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Academia de Letras e Artes
                                  21 de Dezembro de 2012


    ENTRE O FIM DO MUNDO E O FIM
    DE UM MUNDO, OU O PRIMEIRO
  SOLSTÍCIO DE INVERNO DE UMA ERA
            DE MUDANÇA
              (Em três andamentos porque a vida é ela própria uma sonata)


                                por: Paulo Machado de Jesus



                                                                                              1
      1º Andamento – Finlandia, de Sibelius

      O FIM DO MUNDO

       Conhecemos o mundo através de ritmos, de vibrações, como o som e a luz. Tudo
o que conhecemos no mundo é vibração, ritmo, ondulação, pulsação, manifestando-se
em muitas formas, criando estrelas, planetas, galáxias, gerando ciclos de vida, e definindo
os ritmos daquilo a que chamamos tempo. Assim também o nosso sistema solar, com os
seus planetas e a Terra, a nossa casa, a nossa nave espacial original, todo se move
conjungando os vários ritmos dos diversos astros, parecendo realizar uma dança, ritmada
por cadência própria. São os efeitos dessas cadências, e os seus ritmos, que, há milhares
de anos, os nosso antepassados registaram em pedra, produzindo, assim, os primeiros
calendários. A princípio marcavam apenas os eventos astronómicos principais -- eclipses,
equinócios e solstícios -- que tinham particular influência na sua vida e na sua
sobrevivência como caçadores e, mais tarde, como agricultores. Mais tarde, muito mais
tarde, tivémos os calendários anuais, como os conhecemos, com os dias, semanas, meses
e anos, tão importantes hoje nas nossas agendas.
       Várias civilizações produziram os seus calendários próprios, baseados nas suas
cosmogonias particulares, dependentes das suas crenças e da sua relação com o meio
ambiente, bem como o lugar na Terra em que desenvolveram a sua sobrevivência, e
onde basearam as suas observações astronómicas.
Pelo chamado movimento de recessão dos equinócios, verificou-se que o que hoje
chamamos ponto vernal (o grau zodiacal em que o Sol está quando nasce em 21 de
Março, equinócio da Primavera) recua regularmente completando um ciclo de 25796
anos. Assim, em cada 2000 anos, isto em números redondos, muda a era, mudando, na
faixa zodiacal, a zona em que o ponto vernal se encontra, e à qual se atribui a regência de
um signo. Muitos acreditam que tal mudança marca também uma alteração das
influências das vibrações projectadas pelos astros, o que provocaria uma alteração em
muitos aspectos da vida na Terra, nomeadamente influenciando as mentes humanas,
provocando mudanças sociais e, naturalmente, revolucionando o protagonismo entre as
civilizações dominantes.
        Com os antigos cultos e religiões desenvolveu-se a crença no fim do mundo,
também chamado “fim dos tempos”. Já no chamado “Livro dos Mortos”, encontrado
no Egipto e decifrado por Champollion, e que alguns estudiosos dizem ser o mais antigo
livro do mundo, se encontra aí anunciada uma série de catástrofes e cataclismos
cósmicos, precursores dos desastres bíblicos e do Apocalipse. Portanto, desde esses
tempos, há milénios, que ciclìcamente aparecem teorias de que o mundo vai acabar.
        Os actuais defensores do Fim dos Tempos provêm de diversos origens: uns, das
diversas correntes teosóficas, desenvolvidas durante os séculos XVIII e XIX, e ainda
hoje disseminadas em diversos grupos esotéricos e ocultistas; outros, de tendências
inspiradas por uma renovação do Cristianismo, influenciados por certas lojas esotéricas-
gnósticas. Todos convergem para a teoria de que, e segundo a leitura zodiacal baseada
nessa antigas cosmogonias, estaríamos a entrar na Era de Aquário. Mas daí a insistir na
ideia de que o mundo vai acabar é um passo… demasiado grande. Então de onde vem               2
este alarido que levou a NASA a alertar os americanos (mais crédulos do que os
europeus) para as incongruências do discurso pseudo-científico que se divulgou e
propalou através da Internet e dos media?
        Dos vários indícios que apontam para uma data certa destacou-se, nos últimos
anos, misturando o científico ao religioso, acrescido da credibilidade atribuível às velhas
civilizações, consideradas por alguns mais sábias do que a actual, destacou-se, dizia, uma
pedra que os arqueólogos e outros investigadores interpretaram como sendo um
calendário em que se inscreveu, em caracteres próprios, a sequência de um grande ciclo
concebido pelos Maias, o qual, segundo os mesmos esclarecidos intérpretes, terminaria
no solstício de Inverno do ano 2012 da Era Cristã. Até aqui nada de errado: acaba um
ciclo, começa outro. Mas os mais fanáticos, desiludidos com a passagem do ano 2000
sem os cataclismos que esperavam, pegaram na deixa dos Maias e propalaram aos quatro
ventos que afinal o fim do mundo era em 2012, em vez de 2000, e no solstício de
Inverno, portanto… é hoje. Tenho por isso que me apressar pois posso ter de deixar a
palestra a meio, que o dia já está perto do fim. Mas a verdade é que a NASA antecipou
uma comunicação prevista para dia 22, divulgando-a já na passada semana, preocupados
que estavam ao tomarem conhecimento de que era grande o número de pessoas a
construirem abrigos subterrâneos nos quintais e nas caves, a comprarem alimentos para
meses ou anos de reserva e, até, a falarem em suicídios colectivos de famílias. O susto foi
grande pois temia-se o caos nas cidades ou nas estradas, provocado por alguns mais
crédulos, e em pânico.
        Mas passemos em revista algumas dessas teses apocalípticas.
Para começar: a inversão dos pólos. Acontece, mas leva muitas dezenas ou
centenas de milhares de anos a realizar-se. A última, assim identificada pelos cientistas,
ocorreu há cerca de… 780.000 anos.
       Outra teoria: o alinhamento com o centro da galáxia. Houve um, o último, em
1998, em que a Terra, o Sol e o centro da Galáxia estiveram alinhados. Alguém sentiu
alguma coisa de especial? Talvez uma ligeira dor de cabeça mas… galáctica!
       Os perigosos asteróides, especialmente uns, grandes e ameaçadores que, por
razões que desconhecemos, podem sair da órbita em que ordeiramente têm navegado
desde há milhões de anos, e vir por aí espatifar-se. Felizmente que a NASA, sempre a
nossa guardiã, já anunciou, em Setembro de 2011, que cerca de 90% dos maiores dos
asteróides já estão assinalados e descritos, e têm, por isso, as suas órbitas monitorizadas.
Mas se algum desordeiro vier por aí haverá, certamente, nalgum satélite, um canhão laser
pronto para o desfazer,… como nos filmes.
       Claro que teriam também que estar presentes as previsões de uma destruição
provocada pelo aumento exponencial de ciclones e tornados, o reactivamento de vulcões
e o aumento do número e intensidade dos terramotos, acompanhados dos respectivos
maremotos, que reduziriam todas as construções humanas a pó e lama.
       E ainda faltam as invasões extra-terrestres, e até uma intervenção divina, com que
alguns, um pouco fanáticos, intérperetes da Bíblia, antevêm um castigo merecido pelas
maldades dos humanos, e pela sua desobediência a Deus.
       E há quem fale no “cinturão fotónico no gancho da galáxia”, um pomposo nome
de uma super-estrutura energética que provocará a alteração das nossas consciências,
afinando-as para a percepção da 5ª dimensão. Como diria o Pessa: “e esta hein?” Mas            3
esta tem uma vertente optimista: o mundo continua e nós, humanos, somos melhorados
com um “upgrade”, como os computadores.
       Falamos do “Fim do Mundo”: a ligeireza, e até um certo humor, com que temos
abordado este tema, escondeu o que realmente nos preocupa. Todas estas previsões de
caos apontam causas de origem extra-humana. Mas há, no entanto, um tipo de previsões
que nos deve preocupar sèriamente, pois nos remete para a realidade -- uma realidade
bem presente, e bem grave. Vamos atentar, então, no que tememos, por nos parecer
mais próximo, e mais do que possível: o “Fim de um Mundo”, o fim do “nosso mundo”
tal como o conhecemos.

      2º Andamento – (Adagio in G Minor (Albinoni))
      O FIM DE UM MUNDO

        As teorias fatalistas tiveram origem, durante milhares de anos, na angústia dos
seres humanos perante a morte, destino inexorável de todos nós. Mas hoje, mais do que
isso, reflectem uma grande insegurança e incerteza perante o futuro da própria espécie
humana, ou melhor, o futuro da Humanidade, que concebemos como um projecto
colectivo de Amor e de Paz.
        Temos nas nossas mãos as chaves do nosso destino e, em vez de as utilizarmos
para bem de todos, deixamos que paire sobre nós a ameaça de uma catástrofe planetária
que ameaça grande parte da vida na Terra – incluindo a nossa.
A maioria das teses apocalípticas que têm aparecido exprimem, pois, essa
incerteza perante o futuro; mas são, ao mesmo tempo, um apelo a uma mudança
necessária e urgente. Quase tudo parece resumir-se, e concentrar-se, nos últimos anos,
em torno de uma palavra: a crise.
       O Grande Dicionário da Língua Portuguesa, coordenado por José Pedro
Machado, define crise, entre outras sugestões, como “conjuntura perigosa, situação
anormal e grave; situação aflitiva; momento grave, decisivo, perigoso, num negócio||
Situação de um governo cuja continuação encontra dificuldades muito graves”. Mas esta
palavra crise também tem na sua origem grega, krísis, um sentido de “escolha,
julgamento ou opção, acto ou faculdade de distinguir, decisão, solução”, como a define o
mesmo ilustre filólogo no seu Dicionário Etimológico.
       E é de facto de uma escolha que se trata, de uma decisão, necessária e urgente,
quanto ao rumo a seguir. Além da palavra crise notemos que têm a mesma origem, na
Grécia antiga, as palavras democracia, paradigma, política. Parece ser, pois, na Grécia,
mais precisamente na Atenas de há 2300/2400 anos, no famoso século V, o século de
Péricles, que podemos encontrar muita da inspiração para o sentido a dar à mudança.
Poder-se-á dizer que a nossa actual crise, tanto em sentido lato, como no sentido
etimológico, se iniciou de facto há, pelo menos, 2400 anos; e, no entanto, ainda estamos
longe do que sonharam alguns dos melhores filósofos, sábios, legisladores e pedagogos
desse tempo.
       Vejamos alguns textos que corroboram a nossa argumentação de urgência na
mudança.
       Em Maio de 1931 era publicada uma pequena obra de onde extraí o seguinte            4
fragmento:
      “Despotismo económico
      “É coisa manifesta, como nos nossos tempos não só se amontoam
riquezas, mas acumula-se um poder imenso e um verdadeiro despotismo
económico nas mãos de poucos, que as mais das vezes não são senhores, mas
simples depositários e administradores de capitais alheios, com que negoceiam a
seu talante.
      “Este despotismo torna-se intolerável naqueles que, tendo nas suas mãos o
dinheiro, são também senhores absolutos do crédito e por isso dispõem do
sangue de que vive toda a economia, e manipulam de tal maneira a alma da
mesma, que não pode respirar sem sua licença.
      “Este acumular de poderio e recursos, nota característica da economia
actual, é consequência lógica da concorrência desenfreada, à qual só podem
sobreviver os mais fortes, isto é, ordinariamente os mais violentos competidores e
que menos sofrem de escrúpulos de consciência.”
       Trata-se, este texto, de um excerto da Encíclica “Quadragesimo Anno”, publicada
em tempo do Papa Pio XI. E acrescentava um comentário, em nota de rodapé, numa
das reedições portuguesas da encíclica:
       “É esta uma das páginas mais brilhantes da encíclica. Todos os principais
vícios do regime liberal e do sistema económico dele saído estão apontados com
rigor e clareza … /... Em resumo: vê-se que todo o mal está em a vida económica
ter saído fora do seu caminho e dos seus fins. Dominando primeiro o trabalho, o
capital, por meio das grandes facilidades de domínio que alcançou sobretudo em
virtude da organização do crédito e das sociedades anónimas, pretendeu
estabelecer e estabeleceu uma autêntica ditadura que escravizou o próprio
Estado. O remédio está em dominar a ditadura económica, fazendo voltar o
capital ao lugar que numa sociedade bem organizada lhe compete.”
       Também relacionado com este tema da economia publicou em Fevereiro de 2010,
na revista Magazine do Jornal de Notícias, o jornalista e poeta Manuel António Pina,
falecido em Outubro passado, um artigo intitulado “À mesa da usura”, de onde extraí as
seguintes, e bem fundamentadas, afirmações:
      “Ezra Pound chamou-lhe «pecado contra a natureza» e o papa Cisto V
«pecado contra Deus e contra os homens». O empréstimo de dinheiro a juros, o
«lucro sem labor», é considerado imoral pela Bíblia (no Êxodo, no Levítico, no
Deuteronómio, nos Evangelhos de Lucas e Mateus), proibido pelo Corão,
condenado por filósofos (Platão, Aristóteles, Séneca, Plutarco, São Tomás de
Aquino…), por Maomé, por Moisés, pelo Buda; foi banido em concílios como o
de Niceia e o de Latrão, declarado heresia e blasfémia por Clemente V; e Dante
colocou os usurários – a quem a Igreja chegou a recusar os sacramentos e o
funeral cristão – no interior do sétimo círculo do Inferno.
      “Os usurários tornaram-se entretanto gente respeitável, capaz de temer a
Deus e pregar valores morais e, simultaneamente, ler pela cartilha de Bentham
que, em 1787, na sua Defesa da Usura, defendeu que cada homem deve ser o
único juiz do modo como obtém lucros, não tendo de se ater a empecilhos
morais.”                                                                                      5
       Esta era a crítica sábia de um grande jornalista e homem de letras que aqui
recordo.
       Alarguemos ainda o nosso quadro de perspectivas sobre a herança do séc. XX
passando para outras áreas, como as do ambiente e da ecologia. Passemos uma vista de
olhos através dos estudos do Clube de Roma. Fundado em 1968 foi constituído
inicialmente por um grupo de cientistas, a que se juntaram depois investigadores das
chamadas ciências humanas tais como sociólogos, antropólogos, politólogos e até
historiadores, além de reconhecidas personalidades da política mundial como o Rei Juan
Carlos, por exemplo. Em 1972 publicaram um relatório, “Os limites do crescimento”,
onde com base em modelos matemáticos estabelecidos sobre os dados recolhidos desde
1900, abrangendo diversos campos de variáveis que incluíam, entre outras, os recursos
naturais, a população mundial, o produto industrial per capita, a poluição e a quota
alimentar, foi elaborada uma pespectiva de evolução, das variáveis consideradas, até ao
ano 2100. A verdade é que a apresentação desse relatório marcou o fim do optimismo
no que toca ao crescimento económico global e harmonioso, gerando bem-estar e
acabando com a fome, como se perspectivara a seguir à IIª Grande Guerra. Ainda que
criticado quanto a alguns possíveis erros o que é certo é que as suas previsões, mesmo as
mais pessimistas, se têm revelado um sério motivo de angústia para os analistas mais
conscienciosos, pois eram, apesar de tudo, mais optimistas dos que outras previsões que
mais recentemente se realizaram, e nem sequer consideravam, naquele tempo, a
influência negativa de possíveis conflitos entre nações, guerras civis ou desordens sociais
de vária ordem, passíveis de paralizar a economia, além dos efeitos nefastos tanto para o
desenvolvimento social, como para o meio ambiente. Em geral podemos resumir que se
já era previsível uma queda global da qualidade de vida entre 2000 e 2030, o que
coincide, curiosamente, com o período de maior incidência de datas atribuídas pelas
diversas profecias do Fim dos Tempos, os valores actualmente avaliados revelam um
acentuar do declínio, com um aumento global da pobreza e a concentração de riqueza
num número minoritário de milionários e ultra-milionários, a que se seguirá um aumento
de convulsões sociais e uma tendência para o aparecimento de regimes totalitários ou, no
mínimo, autoritários, ainda que sob a capa de democracias.
       Chegados a este ponto ou ficamos estáticos, assustados, paralisados de medo, ou
aplicamos aquele conceito etimológico de crise e fazemos uma escolha. E a única escolha
possível só parece ser uma: unirmo-nos para a mudança. Se estamos conscientes da
urgência então porquê hesitar e deixar sempre para outros as decisões tomadas sobre as
nossa vidas?
       Façamos nossas as palavras de Fernando Pessoa quando escreveu na sua
“Mensagem”: “é a hora!”

       3º Andamento -- Allegro con brio (4° mov.) Sinfonia n°7 en la mayor opus
92. L. V. Beethoven
       O PRIMEIRO SOLSTÍCIO DE UMA ERA DE MUDANÇA

       O que fazer então?
       Tudo.
       Restaurar a cidadania, o exercício do direito de cada um a participar no governo      6
da cidade, a polis, dando à política o seu verdadeiro sentido. Criar um movimento de
solidariedade e de partilha que seja estruturante de uma forma nova de viver em
comunidade, criando uma sociedade em que todos estejam conscientes da importância
da sua participação e de que podemos fazer história, desenvolvendo a acção social no
sentido do desenvolvimento conjunto e integral da sociedade
       Estimular e desenvolver em todos a solidariedade e o voluntariado de modo a
tornar a participação, a partilha e a interacção transversal a toda a comunidade.
       Partir da experiência local, tornando mais abrangentes as reinvidicações, e criando
assim novos, e verdadeiros, movimentos sociais que lutem pelo acesso aos mecanismos
de decisão política e económica, bem como à sua fiscalização.
       Mas acima de tudo ter presente que o futuro é das crianças de hoje. São elas as
herdeiras do Mundo. É por elas e para elas, acima de tudo, que devemos aperfeiçoar os
métodos pedagógicos, ensinando-lhes a importância de valores éticos e de partilha,
inspirados nos valores filosóficos e religiosos consagrados há mais de dois mil anos.
Preparar os futuros dirigentes mais do que apenas pelas habilitações, pelo equilíbrio do
carácter, pela motivação própria e pela capacidade de motivar os outros.
       E isso envolve a matemática, essencial para quase tudo e que é fundamental para
criar hábitos de raciocínio. O estudo da língua, para a comunicação correcta do
pensamento. A História dos movimentos sociais, filosóficos, políticos, que contribui
para que os jovens adquiram a consciência de uma evolução social comum e dos valores
comunitários. As ciências naturais, que promovem uma aproximação à natureza,
ensinando os jovens a respeitá-la e fomentando a defesa do meio ambiente, a casa de
todos nós.
       Mas também a música deverá ser incluída na aprendizagem de todos, pois é a
linguagem universal da harmonia, e um meio de fomentar a disciplina no estudo, a
atenção e o trabalho em conjunto.
       O respeito pela velhice deverá ser consagrado, com a integração dos mais idosos,
ao invés de os rejeitar, e convidando os ainda válidos a participar, como um conselho de
sábios, à maneira dos antigos anciãos, nas deliberações da comunidade. A sua
experiência é essencial pois são um repositório de um saber adquirido tantas vezes nos
gestos quase rituais dos antigos ofícios, à beira de se perder pelo desprezo a que foram
votados nesta era de tecnologia industrial. Só os velhos podem ainda fazer passar esses
segredos, fazendo a ponte para as gerações futuras.
       Em 1849 Ernest Renan escrevia: “O passado foi religioso e anti-científico; o
presente é arreligioso e científico; o futuro será religioso e científico”. Eis-nos à beira
desse futuro.
       O momento é de acção por que nos anima a vontade de respirar ar puro, a
vontade de erguer uma voz mais alto do que a voz da egoísmo, que é só ruído e
destruição. A vitória passará sempre por uma mudança nos paradigmas da economia, só
por isso será difícil.
       Que a nossa Esperança seja uma antevisão do nosso destino para além do futuro
próximo; e que esse destino seja a realização desse magnífico projecto que é a
Humanidade, a humana unidade, que concebemos como o nosso melhor sonho
colectivo de Amor e de Paz.                                                                   7
       Um Santo e Feliz Natal

                                                        Monte Estoril, Dezembro de 2012
                                                                Paulo Machado de Jesus

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O fim do mundo e o fim de um mundo

  • 1. Academia de Letras e Artes 21 de Dezembro de 2012 ENTRE O FIM DO MUNDO E O FIM DE UM MUNDO, OU O PRIMEIRO SOLSTÍCIO DE INVERNO DE UMA ERA DE MUDANÇA (Em três andamentos porque a vida é ela própria uma sonata) por: Paulo Machado de Jesus 1 1º Andamento – Finlandia, de Sibelius O FIM DO MUNDO Conhecemos o mundo através de ritmos, de vibrações, como o som e a luz. Tudo o que conhecemos no mundo é vibração, ritmo, ondulação, pulsação, manifestando-se em muitas formas, criando estrelas, planetas, galáxias, gerando ciclos de vida, e definindo os ritmos daquilo a que chamamos tempo. Assim também o nosso sistema solar, com os seus planetas e a Terra, a nossa casa, a nossa nave espacial original, todo se move conjungando os vários ritmos dos diversos astros, parecendo realizar uma dança, ritmada por cadência própria. São os efeitos dessas cadências, e os seus ritmos, que, há milhares de anos, os nosso antepassados registaram em pedra, produzindo, assim, os primeiros calendários. A princípio marcavam apenas os eventos astronómicos principais -- eclipses, equinócios e solstícios -- que tinham particular influência na sua vida e na sua sobrevivência como caçadores e, mais tarde, como agricultores. Mais tarde, muito mais tarde, tivémos os calendários anuais, como os conhecemos, com os dias, semanas, meses e anos, tão importantes hoje nas nossas agendas. Várias civilizações produziram os seus calendários próprios, baseados nas suas cosmogonias particulares, dependentes das suas crenças e da sua relação com o meio ambiente, bem como o lugar na Terra em que desenvolveram a sua sobrevivência, e onde basearam as suas observações astronómicas.
  • 2. Pelo chamado movimento de recessão dos equinócios, verificou-se que o que hoje chamamos ponto vernal (o grau zodiacal em que o Sol está quando nasce em 21 de Março, equinócio da Primavera) recua regularmente completando um ciclo de 25796 anos. Assim, em cada 2000 anos, isto em números redondos, muda a era, mudando, na faixa zodiacal, a zona em que o ponto vernal se encontra, e à qual se atribui a regência de um signo. Muitos acreditam que tal mudança marca também uma alteração das influências das vibrações projectadas pelos astros, o que provocaria uma alteração em muitos aspectos da vida na Terra, nomeadamente influenciando as mentes humanas, provocando mudanças sociais e, naturalmente, revolucionando o protagonismo entre as civilizações dominantes. Com os antigos cultos e religiões desenvolveu-se a crença no fim do mundo, também chamado “fim dos tempos”. Já no chamado “Livro dos Mortos”, encontrado no Egipto e decifrado por Champollion, e que alguns estudiosos dizem ser o mais antigo livro do mundo, se encontra aí anunciada uma série de catástrofes e cataclismos cósmicos, precursores dos desastres bíblicos e do Apocalipse. Portanto, desde esses tempos, há milénios, que ciclìcamente aparecem teorias de que o mundo vai acabar. Os actuais defensores do Fim dos Tempos provêm de diversos origens: uns, das diversas correntes teosóficas, desenvolvidas durante os séculos XVIII e XIX, e ainda hoje disseminadas em diversos grupos esotéricos e ocultistas; outros, de tendências inspiradas por uma renovação do Cristianismo, influenciados por certas lojas esotéricas- gnósticas. Todos convergem para a teoria de que, e segundo a leitura zodiacal baseada nessa antigas cosmogonias, estaríamos a entrar na Era de Aquário. Mas daí a insistir na ideia de que o mundo vai acabar é um passo… demasiado grande. Então de onde vem 2 este alarido que levou a NASA a alertar os americanos (mais crédulos do que os europeus) para as incongruências do discurso pseudo-científico que se divulgou e propalou através da Internet e dos media? Dos vários indícios que apontam para uma data certa destacou-se, nos últimos anos, misturando o científico ao religioso, acrescido da credibilidade atribuível às velhas civilizações, consideradas por alguns mais sábias do que a actual, destacou-se, dizia, uma pedra que os arqueólogos e outros investigadores interpretaram como sendo um calendário em que se inscreveu, em caracteres próprios, a sequência de um grande ciclo concebido pelos Maias, o qual, segundo os mesmos esclarecidos intérpretes, terminaria no solstício de Inverno do ano 2012 da Era Cristã. Até aqui nada de errado: acaba um ciclo, começa outro. Mas os mais fanáticos, desiludidos com a passagem do ano 2000 sem os cataclismos que esperavam, pegaram na deixa dos Maias e propalaram aos quatro ventos que afinal o fim do mundo era em 2012, em vez de 2000, e no solstício de Inverno, portanto… é hoje. Tenho por isso que me apressar pois posso ter de deixar a palestra a meio, que o dia já está perto do fim. Mas a verdade é que a NASA antecipou uma comunicação prevista para dia 22, divulgando-a já na passada semana, preocupados que estavam ao tomarem conhecimento de que era grande o número de pessoas a construirem abrigos subterrâneos nos quintais e nas caves, a comprarem alimentos para meses ou anos de reserva e, até, a falarem em suicídios colectivos de famílias. O susto foi grande pois temia-se o caos nas cidades ou nas estradas, provocado por alguns mais crédulos, e em pânico. Mas passemos em revista algumas dessas teses apocalípticas.
  • 3. Para começar: a inversão dos pólos. Acontece, mas leva muitas dezenas ou centenas de milhares de anos a realizar-se. A última, assim identificada pelos cientistas, ocorreu há cerca de… 780.000 anos. Outra teoria: o alinhamento com o centro da galáxia. Houve um, o último, em 1998, em que a Terra, o Sol e o centro da Galáxia estiveram alinhados. Alguém sentiu alguma coisa de especial? Talvez uma ligeira dor de cabeça mas… galáctica! Os perigosos asteróides, especialmente uns, grandes e ameaçadores que, por razões que desconhecemos, podem sair da órbita em que ordeiramente têm navegado desde há milhões de anos, e vir por aí espatifar-se. Felizmente que a NASA, sempre a nossa guardiã, já anunciou, em Setembro de 2011, que cerca de 90% dos maiores dos asteróides já estão assinalados e descritos, e têm, por isso, as suas órbitas monitorizadas. Mas se algum desordeiro vier por aí haverá, certamente, nalgum satélite, um canhão laser pronto para o desfazer,… como nos filmes. Claro que teriam também que estar presentes as previsões de uma destruição provocada pelo aumento exponencial de ciclones e tornados, o reactivamento de vulcões e o aumento do número e intensidade dos terramotos, acompanhados dos respectivos maremotos, que reduziriam todas as construções humanas a pó e lama. E ainda faltam as invasões extra-terrestres, e até uma intervenção divina, com que alguns, um pouco fanáticos, intérperetes da Bíblia, antevêm um castigo merecido pelas maldades dos humanos, e pela sua desobediência a Deus. E há quem fale no “cinturão fotónico no gancho da galáxia”, um pomposo nome de uma super-estrutura energética que provocará a alteração das nossas consciências, afinando-as para a percepção da 5ª dimensão. Como diria o Pessa: “e esta hein?” Mas 3 esta tem uma vertente optimista: o mundo continua e nós, humanos, somos melhorados com um “upgrade”, como os computadores. Falamos do “Fim do Mundo”: a ligeireza, e até um certo humor, com que temos abordado este tema, escondeu o que realmente nos preocupa. Todas estas previsões de caos apontam causas de origem extra-humana. Mas há, no entanto, um tipo de previsões que nos deve preocupar sèriamente, pois nos remete para a realidade -- uma realidade bem presente, e bem grave. Vamos atentar, então, no que tememos, por nos parecer mais próximo, e mais do que possível: o “Fim de um Mundo”, o fim do “nosso mundo” tal como o conhecemos. 2º Andamento – (Adagio in G Minor (Albinoni)) O FIM DE UM MUNDO As teorias fatalistas tiveram origem, durante milhares de anos, na angústia dos seres humanos perante a morte, destino inexorável de todos nós. Mas hoje, mais do que isso, reflectem uma grande insegurança e incerteza perante o futuro da própria espécie humana, ou melhor, o futuro da Humanidade, que concebemos como um projecto colectivo de Amor e de Paz. Temos nas nossas mãos as chaves do nosso destino e, em vez de as utilizarmos para bem de todos, deixamos que paire sobre nós a ameaça de uma catástrofe planetária que ameaça grande parte da vida na Terra – incluindo a nossa.
  • 4. A maioria das teses apocalípticas que têm aparecido exprimem, pois, essa incerteza perante o futuro; mas são, ao mesmo tempo, um apelo a uma mudança necessária e urgente. Quase tudo parece resumir-se, e concentrar-se, nos últimos anos, em torno de uma palavra: a crise. O Grande Dicionário da Língua Portuguesa, coordenado por José Pedro Machado, define crise, entre outras sugestões, como “conjuntura perigosa, situação anormal e grave; situação aflitiva; momento grave, decisivo, perigoso, num negócio|| Situação de um governo cuja continuação encontra dificuldades muito graves”. Mas esta palavra crise também tem na sua origem grega, krísis, um sentido de “escolha, julgamento ou opção, acto ou faculdade de distinguir, decisão, solução”, como a define o mesmo ilustre filólogo no seu Dicionário Etimológico. E é de facto de uma escolha que se trata, de uma decisão, necessária e urgente, quanto ao rumo a seguir. Além da palavra crise notemos que têm a mesma origem, na Grécia antiga, as palavras democracia, paradigma, política. Parece ser, pois, na Grécia, mais precisamente na Atenas de há 2300/2400 anos, no famoso século V, o século de Péricles, que podemos encontrar muita da inspiração para o sentido a dar à mudança. Poder-se-á dizer que a nossa actual crise, tanto em sentido lato, como no sentido etimológico, se iniciou de facto há, pelo menos, 2400 anos; e, no entanto, ainda estamos longe do que sonharam alguns dos melhores filósofos, sábios, legisladores e pedagogos desse tempo. Vejamos alguns textos que corroboram a nossa argumentação de urgência na mudança. Em Maio de 1931 era publicada uma pequena obra de onde extraí o seguinte 4 fragmento: “Despotismo económico “É coisa manifesta, como nos nossos tempos não só se amontoam riquezas, mas acumula-se um poder imenso e um verdadeiro despotismo económico nas mãos de poucos, que as mais das vezes não são senhores, mas simples depositários e administradores de capitais alheios, com que negoceiam a seu talante. “Este despotismo torna-se intolerável naqueles que, tendo nas suas mãos o dinheiro, são também senhores absolutos do crédito e por isso dispõem do sangue de que vive toda a economia, e manipulam de tal maneira a alma da mesma, que não pode respirar sem sua licença. “Este acumular de poderio e recursos, nota característica da economia actual, é consequência lógica da concorrência desenfreada, à qual só podem sobreviver os mais fortes, isto é, ordinariamente os mais violentos competidores e que menos sofrem de escrúpulos de consciência.” Trata-se, este texto, de um excerto da Encíclica “Quadragesimo Anno”, publicada em tempo do Papa Pio XI. E acrescentava um comentário, em nota de rodapé, numa das reedições portuguesas da encíclica: “É esta uma das páginas mais brilhantes da encíclica. Todos os principais vícios do regime liberal e do sistema económico dele saído estão apontados com rigor e clareza … /... Em resumo: vê-se que todo o mal está em a vida económica ter saído fora do seu caminho e dos seus fins. Dominando primeiro o trabalho, o
  • 5. capital, por meio das grandes facilidades de domínio que alcançou sobretudo em virtude da organização do crédito e das sociedades anónimas, pretendeu estabelecer e estabeleceu uma autêntica ditadura que escravizou o próprio Estado. O remédio está em dominar a ditadura económica, fazendo voltar o capital ao lugar que numa sociedade bem organizada lhe compete.” Também relacionado com este tema da economia publicou em Fevereiro de 2010, na revista Magazine do Jornal de Notícias, o jornalista e poeta Manuel António Pina, falecido em Outubro passado, um artigo intitulado “À mesa da usura”, de onde extraí as seguintes, e bem fundamentadas, afirmações: “Ezra Pound chamou-lhe «pecado contra a natureza» e o papa Cisto V «pecado contra Deus e contra os homens». O empréstimo de dinheiro a juros, o «lucro sem labor», é considerado imoral pela Bíblia (no Êxodo, no Levítico, no Deuteronómio, nos Evangelhos de Lucas e Mateus), proibido pelo Corão, condenado por filósofos (Platão, Aristóteles, Séneca, Plutarco, São Tomás de Aquino…), por Maomé, por Moisés, pelo Buda; foi banido em concílios como o de Niceia e o de Latrão, declarado heresia e blasfémia por Clemente V; e Dante colocou os usurários – a quem a Igreja chegou a recusar os sacramentos e o funeral cristão – no interior do sétimo círculo do Inferno. “Os usurários tornaram-se entretanto gente respeitável, capaz de temer a Deus e pregar valores morais e, simultaneamente, ler pela cartilha de Bentham que, em 1787, na sua Defesa da Usura, defendeu que cada homem deve ser o único juiz do modo como obtém lucros, não tendo de se ater a empecilhos morais.” 5 Esta era a crítica sábia de um grande jornalista e homem de letras que aqui recordo. Alarguemos ainda o nosso quadro de perspectivas sobre a herança do séc. XX passando para outras áreas, como as do ambiente e da ecologia. Passemos uma vista de olhos através dos estudos do Clube de Roma. Fundado em 1968 foi constituído inicialmente por um grupo de cientistas, a que se juntaram depois investigadores das chamadas ciências humanas tais como sociólogos, antropólogos, politólogos e até historiadores, além de reconhecidas personalidades da política mundial como o Rei Juan Carlos, por exemplo. Em 1972 publicaram um relatório, “Os limites do crescimento”, onde com base em modelos matemáticos estabelecidos sobre os dados recolhidos desde 1900, abrangendo diversos campos de variáveis que incluíam, entre outras, os recursos naturais, a população mundial, o produto industrial per capita, a poluição e a quota alimentar, foi elaborada uma pespectiva de evolução, das variáveis consideradas, até ao ano 2100. A verdade é que a apresentação desse relatório marcou o fim do optimismo no que toca ao crescimento económico global e harmonioso, gerando bem-estar e acabando com a fome, como se perspectivara a seguir à IIª Grande Guerra. Ainda que criticado quanto a alguns possíveis erros o que é certo é que as suas previsões, mesmo as mais pessimistas, se têm revelado um sério motivo de angústia para os analistas mais conscienciosos, pois eram, apesar de tudo, mais optimistas dos que outras previsões que mais recentemente se realizaram, e nem sequer consideravam, naquele tempo, a influência negativa de possíveis conflitos entre nações, guerras civis ou desordens sociais de vária ordem, passíveis de paralizar a economia, além dos efeitos nefastos tanto para o
  • 6. desenvolvimento social, como para o meio ambiente. Em geral podemos resumir que se já era previsível uma queda global da qualidade de vida entre 2000 e 2030, o que coincide, curiosamente, com o período de maior incidência de datas atribuídas pelas diversas profecias do Fim dos Tempos, os valores actualmente avaliados revelam um acentuar do declínio, com um aumento global da pobreza e a concentração de riqueza num número minoritário de milionários e ultra-milionários, a que se seguirá um aumento de convulsões sociais e uma tendência para o aparecimento de regimes totalitários ou, no mínimo, autoritários, ainda que sob a capa de democracias. Chegados a este ponto ou ficamos estáticos, assustados, paralisados de medo, ou aplicamos aquele conceito etimológico de crise e fazemos uma escolha. E a única escolha possível só parece ser uma: unirmo-nos para a mudança. Se estamos conscientes da urgência então porquê hesitar e deixar sempre para outros as decisões tomadas sobre as nossa vidas? Façamos nossas as palavras de Fernando Pessoa quando escreveu na sua “Mensagem”: “é a hora!” 3º Andamento -- Allegro con brio (4° mov.) Sinfonia n°7 en la mayor opus 92. L. V. Beethoven O PRIMEIRO SOLSTÍCIO DE UMA ERA DE MUDANÇA O que fazer então? Tudo. Restaurar a cidadania, o exercício do direito de cada um a participar no governo 6 da cidade, a polis, dando à política o seu verdadeiro sentido. Criar um movimento de solidariedade e de partilha que seja estruturante de uma forma nova de viver em comunidade, criando uma sociedade em que todos estejam conscientes da importância da sua participação e de que podemos fazer história, desenvolvendo a acção social no sentido do desenvolvimento conjunto e integral da sociedade Estimular e desenvolver em todos a solidariedade e o voluntariado de modo a tornar a participação, a partilha e a interacção transversal a toda a comunidade. Partir da experiência local, tornando mais abrangentes as reinvidicações, e criando assim novos, e verdadeiros, movimentos sociais que lutem pelo acesso aos mecanismos de decisão política e económica, bem como à sua fiscalização. Mas acima de tudo ter presente que o futuro é das crianças de hoje. São elas as herdeiras do Mundo. É por elas e para elas, acima de tudo, que devemos aperfeiçoar os métodos pedagógicos, ensinando-lhes a importância de valores éticos e de partilha, inspirados nos valores filosóficos e religiosos consagrados há mais de dois mil anos. Preparar os futuros dirigentes mais do que apenas pelas habilitações, pelo equilíbrio do carácter, pela motivação própria e pela capacidade de motivar os outros. E isso envolve a matemática, essencial para quase tudo e que é fundamental para criar hábitos de raciocínio. O estudo da língua, para a comunicação correcta do pensamento. A História dos movimentos sociais, filosóficos, políticos, que contribui para que os jovens adquiram a consciência de uma evolução social comum e dos valores comunitários. As ciências naturais, que promovem uma aproximação à natureza,
  • 7. ensinando os jovens a respeitá-la e fomentando a defesa do meio ambiente, a casa de todos nós. Mas também a música deverá ser incluída na aprendizagem de todos, pois é a linguagem universal da harmonia, e um meio de fomentar a disciplina no estudo, a atenção e o trabalho em conjunto. O respeito pela velhice deverá ser consagrado, com a integração dos mais idosos, ao invés de os rejeitar, e convidando os ainda válidos a participar, como um conselho de sábios, à maneira dos antigos anciãos, nas deliberações da comunidade. A sua experiência é essencial pois são um repositório de um saber adquirido tantas vezes nos gestos quase rituais dos antigos ofícios, à beira de se perder pelo desprezo a que foram votados nesta era de tecnologia industrial. Só os velhos podem ainda fazer passar esses segredos, fazendo a ponte para as gerações futuras. Em 1849 Ernest Renan escrevia: “O passado foi religioso e anti-científico; o presente é arreligioso e científico; o futuro será religioso e científico”. Eis-nos à beira desse futuro. O momento é de acção por que nos anima a vontade de respirar ar puro, a vontade de erguer uma voz mais alto do que a voz da egoísmo, que é só ruído e destruição. A vitória passará sempre por uma mudança nos paradigmas da economia, só por isso será difícil. Que a nossa Esperança seja uma antevisão do nosso destino para além do futuro próximo; e que esse destino seja a realização desse magnífico projecto que é a Humanidade, a humana unidade, que concebemos como o nosso melhor sonho colectivo de Amor e de Paz. 7 Um Santo e Feliz Natal Monte Estoril, Dezembro de 2012 Paulo Machado de Jesus