O documento discute a Teoria Cognitiva de Mediação em Redes (TMC) e como ela pode explicar os impactos psicológicos da revolução digital. A TMC propõe que a cognição humana envolve o processamento de informações no cérebro e por meio da interação com estruturas externas. Estudos empíricos mostram correlações positivas entre o grau de imersão na "hipercultura digital" e o desempenho cognitivo e sociabilidade das pessoas.
1. COMPUTADORES EM
COMPORTAMENTO HUMANO
Colocando a Teoria Cognitiva de Mediação em Redes
à prova: avaliação de uma estrutura para atender a
era digital
SOUZA, B. C., et al. Putting the Cognitive Mediation Networks Theory to the test: Evaluation of
a framework for understanding the digital age. Computers in Human Behavior (2012), in press.
Access: http://dx.doi.org/10.1016/j.chb.2012.07.002
2. Introdução
• Revolução Digital: um conjunto de avanços na
tecnologia digital, telecomunicações e software, com
profundas implicações econômicas, sociais e culturais.
• Impactos psicológicos da revolução digital: há
muito pouco em termos de teorias gerais capazes de explicar
adequadamente a dinâmica e os mecanismos subjacentes a
tais fenômenos.
• Visões diferenciadas: Levy (desenvolvimento de uma
inteligência coletiva on-line); Carr (efeitos prejudiciais sobre a
cognição, diminuindo a capacidade de concentração e de
contemplação), etc.
3. O que é a TMC?
• É uma teoria contextualista, construtivista, que
aborda o processamento da informação da
inteligência humana.
• Visa proporcionar uma abordagem ampla para a
cognição, a partir de conceitos e pesquisas de
diversos autores e escolas de pensamento, como
Piaget, Vergnaud, Vygotsky, Chalmers e
Sternberg, assim como Darwin e a Teoria da
Evolução.
4. Objetivos da TMC
• fornecer uma síntese teórica coerente de
teorias psicológicas e estruturas que são
geralmente vistas como separadas, ou mesmo
em conflito umas com as outras, de modo a
produzir um modelo unificado.
• Aplicação: compreensão das mudanças
individuais e coletivas (socioculturais e
psicológicas) associadas à Revolução Digital.
5. Ponto de partida...
• o aparecimento de uma hipercultura que é
claramente distinguível do que tradicionalmente tem
sido chamado de cultura;
• a ocorrência de novas formas de pensar a ela
associada;
• a sua associação a ganhos mensuráveis no
desempenho cognitivo, todos independentes do
sexo, renda e nível de educação, têm sido
observados.
6. Princípios Básicos
• A espécie humana tem como maior vantagem evolutiva a
capacidade de gerar, armazenar, recuperar, manipular e
aplicar o conhecimento de várias maneiras;
• Cognição humana é efetivamente o resultado de algum tipo
de processamento de informação;
• Sozinho, o cérebro humano constitui-se num finito e, em
última instância, insatisfatório ao recurso de
processamento de informação;
• Praticamente qualquer sistema físico organizado é capaz de
executar operações lógicas em algum grau;
• Seres humanos complementam o processamento da
informação cerebral por interação com os sistemas físicos
externos organizados .
7. Combinando estes princípios...
• Imagem de cognição humana: os indivíduos se
desenvolvem e usam o conhecimento por meio do
processamento de informações feito por seus cérebros
e, sendo a capacidade de processamento de informações
limitada e insatisfatória, estes também se envolvem na
atividade cognitiva através da interação com as estruturas no
ambiente, que fornecem uma capacidade adicional de
processamento de informação.
8. Cognição Extra Cerebral: Mediação
• Objeto: O item físico, conceito abstrato, problema, situação, e/ou
relação a respeito da qual o indivíduo está tentando construir
conhecimento;
• Processamento interno: A atividade cerebral fisiológica
(sináptica, neural e endócrino) que executa as operações lógicas básicas
individuais;
• Mecanismos internos: estrutura mental que gerencia
algoritmos, códigos e dados que permitem a conexão, a interação e a
integração entre o processamento interno do cérebro e o processamento
extra cerebral feito pelas estruturas no ambiente, trabalhando tanto como
um “driver de hardware” quanto um “protocolo de rede”;
• Mecanismos externos: Podem ser de vários tipos e
capacidades, que vão desde simples objetos físicos (dedos, pedras), a
individuais e em grupo, com atividades sociais complexas, sistemas
simbólicos e ferramentas/artefatos.
9. Aspecto fundamental da TMC
MECANISMOS INTERNOS
• Tornam possíveis a utilização de estruturas externas, como
auxiliares de dispositivos de processamento de informações
(drivers);
• Trabalham como “máquinas virtuais” internas, que fornecem
novas funcionalidades cognitivas, acrescentando benefícios
que duram para além do tempo da “conexão” a um
mecanismo externo;
• Têm um papel importante na definição da forma como o
pensamento ocorre.
Seres humanos: representação mental do sistema físico (teoremas-em-ação = funcionamento dinâmico)
10. Papel das TIC na TMC
• Uma forma nova e melhorada da mediação
cognitiva.
Na revolução digital, estamos testemunhando o
surgimento de uma “hipercultura”, na qual os
mecanismos externos de mediação incluem a
própria tecnologia e seus impactos na
cultura, enquanto os mecanismos internos incluem
as competências necessárias para a utilização eficaz
dos mecanismos externos.
11. Impactos da interação com as TIC
• Domínio da utilização das TIC;
• Uso de analogias e metáforas ligadas às TIC;
• Pensamento Matemático-científico;
• Pensamento Transcontextual;
• Pensamento visuo-espacial;
• Ênfase na aquisição de habilidades para busca de
informação e conhecimento;
• Técnicas para lidar com grandes conjuntos de
conhecimentos e informações;
• Uso intenso de redes sociais e computação social.
12. Evidências da existência da TMC
• Existência de Hipercultura;
• Mudanças no padrão de desenvolvimento cognitivo;
• Desempenho cognitivo;
• Outros aspectos do funcionamento cognitivo;
• A TMC e o efeito Flynn;
13. A existência da hipercultura
• Quatro conjuntos de dados bastante grandes que
abrangem uma mistura de variáveis culturais
relacionadas com TIC, coletadas de crianças e
adultos, entre 1997 e 2003;
• Os resultados para os quatro conjuntos de dados
mostrou uma faceta claramente definida
relacionada com TIC que se diferencia do restante
das variáveis socioculturais.
• Isto é consistente dada a existência de uma
hipercultura que está emergindo da Revolução
Digital.
14. Mudanças no padrão de
desenvolvimento cognitivo
• teste de QI em 3700 estudantes de 11 a 19
anos em 1997, para analisar os escores brutos
relacionados com a idade do aluno (para
aqueles que tiveram contato com as
tecnologias digitais tecnologias e aqueles que
não tiveram);
• dois padrões diferentes para os grupos
analisados.
15. Desempenho cognitivo
• Pesquisa estratificada por sexo, idade, renda e tipo de
escola: ter um computador em casa foi associado a um
desempenho de 10-20% maior no ENEM em 2000
(amostra com 352.487 alunos);
• Pesquisa estratificada com 465 médicos em 2001: uso
de TIC gerou avaliação positiva do conhecimento dos
métodos de investigação;
• 1.219 adultos de classe média alta em 2003: uso de TIC
positivamente associada à auto-avaliações de
inteligência, conhecimento, criatividade geral;
16. Outros aspectos do funcionamento
cognitivo
• Imersão na hipercultura está positivamente associada ao uso de
metáforas com as TIC na linguagem cotidiana.
• Imersão na hipercultura está positivamente associada a uma
preferência por representações visuais/mentais.
• Indivíduos mais jovens tendem a ser significativamente mais
hiperculturais que os mais velhos (40 anos ou mais em 1990).
• Os indivíduos mais jovens são mais propensos a representações
visuais/mentais e metáforas com as TIC do que os mais velhos.
• A intensidade de uso de softwares gráficos, textuais, ou de
matemática está positivamente associada à auto-
avaliações, respectivamente, à capacidade visual, verbal e
numérica.
• Imersão na hipercultura está positivamente associada a auto-
avaliações de habilidade social, bem como para a frequência de
interações sociais e lazer noturno.
17. A TMC e o efeito Flynn
O Efeito Flynn é o aumento bastante grande nos escores brutos
dos testes de QI ao longo de várias décadas ou mesmo um
século inteiro em vários países do mundo.
A TMC coexiste com as observações do efeito Flynn, pois:
• Prevê um aumento global robusto da capacidade cognitiva, incluindo o que influencia o
desempenho em testes de QI (resultados acadêmicos, exames de conhecimentos
científicos, publicação de artigos científicos, auto-avaliações da capacidade
mental, índices de sociabilidade, e muito mais);
• Depende basicamente do uso disseminado da tecnologia e suas implicações
socioculturais (hipercultura) como a principal explicação para as melhorias cognitivas;
• Conta para um “efeito teto” como a hipercultura dissemina, ao ponto de saturação em
vários países.
18. Objetivos do estudo
Testar as expectativas fundamentais decorrentes da TMC
sobre os impactos do surgimento da hipercultura nos
modos de pensar e agir do indivíduo.
• É possível medir consistentemente o grau em que um indivíduo
internalizou formas hiperculturais de mediação em seus modos de pensar
e agir?
• No nível individual, a hipercultura será positivamente associada ao nível
de seu desempenho cognitivo e grau de
sociabilidade, independentemente do sexo, idade, escolaridade ou renda?
• Hipercultura desenvolve-se gradualmente, como uma função da duração
da experiência hipercultural, sendo mais intensa quanto menor a idade na
qual tais experiências começam a ocorrer?
19. O Método
• Amostra: 1291 indivíduos de ambos os sexos, com idades
variadas, nível de educação, a partir de 46 municípios do
Estado de Pernambuco, Brasil;
• Instrumentos: questionário com questões relativas às
características sócio demográficas, teste de conhecimentos
multidisciplinar, teste de QI;
20. O Método
Desempenho cognitivo
• Os cinco itens do teste de QI e os 10 itens do teste de
conhecimento foram combinados para formar um
escore único de 15 itens do desempenho cognitivo.
21. O Método
Índice de Sociabilidade
• As três variáveis do formulário de pesquisa abordam
capacidades sociais (habilidades de
liderança, capacidade de fazer amigos, capacidade de
influenciar os outros), todos medidos em uma escala
de Likert de 0-4.
22. O Método
• Índice de hardware: O uso de computadores desktop ou portáteis, em casa, no
trabalho ou em outro lugar, seja sozinho ou compartilhado com outros, como uma
soma de um total de seis perguntas em uma escala de Likert de 0-2;
• Índice de Acesso: o acesso à Internet em casa, no trabalho ou em outro lugar, ou
por meio de um telefone celular, como uma soma de 08 variáveis;
• Índice de Smartphone: o uso de smartphones em casa, no trabalho ou em outro
lugar, seja sozinho ou compartilhado com outros, em uma escala de Likert 0-2;
• Índice de Software: O uso de editores de texto, planilhas, editores de
apresentação, desenho/imagem programas, sistemas corporativos, jogos
simples, jogos complexos, e outros tipos de software, como uma soma de oito
variáveis dicotômicas;
• Índice de Internet: Engajamento no uso de tecnologias de Internet, especialmente
de e-mail, ferramentas de busca, edição de web, blogs, chat online, jogos
online, redes sociais, e downloads, como uma soma de 12 variáveis dicotômicas;
• Índice de analogias: Frequência com que um indivíduo detecta semelhanças
lógicas entre TIC e sistemas da vida real de outra natureza, bem como o uso de
metáforas com as TIC na conversação diária, como uma soma de duas
variáveis medidas em uma escala de Likert de 1-5.
ÍndiceHipercultural
23. Resultados
• Houve uma correlação estatisticamente significativa
entre o Índice Hipercultural e o escore de desempenho
cognitivo;
• A relação entre o Índice Hipercultural e desempenho
cognitivo, bem como entre o Índice Hipercultural e o
Índice de sociabilidade, pode ser considerado como
independente do sexo, idade, renda e educação;
• Há picos de indexação Hipercultural em cerca de 7-10
anos de experiência com computadores;
24. Resultados
• O índice Hipercultural continuamente cai com o
aumento da idade em que a interação com os
computadores começou;
• Os resultados indicam que as correlações entre o
Índice Hipercultural e desempenho
cognitivo, assim como aquelas entre o Índice
Hipercultural e o Índice sociabilidade, tendem a
aumentar de acordo com a quantidade de
experiência com TIC.
25. Conclusões
• De um ponto de vista teórico, a TMC está em total acordo
com a explicação do efeito Flynn, isto é, o “estímulo
ambiental” produzido pelo aumento da utilização de
tecnologia mais sofisticada, demandando um trabalho
intelectualmente mais exigente, e uma cultura geral que
favorece o uso de conceitos abstratos.
• A TMC também explica o papel fundamental de
interatividade em espaços de conhecimento e
“cosmopedias” que é apontado por Lévy;
• A TMC também explica os impactos da contínua tecnologia
mediada entre indivíduos e cultura proposto por Van Dijck;
26. Conclusões
• A TMC é uma síntese dos princípios básicos de três
grandes teorias em psicologia cognitiva (Epistemologia
Genética de Piaget, Teoria dos Campos Conceituais de
Vergnaud, e Construtivismo Social de Vygotsky)
integrados em um modelo coerente;
• Quando aplicado ao entendimento dos impactos da
Revolução Digital, esta teoria produz explicações e
expectativas que são semelhantes a algumas das
teorizações mais importantes sobre o assunto.
27. Conclusões
• Ao observar uma amostra bastante grande e variada de
adultos e adolescentes brasileiros, os resultados
obtidos, podem ser interpretados como um apoio
razoavelmente forte para as conclusões;
• Em conjunto com os resultados de investigações anteriores
sobre a TMC, este constitui um conjunto bastante robusto
de provas em favor da teoria.
• A TMC surge neste trabalho como um quadro que parece
teoricamente sólido e de acordo com as
observações, constituindo um modelo válido de cognição
humana, pelo menos quando aplicado aos impactos da
Revolução Digital.