1. O documento apresenta uma introdução sobre o dinamismo do setor varejista no Brasil e o aumento das fusões e aquisições.
2. O objetivo geral é analisar os diversos modelos de gestão de pessoas que podem coexistir em empresas após mudanças organizacionais causadas por fusões e aquisições.
3. A fundamentação teórica aborda modelos de gestão de pessoas, mudanças organizacionais, cultura organizacional e processos de fusão e aquisição.
Modelos de Gestão de Pessoas em ambiente de fusões e aquisições
1. Trabalho de Conclusão de Curso
Pós-graduação lato sensu MBA RH - Turma 29
Modelos de gestão de pessoas em
ambiente de fusões e aquisições
Anderson Rafael Brugnera
Orientadora: Profa. Dra. Natacha Bertoia da Silva
São Paulo – Agosto/2012
3. AGRADECIMENTOS
Um projeto de pesquisa demanda esforço extra para conseguirmos equilibrar
os diversos papéis que exercemos na vida. Por isso, não posso deixar de agradecer
à minha esposa e aos meus pais pela compreensão e apoio durante o tempo em
que me dediquei ao trabalho.
Agradeço aos executivos entrevistados que tanto contribuíram para o estudo,
e à minha orientadora, que colaborou valiosamente para o estudo ter qualidade
acadêmica e sentido prático para as empresas e a carreira de profissionais de
Recursos Humanos.
Aos colegas da turma 29 de MBA Recursos Humanos da FIA, meu muito
obrigado pelo aprendizado e amizades construídas.
4. RESUMO
O objetivo geral deste estudo foi analisar os diversos modelos de gestão de
pessoas que coexistiriam nas empresas após as mudanças organizacionais
provocadas por iniciativas de fusões e aquisições. Por meio de entrevistas com
dirigentes de Recursos Humanos, foi possível analisar as principais oportunidades
na forma em que a empresa composta por diversas unidades de negócio se
organiza para gerenciar e orientar o comportamento humano no trabalho. O estudo
mostra que, apesar de haver na organização um conjunto de diretrizes estratégicas
compartilhadas entre todos os negócios, os papéis exercidos pelas equipes de
gestão de pessoas variam consideravelmente quando se comparam duas unidades
de negócio. Como o estágio de desenvolvimento e a cultura dos negócios
decorrentes de fusões e aquisições são distintos, os modelos de gestão de pessoas
dão respostas diferentes às exigências dos negócios, com tratativas distintas para as
diretrizes de grupo.
Palavras-chave: Modelos de gestão de pessoas, mudança organizacional, cultura
organizacional, fusões e aquisições.
5. ABSTRACT
The aim of this study was to analyze the different people management models that
can coexist in companies after organizational changes mainly caused by mergers
and acquisitions. Through interviews with human resources leaders, it was possible
to analyze the main opportunities in the way a company, composed of several
business units, manages and guides human behavior at work. The study shows that,
even when the organization has a set of strategic guidelines shared among all
business units, the roles played by the HR teams vary considerably when a business
unit is compared to another. As businesses stage of development and culture are
different, people management models give different answers to business needs,
dealing differently with the group HR guidelines.
Keywords: People management models, organizational change, organizational
culture, mergers and acquisitions.
6. LISTA DE QUADROS
Quadro
1
-‐
Dificuldades
no
gerenciamento
da
cultura
.......................................................
32
Quadro
2
-‐
Referências
conceituais
para
as
possíveis
combinações
estratégicas
entre
as
empresas
..........................................................................................................................
34
Quadro
3
-‐
Definições
de
políticas
de
gestão
de
pessoas
...................................................
49
Quadro
4
-‐
Definições
de
políticas
x
autonomia
das
unidades
de
negócios
........................
50
Quadro
5
-‐
Gestão
sobre
os
processos
de
gestão
de
pessoas
.............................................
51
Quadro
6
-‐
Responsabilização
dos
negócios
......................................................................
52
Quadro
7
-‐
Predominância
dos
modelos
de
gestão
de
pessoas
e
papéis
de
recursos
humanos
..........................................................................................................................
55
7. SUMÁRIO
1
INTRODUÇÃO
..............................................................................................................
6
2
FUNDAMENTAÇÃO
TEÓRICA
.......................................................................................
8
2.1
Modelos
de
gestão
de
pessoas
e
papéis
de
recursos
humanos
........................................
8
2.1.1
Papéis
de
recursos
humanos
...........................................................................................
11
2.2
Mudanças
organizacionais
............................................................................................
14
2.2.1
Tipos
de
mudanças
organizacionais
................................................................................
16
2.2.2
Modelos
de
gestão
de
mudanças
....................................................................................
18
2.3
Cultura
organizacional
...................................................................................................
23
2.4
Fusões
e
aquisições
.......................................................................................................
32
3
METODOLOGIA
.........................................................................................................
38
4
ANÁLISE
DOS
RESULTADOS
.......................................................................................
41
4.1
Caracterização
do
Grupo
G
e
suas
unidades
de
negócio
.................................................
41
4.2
Percepção
sobre
princípios
de
gestão
de
pessoas
..........................................................
42
4.3
Análise
das
políticas
e
processos
de
gestão
de
pessoas
.................................................
48
4.4
Características
predominantes
nos
modelos
e
papéis
exercidos
pelos
profissionais
de
recursos
humanos
.....................................................................................................................
52
5
CONSIDERAÇÕES
FINAIS
............................................................................................
56
REFERÊNCIAS
....................................................................................................................
58
Apêndice
A
–
Roteiro
de
entrevista
semiestruturada
.................................................................
62
Apêndice
B
–
Formulário
Complementar
à
Entrevista
................................................................
62
8.
9. 6
1 INTRODUÇÃO
A primeira década do século XXI mostrou que o aumento do poder aquisitivo
da população e, por conseguinte, o aumento do consumo nacional, favoreceram o
crescimento exponencial do setor varejista e impulsionaram a criação de oligopólios
e de incorporações.
De acordo com Pires (2012), o acelerado processo de mudança vivenciado
pelo segmento de varejo no Brasil implica oportunidades “às empresas e grupos que
se movimentarem rapidamente e que estão preparados para as especificidades” do
mercado brasileiro. “Estima-se que 35 milhões de pessoas vão ascender à classe
média brasileira até 2014, somando-se aos 32 milhões que já se enquadraram a
esse grupo social na última década”.
Os novos consumidores tendem a fortalecer ainda mais o dinamismo das
empresas relacionadas ao mercado de consumo, pois as empresas, como forma de
atrair e manter o número crescente de consumidores, passam a investir em novos
formatos de negócios, novas bandeiras, serviços diferenciados, fusões e aquisições
(PEDROZO, 2008).
Segundo a empresa KPMG, que desde 1994 publica indicadores de fusões e
aquisições, no ano de 2011 foram efetuadas 817 transações, representando
crescimento de 12,5% em relação a 2010, o recorde anterior. “Com 817 operações
de fusões e aquisições que envolveram [...] empresas brasileiras [...], o recorde
anual anterior [...] foi batido em 91 transações” (KPMG, 2012).
O dinamismo do setor e o ritmo acelerado de fusões e aquisições forçam as
maiores empresas a se reinventarem constantemente e a repensar seu modelo de
gestão e estruturas organizacionais.
As revisões constantes impactam na vida dos empregados do setor, mudando
comportamentos, formas de trabalho e relações entre a empresa e colaboradores.
De acordo com Thomson (1999), em processos de fusões, aquisições e
parcerias, enquanto se olha para a parte financeira do acordo, é igualmente
10. 7
importante examinar a forma como cada organização trabalha. Muito além da
habilidade de remover custos eliminando duplicações, a tão esperada sinergia
deveria estar centrada na produção e desenvolvimento de capacidades que talvez
nunca se desenvolvessem sozinhas (sem fusões, aquisições e parcerias).
O objetivo geral deste estudo é analisar os diversos modelos de gestão de
pessoas que coexistiriam nas empresas após as mudanças organizacionais
provocadas por iniciativas recentes de novos negócios e reestruturações. Em outras
palavras, propõe-se analisar as principais oportunidades na forma em que “uma
empresa se organiza para gerenciar e orientar o comportamento humano no
trabalho” diante de tais processos de mudança (Fischer, 2002, p. 12).
Os diversos negócios de um mesmo grupo se organizam de maneiras
diferentes, e a relação de áreas corporativas com os distintos negócios torna-se
mais complexa cada vez que há novas incorporações. A estrutura societária e as
decisões de governança dos negócios afetam o estilo de gestão dos líderes e a
forma como o comportamento humano no trabalho é gerenciado pelas áreas de
gestão de pessoas, com a existência de regras, processos e, principalmente,
pessoas diferentes.
Este trabalho não propõe um guia de melhores modelos de gestão de
pessoas em ambiente dinâmico de fusões e aquisições, mas evidencia a
possibilidade e talvez a necessidade de haver modelos diversos convivendo dentro
de um mesmo grupo, apesar de existir uma corporação que na figura de
“controladora” dos negócios centraliza estratégias, políticas, práticas ou processos
de gestão de pessoas na organização.
11. 8
2 FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA
Para a análise de um cenário no qual modelos de gestão de pessoas se
transformam ou são criados em meio a mudanças organizacionais, fusões e
aquisições, fundamenta-se este estudo com literaturas que tratam de:
§ definições e características dos modelos de gestão de pessoas e
papéis de recursos humanos;
§ mudanças organizacionais, características e modelos;
§ cultura organizacional;
§ processos de fusão e aquisição.
2.1 Modelos de gestão de pessoas e papéis de recursos humanos
De acordo com Fischer (2002, p. 12), define-se um modelo de gestão de
pessoas como “a maneira pela qual uma empresa se organiza para gerenciar e
orientar o comportamento humano no trabalho”. Toda organização interfere nas
relações organizacionais de formas diferentes e com intensidades distintas, sendo
que a exigência de busca de padrão de desempenho e comportamento no trabalho
se intensifica à medida que os negócios se sofisticam. Expansão dos negócios,
mudanças no mercado e escolhas de novas tecnologias criam a cada movimento
maior dependência de um padrão de comportamento coerente que diferencia a
empresa em seu mercado.
De acordo com Gil (1994), a administração de recursos humanos é um olhar
da administração de pessoal a partir de abordagem sistêmica, na qual as
organizações são vistas como sistemas dentro de sistemas. Uma empresa seria
vista como um sistema envolvido por um macrossistema, que é o sistema
social. Dentro desse sistema estariam presentes diversos microssistemas, entre eles
o de recursos humanos, que ainda seria visto como um conjunto de sistemas
12. 9
menores, como o de seleção, desenvolvimento, manutenção de pessoal etc. A
determinação dos sistemas é arbitrária e as fronteiras que se estabelecem entre eles
apresentam sempre alguma permeabilidade, fazendo com que elementos de um
sistema sejam classificados como integrantes de outro.
Fischer (2002) defende que a maior ou menor formalização desses elementos
de gestão de pessoas na empresa, relacionados aos sistemas mencionados por Gil
(1994), dependem da maior ou menor consciência que a própria empresa tem da
importância de agir organizadamente sobre o comportamento humano aplicado ao
trabalho.
É importante destacar que, para Fischer (2002), a administração de recursos
humanos, termo utilizado no trabalho de Gil (1994), “é resultado do desenvolvimento
empresarial e da evolução da teoria organizacional nos Estados Unidos”, que
buscou suplantar a visão de departamento pessoal. Seria, dentro das grandes
correntes de gestão de pessoas, a primeira vertente histórica de modelo de gestão
de pessoas, tendo como conceitos articuladores produtividade, recompensa e
eficiência de custos com o trabalho.
Para Fischer (2002, p. 32), ao empregar o termo modelo:
busca-se ampliar o âmbito das ações de Recursos Humanos dando-lhes
nova dimensão e abrangência. [...] Isso leva a considerar não somente a
estrutura, os instrumentos e as práticas normatizadas como elementos
componentes do modelo, mas também tudo aquilo que interfere
significativamente nas relações entre os indivíduos e a organização.
Nessa ótica, o trabalho de Fischer (2002) categoriza quatro grandes correntes
de gestão de pessoas: modelo de gestão de pessoas articulado como departamento
pessoal, como gestão do comportamento humano, como gestão estratégica e,
finalmente, modelo de gestão de pessoas articulado por competências como
vantagem competitiva. Embora as quatro categorias sejam correspondentes a
diferentes períodos históricos e tenham conceitos articuladores específicos, é
possível observar na composição dos modelos elementos formais menos abstratos
que seriam avaliados nos modelos, independentemente de períodos e conceitos
articuladores.
13. 10
Ainda que os modelos sejam compostos por tudo que interfere de alguma
maneira nas relações organizacionais, Fischer define como componentes formais de
um modelo de gestão de pessoas:
1. Princípios de gestão: compostos basicamente pelos valores
definidos para a organização e pelas diretrizes estratégicas de
gestão de pessoas.
2. Políticas: diretrizes de atuação centradas nos objetivos de médio e
longo prazo relacionados às pessoas.
3. Processos: cursos de ação previamente determinados e orientados
pelas políticas, visando alcançar os objetivos traçados sem
ultrapassar os limites dos princípios de gestão. Como exemplos,
planos de cargos e salários, planos de capacitação e de sucessão,
administração de carreiras e avaliações de desempenho e
performance.
No que diz respeito às categorias mencionadas por Fischer (2002), resumem-
se os modelos de gestão de pessoas por meio das seguintes características
principais:
1. Modelo de gestão de pessoas como departamento pessoal:
centrado basicamente na produtividade, recompensa e eficiência de
custos com o trabalho.
2. Modelo de gestão de pessoas como gestão do comportamento
humano: modelo baseado na psicologia como ciência capaz de
apoiar a compreensão e a intervenção na vida organizacional, por
meio de treinamentos gerenciais, processos de avaliação de
desempenho e estímulo ao desenvolvimento de perfis gerenciais
coerentes com o processo desejado de gestão de pessoas. Esse
modelo representa olhar mais direcionado à concretização dos
interesses da empresa, percebendo além da efetividade econômica
(maximização de lucros ou redução de custos), efetividade técnica
(manutenção dos padrões de qualidade requeridos) e a efetividade
comportamental (busca da motivação e satisfação dos
funcionários).
14. 11
3. Modelo estratégico de gestão de pessoas: introduz a exigência de
vincular a gestão de pessoas às estratégias da organização,
quando se percebe que a motivação genérica nada significaria para
as diretrizes estratégicas da empresa. A busca de orientação
estratégica para as políticas e práticas de RH implicou a
intensificação dos esforços de adaptação do modelo às reais
exigências da organização.
4. Modelo de gestão de pessoas articulado por competências:
qualificado como modelo competitivo por privilegiar e se articular
em torno das competências dos funcionários e por ser condizente
com o ambiente de competitividade que caracteriza as
organizações. De acordo com Fischer (2002), a empresa para ser
competitiva precisa criar um novo espaço competitivo e não
simplesmente posicionar-se melhor no espaço competitivo atual,
por isso o modelo de gestão de pessoas deve desenvolver e
estimular as competências humanas essenciais para as
competências organizacionais da empresa se viabilizarem, gerando
maior competitividade.
2.1.1 Papéis de recursos humanos
Como Fischer (2002), Ulrich (1997) discorre sobre a evolução dos modelos de
gestão de pessoas e principalmente sobre a imprescindibilidade de modelos
direcionados à competitividade empresarial para lidar com os desafios do mercado
em constante transformação, objeto principal deste estudo.
De acordo com Ulrich (1997), a criação de empresas que adicionam valor a
seus investidores, clientes e funcionários no cenário competitivo depende do RH e
principalmente do papel exercido pelos profissionais. Ulrich acredita que a
capacidade do líder de recursos humanos em contribuir com o sucesso da
organização seria potencializada por meio de seis princípios.
O primeiro princípio se baseia no alinhamento da estratégia de recursos
humanos à estratégia da organização. Nada contribui com maior intensidade para a
15. 12
credibilidade da área do que fixar-se no que é importante, com interesse genuíno no
negócio.
O segundo princípio diz que a gestão de Recursos Humanos não é realizada
por meio de programas, mas de relacionamentos. O papel primário da área é criar
um ambiente que implique o comprometimento dos funcionários com o sucesso da
organização. Engajar os colaboradores nos processos de mudança, dando-lhes voz
na construção do futuro, demonstra que as pessoas suportam o que ajudaram a
construir.
A importância do papel de recursos humanos na construção de
relacionamentos é enfatizada por Silva e Vergara (2003, p. 11) no estudo
“Sentimentos, subjetividade e supostas resistências à mudança organizacional”:
[...] A mudança organizacional, mesmo quando intencional, não pode assim
ser entendida somente sob a ótica de estratégias, processos ou tecnologias,
ainda que, em alguns casos, até mesmo a tradição funcionalista que tem
dominado os textos sobre gestão de mudanças reconheça a dimensão
social como uma variável determinante das possibilidades de sucesso das
organizações. É preciso que se veja a mudança organizacional também
como uma mudança de relações: do indivíduo com a organização, dele com
seus pares, da organização com a sociedade, do indivíduo com a sociedade
e dele consigo mesmo.
Ulrich (1997) elenca como terceiro princípio que a área de Recursos
Humanos deve ser conhecida como organização que antecipa a mudança e
compreende as exigências de implementação. O RH deve entender o processo de
mudança e atuar com proximidade aos agentes da mesma, auxiliando-os a
compreender que envolver as pessoas nas transformações energiza o processo e
enfatiza os resultados.
O quarto princípio relata a importância do RH como representante dos
interesses dos funcionários, entendendo que as decisões empresariais devem
equilibrar uma série de fatos, por vezes conflitantes. A consultoria dada pelo RH
nesse momento deve ser atenciosa, objetiva e realista, para primar pelas melhores
conclusões. O objetivo da área não é vencer os argumentos, mas garantir que os
problemas recebam a atenção que merecem.
O autor descreve o quinto princípio dizendo que a efetividade da área de
Recursos Humanos depende de ficar centralizado nas questões e não nas
16. 13
personalidades. Evita-se o sentimento rígido quando o principal é a questão e não o
indivíduo. Logo, independentemente de como se sente, argumentar por meio dos
fatos é mais representativo.
O sexto princípio relata que a área de Recursos Humanos deve aceitar que a
constante aprendizagem e o desenvolvimento das habilidades são essenciais para
ela ser um contribuinte para o negócio. As mudanças constantes fazem com que os
conhecimentos se tornem obsoletos na mesma velocidade. Atualmente, o
profissional de RH precisa, além da perícia funcional, conhecer o negócio, entender
de finanças, ter habilidades de consultoria e habilidades interpessoais.
Ulrich (1997) descreve o quanto é importante aos profissionais de Recursos
Humanos fixarem-se no longo prazo (dimensão estratégica) e no curto prazo
(dimensão operacional), e dedicarem-se à gestão de processos e à gestão de
pessoas. Ao organizar o objetivo principal (curto e longo prazo) e atividades dos
profissionais (direcionadas aos processos e pessoas) em dois eixos, descrevem-se
os quatro papéis de Recursos Humanos essenciais para a construção de uma
organização competitiva.
O papel da gestão estratégica de Recursos Humanos se relaciona, de acordo
com Ulrich (1997), com o direcionamento a longo prazo, com visão mais relacionada
a processos do que a pessoas. Nesse papel, os esforços profissionais concentram-
se no alinhamento das ações de Recursos Humanos à estratégia do negócio, de
maneira a apresentar diagnósticos e ações que possibilitem a proximidade da área
de Recursos Humanos às tomadas de decisão do negócio.
Um segundo papel seria a manutenção de olhar ainda mais intenso por
processos, porém no curto prazo, o que leva ao papel da gestão da infraestrutura
organizacional, ou papel de eficiência administrativa. Nesse caso, o profissional de
Recursos Humanos estaria fixado na construção de infraestrutura eficiente e na
prestação de serviços transacionais de qualidade. Um bom exemplo está na análise
da atuação de Recursos Humanos em centros de serviços compartilhados.
Se o profissional de RH empenha sua função mais direcionada à gestão das
pessoas e não dos processos, emergem um terceiro e um quarto papéis
17. 14
desempenhados por esses profissionais. Se no curto prazo, com viés maior para
pessoas, o papel de gestor da contribuição dos empregados, como seu agente
defensor, apresenta características relacionadas à atitude de responder às
exigências dos funcionários, provendo-lhes mais recursos. Em contrapartida, centrar
no longo prazo com o mesmo viés para as pessoas (e menos para os processos)
define o papel de agente de transformação e de mudança, quando o profissional
garante para a organização capacidades indispensáveis à mudança organizacional
desejada.
Ainda de acordo com Ulrich (1997, p. 152), profissionais de Recursos
Humanos que atuam como agentes de mudança:
certificam que as iniciativas sejam definidas, desenvolvidas e entregues em
tempo hábil; que processos sejam finalizados, iniciados e simplificados; e
que valores fundamentais dentro da organização sejam discutidos e
adaptados apropriadamente às condições dos negócios em mudança.
Embora Ulrich (1998) defenda que o papel da transformação e da mudança
organizacional seja elemento-chave à essência do profissional de Recursos
Humanos, o estudo de Mendonça Júnior et al. (2010) conclui que poucos
profissionais foram além dos papéis de eficiência administrativa e de gestor da
contribuição dos empregados nas organizações, ainda que o envolvimento de
Recursos Humanos nas mudanças organizacionais seja extremamente relevante e
essencial à realidade das organizações contemporâneas.
De acordo com Leo (1999), a exemplo da Ford, a bagagem de
desenvolvimento organizacional ainda é vista como algo secundário nos imperativos
empresariais, o que dificulta a atuação da área de Recursos Humanos em grandes
processos de aprendizagem e transformação organizacional.
2.2 Mudanças organizacionais
Mudança organizacional, segundo Fischer (1998, p. 44), “consiste em todo o
movimento de transformação de processos, sistemas e estruturas promovido por
grupos e indivíduos de uma empresa, capaz de promover alterações substanciais no
padrão de competitividade [dela]”. De acordo com Guimarães e Borges (2007), as
18. 15
mudanças provocadas nas empresas para sobreviverem e se manterem
competitivas, impactam de maneira significativa os processos de gestão.
Bilhim (1995) afirma que uma mudança organizacional ocorre quando há
desequilíbrios ou os resultados são menores que os esperados, estudo
complementado pelo trabalho de Wood Jr. (2009). O autor afirma que geralmente os
processos de mudanças respondem à exigência de transformar e resolver questões
de natureza estrutural, de recursos humanos, tecnologia ou natureza ambiental.
Fischer (1998) e Guimarães e Borges (2007) remetem ao campo da
competitividade como fenômeno provocador da mudança organizacional, o que
permite avaliar as mudanças organizacionais como processo que se inicia na
tomada de decisão sobre os modelos de negócios e sobre as decisões estratégicas
do negócio, e que acarretam necessidades de transformação.
Segundo Wood Jr. (2009), a mudança organizacional se dá porque
consumidores se tornam mais exigentes e criteriosos, e o número de competidores
aumenta em grande velocidade, fazendo com que as empresas tenham que se
adaptar ao que o mercado exige.
Na maioria das vezes, a mudança ocorre apenas quando as organizações
estão em crise, sendo muito pequeno o número de organizações que se dispõe à
mudança como atitude proativa (WOOD JR, 2009).
Por diversas vezes, revisões no modelo de gestão das empresas e nas
estruturas organizacionais tiram o olhar principal da transformação, que deveria ser
manutenção ou aprimoramento da competitividade dos negócios. De acordo com
Blenko, Mankins e Rogers (2010, p. 40), um estudo da Bain & Company de “57
reorganizações ocorridas entre 2000 e 2006 revelou que menos de um terço
produziu qualquer avanço significativo no desempenho das empresas”.
Blenko et al (2010, p. 40) afirmam que “a estrutura de uma empresa só irá
produzir um melhor desempenho se [...] aumentar a capacidade da organização de
tomar decisões importantes de forma melhor e mais rápida do que as concorrentes”,
defendendo um modelo de reorganização organizacional com base na hierarquia de
decisões. Sob essa ótica, o valor das empresas passa a estar diretamente
19. 16
relacionado à “soma das decisões que toma e executa”, e seus recursos de nada
servem se não tomarem decisões essenciais à manutenção ou aprimoramento da
competitividade do negócio.
Ulrich (1998, p. 38) defende ser indispensável a agilidade na tomada de
decisões, afirmando que “uma diferença primária entre ganhadores e perdedores
não está no ritmo da mudança, mas na habilidade de responder ao ritmo da
mudança”. Assim, “o alcance necessário de respostas à mudança de uma empresa
deve expandir-se à medida que o ritmo das mudanças externas à empresa cresce”.
De acordo com Wood Jr. (2009, p. 7),
[...] a mudança organizacional deve ser encarada como um processo e
caracterizada pelo princípio de melhoria contínua. [...] Mudanças são
necessariamente acompanhadas por quebras de paradigmas e [pela]
necessidade de que isto ocorra para que a inércia organizacional seja
vencida e dê lugar a novos padrões.
Ou seja, independentemente do ritmo de resposta à mudança frente às
necessidades competitivas da organização, como defendido por Ulrich (1998), Wood
Jr. (2009) enfatiza ser imperioso centrar-se constantemente nas iniciativas de
mudança, como busca permanente pelo novo e pela transformação.
2.2.1 Tipos de mudanças organizacionais
De acordo com Bilhim (1995), a mudança organizacional seria feita de duas
maneiras: mudança incremental ou mudança revolucionária.
A mudança incremental consiste na ideia de mudança episódica ou evolutiva.
Segundo o autor, para esse tipo de mudança ocorrer é preciso haver uma meta
desejável e um conjunto específico de etapas indispensáveis a serem atingidas
(BILHIM, 1995).
Esse perfil de mudança limita-se a uma finalidade e, na maioria das vezes, é
reversível caso a mudança implementada não atinja os resultados esperados,
possibilitando inclusive que o modelo organizacional antigo seja retomado. Ressalta-
se que no processo de mudança a forma de atuação passada não é dispensada e
20. 17
trocada por uma nova, ou seja, há continuação e prolongamento das ideias
anteriores implementadas na organização.
Bilhim (1995) destaca que no procedimento de mudança incremental, o
dirigente detém o controle sobre a mudança, pois o futuro, normalmente, é bastante
suscetível a previsões.
Os estudos de Bilhim (1995) afirmam que para a mudança incremental
acontecer é importante a existência de algumas categorias que respondam às
perguntas: mudar o quê? e mudar como?. Além disso, Bilhim define como
fundamental e imprescindível a exigência de manter e integrar três elementos para a
efetivação da mudança: contextos interno e externo, conteúdo e processo.
No que diz respeito à mudança revolucionária, de acordo com Bilhim (1995), o
rompimento com padrões anteriores é imprescindível. As mudanças visam ao total
“redesenho” que levaria ao reposicionamento do negócio da organização.
Os autores Costa, Vieira e Rodrigues (2010) caracterizam o processo de
mudança organizacional em aspectos diversos. São eles: cultura, produtos e
serviços, reengenharia, estrutura, tarefa, tecnologia e comportamento.
No que se refere ao aspecto cultural, Costa, Vieira e Rodrigues (2010, p. 9)
afirmam que
a mudança de cultura é um processo lento e difícil, obra mais de líderes do
que de gestores. Isso porque implica a substituição de pressupostos básicos
que determinam as normas, os valores e as crenças organizacionais, e
atingem as formas de pensar, sentir e agir [...]
Acerca da mudança de produtos ou serviços, os autores citam dois tipos de
vantagens, afirmando que mudanças do gênero tornam as empresas mais
competitivas no mercado. A primeira vantagem é que a mudança implicaria custos
mais baixos, e a segunda é a possibilidade de diferenciação, relacionada a
assegurar certo benefício ao consumidor, que passa a estar disposto a pagar
excedente por isso, permitindo a elevação da margem comercial, e por sua vez, a
maximização de valor do negócio.
21. 18
Quando o assunto é a reengenharia organizacional, Costa, Vieira e Rodrigues
(2010, p. 9) asseguram:
A reengenharia consiste no repensar fundamental e no reformular
radical dos processos de negócios, de forma a alcançarem-se
progressos dramáticos nos níveis de desempenho, nos custos, na
qualidade, no serviço e na rapidez.
Sobre o aspecto estrutura, os autores Costa, Vieira e Rodrigues (2010)
indicam esse tipo de mudança como alternativa rápida à promoção de mudanças:
Reorganizar implica conceber de novo a estrutura da organização –
uma mudança nos departamentos, na coordenação, nos níveis de
controle ou nos centros de decisão. A reorganização é um método,
relativamente direto e rápido, para operar mudanças na organização
e é uma técnica largamente usada e muitas vezes eficaz.
Da mesma maneira, os autores abordam a redefinição de tarefas como
alternativa ao processo de mudança, mas relatam que a introdução de novos
sistemas tecnológicos é um dos mais difíceis desafios a se enfrentar em processos
de mudança organizacional.
Os autores Costa, Vieira e Rodrigues (2010) ainda afirmam que para a
mudança de comportamento a abordagem deve ser sistêmica e de caráter positivo,
ou seja, com enfoque abrangente, alicerçada na busca de benefícios aos
colaboradores. Com isso, torna-se possível a construção de nova realidade social,
por meio inclusive das percepções dos colaboradores.
2.2.2 Modelos de gestão de mudanças
A literatura existente que trata de transformações organizacionais sob o
prisma dos processos planejados de mudança, segundo Silva e Vergara (2003,
p.10), procura “fornecer respostas sobre como fazer com que a organização tenha
sucesso na estratégia de mudança intencional ao promover a coesão de esforços e
vencer as supostas resistências humanas”.
Pettigrew (1989, p. 146) reforça:
a pesquisa teoricamente correta e praticamente útil sobre a tomada de
decisão e mudança estratégica deve desenvolver a interação contínua entre
ideias a respeito do contexto da mudança, do processo de mudança e do
22. 19
conteúdo da mudança, juntamente com a habilidade de regular as relações
entre os três.
Nesse cenário, Fischer (2002) propõe a adoção de um modelo de gestão de
mudança por meio de abordagem contextualista, a mesma citada por Pettigrew
(1989). O modelo de gestão de mudança na visão de Fischer (2002) é composto por
quatro etapas interdependentes: auscultação, concepção, disseminação/adesão e
sustentação.
A etapa de auscultação é aquela na qual há levantamentos e análises de
dados para identificar características dos processos de trabalho, fluxos de
comunicação e interação entre as áreas da organização. Nesse momento, é
importante mapear e analisar os processos existentes, evitando o desperdício de
esforços mobilizados, além de respeitar os padrões da cultura organizacional.
A segunda etapa do processo de transformação organizacional, Fisher (2002)
chama de concepção. A fase representa a transição entre a situação constatada e a
concepção do processo de mudança. Por meio de técnicas participativas, se
constroem parâmetros e indicadores e se definem papéis para compor o grupo de
mobilização, responsável por gerir e disseminar todo o processo de transformação.
Nesse período, em que os planos de ação são objeto de atuação, é fundamental que
a performance organizacional seja impactada pelos aprimoramentos realizados, e
que as ações agreguem valor à qualidade e a produtividade dos resultados para o
processo ser legitimado.
Kotter (1999), em complemento às afirmativas de Fischer (2002), descreve
que a mudança deve se iniciar a partir de um senso de urgência, pois, por meio dele
se obtém a cooperação essencial ao processo. Para aumentar o senso de urgência
de uma organização é imprescindível minimizar a complacência utilizando-se de
ações ousadas que rompem o status quo, promovendo a mobilização das pessoas.
Como mencionado por Fischer (2002), é preciso fazer com que a maior parte dos
colaboradores acredite que a mudança proposta é imprescindível para se obter o
senso de urgência adequado.
Na etapa disseminação ou adesão, os demais colaboradores são envolvidos,
gradativa e planejadamente, na mudança organizacional. O objetivo principal é
23. 20
disseminar os produtos elaborados, aferir o entendimento dos funcionários e a
adequação das propostas, avaliar críticas e sugestões, buscando o engajamento
dos participantes e a internalização de princípios e valores que representem
significado à reconstrução da identidade organizacional.
Kotter (1999) denomina como um segundo passo de gestão da mudança a
criação de coalizão administrativa. Bastante relacionado à fase de disseminação
proposta por Fischer (2002), esse passo visa formar uma aliança entre pessoas,
com adequado nível de confiança e objetivos comuns. Segundo Kotter, para ocorrer
é indispensável liderar, mais do que gerir a mudança.
A gestão da mudança, de acordo com Kotter (1999), evolui em oito passos. O
terceiro passo seria o desenvolvimento da visão e a estratégia da mudança
proposta. A visão auxilia a transmitir as expectativas futuras da organização, dando
direção geral à transformação e ajudando todos os colaboradores a compreender o
sentido da mudança. A estratégia suporta a visão, implicando a lógica de execução
da mesma. O processo deve ser criado com cautela para transmitir de forma simples
e clara os reais desejos da organização no processo em questão.
O quarto passo, comunicar a nova visão, tem como objetivo alinhar com o
grupo de funcionários a nova direção a ser tomada. Criar nova visão e não transmiti-
la repetidamente acarretará inconsistência ao processo de mudança. É fundamental,
nesse momento, que a mensagem seja amplamente divulgada, aplicada nos
processos da organização e transmitida por meio de exemplos da liderança
(KOTTER, 1999).
Kotter (1999) elenca como quinto passo potencializar o processo,
conquistando e capacitando o maior número de colaboradores para atingir os
objetivos da visão criada. Durante o movimento da mudança é natural que se
identifiquem resistências e obstáculos a serem transpostos; é fundamental identificar
pessoas capazes de gerir a mudança para auxiliar a remoção dos obstáculos.
Conseguir vitórias em curto prazo é a definição de Kotter (1999) para a sexta
etapa. Para a conquista ser impactante é essencial garantir a visibilidade da mesma
por um grande número de pessoas, que concluam sozinhas a veracidade dos
24. 21
resultados. O apelo da conquista não deve ser ambíguo, mas claramente
relacionado à mudança. Celebrar as pequenas vitórias ocasiona reforço positivo ao
processo, reconhecendo os líderes do projeto e minimizando as resistências.
A etapa sete é descrita pelo autor como consolidação dos ganhos e produção
de mais mudanças. Acrescenta-se ao processo a visão de longo prazo, sendo
preciso desenvolver uma transformação organizacional. Isso acontece ao se
consolidar e reavaliar as pequenas vitórias, empreendendo maior quantidade, e mais
ampla, de projetos de mudança, expandindo a consciência de um ambiente
inovador.
E, por fim, o oitavo passo ocorre por meio do estabelecimento de novos
conceitos à cultura da organização. Assim, esse estágio requer a incorporação das
novas atitudes no núcleo organizacional e a consolidação da cultura, integrando as
novas práticas ao cotidiano empresarial. Na realidade da organização haverá uma
proposta contínua de mudança.
Os passos sete e oito de Kotter (1999) seriam comparados à quarta etapa
proposta por Fischer (2002), denominada sustentação, que tem o propósito de
monitorar e avaliar continuamente o processo de mudança, identificando a cada
ciclo oportunidades de aperfeiçoamento, considerando os acontecimentos no
mercado.
Trabalho análogo ao de Kotter (1999) e Fischer (2002) é o estudo de Beer,
Spector, Lawrence, Mills e Walton (1984). Segundo os autores, para um processo de
mudança profunda ou revolucionária ser eficiente é preciso que sejam seguidos seis
passos importantes.
O primeiro é mobilizar os colaboradores para a mudança, analisando em
conjunto os problemas de competitividade a serem enfrentados. A segunda ação é
criar ideia partilhada de como gerir e organizar para a competitividade. Incentivar a
equipe acerca da nova visão é o terceiro passo. Sequencialmente é essencial
espalhar a nova visão para todos os departamentos. O quinto passo é formalizar a
revitalização por meio de políticas formais, e por último, controlar e ajustar as
estratégias (BEER et. al., 1984).
25. 22
Ulrich (1997), de maneira similar, porém baseado em fatores críticos de
sucesso para mudanças organizacionais bem-sucedidas das empresas, estrutura a
construção de capacidade para mudança em quatro passos: (i) identificação dos
fatores críticos de sucesso; (ii) alcance dos fatores críticos como ferramenta
gerencial; (iii) identificação de atividades de melhoria para cada fator crítico; e (iv)
visão iterativa dos fatores críticos.
O primeiro passo de Ulrich (1997) está exatamente na identificação dos sete
princípios baseados nos quais estrutura os passos na construção da capacidade
para a mudança. Os princípios identificados são, na verdade, imperativos para a
capacidade de mudar: (i) liderar a mudança (ter patrocinador que detém e lidera a
mudança); (ii) criar necessidade compartilhada (assegurar que os funcionários
saibam o porquê da mudança e que a necessidade seja maior que a resistência); (iii)
modelar a visão da mudança; (iv) mobilizar e comprometer os principais
stakelhoders; (v) mudar sistemas e estruturas; (vi) monitorar o progresso; (vii)
sustentar a mudança.
Após a identificação dos fatores críticos pertinentes à mudança e à
organização, o segundo e terceiro passos propostos por Ulrich (1997) consistem em
tornar os fatores críticos ferramentas gerenciais e criar planos de ação para que os
fatores críticos com baixa avaliação tenham melhora de performance.
O quarto e último passo proposto por Ulrich (1997), não muito diferente dos
trabalhos de Kotter (1999) e Fischer (2002), consiste em ver os fatores críticos como
processo iterativo, e não como evento. Segundo o autor, os profissionais de
Recursos Humanos que atuam como agentes de mudança devem reconhecer a
importância de revisitar periodicamente os fatores críticos para manter a mudança
em pauta, o que está intimamente relacionado à fase de sustentação defendida por
Fischer (2002) e às fases nas quais se sugere o estabelecimento da visão de longo
prazo e a proposta contínua de mudança apresentada por Kotter (1999).
De acordo com Junqueira e Bichuetti (2010, p. 60-61), das muitas empresas
que “mergulharam em processos de mudança [...] para dar um salto de qualidade na
gestão e no desempenho”, aquelas que apresentaram processos de mudanças bem-
sucedidas ou mesmo aquelas que não apresentaram processos bem-sucedidos,
26. 23
mas avaliaram as falhas cometidas, compartilham ao menos cinco fatores
considerados como críticos para o sucesso da transformação. São eles: (i)
estabelecimento de visão clara da mudança; (ii) abordagem simples com mudança
gradual da cultura; (iii) envolvimento adequado das equipes e gestores; (iv)
comunicação objetiva a todos os níveis da organização; e (v) tempo adequado para
o amadurecimento e absorção da mudança.
Esses fatores corroboram a abordagem dos sete fatores críticos de Ulrich
(1997), com a diferença de que Junqueira e Bichuetti (2010) não mencionam
mecanismos de sustentação e monitoramento do processo de mudança.
Observa-se que há vasta literatura sobre a estruturação de processos de
mudança organizacional, mas de acordo com Senge (1999), há diversos exemplos
organizacionais de como o trabalho de desenvolvimento organizacional é percebido
como secundário, subestimado frente aos demais processos em que as empresas
atentam quando passam por processos de mudanças, principalmente em se
tratando de fusões e aquisições.
2.3 Cultura organizacional
O conceito de cultura sofreu alterações ao longo do tempo, pois à medida que
as sociedades e culturas se transformam, os conceitos acompanham as mudanças,
o que gera vasto material sobre o assunto. Como de maneira geral o conceito passa
por mudanças, no contexto organizacional suas alterações acontecem a partir das
transformações vivenciadas pelas organizações, gerando novos significados.
Para Aidar, Brisola, Motta e Wood Jr (2009, p.37), “toda cultura possui uma
lógica própria, que deve ser compreendida a partir dela mesma”. Os autores afirmam
que os estudiosos de cultura precisam, ao observar qualquer grupo de pessoas, se
aprofundar em sua rotina, no seu dia a dia, para entender o que significam atos e
percepções dos membros.
Dentro do contexto, as definições precisas de cultura organizacional tornam-
se difíceis de ser circunscritas, contribuindo com o risco de serem consideradas
como cultura organizacional situações que na realidade não o são, podendo ser, por
exemplo, clima organizacional. De maneira simplificada, fazem parte do clima
27. 24
organizacional os fatos rapidamente percebidos na organização, mas que ainda são
superficiais e não refletem a realidade e crenças mais profundas.
Considerando o contexto de cultura organizacional, Aidar, Brisola, Motta e
Wood Jr. (2009) ressaltam que uma empresa multinacional terá maior sucesso de
acordo com sua capacidade de gerenciar a diversidade, sendo que uma das maiores
dificuldades que líderes de empresa internacionalizadas encontram é a criação de
sinergias entre culturas diversificadas, aproveitando o que cada uma tem de melhor.
De acordo com os autores, estudos comprovam que respeitar a cultura onde se quer
operar implica vantagens competitivas.
A conclusão de Aidar, Brisola, Motta e Wood Jr. (2009) é que não se pode
desconsiderar o meio ambiente, interno e externo, no estudo da cultura das
organizações. O meio possui muita influência nos comportamentos, valores e
atitudes das pessoas que fazem parte da organização, e se refletirá no modelo de
gestão da empresa. A compreensão dos contextos sociais e culturais da
organização é fundamental para sua gestão.
Schein (2009, p.17) ainda afirma
[...] para se atingir esses níveis mais profundos, deve-se entender as
percepções e sentimentos que surgem em situações críticas e observar e
entrevistar os membros regulares ou veteranos para obter um senso correto
das suposições compartilhadas de nível mais profundo.
A cultura organizacional precisa ser interiorizada, isto é, entendida e praticada
pelas pessoas que a influenciam e são por ela influenciadas. Quando acontece a
interiorização há então a autoidentificação com a cultura. De maneira similar citamos
Berger e Luckmann (1985, p. 176):
[...] Quaisquer que sejam, a interiorização só se realiza quando há
identificação. A criança absorve os papéis e as atitudes dos outros
significativos, isto é, interioriza-os, tornando-os seus. Por meio desta
identificação com os outros significativos a criança torna-se capaz de
identificar a si mesma, de adquirir uma identidade subjetivamente coerente
e plausível. Em outras palavras, a personalidade é uma identidade reflexa,
que retrata as atitudes pela primeira vez pelos outros significativos com
relação ao indivíduo, que se torna o que é pela ação dos outros para ele
significativos. Este processo não é unilateral nem mecanicista. Implica uma
dialética entre a identificação pelos outros e a autoidentificação, entre a
identidade objetivamente atribuída e a identidade subjetivamente atribuída.
28. 25
De acordo com Fleury e Sampaio (2002), esse conceito de cultura
organizacional começou a ser debatido no final da década de 1950, porque
empresas iniciaram sua expansão internacional, e queriam reproduzir em outros
países estruturas e forma de administrar. Embora replicassem a mesma estrutura e
os mesmos programas, os resultados nem sempre eram similares. Os
administradores passaram a se deparar com problemas que não havia no país onde
a empresa fora criada. Por isso, no princípio a palavra cultura aplicada à
administração é utilizada de modo parecido a como utilizamos para conceituar
culturas nacionais, conforme Fleury e Sampaio (2002, p. 285):
[...] elementos culturais foram obtidos na sociedade pelos empregados,
especialmente os que entram em conflito com a ordem organizacional
original, para então buscar um novo arranjo organizacional ou uma
mudança de crenças e valores apropriada.
Segundo Fleury (2011, p. 15), “estudar o tema cultura organizacional tem
apresentado para os pesquisadores o desafio de encontrar caminhos metodológicos
inovadores, interessantes e consistentes”, até mesmo porque a cultura
organizacional não é formada por elementos objetivos; ao contrário, a subjetividade
se torna efetiva da composição às escolhas e diretrizes. Tomando como ponto de
partida a linha de pesquisa e estudo com perspectiva antropológica, Fleury (2011,
p.17) afirma que “a dimensão simbólica é concebida como capaz de integrar todos
os aspectos da prática social”. A “dimensão simbólica” é a expressão que resume a
complexidade do assunto.
Bertero (2011, p. 37) complementa ressaltando que “a cultura pode ser vista
como propiciando aos indivíduos uma interpretação da realidade e, portanto,
conferindo sentido e significado à realidade”. Reforçando a ideia, Schein (2009, p.1)
afirma:
[...] cultura é um fenômeno dinâmico que nos cerca em todas as horas,
sendo constantemente desempenhada e criada por nossas interações com
outros e moldada por comportamento de liderança, e um conjunto de
estruturas, rotinas, regras e normas que orientam e restringem o
comportamento.
A cultura está presente em todos os momentos. Ela é moldada e molda as
pessoas. Por isso, no contexto organizacional, a cultura está intimamente
29. 26
relacionada ao modelo de liderança e com o perfil dos líderes, pois a liderança não
acontece sozinha, mas nasce de interação entre líder e liderado.
Fleury e Sampaio (2002, p.293) definem cultura organizacional:
[...] Um conjunto de valores e pressupostos básicos expresso em
elementos simbólicos que, em sua capacidade de ordenar, atribuir
significações, construir a identidade organizacional, tanto agem como
elemento de comunicação e consenso como ocultam e instrumentalizam as
relações de dominação
Schein (2009, p. 187) afirma:
[...] uma cultura integrada é aquela em que toda a organização compartilha
um único conjunto de suposições; uma cultura diferenciada é uma
organização em que subculturas poderosas discordam em certas questões
cruciais, tal como trabalho braçal e trabalho administrativo; e uma cultura
fragmentada é uma organização, como um conglomerado financeiro, que
tem subculturas muito grandes e nenhum conjunto muito amplo de
suposições que sejam compartilhadas.
Como a cultura é formada por elementos básicos carregados de crenças,
valores e subjetividade, ela precisa refletir um contexto mais amplo. É essencial
haver elementos-chave que permeiem no coletivo, pois caso isso não aconteça, a
cultura organizacional se desintegraria, sendo prejudicial à organização.
Para se ter melhor entendimento de contexto organizacional, avaliar apenas
os aspectos ou traços culturais da organização não é suficiente. É preciso avaliar
liderança, modelo de gestão, condições de mercado e planejamento da organização.
Na relação entre liderança e cultura Schein (2009) define
[...] liderança é a habilidade de ficar à margem da cultura que criou o
lider e de iniciar os processos de mudança evolucionária que forem
mais adaptativos. Essa capacidade de perceber as limitações da
cultura própria de alguém e de desenvolver adaptativamente a cultura
constitui a essência e o desafio final da liderança.
Se o líder não tem esse movimento, deixa de liderar, o que
consequentemente interferirá na rotina da organização, gerando a perda de valores
até então considerados importantes para a manutenção da organização. Schein
(2009, p. 34) ressalta:
[...] originalmente liderança é a fonte das crenças e valores que levam
um grupo a lidar com seus problemas internos e externos. Se o que o
30. 27
líder propõe funciona e continua a funcionar, o que antes eram
apenas suposições do líder, gradualmente passam a ser suposições
compartilhadas.
Cultura e liderança estão tão interligadas que a separação entre ambas não é
viável. Shein (2009, p.10) afirma que “são dois lados de uma mesma moeda; nem
uma nem a outra podem, realmente, ser entendidas por si próprias”. Segundo
Schein (2009), o único aspecto da cultura apenas parcialmente influenciado pelo
comportamento do líder é o resultado complexo de um processo de aprendizagem
de grupo, pois o aprendizado depende significantemente do aprendiz.
Levando adiante o papel da liderança, identifica-se que o direcionamento que
dá à organização contribui para o fortalecimento dos laços culturais, sendo que,
quando se tem missão, visão e valores da organização definidos, há contribuição
significativa na formação, fortalecimento ou mudanças dos traços culturais. Ainda no
mesmo assunto, considera-se como um dos fortalecedores da cultura a forma como
a alta liderança direciona, acompanha e cobra suas equipes nas ações do dia a dia
e em outras atividades.
Segundo Pettigrew (2011, p.146), “no nível mais profundo a cultura é pensada
como um conjunto complexo de valores, crenças e pressupostos que definem os
modos pelos quais uma empresa conduz seus negócios”. A formação de cultura
organizacional está ligada ao perfil dos fundadores da organização. Entretanto, para
a cultura ser levada adiante, é indispensável que as pessoas que passarem a fazer
parte da organização de alguma forma partilhem valores e crenças dos fundadores,
pois somente assim contribuirão para o processo de consolidação e mutação da
cultura, conforme surgirem novas realidades. Berger e Luckmann (1985, p. 35)
afirmam: “A vida cotidiana apresenta-se como uma realidade interpretada pelos
homens e subjetivamente dotada de sentido para eles na medida em que forma um
mundo coerente”. Nas organizações, as situações apresentam-se como realidade
para quem as observa e são interpretadas de maneira subjetiva, de acordo com as
experiências vividas pelos funcionários, individualmente.
Segundo Berger e Luckmann (1985, p. 47),
[...] nenhuma outra forma de relacionamento social pode reproduzir a
plenitude de sintomas da subjetividade presentes na situação face a face.
Somente aqui a subjetividade do outro é expressivamente próxima. Todas
31. 28
as outras formas de relacionamento com o outro são, em graus variáveis,
remotas.
Analisando a partir dessa afirmação e considerando o número de horas que
as pessoas passam diariamente dentro das organizações, nota-se que a
subjetividade está mais presente do que se assume, o que interferiria de maneira
relevante na tomada de decisões.
A cultura organizacional é composta por conhecimentos, objetivos e
subjetivos, que, ao lado de outros fatores ligados ao ambiente a tornam dinâmica,
ora influenciando, ora sendo influenciada. Berger e Luckmann (1985, p. 120),
descrevendo situação semelhante, analisam:
[...] a relação entre o conhecimento e sua base social é dialética, isto é, o
conhecimento é um produto social e [...] um fator na transformação social
[...] O crescente número de complexidade dos subuniversos faz com que
[eles] se tornem cada vez mais inacessíveis aos estranhos.
Entende-se que a relação é de múltipla interferência, assim como na cultura
organizacional, em que o indivíduo influencia e é influenciado pelo meio. Aos recém-
chegados entender a complexidade da cultura organizacional inicialmente é difícil,
pois ainda nem todos os aspectos lhes são familiares.
Berger e Luckmann (1985) tratam de socialização primária e socialização
secundária. Segundo eles, a primária é carregada de emoções e tem como grande
propulsor o desenvolvimento da linguagem, sendo que pais, familiares e amigos
próximos são os elementos-chave. Na secundária a carga emocional é menor, se
comparada à primeira, e nessa socialização os elementos de ordem mais técnica
são mais importantes. A cultura organizacional se dá com base na socialização
secundária, e se o ambiente organizacional não a favorecer haveria problemas que
se refletirão no clima organizacional.
Quando o fundador inicia uma organização, seus valores, crenças, objetivos e
cultura apreendidos em sua vida nortearão o novo projeto, contribuindo com a
circunscrição dos traços culturais da organização. Essa cultura consequentemente
será compartilhada com as pessoas que fizerem parte da organização. Para isso
acontecer, é imprescindível que ambos, fundador e contratado, estejam dispostos a
32. 29
iniciar a nova etapa, comunicando crenças, ajustando gradualmente os aspectos
passíveis de ajustes a curto ou médio prazo (SCHEIN, 2009).
Bertero (2011) acrescenta:
[...] Na fase inicial de uma empresa, o fundador, indivíduo ou grupo formam
a cultura organizacional, moldando-a um pouco à sua própria imagem e
semelhança. As atitudes do fundador, comportamento, sua visão de mundo,
da natureza humana e do próprio negócio, acabam por ir moldando a
organização e vão lenta e gradativamente se impondo, como valores e
crenças. O poder do fundador se faz sentir desde o início nos processos de
recrutamento e seleção, tomados aqui em sentido amplo. O fundador
escolherá as pessoas afins com seus valores, visão de negócio, ou pelo
menos buscará pessoas moldáveis e adaptáveis ao que julga ser a postura
organizacional conveniente e adequada [grifo do autor].
Na verdade, desde o começo da organização, o fundador é o responsável por
direcionar o caminho por onde quer que ela transite; é ele quem deve dar o
comando do que automaticamente configurará para o início do estabelecimento das
crenças da organização, invariavelmente vinculadas às suas crenças. Com o passar
do tempo, será ampliada para os demais membros.
Bertero (2011) sugere que se requer do empresário a capacidade de
possibilitar que outras pessoas, ao longo do tempo, contribuam com sua
organização, sendo que essa ação resultará em mudanças de traços na cultura
conforme se afirmou anteriormente. O processo não significa que o fundador deixou
de ser útil, mas que a partir do momento em que pessoas até então “estranhas” à
organização deixam de ser “estranhas”, elas contribuirão para a perenidade do
negócio.
Não obstante a ansiedade que cerca as pessoas envolvidas em quaisquer
organizações quando se aborda o tema mudanças, cultura organizacional, crenças e
valores, identifica-se que a cultura organizacional muda constantemente. A cultura
não é estática, mas dinâmica. Logo, as pessoas que direcionam as mudanças
precisam identificar qual o ritmo adequado às mesmas, levando em consideração
que não há modelo padrão. Cada realidade é única, portanto, deve ser avaliada para
possibilitar a saída mais adequada.
Maanem (2011, p.47) afirma que “alguma socialização sempre ocorrerá
quando uma pessoa se movimentar no interior da organização e passar a assumir
33. 30
um novo papel”. Portanto, as mudanças na cultura organizacional acontecem com
maior intensidade do que talvez se supõe, mesmo que em menor grau. Os casos de
mudanças constatadas rapidamente não são frequentes; em alguns, quando se
percebe, é porque as mudanças caminham em rumo não planejado.
Nos casos de novas admissões, o recém-contratado, ao chegar à
organização, é rapidamente identificado, e nos primeiros dias passará por uma fase
de adaptação na qual terá de assimilar a enxurrada de informações e percepções do
clima organizacional. Mas a cultura somente será assimilada com o passar do
tempo. Ao longo dos anos, se identificará se houve aderência do admitido à
empresa e vice-versa. Maanem (2011, p.49) afirma que “é provável que uma pessoa
que se submeta à socialização formal se sinta isolada, separada e proibida de
assumir relacionamentos sociais cotidianos com seus superiores mais
experimentados”. E na permanência do sentimento, é pequena a possibilidade de
integração da pessoa à cultura da organização.
Considerando que a cultura organizacional é concebida, vivida e moldada
pelas crenças, valores e atitudes das pessoas, nota-se que o turnover, saída de
funcionários da organização, possibilita o enfraquecimento da cultura organizacional
oriunda dos fundadores, pois os profissionais que não permanecem na organização
não internalizam a cultura, dificultando a perpetuação dos valores. Por outro lado,
Shein (2009, p. 13) ressalta:
[...] a cultura sobrevive mesmo quando alguns membros deixam a
organização. A cultura é difícil de ser mudada, porque os membros do grupo
valorizam a estabilidade no que ela fornece de significado e previsibilidade.
Outra questão não menos importante a ser considerada na cultura
organizacional são os círculos de poder presentes na organização. Fischer (2011, p.
65) frisa que “pertencem a este universo difuso, mas extremamente importante de
ser conhecido, as dúvidas e indagações referentes às relações existentes entre a
cultura e o poder nas organizações”. Os círculos de poder fazem parte desse
contexto e não podem ser desconsiderados. Como exemplo, o papel dos fundadores
com as pessoas diretamente ligadas a ele, fator que não deve ser desconsiderado
ao se abordar o tema cultura organizacional.
Fischer (2011) ainda afirma:
34. 31
[...] não se pode tratar a resistência à mudança como uma questão
genérica, um empecilho a mais nos projetos de desenvolvimento
organizacional; porque se as premissas básicas de cultura da organização
permanecem válidas, ou suficientemente internalizadas, mesmo as
propostas de indiscutível qualidade técnica e de prioridade estratégica não
se viabilizam.
A afirmação mostra o poder que tem a cultura organizacional, sua
importância, e que os círculos de poder devem ser sempre lembrados como
facilitadores ou dificultadores nos processos de mudança cultural.
De acordo com Fleury (2011), um dos agentes da cultura organizacional é a
figura do herói. “[...] das estórias sobre os atos de coragem nascem os heróis, que
personificam os valores e proveem modelos de comportamentos para os demais”
(FLEURY, 2011, p.120).
No contexto organizacional, o herói é aquele que em algum momento da
história da empresa atuou de maneira exemplar e conseguiu reverter situação
avaliada como comprometedora. Ao longo do tempo, o acontecimento tende a se
perpetuar, criando essa figura.
Por último, sobre a administração da cultura organizacional, Pettigrew (2011)
afirma que a cultura das organizações é administrável, mas destaca que o
gerenciamento seria possível com extrema dificuldade, frequentemente se iniciando
com mudanças estratégicas na organização.
Sobre a dificuldade no gerenciamento da cultura organizacional, Schein
(2003) analisa:
[...] o que ocorre nas organizações é muito fácil de observar; por exemplo,
fracassos de liderança, miopia de marketing, arrogância baseada em
sucessos passados etc.; mas, no esforço de entender por que tais coisas
ocorrem, a cultura como conceito é apropriadamente reconhecida.
Pettigrew (2011) destaca alguns fatores, resumidos no Quadro 1, como os
mais importantes de se reconhecer como problemas ligados à cultura que afetam as
organizações no cotidiano.
35. 32
Quadro 01 – Dificuldades no gerenciamento da cultura
Problema Descrição
Problema dos níveis
Relaciona-se ao fato de que a cultura organizacional
existe em uma variedade de níveis diferentes na
empresa.
Problema da infiltração
A cultura não é apenas profunda, mas também
extensa, alcançando os pontos de vista, as
estruturas, os sistemas, a missão da empresa, as
formas de recrutamento, a socialização e o sistema
de recompensa.
Problema do implícito
Muito da cultura organizacional é aceito
implicitamente. Raramente emerge para discussão
explícita.
Problema do impresso
São as raízes históricas profundas de grande parte
da cultura organizacional.
Problema do político
Refere-se às conexões entre a cultura organizacional
e a distribuição de poder na empresa.
Problema da pluralidade
São as subculturas que de alguma forma apresentam
crenças e valores com algumas diferenças.
Problema da interdependência
A cultura está interconectada não apenas à política
da empresa, mas à estrutura, aos sistemas, às
pessoas e às prioridades.
Fonte: elaborado com base em Pettigrew (2011)
Quando os fatores apresentados no Quadro 01 são compreendidos, as
possibilidades de se trabalhar a cultura organizacional passam a ser mais coerentes
com as estratégias definidas pela organização.
A partir do entendimento da cultura organizacional e sua dinâmica no contexto
organizacional, explicita-se a necessidade de atenção ao tema como imperativo aos
processos de transformação organizacional, em destaque aqueles decorrentes de
fusões e aquisições.
2.4 Fusões e aquisições
O crescente aumento das operações de fusões e aquisições em empresas de
diferentes tamanhos e países causa “profundas mudanças, alterando os padrões de
gestão, produção e emprego no mundo todo” (BARROS; SOUZA; STEUER, 2003, p.
17).
De acordo com as autoras Barros, Souza e Steuer (2003), o fenômeno tende
a continuar, pois os processos de fusão e aquisição respondem a necessidades de
manutenção das empresas no atual cenário competitivo.
De acordo com Gitman (2006), as fusões acontecem principalmente com o
objetivo de maximizar os lucros organizacionais, aumentando o valor da empresa no
36. 33
mercado. Como objetivos secundários, o autor cita intenções tecnológicas, aumento
de liquidez e maior participação de mercado, motivos igualmente encontrados nos
estudos de Rourke (1992).
Evans, Pucik e Barsoux (2002) citam motivos como domínio de mercado,
expansão geográfica, aquisição ou alavancagem de competências, aquisição de
recursos, ajuste ao mercado competidor e desejo irracional de executivos.
Cartwright e Cooper (1999) relacionam duas razões lógicas para as
combinações estratégicas entre as empresas. Uma se relaciona à maximização de
valor da empresa e a outra a motivações do corpo diretivo, de tal forma que ambas,
em última análise, teriam como objetivo principal o aumento de valor da empresa,
pois seria a motivação maior do corpo diretivo da organização.
Sterger (1999), por sua vez, consolida os diversos motivos citados pelos
demais autores para fusões e aquisições entre empresas em dois grupos: tradicional
e transformacional. Os motivos tradicionais se relacionam à consolidação e à
expansão do mercado, ainda dentro do mesmo setor de atividade, visando, por
exemplo, ao aumento de share of wallet1
. Os motivos transformacionais se
relacionam ao desenvolvimento de novo portfólio, novo modelo de negócios ou
mudança radical de patamar.
O tema ganha importância no Brasil desde a década de 90, pois as barreiras
de entrada ao capital estrangeiro foram reduzidas e o país passou a se inserir com
maior intensidade no mercado global (BARROS; SOUZA; STEUER, 2003).
Buscando maior objetividade no estudo proposto, resumem-se as possíveis
combinações estratégicas entre empresas por meio das palavras “fusões” e
“aquisições”, mas é possível sumarizar diferentes tipos de combinações por meio do
Quadro 2.
1
O aumento de share of wallet se relaciona ao aumento da participação dos clientes na compra de
produtos. O conceito vai além do conceito de market share, que busca entender a participação que a
empresa tem no mercado (SOUZA e SERRENTINO, 2002). De acordo com os estudos de Souza e
Serrentino (2002), os processos de fusão e aquisição, principalmente no varejo brasileiro, visam ao
crescimento de share of wallet para a maximização do valor da empresa.
37. 34
Vale ressaltar que, de acordo com Evans, Pucik e Barsoux (2002), a maioria
das fusões revela-se, na prática, como aquisições após a assinatura dos acordos de
associação. A designação de fusão atende, no primeiro momento, às exigências do
mercado e dos órgãos regulatórios, como a Comissão de Valores Mobiliários, além
de ser mais conveniente aos adquiridos, que veem caráter depreciativo na ideia de
venda. No entanto, o grande impacto sobre a gestão das pessoas depende do jogo
de poder entre as empresas e da estratégia de integração adotada, que determinam
o novo perfil e o novo modelo de gestão das companhias.
Quadro 2 – Referências conceituais para as possíveis combinações estratégicas entre
as empresas
Tipologia Descrição
Aliança (Estratégica)
Associação entre duas ou mais empresas que empenham
recursos comuns para juntamente desenvolver uma nova
atividade. O termo parceria pode ser empregado quando esse
esforço cooperativo não envolver concorrentes, mas
fornecedores ou clientes, na lógica da cadeia de valor da
empresa.
Joint Venture
Associação de empresas para o desenvolvimento e a execução
de projetos específicos. As empresas criam nova empresa,
formalmente separada das demais, com governança, força de
trabalho, procedimentos e cultura própria.
Consórcio
Grupo de empresas formado para a aquisição de outra empresa,
para a execução de uma obra ou financiamento de projeto de
grande envergadura.
Contrato de longa duração
Acordo, pacto ou convenção entre empresas para a execução
de atividade comum.
Fusão
União de duas ou mais companhias, envolvendo uma completa
combinação de duas ou mais empresas, que deixam de existir
legalmente para formar uma terceira, com nova identidade,
teoricamente sem predominância de nenhuma das empresas
anteriores, mas, na prática, geralmente sob controle
administrativo da maior ou mais próspera.
Aquisição
Compra de controle acionário de uma empresa por outra,
determinando o desaparecimento legal da empresa comprada.
Fonte: adaptado de Rossetti (2001) e Barros, Souza e Steuer (2003).
Divide-se um processo de fusão ou aquisição em três etapas: due diligence,
negociação e integração (BARROS, 2001a).
A due dilligence refere-se à fase na qual são feitos levantamentos e análises
sistematizadas sobre a empresa a ser adquirida. O mais frequente, de acordo com
Marks e Mirvis (1998), é analisar aspectos objetivos do negócio, principalmente as
implicações financeiras, para ajudar na definição do preço a ser pago.
38. 35
Barros, Souza e Steuer (2003, p. 25) defendem que a presença de equipes
multidisciplinares na due diligence, incluindo equipes de Recursos Humanos,
“possibilita uma visão mais estratégica de todas as competências da empresa,
evitando que as pessoas se deixem seduzir pelas possibilidades de sinergia que, na
maioria das vezes, não se concretizam”. Entretanto, Evans, Pucik e Barsoux (2002)
afirmam que a área de RH está envolvida em apenas 25% do planejamento das
operações de fusão e aquisição de empresas, segundo pesquisas nos Estados
Unidos e Europa. O envolvimento da área de Recursos Humanos na etapa de
negociação é sensivelmente maior (aproximadamente 80% das operações), o que
revela atuação de RH centrada em diferenças culturais e sinergias de gestão de
pessoas apenas depois que a compra foi efetivada.
Na etapa de negociação, os estudos de caso apresentados por Barros, Souza
e Steuer (2003) não revelam padrão de comportamento das empresas, mas a
possibilidade de haver operação extremamente profissionalizada e operação mais
personalizada, conduzida com frequência por profissionais sem a experiência
adequada.
Rourke (1992) afirma que a última etapa do processo, a integração, sofre de
pouco planejamento e atenção por parte dos adquirentes, que geralmente não dão a
importância devida ao fato de que o encontro de culturas organizacionais distintas
impacta na gestão da nova organização.
Marks (1994) enfatiza a importância da maneira que nos atentamos para
essas etapas do processo de fusão e aquisição, afirmando que líderes
organizacionais devem notar que a maneira pela qual algumas organizações se
transformaram, principalmente durante o início da década de 90, “sufocou a
motivação dos funcionários, prejudicou o desempenho das equipes e danificou a
eficácia organizacional” (MARKS, 1994, p. 14, tradução do autor).
Marks (1994) ressalta a importância da atitude da alta liderança nos
processos de transição para um novo modelo (decorrente de fusão ou aquisição).
Um presidente com a combinação correta das habilidades de liderança
carismática e visionária pode mobilizar os funcionários para a ideia de que a
transição não é simplesmente uma resposta necessária às realidades do
negócio, mas uma oportunidade proativa de melhorar como o trabalho é
39. 36
abordado e conduzido na organização. Um processo [desse] [...] tem o
potencial de descongelar a organização e seu pessoal, provendo uma
chance rara de mudar drasticamente a cultura organizacional e reforçar uma
nova maneira de fazer as coisas. [...] Os resultados podem incluir a adoção
de novos comportamentos e atitudes em trabalho em equipe para sustentar
aprimoramentos em trabalhos inovativos e um comprometimento sincero
com a qualidade (MARKS, 1994, p. 15, tradução do autor).
Marks (1994) menciona que a aquisição seria um ponto de inflexão no
contrato psicológico até então relativamente estável entre a empresa e seus
colaboradores. O caso da empresa Majestic é exemplo em que “após três grandes
reorganizações em quatro anos, os colaboradores viam-se desgastados em
decorrência da extensão e ritmo da mudança na organização” (MARKS, 1994, p. 21,
tradução deste autor).
Sendo tão importantes a forma em que se atua nesses processos e o aspecto
cultural envolvido, o segredo estaria em como fazer com que as diferenças culturais
contribuam com mais intensidade como agentes enriquecedores que agregam valor
ao negócio e menos como agentes dificultadores do próprio processo de fusão ou
aquisição (BARROS, 2001a).
De acordo com Barros (2001a, p. 133), “é necessário identificar qual grau de
aculturação será o do processo em questão, uma vez que ela pode ocorrer em três
diferentes níveis”.
No primeiro nível, intitulado de assimilação cultural, uma empresa claramente
absorve a outra. No caso, a combinação produtiva acontece, pelo menos em
algumas oportunidades, se as empresas estiverem cientes do processo que
passarão e desenvolverem um acordo mínimo em torno dele (BARROS, 2001a).
No segundo nível, o de mescla cultural, as empresas reúnem as culturas de
forma equilibrada. É natural que, após a operação, a direção da empresa tenha
urgências diferentes de integrar as culturas de áreas, promovendo ritmo e
velocidade diferentes no processo de integração. Se bem utilizado, o segundo nível
de aculturação permitiria o uso de benchmarkings internos no processo de
comunicação, usando como exemplo áreas que tiveram processos de integração
mais avançados (BARROS, 2001a).
40. 37
No terceiro nível, o da pluralidade cultural, diferentes culturas passam a
coexistir. Vale ressaltar:
atuar no mundo dos negócios e com o management significa ter
competência para lidar com ambiguidades e gerenciar paradoxos. A
ambiguidade pode ser entendida pela necessidade de se analisar
criticamente a situação de cada operação e de se conhecer suficientemente
as condições para se encontrar a melhor resposta para determinada
situação (BARROS, 2001a, p. 134).
Por isso não há nível de aculturação correto, mas respostas corretas para
determinadas situações.
Quanto ao envolvimento da área de recursos humanos, como Barros, Souza
e Steuer (2003), Thomson (1999) propõe em seu estudo, intitulado “due diligence
cultural”, que ao buscar aspectos financeiros da negociação, é igualmente
importante examinar a maneira como cada organização se comporta, para avaliar
se, dado o momento em que as empresas se juntam, as diferenças culturais não
diminuem ou negam o valor do acordo. Thomson (1999) afirma que a maioria dos
administradores utiliza a palavra sinergia querendo dizer sobre “a habilidade de se
remover custos por meio da eliminação de duplicações, mas na verdade ela significa
organizar dois grupos de maneira que eles possam, juntos, produzir e desenvolver
capacidades que eles nunca poderiam ter desenvolvido sozinhos” (THOMSON,
1999, p. 403).
Tudo isso, de acordo com Thomson (1999), representa oportunidade para o
diálogo. Se esse diálogo tratar da nova identidade, do controle e dos planos de ação
promoveria a aculturação, como proposta por Barros (2001a), de forma mais natural
e participativa.
41. 38
3 METODOLOGIA
O objetivo deste estudo foi compreender como diversos modelos de gestão
de pessoas coexistem nas empresas após mudanças organizacionais provocadas
por iniciativas recentes de novos negócios, fusões e aquisições. Para tanto, realizou-
se em um grupo varejista estudo com abordagem qualitativa, quando “o interesse
está em verificar como determinado fenômeno se manifesta nas atividades,
procedimentos e interações diárias” desse determinado grupo (GODOY, 1995, p.
63).
A unidade de estudo selecionada foi o grupo econômico de empresas G2
,
composto por um conjunto de unidades de negócio do qual foram selecionadas
cinco para pesquisa exploratória. Como as diferentes unidades de negócios
selecionadas foram constituídas ou adquiridas em momentos diferentes, e a
composição acionária do Grupo G para com elas é diversificada (em alguns casos o
grupo detém maior controle sobre a unidade de negócio, em outros menos), a
pesquisa exploratória buscou a conexão entre as diversas variáveis que compõem
os modelos de gestão de pessoas coexistentes no grupo (RICHARDSON et al.,
2007).
As variáveis foram analisadas por meio de estudo qualitativo para buscar a
compreensão do significado que os colaboradores de gestão de pessoas constroem
sobre as experiências vividas nesses modelos (Merriam, 2002).
Denominaram-se neste estudo as unidades de negócio selecionadas como
N1, N2, N3, N4 e N5. Embora a organização G seja composta por diversas unidades
de negócios de composição acionária diferentes, decorrentes de processos de fusão
e contratos de associação heterogêneos, G possui uma Vice-Presidência de
Recursos Humanos responsável por todas as unidades de negócio. Cada uma das
unidades de negócio possui um responsável pela área de Recursos Humanos, que
em alguns casos tem a nomenclatura de cargo de gerente e em outros de diretor. Os
responsáveis pela área de RH de N1, N2, N3, N4 e N5 foram os sujeitos da
pesquisa, aqui denominados RH1, RH2, RH3, RH4 E RH5.
2
Nome fictício.
42. 39
Buscou-se identificar com este estudo os padrões recorrentes, os aspectos e
as principais características dos modelos de gestão de pessoas dessas unidades,
observando e comparando os papéis e posturas adotados pela liderança de RH nos
negócios e expressando as informações por meio de relato descritivo com base no
referencial teórico abordado neste trabalho.
Para a coleta de dados, utilizou-se a técnica de entrevistas semiestruturadas
(Apêndice A), de maneira a obter informações que não podem ser encontradas em
registros ou fontes documentais, pois o objetivo do estudo é compreender como o
fenômeno se manifesta nas atividades, procedimentos e interações do cotidiano do
trabalho (DENCKER; VIÁ, 2001).
As entrevistas semiestruturadas referem-se a técnica com perguntas abertas,
de maneira a permitir certa flexibilidade ao entrevistado para que pontos peculiares
de gestão de pessoas nos diversos negócios sejam percebidos pelo entrevistador.
Esse tipo de entrevista costuma ser utilizado para que a situação de coleta de dados
pareça uma conversa na qual os envolvidos sintam-se confortáveis e ambientados
com a situação (FLICK, 2004).
A fim de complementar os dados obtidos nas entrevistas, foram aplicados
formulários (Apêndice B) formados por um conjunto de perguntas de múltipla
escolha, buscando compreender melhor as características dos modelos de gestão
de pessoas da unidade investigada. Os formulários foram aplicados ao final de cada
entrevista semiestruturada, ao mesmo entrevistado, ainda na presença do
entrevistador.
A elaboração do roteiro da entrevista (Apêndice A) e do formulário
complementar (Apêndice B) baseou-se essencialmente no referencial teórico sobre
modelos de gestão de pessoas e sobre o papel de Recursos Humanos nas
transformações organizacionais.
Todo o conteúdo das entrevistas foi transcrito na íntegra em texto digitado, com
as respostas compiladas em um único arquivo digital. Desse arquivo foram retirados
trechos e evidências que revelaram características importantes para a análise de
dados do estudo, os quais foram confrontados com a fundamentação teórica.
43. 40
De acordo com Collis e Hussey (2005), a filosofia de pesquisa qualitativa, por
eles nomeada fenomenológica, é usada para que se reflita sobre percepções para o
entendimento de atividades sociais; nesse caso, os modelos de gestão de pessoas
estabelecidos pelas relações humanas organizacionais. Em uma pesquisa dessa
natureza, não se busca a solução de um problema, mas a descoberta de maneiras
diferentes de gestão.
As entrevistas e a aplicação do formulário complementar permitiram a coleta e
análise de dados acerca da caracterização do grupo G e suas unidades de negócio
e da percepção dos gestores sobre os princípios, políticas e processos de gestão de
pessoas. Pôde-se ainda evidenciar características predominantes nos modelos e
papéis exercidos pelos profissionais de recursos humanos.
44. 41
4 ANÁLISE DOS RESULTADOS
Nesta seção, os dados obtidos nas entrevistas e na aplicação dos formulários
de pesquisa foram apresentados com o enfoque exploratório, visando compreender
como os diversos modelos de gestão de pessoas coexistem na empresa após
mudanças organizacionais.
4.1 Caracterização do Grupo G e suas unidades de negócio
O Grupo G tem mais de 50 anos é um dos líderes no segmento de varejo no
Brasil, com atuação em diversos Estados e número de colaboradores que ultrapassa
20 mil. Sua atuação é sustentada por distintas unidades de negócio, que permitem
atender às necessidades de consumidores de diferentes regiões e classes
socioeconômicas.
A N1 é uma das maiores unidades de negócio do grupo G e foi criada a partir
de processo de fusão iniciado há mais de três anos. O contrato de associação do
Grupo com essa unidade de negócio estabelece regras de governança que prezam
pelo respeito à cultura anterior da unidade, que, assim como o grupo G, tem história
superior a 50 anos.
A unidade de negócio N2 foi estruturada há dois anos, após a fusão do grupo
G com a unidade de negócio N1. Não era de expertise de nenhum dos negócios do
grupo, mas se fortaleceu com a fusão do grupo com N1, pois esse movimento gerou
sinergias importantes nos processos de vendas que envolvem N2. Vale ressaltar
que a unidade N1 tem participação acionária relevante de N2. Entretanto, durante as
entrevistas de coleta de dados, não se nota influência de gestão de N1 sobre N2, a
não ser por meio de fóruns de governança corporativa.
A unidade de negócios N3 é caracterizada por três formatos de negócios
distintos, um deles estabelecido recentemente e dois deles estabelecidos há mais de
12 anos, por meio de aquisições e fusões. No momento da coleta de informações
observa-se que a estrutura de gestão de pessoas dessa unidade de negócio se
utiliza de recursos e ferramentas desenvolvidos pela unidade de negócio N4.
45. 42
A unidade de negócio N4 é caracterizada ainda por formatos de negócios
diferentes, nesse caso mais de cinco. Parte desses formatos expandiu-se por meio
de fusões e aquisições, ao longo dos diversos anos de história do grupo. A unidade
de negócio ainda é composta pelas primeiras iniciativas de negócio do grupo G, que
iniciaram-se há mais de 50 anos.
Por último, a unidade de negócio N5 foi estabelecida há cinco anos por meio
de fusão com o grupo G. Primeiramente, o controle acionário foi compartilhado entre
o grupo G e os fundadores de N5 antes da fusão, mas há dois anos o controle
acionário passou a ser integralmente do grupo G. A unidade trabalha com apenas
um formato de negócio e tem planos importantes de expansão para os próximos
anos.
4.2 Percepção sobre princípios de gestão de pessoas
Primeiramente, propõe-se analisar a percepção dos líderes de Recursos
Humanos sobre os princípios de gestão. De acordo com Fischer (2002), os
princípios de gestão estão relacionados à definição dos valores da organização e às
diretrizes estratégicas de gestão de pessoas.
Os líderes de todos os negócios sabem quais os valores da organização, mas
parte dos líderes questiona a real aplicabilidade dos valores às unidades de negócio.
O RH1 menciona que tem mais certeza dos valores do N1 do que dos valores
do grupo. Ressalta que há diretrizes estratégicas e valores compartilhados apenas
por meio do conselho de administração, ou seja, “não são diretrizes que
necessariamente contribuem para o sucesso do N1, mas que são impostas por
desejo do grupo G”.
Como a unidade de negócio N1 passou por mudanças recentes com relação
à governança corporativa, a proximidade de N1 com as diretrizes do grupo G se
intensificou. De acordo com RH1, o maior contato com outras práticas e diretrizes
que não eram comuns à N1 começou a modificar diretrizes, políticas e práticas de
RH.
46. 43
Fischer (2002) defende que a maior ou menor formalização de elementos de
gestão de pessoas na empresa dependem do grau de consciência que a empresa
tem de agir organizadamente sobre o comportamento humano no trabalho. No
discurso de RH1, quando se menciona que “a empresa não tinha a missão e os
valores definidos e divulgados e por isso iniciou um trabalho de construção”,
observa-se que a proximidade com o grupo G trouxe maior nível de consciência
sobre a necessidade, e que o processo de fusão acelerou a evolução do modelo de
gestão de pessoas de N1.
De acordo com RH1, não existe para N1 coparticipação na construção das
diretrizes de gestão de pessoas para o grupo G. O distanciamento entre o que se
acredita como diretrizes corporativas de G e o que se pratica em N1 gera a
necessidade de criação de diretrizes específicas para N1. Diretrizes que respondem
às reais exigências do negócio em termos de gestão de pessoas.
Quando questionado sobre a aplicabilidade dos valores definidos por G para
todos os negócios, a posição de RH1 é de que houve a divulgação de valores para
todos os negócios, mas que os valores foram apenas oficializados, não
institucionalizados em N1. A unidade N1 buscou definir e institucionalizar valores,
por meio de distinto programa formal de desenvolvimento. O outro programa
pretende tornar tangíveis alguns atributos para serem princípios norteadores de
comportamento, e que simplesmente não foram chamados de “valores”. Entretanto,
são atributos que na prática se relacionarão aos comportamentos esperados, e que
contribuirão para o alcance dos objetivos do negócio da unidade N1.
O RH4, em sua entrevista, apresenta elementos de valores organizacionais
de maneira bastante parecida com RH1. A unidade N4 admitiu ter diretrizes
específicas para que o comportamento esperado seja compreendido e praticado por
todos os níveis. Como se trata de negócio em expansão, com diferentes formatos, a
exigência de posicionamento diferente faz os perfis profissionais desejados e as
necessidades de gestão de pessoas serem diferentes dentro da mesma unidade de
negócio. Sendo assim, RH4 afirma que cria diretrizes específicas para os diferentes
formatos, e que o corporativo do grupo G não tem envolvimento na definição das
diretrizes.
47. 44
De acordo com Berger e Luckmann (1985), a cultura organizacional precisa
ser interiorizada, o que implica identificação pelos outros e autoidentificação. Por
isso, de acordo com Fleury e Sampaio (2002), em processos de fusão, a mesma
forma de administrar traz resultados diferentes nos diversos negócios. O que não
parece ser diferente no grupo G. Os modelos de gestão de pessoas nesse ambiente
mostram-se constituídos mais intensamente por elementos específicos do que por
elementos compartilhados.
No caso da unidade N1, o entrevistado apresenta evidências de que acredita
que a área de Recursos Humanos não tem a legitimidade e a penetração essenciais
ao negócio para o cumprimento pleno de seu papel. RH1 justifica o fato na
desconfiança dos dirigentes frente ao processo recente de mudança no controle
acionário, em que o grupo G passa a ter mais influência no negócio, e parte da área
de Recursos Humanos é oriunda de outros negócios e da corporação do grupo G.
No contexto, por mais que RH1 ainda entenda que há um conjunto de diretrizes
estratégicas compartilhadas pelo corporativo para todos os negócios, pouco acredita
na efetividade da aplicação dos princípios de gestão em sua unidade.
A posição do RH1 é de que, dado que o momento de cada um dos negócios
do grupo é bastante diferente, o nível de consciência dos negócios sobre as
necessidades de gestão de pessoas é igualmente diferente. Acredita que deveria ser
papel do corporativo de Recursos Humanos definir estratégias e diretrizes de gestão
de pessoas que respondessem às exigências específicas dos negócios. RH1 afirma
que na prática a área corporativa de Recursos Humanos desenha diretrizes lineares
que são oficializadas, mas, por não responderem aos anseios reais do momento,
são pouco institucionalizadas nos diversos negócios.
O RH2 não percebe ainda se os valores oficializados pelo grupo G são
aplicáveis à sua unidade de negócios. Entende-se que há busca de N2 para
absorver melhores práticas do grupo e dos demais negócios por meio das diretrizes
estratégicas de gestão de pessoas, compartilhadas para implementação nos
diversos negócios.
Em N2, as diretrizes não são vistas como imposições, termo mencionado pelo
RH1, mas como opções. O RH2 ressalta que construiu relação de parceria com o
48. 45
grupo G, embora por razões de governança corporativa e posição acionária pudesse
optar, assim como N1, em receber diretrizes somente por meio de caminhos formais
da governança, como os conselhos de administração.
RH2 ressalta que o relacionamento com o grupo G lhe permite avaliar o que
de fato tem sentido para a realidade do negócio e aplica, em seu tempo, programas
centrados nas diretrizes escolhidas e não impostas.
Ao comentar sobre as diretrizes estratégicas de gestão de pessoas, o RH2
afirma que o dinamismo dos negócios não permite a fixação de uma cultura única,
por isso há dificuldade em definir diretrizes lineares. As culturas dos negócios são
mais fortes do que uma cultura de grupo, por isso os programas devem ser
selecionados em resposta às realidades e não ao desejo corporativo.
A unidade N3, de acordo com RH3, é composta por subculturas muito
diferentes. Os diferentes formatos da unidade de negócio resultam em valores e
diretrizes corporativas aplicadas com certas adaptações.
O RH5 acredita e trabalha em favor dos valores e diretrizes de gestão de
gente do grupo G, mas relata a dificuldade de implementação dos valores e
diretrizes em sua unidade de negócio. A unidade N5, de acordo com o entrevistado,
é impactada pelo posicionamento de seus dirigentes, que não valorizam o fator
humano no estágio de transformação do negócio. Na teoria, Leo (1999) confirma
que quando a bagagem de desenvolvimento organizacional é vista como secundária
e menos importante, a área de Recursos Humanos tem, de fato, maior dificuldade
em atuar frente a processos de aprendizagem e transformação organizacional.
A unidade N5 passou recentemente por mudança de controle acionário. De
acordo com Blenko et. al. (2010), o valor das empresas se relaciona à soma das
decisões tomadas, sendo seus recursos responsáveis por decisões essenciais à
manutenção e competitividade do negócio. Fischer (2002) complementa que o
modelo de gestão de pessoas deve desenvolver e estimular as competências
humanas imprescindíveis para as competências organizacionais da empresa se
viabilizarem, gerando maior competitividade. No contexto, o RH5 entende que os
valores da organização e parte das diretrizes corporativas de desenvolvimento
49. 46
servem como direcionadores para o processo de transformação da liderança, o que
implicaria competências indispensáveis para o alcance da competitividade esperada
do negócio. O RH5 menciona durante a entrevista que tem ciência do que a
organização espera, a partir de sua atuação: consolidar nessa unidade a prática dos
valores e o desenho de programas baseados nas diretrizes do grupo G.
Ainda assim, o RH5 entende haver valores complementares e específicos a
N5, e diretrizes corporativas que não deveriam ser diretrizes por não serem
aplicáveis aos diversos negócios.
Como contraponto, RH4 mostra que, em sua opinião, as diretrizes são feitas
para serem “traduzidas” pelas áreas de Recursos Humanos. A responsabilidade
sobre as adaptações e sua efetividade se prende à unidade de negócio. Mais do que
avaliar se são aplicáveis, fala-se em entender as diretrizes como norteadores que
devem ser adaptados e aplicados em todos os negócios, sem restrições, apenas
levando-se em conta a realidade atual do negócio.
De acordo com Schein (2009), uma cultura integrada é aquela em que toda a
organização compartilha um único conjunto de suposições; uma cultura diferenciada
é uma organização em que subculturas poderosas discordam em certas questões
cruciais, e uma cultura fragmentada é a organização que tem subculturas muito
grandes e nenhum conjunto amplo de suposições compartilhadas. A partir das
entrevistas, observa-se que as diretrizes estratégicas do grupo não parecem ser
aceitas integralmente e compartilhadas entre os diversos negócios, indício de uma
cultura diferenciada. Ainda assim, o grupo G é claramente detentor de diretrizes
lineares conhecidas por todos os negócios, o que demonstra modelos de gestão de
pessoas convivendo em cultura não fragmentada, pois, de maneira geral, há
discussão sobre as diretrizes e sua aplicabilidade em cada um dos negócios.
Ao avaliar o grau de autonomia dos líderes de Recursos Humanos
contrapondo-o às possíveis vantagens de se ter mais alinhamentos estratégicos com
o grupo G, não há visão uniforme sobre vantagens e necessidade de maior ou
menor autonomia. Como mencionado por Thomson (1999) sobre esse aspecto, os
negócios deveriam estar direcionados à produção e ao desenvolvimento de
capacidades que talvez nunca fossem desenvolvidas isoladamente (antes da fusão,
50. 47
aquisição ou parceria). Entretanto, os negócios opinam de maneira bastante
divergente sobre as possíveis vantagens de sinergia e aprendizado compartilhado.
O RH1 menciona que, no momento de mudança vivido por N1, os
alinhamentos deveriam acontecer de forma muito mais intensa, pois atualmente as
decisões são tomadas pelo corpo diretivo do negócio, sem elementos suficientes
para a tomada de decisão sobre processos de gestão de pessoas. As decisões, se
compartilhadas, estariam direcionadas à evolução do modelo de gestão de pessoas
e não à preservação de modelo de gestão de pessoas que não condiz com as
práticas do grupo G.
De acordo com RH4, o grupo sempre viveu ciclos de maior ou menor
centralização de diretrizes estratégicas de gestão de pessoas, nos quais há distintas
exigências de alinhamentos. Atualmente, a unidade N4 não exige processos
estruturados, o que, de acordo com RH4, é premissa para maior descentralização e
autonomia da unidade de negócio frente às questões de Recursos Humanos.
Enquanto os processos não amadurecem, a unidade N4 depende da área
corporativa. Segundo RH4, não evolui a forma de trabalhar gestão de pessoas no
ambiente com diferentes subculturas, o que enfraquece a disseminação de
diretrizes, haja vista a falta de profundidade sobre as reais necessidades dos
negócios e o controle da efetividade de suas diretrizes e ações corporativas.
De acordo com Fischer (2002), a busca de padrão de desempenho e
comportamento no trabalho se intensifica à medida que os negócios se sofisticam. O
RH4 apresenta em seu discurso a exigência cada vez mais relevante de construir
competências para um padrão de comportamento coerente, que diferencie sua
unidade de negócio, resposta que não enxerga na corporação, e não entende que
há ganhos de aprendizado e sinergia com as aquisições e fusões que dividiram o
grupo em diversos negócios.
O RH5, ao comentar a questão, utiliza com grande frequência a expressão
“discernimento”. Entende-se que os alinhamentos são válidos, porém superficiais,
mas que cabe a cada líder de Recursos Humanos o discernimento sobre o que é
aplicável. No caso da unidade N5, o RH5 entende que as diretrizes servem de
exemplo para atuação diferenciada e que contribuem significativamente para, num
51. 48
processo longo de gestão da mudança, evoluir competências e capacidades que o
negócio não tinha antes da aquisição.
O RH3 apresenta elementos de interferência entre os negócios, afirmando
que, como os negócios têm dimensões e regras de governança corporativa
diferentes, há negócios com o modelo de gestão de pessoas nitidamente
enfraquecido pela corporação e por outros negócios. A unidade N3 utiliza serviços
de Recursos Humanos de outros negócios, como o N4, por exemplo. Por ter
estruturas mais enxutas de gestão de pessoas, o N3 entende que a exigência de
alinhamentos com a corporação e outros negócios reduz a autonomia além do nível
suficiente para os ganhos de sinergia e aprendizado entre a corporação e os
negócios.
O RH2, por sua vez, trata desse aspecto como fonte de aprendizado e
capacidades na corporação, entendendo os alinhamentos como necessários, mas
não como imprescindíveis para a evolução do modelo de gestão de pessoas da
unidade N2.
Observa-se que as diferenças de percepções entre os entrevistados, gestores
de gestão de pessoas, corroboram os autores Aidar, Brisola, Motta e Wood Jr.
(2009), pois esses autores afirmam que a criação de sinergias entre culturas
diversificadas é uma das maiores dificuldades que os líderes encontram. Segundo
os autores, há estudos que comprovam que o respeito à cultura onde se quer operar
é bom caminho para a conquista de vantagens competitivas.
4.3 Análise das políticas e processos de gestão de pessoas
Ao analisar os diversos modelos de gestão de pessoas por meio dos
elementos mais tangíveis propostos por Fischer (2002) – políticas e processos de
gestão de pessoas –, percebe-se configuração bastante diferente entre os negócios
do grupo G.
Primeiramente, os entrevistados foram questionados sobre a definição de
políticas relacionadas a um conjunto de processos de gestão de pessoas em sua
unidade de negócio, buscando entendimento sobre o quanto os líderes definem