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Adail Sobral
(PPGL-UCPEL)
O método filosófico de Bakhtin
 As teorias do Círculo exibem de modo geral, em sua
 formulação, dois momentos básicos: (a) partir dos
 fenômenos concretos (indução – a voz do elemento
 estudado) sem renunciar a uma concepção teórica
 declarada (dedução – a voz do estudioso) para estudá-
 los, sempre fundada em termos filosóficos, como é
 corriqueiro em solo russo e (b), usar os elementos
 obtidos no exame dos fenômenos concretos para
 alterar a concepção a partir da qual ele tinha sido
 analisado e, em seguida, voltar a ele com uma outra
 compreensão.
O método filosófico de Bakhtin
 Trata-se do que se poderia chamar de “síntese bakhtiniana”
  (para lembrar intencionalmente a “síntese kantiana”): uma
  dia-lógica, dado que os momentos dialéticos não são tese-
  antítese-síntese, mas tese-tese-síntese: em vez de
  superação da tese pela antítese, a articulação entre as duas,
  o que corrige o teoreticismo da dialética tradicional. Aqui
  se reconhece que o mundo é apreendido pelo homem em
  termos de categorias humanas (Kant) e, ao mesmo tempo,
  que há um mundo dado, fenômenos dados, não se podendo
  nem propor uma apreensão do real como tal nem uma
  apreensão que não considere que esse real existe (Husserl);
  conteúdo e processo de apreensão formam o Jano que
  constitui a base da concepção bakhtiniana do ato.
Etapas e forma de apresentação
 As propostas partem sempre da consideração dos dois (ou
 mais) lados da questão — por exemplo, da concepção
 formalista e da concepção sociológica do fenômeno
 literário — para então, a partir da crítica do caráter parcial
 de cada uma delas, propor uma nova concepção, voltada
 para abarcar, em vez de negar ou privilegiar indevidamente,
 os dois aspectos parciais que as propostas não viram. É o
 que se pode chamar de “método socrático bakhtiniano”,
 dado que busca abalar as bases das propostas examinadas,
 seja mostrando suas falhas em termos de pressupostos ou
 expondo sua incapacidade de ir na direção escolhida até as
 últimas conseqüências.
Etapas e forma de apresentação
 O Círculo defende o compromisso concreto, assumido
  por sujeitos que vão até o fim em suas propostas, não o
  comprometimento estratégico ou a “solução de
  compromisso” conciliatória.
 Unindo esses dois níveis de estudo, o Círculo se propõe
  a produzir abordagens teoricamente defensáveis, mas
  não abstratas, bem como procedimentos de análise
  rigorosos mas não rígidos, fundados na identificação e
  explicação das seguintes relações entre elementos dos
  objetos estudados:
O geral e o particular como
categorias filosóficas
 O empreendimento bakhtiniano consiste em propor
 que há entre o particular e o geral, o prático e o teórico,
 a vida e a arte uma reação de interconstituição
 dialógica que não privilegia nenhum desses termos,
 mas os integra na produção de atos, de enunciados, de
 obras de arte etc. (SOBRAL, 2006, p.105).
Tensões
 Os fenômenos são estudados em termos da relação
 entre seus elementos no âmbito de uma organização
 arquitetônica, organização dos elementos em sistemas
 definidos não apenas em termos de contigüidade
 mecânica, ou empíricos, mas de articulação no plano
 do sentido, ou teóricos, que se integram na criação de
 totalidades abertas, sistemas dinâmicos sujeitos a
 alterações conjunturais envolvendo vivências e relações
 sociais historicamente condicionadas.
Tensões
 Forma/Conteúdo;
 Resultado/Processo;
 Material/Organização;
 Individualidade/Interação entre indivíduos;
 Cognição/Vida prática;
 Universalidade/Singularidade;
 Objetividade (o real concreto)/objetivação
Sujeito e agir
 A diferença em seu tratamento do sujeito reside no
 fato de que, recusando concepções transcendentes,
 como a de Kant, por exemplo, para o qual haveria
 categorias independentes da vida concreta a que os
 sujeitos se submeteriam, ou psicologizantes, como as
 das teorias, filosóficas e outras, do sujeito cartesiano
 autárquico ou da criatividade individual, não aceita
 categorias de percepção e/ou de pensamento que
 possam existir fora da situação concreta dos sujeitos
 percipientes e/ou pensantes ou que existam em sua
 consciência entendida como instância a-social e a-
 histórica.
Sujeito e sentido
 O Círculo de Bakhtin vê o sujeito no âmbito de uma
 arquitetônica em que diferentes elementos que
 constituem sua fluida e situada identidade estão em
 permanente tensão, em constante articulação
 dialógica, em permanente negociação de formas de
 composição, em vez de unidos mecanicamente.
 (SOBRAL, 2006, p. 105)
Imperativo categórico e álibis
 Bakhtin reformula esse conceito kantiano a partir de
 duas teses essenciais: a ideia de que o sujeito humano é
 marcado pela ausência de “álibi” na vida, isto é, de que
 cada sujeito deve responder por seus atos, sem que
 haja uma justificativa a priori, de caráter geral, para
 seus atos particulares. (SOBRAL, 2005, p.104)
“Responsibilidade”
 O ato responsível ou ato ético, envolve o conteúdo do
 ato, o processo do ato, e unindo-os, a
 valoração/avaliação do agente com respeito ao seu
 próprio ato. Essa visão globalizante dos atos humanos
 é à base de sua filosofia humana do processo(...)
 (SOBRAL, 2005, p.104).
Contra algumas teorias do agir
 Os eventos de que sou agente trazem minha
  “assinatura”, não a de instâncias que estabelecem leis
  abstratas ou objetificantes, aquelas pretensamente
  acima da sociedade e da história e estas [últimas]
  marcadas pela       transformação dos sujeitos em
  objetos.(SOBRAL, 2005,p.108).
 Bakhtin é assim um filósofo da individualidade, mas
  seu “indivíduo” é constituído nas, e constitutivo das,
  relações com outros sujeitos. O eu é o outro do outro!
O sensível e o inteligível
 As propostas filosóficas do Círculo de Bakhtin
 permitem dizer que o mundo não chega à consciência
 sem mediação: o sensível é o plano de apreensão
 “intuitiva” do mundo sem elaboração teórica, o plano
 do dado, das “impressões totais” de que fala Schaff; e o
 inteligível é o plano da elaboração do apreendido;
 aquele privilegia o processo de percepção e de ação
 enquanto criador de impressões e este privilegia a
 transformação dessas impressões numa unidade de
 conteúdo, um conceito; portanto, o sensível é o plano
 da multiplicidade, da descontinuidade, e o inteligível,
 o da busca da unidade, da continuidade..
Exotopia
 A posição exotópica, equivalente a “estar num lugar
 fora”, é um “fora” relativo, uma posição de fronteira,
 posição móvel, que não transcende o mundo, mas o vê
 de certa distância a fim de transfigurá-lo na construção
 arquitetônica da obra, estética ou não. A posição
 exotópica é a posição a partir da qual é possível o
 trabalho estético, a ação de construir o objeto estético
 (...) (SOBRAL, 2005,p.109).
Uma filosofia humana do processo
 O agir do sujeito é um conhecer em vários planos que
 une processo (o agir no mundo, o ético), produto (a
 teorização) e valoração (o estético) nos termos de sua
 responsabilidade inalienável de sujeito humano, de sua
 falta de escapatória, de sua inevitável condição de ser
 lançado no mundo e ter ainda assim de dar contas de
 como nele agiu.( SOBRAL, 2005, p.18)
A síntese bakhtiniana (1)
 O momento [no sentido filosófico de “instância”] que o
 pensamento teórico discursivo (tanto nas ciências naturais
 como na filosofia), a descrição-exposição histórica e a
 intuição estética têm em comum, e que se reveste de
 particular importância para nossa investigação é: todas
 essas atividades estabelecem uma cisão fundamental entre
 o conteúdo ou sentido de um dado ato/atividade e a
 concretude histórica do ser desse ato/atividade, a
 experiência atual e uni-ocorrente dele. E é em
 conseqüência disso que o ato dado vê-se privado de seu
 valor, bem como da unidade de seu vir-a-ser e de sua
 autodeterminação atuais [grifos meus].
A síntese bakhtiniana (2)
 Ao defender uma versão da filosofia da práxis
 materialista dialética, que traz elementos kantianos e
 fenomenológicos, Bakhtin evita cuidadosamente cair
 no extremo oposto de certas tendências filosóficas,
 próximas do empirismo, em que a percepção seria tida
 como imediata, sem categorias que a organizem, e que
 a reduzem assim a seu aspecto particular. Logo, se não
 admite que a teoria apague a vida concreta, prática,
 Bakhtin também não admite que a prática concreta
 apague a teoria, o plano em que se pode generalizar
 sobre todos os atos
Implicações metodológicas
 (1) Entender o ideológico em sua ligação constitutiva com a
  materialidade concreta da linguagem, em vez de existir fora
  dele, de ser um conteúdo que a linguagem apenas veicularia
  ou de existir na consciência do sujeito entendida como
  instância desvinculada do social e do histórico.
 (2) Entender as formas da língua como obtendo sentido,
  com base em sua significação, em sua associação intrínseca
  com as formas concretas com que se manifesta o sistema de
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 (3) Entender a comunicação e suas formas em sua relação
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  • 2. O método filosófico de Bakhtin  As teorias do Círculo exibem de modo geral, em sua formulação, dois momentos básicos: (a) partir dos fenômenos concretos (indução – a voz do elemento estudado) sem renunciar a uma concepção teórica declarada (dedução – a voz do estudioso) para estudá- los, sempre fundada em termos filosóficos, como é corriqueiro em solo russo e (b), usar os elementos obtidos no exame dos fenômenos concretos para alterar a concepção a partir da qual ele tinha sido analisado e, em seguida, voltar a ele com uma outra compreensão.
  • 3. O método filosófico de Bakhtin  Trata-se do que se poderia chamar de “síntese bakhtiniana” (para lembrar intencionalmente a “síntese kantiana”): uma dia-lógica, dado que os momentos dialéticos não são tese- antítese-síntese, mas tese-tese-síntese: em vez de superação da tese pela antítese, a articulação entre as duas, o que corrige o teoreticismo da dialética tradicional. Aqui se reconhece que o mundo é apreendido pelo homem em termos de categorias humanas (Kant) e, ao mesmo tempo, que há um mundo dado, fenômenos dados, não se podendo nem propor uma apreensão do real como tal nem uma apreensão que não considere que esse real existe (Husserl); conteúdo e processo de apreensão formam o Jano que constitui a base da concepção bakhtiniana do ato.
  • 4. Etapas e forma de apresentação  As propostas partem sempre da consideração dos dois (ou mais) lados da questão — por exemplo, da concepção formalista e da concepção sociológica do fenômeno literário — para então, a partir da crítica do caráter parcial de cada uma delas, propor uma nova concepção, voltada para abarcar, em vez de negar ou privilegiar indevidamente, os dois aspectos parciais que as propostas não viram. É o que se pode chamar de “método socrático bakhtiniano”, dado que busca abalar as bases das propostas examinadas, seja mostrando suas falhas em termos de pressupostos ou expondo sua incapacidade de ir na direção escolhida até as últimas conseqüências.
  • 5. Etapas e forma de apresentação  O Círculo defende o compromisso concreto, assumido por sujeitos que vão até o fim em suas propostas, não o comprometimento estratégico ou a “solução de compromisso” conciliatória.  Unindo esses dois níveis de estudo, o Círculo se propõe a produzir abordagens teoricamente defensáveis, mas não abstratas, bem como procedimentos de análise rigorosos mas não rígidos, fundados na identificação e explicação das seguintes relações entre elementos dos objetos estudados:
  • 6. O geral e o particular como categorias filosóficas  O empreendimento bakhtiniano consiste em propor que há entre o particular e o geral, o prático e o teórico, a vida e a arte uma reação de interconstituição dialógica que não privilegia nenhum desses termos, mas os integra na produção de atos, de enunciados, de obras de arte etc. (SOBRAL, 2006, p.105).
  • 7. Tensões  Os fenômenos são estudados em termos da relação entre seus elementos no âmbito de uma organização arquitetônica, organização dos elementos em sistemas definidos não apenas em termos de contigüidade mecânica, ou empíricos, mas de articulação no plano do sentido, ou teóricos, que se integram na criação de totalidades abertas, sistemas dinâmicos sujeitos a alterações conjunturais envolvendo vivências e relações sociais historicamente condicionadas.
  • 8. Tensões  Forma/Conteúdo;  Resultado/Processo;  Material/Organização;  Individualidade/Interação entre indivíduos;  Cognição/Vida prática;  Universalidade/Singularidade;  Objetividade (o real concreto)/objetivação
  • 9. Sujeito e agir  A diferença em seu tratamento do sujeito reside no fato de que, recusando concepções transcendentes, como a de Kant, por exemplo, para o qual haveria categorias independentes da vida concreta a que os sujeitos se submeteriam, ou psicologizantes, como as das teorias, filosóficas e outras, do sujeito cartesiano autárquico ou da criatividade individual, não aceita categorias de percepção e/ou de pensamento que possam existir fora da situação concreta dos sujeitos percipientes e/ou pensantes ou que existam em sua consciência entendida como instância a-social e a- histórica.
  • 10. Sujeito e sentido  O Círculo de Bakhtin vê o sujeito no âmbito de uma arquitetônica em que diferentes elementos que constituem sua fluida e situada identidade estão em permanente tensão, em constante articulação dialógica, em permanente negociação de formas de composição, em vez de unidos mecanicamente. (SOBRAL, 2006, p. 105)
  • 11. Imperativo categórico e álibis  Bakhtin reformula esse conceito kantiano a partir de duas teses essenciais: a ideia de que o sujeito humano é marcado pela ausência de “álibi” na vida, isto é, de que cada sujeito deve responder por seus atos, sem que haja uma justificativa a priori, de caráter geral, para seus atos particulares. (SOBRAL, 2005, p.104)
  • 12. “Responsibilidade”  O ato responsível ou ato ético, envolve o conteúdo do ato, o processo do ato, e unindo-os, a valoração/avaliação do agente com respeito ao seu próprio ato. Essa visão globalizante dos atos humanos é à base de sua filosofia humana do processo(...) (SOBRAL, 2005, p.104).
  • 13. Contra algumas teorias do agir  Os eventos de que sou agente trazem minha “assinatura”, não a de instâncias que estabelecem leis abstratas ou objetificantes, aquelas pretensamente acima da sociedade e da história e estas [últimas] marcadas pela transformação dos sujeitos em objetos.(SOBRAL, 2005,p.108).  Bakhtin é assim um filósofo da individualidade, mas seu “indivíduo” é constituído nas, e constitutivo das, relações com outros sujeitos. O eu é o outro do outro!
  • 14. O sensível e o inteligível  As propostas filosóficas do Círculo de Bakhtin permitem dizer que o mundo não chega à consciência sem mediação: o sensível é o plano de apreensão “intuitiva” do mundo sem elaboração teórica, o plano do dado, das “impressões totais” de que fala Schaff; e o inteligível é o plano da elaboração do apreendido; aquele privilegia o processo de percepção e de ação enquanto criador de impressões e este privilegia a transformação dessas impressões numa unidade de conteúdo, um conceito; portanto, o sensível é o plano da multiplicidade, da descontinuidade, e o inteligível, o da busca da unidade, da continuidade..
  • 15. Exotopia  A posição exotópica, equivalente a “estar num lugar fora”, é um “fora” relativo, uma posição de fronteira, posição móvel, que não transcende o mundo, mas o vê de certa distância a fim de transfigurá-lo na construção arquitetônica da obra, estética ou não. A posição exotópica é a posição a partir da qual é possível o trabalho estético, a ação de construir o objeto estético (...) (SOBRAL, 2005,p.109).
  • 16. Uma filosofia humana do processo  O agir do sujeito é um conhecer em vários planos que une processo (o agir no mundo, o ético), produto (a teorização) e valoração (o estético) nos termos de sua responsabilidade inalienável de sujeito humano, de sua falta de escapatória, de sua inevitável condição de ser lançado no mundo e ter ainda assim de dar contas de como nele agiu.( SOBRAL, 2005, p.18)
  • 17. A síntese bakhtiniana (1)  O momento [no sentido filosófico de “instância”] que o pensamento teórico discursivo (tanto nas ciências naturais como na filosofia), a descrição-exposição histórica e a intuição estética têm em comum, e que se reveste de particular importância para nossa investigação é: todas essas atividades estabelecem uma cisão fundamental entre o conteúdo ou sentido de um dado ato/atividade e a concretude histórica do ser desse ato/atividade, a experiência atual e uni-ocorrente dele. E é em conseqüência disso que o ato dado vê-se privado de seu valor, bem como da unidade de seu vir-a-ser e de sua autodeterminação atuais [grifos meus].
  • 18. A síntese bakhtiniana (2)  Ao defender uma versão da filosofia da práxis materialista dialética, que traz elementos kantianos e fenomenológicos, Bakhtin evita cuidadosamente cair no extremo oposto de certas tendências filosóficas, próximas do empirismo, em que a percepção seria tida como imediata, sem categorias que a organizem, e que a reduzem assim a seu aspecto particular. Logo, se não admite que a teoria apague a vida concreta, prática, Bakhtin também não admite que a prática concreta apague a teoria, o plano em que se pode generalizar sobre todos os atos
  • 19. Implicações metodológicas  (1) Entender o ideológico em sua ligação constitutiva com a materialidade concreta da linguagem, em vez de existir fora dele, de ser um conteúdo que a linguagem apenas veicularia ou de existir na consciência do sujeito entendida como instância desvinculada do social e do histórico.  (2) Entender as formas da língua como obtendo sentido, com base em sua significação, em sua associação intrínseca com as formas concretas com que se manifesta o sistema de comunicação social organizada, em vez de como um artefato físico que existe independentemente da interação.  (3) Entender a comunicação e suas formas em sua relação intrínseca com as bases materiais, ou seja, as situações concretas.
  • 20. Uma filosofia ética, estética e prática