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Palestras proferidas no simpósio OS PURITANOS em 1995
Joel R. Beeke
PUBLICAÇÕES EVANGÉLICAS SELECIONADAS
Caixa Postal 1287 10159-970-São Paulo-SP

Ao irmão, amigo e conselheiro, Olin Coleman, grande incentivador da
literatura reformada e puritana.
Aos que batalham pela fé reformada, que desejam ver um dia estabelecidas, nesta
nação, as antigas doutrinas da graça, uma reforma na igreja brasileira e a prática de
uma evangelização bíblica sem adições ou subtrações.

ÍNDICE
Prefácio
1 .A Tocha da Evangelização Acesa no Novo Testamento
2. A Tocha da Evangelização Reacesa pela Reforma
3.A Tocha Levada pelos Puritanos
(A Mensagem da Evangelização Puritana)
4.A Tocha Levada pelos Puritanos
(O Método da Evangelização Puritana e a Disposição Interna do Coração)
5.A Tocha da Evangelização Passada para Nós
PREFÁCIO
Após 40 anos no evangelho, defrontei-me com a literatura puritana e reformada. Tal foi o
impacto em minha vida que me senti como alguém que vai reclamar seus supostos direitos e se
depara, para sua surpresa, com a realidade de que estava errado, e que seus direitos eram falsos.
Senti-me envergonhado do movimento evangélico superficial, humanista, vivenciado há tanto
tempo em nosso meio e que não considera a soberania de Deus, mas coloca no homem o poder de
realizar.
Ao ler a literatura puritana e reformada os meus olhos foram abertos para ver o caminho
que trilhava. Percebi logo que boa parte do movimento evangélico moderno, mesmo falando da
graça de Deus, não a compreende como ela é apresentada na bíblia. Afirma que, pela graça, todos
os homens têm a capacidade de crer e aceitar o evangelho; é uma decisão deles. Por isso Dr. M.
Lloyd-Jones afirmou: "Embora comecem com a graça, na seqüência a negam". Percebi que o
movimento evangélico moderno fala da Bíblia como a única regra de fé e prática mas não
compreende o significado de Sola Scriptura, como os reformadores a ensinavam, e era vivida pelos
puritanos de forma madura.
Muito do movimento evangélico moderno tem feito acréscimos, adições às Escrituras,
como fizeram os judeus na época de Jesus, quando citavam mais de 600 leis que não estavam
naTorah, ou mesmo como a igreja católica romana, com toda sua tradição maligna, que tem levado
milhões de pessoas à condenação, por causa de ensinos apócrifos, antibíblicos, esquecendo-se de
que Deus trará maior juízo àqueles que ensinam falsidade (Tiago 3:1). Recentemente um grupo de
congressistas questionou um famoso líder americano e professor de missiologia sobre suas práticas
na área de batalha espiritual e missões. Sua resposta foi: "É verdade que não está na Bíblia, mas
funciona". Creio que é exatamente este pragmatismo religioso, não bíblico, que domina em grande
parte nosso movimento evangélico, nossa prática cristã e especialmente nossa evangelização. Os
métodos evangelísticos não bíblicos, se estão funcionando, são considerados válidos. Será que
estamos esquecidos das palavras de Jesus que serão proferidas no dia do juízo contra aqueles que
evangelizaram de forma condenável, mesmo que bem sucedidos: "Nunca vos conheci"? (Mat.7:23).
Um dia comecei a ler sobre Pelágio, o herege dos séculos IV e V, que fora tão combatido
por Agostinho e por fim condenado pelo Concilio de Éfeso. Pelágio não só ficou conhecido por
negar o pecado original, mas especialmente pelas suas idéias do livre--arbítrio fundamental do
homem, que o faz capaz de querer e fazer (até mesmo o bem espiritual). Pelágio pensava a respeito
da graça como sendo apenas uma ajuda externa de Deus, do Espírito Santo, para a alma humana;
um tipo de ação que persuade o homem pela razão e o faz usar seu livre-arbítrio, sua capacidade de
obedecer ou não a lei de Moisés e os ensinos de Jesus. Para Pelágio, a predestinação divina é algo
que opera apenas de acordo com as qualidades das pessoas, as quais Deus prevê que terão. É algo
baseado no mérito das pessoas. Dessa forma a fé não é um dom, e sim, uma obra meritória para
levá-las à salvação. Assim, o homem pode tomar uma decisão por Cristo na dependência apenas de
sua própria vontade, independente de Deus. Ou seja, tudo depende do homem.
Quando tomei conhecimento de tudo isso, comecei aperceber que muita da nossa
evangelização é calcada em cima desses princípios, com apenas algumas mudanças
(semipelagianismo), como o reconhecimento do pecado original do homem, sua enfermidade moral.
Entretanto, continua defendendo que o homem é que dá o primeiro passo em direção a Deus, com
suas próprias forças e, que por isso, Deus o recompensará. Todo o sistema de apelo por decisões
está baseado nestes princípios, e não foi sem razão que Finney (pelagiano declarado) tenha sido o
iniciador desse sistema de convidar pessoas a virem à frente, usando o livre-arbítrio, como
demonstração de fé e conversão. Falar contra estas coisas hoje é provocar a ira de muitos. Os
grande pregadores e missionários batistas, congregacionais e presbiterianos do passado sempre
condenaram estes princípios não bíblicos, e a Igreja foi tremendamente abençoada por serem
defensores das antigas doutrinas da graça, defensores de um evangelho centralizado na soberania de
Deus, um evangelho que diz ser Deus o iniciador e consumador da nossa fé e da nossa salvação.
Infelizmente o semipelagianismo defendido por Armínio espalha-se no nosso meio e é
praticado por quase a totalidade da evangelização moderna. A situação é tão grave que raramente se
vêem programas de rádio e televisão, ou mensagens (com raras excessões) que pudessem ser
aprovados pelos reformadores e puritanos (congregacionais, batistas e presbiterianos) do passado;
nossos pais espirituais. Percebo que é algo natural, que vem da natureza humana corrompida, da
"sabedoria da carne", como dizia Martinho Lutero, a idéia de que o homem pode exercer fé por si
mesmo para ser justificado; que pode usar seu livre-arbítrio para ser salvo; que Deus não pediria
algo de nós (crer, arrepender--se), se nós não pudéssemos realizá-lo. Isto é pensar como Pelágio
(esquecem do Salmo 127:1-2; Mat.l6:17; 19:26; Joãol:13; 3:27; 6:44-65). Toda esta visão
doutrinária e prática é incompatível com o pensamento do maior pregador da Inglaterra no século
XVIII, George Whitefield, que não temia afirmar que o homem natural já nasce arminiano.
Preocupado com esta visão distorcida da evangelização, e a ironia e desprezo da parte de
muitos para com o ensino bíblico calvinista, praticado pelos grandes missionários batistas como
William Carey ou congregacionais como Robert Kalley (chamado de "O Lobo Calvinista") e
presbiterianos como Ashbel Green Simonton e os grandes pregadores do passado, o projeto Os
Puritanos realizou o seu simpósio anual em 1995 sobre o tema da evangelização bíblica e puritana.
Para isso foi convidado o Dr. Joel Beeke, pastor reformado em Grand Rapids, Michigan, Estados
Unidos, doutor e mestre, estudioso da história e do ensino reformados desde os nove anos de idade,
para abordar este tema tão importante que é a evangelização reformada.
O Dr. Joel Beeke apresenta de forma simples e piedosa, a necessidade da evangelização
fundamentada na soberania de Deus, e que enfatize a responsabilidade do homem. Neste aspecto
Calvino nos ensina a sermos evangelistas e que a doutrina da eleição não leva à passividade na
evangelização; pelo contrário, nos leva à atividade. O autor afirma que nós não somos responsáveis
pelos resultados da nossa evangelização, e sim, pela fidelidade da mensagem e pelos métodos que
usamos. Disso prestaremos conta. Portanto, o que devemos fazer é lançar a semente e esperar no
Senhor. Os resultados pertencem a Deus, é verdade, mas temos de ir em busca das ovelhas de
Cristo. A eleição não exclui os meios pelos quais Deus chama os Seus de forma eficaz. No túmulo
de David Livingstone está escrito o que o motivou ser missionário na África: "Ainda tenho outras
ovelhas, não deste aprisco; a mim me convém conduzi-las" (João 10:16). Assim como Jesus veio ao
mundo em busca de Suas ovelhas e por elas morreu, Livingstone foi à África em busca das ovelhas
do Senhor.
Este livro pode ser um grande orientador de como podemos evangelizar para a glória de
Deus e nos despertar para sermos verdadeiros evangelistas, obedientes a Cristo e ganhadores de
almas. Que possamos levar esta tocha da evangelização como os cristãos primitivos, como os
reformadores e puritanos fizeram.
Agradeço a Deus ter conhecido e ouvido o Dr. Joel Beeke; suas palavras eram carregadas de
amor, piedade e firmeza doutrinária. Todos nós do Projeto Os Puritanos aprendemos muito com o
Dr. Beeke sobre o que é ser um evangelista como a Bíblia recomenda.
Caro leitor, aproveite das palavras escritas neste livro e, com a ajuda de Deus, seja um
evangelista fiel.
Manoel Canuto
Coordenador do Projeto Os Puritanos

1
A Tocha da Evangelização Acesa no Novo Testamento
"Jesus, aproximando-se, falou-lhes, dizendo: toda a autoridade me foi dada no céu e na
terra. Ide, portanto, fazei discípulos de todas as nações, batizando-os em nome do Pai e do Filho e
do Espírito Santo; ensinando-os a guardar todas as cousas que vos tenho ordenado. E eis que estou
convosco todos os dias até à consumação dos séculos." - Mateus 28:18-20
"E assim, se alguém está em Cristo, é nova criatura: as coisas antigas já passaram; eis que
se fizeram novas. Ora, tudo provém de Deus que nos reconciliou consigo mesmo por meio de
Cristo, e nos deu o ministério da reconciliação, a saber, que Deus estava em Cristo, reconciliando
consigo o mundo, não imputando aos homens as suas transgressões, e nos confiou a palavra da
reconciliação. De sorte que somos embaixadores em nome de Cristo, como se Deus exortasse por
nosso intermédio. Em nome de Cristo, pois rogamos que vos reconcilieis com Deus. Àquele que não
conheceu pecado, ele o fez pecado por nós; para que nele fossemos feitos justiça de Deus." - 2
Coríntios 5:17-21

Introdução
Evangelização Reformada é um tema bastante vasto. Muitas pessoas chegam a negar a sua
existência, pois não crêem que exista tal coisa. Nossa esperança é, por um lado, não exagerar a
força da evangelização reformada, e por outro, não diminuir as suas fraquezas. Este assunto pode
melhor ser apresentado através de uma ilustração. Na América existiu um pastor que era um homem
de Deus, mas tinha um problema terrível. Gostava de constantemente exagerar nas sua afirmações.
Seu conselho se reuniu, e procurou conversar com ele sobre o problema. O pastor estava consciente
desta sua falha e via que precisava de ajuda. Após conversarem, chegaram ao seguinte acordo:
quando o pastor, do púlpito, exagerasse em alguma coisa, um dos presbíteros daria uma leve
tossida. Então o pastor saberia que deveria "maneirar" um pouco nas suas afirmações, pois estaria
além dos limites da realidade. Quando chegou o domingo ele teve a sua chance de ser testado com
este sistema. O pastor começou a pregar sobre Sansão. Descrevia como ele pegara trezentas raposas
e como amarrou suas caudas. Estava muito envolvido na descrição desta cena e disse que quando
Sansão tomou as caudas das raposas para amarrá-las, estas caudas eram do tamanho dos braços
abertos de um homem (ele fez este gesto). Nesta hora o presbítero deu uma tossidinha. O pastor,
então diminuiu o gesto na tentativa de dizer que as caudas eram menores, mas mesmo assim ainda
exagerava. O presbítero novamente tossiu. Ele diminuiu o tamanho, porém ainda estava
exagerando. Nova tossidinha. O pastor, então, não se contendo, perguntou: "Irmão, afinal de contas
qual era o tamanho das caudas das raposas?".
Algumas pessoas dizem que a evangelização reformada não tem "cauda" e outros dizem que
sua "cauda" é imensa. Queremos lidar de uma forma bem realista com os pontos fortes e os pontos
fracos da evangelização reformada. Focalizaremos alguns princípios neo-testamentários de
evangelização. Eles estão de fato no Novo Testamento. Como foi que Calvino construiu em cima
destes princípios a sua própria evangelização, sendo pai da sistematização da verdade reformada e
também da sistematização da evangelização reformada? O que os puritanos têm a nos dizer sobre a
evangelização reformada? Como podemos tomar esta tocha da evangelização reformada, hoje, e
passá-la adiante às nossas comunidades e à nação?

Definindo a evangelização
O que é a evangelização? Há muitas definições que são dadas. Poderíamos passar muito
tempo só definindo-a. Mas quero dizer algumas coisas. Em primeiro lugar não devemos definir a
evangelização nos termos daqueles que vão receber a mensagem. Isso pode nos levar a
comprometer a mensagem e a mudá-la. Em segundo lugar, também não devemos definir a
evangelização em termos dos seus resultados. Pois dessa forma, você diria que William Carey não
estava fazendo evangelização nos primeiros anos em que ele esteve na índia, porque por muitos
anos ele não viu nenhum convertido. Em terceiro lugar, não devemos definir a evangelização em
termos dos métodos usados. Dessa forma, se pensarmos assim, os fins vão justificar os meios e nós
vamos terminar naquilo que é tão comum hoje, a chamada "evangelização pragmática". Essa
"evangelização" está mais preocupada com os números do que com a verdade. Nós precisamos
definir a evangelização em termos do significado da própria palavra.
Evangelização vem de uma palavra grega que significa "boas novas". Assim, poderíamos
definir a evangelização como sendo a proclamação das boas novas, a proclamação do evangelho.
Nele buscamos, pela graça de Deus, a conversão de pecadores. Num sentido mais amplo podemos
dizer que inclui a edificação dos filhos de Deus. Inicialmente, a evangelização procura a conversão
de pecadores e no sentido mais amplo, procura o discipulado daqueles que já nasceram de novo.
Esta palavra grega aqui referida, euaggélion, está registrada 124 vezes no Novo Testamento.
Portanto, a Bíblia é um livro evangelístico. Nosso Deus é um Deus evangelístico.

A tocha acesa no Velho Testamento
Na verdade, a tocha da evangelização foi acesa originalmente, no Velho Testamento. Em
primeiro lugar foi acesa pelo próprio Deus na primeira promessa messiânica que Ele deu a Adão e
Eva, lá no Éden. Vemos isso em Gênesis 3:15: "Porei inimizade entre ti e a mulher, entre a tua
descendência e o seu descendente. Este te ferirá a cabeça, e tu Ihe ferirás o calcanhar". Aqui, Deus
Jeová está agindo como um Deus evangelista. Ele está interceptando Adão e Eva numa relação
pactuai que eles estavam tendo com satanás e traz para eles a promessa do Messias que haveria de
vir: a semente da mulher que haveria de esmagar a cabeça da serpente. Assim, Deus acendeu a
tocha antes mesmo de Adão deixar o paraíso e, ainda lá, Ele revela Seu Filho que haveria de vir. Ele
próprio é essa tocha!
Para que nós possamos lançar um bom alicerce, devemos dizer que o próprio Deus é o
evangelizador por excelência. Através do Seu próprio Filho, e por meio dEle, o coração de Deus
bate de uma forma evangelística. Ele não pode negar-Se a Si mesmo. Dessa forma Deus demonstra
que tem os meios para levar avante este projeto evangelístico. Ele leva à frente estas boas novas
através de todo o Velho Testamento. Através de toda a linhagem de Sete, Noé e de todos os
patriarcas; por sua vez, esses patriarcas passam essa tocha para os filhos de Israel. A nação de Israel
leva a tocha como quem leva a alma da evangelização. Israel é a alma que conduz à evangelização
nos tempos do Velho Testamento, no meio do mundo gentio. Por fim, o último profeta do Velho
Testamento, João Batista, foi privilegiado porque ele levou a tocha da evangelização à era do Novo
Testamento.

A tocha acesa no Novo Testamento
Logo que o Novo Testamento se abre, nós encontramos a tocha, a Pessoa do Senhor Jesus
Cristo, que é "as boas novas", o evangelho; Ele é tanto o Salvador quanto a salvação. Quando Cristo
começa a realizar o Seu ministério, bem cedo, ele começa a dar aos Seus discípulos instruções bem
específicas quanto ao levar a tocha da evangelização. Quando Jesus ressuscitou dos mortos, deulhes a grande comissão como vemos em Mateus, capítulo 28. Esta grande comissão pergunta e
responde importantes questões.
Por que e como evangelizamos?
A nossa resposta é esta: evangelizamos por compaixão aos homens e mulheres que estão
perecendo. Evangelizamos como Cristo, pois Ele chorou sobre a cidade de Jerusalém e nós
devemos chorar sobre Recife, Rio de Janeiro, São Paulo e sobre todo o Brasil. Quando vemos
milhões que estão morrendo em nossa volta, estranhos a Cristo, sem Deus e sem esperança no
mundo, alienados de Deus, inimigos de Deus, rebeldes como outrora nós também fomos, nossos
corações precisam sangrar; nossos olhos, chorar; nossas orações, subir aos céus e assim seremos
motivados a evangelizar por causa da compaixão.
Há outros motivos profundos que nos impelem à evangelização. Mateus, capítulo 28, deixa
de forma absoluta e clara a grande motivação que é uma ordem de Jesus. Se nós amamos alguém,
desejamos agradar-lhe e obedecer-lhe. Se amamos a Cristo queremos obedecer à Sua ordem e fazer
a Sua vontade. Quando Cristo diz, "ide e ensinai", a Sua ordem em si é a nossa grande motivação.
Naturalmente essa grande motivação é uma lição que nos vem através do conceito da soberania de
Deus. Sempre fomos uma minoria na tradição reformada e uma outra minoria procura usar a
soberania de Deus de uma forma, às vezes, não bíblica. Calvino diria que isso é como um "veneno"
que está sobre, o conceito da soberania de Deus. Esta minoria, às vezes, procura diminuir a
importância e o papel da soberania na salvação das pessoas. A ilustração clássica disso é o exemplo
de William Carey. Quando ele explicou seu chamado para ir para a Índia, um dos que estavam
naquela reunião lhe disse: "Sente-se, jovem, se Deus quer realmente salvar a Índia, Ele pode salvála sem a ajuda de William Carey ou de qualquer outro". Esta é uma afirmação terrível. Percebam
que aquelas pessoas estavam separando a doutrina da soberania de Deus dos meios através dos
quais essa soberania é exercida.
Os meios que Deus usa no exercício da Sua soberania são homens pecadores como nós.
Jesus disse: "Ide e ensinai". Jesus não está dizendo que se deixe a evangelização na esfera da
soberania de Seu Pai. Também não está dizendo que devemos ficar apenas em uma sala ensinando.
Há pessoas que têm um grande dom de ensinar, mas não saem para levar a mensagem de boas
novas. Por outro lado, uma das grandes calamidades da Igreja hoje, é o fato de igrejas, que têm
grandes alvos evangelísticos, possuirem líderes com tão pouca capacidade de ensino. Da mesma
forma, igrejas que têm muitos com o dom de ensinar, freqüentemente apresentam baixos alvos
evangelísticos. Precisamos voltar à ênfase de Jesus, que era a colocação das duas coisas juntas - ir e
ensinar! Estas duas ações precisam estar juntos. Precisamos ser motivados à evangelização
reformada pela obediência ao nosso Mestre.
Quero citar mais um motivo. Devemos ser impelidos pelo nosso relacionamento com Deus.
Paulo diz que se conhecemos a ira de Deus, nós precisamos persuadir os homens, pois ele sabia
como são os homens e mulheres sem Deus. O apóstolo Paulo foi um deles, mas sabia o que
significava ser salvo e ter um novo relacionamento com Jesus. Sabia a terrível realidade de uma
alienação de Deus; também sabia o poder da reconciliação com Deus. Em 2 Coríntios, . capítulo
5,ele fala de uma forma poderosa desta reconciliação. Nos versículos 20-21 ele diz: "De sorte que
somos embaixadores em nome de Cristo, como se Deus exortasse por nosso intermédio. Em nome
de Cristo, pois, rogamos que vos reconcilieis com Deus. Aquele que não conheceu pecado, ele o fez
pecado por nós; para que nele fôssemos feitos justiça de Deus". Paulo estava, pois, motivado por
aquela paixão e pelo desejo ardente de agradar a Cristo, como uma criança em profunda reverência
por seu pai. Como fruto de uma grande apreciação e amor por Cristo.
Todos os diferentes aspectos dos atributos de Deus e o relacionamento daqueles que crêem
neles, motivaram Paulo a evangelizar. Ele sempre procurou glorificar a Deus em todas estas coisas:
a soberania de Deus, o amor de Deus, a graça de Deus. Esta foi a motivação mais profunda da
evangelização de Paulo. Não somente uma compaixão humana, não somente a ordem de Cristo,
mas um desejo ardente de glorificar a Deus a quem ele conhecia. Ele tinha absoluta certeza de que
qualquer um que cruzasse o caminho de Cristo, um dia estaria perante o julgamento de Deus e teria
de responder diante dEle por todo o bem ou mal que fizera no seu corpo, nesta vida.
Quando nós, pastores, ficamos de pé diante da nossa congregação, semana após semana,
quão prontos estamos para esquecer que, mesmo que se passem cem anos, se o Senhor demorar a
voltar, nenhuma pessoa na nossa congregação vai escapar do julgamento final de Cristo? Em toda a
nossa evangelização, estamos lidando com almas viventes que poderão estar alienadas de Deus para
sempre, ou que irão usufruir da presença gloriosa de Jesus eternamente. Há uma diferença radical
entre estas duas coisas. A grande gloria que Deus recebe na conversão de pecadores motivava Paulo
a fazer missões e evangelizar.
A quem evangelizar?
A grande comissão responde a uma segunda pergunta. A quem devemos evangelizar?
Mateus nos diz que devemos ir a todas as nações. Ide e ensinai a todas as nações. Há algo
maravilhoso neste mandamento para a evangelização reformada, porque o evangelista reformado
não fica apenas vendo a soberania de Deus no ato de eleger, pois este ato não é algo que impede o
sucesso da evangelização, e sim, algo que o confirma. Quando Cristo nos envia a todas as nações,
Ele vai reunir delas, aqueles que vão servi-lo e temê-lo na Sua própria Palavra. Ele vai usar a
loucura da pregação para salvar aqueles que devem e precisam crer. Que encorajamento
maravilhoso para nós evangelizarmos, pois onde formos passando no meio desta torrente de
depravação humana, não há nenhuma expectativa em nós ou na semente em si. Algumas sementes
vão cair em solo rochoso ou à beira do caminho, e a nossa única esperança de que Deus Se agrade é
que Ele venha a usar-nos como barro em Suas mãos para cumprir o Seu propósito de amor e
soberania em termos da eleição. Dessa forma, Deus vai atrair pecadores a Si mesmo.
Em Marcos 16:15 ("Ide por todo o mundo e pregai o evangelho a toda criatura") a grande
comissão diz algo um pouco diferente. Pregar o evangelho a toda criatura! Mateus disse, "a todas as
nações". Marcos particulariza a grande comissão. A ênfase é que o evangelho deve, não só ser
levado a todas as nações, mas a todo homem, mulher, moço e moça que habitam nelas. O evangelho
é o oferecimento de Deus aos pecadores. São as boas novas de Cristo e está disponível para todos.
São boas novas de que Cristo os está convidando a virem a Ele como estão. As boas novas,
entretanto, não consideram que cada pessoa tem força em si mesma para ir a Deus. As boas novas
não afirmam que a pessoa é salva meramente por uma "decisão" por Cristo. A mensagem das boas
novas não é que você vai declarar a cada um que ele está salvo. Não significa contar a cada um, que
definitivamente Cristo morreu por você, não é simplesmente levar as pessoas a saberem que Cristo
morreu por elas. Muitos pregadores pregam assim. Eles dizem: "Jesus morreu por todos e tudo que
você tem de saber é crer que Ele morreu por você ". O que está errado com isso? No momento em
que eu creio que Cristo morreu por cada um, então, eu posso concluir que há uma espécie de acordo
que afirma: se Ele morreu por todos, então, morreu também por mim. Os pregadores que pregam
assim, persuadem as pessoas a pensarem que estão salvas, mesmo sem ter recebido nenhum toque
do Senhor. Contudo, apenas um assentimento intelectual sem essa bênção da fé salvadora, não
salva.
Uma fé salvadora pessoal, um arrependimento pessoal, uma convicção pessoal dos pecados
e uma rendição diante de Deus de todas as suas justiças que são trapos diante de Deus, são
ingredientes necessários para que você encontre a real salvação. Se você não compreende o que é
ser um pecador perdido e condenado perante Deus, como pode apreciar a riqueza do evangelho?
Dessa forma, a grande comissão nos encoraja a levar o evangelho a todas as nações, ao homem
como um ser integral. Não leve o evangelho a pressionar apenas a vontade do homem, pois o
evangelho afeta a vontade, as afeições, a totalidade do ser humano. Posteriormente veremos como
os reformadores e puritanos praticaram esse tipo de evangelização. Quando eles apresentavam a
Cristo de uma forma integral para um ser integral, acabavam proclamando todo o conselho de Deus.
Onde iniciar?
Finalmente, a grande comissão certamente inclui que o evangelho precisa ser levado de
preferência às ovelhas perdidas da casa de Israel, como lemos em Mateus 10:6. Assim, quando
Jesus deu a ordem de evangelizar aos Seus discípulos, Ele começou com Jerusalém e de lá deviam
levar o evangelho a Samaria, Judéia e até os confins da terra. Traduzindo a idéia para os dias de
hoje, esta ordem diz que nós não devemos apenas evangelizar os judeus mas devemos começar em
nossos lares, em nossas igrejas. Dentro do ministério pastoral devemos enfrentar o fato de que
dentro da Igreja de Deus há muitas pessoas que não São verdadeiramente salvas. Talvez tenham até
sido batizadas, talvez sejam membros comungantes, vivam uma vida decente, todavia não foram
salvas. Podem até ter um bom conhecimento bíblico e até serem professores de Seminários,
pastores, ou presbíteros, mas não são diferentes de Nicodemus que foi um mestre em Israel e no
entanto não havia nascido de novo. Jesus diz ainda hoje a cada um de nós e a nossas igrejas: "vocês
precisam nascer de novo". É possível que nossa a evangelização, às vezes, seja muito fraca porque
há pouca experiência do que significa nascer de novo.
Jesus passou a Sua tocha da evangelização para Seus apóstolos e discípulos e a acendeu de
forma maravilhosa no dia de Pentecoste e nas semanas que se seguiram. O mundo precisa ser
colocado em chamas por esta tocha da evangelização. No dia de Pentecoste Deus vindicou a Sua
própria Palavra conforme lemos em João 3:16: "Porque Deus amou o mundo de tal maneira que
deu seu Filho unigênito para que todo aquele que nele crê não pereça mas tenha a vida eterna".
Milhares de pessoas foram feridas nas suas consciências e foram levadas a um arrependimento
autêntico naquele dia, depositando sua fé em Cristo. Mas a novidade que começou no dia de
Pentecoste foi disseminada e começou a usar de uma forma poderosa o apóstolo Paulo para levar
avante a tocha da evangelização.
Paulo, o evangelista
Paulo foi de modo peculiar qualificado para esta tarefa, talvez mais do que qualquer pessoa
da sua época. Ele entendia tanto a — mentalidade hebraica, quanto a mentalidade helênica. Ele teve
um "seminário" de três anos na Arábia, durante o qual Deus o treinou e o moldou para ser o
apóstolo dos gentios. A atividade evangelística de Paulo, levando a tocha da evangelização, foi e
ainda é amplamente expandida hoje. Ele levou o evangelho aos seus irmãos na carne, levou-o até a
Ásia, Europa, e pela inspiração do Espírito Santo, trouxe a tocha até nós em suas Epístolas. É muito
importante tomarmos um pouco da evangelização de Paulo. A evangelização é algo muito
importante no ministério de Paulo e precisamos nos "agarrar" ao seu padrão de evangelizar. De uma
coisa nós não podemos fugir, quando lemos suas cartas: Paulo evangelizava de uma forma
doutrinária e teológica. Não evangelizava contando anedotas ou pequenas histórias. Há, hoje,
pessoas que afirmam que temos de colocar a doutrina de lado para podermos evangelizar. Pensam
que quando evangelizamos não devemos ser didáticos. Paulo rejeitou isso de forma prática. Grandes
porções de suas Epístolas estão preocupadas, por exemplo, com a lei. Ele faz com que uma
apresentação da lei seja seguida pela apresentação do evangelho e então aplica esta realidade à vida
dos seus leitores com ensinamentos éticos e experimentais. Esse é o padrão da evangelização de
Paulo.
Queremos apresentar aqui algumas ramificações deste padrão de evangelização que Paulo
usava.
Consciência teísta
O primeiro resultado do seu padrão evangelístico é: Paulo pressupõe, em todas as suas
cartas, uma consciência teista em cada pessoa. Na tradição reformada, somos profundamente
devedores a João Calvino e a Cornelius Van Til porque eles estabeleceram o que nós hoje
chamamos de teologia préssuposicional. Calvino afirma que a semente da religião está em cada
homem. Dessa forma, o pensamento reformado sempre entendeu que cada pessoa no mundo tem
certo sentimento de Deus. Este conhecimento nato pode ser muito distorcido, misturado com
pecado, mas aquela semente, no entanto, está lá. Tanto Calvino quanto Van Til tiram estes
pressupostos teológicos de Paulo. Paulo argumenta de forma muito clara, por exemplo, na sua carta
aos Romanos e ele parte de uma posição de pressuposição que afirma que, mesmo os pagãos têm
alguma consciência de um ser supremo. O que aprendemos disso é o seguinte: nós não devemos
gastar muito tempo discutindo com uma pessoa sobre a existência de Deus. Antes, enquanto
evangelizamos, pressupomos que, no fundo do coração, eles têm consciência da existência de Deus.
Os reformados afirmam que não existe a condição do ateu genuíno. Um ateu é alguém que deseja
se convencer que não existe Deus. Já tive duas vezes oportunidade de conversar com duas pessoas
que afirmavam que eram atéias. No entanto, o que era estranho é que exatamente os dois queriam
conversar sobre Deus. Dessa forma estavam querendo se convencer de que Deus não existia.
O que Paulo está dizendo é o seguinte: quando você estiver lidando com uma pessoa que
não crê e fala do seu relacionamento com Deus, o que você precisa fazer é apresentar a Deus, como
está em Romanos, capítulo primeiro. Você não deve colocar como alvo provar filosoficamente que
Deus existe. O que deve ser feito é apelar para a consciência da pessoa. Paulo diz em Romanos,
capítulo 1, que esta consciência está apertando, fazendo desaparecer o conhecimento de Deus.
Quando nós pregamos o evangelho, evangelizamos pessoas que têm uma consciência teista como
seres humanos.

Mensagem de despertamento
Em segundo lugar, Paulo ensina que nossa mensagem evangelística precisa ser uma
mensagem de despertamento. Quando Paulo dirige-se a alguém que está evangelizando, ele começa
a falar a respeito do pecado e da grande necessidade do ser humano. Ele sempre procura construir
um sentimento de necessidade por parte da pessoa. Então, seu alvo é a consciência. Esta não é uma
tarefa fácil e sem o Espírito Santo é uma tarefa impossível, porque é necessário o poder divino, o
Todo-poderoso, para quebrar um homem e reduzi -lo a nada. Assim o homem vê o seu pecado e
enxerga que não é outra coisa senão um grande pecador e não pode dizer outra coisa senão:
"Ó Deus, tem misericórdia de mim, pecador!". Isso é exatamente o que Paulo procura fazer
em Romanos, capítulos 1, 2 e 3, trazendo, tanto judeu como gentio, a um sentimento de culpa diante
de Deus, para que toda boca seja fechada e todo o mundo seja considerado culpado perante Deus.
Por isso, Paulo pregava a lei a fim de trazer o evangelho. Com a evangelização eficaz nós vamos
levar pecadores, pelo Espírito, a serem confrontados face a face com a realidade de um Deus vivo e
santo, que Se ira e que executa julgamento; na realidade da maldição da lei que vem contra todos
que a transgridem. Precisamos levar pecadores ao Deus do Sinai, ao Deus de Isaías, capítulo 6, para
podermos levá-los ao Deus do Calvário. Nosso alvo, portanto, é levá-los a Cristo e a única maneira
de levá-los a Cristo é mostrar a maneira como Cristo Se torna apreciado e válido no coração
daqueles que dEle precisam.

Pregar Cristo - a reconciliação
Finalmente, Paulo prega não apenas de forma que usa pressupostos, de uma forma que
desperta e aviva, mas prega de forma cristológica. Ele proclama a realidade gloriosa do evangelho.
No Novo Testamento, no grego, há uma palavra (paralambanó) que expressa a idéia de receber
alguma coisa e passá-la adiante. Todas as vezes que esta palavra é utilizada (paralambanó), ele
sempre a usa em conexção com Jesus. A sua idéia é a de que Cristo precisa ser recebido pela fé e
passado à frente. Ele precisa ser "tradição". Paulo quer fazer a passagem desta "tradição", ou seja,
deste evangelho; ele quer passar especialmente a mensagem da reconciliação. Ele está com tal peso
na alma, que o amor de Cristo o constrange. Esta reconciliação é absolutamente necessária. Sem ela
os pecadores estarão alienados no inferno, para sempre, e alienados do Seu criador. Esta
reconciliação encontra a suarealização na cruz por Cristo, e agora precisa ser realizada no coração
dos pecadores pelo poder do Espírito Santo. Ele aplica esta reconciliação, advinda da cruz, aos
corações dos pecadores.
A idéia de reconciliação é uma idéia de troca. Paulo volta a este assunto várias vezes na sua
teologia. Jesus é aquele que troca de lugar com o pecador carente, em necessidade. O evangelho diz
que nós é que merecíamos estar naquela cruz e sermos punidos por nossos pecados. Entretanto o
que é glorioso é que Jesus vem e toma o nosso lugar naquela cruz. O apóstolo Paulo diz em 2
Cor.5:21: "Aquele que não conheceu pecado, ele o fez pecado por nós; para que nele fôssemos
feitos justiça de Deus". Cristo toma os nossos pecados, toma para Si próprio a morte que nós
merecíamos e paga o preço plenamente. Ele dá ao pecador a Sua salvação, a Sua santidade, todos os
benefícios gloriosos e, acima de tudo a Sua própria Pessoa . Na reconciliação Cristo faz duas coisas
para cada um dos filhos de Deus, os quais eles jamais poderiam fazer por si próprios. Estas duas
coisas são feitas por nós, doutra forma não seríamos salvos.
Em primeiro lugar, a nossa dívida completa precisa ser paga. Pecado é uma coisa tão séria,
que traz a morte, conforme nos diz a Bíblia, em Romanos, capítulo 6. Jesus disse que estava pronto
para morrer pelos pecadores. Jesus, nesta obediência passiva, suportou a ira de Deus por causa
dos nossos pecados. Paulo diz que Ele Se deu a Si mesmo por Sua Igreja - sofrendo a morte na
cruz. A segunda coisa que Ele faz e que nós não podemos fazer, é que Ele, de forma perfeita,
obedece à lei em nosso lugar. A lei exige que amemos a Deus sobre todas as coisas e ao próximo
como a nós mesmos. Cristo fez isso, de forma perfeita, por 33 anos. Não por Ele mesmo, mas
por aqueles pecadores a quem salvará. Chamamos a isso de Sua obediência ativa e dinâmica, pois
dessa forma ele obedeceu a lei. Por Sua obediência ativa e passiva, obedecendo à lei e pagando o
preço do pecado, Ele satisfez a justiça de Deus. Dessa forma Deus está reconciliado com o pecador.
Ele concede o Seu Espírito para que esse mesmo Espírito opere a Sua salvação na mente e no
coração dos pecadores e o pecador perca todo seu sentimento de justiça rendendo-se inteiramente
ao caminho da salvação de Deus, aos pés da cruz. Ao serem assim reconciliados com Deus, lá na
cruz, Deus está reconciliado com o homem e o homem com Deus. Através da cruz Deus leva os
pecadores a se reconciliarem com Ele mesmo. Percebe que tudo está centralizado na cruz? O
apóstolo Paulo diz que a cruz exige uma vida que produza frutos.
Se você já esteve ali na cruz e já experimentou a reconciliação com Deus, por Jesus Cristo,
você já percebeu que deveria estar onde Jesus esteve, percebeu que merecia os cravos nas mãos e
pés. Você que merecia aquela coroa de espinhos e suas costas sangrando, agora sabe que, ao invés
de você, foram seus pecados que foram cravados naquela cruz. Ele experimentou a morte e você
compreenderá que Ele permitiu que você, pelos seus pecados, O pregasse na cruz do Calvário,
como resultado de um amor puro a pecadores que não são dignos nem merecedores desse amor, por
causa do Seu amor ao Pai, à vontade soberana do Seu Pai. Como você pode viver sem estar
fervendo de amor pelo Pai, Filho e Espírito Santo? Acaso você poderia dizer como Samuel
Rutherford: "Eu não sei qual das três pessoas da Trindade eu mais amo, porém isso eu sei, eu amo a
todas três"?
Quando estamos motivados pelo grande amor de um Pai que deu Seu único Filho, e somos
movidos pelo Filho que Se deu a Si mesmo, e somos movidos pelo Espírito Santo que tem a
paciência de operar em pecadores tão difíceis como nós, somente podemos caminhar de uma forma
gostosa e desejosa com este Deus Triúno. Em Colossenses 2:6-7, o apóstolo Paulo diz: "Ora, como
recebeste a Cristo Jesus, o Senhor, assim andai nele, nele radicados e edificados, e confirmados
nafé, tal como fostes instruídos, crescendo em ações de graça". Para Paulo, a mensagem da
evangelização é a mensagem da reconciliação que prega um Cristo completo -mensagem que
envolve o Seu senhorio, envolve ser salvo do pecado e ser salvo para servir. O pecador recebe esta
salvação gloriosa, tão -somente pela obra salvadora do Espírito. Justificação pela fé somente, para
aqueles que estão vivendo sem Deus, produz neles o fruto de serem pessoas de Deus.
Vamos, portanto, levar em nossa evangelização todas estas coisas. Como pode a fé despojar
o pecador de todo o seu sentimento de justiça? Como pode levá-lo ao Senhor Jesus Cristo? Como a
fé leva este pecador a viver uma nova vida em Cristo? Assim, percebemos que Cristo é o alfa e o
ômega de toda a nossa pregação, de toda a nossa evangelização. É somente nEle que temos Shalom,
paz. Este foi o grande chamado de Paulo. Este foi seu alvo, que envolve todas as Escrituras, e
Cristo, para o homem como ser total.

2
A Tocha da Evangelização Reacesa pela Reforma
O destaque de Calvino
Entre os reformadores, João Calvino teve um destaque especial. No primeiro capítulo,
falamos daquele pregador que exagerava no tamanho da "cauda da raposa", na história de Sansão.
No caso de Calvino, muitas pessoas acham que ele não teve nenhuma "cauda de raposa", no que
diz respeito à pregação do evangelho. Com isso querem dizer que ele não teve destaque algum em
evangelização. Outros estudiosos, entretanto, dizem que Calvino tinha uma "cauda de raposa" muito
grande, falando de sua evangelização. Chegam a dizer que ele foi o pai teológico de todo o
movimento missionário moderno. O ponto de vista de Calvino quanto à evangelização tem sido
obscurecido, especialmente por três tipos de estudiosos:
O primeiro grupo falha porque, ao invés de ler os escritos de Calvino, lê o que outros
escreveram sobre ele. O segundo grupo, quando analisa Calvino, não compreende o contexto no
qual Calvino exerceu sua evangelização. O terceiro grupo, que joga também uma luz negativa na
evangelização de Calvino, traz seus próprios pressupostos negativos ao ler Calvino e conclui que
ele não deu ênfase à evangelização. Estes estudiosos, partem da doutrina da eleição e concluem
desta doutrina, que é um ato soberano de Deus, que Calvino negou qualquer ênfase à
evangelização, a qualquer esforço evangelístico. Desse modo, para avaliar o verdadeiro
calvinismo em relação à evangelização, queremos fazer três coisas. Ao fazer estas três coisas,
espero ter o quadro completo da posição de João Calvino quanto à evangelização.
Primeiro vamos dar uma "olhada" rápida na vida de João Calvino. Em segundo lugar vamos
olhar seus ensinamentos quanto à evangelização, nos seus próprios escritos (as Institutas, seus
comentários, seus sermões, e suas cartas). Em terceiro lugar olharemos Calvino como um
praticante da evangelização reformada. Vamos analisar isso em quatro círculos concêntricos: no seu
próprio pensamento, na cidade de Genebra, na França e no Brasil. Espero que, quando chegarmos
ao fim, tenhamos uma visão mais correta do pensamento de Calvino sobre a evangelização.
Sua vida
Primeiramente iniciemos com uma visão rápida da sua vida. Lutero tinha 25 anos de idade
quando Calvino nasceu. Em certo sentido, Calvino representa quase que uma segunda geração de
reformadores. Ele teve a vantagem de poder usar os escritos de Lutero e de outros pensadores
reformados antes de escrever o seu próprio pensamento. Calvino foi além de Lutero pelo menos em
quatro áreas. Em primeiro lugar, em relação à Ceia do Senhor. Calvino negou a presença corporal
de Jesus na ordenança, nos elementos da Ceia. Em relação à vida da Igreja, Calvino concluiu que
aquilo que não estiver na Bíblia, não deve estar na vida de adoração da Igreja. Lutero admitia que,
o que não fosse expressamente condenado na Bíblia, podia ser usado no culto. Calvino esteve
também à frente de Lutero, na maior interrogação que todos eles fizeram. A grande pergunta de
Martinho Lutero era esta: como pode um homem ser feito justo perante Deus? Calvino também fez
essa pergunta, mas foi além e fez a seguinte indagação: como pode, aquele que já foi declarado
justo pela graça, viver agora uma vida para a glória de Deus? Finalmente, Calvino foi além de
Lutero porque ele começou a olhar como seria possível evangelizar todos os povos, em toda a terra.
Calvino viu um exemplar da Bíblia pela primeira vez em sua vida quando tinha 14 anos de
idade. Era seu desejo, como adolescente, tornar-se um padre, um sacerdote. Ele ficou muito
interessado, enquanto ainda jovem, no debate que estava em andamento entre católicos e
protestantes. Seu pai, no entanto, interrompeu os seus planos, pois teve uma discussão muito séria
com um padre na escola onde Calvino estudava. Isso motivou a retirada dele daquela escola e o seu
pai o colocou para estudar direito. Aos vinte anos de idade Calvino já tinha se formado em
advocacia. Na Sua providência, Deus usou esse treinamento para que ele pudesse ter um
pensamento claro e lógico em sua teologia. Quando Calvino tinha 21 anos seu pai morreu e ele
matriculou-se novamente numa escola de teologia.
Calvino foi convertido quando tinha entre 24 e 25 anos de idade. Diferentemente de Lutero
ele falou muito pouco a respeito de si próprio. Em mais de cem volumes escritos, Calvino fala a
respeito de si uma ou duas vezes. O lugar onde ele fala com maior detalhe a seu respeito é no
prefácio aos seus comentários dos Salmos. Ali ele escreve o seguinte, lembrando os dias de sua
conversão: "Eu comecei a entender como se alguém me houvesse trazido uma luz, revelando em
que tipo de erro eu tinha estado laborando até então. Eu me tornava cada vez mais sujo, e percebi
que estava num estado deplorável, mas Deus, por uma conversão súbita, me elevou e me colocou
dentro de um paradigma no qual eu me tornava ensinavel, educável. Eu tive de desistir de mim
mesmo e entregar-me aos caminhos de Deus". A vida de Calvino mudou completamente de uma
forma imediata. Um ano ou dois mais tarde, ele escreveu a primeira edição da sua famosa obra, As
Institutas. Esse foi o livro mais famoso em termos de teologia reformada que jamais havia sido
publicado. Calvino desenvolveu sua teologia bíblica durante toda a sua vida. A primeira edição das
Institutas tinha apenas 6 capítulos, com cerca de 120 páginas. A última edição tinha 80 capítulos e
1200 páginas.
Calvino deixou a França por causa de uma perseguição em potencial e foi para Basiléia na
Suíça. No seu caminho a Basiléia, ele foi interceptado por Guilherme Farei. Farei persuadiu
Calvmo a ficar com ele em Genebra para que juntos pudessem reformar a cidade. Eles trabalharam
arduamente por três anos e foram rejeitados pelo povo de Genebra, pelo menos pela maioria do
povo e a maioria dos que compunham o Conselho da cidade. Assim, em 1538 ele foi banido da
cidade de Genebra por decisão do Conselho daquela cidade. Foi para Estrasburgo onde passou os
quatro anos mais silenciosos e quietos de toda sua vida. Lá foi pastor de uma igreja reformada. Em
1541 foi chamado de volta a Genebra pela primeira vez. Naturalmente ele rejeitou esse chamado mas insistiram. Ele escreveu dizendo que jamais voltaria a um lugar de tanta perseguição. Eles o
chamaram pela terceira vez. Depois de muita luta Calvino aceitou e escreveu o seguinte: "Quando
considero que não estou debaixo da minha própria autoridade, eu quero oferecer o meu coração
como uma vítima a ser morta em sacrifício para o Senhor".
Nos últimos 24 anos de sua vida Calvino trabalhou em Genebra. Os primeiros 15 anos de
seu trabalho foram uma batalha contra seus inimigos. Lutou como quem luta contra um inimigo
que vem colina abaixo, e ele lutava de baixo para cima. Somente nos últimos nove anos do seu
ministério a maioria do Conselho da cidade e o povo, estava ao seu lado. Calvino suportou muita
perseguição. As pessoas jogavam armas e objetos dentro de sua casa e até colocavam o nome
Calvino em seus cachorros. Todavia ele perseverou com a graça de Deus. Foi nos últimos nove anos
que a Reforma progrediu de uma forma notável. A Academia de Genebra foi estabelecida por
Calvino com a ajuda de seu sucessor, Teodoro de Beza. Nos últimos nove anos da vida de Calvino,
1600 jovens foram treinados para o ministério reformado. Muitos deles foram queimados vivos na
França, mas outros foram espalhados pela Europa divulgando a fé reformada. Alguns deles, como
John Knox e Gasper Oliviana, se tornaram famosos.
Calvino trabalhou de forma dedicada e formou um movimento em Genebra que veio a
influenciar toda a Europa. Ele trabalhou até o último dia da sua vida e com 55 anos de idade
morreu. Certo estudioso e pesquisador analisou que 83 diferentes enfermidades estavam "minando"
seu corpo. Esta afirmação é uma "cauda de raposa" muito comprida, deste pesquisador. Contudo, o
ponto é que Calvino, mesmo sofrendo grandes dores, perseverou até o fim. Ele disse àqueles que
estavam ao redor do seu leito de morte: "Senhor, eu retenho a minha língua porque sei que isto vem
de Ti. Eu estou chorando como um cão. Tu tens me moído e me transformado em pó, mas isto me
basta porque compreendo que é a Tua vontade. Quero oferecer-Te meu corpo e minha alma de
forma pronta e sincera". Calvino fez apenas um pedido ao morrer: não colocarem nenhuma na sua
sepulura, porque dizia que não era digno e merecedor de nenhuma honra, de nenhuma glória. Assim
viveu, assim morreu defendendo as doutrinas da graça soberana de Deus. Ele teve suas falhas como
qualquer um de nós. Teve seus erros, mas foi um homem de Deus, salvo pela graça de Cristo

Seu ensino
Vejamos, em segundo lugar, seus ensinos sobre a evangelização. Façamos esta pergunta:
será que seus ensinos trazem aquela dinâmica interna que leva os seus leitores e seguidores à
evangelização? Nossa resposta é "sim", e bastante. Em todos os seus ensinos Calvino enfatiza a
universalidade do reino de Cristo e a responsabilidade dos crentes em colocarem como alvo a
expansão deste reino. Calvino ensinou que a motivação para isso está no próprio Deus triúno. Todas
as três pessoas da santíssima Trindade estão envolvidas na expansão do reino, assim ensinou
Calvino. Ele disse: "O Pai, não apenas mandou a Sua vontade para uma parte da terra, mas também
para a outra extensão da terra". Sobre Jesus, escreveu que Jesus estende Sua graça sobre todos. Em
um sermão sobre o Espírito Santo ele disse que este Espírito deseja alcançar até às extremidades da
terra. Ele escreveu: "O triunfo de Cristo será manifesto em todos os lugares da terra". Como pode
Deus estender o Seu reino maravilhoso em toda a extensão da terra? A resposta de Calvino conjuga
a soberania de Deus e a responsabilidade humana. O trabalho de um evangelista, disse Calvino, é o
trabalho de Deus e não do homem. Mas Deus derrama sobre Seu povo a honra e o privilégio de
serem usados como o barro na mão do Oleiro. Dessa forma, Calvino chama o povo de Deus de
cooperadores com Ele. Calvino inclui no seu ensino sobre a soberania de Deus, os meios pelos
quais Ele cumpre essa soberania. Esses meios seriam aqueles que crêem e que são usados para
expansão do reino de Deus. Assim, no ensino de Calvino sobre a evangelização, o esforço humano
nunca tem a última palavra, mas Deus Se agrada em usar seres humanos, simples, para levar o Seu
reino. Esta inter-relação entre soberania e a participação da responsabilidade humana tem pelo
menos quatro inferências.
Em primeiro lugar, dizia Calvino, isso nos chama à oração. Ele disse que o cristão deve orar
e desejar que Deus reúna, em torno de Si mesmo, igrejas em toda a face da terra. Em segundo lugar,
não devemos ficar desanimados pela falta de sinais visíveis de sucesso. Calvino escreve: "O nosso
Senhor exercita a fé dos Seus filhos quando Ele não realiza imediatamente as coisas que prometeu.
Se Deus passa um dia ou um ano sem proporcionar frutos, não devemos desistir, porém devemos
orar mais e não duvidar que Ele está ouvindo a nossa voz, mesmo quando não vemos os frutos" .
Em terceiro lugar, Calvino ensinava que devíamos trabalhar diligentemente pela extensão do reino
de Cristo sabendo que, no Senhor, nosso trabalho não é vão. Podemos colocar isso de outra forma.
A nossa salvação nos obriga a evangelizar. Calvino disse: "Não é suficiente, para qualquer homem
ocupar-se consigo mesmo. O nosso zelo deve ir além de nós mesmos e atrair outras pessoas a
Cristo. Precisamos atrair todos os homens à Pessoa de Jesus Cristo com todo nosso esforço". Será
que isso não é uma indicação do tamanho da "cauda de raposa" do evangelista que era Calvino?
Para Calvino, a evangelização não era uma coisa opcional, era parte de sermos cristãos. Em quarto
lugar, nesse relacionamento entre soberania e responsabilidade humana, Calvino mostra muitos
motivos pelos quais devemos evangelizar. Já consideramos algumas motivações no capítulo
anterior, e vou, portanto, apenas relacionar estas sem fazer referência a todas as citações de Calvino,
para sermos sucintos.
Nos seus sermões e comentários, Calvino apresenta sete motivos diferentes para
evangelizar:
1. Jesus nos mandou evangelizar.
2. Devemos estar motivados pelo exemplo do próprio Deus como evangelista.
3. O nosso desejo de manifestar a glória de Deus deve nos motivar a evangelizar.
4. Já que o cristão valoriza aquilo que agrada a Deus, e evangelizar agrada a Deus, então
devemos evangelizar.
5. É nossa responsabilidade e nosso dever evangelizar.
6. Uma forte compaixão pela condição dos pecadores deve motivar-nos a evangelizar.
7. Profundamente gratos a Deus pela alegria da nossa própria salvação, nós devemos
evangelizar em amor ao próximo.
O cristão, diz Calvino, é aquele que diz assim: "Já que Deus pôde me salvar Ele pode salvar
a qualquer um na face da terra". Calvino disse: "Nada é mais incoerente com a natureza da fé do
que aquela mortificação que leva a pessoa a desconsiderar seus semelhantes, e assim, de uma forma
errônea, guardar a luz e a graça de Cristo somente no seu peito". Portanto, Calvino ensinou que a
evangelização é a tarefa de todo cristão. Assim, cada cristão deve trabalhar e buscar pecadores para
Cristo; essa é a sua tarefa sacerdotal. Cada cristão deve instruir outros no caminho da salvação;
essa é a sua tarefa profética. Cada cristão é chamado a discipular outros; essa é a sua tarefa real.
Calvino, no entanto, pensou e ensinou que essa tarefa, que é sacerdotal, profética e real, é
preferencialmente ligada àqueles que foram chamados e ordenados por Deus para o ministério.
Calvino sempre desejou ligar a evangelização com a Igreja. Dessa forma, cristãos que ainda não
tinham conhecimento próprio, completo, não iriam evangelizar de forma correta, agindo como se
não devessem prestar contas a ninguém e acabariam ensinando coisas erradas ao povo. O que
Calvino jamais fez, foi pegar o novo convertido e dizer que ele estava por "conta própria", e que
devia partir para evangelizar. Esta alerta de Calvino tem feito com que ele receba um "rótulo", da
parte de alguns, como se ele fosse contrário à evangelização. Calvino não era contra à
evangelização, mas era contra à evangelização errada. Era contrário, por exemplo, à evangelização
individualista que pudesse levar a um caminho errôneo.

Aspectos práticos
Vejamos em terceiro lugar, os aspectos práticos de Calvino quanto à evangelização
reformada. Calvino operava a partir do seguinte princípio básico: onde quer que o Senhor abra uma
porta, ainda que seja uma pequena brecha, precisamos ver a necessidade de atravessarmos esta
abertura para levar a mensagem do Seu reino. Ele diz que não devemos rejeitar qualquer convite
que Deus nos faça. Se porventura Deus nos lança lá fora e fecha a porta, não devemos resistir a Sua
soberania tentando abrir uma porta que foi trancada por Deus. Calvino não ensinaria, todavia, que
deveríamos simplesmente deixar de olhar as diferentes oportunidades e seguir aquelas que nós
julgamos ser as melhores. Ele estava simplesmente falando de situações, quando as portas estão
completamente trancadas. Sem dúvida ele estava pensando, no fundo da sua mente, na sua
experiência em Genebra, quando foi expulso da cidade. Vejamos os quatro círculos onde Calvino
exercitou a sua evangelização. Assim como quando você joga uma pedra dentro de um rio e as
pequenas ondas formam aqueles círculos concêntricos, da mesma forma Calvino operou em quatro
círculos concêntricos diferentes.

Círculos concêntricos - áreas de atuação
Sendo um pastor, ele concentrou em primeiro lugar, o seu esforço evangelístico na sua
própria congregação. A sua ênfase sobre a conversão como um processo contínuo na vida da
pessoa o levou a ver a evangelização como um chamado constante na vida da
igreja. Para
Calvino, a evangelização envolve não apenas chamar as pessoas a Jesus, mas também edificá-las
em Jesus. Desta maneira, Calvino foi um destacado evangelista para o seu próprio rebanho. Ele
pregou 170 vezes por ano. Ele pregava cada domingo de manhã do Velho Testamento e todo
domingo, à noite, pregava do Novo Testamento. Nos domingos à tarde pregava dos Salmos. Ele
pregou ao rebanho de Genebra de forma expositiva, praticamente através de todos os livros da
Bíblia. Seu sermão, em média, tinha por base 4 a 5 versículos do Velho Testamento, ou 2 a 3 do
Novo Testamento. Seu método consistia em pegar uma pequena parte de um versículo, fazer um
pouco de exegese e exposição dela, e, então, fazer a aplicação com uma exortação ou um chamado à
obediência. Nunca faltavam aplicações nos sermões de Calvino. Ele dizia que os pregadores deviam
ser como pais. Precisam pegar o pão grande e parti-lo em pedacinhos pequenos para alimentar as
suas crianças. Ele trabalhou arduamente na prática da pregação. Mas também "trabalhou" a sua
congregação para ensinar-lhe como ouvir um sermão. Ensinou o que eles deveriam buscar numa
pregação; ensinou em que espírito deveriam vir aos sermões; ensinou o que se esperava dos que
estavam ouvindo a mensagem. Disse à sua congregação: "Vocês devem estar participando de forma
tão ativa no sermão, quanto o pregador mesmo". A sua participação precisa ser construída em cima
do viver a mensagem na sua vida diária, quando você mostra o desejo de obedecer à vontade de
Deus, sem nenhuma reserva. Quando Calvino falava à sua congregação, falava às pessoas como
crentes. Poucos estudiosos pensam que Calvino admitia que toda a sua congregação era formada de
pessoas já convertidas. Entretanto não era isso que Calvino acreditava. Quando estudei Calvino por
um bom período, fiz uma lista de trinta vezes, nos seus comentários e nove vezes nas Institutas, de
quão pouco eram aqueles que realmente tinham recebido e aceito a Palavra na sua própria
congregação. Eis uma citação sua: "Se um sermão é pregado para cem pessoas, mais ou menos
vinte vão receber este sermão com fé obediente. O restante receberá o mesmo como se
fosse
uma coisa sem muito valor".
Calvino se dirigia à sua congregação como a pessoas já crentes porque ele exercitava
a caridade na sua avaliação. A availiação caridosa é que, enquanto o membro da igreja está vivendo
uma vida externamente reta e ouvindo o evangelho, o pastor não deve julgar essa pessoa de forma
negativa, porque somente o Senhor pode olhar por dentro do coração. Gostaria que guardassem o
seguinte. Calvino acreditava que a evangelização era evangelizar cada um do seu próprio rebanho e
o alvo era edificar os crentes em uma vida cada vez mais santa. Tinha também o alvo de
convencer as consciências dos não regenerados, para que eles pudessem ver a sua culpa do pecado e
ser conduzidos à liberdade em Jesus Cristo como o único Redentor.
O segundo círculo de evangelização de Calvino, depois da congregação local, era a cidade
de Genebra. A pregação foi parte do seu plano de estabelecer o sistema reformado em toda a cidade.
No anoemqueelemorreuhaviaumsermãoemcadaigreja,emcada dia
da semana. Ele estabeleceu o
seu programa de igrejas espalhadaspor toda a cidade, organizando pelo menos três ministérios além
da pregação da Palavra. Um era o ofício de doutores, que era usado especialmente na Academia de
Genebra, onde pastores eramtreinados. O outro ministério era o dos presbíteros, que estabeleciam
a disciplina cristã. O terceiro ministério era o diaconato, que tinha como alvo receber ofertas e
distribuir o socorro aos pobres. Sob Calvino, Genebra se tornou um lugar seguro para o refúgio de
protestantes perseguidos em toda a Europa. Calvino estava absolutamente consciente de que o
mundo europeu estava olhando para Genebra. Ele escreveu a um dos seus amigos o seguinte: "A
minha oração por Genebra é que ela se torne um lugar de empatia em relação à divulgação do
evangelho para todo o mundo". E foi exatamente o que aconteceu. Os homens que Calvino treinou
foram para a França, Escócia, Inglaterra, Holanda, parte da Alemanha Ocidental, e alguns
segmentos da Polônia, Checoslováquia e Hungria. A igreja de Genebra e a própria cidade de
Genebra se tornaram mãe e modelo para todo o movimento reformado.
Em círculos mais amplos vemos os esforços missionários de Calvino na França e até mesmo
no Brasil. Seria fácil para Calvino treinar ministros apenas para a França e esperar que de outro
lugar alguém mandasse missionários para outras partes dos mundo. Muitos daqueles que foram
treinados em Genebra e voltaram à França foram mortos por causa da perseguição. Mas Calvino
perseverou em evangelizar a França apesar de todas as perseguições. Em 1555 havia apenas uma
igreja realmente reformada na França. Sete anos mais tarde havia 1500 igrejas reformadas
organizadas na França. A tocha da evangelização reformada foi reacesa através do ministério de
Calvino na França e tornou-se um dos exemplos notáveis de missões nacionais de toda a história da
Igreja. Eventualmente a Igreja Reformada da França foi forçada a sair. A França chamou os
refugiados da perseguição religiosa de Huguenotes. Estes Huguenotes se espalharam por várias
partes do mundo e se transformaram numa bênção de Deus onde quer que andaram. Calvino esteve
também envolvido no primeiro esforço missionário além-mar, numa missão que foi mandada
especificamente para o Brasil. Um homem chamado de Villegaignon sendo um simpatizante do
movimento Huguenote, trouxe uma expedição colonizadora em 1555. Quando surgiram alguns
problemas aqui na colônia, numa ilha perto do Rio de Janeiro, Villegaignon voltou-se para os
Huguenotes na França pedindo que mandassem melhores colonizadores. Ele mandou uma carta a
Calvino, à Igreja de Genebra, pedindo ajuda. Com a aprovação de Calvino, a companhia de
pastores de Genebra escolheu dois pastores para mandar ao Brasil, junto com onze leigos.
Infelizmente o resultado final foi trágico. Villegaignon mudou seu pensamento em relação a
Calvino e ao próprio movimento da Reforma.
Em 1558 ele estrangulou e jogou ao mar três desses calvinistas. Os que restaram foram
depois, atacados e destruídos pelos portugueses. Desse modo, essa missão de vida tão curta,
terminou. Será que chegou mesmo ao fim? Quando a história dos mártires do Rio de Janeiro foi
publicada pela primeira vez nos jornais da Europa, seis anos mais tarde, a sua introdução foi com
as seguintes palavras: "É uma terra estranha, distante, e é de certa forma surpreendente para nós,
saber que ali alguns mártires morreram. Mas nós veremos um dia os frutos que aquele sangue tão
precioso produziu". Um dos pais da Igreja primitiva, Tertuliano, disse há tanto tempo atrás: "O
sangue dos mátires é a sementeira da Igreja". A Igreja é comparada com a grama, quanto mais se
corta, mais ela cresce. Nossa oração para todos os brasileiros é que vocês façam parte deste plano
de Deus.

Conclusões
Qero fazer algumas observações:
É muito claro que Calvino tinha o coração abundantemente voltado para a evangelização. A
idéia de que Calvino e o calvinismo não estão voltado para a evangelização e para a expansão do
reino de Deus é um pensamento totalmente falso. De fato, percebemos que Calvino se tornou
exatamente o oposto disso. A Doutrina da eleição leva à evangelização. Deus, soberanamente, liga a
eleição aos meios da graça. Sendo assim, a eleição não é um estímulo à passividade, mas para a
atividade.
2. A vida e ministério de Calvino precisam nos encorajar a manter as nossas mãos no arado
e a pensar menos no que os outros pensam a nosso respeito. Calvino trabalhava vinte horas por dia
por causa da evangelização. Todavia não é isso o que as pessoas falam sobre ele. Afirmam que ele
não era um evangelista. Se ele fosse vivo hoje certamente diria : "Não importa o que os homens
pensam de mim, e sim, o que Deus pensa a meu respeito. Um dia eu comparecerei na presença
de Deus, não na presença de homens". Isso não quer dizer que devemos passar por cima do
sentimento das pessoas, pois devemos trabalhar para que tenhamos uma consciência boa e clara
diante dos homens e diante de Deus. Mas nós não vamos cair nessa idéia de evangelizar pensando
no que as pessoas pensam sobre a nossa evangelização. O que devemos fazer é olhar para Deus e
perguntar o que Ele pensa sobre o que estamos fazendo.
Não conheço bem o que os brasileiros fazem em termos de evangelização, porém sei que
vocês não são responsáveis pelos resultados da sua evangelização. Vocês são responsáveis pela
mensagem e pelos métodos que usam. Esperem em Deus e em Sua graça soberana na produção dos
frutos, dos resultados. Na China há um bambuzeiro que não cresce nos primeiros quatro anos,
mesmo que você cuide bem dele. Contudo, quando no quinto ano ele começa a brotar, em noventa
dias fica com cinco a seis metros de altura. Você diria que esta árvore cresceu em noventa dias ou
que ela cresceu potencialmente nos cinco anos? Trabalhem, esperem em Deus, lancem a semente e
esperem no Senhor. Os tempos hoje são às vezes desencoraj adores, mas houve tempos mais
desencorajadores antes. Às vezes ficamos prevendo a ruína da Igreja, no entanto o que devemos
fazer é planejar a renovação da Igreja. John Flavel, um grande puritano, disse: "Não sepultem a
Igreja antes que ela esteja morta". Espero que vocês possam suportar firmes como bons soldados de
Cristo, estando prontos para serem chamados de loucos por amor a Cristo. Deixem que as suas
vidas falem mais alto do que dizem ou pregam. Que Deus nos ajude a sermos verdadeiros
evangelistas.

3
A Tocha da Evangelização Levada pelos Puritanos
A Mensagem da Evangelização Puritana
A preocupação evangelística puritana
Quais os métodos que os puritanos usaram para comunicar a sua mensagem? Qual a
disposição interior do evangelista puritano?
Ao analisarmos a mensagem da evangelização puritana, procuraremos cobrir pelo menos
quatro características e, assim fazendo, procuraremos contrastar a evangelização puritano com a
evangelização moderna.
Antes disso, quero, de forma sumária, definir o que entendo por puritano. Estou usando a
palavra "puritano" no sentido geral da palavra, que inclui aqueles piedosos ministros e teólogos
ingleses do século XVI e XVII, que estavam preocupados com uma vida pura de acordo com as
doutrinas da graça soberana de Deus. Eles estavam preocupados com as seguintes áreas:
1. Com a manutenção do ensino das Escrituras e do pensamento reformado sadio.
2. Com a necessidade de desenvolver um padrão pessoal de piedade, conforme as
prescrições das Escrituras, que flui do correto entendimento de doutrina, e que dá ênfase à
conversão pessoal e se manifesta numa religião experimental resultante do poder transformador do
Espírito Santo.
3. Com a necessidade de uma vida eclesiástica baseada nas Escrituras, onde o Deus triúno é
adorado conforme as determinações de Sua Palavra.
Quando me refiro à evangelização puritana estou focalizando a proclamação que era
efetivada pelos puritanos de todo o conselho de Deus como revelado em Sua Palavra. Percebe-se
que a palavra Escritura está presente e inferida nos três itens. Por isso queremos considerar quatro
características bem abrangentes da pregação puritana. Dentro de cada característica veremos o
contraste com a evangelização moderna.
Característica da pregação puritana - contraste com a evangelização moderna
Em primeiro lugar, os puritanos, por serem profundamente embasados nas Escrituras
Sagradas, apresentavam sermões extensamente baseados nas Escrituras. Para o puritano, o
sermão nunca estava só ligado às Escrituras, mas ele saía e crescia de dentro da Palavra de Deus.
Para o pregador puritano o texto não estava no sermão, mas o sermão estava no texto. Por isso, um
velho membro de uma igreja puritana poderia dizer: "Ouvir um sermão, para mim, é como estar
dentro da Bíblia".
Se você abrir um livro de sermões puritanos, encontrará de dez a quinze versículos citados
em cada página, além de encontrar dez a doze referências textuais. Os pastores puritanos sabiam
como usar suas Bíblias. Eles viviam e respiravam os textos da Palavra de Deus. Eles tinham
centenas e até milhares de textos das Escrituras memorizados e sabiam como citá-los para os
problemas da alma ou para qualquer outro problema pessoal. Eles usavam as Escrituras de forma
sábia, não passando por elas de forma superficial, porém trazendo o texto e fazendo-o permanecer
de acordo com a doutrina que estava sendo enfocada. Os sermões evangelísticos de hoje muitas
vezes são perturbadores, não porque não citem as Escrituras, mas porque o fazem de modo
repetitivo, superficial. Quando alguém saía da igreja, após um sermão puritano, nunca esquecia o
texto que fora usado, pois aquele texto lhe fora colocado inteiramente aberto, tendo sido levado até
o seu coração.
Hoje, na evangelização moderna, temos toda razão para ficarmos perturbados quando
testemunhamos que há uma seleção muito pequena dos textos bíblicos utilizados, além de textos
que são tirados do seu contexto bíblico. Nós pregadores sabemos que podemos citar uma porção de
textos sem estarmos sendo bíblicos nestas citações. Uma seqüência de textos intercalados por
anedotas não faz, de maneira alguma, com que um sermão seja bíblico em si.
Os puritanos acreditavam fortemente em Sola Scriptura. Você pode procurar nos seus
escritos e sermões, qualquer história ou referência pessoal e não as encontrará. Pelo fato de
pensarem que o púlpito era um lugar de grande importância, este não podia ser degenerado com
uma pregação egocêntrica. Eles sabiam que só uma coisa pode salvar pecadores: o Espírito Santo
ligando-Se à semente incorruptível da Palavra de Deus. Por isso a tarefa deles era exatamente expor
a Palavra de Deus incorruptível, orando para que o Espírito a aplicasse aos corações dos ouvintes.
Se estamos convencidos de que conhecemos bem as nossas Bíblias e abrirmos um livro puritano,
logo ficaremos muito humilhados. Eles foram gigantes espirituais nas Escrituras e nós somos anões,
pigmeus perante eles. Por isso é muito importante lermos os puritanos. Eles são nossos mentores
para nos ensinar como usar a Bíblia de uma forma pastoral, evangelística e na nossa pregação. Você
sem dúvida seria um evangelista mais sábio e útil se buscasse mais as Escrituras como faziam os
puritanos. Ame a Palavra de Deus de maneira mais calorosa. Pesquise a Palavra de Deus em suas
devoções pessoais. Busque a bênção de pensar biblicamente, de falar biblicamente, viver
biblicamente e perceberá que sua palavra contém uma autoridade divina. Você não precisará
persuadir as pessoas pela sua personalidade ou por você mesmo, mas a Palavra de Deus é que vai
persuadi-las. A Palavra quando exposta, passo a passo, abre as Escrituras perante nós. Esse é o
primeiro ponto da pregação puritana. Eram profundamente bíblicos.
Em segundo lugar, o pregador puritano era doutrinador. A mensagem puritana não pedia
desculpas por apresentar doutrina. O puritano não temia pregar todo o conselho de Deus para o
povo. Os puritanos achavam que você não podia contar uma história qualquer, sem que esta tivesse
doutrina. Doutrina é simplesmente a apresentação das verdades de Deus trazidas das Escrituras
numa forma que pode ser entendida e que se relaciona com as nossas vidas. Não diluíam suas
mensagens com anedotas, humor, histórias triviais e levianas durante a pregação. Eram
profundamente sérios, verdadeiros e austeros no púlpito, pois sabiam que ao chegar ali estariam
lidando com verdades eternas e almas eternas. Sentiam a realidade solene do seu chamado divino.
Pregavam a verdade de Deus como um homem que está morrendo para homens que estão
morrendo.
Vejamos alguns exemplos:
1. Quando pregavam a doutrina do pecado tinham a coragem de chamar pecado de pecado
mesmo. Eles pregavam o pecado como uma rebelião moral contra Deus, uma rebelião que traz um
sentimento de culpa e, se não houver arrependimento e perdão, a conseqüência será a condenação
eterna certamente. Pregavam a respeito de pecados específicos; pecados de omissão e pecados de
comissão; pecados por palavras e ações; falavam do quanto foi horroroso o nosso pecado original
em Adão e Eva; falavam à congregação que eles tinham um referencial muito ruim e um coração
mal por natureza; que o homem natural não pode amar a Deus sobre todas as coisas e ao próximo
como a si mesmo; ensinavam de forma "aberta" que uma reforma, apenas externa na nossa vida,
não é suficiente para salvação eterna; a reforma interna produzida pelo Espírito Santo é
absolutamente necessária e por isso pregavam como aquela regeneração podia ser experimentada e
então vivida.
2. Outro exemplo se vê na sua pregação. Pregavam de uma maneira muito forte a
doutrina de Deus. A evangelização deles era construída em cima de forte base teísta; pregavam
Deus no Seu ser majestoso e em todos os Seus atributos gloriosos. Não só deixavam Deus ser Deus,
mas declaravam que Deus é Deus. Os puritanos colocavam Deus em uma posição bem elevada como deve ser. Quando se aproximavam de Deus em oração não falavam com Ele como quem fala
com o vizinho pela janela, ou como um vizinho que pode ajustar seus atributos de acordo com suas
necessidades e desejos pessoais. O puritano sempre exaltou a majestade de Deus e, quando se
aproximava de Deus, você podia perceber aquele sentimento profundo de reverência. O Deus que o
puritano pregava era o Deus da Bíblia. Talvez um dos versículos mais importantes, na Bíblia, para
um puritano, seria exatamente Gênesis 1:1 - "No princípio, Deus". E de Deus que emanam e se
desdobram todas as coisas neste mundo. Todas as coisas são preparadas, iniciadas,projetadas e
feitas para a glória de Deus!
3. A evangelização puritano também proclamava de forma completa e plena a doutrina
de Jesus Cristo. Pregavam o Cristo integral para o homem integral. Recusavam-se em separar os
benefícios que advêm de Cristo, da própria Pessoa de Cristo. Um dos grandes puritanos, Joseph
Alleine, em seu clássico livro originalmente intitulado, An Alarm to the Unconverted (Publicado no
Brasil pela PES, como Um Guia Seguro para o Céu), disse que o ser de Cristo integral é aceito por
aquele que é realmente convertido. Os verdadeiros convertidos não aceitam apenas as recompensas
de Cristo, mas a própria obra de Cristo. Não amam apenas os benefícios de Cristo, e sim também o
"fardo" de Cristo ("...tomai sobre vós o meu jugo..."). Amam não só tomar os mandamentos, mas
também, a cruz de Cristo. Por outro lado, o falso convertido recebe Cristo pela "metade". Ele quer
os privilégios de Cristo, porém não quer se inclinar diante do senhorio de Cristo. Ele divide os
ofícios de Cristo e os benefícios de Cristo. Esse é o problema dos "crentes" de hoje.
Freqüentemente Jesus tem sido apresentado na evangelização de hoje como alguém que está
aí para satisfazer todas as necessidades e desejos dos homens. Na pregação de hoje, Jesus é
apresentado como alguém que não exige que o homem ofereça o seu coração completo e a sua vida
completa. Quando os puritanos pregavam, instavam com os pecadores a se voltarem para Jesus e
avisavam que eles precisavam avaliar o preço de seguir a Jesus, e o preço era perder a sua vida;
morrer diariamente por amor a Cristo, negar-se a si mesmo, tomar a cruz e segui-lO. Os puritanos
tinham horror àquilo que hoje é chamada "a graça barata", porque, na verdade, essa não é uma
graça verdadeira. Graça barata significa que eu aceito Jesus na minha própria força; Ele reforma um
pouco a minha vida por fora, porém eu continuo agindo com os princípios egocêntricos no meu ser
interior. A graça barata me leva a pensar que, por um lado, eu tenho a Jesus, que estou a caminho
para o céu, mas, por outro lado me permite continuar vivendo uma vida mundana. Na verdade, eu
estou mesmo no meu caminho para o inferno. Os puritanos apresentavam Jesus como um Salvador
completo para um pecador completo. Um puritano disse: "O pregador que é o seu melhor amigo, é
aquele que vai dizer mais verdades sobre você mesmo". Eles não estavam preocupados em causar
dano ao amor próprio dos ouvintes das suas congregações. Eles estavam mais preocupados com
Cristo do que com os ouvintes. Estavam preocupados com a Trindade. O cristão encontra o seu
amor próprio a medida que ele ama ao Pai que o criou, ao Filho que o restaurou através da cruz, e
no amor ao Espírito Santo que mora nele e que faz com que sua alma e seu corpo sejam templo do
Espírito Santo.
4. A doutrina puritana expandia e explanava com detalhes a doutrina da santificação. A
vida inteira do crente era para ser colocada aos pés de Deus. Ele tinha que trilhar a vereda do Rei no
caminho da justiça. Ele precisava conhecer a vida de uma forma experimental. Precisava conhecer
essas "irmãs siamesas" que são, a vida e a experiência. Quando o ministro prega sobre santificação,
você precisa saber o que está sendo requerido de sua parte. Você não pode entender estas coisas
sem doutrina e isso nos traz à terceira característica da pregação dos puritanos.
Em terceiro lugar, destacamos que a pregação puritana era experimentalmente prática.
A ausência de uma pregação experimental e prática é uma das grandes falhas no culto e na
evangelização de hoje. O que significa uma pregação experimental? A palavra experimental vem da
palavra experiência. Em termos de cristianismo, a religião experimental significa que a Palavra de
Deus e suas doutrinas precisam ser recebidas não apenas na mente (os puritanos chamavam isso de
conhecimento na cabeça, apenas), mas também precisam ser experimentadas e vividas no coração.
Isso eles chamavam de "conhecimento do coração". Eles baseavam este tipo de ensinamento, por
exemplo, em Provérbios 4:23: "Sobre tudo o que se deve guardar, guarda o teu coração, porque
dele procedem as fontes da vida".
Para os puritanos os pensamentos precisam fluir das Escrituras e as experiências do coração,
fluem do ensino da doutrina e das Escrituras. Dessa forma, experiência não é alguma coisa mística,
separada da Bíblia. Isso eles rejeitavam totalmente! Ao mesmo tempo, eles também rejeitavam
completamente o tipo de religião que se satisfaz com o conhecimento apenas na cabeça, que é só
racional. Estas doutrinas sobre as quais falamos resumidamente, a doutrina de Deus, de Cristo e do
pecado, para os puritanos deviam ser tão reais quanto as cadeiras em que sentamos. Estas doutrinas
precisam ser transformadas numa realidade que queime dentro de minha alma. Elas precisam
influenciar toda a minha vida, todo o meu estilo de vida. Dessa forma, os puritanos acreditavam em
viver, na prática, o que eles experimentavam. Sempre eles traziam suas experiências às Escrituras
para terem a certeza de que estavam sendo totalmente bíblicos - até nas suas experiências. Para os
puritanos doutrina seria algo vazio se não fosse acompanhada pela experiência. Toda experiência
verdadeira leva a uma experiência pessoal com Cristo. Por isso é necessária a pregação da Pessoa
de Cristo e esta pregação será honrada pelo Espírito Santo, porque Ele toma estas coisas e as aplica
aos pecadores.
Os puritanos, na sua pregação, incluíam o que chamavam de "marcas de um auto exame".
Estas marcas de exame eram os sinais que distinguiam a Igreja do mundo. Distinguiam os
verdadeiros crentes daqueles que eram crentes nominais ou apenas por professarem a fé. Os
puritanos faziam distinção entre fé salvadora e fé temporária. Muitos livros têm sido escritos a
respeito deste assunto. O mais famoso deles foi escrito por Jonathan Edwards: Afeições Religiosas.
Também o livro de João Bunyan, O Peregrino, contém tais marcas. O que nós hoje,
desesperadamente precisamos, é de uma volta a este estilo de evangelização reformado-puritano
que sempre está pesquisando e sondando o coração. Os puritanos nunca diziam de uma forma
"leviana" que os pecados do povo estavam perdoados, mas pregavam de forma profunda o que
realmente o pecado é e como ele tem afetado as pessoas. Eles procuravam tirar do pecador todo o
seu sentimento de justiça própria para, então, levá-lo ao Senhor Jesus Cristo.
Alguém disse que a religião da América, hoje, tem 2.000 km de comprimento por 3.500 Km
de largura (essas são as dimensões do país), mas com uma profundidade de mais ou menos 12
centímetros, apenas! O problema, em todos os lugares no mundo, hoje, é que a evangelização
freqüentemente começa num lugar errado. Poderíamos dizer muitas coisas sobre as diferenças entre
a evangelização moderna e a puritana, em relação à experiência do povo de Deus. Pois bem, quero
apenas destacar um ponto e este é a resposta a uma pergunta: quando olhamos atrás para a história
da Igreja, e também na história bíblica, observando as épocas de avivamento verdadeiro, não
produzido pelo homem, qual era o elemento evidente naquela época que hoje está claramente
ausente? Respondemos sem hesitação que é a ausência de profunda convicção de pecado. Este é um
grande problema nos nossos dias.

Convicção de pecado
Hoje há muito pouca convicção de pecado entre os não salvos. A maioria dos chamados
"cristãos" contemporâneos, vive de maneira tão descuidada em sua vida, que é muito difícil alguém
diferenciá -los de homens não convertidos. O problema é que freqüentemente o pecado não é
pregado como pecado para as pessoas; o horror do pecado não é enfatizado às pessoas. Isso nos leva
a uma pergunta ainda mais profunda: por que as épocas de avivamento realizado pelo Espírito Santo
foram períodos de profunda convicção de pecado? A resposta é que o Espírito Santo, como Jesus
nos diz, vem para convencer do pecado, da justiça e do juízo. Assim, o convencimento do pecado é
o caminho pelo qual Deus age para abrir espaço no coração do pecador. Quando o homem vê a
realidade de Deus e a realidade do pecado contra Deus, ele se humilha até o pó. Só então, ele vai
apreciar o que aquele Deus-homem, Jesus Cristo, fez por nós pecadores. Foi o que aconteceu com
Isaías quando ele chegou à presença de Deus: "Ai de mim porque sou um homem de lábios
impuros..." O mesmo aconteceu com Jó ao chegar à presença de Deus. Por cerca de quarenta
capítulos no livro de Jó ele estava mais ou menos se defendendo, estava lutando para entender o que
Deus havia feito com ele. Mas ao se sentir na presença de Deus, o Senhor Se tornou tão grande e Jó
tornou-se tão pequeno, que perdeu todas as suas defesas. Então Jó falou: "Eu te conhecia só de
ouvir, mas agora os meus olhos te vêem. Por isso me abomino, e me arrependo no pó e na cinza"
(Jó 42:5-6). Ele já havia ouvido falar de Deus antes, porém agora ele "viu a Deus", pela fé e perdeu
tudo que estava do seu lado e se lançou como um pobre pecador, tão somente na misericórdia de
Deus. É isso que está faltando na evangelização moderna. Não se vêem pecadores chegando até a
cruz e clamando como aquele publicano que disse em sua oração: "Ó Deus, tem misericórdia de
mim pecador".
Vocês vêem o que é realmente o pecado, e quem é Deus? Se assim acontecer seremos
levados à cruz e, quando experimentarmos pela fé a beleza e plenitude de Cristo na cruz, não
precisaremos de nenhuma explicação da parte de Deus por aquilo que Ele está fazendo em nossa
vida. Nós nos inclinamos diante dEle e dizemos que seja feita a Sua vontade. Deus nunca explicou a
Jó por que Ele fez tudo aquilo com sua vida. Entretanto, veio de Deus o poder para que Jó fosse
justo aos Seus olhos.
Avivamento
Isso nos leva a outra questão. Se a falta de convicção de pecado é um problema tão sério,
como pode esse tipo de convicção ser restaurado à Igreja hoje? Novamente aqui a história da Igreja
nos dá uma resposta muito clara. O Espírito Santo encontra um homem caído, quebrantado; este
homem chega diante da cruz e encontra a plenitude da salvação em Cristo Jesus, e o Espírito envia
esse tipo de homem para pregar o pecado e a conversão aos outros. Em outras palavras, Deus está
levantando homens que sejam santos, que sejam humildes, homens de oração para usá-los; homens
que odeiam o pecado e que amem a Deus; homens que estejam tremendamente convictos da
necessidade da salvação de almas; homens que estejam orando sempre por um avivamento bíblico,
um avivamento do Espírito Santo. Deus usa este tipo de homem para trazer avivamento. Lembremse que o avivamento começa com uma convicção experimental de pecado.
Arrependimento
Isso nos leva a outra questão. Quando Deus Se agrada em levantar esse tipo de homem, será
que alguma coisa específica em sua pregação tem conexão com a convicção de pecado? Creio que a
resposta é sim! É esse tipo de homem, que de forma incisiva, se dirige à convicção da consciência,
de uma forma bem aguçada. Eles mostram aos pecadores de forma clara a necessidade de
arrependimento e o Espírito Santo Se agrada em honrar e abençoar a Sua Palavra quando este
homem prega de forma convincente. O que aconteceu com João Batista quando ele começou a
pregar com convicção? Os homens começaram a fugir da ira vindoura. O que aconteceu quando
Pedro pregou com profunda convicção no dia de Pentecoste? O Espírito Santo desceu sobre os que
ouviam a sua palavra.
Evangelização moderna
Por isso minha tese é: a evangelização moderna está se levantando como um obstáculo
frontal, com raras exceções, à verdadeira convicção de pecado, ao arrependimento e ao verdadeiro
avivamento. A evangelização moderna tem uma visão superficial de pecado; fala tão pouco de um
assunto que a Bíblia tanto menciona. Por que a evangelização moderna fala tão pouco a respeito do
pecado? A evangelização moderna tem medo de falar às pessoas as verdades a respeito delas
mesmas; tem medo de perdê-las. Ensina que nós não devemos ofender as pessoas, e sim, sempre
conquistá -las. A razão humana diz que não vamos ganhar as pessoas se lhes falarmos do pecado. A
evangelização moderna não nega que o homem esteja morto nos seus delitos e pecados; não nega
que a Bíblia diz em Romanos 8:7, que a mente carnal está em inimizade contra Deus; não nega que
está escrito em 1 Coríntios, capítulo 2, que o homem natural não aceita, não compreende as coisas
de Deus, mas a evangelização moderna diz que textos assim são apenas afirmações doutrinárias.
Diz que esses textos são relevantes para os crentes, todavia não seriam relevantes para os não
salvos. Dizem: "Como podemos ganhar as pessoas se dissermos que elas não podem se salvar a si
próprias?" Concluem, assim, que qualquer ensino que retira da mente dos ouvintes a capacidade de
responder imediatamente ao evangelho, na verdade é alguma coisa que impede a evangelização.
Dessa forma fazem do cristianismo alguma coisa bem simples e fácil. Dizem: "aceite a
Jesus hoje, é simples, não precisa se preocupar com seus pecados, Ele já lhe perdoou. " Mas eles
não somam aí o que é que significa realmente ser perdoado e quais os frutos de uma vida
verdadeiramente perdoada. Por isso, a evangelização moderna produz cristãos muito superficiais,
com uma religiosidade de apenas "12 centímetros" de profundidade. O pastor batista, Erroll Hulse,
trabalhou certa vez em uma cruzada evangelística de massa com o Dr. Billy Graham e logo após,
teve de escrever um livro intitulado, O Dilema do Pastor, onde esclarece que menos de cinco por
cento dos que vinham à frente, no apelo, mostravam frutos subseqüentes em suas vidas. Se formos
comparar por um momento, tudo isso, com o ministério do puritano Richard Baxter, que teve 600
pessoas convertidas na pequenina cidade de Kidderminster onde foi pastor, fazendo-o dizer no fim
de sua vida que ele não sabia de nenhum que tivesse caído ao longo do caminho, perceberemos que
há uma grande diferença. Há uma diferença entre uma pregação superficial a respeito de Jesus e que
ignora o pecado, e uma pregação que diz ao pecador que ele não vai saber valorizar a Jesus
enquanto não souber claramente o que é pecado. A evangelização moderna põe toda a pressão em
cima da vontade do pecador e o pecador precisa tomar uma decisão imediata. Um ato de decisão
feito pelo homem usurpa o papel do Espírito Santo em salvar pecadores.
Evangelização puritana
A evangelização puritana tem uma mensagem bem mais ampla sobre o que é o evangelho. O
dever da fé é enfatizado, mas outros deveres também são ressaltados. Os evangelistas puritanos vão
dizer aos seus ouvintes, não salvos, que eles precisam se arrepender, precisam parar de fazer o mal,
precisam ser santos como Deus é santo, precisam amar a Deus de todo o coração e precisam entrar
pela porta estreita. Tudo isso é enfatizado na evangelização puritana. Noutras palavras,a
evangelização puritana apresenta a Bíblia como um todo para confrontar o incrédulo. Contudo,
sejamos cuidadosos aqui. Eles não pregavam que o incrédulo tinha capacidade de fazer estas coisas,
mas pregavam a seus ouvintes as exigências das Escrituras, sabendo que o Espírito Santo é quem
faz tudo isso para mostrar aos pecadores que eles não podem cumpri-las por sua própria força.
O alvo do puritano era levar a alma não sal va a uma encruzilhada, quando duas estradas se
cruzam. Uma dessas estradas poderia ser chamada a estrada da necessidade e o pecador realmente
convencido diria: "Eu preciso ser salvo, salvação é minha necessidade!" A outra estrada poderia ser
chamada a estrada da impossibilidade. O pecador diria: "Eu não posso ser salvo; eu não consigo ser
santo como Deus é santo; não posso ir a Jesus e me dobrar diante dEle por minha própria força".
Qual era o alvo do puritano? Era o de levar o pecador a esta encruzilhada e ao chegar lá descobrir
que precisa ser salvo mas não pode. Dessa forma ele vai clamar ao Deus todo-poderoso: "Faze por
mim ó Senhor, o que eu não posso fazer por mim mesmo!". É isso que Paulo faz nos capítulos 1,2 e
3 de Romanos; o mesmo fez João Batista quando pregava assim: "Arrependei-vos porque o reino de
Deus está próximo". João Batista não começou dizendo: "Eis o Cordeiro de Deus...", porém
começou dizendo "arrependei-vos". Quando Jesus começou Seu ministério pastoral, Ele não disse
"tome uma decisão por mim", mas também começou dizendo "arrependei-vos porque o reino de
Deus é chegado". Como foi que Jesus evangelizou Nicodemus?Ele disse: "você precisa nascer de
novo". Como Jesus evangelizou o jovem rico? Ele disse: "Guarde os mandamentos". Por que Jesus
lhe disse isso? Ele sabia que o jovem não podia guardar todos os mandamentos no seu coração.
Jesus estava colocando como alvo a convicção de pecado.
Os puritanos não faziam na sua evangelização nada que os apóstolos e o próprio Senhor
Jesus não fizesse. Eles pregavam a lei para que os pecadores se sentissem culpados perante Deus e
aí pregavam Cristo, não um Cristo de 12 centímetros de profundidade, e sim, Cristo completo na
Sua altitude, na Sua amplitude e na Sua profundidade. Pregavam Cristo destacando Seus ofícios,
Seus nomes e Seus títulos. Pregavam Sua natureza e Sua Pessoa,pregavam-no plenamente. Isso nos
leva a uma conclusão: o que nós estamos precisando desesperadamente é de uma evangelização
centralizada em Deus; uma evangelização centralizada na mensagem; centralizada na Bíblia; não
uma evangelização feita pelo homem, mas uma evangelização onde o Espírito Santo está agindo na
Palavra e por meio dela. Para este fim você e eu, como evangelistas, nós mesmos fomos restaurados
para um relacionamento mais vital e íntimo com Deus por Jesus Cristo. O que nós precisamos
desesperadamente é de carregadores da tocha, homens e mulheres que estejam em chamas por
Deus. Não de homens que estejam em fogo por ensinos não bíblicos, mas de homens inflamados
pelo ensino da Palavra de Deus - sim, de homens cheios daquele temor filial a Deus. Você já
percebeu que todas as vezes que Paulo fala a pastores e presbíteros para dar-lhes algum conselho ele
sempre diz, "Tem cuidado de ti mesmo e depois do rebanho"?
Conclusão
Querido irmão, se você não odiar o pecado, se você não amar a Deus, se não estiver cheio
do poder de Cristo, não deve ficar surpreso de seu ministério ser tão infrutífero. Se as pessoas
perceberem que viver religiosamente não é viver a realidade da nossa vida, elas vão ser levadas a
desobedecer as nossas mensagens. Um dos nossos grandes problemas hoje é que a nossa própria
casa não está em ordem. Que Deus nos leve a conhecê-lo de uma forma íntima e pessoal, seguindo0 de forma incondicional e pregando todo o conselho de Deus.
Queridos amigos, o tempo está curto, muito cedo vamos pregar nosso último sermão, fazer a
nossa última oração, participar da nossa última conferência, e a única coisa que realmente vai contar
é a seguinte: conhecemos realmente a Deus e a Jesus Cristo a quem Ele levou assunto aos céus?
Que Deus nos faça portadores da tocha da evangelização puritana em nossa geração.
4
A Tocha da Evangelização Levada pelos Puritanos
O Método da Evangelização Puritana e A Disposição Interna do Coração

Raízes da evangelização moderna
A fim de compreendermos estes dois pensamentos (o método da evangelização Puritana e a
disposição interna do coração) precisamos contrastá-los com a evangelização moderna. Só assim
poderemos apreciar o aspecto característico da evangelização puritana. Para isso vamos voltar um
pouco ao século XIX para considerarmos as raízes da evangelização moderna.
A evangelização moderna tem as suas raízes nos anos 1820 sob a liderança de Charles
Finney, que freqüentemente é chamado de "o pai" da evangelização moderna. Finney foi criado em
Nova Iorque e tinha o grau de advogado. Começou sua prática como advogado nos anos de 1820
em Nova Iorque. No ano seguinte teve uma experiência religiosa muito profunda e isso o
influenciou para que deixasse seu escritório de advocacia e se dedicasse inteiramente ao ministério.
Foi ordenado pastor presbiteriano em 1824 e por 8 anos liderou eventos e reuniões de avivamento
no leste dos E.U.A. Por quatro anos trabalhou como pastor em Nova Iorque e nos últimos quarenta
anos de sua vida foi professor na Universidade de Oberlin no estado de Ohio. Através dessas
décadas ele continuou fazendo reuniões de avivamento. Ele inventou aquilo que se chama de "novas
medidas" para avivamento que incluem: (a) reuniões com muita emoção e (b) o banco dos
"ansiosos". Eram reuniões evangelísticas caracterizadas por uma atividade intensa, que duravam
dois ou três dias e nos quais Finney pregava duas vezes ao dia. O banco dos "ansiosos" era o
primeiro banco da igreja que era deixado vazio para que as pessoas ansiosas pudessem vir e se
assentar ali, recebendo uma ministração individual. No final dos seus sermões Finney diria: "Aqui
está o banco dos "ansiosos", se vocês estiverem do lado do Senhor, venham à frente." Hoje a
evangelização de massa, é um desenvolvimento das chamadas "novas medidas" dos avivamentos de
Finney.
Em suas campanhas evangelísticas, Billy Graham apresenta um estilo polido destas cruzadas
feitas por Finney. Essas chamadas ao altar para que as pessoas venham à frente e confessem Jesus
Cristo, é uma versão moderna do banco dos "ansiosos". Hoje nós estamos tão acostumados com este
estilo de evangelização moderna, que dificilmente percebemos que é uma inovação na história da
Igreja. Com freqüência nos esquecemos de quão distante está da evangelização bíblica. Tanto
Finney, quanto a evangelização moderna, cometeram alguns erros básicos em diferentes aspectos
das Escrituras. Vamos mencionar quatro áreas em que se afastaram dos princípios bíblicos.

Deficiências da evangelização moderna
1. Aceitação do pelagianismo. Embora certos elementos calvinistas estejam presentes, a
evangelização moderna, seguindo a teologia de Fnney, é essencialmente arminiana na sua
apresentação do evangelho. Finney era confessadamente um pelagiano (Pelágio foi um herege do
século IV que sofreu dura oposição de Agostinho). Ele negava que o homem caído fosse incapaz de
se arrepender. Dizia que cada pessoa tem a liberdade e a vontade livre de arrepender-se e voltar-se
para Deus; que cada pecador pode resistir ao chamado do Espírito Santo, e que este Espírito apenas
apresenta-lhe razões pelas quais ele deve ir a Deus. O pecador, entretanto, é livre para aceitar ou
rejeitar as razões apresentadas. Dessa forma, em última análise, a salvação não é uma obra de Deus,
é realmente um trabalho do próprio homem. Finney escreveu o seguinte: "Pecadores vão para o
inferno apesar de Deus". Finney negou os cinco pontos do calvinismo, e não subscreveu os
ensinamentos de Jesus de que o homem precisa nascer de novo, nascer do alto, doutra forma ele não
pode entrar no reino de Deus.
2. Finney e a evangelização moderna colocam uma pressão indevida sobre a vontade
humana. Se a vontade humana, pecadora, é livre, segundo os evangelistas semipelagianos afirmam,
apregação é reduzida simplesmente a uma batalha entre a vontade dos ouvintes e a vontade do
pregador. O resultado disso é que todos os meios que o pregador puder usar para persuadir os seus
ouvintes a aceitar a Cristo, acabam se tornando lícitos, mesmo que sejam baseados num excesso de
emocionalismo do auditório. O alvo principal nestes casos é mover a vontade do homem, e levá-lo a
fazer uma decisão imediata. O contrário disso, vemos no ensino de João 1:13: "... os quais não
nasceram do sangue nem da vontade da carne, nem da vontade do homem, mas de Deus."
3. Finney e a evangelização moderna reduzem o processo de conversão a um espaço curto
de tempo. Isso não é bíblico! A Bíblia apresenta a conversão como sendo um processo por vezes
demorado. Entretanto, para a evangelização moderna, a conversão é um processo de mais ou menos
dez minutos. Recentemente foi escrito um livro sobre evangelização que faz com que o evangelista
caia em profundo sentimento de culpa, se demorar mais de dez minutos para converter alguém.
Chegamos a conclusão que, para muitos evangelistas modernos, a salvação não é mais aquele
trabalho miraculoso, soberano e misterioso do Espírito Santo de Deus, e sim, o trabalho calculável
da ação do homem. Isso é contrário ao que lemos em João 3:8: "O vento sopra onde quer, ouves a
sua voz, mas não sabes donde vem, nem para onde vai; assim é todo o que é nascido do Espírito ".
O que realmente tem acontecido nos últimos 175 anos, é o seguinte: Finney e a evangelização
moderna perderam o sentido de conversão bíblica; perderam o conceito de conversão como uma
obra miraculosa; perderam o sentimento daquela dependência total do homem em Deus, na sua
conversão.
4. Grande parte dos resultados da evangelização moderna é questionável. Diversos
estudos têm provado que a evangelização de massa, utilizado em grande parte nas cruzadas, em que
o próprio homem decide a sua salvação, leva, finalmente, a um cristianismo muito superficial, que
quase não dá fruto. Isso não quer dizer que não existam certos indivíduos a quem Deus realmente
converteu em tais tipos de reuniões. A Bíblia diz que Deus pode fazer com que uma vara torta se
torne reta. Entretanto, esse fato não nos isenta da responsabilidade em apresentar aos nossos
ouvintes uma evangelização bíblico e saudável, uma evangelização que tenha uma profundidade
maior, uma evangelização que começa, centraliza-se e termina em Deus. É isso que descobrimos
quando nos voltamos para o método dos puritanos.
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  • 1.
  • 2. Palestras proferidas no simpósio OS PURITANOS em 1995 Joel R. Beeke PUBLICAÇÕES EVANGÉLICAS SELECIONADAS Caixa Postal 1287 10159-970-São Paulo-SP Ao irmão, amigo e conselheiro, Olin Coleman, grande incentivador da literatura reformada e puritana. Aos que batalham pela fé reformada, que desejam ver um dia estabelecidas, nesta nação, as antigas doutrinas da graça, uma reforma na igreja brasileira e a prática de uma evangelização bíblica sem adições ou subtrações. ÍNDICE Prefácio 1 .A Tocha da Evangelização Acesa no Novo Testamento 2. A Tocha da Evangelização Reacesa pela Reforma 3.A Tocha Levada pelos Puritanos (A Mensagem da Evangelização Puritana) 4.A Tocha Levada pelos Puritanos (O Método da Evangelização Puritana e a Disposição Interna do Coração) 5.A Tocha da Evangelização Passada para Nós
  • 3. PREFÁCIO Após 40 anos no evangelho, defrontei-me com a literatura puritana e reformada. Tal foi o impacto em minha vida que me senti como alguém que vai reclamar seus supostos direitos e se depara, para sua surpresa, com a realidade de que estava errado, e que seus direitos eram falsos. Senti-me envergonhado do movimento evangélico superficial, humanista, vivenciado há tanto tempo em nosso meio e que não considera a soberania de Deus, mas coloca no homem o poder de realizar. Ao ler a literatura puritana e reformada os meus olhos foram abertos para ver o caminho que trilhava. Percebi logo que boa parte do movimento evangélico moderno, mesmo falando da graça de Deus, não a compreende como ela é apresentada na bíblia. Afirma que, pela graça, todos os homens têm a capacidade de crer e aceitar o evangelho; é uma decisão deles. Por isso Dr. M. Lloyd-Jones afirmou: "Embora comecem com a graça, na seqüência a negam". Percebi que o movimento evangélico moderno fala da Bíblia como a única regra de fé e prática mas não compreende o significado de Sola Scriptura, como os reformadores a ensinavam, e era vivida pelos puritanos de forma madura. Muito do movimento evangélico moderno tem feito acréscimos, adições às Escrituras, como fizeram os judeus na época de Jesus, quando citavam mais de 600 leis que não estavam naTorah, ou mesmo como a igreja católica romana, com toda sua tradição maligna, que tem levado milhões de pessoas à condenação, por causa de ensinos apócrifos, antibíblicos, esquecendo-se de que Deus trará maior juízo àqueles que ensinam falsidade (Tiago 3:1). Recentemente um grupo de congressistas questionou um famoso líder americano e professor de missiologia sobre suas práticas na área de batalha espiritual e missões. Sua resposta foi: "É verdade que não está na Bíblia, mas funciona". Creio que é exatamente este pragmatismo religioso, não bíblico, que domina em grande parte nosso movimento evangélico, nossa prática cristã e especialmente nossa evangelização. Os métodos evangelísticos não bíblicos, se estão funcionando, são considerados válidos. Será que estamos esquecidos das palavras de Jesus que serão proferidas no dia do juízo contra aqueles que evangelizaram de forma condenável, mesmo que bem sucedidos: "Nunca vos conheci"? (Mat.7:23). Um dia comecei a ler sobre Pelágio, o herege dos séculos IV e V, que fora tão combatido
  • 4. por Agostinho e por fim condenado pelo Concilio de Éfeso. Pelágio não só ficou conhecido por negar o pecado original, mas especialmente pelas suas idéias do livre--arbítrio fundamental do homem, que o faz capaz de querer e fazer (até mesmo o bem espiritual). Pelágio pensava a respeito da graça como sendo apenas uma ajuda externa de Deus, do Espírito Santo, para a alma humana; um tipo de ação que persuade o homem pela razão e o faz usar seu livre-arbítrio, sua capacidade de obedecer ou não a lei de Moisés e os ensinos de Jesus. Para Pelágio, a predestinação divina é algo que opera apenas de acordo com as qualidades das pessoas, as quais Deus prevê que terão. É algo baseado no mérito das pessoas. Dessa forma a fé não é um dom, e sim, uma obra meritória para levá-las à salvação. Assim, o homem pode tomar uma decisão por Cristo na dependência apenas de sua própria vontade, independente de Deus. Ou seja, tudo depende do homem. Quando tomei conhecimento de tudo isso, comecei aperceber que muita da nossa evangelização é calcada em cima desses princípios, com apenas algumas mudanças (semipelagianismo), como o reconhecimento do pecado original do homem, sua enfermidade moral. Entretanto, continua defendendo que o homem é que dá o primeiro passo em direção a Deus, com suas próprias forças e, que por isso, Deus o recompensará. Todo o sistema de apelo por decisões está baseado nestes princípios, e não foi sem razão que Finney (pelagiano declarado) tenha sido o iniciador desse sistema de convidar pessoas a virem à frente, usando o livre-arbítrio, como demonstração de fé e conversão. Falar contra estas coisas hoje é provocar a ira de muitos. Os grande pregadores e missionários batistas, congregacionais e presbiterianos do passado sempre condenaram estes princípios não bíblicos, e a Igreja foi tremendamente abençoada por serem defensores das antigas doutrinas da graça, defensores de um evangelho centralizado na soberania de Deus, um evangelho que diz ser Deus o iniciador e consumador da nossa fé e da nossa salvação. Infelizmente o semipelagianismo defendido por Armínio espalha-se no nosso meio e é praticado por quase a totalidade da evangelização moderna. A situação é tão grave que raramente se vêem programas de rádio e televisão, ou mensagens (com raras excessões) que pudessem ser aprovados pelos reformadores e puritanos (congregacionais, batistas e presbiterianos) do passado; nossos pais espirituais. Percebo que é algo natural, que vem da natureza humana corrompida, da "sabedoria da carne", como dizia Martinho Lutero, a idéia de que o homem pode exercer fé por si mesmo para ser justificado; que pode usar seu livre-arbítrio para ser salvo; que Deus não pediria algo de nós (crer, arrepender--se), se nós não pudéssemos realizá-lo. Isto é pensar como Pelágio (esquecem do Salmo 127:1-2; Mat.l6:17; 19:26; Joãol:13; 3:27; 6:44-65). Toda esta visão doutrinária e prática é incompatível com o pensamento do maior pregador da Inglaterra no século XVIII, George Whitefield, que não temia afirmar que o homem natural já nasce arminiano. Preocupado com esta visão distorcida da evangelização, e a ironia e desprezo da parte de muitos para com o ensino bíblico calvinista, praticado pelos grandes missionários batistas como William Carey ou congregacionais como Robert Kalley (chamado de "O Lobo Calvinista") e presbiterianos como Ashbel Green Simonton e os grandes pregadores do passado, o projeto Os Puritanos realizou o seu simpósio anual em 1995 sobre o tema da evangelização bíblica e puritana. Para isso foi convidado o Dr. Joel Beeke, pastor reformado em Grand Rapids, Michigan, Estados Unidos, doutor e mestre, estudioso da história e do ensino reformados desde os nove anos de idade, para abordar este tema tão importante que é a evangelização reformada. O Dr. Joel Beeke apresenta de forma simples e piedosa, a necessidade da evangelização fundamentada na soberania de Deus, e que enfatize a responsabilidade do homem. Neste aspecto Calvino nos ensina a sermos evangelistas e que a doutrina da eleição não leva à passividade na evangelização; pelo contrário, nos leva à atividade. O autor afirma que nós não somos responsáveis pelos resultados da nossa evangelização, e sim, pela fidelidade da mensagem e pelos métodos que usamos. Disso prestaremos conta. Portanto, o que devemos fazer é lançar a semente e esperar no Senhor. Os resultados pertencem a Deus, é verdade, mas temos de ir em busca das ovelhas de Cristo. A eleição não exclui os meios pelos quais Deus chama os Seus de forma eficaz. No túmulo de David Livingstone está escrito o que o motivou ser missionário na África: "Ainda tenho outras ovelhas, não deste aprisco; a mim me convém conduzi-las" (João 10:16). Assim como Jesus veio ao mundo em busca de Suas ovelhas e por elas morreu, Livingstone foi à África em busca das ovelhas
  • 5. do Senhor. Este livro pode ser um grande orientador de como podemos evangelizar para a glória de Deus e nos despertar para sermos verdadeiros evangelistas, obedientes a Cristo e ganhadores de almas. Que possamos levar esta tocha da evangelização como os cristãos primitivos, como os reformadores e puritanos fizeram. Agradeço a Deus ter conhecido e ouvido o Dr. Joel Beeke; suas palavras eram carregadas de amor, piedade e firmeza doutrinária. Todos nós do Projeto Os Puritanos aprendemos muito com o Dr. Beeke sobre o que é ser um evangelista como a Bíblia recomenda. Caro leitor, aproveite das palavras escritas neste livro e, com a ajuda de Deus, seja um evangelista fiel. Manoel Canuto Coordenador do Projeto Os Puritanos 1 A Tocha da Evangelização Acesa no Novo Testamento "Jesus, aproximando-se, falou-lhes, dizendo: toda a autoridade me foi dada no céu e na terra. Ide, portanto, fazei discípulos de todas as nações, batizando-os em nome do Pai e do Filho e do Espírito Santo; ensinando-os a guardar todas as cousas que vos tenho ordenado. E eis que estou convosco todos os dias até à consumação dos séculos." - Mateus 28:18-20 "E assim, se alguém está em Cristo, é nova criatura: as coisas antigas já passaram; eis que se fizeram novas. Ora, tudo provém de Deus que nos reconciliou consigo mesmo por meio de Cristo, e nos deu o ministério da reconciliação, a saber, que Deus estava em Cristo, reconciliando consigo o mundo, não imputando aos homens as suas transgressões, e nos confiou a palavra da reconciliação. De sorte que somos embaixadores em nome de Cristo, como se Deus exortasse por nosso intermédio. Em nome de Cristo, pois rogamos que vos reconcilieis com Deus. Àquele que não conheceu pecado, ele o fez pecado por nós; para que nele fossemos feitos justiça de Deus." - 2 Coríntios 5:17-21 Introdução Evangelização Reformada é um tema bastante vasto. Muitas pessoas chegam a negar a sua existência, pois não crêem que exista tal coisa. Nossa esperança é, por um lado, não exagerar a força da evangelização reformada, e por outro, não diminuir as suas fraquezas. Este assunto pode melhor ser apresentado através de uma ilustração. Na América existiu um pastor que era um homem de Deus, mas tinha um problema terrível. Gostava de constantemente exagerar nas sua afirmações. Seu conselho se reuniu, e procurou conversar com ele sobre o problema. O pastor estava consciente desta sua falha e via que precisava de ajuda. Após conversarem, chegaram ao seguinte acordo: quando o pastor, do púlpito, exagerasse em alguma coisa, um dos presbíteros daria uma leve tossida. Então o pastor saberia que deveria "maneirar" um pouco nas suas afirmações, pois estaria além dos limites da realidade. Quando chegou o domingo ele teve a sua chance de ser testado com este sistema. O pastor começou a pregar sobre Sansão. Descrevia como ele pegara trezentas raposas
  • 6. e como amarrou suas caudas. Estava muito envolvido na descrição desta cena e disse que quando Sansão tomou as caudas das raposas para amarrá-las, estas caudas eram do tamanho dos braços abertos de um homem (ele fez este gesto). Nesta hora o presbítero deu uma tossidinha. O pastor, então diminuiu o gesto na tentativa de dizer que as caudas eram menores, mas mesmo assim ainda exagerava. O presbítero novamente tossiu. Ele diminuiu o tamanho, porém ainda estava exagerando. Nova tossidinha. O pastor, então, não se contendo, perguntou: "Irmão, afinal de contas qual era o tamanho das caudas das raposas?". Algumas pessoas dizem que a evangelização reformada não tem "cauda" e outros dizem que sua "cauda" é imensa. Queremos lidar de uma forma bem realista com os pontos fortes e os pontos fracos da evangelização reformada. Focalizaremos alguns princípios neo-testamentários de evangelização. Eles estão de fato no Novo Testamento. Como foi que Calvino construiu em cima destes princípios a sua própria evangelização, sendo pai da sistematização da verdade reformada e também da sistematização da evangelização reformada? O que os puritanos têm a nos dizer sobre a evangelização reformada? Como podemos tomar esta tocha da evangelização reformada, hoje, e passá-la adiante às nossas comunidades e à nação? Definindo a evangelização O que é a evangelização? Há muitas definições que são dadas. Poderíamos passar muito tempo só definindo-a. Mas quero dizer algumas coisas. Em primeiro lugar não devemos definir a evangelização nos termos daqueles que vão receber a mensagem. Isso pode nos levar a comprometer a mensagem e a mudá-la. Em segundo lugar, também não devemos definir a evangelização em termos dos seus resultados. Pois dessa forma, você diria que William Carey não estava fazendo evangelização nos primeiros anos em que ele esteve na índia, porque por muitos anos ele não viu nenhum convertido. Em terceiro lugar, não devemos definir a evangelização em termos dos métodos usados. Dessa forma, se pensarmos assim, os fins vão justificar os meios e nós vamos terminar naquilo que é tão comum hoje, a chamada "evangelização pragmática". Essa "evangelização" está mais preocupada com os números do que com a verdade. Nós precisamos definir a evangelização em termos do significado da própria palavra. Evangelização vem de uma palavra grega que significa "boas novas". Assim, poderíamos definir a evangelização como sendo a proclamação das boas novas, a proclamação do evangelho. Nele buscamos, pela graça de Deus, a conversão de pecadores. Num sentido mais amplo podemos dizer que inclui a edificação dos filhos de Deus. Inicialmente, a evangelização procura a conversão de pecadores e no sentido mais amplo, procura o discipulado daqueles que já nasceram de novo. Esta palavra grega aqui referida, euaggélion, está registrada 124 vezes no Novo Testamento. Portanto, a Bíblia é um livro evangelístico. Nosso Deus é um Deus evangelístico. A tocha acesa no Velho Testamento Na verdade, a tocha da evangelização foi acesa originalmente, no Velho Testamento. Em primeiro lugar foi acesa pelo próprio Deus na primeira promessa messiânica que Ele deu a Adão e Eva, lá no Éden. Vemos isso em Gênesis 3:15: "Porei inimizade entre ti e a mulher, entre a tua descendência e o seu descendente. Este te ferirá a cabeça, e tu Ihe ferirás o calcanhar". Aqui, Deus Jeová está agindo como um Deus evangelista. Ele está interceptando Adão e Eva numa relação pactuai que eles estavam tendo com satanás e traz para eles a promessa do Messias que haveria de vir: a semente da mulher que haveria de esmagar a cabeça da serpente. Assim, Deus acendeu a tocha antes mesmo de Adão deixar o paraíso e, ainda lá, Ele revela Seu Filho que haveria de vir. Ele próprio é essa tocha! Para que nós possamos lançar um bom alicerce, devemos dizer que o próprio Deus é o evangelizador por excelência. Através do Seu próprio Filho, e por meio dEle, o coração de Deus bate de uma forma evangelística. Ele não pode negar-Se a Si mesmo. Dessa forma Deus demonstra que tem os meios para levar avante este projeto evangelístico. Ele leva à frente estas boas novas através de todo o Velho Testamento. Através de toda a linhagem de Sete, Noé e de todos os patriarcas; por sua vez, esses patriarcas passam essa tocha para os filhos de Israel. A nação de Israel
  • 7. leva a tocha como quem leva a alma da evangelização. Israel é a alma que conduz à evangelização nos tempos do Velho Testamento, no meio do mundo gentio. Por fim, o último profeta do Velho Testamento, João Batista, foi privilegiado porque ele levou a tocha da evangelização à era do Novo Testamento. A tocha acesa no Novo Testamento Logo que o Novo Testamento se abre, nós encontramos a tocha, a Pessoa do Senhor Jesus Cristo, que é "as boas novas", o evangelho; Ele é tanto o Salvador quanto a salvação. Quando Cristo começa a realizar o Seu ministério, bem cedo, ele começa a dar aos Seus discípulos instruções bem específicas quanto ao levar a tocha da evangelização. Quando Jesus ressuscitou dos mortos, deulhes a grande comissão como vemos em Mateus, capítulo 28. Esta grande comissão pergunta e responde importantes questões. Por que e como evangelizamos? A nossa resposta é esta: evangelizamos por compaixão aos homens e mulheres que estão perecendo. Evangelizamos como Cristo, pois Ele chorou sobre a cidade de Jerusalém e nós devemos chorar sobre Recife, Rio de Janeiro, São Paulo e sobre todo o Brasil. Quando vemos milhões que estão morrendo em nossa volta, estranhos a Cristo, sem Deus e sem esperança no mundo, alienados de Deus, inimigos de Deus, rebeldes como outrora nós também fomos, nossos corações precisam sangrar; nossos olhos, chorar; nossas orações, subir aos céus e assim seremos motivados a evangelizar por causa da compaixão. Há outros motivos profundos que nos impelem à evangelização. Mateus, capítulo 28, deixa de forma absoluta e clara a grande motivação que é uma ordem de Jesus. Se nós amamos alguém, desejamos agradar-lhe e obedecer-lhe. Se amamos a Cristo queremos obedecer à Sua ordem e fazer a Sua vontade. Quando Cristo diz, "ide e ensinai", a Sua ordem em si é a nossa grande motivação. Naturalmente essa grande motivação é uma lição que nos vem através do conceito da soberania de Deus. Sempre fomos uma minoria na tradição reformada e uma outra minoria procura usar a soberania de Deus de uma forma, às vezes, não bíblica. Calvino diria que isso é como um "veneno" que está sobre, o conceito da soberania de Deus. Esta minoria, às vezes, procura diminuir a importância e o papel da soberania na salvação das pessoas. A ilustração clássica disso é o exemplo de William Carey. Quando ele explicou seu chamado para ir para a Índia, um dos que estavam naquela reunião lhe disse: "Sente-se, jovem, se Deus quer realmente salvar a Índia, Ele pode salvála sem a ajuda de William Carey ou de qualquer outro". Esta é uma afirmação terrível. Percebam que aquelas pessoas estavam separando a doutrina da soberania de Deus dos meios através dos quais essa soberania é exercida. Os meios que Deus usa no exercício da Sua soberania são homens pecadores como nós. Jesus disse: "Ide e ensinai". Jesus não está dizendo que se deixe a evangelização na esfera da soberania de Seu Pai. Também não está dizendo que devemos ficar apenas em uma sala ensinando. Há pessoas que têm um grande dom de ensinar, mas não saem para levar a mensagem de boas novas. Por outro lado, uma das grandes calamidades da Igreja hoje, é o fato de igrejas, que têm grandes alvos evangelísticos, possuirem líderes com tão pouca capacidade de ensino. Da mesma forma, igrejas que têm muitos com o dom de ensinar, freqüentemente apresentam baixos alvos evangelísticos. Precisamos voltar à ênfase de Jesus, que era a colocação das duas coisas juntas - ir e ensinar! Estas duas ações precisam estar juntos. Precisamos ser motivados à evangelização reformada pela obediência ao nosso Mestre. Quero citar mais um motivo. Devemos ser impelidos pelo nosso relacionamento com Deus. Paulo diz que se conhecemos a ira de Deus, nós precisamos persuadir os homens, pois ele sabia como são os homens e mulheres sem Deus. O apóstolo Paulo foi um deles, mas sabia o que significava ser salvo e ter um novo relacionamento com Jesus. Sabia a terrível realidade de uma alienação de Deus; também sabia o poder da reconciliação com Deus. Em 2 Coríntios, . capítulo 5,ele fala de uma forma poderosa desta reconciliação. Nos versículos 20-21 ele diz: "De sorte que somos embaixadores em nome de Cristo, como se Deus exortasse por nosso intermédio. Em nome
  • 8. de Cristo, pois, rogamos que vos reconcilieis com Deus. Aquele que não conheceu pecado, ele o fez pecado por nós; para que nele fôssemos feitos justiça de Deus". Paulo estava, pois, motivado por aquela paixão e pelo desejo ardente de agradar a Cristo, como uma criança em profunda reverência por seu pai. Como fruto de uma grande apreciação e amor por Cristo. Todos os diferentes aspectos dos atributos de Deus e o relacionamento daqueles que crêem neles, motivaram Paulo a evangelizar. Ele sempre procurou glorificar a Deus em todas estas coisas: a soberania de Deus, o amor de Deus, a graça de Deus. Esta foi a motivação mais profunda da evangelização de Paulo. Não somente uma compaixão humana, não somente a ordem de Cristo, mas um desejo ardente de glorificar a Deus a quem ele conhecia. Ele tinha absoluta certeza de que qualquer um que cruzasse o caminho de Cristo, um dia estaria perante o julgamento de Deus e teria de responder diante dEle por todo o bem ou mal que fizera no seu corpo, nesta vida. Quando nós, pastores, ficamos de pé diante da nossa congregação, semana após semana, quão prontos estamos para esquecer que, mesmo que se passem cem anos, se o Senhor demorar a voltar, nenhuma pessoa na nossa congregação vai escapar do julgamento final de Cristo? Em toda a nossa evangelização, estamos lidando com almas viventes que poderão estar alienadas de Deus para sempre, ou que irão usufruir da presença gloriosa de Jesus eternamente. Há uma diferença radical entre estas duas coisas. A grande gloria que Deus recebe na conversão de pecadores motivava Paulo a fazer missões e evangelizar. A quem evangelizar? A grande comissão responde a uma segunda pergunta. A quem devemos evangelizar? Mateus nos diz que devemos ir a todas as nações. Ide e ensinai a todas as nações. Há algo maravilhoso neste mandamento para a evangelização reformada, porque o evangelista reformado não fica apenas vendo a soberania de Deus no ato de eleger, pois este ato não é algo que impede o sucesso da evangelização, e sim, algo que o confirma. Quando Cristo nos envia a todas as nações, Ele vai reunir delas, aqueles que vão servi-lo e temê-lo na Sua própria Palavra. Ele vai usar a loucura da pregação para salvar aqueles que devem e precisam crer. Que encorajamento maravilhoso para nós evangelizarmos, pois onde formos passando no meio desta torrente de depravação humana, não há nenhuma expectativa em nós ou na semente em si. Algumas sementes vão cair em solo rochoso ou à beira do caminho, e a nossa única esperança de que Deus Se agrade é que Ele venha a usar-nos como barro em Suas mãos para cumprir o Seu propósito de amor e soberania em termos da eleição. Dessa forma, Deus vai atrair pecadores a Si mesmo. Em Marcos 16:15 ("Ide por todo o mundo e pregai o evangelho a toda criatura") a grande comissão diz algo um pouco diferente. Pregar o evangelho a toda criatura! Mateus disse, "a todas as nações". Marcos particulariza a grande comissão. A ênfase é que o evangelho deve, não só ser levado a todas as nações, mas a todo homem, mulher, moço e moça que habitam nelas. O evangelho é o oferecimento de Deus aos pecadores. São as boas novas de Cristo e está disponível para todos. São boas novas de que Cristo os está convidando a virem a Ele como estão. As boas novas, entretanto, não consideram que cada pessoa tem força em si mesma para ir a Deus. As boas novas não afirmam que a pessoa é salva meramente por uma "decisão" por Cristo. A mensagem das boas novas não é que você vai declarar a cada um que ele está salvo. Não significa contar a cada um, que definitivamente Cristo morreu por você, não é simplesmente levar as pessoas a saberem que Cristo morreu por elas. Muitos pregadores pregam assim. Eles dizem: "Jesus morreu por todos e tudo que você tem de saber é crer que Ele morreu por você ". O que está errado com isso? No momento em que eu creio que Cristo morreu por cada um, então, eu posso concluir que há uma espécie de acordo que afirma: se Ele morreu por todos, então, morreu também por mim. Os pregadores que pregam assim, persuadem as pessoas a pensarem que estão salvas, mesmo sem ter recebido nenhum toque do Senhor. Contudo, apenas um assentimento intelectual sem essa bênção da fé salvadora, não salva. Uma fé salvadora pessoal, um arrependimento pessoal, uma convicção pessoal dos pecados e uma rendição diante de Deus de todas as suas justiças que são trapos diante de Deus, são ingredientes necessários para que você encontre a real salvação. Se você não compreende o que é
  • 9. ser um pecador perdido e condenado perante Deus, como pode apreciar a riqueza do evangelho? Dessa forma, a grande comissão nos encoraja a levar o evangelho a todas as nações, ao homem como um ser integral. Não leve o evangelho a pressionar apenas a vontade do homem, pois o evangelho afeta a vontade, as afeições, a totalidade do ser humano. Posteriormente veremos como os reformadores e puritanos praticaram esse tipo de evangelização. Quando eles apresentavam a Cristo de uma forma integral para um ser integral, acabavam proclamando todo o conselho de Deus. Onde iniciar? Finalmente, a grande comissão certamente inclui que o evangelho precisa ser levado de preferência às ovelhas perdidas da casa de Israel, como lemos em Mateus 10:6. Assim, quando Jesus deu a ordem de evangelizar aos Seus discípulos, Ele começou com Jerusalém e de lá deviam levar o evangelho a Samaria, Judéia e até os confins da terra. Traduzindo a idéia para os dias de hoje, esta ordem diz que nós não devemos apenas evangelizar os judeus mas devemos começar em nossos lares, em nossas igrejas. Dentro do ministério pastoral devemos enfrentar o fato de que dentro da Igreja de Deus há muitas pessoas que não São verdadeiramente salvas. Talvez tenham até sido batizadas, talvez sejam membros comungantes, vivam uma vida decente, todavia não foram salvas. Podem até ter um bom conhecimento bíblico e até serem professores de Seminários, pastores, ou presbíteros, mas não são diferentes de Nicodemus que foi um mestre em Israel e no entanto não havia nascido de novo. Jesus diz ainda hoje a cada um de nós e a nossas igrejas: "vocês precisam nascer de novo". É possível que nossa a evangelização, às vezes, seja muito fraca porque há pouca experiência do que significa nascer de novo. Jesus passou a Sua tocha da evangelização para Seus apóstolos e discípulos e a acendeu de forma maravilhosa no dia de Pentecoste e nas semanas que se seguiram. O mundo precisa ser colocado em chamas por esta tocha da evangelização. No dia de Pentecoste Deus vindicou a Sua própria Palavra conforme lemos em João 3:16: "Porque Deus amou o mundo de tal maneira que deu seu Filho unigênito para que todo aquele que nele crê não pereça mas tenha a vida eterna". Milhares de pessoas foram feridas nas suas consciências e foram levadas a um arrependimento autêntico naquele dia, depositando sua fé em Cristo. Mas a novidade que começou no dia de Pentecoste foi disseminada e começou a usar de uma forma poderosa o apóstolo Paulo para levar avante a tocha da evangelização. Paulo, o evangelista Paulo foi de modo peculiar qualificado para esta tarefa, talvez mais do que qualquer pessoa da sua época. Ele entendia tanto a — mentalidade hebraica, quanto a mentalidade helênica. Ele teve um "seminário" de três anos na Arábia, durante o qual Deus o treinou e o moldou para ser o apóstolo dos gentios. A atividade evangelística de Paulo, levando a tocha da evangelização, foi e ainda é amplamente expandida hoje. Ele levou o evangelho aos seus irmãos na carne, levou-o até a Ásia, Europa, e pela inspiração do Espírito Santo, trouxe a tocha até nós em suas Epístolas. É muito importante tomarmos um pouco da evangelização de Paulo. A evangelização é algo muito importante no ministério de Paulo e precisamos nos "agarrar" ao seu padrão de evangelizar. De uma coisa nós não podemos fugir, quando lemos suas cartas: Paulo evangelizava de uma forma doutrinária e teológica. Não evangelizava contando anedotas ou pequenas histórias. Há, hoje, pessoas que afirmam que temos de colocar a doutrina de lado para podermos evangelizar. Pensam que quando evangelizamos não devemos ser didáticos. Paulo rejeitou isso de forma prática. Grandes porções de suas Epístolas estão preocupadas, por exemplo, com a lei. Ele faz com que uma apresentação da lei seja seguida pela apresentação do evangelho e então aplica esta realidade à vida dos seus leitores com ensinamentos éticos e experimentais. Esse é o padrão da evangelização de Paulo. Queremos apresentar aqui algumas ramificações deste padrão de evangelização que Paulo usava. Consciência teísta
  • 10. O primeiro resultado do seu padrão evangelístico é: Paulo pressupõe, em todas as suas cartas, uma consciência teista em cada pessoa. Na tradição reformada, somos profundamente devedores a João Calvino e a Cornelius Van Til porque eles estabeleceram o que nós hoje chamamos de teologia préssuposicional. Calvino afirma que a semente da religião está em cada homem. Dessa forma, o pensamento reformado sempre entendeu que cada pessoa no mundo tem certo sentimento de Deus. Este conhecimento nato pode ser muito distorcido, misturado com pecado, mas aquela semente, no entanto, está lá. Tanto Calvino quanto Van Til tiram estes pressupostos teológicos de Paulo. Paulo argumenta de forma muito clara, por exemplo, na sua carta aos Romanos e ele parte de uma posição de pressuposição que afirma que, mesmo os pagãos têm alguma consciência de um ser supremo. O que aprendemos disso é o seguinte: nós não devemos gastar muito tempo discutindo com uma pessoa sobre a existência de Deus. Antes, enquanto evangelizamos, pressupomos que, no fundo do coração, eles têm consciência da existência de Deus. Os reformados afirmam que não existe a condição do ateu genuíno. Um ateu é alguém que deseja se convencer que não existe Deus. Já tive duas vezes oportunidade de conversar com duas pessoas que afirmavam que eram atéias. No entanto, o que era estranho é que exatamente os dois queriam conversar sobre Deus. Dessa forma estavam querendo se convencer de que Deus não existia. O que Paulo está dizendo é o seguinte: quando você estiver lidando com uma pessoa que não crê e fala do seu relacionamento com Deus, o que você precisa fazer é apresentar a Deus, como está em Romanos, capítulo primeiro. Você não deve colocar como alvo provar filosoficamente que Deus existe. O que deve ser feito é apelar para a consciência da pessoa. Paulo diz em Romanos, capítulo 1, que esta consciência está apertando, fazendo desaparecer o conhecimento de Deus. Quando nós pregamos o evangelho, evangelizamos pessoas que têm uma consciência teista como seres humanos. Mensagem de despertamento Em segundo lugar, Paulo ensina que nossa mensagem evangelística precisa ser uma mensagem de despertamento. Quando Paulo dirige-se a alguém que está evangelizando, ele começa a falar a respeito do pecado e da grande necessidade do ser humano. Ele sempre procura construir um sentimento de necessidade por parte da pessoa. Então, seu alvo é a consciência. Esta não é uma tarefa fácil e sem o Espírito Santo é uma tarefa impossível, porque é necessário o poder divino, o Todo-poderoso, para quebrar um homem e reduzi -lo a nada. Assim o homem vê o seu pecado e enxerga que não é outra coisa senão um grande pecador e não pode dizer outra coisa senão: "Ó Deus, tem misericórdia de mim, pecador!". Isso é exatamente o que Paulo procura fazer em Romanos, capítulos 1, 2 e 3, trazendo, tanto judeu como gentio, a um sentimento de culpa diante de Deus, para que toda boca seja fechada e todo o mundo seja considerado culpado perante Deus. Por isso, Paulo pregava a lei a fim de trazer o evangelho. Com a evangelização eficaz nós vamos levar pecadores, pelo Espírito, a serem confrontados face a face com a realidade de um Deus vivo e santo, que Se ira e que executa julgamento; na realidade da maldição da lei que vem contra todos que a transgridem. Precisamos levar pecadores ao Deus do Sinai, ao Deus de Isaías, capítulo 6, para podermos levá-los ao Deus do Calvário. Nosso alvo, portanto, é levá-los a Cristo e a única maneira de levá-los a Cristo é mostrar a maneira como Cristo Se torna apreciado e válido no coração daqueles que dEle precisam. Pregar Cristo - a reconciliação Finalmente, Paulo prega não apenas de forma que usa pressupostos, de uma forma que desperta e aviva, mas prega de forma cristológica. Ele proclama a realidade gloriosa do evangelho. No Novo Testamento, no grego, há uma palavra (paralambanó) que expressa a idéia de receber alguma coisa e passá-la adiante. Todas as vezes que esta palavra é utilizada (paralambanó), ele sempre a usa em conexção com Jesus. A sua idéia é a de que Cristo precisa ser recebido pela fé e passado à frente. Ele precisa ser "tradição". Paulo quer fazer a passagem desta "tradição", ou seja, deste evangelho; ele quer passar especialmente a mensagem da reconciliação. Ele está com tal peso na alma, que o amor de Cristo o constrange. Esta reconciliação é absolutamente necessária. Sem ela
  • 11. os pecadores estarão alienados no inferno, para sempre, e alienados do Seu criador. Esta reconciliação encontra a suarealização na cruz por Cristo, e agora precisa ser realizada no coração dos pecadores pelo poder do Espírito Santo. Ele aplica esta reconciliação, advinda da cruz, aos corações dos pecadores. A idéia de reconciliação é uma idéia de troca. Paulo volta a este assunto várias vezes na sua teologia. Jesus é aquele que troca de lugar com o pecador carente, em necessidade. O evangelho diz que nós é que merecíamos estar naquela cruz e sermos punidos por nossos pecados. Entretanto o que é glorioso é que Jesus vem e toma o nosso lugar naquela cruz. O apóstolo Paulo diz em 2 Cor.5:21: "Aquele que não conheceu pecado, ele o fez pecado por nós; para que nele fôssemos feitos justiça de Deus". Cristo toma os nossos pecados, toma para Si próprio a morte que nós merecíamos e paga o preço plenamente. Ele dá ao pecador a Sua salvação, a Sua santidade, todos os benefícios gloriosos e, acima de tudo a Sua própria Pessoa . Na reconciliação Cristo faz duas coisas para cada um dos filhos de Deus, os quais eles jamais poderiam fazer por si próprios. Estas duas coisas são feitas por nós, doutra forma não seríamos salvos. Em primeiro lugar, a nossa dívida completa precisa ser paga. Pecado é uma coisa tão séria, que traz a morte, conforme nos diz a Bíblia, em Romanos, capítulo 6. Jesus disse que estava pronto para morrer pelos pecadores. Jesus, nesta obediência passiva, suportou a ira de Deus por causa dos nossos pecados. Paulo diz que Ele Se deu a Si mesmo por Sua Igreja - sofrendo a morte na cruz. A segunda coisa que Ele faz e que nós não podemos fazer, é que Ele, de forma perfeita, obedece à lei em nosso lugar. A lei exige que amemos a Deus sobre todas as coisas e ao próximo como a nós mesmos. Cristo fez isso, de forma perfeita, por 33 anos. Não por Ele mesmo, mas por aqueles pecadores a quem salvará. Chamamos a isso de Sua obediência ativa e dinâmica, pois dessa forma ele obedeceu a lei. Por Sua obediência ativa e passiva, obedecendo à lei e pagando o preço do pecado, Ele satisfez a justiça de Deus. Dessa forma Deus está reconciliado com o pecador. Ele concede o Seu Espírito para que esse mesmo Espírito opere a Sua salvação na mente e no coração dos pecadores e o pecador perca todo seu sentimento de justiça rendendo-se inteiramente ao caminho da salvação de Deus, aos pés da cruz. Ao serem assim reconciliados com Deus, lá na cruz, Deus está reconciliado com o homem e o homem com Deus. Através da cruz Deus leva os pecadores a se reconciliarem com Ele mesmo. Percebe que tudo está centralizado na cruz? O apóstolo Paulo diz que a cruz exige uma vida que produza frutos. Se você já esteve ali na cruz e já experimentou a reconciliação com Deus, por Jesus Cristo, você já percebeu que deveria estar onde Jesus esteve, percebeu que merecia os cravos nas mãos e pés. Você que merecia aquela coroa de espinhos e suas costas sangrando, agora sabe que, ao invés de você, foram seus pecados que foram cravados naquela cruz. Ele experimentou a morte e você compreenderá que Ele permitiu que você, pelos seus pecados, O pregasse na cruz do Calvário, como resultado de um amor puro a pecadores que não são dignos nem merecedores desse amor, por causa do Seu amor ao Pai, à vontade soberana do Seu Pai. Como você pode viver sem estar fervendo de amor pelo Pai, Filho e Espírito Santo? Acaso você poderia dizer como Samuel Rutherford: "Eu não sei qual das três pessoas da Trindade eu mais amo, porém isso eu sei, eu amo a todas três"? Quando estamos motivados pelo grande amor de um Pai que deu Seu único Filho, e somos movidos pelo Filho que Se deu a Si mesmo, e somos movidos pelo Espírito Santo que tem a paciência de operar em pecadores tão difíceis como nós, somente podemos caminhar de uma forma gostosa e desejosa com este Deus Triúno. Em Colossenses 2:6-7, o apóstolo Paulo diz: "Ora, como recebeste a Cristo Jesus, o Senhor, assim andai nele, nele radicados e edificados, e confirmados nafé, tal como fostes instruídos, crescendo em ações de graça". Para Paulo, a mensagem da evangelização é a mensagem da reconciliação que prega um Cristo completo -mensagem que envolve o Seu senhorio, envolve ser salvo do pecado e ser salvo para servir. O pecador recebe esta salvação gloriosa, tão -somente pela obra salvadora do Espírito. Justificação pela fé somente, para aqueles que estão vivendo sem Deus, produz neles o fruto de serem pessoas de Deus. Vamos, portanto, levar em nossa evangelização todas estas coisas. Como pode a fé despojar o pecador de todo o seu sentimento de justiça? Como pode levá-lo ao Senhor Jesus Cristo? Como a
  • 12. fé leva este pecador a viver uma nova vida em Cristo? Assim, percebemos que Cristo é o alfa e o ômega de toda a nossa pregação, de toda a nossa evangelização. É somente nEle que temos Shalom, paz. Este foi o grande chamado de Paulo. Este foi seu alvo, que envolve todas as Escrituras, e Cristo, para o homem como ser total. 2 A Tocha da Evangelização Reacesa pela Reforma O destaque de Calvino Entre os reformadores, João Calvino teve um destaque especial. No primeiro capítulo, falamos daquele pregador que exagerava no tamanho da "cauda da raposa", na história de Sansão. No caso de Calvino, muitas pessoas acham que ele não teve nenhuma "cauda de raposa", no que diz respeito à pregação do evangelho. Com isso querem dizer que ele não teve destaque algum em evangelização. Outros estudiosos, entretanto, dizem que Calvino tinha uma "cauda de raposa" muito grande, falando de sua evangelização. Chegam a dizer que ele foi o pai teológico de todo o movimento missionário moderno. O ponto de vista de Calvino quanto à evangelização tem sido obscurecido, especialmente por três tipos de estudiosos: O primeiro grupo falha porque, ao invés de ler os escritos de Calvino, lê o que outros escreveram sobre ele. O segundo grupo, quando analisa Calvino, não compreende o contexto no qual Calvino exerceu sua evangelização. O terceiro grupo, que joga também uma luz negativa na evangelização de Calvino, traz seus próprios pressupostos negativos ao ler Calvino e conclui que ele não deu ênfase à evangelização. Estes estudiosos, partem da doutrina da eleição e concluem desta doutrina, que é um ato soberano de Deus, que Calvino negou qualquer ênfase à evangelização, a qualquer esforço evangelístico. Desse modo, para avaliar o verdadeiro calvinismo em relação à evangelização, queremos fazer três coisas. Ao fazer estas três coisas, espero ter o quadro completo da posição de João Calvino quanto à evangelização. Primeiro vamos dar uma "olhada" rápida na vida de João Calvino. Em segundo lugar vamos olhar seus ensinamentos quanto à evangelização, nos seus próprios escritos (as Institutas, seus comentários, seus sermões, e suas cartas). Em terceiro lugar olharemos Calvino como um praticante da evangelização reformada. Vamos analisar isso em quatro círculos concêntricos: no seu próprio pensamento, na cidade de Genebra, na França e no Brasil. Espero que, quando chegarmos ao fim, tenhamos uma visão mais correta do pensamento de Calvino sobre a evangelização. Sua vida
  • 13. Primeiramente iniciemos com uma visão rápida da sua vida. Lutero tinha 25 anos de idade quando Calvino nasceu. Em certo sentido, Calvino representa quase que uma segunda geração de reformadores. Ele teve a vantagem de poder usar os escritos de Lutero e de outros pensadores reformados antes de escrever o seu próprio pensamento. Calvino foi além de Lutero pelo menos em quatro áreas. Em primeiro lugar, em relação à Ceia do Senhor. Calvino negou a presença corporal de Jesus na ordenança, nos elementos da Ceia. Em relação à vida da Igreja, Calvino concluiu que aquilo que não estiver na Bíblia, não deve estar na vida de adoração da Igreja. Lutero admitia que, o que não fosse expressamente condenado na Bíblia, podia ser usado no culto. Calvino esteve também à frente de Lutero, na maior interrogação que todos eles fizeram. A grande pergunta de Martinho Lutero era esta: como pode um homem ser feito justo perante Deus? Calvino também fez essa pergunta, mas foi além e fez a seguinte indagação: como pode, aquele que já foi declarado justo pela graça, viver agora uma vida para a glória de Deus? Finalmente, Calvino foi além de Lutero porque ele começou a olhar como seria possível evangelizar todos os povos, em toda a terra. Calvino viu um exemplar da Bíblia pela primeira vez em sua vida quando tinha 14 anos de idade. Era seu desejo, como adolescente, tornar-se um padre, um sacerdote. Ele ficou muito interessado, enquanto ainda jovem, no debate que estava em andamento entre católicos e protestantes. Seu pai, no entanto, interrompeu os seus planos, pois teve uma discussão muito séria com um padre na escola onde Calvino estudava. Isso motivou a retirada dele daquela escola e o seu pai o colocou para estudar direito. Aos vinte anos de idade Calvino já tinha se formado em advocacia. Na Sua providência, Deus usou esse treinamento para que ele pudesse ter um pensamento claro e lógico em sua teologia. Quando Calvino tinha 21 anos seu pai morreu e ele matriculou-se novamente numa escola de teologia. Calvino foi convertido quando tinha entre 24 e 25 anos de idade. Diferentemente de Lutero ele falou muito pouco a respeito de si próprio. Em mais de cem volumes escritos, Calvino fala a respeito de si uma ou duas vezes. O lugar onde ele fala com maior detalhe a seu respeito é no prefácio aos seus comentários dos Salmos. Ali ele escreve o seguinte, lembrando os dias de sua conversão: "Eu comecei a entender como se alguém me houvesse trazido uma luz, revelando em que tipo de erro eu tinha estado laborando até então. Eu me tornava cada vez mais sujo, e percebi que estava num estado deplorável, mas Deus, por uma conversão súbita, me elevou e me colocou dentro de um paradigma no qual eu me tornava ensinavel, educável. Eu tive de desistir de mim mesmo e entregar-me aos caminhos de Deus". A vida de Calvino mudou completamente de uma forma imediata. Um ano ou dois mais tarde, ele escreveu a primeira edição da sua famosa obra, As Institutas. Esse foi o livro mais famoso em termos de teologia reformada que jamais havia sido publicado. Calvino desenvolveu sua teologia bíblica durante toda a sua vida. A primeira edição das Institutas tinha apenas 6 capítulos, com cerca de 120 páginas. A última edição tinha 80 capítulos e 1200 páginas. Calvino deixou a França por causa de uma perseguição em potencial e foi para Basiléia na Suíça. No seu caminho a Basiléia, ele foi interceptado por Guilherme Farei. Farei persuadiu Calvmo a ficar com ele em Genebra para que juntos pudessem reformar a cidade. Eles trabalharam arduamente por três anos e foram rejeitados pelo povo de Genebra, pelo menos pela maioria do povo e a maioria dos que compunham o Conselho da cidade. Assim, em 1538 ele foi banido da cidade de Genebra por decisão do Conselho daquela cidade. Foi para Estrasburgo onde passou os quatro anos mais silenciosos e quietos de toda sua vida. Lá foi pastor de uma igreja reformada. Em 1541 foi chamado de volta a Genebra pela primeira vez. Naturalmente ele rejeitou esse chamado mas insistiram. Ele escreveu dizendo que jamais voltaria a um lugar de tanta perseguição. Eles o chamaram pela terceira vez. Depois de muita luta Calvino aceitou e escreveu o seguinte: "Quando considero que não estou debaixo da minha própria autoridade, eu quero oferecer o meu coração como uma vítima a ser morta em sacrifício para o Senhor". Nos últimos 24 anos de sua vida Calvino trabalhou em Genebra. Os primeiros 15 anos de seu trabalho foram uma batalha contra seus inimigos. Lutou como quem luta contra um inimigo que vem colina abaixo, e ele lutava de baixo para cima. Somente nos últimos nove anos do seu ministério a maioria do Conselho da cidade e o povo, estava ao seu lado. Calvino suportou muita
  • 14. perseguição. As pessoas jogavam armas e objetos dentro de sua casa e até colocavam o nome Calvino em seus cachorros. Todavia ele perseverou com a graça de Deus. Foi nos últimos nove anos que a Reforma progrediu de uma forma notável. A Academia de Genebra foi estabelecida por Calvino com a ajuda de seu sucessor, Teodoro de Beza. Nos últimos nove anos da vida de Calvino, 1600 jovens foram treinados para o ministério reformado. Muitos deles foram queimados vivos na França, mas outros foram espalhados pela Europa divulgando a fé reformada. Alguns deles, como John Knox e Gasper Oliviana, se tornaram famosos. Calvino trabalhou de forma dedicada e formou um movimento em Genebra que veio a influenciar toda a Europa. Ele trabalhou até o último dia da sua vida e com 55 anos de idade morreu. Certo estudioso e pesquisador analisou que 83 diferentes enfermidades estavam "minando" seu corpo. Esta afirmação é uma "cauda de raposa" muito comprida, deste pesquisador. Contudo, o ponto é que Calvino, mesmo sofrendo grandes dores, perseverou até o fim. Ele disse àqueles que estavam ao redor do seu leito de morte: "Senhor, eu retenho a minha língua porque sei que isto vem de Ti. Eu estou chorando como um cão. Tu tens me moído e me transformado em pó, mas isto me basta porque compreendo que é a Tua vontade. Quero oferecer-Te meu corpo e minha alma de forma pronta e sincera". Calvino fez apenas um pedido ao morrer: não colocarem nenhuma na sua sepulura, porque dizia que não era digno e merecedor de nenhuma honra, de nenhuma glória. Assim viveu, assim morreu defendendo as doutrinas da graça soberana de Deus. Ele teve suas falhas como qualquer um de nós. Teve seus erros, mas foi um homem de Deus, salvo pela graça de Cristo Seu ensino Vejamos, em segundo lugar, seus ensinos sobre a evangelização. Façamos esta pergunta: será que seus ensinos trazem aquela dinâmica interna que leva os seus leitores e seguidores à evangelização? Nossa resposta é "sim", e bastante. Em todos os seus ensinos Calvino enfatiza a universalidade do reino de Cristo e a responsabilidade dos crentes em colocarem como alvo a expansão deste reino. Calvino ensinou que a motivação para isso está no próprio Deus triúno. Todas as três pessoas da santíssima Trindade estão envolvidas na expansão do reino, assim ensinou Calvino. Ele disse: "O Pai, não apenas mandou a Sua vontade para uma parte da terra, mas também para a outra extensão da terra". Sobre Jesus, escreveu que Jesus estende Sua graça sobre todos. Em um sermão sobre o Espírito Santo ele disse que este Espírito deseja alcançar até às extremidades da terra. Ele escreveu: "O triunfo de Cristo será manifesto em todos os lugares da terra". Como pode Deus estender o Seu reino maravilhoso em toda a extensão da terra? A resposta de Calvino conjuga a soberania de Deus e a responsabilidade humana. O trabalho de um evangelista, disse Calvino, é o trabalho de Deus e não do homem. Mas Deus derrama sobre Seu povo a honra e o privilégio de serem usados como o barro na mão do Oleiro. Dessa forma, Calvino chama o povo de Deus de cooperadores com Ele. Calvino inclui no seu ensino sobre a soberania de Deus, os meios pelos quais Ele cumpre essa soberania. Esses meios seriam aqueles que crêem e que são usados para expansão do reino de Deus. Assim, no ensino de Calvino sobre a evangelização, o esforço humano nunca tem a última palavra, mas Deus Se agrada em usar seres humanos, simples, para levar o Seu reino. Esta inter-relação entre soberania e a participação da responsabilidade humana tem pelo menos quatro inferências. Em primeiro lugar, dizia Calvino, isso nos chama à oração. Ele disse que o cristão deve orar e desejar que Deus reúna, em torno de Si mesmo, igrejas em toda a face da terra. Em segundo lugar, não devemos ficar desanimados pela falta de sinais visíveis de sucesso. Calvino escreve: "O nosso Senhor exercita a fé dos Seus filhos quando Ele não realiza imediatamente as coisas que prometeu. Se Deus passa um dia ou um ano sem proporcionar frutos, não devemos desistir, porém devemos orar mais e não duvidar que Ele está ouvindo a nossa voz, mesmo quando não vemos os frutos" . Em terceiro lugar, Calvino ensinava que devíamos trabalhar diligentemente pela extensão do reino de Cristo sabendo que, no Senhor, nosso trabalho não é vão. Podemos colocar isso de outra forma. A nossa salvação nos obriga a evangelizar. Calvino disse: "Não é suficiente, para qualquer homem ocupar-se consigo mesmo. O nosso zelo deve ir além de nós mesmos e atrair outras pessoas a Cristo. Precisamos atrair todos os homens à Pessoa de Jesus Cristo com todo nosso esforço". Será
  • 15. que isso não é uma indicação do tamanho da "cauda de raposa" do evangelista que era Calvino? Para Calvino, a evangelização não era uma coisa opcional, era parte de sermos cristãos. Em quarto lugar, nesse relacionamento entre soberania e responsabilidade humana, Calvino mostra muitos motivos pelos quais devemos evangelizar. Já consideramos algumas motivações no capítulo anterior, e vou, portanto, apenas relacionar estas sem fazer referência a todas as citações de Calvino, para sermos sucintos. Nos seus sermões e comentários, Calvino apresenta sete motivos diferentes para evangelizar: 1. Jesus nos mandou evangelizar. 2. Devemos estar motivados pelo exemplo do próprio Deus como evangelista. 3. O nosso desejo de manifestar a glória de Deus deve nos motivar a evangelizar. 4. Já que o cristão valoriza aquilo que agrada a Deus, e evangelizar agrada a Deus, então devemos evangelizar. 5. É nossa responsabilidade e nosso dever evangelizar. 6. Uma forte compaixão pela condição dos pecadores deve motivar-nos a evangelizar. 7. Profundamente gratos a Deus pela alegria da nossa própria salvação, nós devemos evangelizar em amor ao próximo. O cristão, diz Calvino, é aquele que diz assim: "Já que Deus pôde me salvar Ele pode salvar a qualquer um na face da terra". Calvino disse: "Nada é mais incoerente com a natureza da fé do que aquela mortificação que leva a pessoa a desconsiderar seus semelhantes, e assim, de uma forma errônea, guardar a luz e a graça de Cristo somente no seu peito". Portanto, Calvino ensinou que a evangelização é a tarefa de todo cristão. Assim, cada cristão deve trabalhar e buscar pecadores para Cristo; essa é a sua tarefa sacerdotal. Cada cristão deve instruir outros no caminho da salvação; essa é a sua tarefa profética. Cada cristão é chamado a discipular outros; essa é a sua tarefa real. Calvino, no entanto, pensou e ensinou que essa tarefa, que é sacerdotal, profética e real, é preferencialmente ligada àqueles que foram chamados e ordenados por Deus para o ministério. Calvino sempre desejou ligar a evangelização com a Igreja. Dessa forma, cristãos que ainda não tinham conhecimento próprio, completo, não iriam evangelizar de forma correta, agindo como se não devessem prestar contas a ninguém e acabariam ensinando coisas erradas ao povo. O que Calvino jamais fez, foi pegar o novo convertido e dizer que ele estava por "conta própria", e que devia partir para evangelizar. Esta alerta de Calvino tem feito com que ele receba um "rótulo", da parte de alguns, como se ele fosse contrário à evangelização. Calvino não era contra à evangelização, mas era contra à evangelização errada. Era contrário, por exemplo, à evangelização individualista que pudesse levar a um caminho errôneo. Aspectos práticos Vejamos em terceiro lugar, os aspectos práticos de Calvino quanto à evangelização reformada. Calvino operava a partir do seguinte princípio básico: onde quer que o Senhor abra uma porta, ainda que seja uma pequena brecha, precisamos ver a necessidade de atravessarmos esta abertura para levar a mensagem do Seu reino. Ele diz que não devemos rejeitar qualquer convite que Deus nos faça. Se porventura Deus nos lança lá fora e fecha a porta, não devemos resistir a Sua soberania tentando abrir uma porta que foi trancada por Deus. Calvino não ensinaria, todavia, que deveríamos simplesmente deixar de olhar as diferentes oportunidades e seguir aquelas que nós julgamos ser as melhores. Ele estava simplesmente falando de situações, quando as portas estão completamente trancadas. Sem dúvida ele estava pensando, no fundo da sua mente, na sua experiência em Genebra, quando foi expulso da cidade. Vejamos os quatro círculos onde Calvino exercitou a sua evangelização. Assim como quando você joga uma pedra dentro de um rio e as pequenas ondas formam aqueles círculos concêntricos, da mesma forma Calvino operou em quatro círculos concêntricos diferentes. Círculos concêntricos - áreas de atuação Sendo um pastor, ele concentrou em primeiro lugar, o seu esforço evangelístico na sua
  • 16. própria congregação. A sua ênfase sobre a conversão como um processo contínuo na vida da pessoa o levou a ver a evangelização como um chamado constante na vida da igreja. Para Calvino, a evangelização envolve não apenas chamar as pessoas a Jesus, mas também edificá-las em Jesus. Desta maneira, Calvino foi um destacado evangelista para o seu próprio rebanho. Ele pregou 170 vezes por ano. Ele pregava cada domingo de manhã do Velho Testamento e todo domingo, à noite, pregava do Novo Testamento. Nos domingos à tarde pregava dos Salmos. Ele pregou ao rebanho de Genebra de forma expositiva, praticamente através de todos os livros da Bíblia. Seu sermão, em média, tinha por base 4 a 5 versículos do Velho Testamento, ou 2 a 3 do Novo Testamento. Seu método consistia em pegar uma pequena parte de um versículo, fazer um pouco de exegese e exposição dela, e, então, fazer a aplicação com uma exortação ou um chamado à obediência. Nunca faltavam aplicações nos sermões de Calvino. Ele dizia que os pregadores deviam ser como pais. Precisam pegar o pão grande e parti-lo em pedacinhos pequenos para alimentar as suas crianças. Ele trabalhou arduamente na prática da pregação. Mas também "trabalhou" a sua congregação para ensinar-lhe como ouvir um sermão. Ensinou o que eles deveriam buscar numa pregação; ensinou em que espírito deveriam vir aos sermões; ensinou o que se esperava dos que estavam ouvindo a mensagem. Disse à sua congregação: "Vocês devem estar participando de forma tão ativa no sermão, quanto o pregador mesmo". A sua participação precisa ser construída em cima do viver a mensagem na sua vida diária, quando você mostra o desejo de obedecer à vontade de Deus, sem nenhuma reserva. Quando Calvino falava à sua congregação, falava às pessoas como crentes. Poucos estudiosos pensam que Calvino admitia que toda a sua congregação era formada de pessoas já convertidas. Entretanto não era isso que Calvino acreditava. Quando estudei Calvino por um bom período, fiz uma lista de trinta vezes, nos seus comentários e nove vezes nas Institutas, de quão pouco eram aqueles que realmente tinham recebido e aceito a Palavra na sua própria congregação. Eis uma citação sua: "Se um sermão é pregado para cem pessoas, mais ou menos vinte vão receber este sermão com fé obediente. O restante receberá o mesmo como se fosse uma coisa sem muito valor". Calvino se dirigia à sua congregação como a pessoas já crentes porque ele exercitava a caridade na sua avaliação. A availiação caridosa é que, enquanto o membro da igreja está vivendo uma vida externamente reta e ouvindo o evangelho, o pastor não deve julgar essa pessoa de forma negativa, porque somente o Senhor pode olhar por dentro do coração. Gostaria que guardassem o seguinte. Calvino acreditava que a evangelização era evangelizar cada um do seu próprio rebanho e o alvo era edificar os crentes em uma vida cada vez mais santa. Tinha também o alvo de convencer as consciências dos não regenerados, para que eles pudessem ver a sua culpa do pecado e ser conduzidos à liberdade em Jesus Cristo como o único Redentor. O segundo círculo de evangelização de Calvino, depois da congregação local, era a cidade de Genebra. A pregação foi parte do seu plano de estabelecer o sistema reformado em toda a cidade. No anoemqueelemorreuhaviaumsermãoemcadaigreja,emcada dia da semana. Ele estabeleceu o seu programa de igrejas espalhadaspor toda a cidade, organizando pelo menos três ministérios além da pregação da Palavra. Um era o ofício de doutores, que era usado especialmente na Academia de Genebra, onde pastores eramtreinados. O outro ministério era o dos presbíteros, que estabeleciam a disciplina cristã. O terceiro ministério era o diaconato, que tinha como alvo receber ofertas e distribuir o socorro aos pobres. Sob Calvino, Genebra se tornou um lugar seguro para o refúgio de protestantes perseguidos em toda a Europa. Calvino estava absolutamente consciente de que o mundo europeu estava olhando para Genebra. Ele escreveu a um dos seus amigos o seguinte: "A minha oração por Genebra é que ela se torne um lugar de empatia em relação à divulgação do evangelho para todo o mundo". E foi exatamente o que aconteceu. Os homens que Calvino treinou foram para a França, Escócia, Inglaterra, Holanda, parte da Alemanha Ocidental, e alguns segmentos da Polônia, Checoslováquia e Hungria. A igreja de Genebra e a própria cidade de Genebra se tornaram mãe e modelo para todo o movimento reformado. Em círculos mais amplos vemos os esforços missionários de Calvino na França e até mesmo no Brasil. Seria fácil para Calvino treinar ministros apenas para a França e esperar que de outro lugar alguém mandasse missionários para outras partes dos mundo. Muitos daqueles que foram
  • 17. treinados em Genebra e voltaram à França foram mortos por causa da perseguição. Mas Calvino perseverou em evangelizar a França apesar de todas as perseguições. Em 1555 havia apenas uma igreja realmente reformada na França. Sete anos mais tarde havia 1500 igrejas reformadas organizadas na França. A tocha da evangelização reformada foi reacesa através do ministério de Calvino na França e tornou-se um dos exemplos notáveis de missões nacionais de toda a história da Igreja. Eventualmente a Igreja Reformada da França foi forçada a sair. A França chamou os refugiados da perseguição religiosa de Huguenotes. Estes Huguenotes se espalharam por várias partes do mundo e se transformaram numa bênção de Deus onde quer que andaram. Calvino esteve também envolvido no primeiro esforço missionário além-mar, numa missão que foi mandada especificamente para o Brasil. Um homem chamado de Villegaignon sendo um simpatizante do movimento Huguenote, trouxe uma expedição colonizadora em 1555. Quando surgiram alguns problemas aqui na colônia, numa ilha perto do Rio de Janeiro, Villegaignon voltou-se para os Huguenotes na França pedindo que mandassem melhores colonizadores. Ele mandou uma carta a Calvino, à Igreja de Genebra, pedindo ajuda. Com a aprovação de Calvino, a companhia de pastores de Genebra escolheu dois pastores para mandar ao Brasil, junto com onze leigos. Infelizmente o resultado final foi trágico. Villegaignon mudou seu pensamento em relação a Calvino e ao próprio movimento da Reforma. Em 1558 ele estrangulou e jogou ao mar três desses calvinistas. Os que restaram foram depois, atacados e destruídos pelos portugueses. Desse modo, essa missão de vida tão curta, terminou. Será que chegou mesmo ao fim? Quando a história dos mártires do Rio de Janeiro foi publicada pela primeira vez nos jornais da Europa, seis anos mais tarde, a sua introdução foi com as seguintes palavras: "É uma terra estranha, distante, e é de certa forma surpreendente para nós, saber que ali alguns mártires morreram. Mas nós veremos um dia os frutos que aquele sangue tão precioso produziu". Um dos pais da Igreja primitiva, Tertuliano, disse há tanto tempo atrás: "O sangue dos mátires é a sementeira da Igreja". A Igreja é comparada com a grama, quanto mais se corta, mais ela cresce. Nossa oração para todos os brasileiros é que vocês façam parte deste plano de Deus. Conclusões Qero fazer algumas observações: É muito claro que Calvino tinha o coração abundantemente voltado para a evangelização. A idéia de que Calvino e o calvinismo não estão voltado para a evangelização e para a expansão do reino de Deus é um pensamento totalmente falso. De fato, percebemos que Calvino se tornou exatamente o oposto disso. A Doutrina da eleição leva à evangelização. Deus, soberanamente, liga a eleição aos meios da graça. Sendo assim, a eleição não é um estímulo à passividade, mas para a atividade. 2. A vida e ministério de Calvino precisam nos encorajar a manter as nossas mãos no arado e a pensar menos no que os outros pensam a nosso respeito. Calvino trabalhava vinte horas por dia por causa da evangelização. Todavia não é isso o que as pessoas falam sobre ele. Afirmam que ele não era um evangelista. Se ele fosse vivo hoje certamente diria : "Não importa o que os homens pensam de mim, e sim, o que Deus pensa a meu respeito. Um dia eu comparecerei na presença de Deus, não na presença de homens". Isso não quer dizer que devemos passar por cima do sentimento das pessoas, pois devemos trabalhar para que tenhamos uma consciência boa e clara diante dos homens e diante de Deus. Mas nós não vamos cair nessa idéia de evangelizar pensando no que as pessoas pensam sobre a nossa evangelização. O que devemos fazer é olhar para Deus e perguntar o que Ele pensa sobre o que estamos fazendo. Não conheço bem o que os brasileiros fazem em termos de evangelização, porém sei que vocês não são responsáveis pelos resultados da sua evangelização. Vocês são responsáveis pela mensagem e pelos métodos que usam. Esperem em Deus e em Sua graça soberana na produção dos frutos, dos resultados. Na China há um bambuzeiro que não cresce nos primeiros quatro anos, mesmo que você cuide bem dele. Contudo, quando no quinto ano ele começa a brotar, em noventa dias fica com cinco a seis metros de altura. Você diria que esta árvore cresceu em noventa dias ou
  • 18. que ela cresceu potencialmente nos cinco anos? Trabalhem, esperem em Deus, lancem a semente e esperem no Senhor. Os tempos hoje são às vezes desencoraj adores, mas houve tempos mais desencorajadores antes. Às vezes ficamos prevendo a ruína da Igreja, no entanto o que devemos fazer é planejar a renovação da Igreja. John Flavel, um grande puritano, disse: "Não sepultem a Igreja antes que ela esteja morta". Espero que vocês possam suportar firmes como bons soldados de Cristo, estando prontos para serem chamados de loucos por amor a Cristo. Deixem que as suas vidas falem mais alto do que dizem ou pregam. Que Deus nos ajude a sermos verdadeiros evangelistas. 3 A Tocha da Evangelização Levada pelos Puritanos A Mensagem da Evangelização Puritana A preocupação evangelística puritana Quais os métodos que os puritanos usaram para comunicar a sua mensagem? Qual a disposição interior do evangelista puritano? Ao analisarmos a mensagem da evangelização puritana, procuraremos cobrir pelo menos quatro características e, assim fazendo, procuraremos contrastar a evangelização puritano com a evangelização moderna. Antes disso, quero, de forma sumária, definir o que entendo por puritano. Estou usando a palavra "puritano" no sentido geral da palavra, que inclui aqueles piedosos ministros e teólogos ingleses do século XVI e XVII, que estavam preocupados com uma vida pura de acordo com as doutrinas da graça soberana de Deus. Eles estavam preocupados com as seguintes áreas: 1. Com a manutenção do ensino das Escrituras e do pensamento reformado sadio. 2. Com a necessidade de desenvolver um padrão pessoal de piedade, conforme as prescrições das Escrituras, que flui do correto entendimento de doutrina, e que dá ênfase à conversão pessoal e se manifesta numa religião experimental resultante do poder transformador do Espírito Santo. 3. Com a necessidade de uma vida eclesiástica baseada nas Escrituras, onde o Deus triúno é adorado conforme as determinações de Sua Palavra. Quando me refiro à evangelização puritana estou focalizando a proclamação que era efetivada pelos puritanos de todo o conselho de Deus como revelado em Sua Palavra. Percebe-se que a palavra Escritura está presente e inferida nos três itens. Por isso queremos considerar quatro características bem abrangentes da pregação puritana. Dentro de cada característica veremos o contraste com a evangelização moderna.
  • 19. Característica da pregação puritana - contraste com a evangelização moderna Em primeiro lugar, os puritanos, por serem profundamente embasados nas Escrituras Sagradas, apresentavam sermões extensamente baseados nas Escrituras. Para o puritano, o sermão nunca estava só ligado às Escrituras, mas ele saía e crescia de dentro da Palavra de Deus. Para o pregador puritano o texto não estava no sermão, mas o sermão estava no texto. Por isso, um velho membro de uma igreja puritana poderia dizer: "Ouvir um sermão, para mim, é como estar dentro da Bíblia". Se você abrir um livro de sermões puritanos, encontrará de dez a quinze versículos citados em cada página, além de encontrar dez a doze referências textuais. Os pastores puritanos sabiam como usar suas Bíblias. Eles viviam e respiravam os textos da Palavra de Deus. Eles tinham centenas e até milhares de textos das Escrituras memorizados e sabiam como citá-los para os problemas da alma ou para qualquer outro problema pessoal. Eles usavam as Escrituras de forma sábia, não passando por elas de forma superficial, porém trazendo o texto e fazendo-o permanecer de acordo com a doutrina que estava sendo enfocada. Os sermões evangelísticos de hoje muitas vezes são perturbadores, não porque não citem as Escrituras, mas porque o fazem de modo repetitivo, superficial. Quando alguém saía da igreja, após um sermão puritano, nunca esquecia o texto que fora usado, pois aquele texto lhe fora colocado inteiramente aberto, tendo sido levado até o seu coração. Hoje, na evangelização moderna, temos toda razão para ficarmos perturbados quando testemunhamos que há uma seleção muito pequena dos textos bíblicos utilizados, além de textos que são tirados do seu contexto bíblico. Nós pregadores sabemos que podemos citar uma porção de textos sem estarmos sendo bíblicos nestas citações. Uma seqüência de textos intercalados por anedotas não faz, de maneira alguma, com que um sermão seja bíblico em si. Os puritanos acreditavam fortemente em Sola Scriptura. Você pode procurar nos seus escritos e sermões, qualquer história ou referência pessoal e não as encontrará. Pelo fato de pensarem que o púlpito era um lugar de grande importância, este não podia ser degenerado com uma pregação egocêntrica. Eles sabiam que só uma coisa pode salvar pecadores: o Espírito Santo ligando-Se à semente incorruptível da Palavra de Deus. Por isso a tarefa deles era exatamente expor a Palavra de Deus incorruptível, orando para que o Espírito a aplicasse aos corações dos ouvintes. Se estamos convencidos de que conhecemos bem as nossas Bíblias e abrirmos um livro puritano, logo ficaremos muito humilhados. Eles foram gigantes espirituais nas Escrituras e nós somos anões, pigmeus perante eles. Por isso é muito importante lermos os puritanos. Eles são nossos mentores para nos ensinar como usar a Bíblia de uma forma pastoral, evangelística e na nossa pregação. Você sem dúvida seria um evangelista mais sábio e útil se buscasse mais as Escrituras como faziam os puritanos. Ame a Palavra de Deus de maneira mais calorosa. Pesquise a Palavra de Deus em suas devoções pessoais. Busque a bênção de pensar biblicamente, de falar biblicamente, viver biblicamente e perceberá que sua palavra contém uma autoridade divina. Você não precisará persuadir as pessoas pela sua personalidade ou por você mesmo, mas a Palavra de Deus é que vai persuadi-las. A Palavra quando exposta, passo a passo, abre as Escrituras perante nós. Esse é o primeiro ponto da pregação puritana. Eram profundamente bíblicos. Em segundo lugar, o pregador puritano era doutrinador. A mensagem puritana não pedia desculpas por apresentar doutrina. O puritano não temia pregar todo o conselho de Deus para o povo. Os puritanos achavam que você não podia contar uma história qualquer, sem que esta tivesse doutrina. Doutrina é simplesmente a apresentação das verdades de Deus trazidas das Escrituras numa forma que pode ser entendida e que se relaciona com as nossas vidas. Não diluíam suas mensagens com anedotas, humor, histórias triviais e levianas durante a pregação. Eram profundamente sérios, verdadeiros e austeros no púlpito, pois sabiam que ao chegar ali estariam lidando com verdades eternas e almas eternas. Sentiam a realidade solene do seu chamado divino. Pregavam a verdade de Deus como um homem que está morrendo para homens que estão morrendo. Vejamos alguns exemplos:
  • 20. 1. Quando pregavam a doutrina do pecado tinham a coragem de chamar pecado de pecado mesmo. Eles pregavam o pecado como uma rebelião moral contra Deus, uma rebelião que traz um sentimento de culpa e, se não houver arrependimento e perdão, a conseqüência será a condenação eterna certamente. Pregavam a respeito de pecados específicos; pecados de omissão e pecados de comissão; pecados por palavras e ações; falavam do quanto foi horroroso o nosso pecado original em Adão e Eva; falavam à congregação que eles tinham um referencial muito ruim e um coração mal por natureza; que o homem natural não pode amar a Deus sobre todas as coisas e ao próximo como a si mesmo; ensinavam de forma "aberta" que uma reforma, apenas externa na nossa vida, não é suficiente para salvação eterna; a reforma interna produzida pelo Espírito Santo é absolutamente necessária e por isso pregavam como aquela regeneração podia ser experimentada e então vivida. 2. Outro exemplo se vê na sua pregação. Pregavam de uma maneira muito forte a doutrina de Deus. A evangelização deles era construída em cima de forte base teísta; pregavam Deus no Seu ser majestoso e em todos os Seus atributos gloriosos. Não só deixavam Deus ser Deus, mas declaravam que Deus é Deus. Os puritanos colocavam Deus em uma posição bem elevada como deve ser. Quando se aproximavam de Deus em oração não falavam com Ele como quem fala com o vizinho pela janela, ou como um vizinho que pode ajustar seus atributos de acordo com suas necessidades e desejos pessoais. O puritano sempre exaltou a majestade de Deus e, quando se aproximava de Deus, você podia perceber aquele sentimento profundo de reverência. O Deus que o puritano pregava era o Deus da Bíblia. Talvez um dos versículos mais importantes, na Bíblia, para um puritano, seria exatamente Gênesis 1:1 - "No princípio, Deus". E de Deus que emanam e se desdobram todas as coisas neste mundo. Todas as coisas são preparadas, iniciadas,projetadas e feitas para a glória de Deus! 3. A evangelização puritano também proclamava de forma completa e plena a doutrina de Jesus Cristo. Pregavam o Cristo integral para o homem integral. Recusavam-se em separar os benefícios que advêm de Cristo, da própria Pessoa de Cristo. Um dos grandes puritanos, Joseph Alleine, em seu clássico livro originalmente intitulado, An Alarm to the Unconverted (Publicado no Brasil pela PES, como Um Guia Seguro para o Céu), disse que o ser de Cristo integral é aceito por aquele que é realmente convertido. Os verdadeiros convertidos não aceitam apenas as recompensas de Cristo, mas a própria obra de Cristo. Não amam apenas os benefícios de Cristo, e sim também o "fardo" de Cristo ("...tomai sobre vós o meu jugo..."). Amam não só tomar os mandamentos, mas também, a cruz de Cristo. Por outro lado, o falso convertido recebe Cristo pela "metade". Ele quer os privilégios de Cristo, porém não quer se inclinar diante do senhorio de Cristo. Ele divide os ofícios de Cristo e os benefícios de Cristo. Esse é o problema dos "crentes" de hoje. Freqüentemente Jesus tem sido apresentado na evangelização de hoje como alguém que está aí para satisfazer todas as necessidades e desejos dos homens. Na pregação de hoje, Jesus é apresentado como alguém que não exige que o homem ofereça o seu coração completo e a sua vida completa. Quando os puritanos pregavam, instavam com os pecadores a se voltarem para Jesus e avisavam que eles precisavam avaliar o preço de seguir a Jesus, e o preço era perder a sua vida; morrer diariamente por amor a Cristo, negar-se a si mesmo, tomar a cruz e segui-lO. Os puritanos tinham horror àquilo que hoje é chamada "a graça barata", porque, na verdade, essa não é uma graça verdadeira. Graça barata significa que eu aceito Jesus na minha própria força; Ele reforma um pouco a minha vida por fora, porém eu continuo agindo com os princípios egocêntricos no meu ser interior. A graça barata me leva a pensar que, por um lado, eu tenho a Jesus, que estou a caminho para o céu, mas, por outro lado me permite continuar vivendo uma vida mundana. Na verdade, eu estou mesmo no meu caminho para o inferno. Os puritanos apresentavam Jesus como um Salvador completo para um pecador completo. Um puritano disse: "O pregador que é o seu melhor amigo, é aquele que vai dizer mais verdades sobre você mesmo". Eles não estavam preocupados em causar dano ao amor próprio dos ouvintes das suas congregações. Eles estavam mais preocupados com Cristo do que com os ouvintes. Estavam preocupados com a Trindade. O cristão encontra o seu
  • 21. amor próprio a medida que ele ama ao Pai que o criou, ao Filho que o restaurou através da cruz, e no amor ao Espírito Santo que mora nele e que faz com que sua alma e seu corpo sejam templo do Espírito Santo. 4. A doutrina puritana expandia e explanava com detalhes a doutrina da santificação. A vida inteira do crente era para ser colocada aos pés de Deus. Ele tinha que trilhar a vereda do Rei no caminho da justiça. Ele precisava conhecer a vida de uma forma experimental. Precisava conhecer essas "irmãs siamesas" que são, a vida e a experiência. Quando o ministro prega sobre santificação, você precisa saber o que está sendo requerido de sua parte. Você não pode entender estas coisas sem doutrina e isso nos traz à terceira característica da pregação dos puritanos. Em terceiro lugar, destacamos que a pregação puritana era experimentalmente prática. A ausência de uma pregação experimental e prática é uma das grandes falhas no culto e na evangelização de hoje. O que significa uma pregação experimental? A palavra experimental vem da palavra experiência. Em termos de cristianismo, a religião experimental significa que a Palavra de Deus e suas doutrinas precisam ser recebidas não apenas na mente (os puritanos chamavam isso de conhecimento na cabeça, apenas), mas também precisam ser experimentadas e vividas no coração. Isso eles chamavam de "conhecimento do coração". Eles baseavam este tipo de ensinamento, por exemplo, em Provérbios 4:23: "Sobre tudo o que se deve guardar, guarda o teu coração, porque dele procedem as fontes da vida". Para os puritanos os pensamentos precisam fluir das Escrituras e as experiências do coração, fluem do ensino da doutrina e das Escrituras. Dessa forma, experiência não é alguma coisa mística, separada da Bíblia. Isso eles rejeitavam totalmente! Ao mesmo tempo, eles também rejeitavam completamente o tipo de religião que se satisfaz com o conhecimento apenas na cabeça, que é só racional. Estas doutrinas sobre as quais falamos resumidamente, a doutrina de Deus, de Cristo e do pecado, para os puritanos deviam ser tão reais quanto as cadeiras em que sentamos. Estas doutrinas precisam ser transformadas numa realidade que queime dentro de minha alma. Elas precisam influenciar toda a minha vida, todo o meu estilo de vida. Dessa forma, os puritanos acreditavam em viver, na prática, o que eles experimentavam. Sempre eles traziam suas experiências às Escrituras para terem a certeza de que estavam sendo totalmente bíblicos - até nas suas experiências. Para os puritanos doutrina seria algo vazio se não fosse acompanhada pela experiência. Toda experiência verdadeira leva a uma experiência pessoal com Cristo. Por isso é necessária a pregação da Pessoa de Cristo e esta pregação será honrada pelo Espírito Santo, porque Ele toma estas coisas e as aplica aos pecadores. Os puritanos, na sua pregação, incluíam o que chamavam de "marcas de um auto exame". Estas marcas de exame eram os sinais que distinguiam a Igreja do mundo. Distinguiam os verdadeiros crentes daqueles que eram crentes nominais ou apenas por professarem a fé. Os puritanos faziam distinção entre fé salvadora e fé temporária. Muitos livros têm sido escritos a respeito deste assunto. O mais famoso deles foi escrito por Jonathan Edwards: Afeições Religiosas. Também o livro de João Bunyan, O Peregrino, contém tais marcas. O que nós hoje, desesperadamente precisamos, é de uma volta a este estilo de evangelização reformado-puritano que sempre está pesquisando e sondando o coração. Os puritanos nunca diziam de uma forma "leviana" que os pecados do povo estavam perdoados, mas pregavam de forma profunda o que realmente o pecado é e como ele tem afetado as pessoas. Eles procuravam tirar do pecador todo o seu sentimento de justiça própria para, então, levá-lo ao Senhor Jesus Cristo. Alguém disse que a religião da América, hoje, tem 2.000 km de comprimento por 3.500 Km de largura (essas são as dimensões do país), mas com uma profundidade de mais ou menos 12 centímetros, apenas! O problema, em todos os lugares no mundo, hoje, é que a evangelização freqüentemente começa num lugar errado. Poderíamos dizer muitas coisas sobre as diferenças entre a evangelização moderna e a puritana, em relação à experiência do povo de Deus. Pois bem, quero apenas destacar um ponto e este é a resposta a uma pergunta: quando olhamos atrás para a história da Igreja, e também na história bíblica, observando as épocas de avivamento verdadeiro, não produzido pelo homem, qual era o elemento evidente naquela época que hoje está claramente
  • 22. ausente? Respondemos sem hesitação que é a ausência de profunda convicção de pecado. Este é um grande problema nos nossos dias. Convicção de pecado Hoje há muito pouca convicção de pecado entre os não salvos. A maioria dos chamados "cristãos" contemporâneos, vive de maneira tão descuidada em sua vida, que é muito difícil alguém diferenciá -los de homens não convertidos. O problema é que freqüentemente o pecado não é pregado como pecado para as pessoas; o horror do pecado não é enfatizado às pessoas. Isso nos leva a uma pergunta ainda mais profunda: por que as épocas de avivamento realizado pelo Espírito Santo foram períodos de profunda convicção de pecado? A resposta é que o Espírito Santo, como Jesus nos diz, vem para convencer do pecado, da justiça e do juízo. Assim, o convencimento do pecado é o caminho pelo qual Deus age para abrir espaço no coração do pecador. Quando o homem vê a realidade de Deus e a realidade do pecado contra Deus, ele se humilha até o pó. Só então, ele vai apreciar o que aquele Deus-homem, Jesus Cristo, fez por nós pecadores. Foi o que aconteceu com Isaías quando ele chegou à presença de Deus: "Ai de mim porque sou um homem de lábios impuros..." O mesmo aconteceu com Jó ao chegar à presença de Deus. Por cerca de quarenta capítulos no livro de Jó ele estava mais ou menos se defendendo, estava lutando para entender o que Deus havia feito com ele. Mas ao se sentir na presença de Deus, o Senhor Se tornou tão grande e Jó tornou-se tão pequeno, que perdeu todas as suas defesas. Então Jó falou: "Eu te conhecia só de ouvir, mas agora os meus olhos te vêem. Por isso me abomino, e me arrependo no pó e na cinza" (Jó 42:5-6). Ele já havia ouvido falar de Deus antes, porém agora ele "viu a Deus", pela fé e perdeu tudo que estava do seu lado e se lançou como um pobre pecador, tão somente na misericórdia de Deus. É isso que está faltando na evangelização moderna. Não se vêem pecadores chegando até a cruz e clamando como aquele publicano que disse em sua oração: "Ó Deus, tem misericórdia de mim pecador". Vocês vêem o que é realmente o pecado, e quem é Deus? Se assim acontecer seremos levados à cruz e, quando experimentarmos pela fé a beleza e plenitude de Cristo na cruz, não precisaremos de nenhuma explicação da parte de Deus por aquilo que Ele está fazendo em nossa vida. Nós nos inclinamos diante dEle e dizemos que seja feita a Sua vontade. Deus nunca explicou a Jó por que Ele fez tudo aquilo com sua vida. Entretanto, veio de Deus o poder para que Jó fosse justo aos Seus olhos. Avivamento Isso nos leva a outra questão. Se a falta de convicção de pecado é um problema tão sério, como pode esse tipo de convicção ser restaurado à Igreja hoje? Novamente aqui a história da Igreja nos dá uma resposta muito clara. O Espírito Santo encontra um homem caído, quebrantado; este homem chega diante da cruz e encontra a plenitude da salvação em Cristo Jesus, e o Espírito envia esse tipo de homem para pregar o pecado e a conversão aos outros. Em outras palavras, Deus está levantando homens que sejam santos, que sejam humildes, homens de oração para usá-los; homens que odeiam o pecado e que amem a Deus; homens que estejam tremendamente convictos da necessidade da salvação de almas; homens que estejam orando sempre por um avivamento bíblico, um avivamento do Espírito Santo. Deus usa este tipo de homem para trazer avivamento. Lembremse que o avivamento começa com uma convicção experimental de pecado. Arrependimento Isso nos leva a outra questão. Quando Deus Se agrada em levantar esse tipo de homem, será que alguma coisa específica em sua pregação tem conexão com a convicção de pecado? Creio que a resposta é sim! É esse tipo de homem, que de forma incisiva, se dirige à convicção da consciência, de uma forma bem aguçada. Eles mostram aos pecadores de forma clara a necessidade de arrependimento e o Espírito Santo Se agrada em honrar e abençoar a Sua Palavra quando este homem prega de forma convincente. O que aconteceu com João Batista quando ele começou a pregar com convicção? Os homens começaram a fugir da ira vindoura. O que aconteceu quando
  • 23. Pedro pregou com profunda convicção no dia de Pentecoste? O Espírito Santo desceu sobre os que ouviam a sua palavra. Evangelização moderna Por isso minha tese é: a evangelização moderna está se levantando como um obstáculo frontal, com raras exceções, à verdadeira convicção de pecado, ao arrependimento e ao verdadeiro avivamento. A evangelização moderna tem uma visão superficial de pecado; fala tão pouco de um assunto que a Bíblia tanto menciona. Por que a evangelização moderna fala tão pouco a respeito do pecado? A evangelização moderna tem medo de falar às pessoas as verdades a respeito delas mesmas; tem medo de perdê-las. Ensina que nós não devemos ofender as pessoas, e sim, sempre conquistá -las. A razão humana diz que não vamos ganhar as pessoas se lhes falarmos do pecado. A evangelização moderna não nega que o homem esteja morto nos seus delitos e pecados; não nega que a Bíblia diz em Romanos 8:7, que a mente carnal está em inimizade contra Deus; não nega que está escrito em 1 Coríntios, capítulo 2, que o homem natural não aceita, não compreende as coisas de Deus, mas a evangelização moderna diz que textos assim são apenas afirmações doutrinárias. Diz que esses textos são relevantes para os crentes, todavia não seriam relevantes para os não salvos. Dizem: "Como podemos ganhar as pessoas se dissermos que elas não podem se salvar a si próprias?" Concluem, assim, que qualquer ensino que retira da mente dos ouvintes a capacidade de responder imediatamente ao evangelho, na verdade é alguma coisa que impede a evangelização. Dessa forma fazem do cristianismo alguma coisa bem simples e fácil. Dizem: "aceite a Jesus hoje, é simples, não precisa se preocupar com seus pecados, Ele já lhe perdoou. " Mas eles não somam aí o que é que significa realmente ser perdoado e quais os frutos de uma vida verdadeiramente perdoada. Por isso, a evangelização moderna produz cristãos muito superficiais, com uma religiosidade de apenas "12 centímetros" de profundidade. O pastor batista, Erroll Hulse, trabalhou certa vez em uma cruzada evangelística de massa com o Dr. Billy Graham e logo após, teve de escrever um livro intitulado, O Dilema do Pastor, onde esclarece que menos de cinco por cento dos que vinham à frente, no apelo, mostravam frutos subseqüentes em suas vidas. Se formos comparar por um momento, tudo isso, com o ministério do puritano Richard Baxter, que teve 600 pessoas convertidas na pequenina cidade de Kidderminster onde foi pastor, fazendo-o dizer no fim de sua vida que ele não sabia de nenhum que tivesse caído ao longo do caminho, perceberemos que há uma grande diferença. Há uma diferença entre uma pregação superficial a respeito de Jesus e que ignora o pecado, e uma pregação que diz ao pecador que ele não vai saber valorizar a Jesus enquanto não souber claramente o que é pecado. A evangelização moderna põe toda a pressão em cima da vontade do pecador e o pecador precisa tomar uma decisão imediata. Um ato de decisão feito pelo homem usurpa o papel do Espírito Santo em salvar pecadores. Evangelização puritana A evangelização puritana tem uma mensagem bem mais ampla sobre o que é o evangelho. O dever da fé é enfatizado, mas outros deveres também são ressaltados. Os evangelistas puritanos vão dizer aos seus ouvintes, não salvos, que eles precisam se arrepender, precisam parar de fazer o mal, precisam ser santos como Deus é santo, precisam amar a Deus de todo o coração e precisam entrar pela porta estreita. Tudo isso é enfatizado na evangelização puritana. Noutras palavras,a evangelização puritana apresenta a Bíblia como um todo para confrontar o incrédulo. Contudo, sejamos cuidadosos aqui. Eles não pregavam que o incrédulo tinha capacidade de fazer estas coisas, mas pregavam a seus ouvintes as exigências das Escrituras, sabendo que o Espírito Santo é quem faz tudo isso para mostrar aos pecadores que eles não podem cumpri-las por sua própria força. O alvo do puritano era levar a alma não sal va a uma encruzilhada, quando duas estradas se cruzam. Uma dessas estradas poderia ser chamada a estrada da necessidade e o pecador realmente convencido diria: "Eu preciso ser salvo, salvação é minha necessidade!" A outra estrada poderia ser chamada a estrada da impossibilidade. O pecador diria: "Eu não posso ser salvo; eu não consigo ser santo como Deus é santo; não posso ir a Jesus e me dobrar diante dEle por minha própria força". Qual era o alvo do puritano? Era o de levar o pecador a esta encruzilhada e ao chegar lá descobrir
  • 24. que precisa ser salvo mas não pode. Dessa forma ele vai clamar ao Deus todo-poderoso: "Faze por mim ó Senhor, o que eu não posso fazer por mim mesmo!". É isso que Paulo faz nos capítulos 1,2 e 3 de Romanos; o mesmo fez João Batista quando pregava assim: "Arrependei-vos porque o reino de Deus está próximo". João Batista não começou dizendo: "Eis o Cordeiro de Deus...", porém começou dizendo "arrependei-vos". Quando Jesus começou Seu ministério pastoral, Ele não disse "tome uma decisão por mim", mas também começou dizendo "arrependei-vos porque o reino de Deus é chegado". Como foi que Jesus evangelizou Nicodemus?Ele disse: "você precisa nascer de novo". Como Jesus evangelizou o jovem rico? Ele disse: "Guarde os mandamentos". Por que Jesus lhe disse isso? Ele sabia que o jovem não podia guardar todos os mandamentos no seu coração. Jesus estava colocando como alvo a convicção de pecado. Os puritanos não faziam na sua evangelização nada que os apóstolos e o próprio Senhor Jesus não fizesse. Eles pregavam a lei para que os pecadores se sentissem culpados perante Deus e aí pregavam Cristo, não um Cristo de 12 centímetros de profundidade, e sim, Cristo completo na Sua altitude, na Sua amplitude e na Sua profundidade. Pregavam Cristo destacando Seus ofícios, Seus nomes e Seus títulos. Pregavam Sua natureza e Sua Pessoa,pregavam-no plenamente. Isso nos leva a uma conclusão: o que nós estamos precisando desesperadamente é de uma evangelização centralizada em Deus; uma evangelização centralizada na mensagem; centralizada na Bíblia; não uma evangelização feita pelo homem, mas uma evangelização onde o Espírito Santo está agindo na Palavra e por meio dela. Para este fim você e eu, como evangelistas, nós mesmos fomos restaurados para um relacionamento mais vital e íntimo com Deus por Jesus Cristo. O que nós precisamos desesperadamente é de carregadores da tocha, homens e mulheres que estejam em chamas por Deus. Não de homens que estejam em fogo por ensinos não bíblicos, mas de homens inflamados pelo ensino da Palavra de Deus - sim, de homens cheios daquele temor filial a Deus. Você já percebeu que todas as vezes que Paulo fala a pastores e presbíteros para dar-lhes algum conselho ele sempre diz, "Tem cuidado de ti mesmo e depois do rebanho"? Conclusão Querido irmão, se você não odiar o pecado, se você não amar a Deus, se não estiver cheio do poder de Cristo, não deve ficar surpreso de seu ministério ser tão infrutífero. Se as pessoas perceberem que viver religiosamente não é viver a realidade da nossa vida, elas vão ser levadas a desobedecer as nossas mensagens. Um dos nossos grandes problemas hoje é que a nossa própria casa não está em ordem. Que Deus nos leve a conhecê-lo de uma forma íntima e pessoal, seguindo0 de forma incondicional e pregando todo o conselho de Deus. Queridos amigos, o tempo está curto, muito cedo vamos pregar nosso último sermão, fazer a nossa última oração, participar da nossa última conferência, e a única coisa que realmente vai contar é a seguinte: conhecemos realmente a Deus e a Jesus Cristo a quem Ele levou assunto aos céus? Que Deus nos faça portadores da tocha da evangelização puritana em nossa geração.
  • 25. 4 A Tocha da Evangelização Levada pelos Puritanos O Método da Evangelização Puritana e A Disposição Interna do Coração Raízes da evangelização moderna A fim de compreendermos estes dois pensamentos (o método da evangelização Puritana e a disposição interna do coração) precisamos contrastá-los com a evangelização moderna. Só assim poderemos apreciar o aspecto característico da evangelização puritana. Para isso vamos voltar um pouco ao século XIX para considerarmos as raízes da evangelização moderna. A evangelização moderna tem as suas raízes nos anos 1820 sob a liderança de Charles Finney, que freqüentemente é chamado de "o pai" da evangelização moderna. Finney foi criado em Nova Iorque e tinha o grau de advogado. Começou sua prática como advogado nos anos de 1820 em Nova Iorque. No ano seguinte teve uma experiência religiosa muito profunda e isso o influenciou para que deixasse seu escritório de advocacia e se dedicasse inteiramente ao ministério. Foi ordenado pastor presbiteriano em 1824 e por 8 anos liderou eventos e reuniões de avivamento no leste dos E.U.A. Por quatro anos trabalhou como pastor em Nova Iorque e nos últimos quarenta anos de sua vida foi professor na Universidade de Oberlin no estado de Ohio. Através dessas décadas ele continuou fazendo reuniões de avivamento. Ele inventou aquilo que se chama de "novas medidas" para avivamento que incluem: (a) reuniões com muita emoção e (b) o banco dos "ansiosos". Eram reuniões evangelísticas caracterizadas por uma atividade intensa, que duravam dois ou três dias e nos quais Finney pregava duas vezes ao dia. O banco dos "ansiosos" era o primeiro banco da igreja que era deixado vazio para que as pessoas ansiosas pudessem vir e se assentar ali, recebendo uma ministração individual. No final dos seus sermões Finney diria: "Aqui está o banco dos "ansiosos", se vocês estiverem do lado do Senhor, venham à frente." Hoje a evangelização de massa, é um desenvolvimento das chamadas "novas medidas" dos avivamentos de Finney. Em suas campanhas evangelísticas, Billy Graham apresenta um estilo polido destas cruzadas feitas por Finney. Essas chamadas ao altar para que as pessoas venham à frente e confessem Jesus Cristo, é uma versão moderna do banco dos "ansiosos". Hoje nós estamos tão acostumados com este
  • 26. estilo de evangelização moderna, que dificilmente percebemos que é uma inovação na história da Igreja. Com freqüência nos esquecemos de quão distante está da evangelização bíblica. Tanto Finney, quanto a evangelização moderna, cometeram alguns erros básicos em diferentes aspectos das Escrituras. Vamos mencionar quatro áreas em que se afastaram dos princípios bíblicos. Deficiências da evangelização moderna 1. Aceitação do pelagianismo. Embora certos elementos calvinistas estejam presentes, a evangelização moderna, seguindo a teologia de Fnney, é essencialmente arminiana na sua apresentação do evangelho. Finney era confessadamente um pelagiano (Pelágio foi um herege do século IV que sofreu dura oposição de Agostinho). Ele negava que o homem caído fosse incapaz de se arrepender. Dizia que cada pessoa tem a liberdade e a vontade livre de arrepender-se e voltar-se para Deus; que cada pecador pode resistir ao chamado do Espírito Santo, e que este Espírito apenas apresenta-lhe razões pelas quais ele deve ir a Deus. O pecador, entretanto, é livre para aceitar ou rejeitar as razões apresentadas. Dessa forma, em última análise, a salvação não é uma obra de Deus, é realmente um trabalho do próprio homem. Finney escreveu o seguinte: "Pecadores vão para o inferno apesar de Deus". Finney negou os cinco pontos do calvinismo, e não subscreveu os ensinamentos de Jesus de que o homem precisa nascer de novo, nascer do alto, doutra forma ele não pode entrar no reino de Deus. 2. Finney e a evangelização moderna colocam uma pressão indevida sobre a vontade humana. Se a vontade humana, pecadora, é livre, segundo os evangelistas semipelagianos afirmam, apregação é reduzida simplesmente a uma batalha entre a vontade dos ouvintes e a vontade do pregador. O resultado disso é que todos os meios que o pregador puder usar para persuadir os seus ouvintes a aceitar a Cristo, acabam se tornando lícitos, mesmo que sejam baseados num excesso de emocionalismo do auditório. O alvo principal nestes casos é mover a vontade do homem, e levá-lo a fazer uma decisão imediata. O contrário disso, vemos no ensino de João 1:13: "... os quais não nasceram do sangue nem da vontade da carne, nem da vontade do homem, mas de Deus." 3. Finney e a evangelização moderna reduzem o processo de conversão a um espaço curto de tempo. Isso não é bíblico! A Bíblia apresenta a conversão como sendo um processo por vezes demorado. Entretanto, para a evangelização moderna, a conversão é um processo de mais ou menos dez minutos. Recentemente foi escrito um livro sobre evangelização que faz com que o evangelista caia em profundo sentimento de culpa, se demorar mais de dez minutos para converter alguém. Chegamos a conclusão que, para muitos evangelistas modernos, a salvação não é mais aquele trabalho miraculoso, soberano e misterioso do Espírito Santo de Deus, e sim, o trabalho calculável da ação do homem. Isso é contrário ao que lemos em João 3:8: "O vento sopra onde quer, ouves a sua voz, mas não sabes donde vem, nem para onde vai; assim é todo o que é nascido do Espírito ". O que realmente tem acontecido nos últimos 175 anos, é o seguinte: Finney e a evangelização moderna perderam o sentido de conversão bíblica; perderam o conceito de conversão como uma obra miraculosa; perderam o sentimento daquela dependência total do homem em Deus, na sua conversão. 4. Grande parte dos resultados da evangelização moderna é questionável. Diversos estudos têm provado que a evangelização de massa, utilizado em grande parte nas cruzadas, em que o próprio homem decide a sua salvação, leva, finalmente, a um cristianismo muito superficial, que quase não dá fruto. Isso não quer dizer que não existam certos indivíduos a quem Deus realmente converteu em tais tipos de reuniões. A Bíblia diz que Deus pode fazer com que uma vara torta se torne reta. Entretanto, esse fato não nos isenta da responsabilidade em apresentar aos nossos ouvintes uma evangelização bíblico e saudável, uma evangelização que tenha uma profundidade maior, uma evangelização que começa, centraliza-se e termina em Deus. É isso que descobrimos quando nos voltamos para o método dos puritanos.