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ANTONIO CESAR CAMARGO MIRANDA




BATISTAS ESLAVOS EM CURITIBA: RELIGIÃO E ETNICIDADE




                          Monografia Final do Curso de História,
                          Setor de Ciências Humanas, Letras e Artes, da
                          Universidade Federal do Paraná.

                          Orientador: Prof. Sérgio Odilon Nadalin




                     CURITIBA
                        2009
AGRADECIMENTOS


          É com alegria que concluo mais esta etapa. A realização de um trabalho proporciona a
abertura de novos caminhos, aquisição de conhecimentos e amizades construídas no decorrer
do período em que estive participando da vida universitária. Em primeiro lugar gostaria de
agradecer a Deus por me oferecer uma oportunidade de concretizar meus objetivos, criando
valores e perspectivas de vida que sempre me estimularam para alcançar as metas traçadas.
          Agradeço também a atenção e disponibilidade das pessoas que contribuíram para que
esse simples trabalho pudesse ser realizado. Ao professor Doutor Sergio Odilon Nadalin pela
orientação nos rumos e ajustes da pesquisa. A professora Doutora Oksana O. Boruszenko por
tirar dúvidas, esclarecer muitas das questões que estavam em aberto e contribuir de maneira
direta para construção de meu conhecimento. A professora Maria Luiza Andreazza por, no
início, encaminhar e incentivar a pesquisa. Meus sinceros agradecimentos ao professor Iedo
Néspolo, por revisar e corrigir todo o texto, e ao professor e pastor Ebenézer Soares Ferreira,
pelas indicações bibliográficas.
          Outro grupo de pessoas que não posso deixar de citar são aqueles que disponibilizaram
toda a documentação que tive contato e entenderam o propósito desse trabalho. Agradeço a
Lidiane Xavier Iurk Querino, Coordenadora Administrativa da Convenção Batista
Paranaense, a Doris Körber, secretária da Convenção Batista Pioneira do Sul do Brasil, a
Nelita Morais, secretária da Primeira Igreja Batista de Curitiba, a Marcia Aline Paraszczuk,
secretária da Igreja Batista Avenida dos Estados, a Rangel Ramiro Ramos, secretário da Igreja
Evangélica Batista da Água Verde e a Olga Waculicz, responsável pelas atas da comunidade
eslava.
          De igual modo agradeço a todos os entrevistados que me receberam em suas casas e
disponibilizaram um tempo precioso para que, através de suas memórias familiares e suas
experiências pessoais, eu pudesse aprimorar meu conhecimento.
          Por fim, mas não menos especial, minha gratidão aos meus amigos e familiares.
Principalmente a minha mãe, Lindamir, minha tia, Eliete, e minha avó, Santina, os grandes
alicerces da minha vida. Sem vocês nada disso seria possível e teria valor.
SUMÁRIO

INTRODUÇÃO.....................................................................................................................1
1. Capítulo 1
1.1 A Igreja Batista.................................................................................................................3
1.2 O advento da Igreja Batista em Curitiba, história e organização....................................10
1.3 “Configurações étnicas” na Igreja: o caso das Igrejas Eslavas no Brasil........................12
2. Capítulo 2
2.1 Os “eslavos”: identificações e diferenças.......................................................................18
2.2 Imigrações eslavas para o Brasil.....................................................................................24
3. Capítulo 3
3.1 Primeira Igreja Batista Eslava de Curitiba – motivações étnicas?..................................28
CONCLUSÃO.....................................................................................................................40
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS..............................................................................44
ENTREVISTAS...................................................................................................................46
NOMES DAS FAMÍLIAS ENCONTRADAS NAS ATAS DA COMUNIDADE ESLAVA
DE CURITIBA.....................................................................................................................55
1




Introdução:


       O interesse por uma “história da religião” surge através da curiosidade de “como”,
“quando” e os “porquês” da formação de grupos religiosos. Cada um com especificidade
diferente, próprios ritos, crenças e costumes – especialmente, a denominação batista. Essa
“Igreja” se instala no Brasil e difunde suas crenças, num primeiro momento, através de
missionários, geralmente oriundos dos Estados Unidos, sustentados financeiramente por
instituições ou Igrejas da denominação, especificamente com o objetivo de propagar sua fé.
No entanto, o desenvolvimento desses trabalhos não é restrito apenas à atuação desses
indivíduos, como geralmente se pensa, pois através de movimentos imigratórios, há pessoas
que transportam consigo suas crenças, dando início a suas formas de culto e expandem sua fé.
Nesse sentido, desde fins do século XIX observam-se grupos de batistas vindos da Europa que
se instalam no Brasil. Ao estabelecerem colônias, muitos desses indivíduos iniciam uma ação
missionária própria, ou solicitam a presença de obreiros de seus países, alemães, suecos,
húngaros, letos, estonianos e os “eslavos”, para que o trabalho possa se alargar em diversos
pontos do território brasileiro.
       O nosso primeiro contato com o grupo batista eslavo em Curitiba ocorreu através de
uma foto existente na Convenção Batista Paranaense, em cuja fachada aparecia escrito
“Primeira Igreja Evangélica Batista Eslava de Curitiba”. Indagamos “como” era possível a
existência de um grupo batista “eslavo” em Curitiba, pois não conhecíamos um grupo desse
gênero. Através de contatos com membros da Igreja Evangélica Batista da Água Verde
tivemos acesso à documentação da comunidade, iniciando a nossa pesquisa sobre um grupo
religioso específico. A falta de trabalhos acadêmicos que tratam da questão de grupos batistas
eslavos no Brasil, congregando pessoas de diferentes etnias, ao mesmo tempo, em uma
comunidade de fé, instigaram ainda mais a pesquisa. Há apenas apontamentos sobre o
surgimento de grupos batistas eslavos no Brasil e a organização de Igrejas formadas por
russos, poloneses, ucranianos e outros. Assim, há a possibilidade de, através de estudos da
imigração, observar a formação de grupos religiosos, estudando a maneira como acontecem
suas atuações em lugares diferentes de sua origem e “como” desenvolveram seus trabalhos
eclesiásticos.
       Nesse caso específico, a formação de um grupo religioso denominado “eslavo”, em que
várias etnias apresentando diferenças significativas, reúnem- se em torno de uma profissão de
fé comum, relativamente estranha às suas culturas originais: poloneses são de uma tradição
2




católica de rito latino, russos e ucranianos pertencem ao catolicismo ortodoxo e parte dos
ucranianos acabaram tornando-se católicos uniatas.
               Somadas às questões religiosas, os eslavos ainda reúnem grupos com diferenças
históricas, lingüísticas e culturais bastante significativas. Através dessas questões houve a
busca dos elementos que proporcionaram a congregação destas diferentes etnias em um
mesmo espaço, abrangendo ou não todas suas especificidades. Num primeiro momento,
criaram perante os brasileiros, uma identidade de “eslavos”, por cantarem e fazerem suas
leituras bíblicas e expressarem-se em idiomas próprios. Como as línguas de origem “eslava”
são parecidas entre si, foi possível a conversação e emprego do próprio idioma de cada etnia
em seus trabalhos religiosos. Assim todos conversavam utilizando as línguas russa, ucraniana
e polonesa, deixando o português de lado. Posteriormente, algumas pessoas não se
identificando mais como “eslavos”, reivindicaram uma organização em separado, para que
cada trabalho pudesse respeitar tradições e idiomas próprios de cada etnia. A comunidade deu
prosseguimento a seus trabalhos até o momento em que a Primeira Igreja Evangélica Batista
Eslava de Curitiba muda seu nome para Igreja Evangélica Batista da Água Verde. Essa
mudança de nome traduz uma transformação importante no “regimento” da Igreja. Os
trabalhos deixam de ser destinados somente a “eslavos” e é disponibilizada “assistência
espiritual” aos brasileiros.
       O primeiro capítulo visa a abordar o advento da Igreja Batista no mundo, no Brasil,
em Curitiba e o caso de Igrejas Eslavas no Brasil. Os “eslavos” e suas divergências histórico-
culturais serão estudados no segundo capítulo, quando se deverão traçar algumas
características dessas diferenças. Por fim, o terceiro capítulo trata da comunidade “eslava” em
si, desde sua formação, objetivando “como” foi possível congregar diversas etnias “eslavas”
em um mesmo espaço religioso, até o momento em que, em sua substituição, organiza-se a
Igreja Evangélica Batista da Água Verde, em 1978.
3




1.1 A Igreja Batista.


       O início da história batista é muito incerto. Há três versões que tentam apontar para o
possível surgimento dessa denominação religiosa.
       A primeira delas, defendida por alguns historiadores batistas1, é conhecida como
“Teoria do Rastro de Sangue” ou “Teoria do JJJ- Jerusalém-Jordão-João”. Os historiadores
que seguem esta hipótese veem uma “descendência histórica” partindo de uma linhagem
ininterrupta desde os tempos bíblicos, quando João Batista efetuava batismos no rio Jordão.
Assim, essa denominação é vista como uma filiação proveniente de uma época anterior a
Cristo e que foi se desenvolvendo ao longo dos séculos com vários nomes diferentes2 e
chegou até nós com o nome “batistas”3.
       A segunda proposição correlaciona essa denominação a um parentesco com os
anabatistas do século XVI4. Levando em conta essa ligação, alguns historiadores sugerem que
grupos na Idade Média5 já praticavam preceitos, como o batismo por imersão, uma crença
contrária à veneração de imagens de santos e a transubstanciação na eucaristia, que depois
foram utilizados pelos anabatistas. Outros autores, porém, veem o nascimento dos anabatistas
em Zurique, na Suíça, paralelamente à Reforma praticada por Ulrico Zuínglio6. Um grupo de
pessoas teria estudado a Bíblia e identificado que o batismo infantil era um erro e só pessoas
em condições de professarem sua fé e regeneradas deveriam ser batizadas. Depois de
ocorridos alguns batismos na cidade, as autoridades locais decretaram que os pais deveriam
batizar seus filhos ainda sob pena de desterro e que rebatismos teriam pena de afogamento7.
Com o não cumprimento da lei, um dos líderes do movimento foi condenado à morte e
afogado no rio que corta a cidade8. Os demais líderes foram perseguidos e dispersos pelas
autoridades de Zurique. Para unificação e consolidação dos pontos que eram pregados por

1
  LIMA, Jaime Augusto, História dos Batistas Regulares no Brasil. São Paulo: Editora Batista Regular, 1997.
p. 15.
2
  PEREIRA, José Reis. História dos Batistas no Brasil. Rio de Janeiro: JUERP; 2001. p. 19-47.
3
  KEIDANN, D. M. Uma Introdução à história dos batistas no Rio Grande do Sul numa perspectiva
transcultural. Minas Gerais: IEPG; 1996. p. 24-25.
4
  Os anabatistas, cujo nome significa rebatizadores, surgiram e foram assim denominados durante a Reforma e
considerados radicais por seus opositores. Defendiam a autoridade da Bíblia, discordando em alguns aspectos
dos reformadores do século XVI, principalmente sendo contrários ao batismo infantil e a conseqüente entrada
automática à Igreja. Defendiam a idéia de uma Igreja formada apenas por pessoas regeneradas, crendo que o
batismo deveria ser ministrado somente a adultos que cressem em Cristo e tivessem vontade de ingressar em
uma Igreja. Podem ser identificados durante esse período em vários locais da Europa e em alguns aspectos
doutrinários podem estar ligados às primeiras Igrejas Batistas, chamadas de Gerais no início do século XVII.
(Ibid., p. 28-31)
5
  Valdenses, Lolardos, Petrobrusianos, henriquianos e outros. (PEREIRA, op. cit., p. 34-36)
6
  Ibid., p. 44.
7
  KEIDANN, op. cit., p. 30.
4




esses anabatistas, tornou-se de extrema importância a criação de uma declaração de fé que
compilasse todas as doutrinas seguidas por eles. Aqueles que escaparam à perseguição
elaboraram um documento, entre a cidade de Zurique e Schaffhausen na Suíça, que ficou
conhecido como “Confissão de Fé de Schleitheim”, nome da cidade onde se reuniram e
redigiram sua declaração. Após longo tempo de perseguição e com suas doutrinas já
estabilizadas, vários grupos de anabatistas migraram para áreas de maior tolerância religiosa
na Europa. Alguns soberanos acabaram aceitando a vinda desses imigrantes para povoar
territórios escassamente habitados e os anabatistas se dirigiram para regiões do Palatinado,
Alsácia, Morávia9, Itália, Alemanha, Inglaterra e Holanda10. Nos Países Baixos, foram bem
recebidos, pois já havia uma rejeição a doutrinas católicas empregadas, sendo de maior
facilidade aderirem à nova religião. Antes da chegada desses grupos à região, houve alguns
desastres naturais, como o rompimento de diques, que causou perdas totais das colheitas, e
problemas políticos, como embargos comerciais que causaram inflação, fome e desemprego,
que resultaram num sentimento apocalíptico entre as massas, catalisando a expansão do
anabatismo na região11.
      Os anabatistas embora formassem um movimento religioso pacífico, com discursos
proféticos e apocalípticos numa época de desagregação social, agitaram alguns grupos que se
tornaram revolucionários. O caso mais conhecido é o de Thomas Müntzer, que pregava uma
idéia milenarista de que o reino de Deus deveria ser estabelecido o mais breve possível e se
necessária a violência deveria ser empregada. Após várias perturbações e ataques a igrejas e
mosteiros entre o noroeste da Alemanha e diversas províncias dos Países Baixos, Müntzer e
seus seguidores tomaram a cidade de Münster na Alemanha tentando estabelecer suas crenças
à força. Em resposta a cidade foi sitiada e tomada por tropas do príncipe-arcebispo da cidade
auxiliado pelo exército imperial alemão12. Os anabatistas foram mortos e a fama de sua
violência, decorrente do terror causado por Müntzer, foi espalhada pela Europa. Por outro
lado, os anabatistas pacíficos pregavam um isolamento do mundo e o estabelecimento de
colônias próprias, onde o reino de Deus seria empregado pela desistência de padrões
mundanos e obediência somente às Escrituras. Com a derrota de Thomas Müntzer e sua
popularidade, vários grupos pacíficos foram perseguidos e mais uma vez dispersos.
Posteriormente, reagruparam-se sob a liderança de Menno Simons e deram origem aos

8
  PEREIRA, op. cit., p. 45-47.
9
  MASKE, Wilson. Os menonitas e a Construção do Novo Reino. HISTÓRIA: QUESTÕES E DEBATES,
Curitiba, n. 28, 77-105 , 1998. p. 91.
10
   PEREIRA, op. cit., p. 43.
11
   MASKE, op. cit., p. 87.
5




menonitas13. Estes grupos acabaram por isolar-se em comunidades fechadas, tendo direito a
terra e à liberdade de religião. A Morávia, Palatinado, Galícia, Volínia, Dantzig, Prússia
Ocidental e Oriental foram alguns dos locais onde esses grupos se estabeleceram.
       A terceira hipótese defende que a origem dos batistas estaria relacionada aos
separatistas ingleses14 do início do século XVII. Esses grupos ansiavam por estabelecer Igrejas
com modelo baseado no Novo Testamento, segundo suas interpretações e alegavam que para
a admissão de membros em uma Igreja o batismo deveria ser feito após profissão de fé. Como
o costume era o batismo infantil, verificaram que deveriam batizar-se novamente caso
almejassem formar uma Igreja fundamentada em princípios neotestamentários. A perseguição
a grupos como esse se tornou mais intensa na Inglaterra e o desejo por uma igreja
independente do estado se tornava crescente. Assim migraram para a Holanda e fundaram
uma Igreja Batista em Amsterdã mas após dissidência desse grupo, ex-membros voltaram
para a Inglaterra e fundaram uma Igreja Batista nos arredores de Londres15.
       Ainda no século XVII, derivam dos separatistas ingleses duas denominações: os
“Batistas Gerais” e os “Batistas Particulares”. Os primeiros são assim designados por
acreditarem que a morte de Cristo poderia se aplicar a todos e em suas doutrinas limitavam a
autonomia das igrejas locais que eram ligadas a associações. Este aspecto limitou a atuação
das igrejas individualmente, centralizando e retardando o crescimento destas, que aos poucos
foram enfraquecidas. Os “Batistas Particulares” acreditavam na doutrina da eleição, em que a
salvação em Cristo era apenas destinada a algumas pessoas, e zelavam pela independência de
cada igreja local, relegando às associações apenas funções extras. Alguns grupos aos poucos
foram deixando de lado o princípio da eleição, proporcionando a propagação da fé dos
batistas a um número maior de pessoas e, como conseqüência, floresceram Igrejas Batistas em
toda Inglaterra16.
       Com relação às perseguições feitas no século XVII, outro movimento migratório pode
ser observado nesse período. Alguns separatistas ao invés de irem para o continente europeu,
preferiram a América do Norte e estabeleceram colônias em que todas as pessoas professavam
a mesma crença. Porém, do mesmo modo, houve no Novo Mundo uma série de reclamações

12
   Ibid., p. 88.
13
   Ibid., p. 89-103.
14
    Com o surgimento de várias seitas protestantes na Inglaterra no século XVII, os separatistas ingleses
diferenciavam-se dos demais movimentos religiosos por serem congregacionais em sua eclesiologia, insistindo
no batismo somente à pessoas regeneradas pelo Espírito Santo. Este movimento tinha como origem o
puritanismo inglês e defendia mudanças mais profundas dentro da Igreja, insistindo que as reformas feitas no
século XVI na Inglaterra não foram completas. (PEREIRA, op. cit., p. 14)
15
   Ibid., p. 49-51.
16
   KEIDANN, op. cit., p. 34-36.
6




que envolviam a união entre Estado e Igreja. O pastor Roger Williams demonstrava sua
desaprovação ao sistema em que as colônias viviam, em comunidades atreladas ao poder do
governo. Após acusação e conseqüente punição retirou-se da igreja em que estava e unindo-se
a outros dissidentes chegou ao pleno entendimento de que Igreja e Estado deveriam ser
dissociados. Além disso, estudou a Bíblia e concluiu que o batismo infantil não era válido e
que Cristo havia instituído o batismo a pessoas adultas e conscientes de tal ato. Desse modo o
grupo todo se batizou novamente e organizou a Primeira Igreja Batista em solo norte-
americano, na localidade de Providence,           no estado de Rhode Island17. Após o
estabelecimento dessa comunidade surgem outros grupos ou pessoas que migraram para a
América do Norte e em contato com batistas ou ainda ao examinarem a Bíblia, aderiram às
idéias que eram pregadas por essa denominação e acabaram fundando igrejas espalhadas por
diversas colônias ao longo do território da Nova Inglaterra18. Um exemplo que ilustra esta
questão é o grupo ligado a John Clarke. Perseguidos por convicções religiosas na Inglaterra,
fugiram para a América do Norte, porém não se adaptaram ao sistema das colônias
americanas que também sufocava sua liberdade religiosa. Clarke, assim que chegou à
América, teria entrado em contato com um grupo de batistas. Comprou um território de índios
locais, a qual chamou de Rhode Island, onde fundou uma colônia e igreja próprias. Essa
comunidade reivindica para si o fato de serem a Primeira Igreja Batista em território
americano.      Porém não há evidencias que provem que a Igreja por ele fundada nessa
localidade fosse batista. Os documentos existentes informam haver uma Igreja Batista em
Newport, em Rhode Island, em 1648, cerca de dez anos após a fundação da Igreja de
Providence19.
        As três explicações para o surgimento dos batistas têm um fundamento em comum:
todos os batistas creem na Bíblia como livro que contém suas principais regras de fé e prática,
na separação entre Igreja e o Estado e no batismo por submersão, ministrado somente àqueles
que creram em Cristo e no Evangelho. Ou seja, o batismo por aspersão e o infantil não são
considerados bíblicos e nesses casos há a necessidade do “rebatismo” por imersão. Essa
última característica, que forneceu o nome de “batistas” a essa denominação, daria
oportunidade ao indivíduo de fazer parte de uma Igreja formada apenas por pessoas
regeneradas por Cristo e que fossem conscientes do ato batismal a que estavam se
submetendo. Tendo em vista a falta da liberdade religiosa e as perseguições que decorreram


17
   PEREIRA, op. cit., p. 53-54.
18
   Ibid., p. 55-56.
19
   Ibid., p. 55.
7




delas na Europa, no século XVII, essa denominação é a favor da separação entre Igreja e
Estado e prega a liberdade de culto e consciência a todas as pessoas. Assim sendo, outra
característica dos batistas é a autonomia e soberania da Igreja local frente à outra instituição
eclesiástica ou governamental. Toda Igreja Batista tem artigos de fé e estatutos de regimento
interno próprios e está sujeita a decisões tomadas em conjunto e democraticamente por seus
membros, não estando subordinada a nenhuma outra entidade. Um pequeno grupo de
indivíduos, a partir de duas ou três pessoas, que observam e ao praticar todos esses
ensinamentos da denominação, pode dar início a uma Igreja Batista.
      É através das formações de associações, convenções ou as chamadas “Juntas” que os
batistas cooperam entre si e estabelecem interdependência. A criação de tais instituições por
parte das igrejas, serve para exercer as mais variadas atividades como educação, saúde,
missionarismo e caridade. Deste modo, há maior facilidade para as igrejas bancarem suas
obras visando à expansão da denominação. Essas associações são uma cooperação voluntária
de cada Igreja, sendo mantidas, fiscalizadas e formadas pelos membros daquelas que se
prontificaram a este convênio20.
      Uma comunidade batista pode surgir através da implantação de uma congregação
diretamente vinculada a uma “igreja mãe”, que lhe concede “assistência espiritual” através de
um pastor ou outro responsável que possa presidir suas atividades eclesiásticas. Ao mesmo
tempo, disponibiliza-lhe recursos financeiros para despesas necessárias como compra ou
aluguel de propriedade, materiais para os cultos e demais despesas.
      Muitas vezes há o desejo por parte de alguns indivíduos, pertencentes a uma Igreja já
constituída, de reunirem-se em outro local. Por morarem em municípios, regiões ou bairros
muito afastados da comunidade à qual pertencem, necessitam de um local mais próximo, onde
eles possam desenvolver suas atividades religiosas. Geralmente, num primeiro momento, os
cultos começam a ser feitos nos lares desses indivíduos, trazendo a população vizinha para
apresentação do evangelho. Ao desenvolver-se essa atividade, procura-se um local mais
espaçoso para que possa melhor comportar aqueles que desejam freqüentar as reuniões. Outra
forma comum para a formação de uma congregação são os pontos de pregação nos bairros:
uma localidade, uma praça, ou uma rua, onde rotineiramente, uma vez por semana, ou
mensalmente, acontece um trabalho de propagação do evangelho, com distribuição de
panfletos, pregações e apresentações musicais.
       A congregação pode organizar-se em igreja a partir do momento em que consiga
manter-se fisicamente, sustentando todos os seus gastos financeiros, e “espiritualmente”,
8




tendo pastor próprio ou algum outro responsável que fique à frente de suas atividades
eclesiásticas. Constitui-se, portanto, igreja ao preencher essas condições e os indivíduos
demonstrem vontade para que possa efetivar-se a organização. Na medida em que estejam
sujeitos à doutrina batista, seus artigos de fé, os ensinos bíblicos que seguem, sua
responsabilidade para com a denominação batista e os estatutos da Igreja que expostos não
devem contrariar a crença doutrinária da denominação, surge uma nova comunidade batista.
        O missionarismo batista pode ser observado desde a sua formação como Igreja. O
primeiro ponto a ser destacado na doutrina batista para com pessoas de fora da Igreja é
justamente “o pregar o evangelho”21. Partindo da interpretação do Novo Testamento e os
ensinamentos de Cristo, essa deve ser a principal tarefa das pessoas que se congregam em
uma comunidade batista. Ao relacionar-se com pessoas que ainda não foram regeneradas22, o
crente deve prontificar-se a lhe apresentar o sacrifício de Cristo. Este trabalho pode ser feito
de várias maneiras. Uma delas é a formulação e distribuição de literatura, evangelismos em
locais públicos e convites a eventos especiais onde a Igreja se reúne.
        O movimento de enviar pessoas específicas para outras localidades com o intuito de
propagar o evangelho em várias partes do mundo surgiu ainda em fins do século XVIII. Após
a influência de John Wesley e um movimento que despertou igrejas na Inglaterra, algumas
denominações iniciaram um trabalho visando à expansão de suas crenças. Dentre elas, os
batistas enviaram William Carey e John Thomas em 1793 para a Índia, dando início as
Missões Protestantes Modernas23. Após estes primeiros missionários, fez-se necessária a
criação de Convenções e Juntas Missionárias que reunissem as igrejas no intuito de angariar
fundos para manter esses trabalhos. Tais instituições proporcionaram a manutenção de vários
missionários espalhados por múltiplos territórios24 e fez com que o missionarismo batista
fosse ampliado durante o século XIX, chegando inclusive ao Brasil.
        Uma das Juntas Missionárias de maior expressão foi a Junta de Richmond, criada no
ano de 1845, ligada à Convenção Batista do Sul dos Estados Unidos. Seu objetivo era enviar e
sustentar missionários e trabalhos de introdução do evangelho em locais onde ainda não havia
pessoas que conhecessem ou tivessem algum tipo de contato real e mais profundo com os
ensinamentos evangélicos. No entender desta instituição, o Brasil era um país que se

20
   KEIDANN, op. cit., p. 50.
21
   PORTER, op. cit., p. 23-24.
22
   Os indivíduos só são considerados regenerados na medida em que são vistos com padrões de comportamento
que se aproximem àqueles que estejam conforme as doutrinas ensinadas pelo Novo Testamento. A partir disso, a
prova principal dessa condição é a restauração feita após o batismo por imersão.
23
   PEREIRA, op. cit., p. 52.
24
   Pontos da África, América e Ásia, com crescente demanda ao enviar pessoas para a China. (Ibid., p. 57-58)
9




encaixava nessa condição, pois o catolicismo era julgado como idólatra e apegado ao culto a
Maria e aos santos. Nessas circunstâncias, apesar do Brasil ser considerado, num âmbito
geral, uma nação cristã, fazia-se muito necessária a introdução de um evangelho puro e a
conversão de todos os católicos, não só brasileiros, mas de todo o mundo25.
        Nessa perspectiva de pregar a palavra de Deus aos brasileiros, o primeiro missionário
enviado pela instituição, em 1860, foi Thomas Jefferson Bowen. O evangelista não teve
sucesso em sua missão. Um motivo foi sua saúde que já se encontrava muito debilitada,
agravada com o clima da cidade do Rio de Janeiro, o risco de contrair febre amarela e o alto
custo de vida que lhe dificultava o sustento. Além disso não tinha um planejamento que lhe
norteasse o trabalho, ficando perdido em seus deveres e obrigações. Bowen era conhecedor de
alguns dialetos africanos, pois havia sido missionário na África antes de vir ao Brasil, e
começou a relacionar-se com escravos que encontrava, sendo preso em virtude dessa
atividade. Todos esses motivos fizeram com que ele regressasse para os Estados Unidos. Após
a vinda desse missionário, outros grupos de batistas a chegarem ao Brasil teriam sido
imigrantes oriundos do sul dos Estados Unidos, em decorrência da Guerra de Secessão, e que
se estabeleceram em Santa Bárbara, na província de São Paulo. Na colônia que se organizou,
foram criadas algumas igrejas no ano de 1871, sendo uma batista. Assim, a primeira Igreja
dessa denominação fundada no Brasil tinha a intenção de atender apenas os imigrantes, sendo
seus cultos realizados na língua inglesa26. É possível observar que esta comunidade também
se preocupa em apresentar suas crenças aos brasileiros e faz algumas solicitações a Junta de
Richmond para que se enviem missionários para evangelizar os brasileiros27.
        Um dos responsáveis pela introdução de trabalhos batistas no Brasil foi Alexander
Travis Hawthorne que, após a Guerra de Secessão, dirigiu-se para o estado da Bahia pensando
em estabelecer uma colônia de imigrantes. Não sendo possível esse seu desejo retornou ao
país de origem e tornou-se um grande incentivador do envio de missionários para o Brasil. Os
primeiros missionários apoiados por Hawthorne foi o casal Bagby28 que chegou à cidade do
Rio de Janeiro no ano de 1881, e dirigiu-se a Santa Bárbara para contato com os batistas lá
situados. Como a intenção era aprender a língua portuguesa, mudaram-se para cidade de
Campinas onde havia um colégio presbiteriano que lhes proporcionou melhor estudo29. Em
seu contato com os imigrantes norte-americanos, conheceram um ex-padre católico, Antônio


25
   Ibid., p. 67-68.
26
   Ibid., p. 69.
27
   KEIDANN, op. cit., p. 69.
28
   Ibid., p. 70.
29
   PEREIRA, op. cit., p. 73-76.
10




Teixeira de Albuquerque. Este, ao estudar a Bíblia durante e após fazer seminário em
Pernambuco, criou convicções que estavam fora dos ensinamentos católicos. Resolveu então
largar o sacerdócio e, mais uma vez estudando os mandamentos do Novo Testamento,
começou a acreditar que o batismo deveria ser ministrado por imersão. Tendo o conhecimento
que havia batistas em Santa Bárbara dirigiu-se para a colônia e solicitou o batismo. Como
possuía vasto conhecimento bíblico foi ordenado ao ministério batista30. Para compor o grupo
de missionários pioneiros aparece Zachary Clay Taylor, que tinha intenções de vir para o
Brasil antes mesmo da vinda do casal Bagby. Taylor havia se impressionado com o livro “O
Brasil e os Brasileiros” de Kidder e Fletcher, pregadores metodistas que estiveram no país no
período regencial. Terminou os estudos e foi consagrado ao ministério batista. Encorajado,
assim como os outros missionários, por Hawthorne embarcou com sua esposa em 1882,
juntando-se aos missionários citados acima. Essas pessoas são as responsáveis pela fundação
da Primeira Igreja Batista propriamente brasileira, figurando entre seus membros não só os
missionários norte-americanos, mas também um brasileiro. O local escolhido por eles foi a
cidade de Salvador, uma cidade populosa e centro de religião onde se situava o arcebispo
primaz do país, considerada desprovida de trabalho missionário de qualquer denominação. Na
medida em que a Igreja cresceu e se desenvolveu, os missionários resolveram expandir o
trabalho em outras regiões. Em 1884 os Bagby dirigiram-se para o Rio de Janeiro e, junto
com outros imigrantes e brasileiros que se converteram à mensagem apresentada pelos
evangelistas, fundaram a Segunda Igreja Batista em solo brasileiro. A partir daí, com a
chegada de outros missionários31 e a conseqüente propagação do evangelho, várias
comunidades batistas foram sendo criadas por todo país32.


1.2 O advento da Igreja Batista em Curitiba, história e organização.


        A chegada dos batistas a Curitiba está vinculada à iniciação dos trabalhos dessa
denominação no litoral paranaense. Uma caravana de evangelistas congregacionais partiu da
cidade de Santos, em 1902, visando a estabelecer um trabalho de pregação do evangelho no
Rio Grande do Sul. Ao chegarem a Curitiba, o grupo separou-se. Ao que tudo indica a
literatura que distribuíam teria terminado e por isso enquanto um grupo avançava, o outro
retornaria a Santos para munir-se de mais material. Samuel Pires de Mello, que se convertera


30
   Ibid., p. 77-78.
31
   Ibid., p. 97-103.
32
   Ibid., p. 85-90.
11




havia pouco33, foi o encarregado de voltar. Após sua estada em Curitiba foi a Paranaguá, onde
alugou uma sala e começou a fazer reuniões e pregar o evangelho. Em seguida dirigiu-se a
Santos e retornou dois meses mais tarde à cidade paranaense, trazendo consigo sua família34.
Ao estabelecer-se em solo parnanguara, continuou propagando sua fé em Cristo e em 1903,
após executar os primeiros batismos, criou a “Igreja Cristã”. A princípio esta Igreja não era
batista e não estava ligada a nenhuma denominação religiosa. A comunidade era dirigida
apenas por Mello, que enviava relatórios anuais ao grupo a que estava ligado em São Paulo,
pois não perdera o vínculo inicial com seus mentores na fé35.
        O trabalho do missionário expandiu-se ao longo no tempo, não só em Paranaguá, mas
também em demais localidades do litoral paranaense chegando inclusive a serem realizadas
duas reuniões na cidade de Curitiba. Outros líderes se integraram na propagação do evangelho
pela região, fazendo com que mais pessoas pudessem ter contato com a obra que estava sendo
feita. No ano de 1908, com os recursos financeiros escassos e saúde debilitada, Mello optou
por passar seu trabalho a alguém que pudesse dar continuidade. Diante da recusa por parte do
grupo que o apoiava em São Paulo e como sua “Igreja Cristã” não estava filiada a qualquer
denominação, voltou-se para os batistas pedindo ajuda36. Após um exame da Missão
Paulistana para averiguar se a Igreja de Mello estava de acordo com as doutrinas do Novo
Testamento e se nenhuma de suas práticas comprometia as doutrinas batistas, a comunidade
passou ao vínculo da denominação. Em 1910, a Igreja foi considerada como batista, sendo
incluída no rol de Igrejas que compunham a Convenção Batista Brasileira37. Deste modo,
iniciou-se o trabalho batista no estado do Paraná: uma comunidade religiosa já estabelecida e
sem qualquer ligação denominacional, acaba por passar ao campo de trabalho dos batistas.
        A denominação começou a fazer vários investimentos financeiros no trabalho que fora
desenvolvido, como aquisição para um novo templo, e o envio de missionários para
continuidade na evangelização do litoral. Um destes evangelistas, Manoel Virgínio de Souza,
que chegou a Paranaguá em 1912 para auxílio na obra, transferiu- se no mesmo ano para
Curitiba com intuito de organizar uma nova frente de atuação38. No ano de 1914, outro


33
   CAVALLARI, Nivaldo. Centenário de Fé: História da Primeira Igreja Batista de Paranaguá. Paraná: Edição
A. D. Santos Editora, 2003. p. 19-22.
34
   Ibid., p. 23.
35
   Ibid., p. 33.
36
   Ibid., p. 50-55.
37
   A primeira Convenção Batista Brasileira foi criada no ano de 1907, reunindo pastores e missionários de todo o
país. O objetivo proposto era aumentar ainda mais o trabalho batista, não só no Brasil, mas também enviando
missionários para Chile e Portugal, locais onde havia necessidade e oportunidade de pregar o evangelho.
(PEREIRA, op. cit., p. 141-156)
38
   CAVALLARI, op. cit., p. 63.
12




missionário, Robert Pettigrew, que também estava no litoral apoiando a comunidade batista,
se transfere para a capital paranaense com a intenção de criar um colégio batista na cidade39.
        Manoel Virgínio de Souza fazia reuniões para pregar o evangelho em sua própria casa
e com a vinda de Pettigrew de Paranaguá, organizou-se a Primeira Igreja Batista de Curitiba
constituída por nove membros. Com o crescimento da comunidade fez-se necessária a compra
de uma sede própria e, com o auxílio de outro obreiro recém chegado de São Paulo, Arthur
Beriah Deter, foi possível a aquisição de um terreno na rua Visconde de Guarapuava, esquina
com a rua Desembargador Westphalen. A Igreja, então com cerca de 115 membros, terminou
a construção e inaugurou seu templo em 192440. Em seguida a comunidade continuou
crescendo com a visão de prosseguir espalhando o evangelho por toda a cidade, criando
congregações que virariam Igrejas constituídas.




1.3 “Configurações étnicas” na Igreja: o caso das Igrejas Eslavas no Brasil.


        A história dos batistas eslavos está estritamente ligada aos batistas letos, vindos entre o
fim do século XIX e início do século XX. Eles se instalaram no sul do país onde organizaram
duas igrejas batistas: a Primeira Igreja Batista Leta foi fundada em Rio Novo, Santa Catarina,
em 1892 e a segunda, a Igreja Batista Leta de Ijuí, no Rio Grande do Sul, foi organizada em
189541. Os batistas na Letônia emigraram porque estavam sofrendo perseguições por meio de
leis, proibições, prisões e até mesmo o exílio, por parte de autoridades políticas e
eclesiásticas, que limitavam a atuação de pastores e líderes das comunidades. Somando-se a
essa série de restrições à sua liberdade de culto e fé, as camadas populares da Letônia tinham
o anseio crescente de cultivarem terras próprias, pois estariam submissas a “senhores de terras
germânicos”42. A busca pela terra e melhores condições materiais proporcionaram o advento
da emigração de letos para outros locais, dentre eles o Brasil43.
        O segundo grande movimento imigratório de batistas letos para o Brasil acontece nos
anos de 1922/1923. Após o estabelecimento dos primeiros letos em suas colônias no sul do
país, os que aqui estavam mandavam cartas para seus parentes e amigos que haviam ficado na
Letônia, fazendo propaganda da nova terra e as condições favoráveis em que estavam

39
   Ibid., p. 68.
40
   SOUZA, Sóstenes Borges de. Enciclopédia Batista Brasileira. Salvador: Artios, 1996. p. 77.
41
   KEIDANN, op. cit., p. 168-169.
42
   RONIS, Osvaldo. Uma Epopéia da Fé: História dos Batistas Letos no Brasil. Casa Publicadora Batista. Rio de
Janeiro, 1974. p. 84.
13




vivendo. A inquietação política vivida antes da Primeira Guerra Mundial fazia “os que lá
estavam” refletirem melhor na possibilidade de procurar outro local como refúgio. Os
sofrimentos causados pela guerra e a inquietação vivida nos anos que se sucederam a ela
aguçaram a vontade de emigrar. Aliado a esses sentimentos, houve entre os batistas um
“despertamento espiritual” que apontava para a fuga “das forças do mal, materialistas e
ateístas” que dominariam o país44. O avanço comunista sobre o leste europeu, fez estas
comunidades religiosas atentarem para a saída do país o mais rápido possível, tendo uma
visão profética e apocalíptica do que aconteceria com aqueles que continuassem sob jugo dos
invasores. Superadas as burocracias com o governo brasileiro45, em 1922 começaram a
embarcar pequenos grupos de batistas letos para o Brasil. O primeiro grupo desses imigrantes,
eram famílias mais abastadas que traziam recursos financeiros para aquisição de terras onde
instalariam uma grande colônia. Assim criaram a Colônia de Varpa, em São Paulo, que tinha
por objetivo abrigar os demais colonos provenientes da Letônia46.
        Paralelamente, em condições muito semelhantes a esses batistas letos, um outro grupo
da mesma denominação que vivia na Ucrânia tinha o anseio de embarcar para o Brasil. Um
dos membros da Colônia de Varpa havia deixado uma filha, casada com um russo, na
U.R.S.S. Ela sempre lhe escrevia colocando as dificuldades materiais e “espirituais” em que
se encontravam todos os que viviam na Rússia comunista. Outras pessoas da mesma região
também se queixavam das condições em que estavam e os líderes dessa Colônia
disponibilizaram dois pastores para irem à Europa auxiliar e trazer cerca de 50 famílias para o
Brasil. Divididas em dois grupos, vieram da Ucrânia, não só ucranianos, mas também batistas
russos e letos, que aproveitaram a ocasião para emigrarem juntos, para se fixarem nas
proximidades da Colônia de Varpa47. Ambos os grupos chegaram ao Brasil em 192648. Um
desses novos colonos que estava entre esses batistas era o pastor Simeon Molochenco, que
alguns dias após sua chegada não continuou no interior de São Paulo e dirigiu-se a capital do
estado. Estabeleceu contato com os missionários norte-americanos que lá estavam, entre eles
o casal Bagby que já havia fundado o Colégio Batista Brasileiro com intuito de evangelizar os
brasileiros através da educação. O casal de missionários disponibilizou as instalações do


43
   Ibid., p. 79-86.
44
   Ibid., p. 191-208.
45
   O governo brasileiro preocupava-se com imigrantes vindos dessa região da Europa, pois poderiam vir com
estes, o perigo da infiltração do esquerdismo bolchevista no país, além de que outros letos que estavam no
Estado de São Paulo que se negavam a trabalhar nas fazendas em época de colheita. (Ibid., p. 210)
46
   Ibid., p. 217.
47
   Ibid., p. 317-319.
48
   PEREIRA, op. cit., p. 244-245.
14




colégio para os trabalhos realizados pelo pastor Molochenco. Deste modo, em 1926, fundou a
Primeira Igreja Evangélica Batista Russa de São Paulo.
       Passados alguns meses outros colonos batistas que trabalhavam no interior foram a São
Paulo e integraram-se a essa nova comunidade. O objetivo de Molochenco era, assim como
os demais batistas que aqui se encontravam, propagar o evangelho, principalmente entre os
eslavos. Com sua visão missionária teve influência em trabalhos no interior de São Paulo e no
estado do Paraná. No entanto, para aqueles que optaram por permanecer no interior do estado,
os batistas letos que lá estavam criaram congregações para lhes fornecer “assistência
espiritual”. Uma das congregações foi dirigida pelo pastor leto Karlis Grigorowitsch, que
ficou como responsável pela celebração da Ceia do Senhor e ministrando batismos49.
       Os membros da Igreja Batista Leta entenderam que deveriam apresentar o evangelho a
todos os eslavos que chegavam ao interior do estado de São Paulo, pois os missionários
brasileiros não podiam fazê-lo pelo fato de não conseguir comunicar-se com estes imigrantes
do leste europeu. Os letos, por falarem e entenderem melhor as línguas eslavas, sobretudo o
russo, teriam maior facilidade em praticar o missionarismo dentre os eslavos, pois entendiam
melhor seu idioma. Enquanto isso os mais jovens já conseguiam falar o português, o que
proporcionou tanto o evangelismo de brasileiros, como dos imigrantes vindos de outras partes
da Europa50. Assim, na década de 1920, há dois segmentos de atuação batista entre os eslavos;
de um lado, o pastor Simeon Molochenco desenvolvendo evangelização com povos eslavos
em várias partes de São Paulo e Paraná e, por outro, os letos, atingindo desde eslavos até os
brasileiros no interior do estado de São Paulo51.


      Das três hipóteses levantadas para o surgimento dos batistas, a que melhor condiz com
a origem dessa denominação é a versão que trata dos separatistas ingleses do século XVII. A
“reforma puritana” praticada na Inglaterra desse período provocou transformações na política
e na religião, possíveis de distinguir através de documentos referentes não só ao o
aparecimento dos batistas, mas também de outros movimentos religiosos52. Os postulados da
Reforma Protestante, praticada no século XVI53, foram todos complementares a essa cisão dos
movimentos protestantes ingleses. Ao reforçarem os debates em torno da liberdade religiosa,


49
   Ibid., p. 244.
50
   RONIS, op. cit., p. 320.
51
   PEREIRA, op. cit., p. 244-245.
52
   AZEVEDO, Israel Belo de. A celebração do indivíduo: a formação do pensamento batista brasileiro. São
Paulo: Editora Unimpe, 1996. p. 75-76.
53
   A justificação pela fé, autoridade da bíblia e sacerdócio de todos os crentes. (Ibid., p.27)
15




os batistas criaram sua própria teoria política da separação entre Estado e Igreja54, criticando o
modo como viviam na Inglaterra elisabetana e posteriormente na América do Norte. Este
caráter político fez com que os grupos fossem perseguidos e empreendessem uma estratégia
de expansionismo da denominação por meio do missionarismo visando a uma “sobrevida em
outros locais”55.
        Ao contrário das comunidades anabatistas que, ao fugirem de perseguições religiosas,
buscavam viver em comunidades isoladas, os batistas se diferenciavam pelo fato de
empregarem uma “evangelização direta”, exigindo das pessoas que escutam a respeito de sua
fé, uma tomada de decisão a respeito de sua crença. Deste modo, o missionarismo é
empregado de forma individual por cada membro de uma comunidade                                      batista. Esta
característica, aliada à perseguição política empregada contra a denominação, fez as Igrejas se
unirem em torno de associações voluntárias visando ao envio de missionários a outros locais
para propagação de sua fé. Através destas associações as comunidades, independentes entre
si, começaram a trabalhar em conjunto e a desenvolver uma consciência propriamente
denominacional, desenvolvida posteriormente nos Estados Unidos56.
        Com o protestantismo de imigração, as comunidades batistas foram adentrando nos
Estados Unidos e na Europa. À medida que os imigrantes iam chegando, as igrejas foram
surgindo, sem começar de um centro específico, mas sim a partir de várias comunidades que
aos poucos foram crescendo57. A teologia expansionista de missão veio a se desenvolver nos
Estados Unidos, onde a partir da segunda metade do século XIX, as sociedades missionárias
ampliaram sua atuação e enviaram missionários para vários locais, entre eles o Brasil, com
intuito de propagar o evangelho pelo mundo e fornecer “salvação a outros indivíduos” 58.
        A existência de grupos religiosos denominados “eslavos” é muito intrigante, pois a
reunião dessas várias etnias, nada homogêneas entre si, não pode ser feita de forma simples.
As várias diferenças históricas, diversidades lingüísticas e suas distinções a respeito da
religião, mostram que os “eslavos” diferem-se muito culturalmente. Dentre todos esses
fatores, a marca religiosa acaba por separá-los ainda mais: os poloneses são católicos de rito
latino, os russos e parte dos ucranianos pertencem ao catolicismo ortodoxo e outra parte dos
ucranianos tornaram-se católicos uniatistas. Porém, ocorreu, na cidade de Curitiba, a
congregação de todas essas etnias heterogêneas, em um mesmo espaço religioso.


54
   Era pregada a liberdade de consciência, surgindo a idéia de “igrejas livres em sociedades livres.” (Ibid., p. 20)
55
   Ibid., p. 79.
56
   Ibid., p. 80.
57
   Ibid., p. 116.
58
   Ibid., p.151.
16




       Pode-se observar a existência de cerimônias, na capital paranaense, que fornecem
“assistência espiritual” a estes povos que é anterior ao início do desenvolvimento de suas
atividades. Nesse sentido, podemos observar que houve primeiramente a conversão a uma
outra religião, e o interesse destes em prosseguirem e organizarem-se em torno de uma
profissão de fé comum, não se enquadrando mais no catolicismo latino, o ortodoxo ou o
uniatismo. Com isto há a busca dos elementos que proporcionaram a congregação destas
diferentes etnias em um mesmo espaço, de forma a dialogarem e como conseguir ou não
abranger todas essas manifestações culturais tão divergentes. A maneira como se
comunicavam ainda é muito importante, pois foi através dela que se diferenciaram, mantendo
sua identidade perante os demais grupos. Ao cantarem e realizarem suas leituras bíblicas, os
russos, poloneses e ucranianos empregavam seu próprio idioma e não o português. Isto
proporcionou uma diversidade lingüística dentro da comunidade durante o período em que
estiveram reunidos.
      Os batistas “eslavos” se preocuparam em desenvolver uma forte atuação missionária.
Tiveram o propósito de levar o evangelho àqueles que não pertenciam à sua comunidade.
Nesse sentido, nota-se que não se afastaram do convívio com outras pessoas pertencentes a
sua etnia, mas buscaram a interação com elas através da propagação da sua fé, visando à
expansão não só de suas crenças, como também da denominação batista na cidade, já que se
preocupavam em alcançar aqueles que não eram brasileiros, e sim de sua mesma origem
(poloneses, russos e ucranianos). Com isto contribuíam para propagar o evangelho,
juntamente com as demais comunidades batistas. Para isso eram disponibilizados
investimentos, através da entrega de folhetos, de Bíblias e visitas a casas de pessoas “eslavas”
na cidade de Curitiba, objetivando fornecer-lhes “assistência espiritual” e também o convite a
ingressarem nas atividades de sua Igreja.
     Os objetivos principais de discussão entre todos os membros da comunidade era o bem–
estar que deveria haver através da comunhão de seus participantes, visando ao
desenvolvimento e ao progresso de sua Igreja, principalmente no que diz respeito a
evangelizar os “eslavos” que não pertenciam a sua comunidade de fé.
      O seio de uma comunidade batista fornece elementos, para que todos os que são
membros da igreja, possam se pronunciar, colocar propostas, votar, etc. A partir disto é
notável que em igrejas dessa denominação aconteçam discussões, várias reuniões para
decisões consensuais e exclusão de membros que não aderem ao propósito maior da
comunidade. Portanto, a partir do momento em que todos esses “eslavos” conseguem se
comunicar, desejando desenvolver e propagar suas crenças, adicionaram uma prática religiosa
17




comum, que proporcionou uma “democracia”59 entre todos os membros, o que fornece a
supressão de elementos antagônicos entre essas etnias.
          Isto proporcionou a coexistência e a relação desses “eslavos” em um mesmo espaço até
um dado momento. Porém a partir do falecimento de membros mais antigos e o afastamento
das tradições por parte das pessoas que continuaram na comunidade, mudaram-se as formas
de se fazerem os trabalhos, culminando em 1978 quando a Igreja passou a chamar-se Igreja
Evangélica Batista da Água Verde, e dedicar-se exclusivamente aos brasileiros.




59
     PORTER, op. cit., p. 27-31.
18




     2.1 Os “eslavos”: identificações e diferenças.


        Os “eslavos” podem ser inseridos em três designações: os orientais (russos, ucranianos
e bielorussos), os ocidentais (polacos, tchecos e lusácios60) e os meridionais (eslovenos,
croatas, sérvios, bósnios, montenegrinos, macedônios e búlgaros). Esses vários povos ocupam
grande parte da Europa do leste e sudeste, estendendo-se da parte setentrional do continente
asiático até o oceano Pacífico. Tendo como origem comum a Europa Central, estes grupos
distintos podem ser caracterizados por individualidades que marcam destinos diferentes entre
si. A partir da proximidade geográfica em que estão inseridos, é possível apontar para
relações, identificações e diferenças evidenciadas entre esses diversos grupos a partir do
século X61.
        Além de uma procedência geográfica comum, outro fator que os aproxima é uma
linguagem de fundo aparentado: os idiomas eslavos têm procedência indo-européia62. Embora
cada grupo tenha um dialeto próprio, a mesma origem morfológica permite a todas essas
línguas eslavas serem semelhantes entre si, o que lhes possibilita a comunicação oral na
própria língua “doméstica”. Entretanto, a grafia os divide: os eslavos de procedência ocidental
usam o alfabeto latino, enquanto os eslavos orientais e meridionais distinguem-se por sua
escrita cirílica. Diferentes também são algumas particularidades apresentadas pelos alfabetos,
uma vez que alguns contêm letras ou sinais que outras escritas não empregam. Por exemplo:
se de um lado russos e ucranianos utilizam-se da escrita cirílica, de outro, os ucranianos
apresentam letras e sinais que os russos desconhecem63.
        A influência do Ocidente pode ser observada principalmente entre os poloneses, que
aderiram ao catolicismo romano ainda no século X, quando Mieszko converteu-se ao
cristianismo e a Polônia aderiu ao novo rito, deixando suas práticas pagãs. Assim, o latim se
tornou a língua oficial da administração do reino64. Paralelamente, a influência oriental de
Bizâncio atingiu e doutrinou a região dos Balcãs e chegou até o reino de Kiev. Logo, toda a
área meridional e oriental da Europa, habitada pelos eslavos, converteu-se ao catolicismo sob
sua forma grega65. Mas notam-se especificidades religiosas dentro da ortodoxia que
movimentaram grupos distintos que buscaram novas formas de praticar sua religiosidade. Na

60
   Os lusácios eram um pequeno grupo eslavo, constituído por sérvios, que vivem em regiões da Alemanha,
como Brandemburgo e Saxônia. (PORTAL, Roger. Os eslavos, povos e nações. Rio de Janeiro: Editora
Cosmos, 1968. p. 9)
61
   Ibid., p. 9-11.
62
   Ibid., p. 11.
63
   Entrevista com Professora Dra. Oksana Boruszenko.
64
   Ibid., p.79-80.
19




Ucrânia, houve uma parte de fiéis que optaram por ligar-se à autoridade pontifícia romana,
estabelecendo acordos políticos com Roma. Porém, conservaram seu rito oriental e
organização interna, ficando conhecidos como Uniatas de rito greco-católico66. Outra cisão
aconteceu na Rússia do século XVII, quando o Sínodo de Moscou decretou a correção das
traduções da Bíblia e Livros Litúrgicos utilizados pela Igreja Russa, o que proporcionou a
revolta e conseqüente retirada daqueles que estavam decididos a dar continuidade em seus
ritos antigos. Intitularam-se como únicos membros da antiga e verdadeira Igreja Russa,
denominando-se “velhos crentes”67. O catolicismo e suas várias dissensões não foram as
únicas formas de religião entre os eslavos. A conquista otomana dos balcãs, no século XIV,
implantou a religião muçulmana entre alguns indivíduos dessa região, que se transformaram
em súditos turcos68.
       Por ser um território muito vasto, toda a região do leste europeu também recebeu
outras formas de culto durante e após o período da reforma protestante. Essas reformas
ocorreram na medida em que grupos religiosos buscavam por um lado locais onde pudessem
ter liberdade de praticar seus cultos, não sofrendo qualquer tipo de perseguição ou restrição a
sua fé, e por outro, terras para o desenvolvimento de sua agricultura. Ainda, vários soberanos
buscavam contingentes populacionais para preenchimento de territórios vazios, defesa de
fronteiras e subseqüente crescimento agrícola e econômico dessas regiões não habitadas. Em
conseqüência, é possível observar o estabelecimento de comunidades anabatistas no século
XVI e XVII que se refugiaram desde as regiões da Galícia, até áreas como Prússia Oriental e
Ocidental que então estavam sob o domínio da Polônia69. Esta que também fora fortemente
influenciada pelo movimento hussista70. Após um período de resistência de seus soberanos
católicos, a Polônia começa a abrigar ideais da reforma protestante, principalmente sobre a
forma luterana e calvinista. Ao autorizarem o culto em seu aspecto “reformado”,
possibilitando a igualdade de direitos e liberdade de consciência a adeptos de qualquer

65
   Ibid., p. 44-46.
66
   ANDREAZZA, Maria Luiza. Paraíso das Delícias. Estudo de um grupo imigrante Ucraniano 1895-1995.
Curitiba, 1996. p. 81.
67
   BALHANA, Altiva Pilatti & BORUSZENKO, Oksana. Alguns Problemas de Aculturação nos Campos
Gerais. REVISTA DO MUSEU PAULISTA - Nova Série - Volume XIV, São Paulo, 1963. p. 324-325.
68
   PORTAL, op. cit., p.13.
69
   MASKE, Wilson. Os menonitas e a Construção do Novo Reino. HISTÓRIA: QUESTÕES E DEBATES,
Curitiba, n. 28, 77-105 , 1998. p. 91-95.
70
   Movimento que teve como precursor John Huss, que no início do século XV revolta-se e aponta para os
abusos exercidos pelo clero no que diz respeito a venda de indulgências e os pesados impostos cobrados pela
Igreja numa época de dificuldades econômicas. Após fuga, Huss aceita comparecer ao Concílio de Constança
para defender suas idéias e é condenado a fogueira. Sua morte causa o aumento da agitação popular contra a
Igreja e os governantes. Os motins favorecem a tomada do poder pela burguesia das cidades e essas diversas
20




religião, a Polônia é acusada de asilo de heréticos. Os judeus também se favorecem dessa
situação pois o reino polonês conta com cerca de um milhão deles no reinado de Augusto
III71. Essas questões abrem a possibilidade de refúgio e imigração de perseguidos religiosos
na terra polaca72.
       Outra abertura para grupos religiosos adentrarem no leste europeu ocorreu em meados
do século XVIII, quando a rainha Catarina II, da Rússia, publica um édito que convida
alemães de diversas religiões para se estabelecerem nos territórios recém conquistados dos
turcos. Várias colônias de alemães católicos e luteranos são estabelecidas na região da
Ucrânia e no vale do Rio Volga. À proporção que restrições econômicas e religiosas
dificultam a vida na Prússia, grupos de menonitas são encorajados a emigrarem e aos poucos
se estabelecem entre a Prússia Ocidental e a Ucrânia e ao leste do rio Dnieper73. Ainda na
primeira metade do século XIX, grupos desse mesmo segmento religioso dão continuidade ao
estabelecimento de colônias no território russo.
       Nesse mesmo período, camponeses letos teriam deixado a condição de submissão em
que se encontravam em latifúndios alemães e dirigiam-se para a região de Novgorod, na
Rússia, para cultivarem terras próprias. Os batistas letos já haviam se instalado nos estados
Bálticos no início do século e, agora, se dirigiam para terras russas visando melhores
condições econômicas. Em fins do século XIX e início do século XX é possível identificar
três igrejas batistas estabelecidas na capital do império Russo e uma na cidade de São
Petersburgo, que foram estabelecidas por grupos alemães que chegaram anteriormente74.
Neste mesmo momento também se observa o surgimento desta denominação na Ucrânia pela
região leste do país, Dnipropetrovsk, Kharkiv, Odessa, Sebastopol, e sobretudo na Península
da Criméia – Ialta, e na Rússia, de Saratov até Novosibirsk e Krasnoiarsk. Na Polônia havia
comunidades batistas estabelecidas em Gdynia, Gdansk e Thorn75. No entanto, a falta de
acesso a uma bibliografia mais especializada impede a melhor identificação da procedência
desses grupos e melhor precisão nestas informações. Ao que tudo indica, a disponibilidade de
terras nessas regiões do leste europeu, adicionado a dificuldades na vida material e religiosa,

rebeliões duram ao longo de dez anos. Após negociações para manter os privilégios conquistados, o novo
imperador Sigismundo termina com o conflito. (PORTAL, op. cit., p. 95-100)
71
   Gozando dessa liberdade que não há em outros estados, os judeus conseguem estabelecer uma organização
autônoma que possui escolas, bairros e justiça própria para cuidarem de seus próprios assuntos. Porém ainda
situam-se as margens da sociedade e são constantemente desprezados pela população e explorados pela nobreza.
(Ibid., p. 236-237)
72
   Ibid., p. 218.
73
   MASKE, op. cit., p. 98.
74
   RONIS, Osvaldo. Uma Epopéia da Fé: História dos Batistas Letos no Brasil. Casa Publicadora Batista. Rio de
Janeiro, 1974. p. 84-85.
75
   Entrevista com Professora Dra. Oksana Boruszenko.
21




assim como os casos dos grupos menonitas, proporcionaram que estes grupos batistas
emigrassem em busca de melhores condições de vida. Na medida em que suas comunidades
se fixaram, alguns indivíduos buscaram oportunidades de trabalho nos grandes centros
urbanos, estabeleceram igrejas e começaram a propagação de sua fé76.
        Todos esses fatores auxiliaram para que houvesse um contingente significativo de
pessoas que professavam “outra” fé, mas evidentemente ainda muito menor do que as
religiões oficiais, o que aumentou a efervescência de questões religiosas, políticas e
econômicas dentro de cada estado. O fato do catolicismo latino e ortodoxo, já separados e em
disputas entre si, não ser a única religião provoca o mal-estar entre o alto clero dessas igrejas,
como também causa o desconforto daquelas minorias religiosas77. A Igreja ortodoxa, em fins
do século XIX, já não dispõe do mesmo poder que antes. O reduzido número de igrejas e
mosteiros num vasto território, que se estende do leste europeu ao interior do continente
asiático, não atende a grande quantidade de ortodoxos existentes. Isso favorece que regiões
distantes dos grandes centros urbanos, onde se concentra grande parte das organizações
religiosas, tenham contatos com superstições e práticas pagãs. Deste modo, a ortodoxia é um
rótulo empregado pela Igreja, em que a influência e poder do clero pode ser relativizado78.
Esta situação adversa faz com que, a partir do século XX, haja uma diminuição expressiva da
prática religiosa naquelas regiões. Sob advento do comunismo ateu há a redução do clero a
proporções ínfimas, o fechamento de igrejas, mosteiros e seminários, o que contribui para
enorme decadência religiosa entre toda população dentro da União Soviética79. Na região da
Polônia, acontece o mesmo, pois alguns indivíduos das camadas populares começam a ver o
clero como figura relacionada às classes senhoriais que os exploram. Isso favorece para que o
poder da Igreja enfraqueça, pois agora os padres têm dificuldades em infiltrar idéias de
submissão aos grupos mais pobres da população80.
        As divergências entre os eslavos não ficam somente em torno da religião. Durante
muito tempo russos, poloneses e ucranianos são protagonistas de vários embates políticos,
econômicos e sociais na região do leste europeu. Constantemente surgem desavenças entre os
estados e seus componentes. Russos e polacos tem várias dissensões a respeito de territórios e
disputas para reinar ou influenciar outros grupos de eslavos e povos alógenos. Desde o século
XIV os estados Bálticos, sobretudo a região da Lituânia, é dividida entre esses dominadores.

76
   RONIS, op. cit., p.85.
77
   PORTAL, op. cit., p. 230-232.
78
   Ibid., p. 299-301.
79
   Ibid., p. 426-427.
22




Ora são governados pelos poloneses e existe uma forte pressão da religião ortodoxa sobre sua
população. Ora são governados por russos e há uma “reconquista” por parte do catolicismo de
rito latino81. Durante o século XVII, a guerra polaco-russa novamente mexeu com os aspectos
geográficos dos estados. Soberanos do Estado Polaco-lituano propuseram uma aliança com o
reino de Moscovo, que uniria os tronos e faria com que ambos os reinos futuramente se
unissem em torno de apenas uma coroa. Essa proposta tinha como objetivo uma política
externa e militar de paz e também traria vantagens nas questões de direitos religiosos e
propriedade da terra. Como a proposta não foi aceita a guerra irrompeu. As conseqüências
foram as mudanças de fronteiras, uma delas com parte do território da Ucrânia sob
protetorado dos russos, e sucessivos conflitos entre as duas coroas82.
       O final do século XVIII trouxe a partilha do território polonês entre os estados da
Prússia, Áustria e Rússia. Os ressentimentos causados por esta situação, estão aliados a uma
crescente desconfiança do polonês para com o estrangeiro que tem interesses econômicos em
seu território e que retira suas condições de participar da vida política de seu país e melhorar
suas condições83. Ao mesmo tempo, inicia-se uma mobilização por parte de ucranianos, que
estiveram durante muito tempo sob o jugo polaco, e esporadicamente conseguem se
desvencilhar da opressão polonesa84.
       A partir do século XIX, sobretudo com o reinado de Alexandre I, enfatiza-se a idéia da
Rússia como “polícia da Europa”, atuante ao longo de todo o leste europeu85. Grande parte do
exército russo se ocupava em regiões fora de suas fronteiras, principalmente na Polônia e
Finlândia, onde eram responsáveis pela manutenção da ordem e evitar sublevações desses
povos86. Aspirações a uma independência por parte de poloneses frente ao governo russo,
fizeram os conflitos e a repressão aumentarem durante todo o século XIX, de modo a acentuar
as rivalidades entre esses povos. Nesse mesmo sentido é plausível a união de populações
pobres constituídas de      ucranianos e polacos contra as forças do czar que lhes tiram a
               87
independência .
       A Ucrânia, nesse período, cujo progresso econômico se expande em larga escala,
também está dividida entre estrangeiros: os reinos da Áustria e da Rússia. A vasta região que

80
   WACHOWICZ, Ruy Christovam. O camponês no Brasil. Curitiba: Fundação Cultural, Casa Romário
Martins, 1981. p. 55-56.
81
   Ibid., p. 62-65.
82
   Ibid., p. 152.
83
   WACHOWICZ, op. cit., p. 10-11.
84
   PORTAL, op. cit., p. 14.
85
   KENNEDY, Paul. Ascensão e queda das grandes potências: Transformação econômica e conflito militar de
1500 a 2000. Rio de Janeiro: Campus, 1989. p. 168.
86
   Ibid., p. 170.
23




abriga o território ucraniano ainda sofre uma forte mistura de populações eslavas, pois grande
parte de trabalhadores é recrutada fora de seu território88. Todos esses fatores contribuem para
um acirramento de ânimos por parte dos grupos locais que necessitam se submeter a
estrangeiros em diversos segmentos da sua vida política e econômica, conseguindo apenas
manter intacto alguns de seus costumes culturais e sua língua. Ou seja, desde o início do
século XIX tanto poloneses como ucranianos são contrários as forças de assimilação e
russificação do czarismo.
       Todas estas características conflituosas entre estes eslavos se farão muito presentes ao
longo do século XX. Ainda no início desse período, o exército do czar estava ocupando
regiões ao longo do leste europeu e sufocando minorias étnicas polonesas, ucranianas,
finlandesas, georgianas, lituanas, estonianas, armênias etc., que buscavam preservar as
hesitantes concessões sobre a “russificação” obtidas na fase de debilidade do regime czarista,
resultante da guerra Russo-Japonesa e das insurreições promovidas nos anos de 1905-190689.
Após a Primeira Guerra também houve várias modificações territoriais que deixaram vários
grupos étnicos fora das fronteiras de seus estados de origem, causando vários conflitos
internos e ressentimentos externos90. A situação se agravou quando, depois do término da
Segunda Guerra, as fronteiras soviéticas ampliaram-se às custas dos territórios dos estados
Bálticos, da Polônia, Ucrânia, entre outros91. Os líderes da U.R.S.S. ainda seriam acusados, ao
longo da década de 1960 e 1970, de muitos crimes cometidos contra as identidades nacionais
desses povos. Grandes intelectuais, que representavam idéias de liberdade em prol dos
costumes de seus países, teriam sido presos, torturados e até mortos pelo regime soviético.
Núcleos que abrangiam a cultura e a história dessas repúblicas, como museus e bibliotecas,
teriam sido saqueados, queimados, destruídos, total ou parcialmente92.
       Todos esses episódios marcam uma trajetória de conflitos existentes entre esses
diferentes grupos étnicos. Os eslavos têm mais diferenças do que semelhanças e uma história
separada modelaram tradições, gêneros de vida e uma mentalidade que os caracteriza de
forma muito distinta93.




87
   PORTAL, op. cit., p. 357.
88
   Ibid., p. 274-277.
89
   KENNEDY, op. cit., p. 231.
90
   Ibid., p. 280.
91
   Ibid., p. 346.
92
   HANEIKO, Valdemiro Pe. Em defesa de uma cultura. Rio de Janeiro: Cobrag, 1974.
93
   PORTAL, op. cit., p. 21.
24




2.2 Imigrações eslavas para o Brasil.


       As políticas imigratórias no Brasil remontam a inícios do século XIX. O governo
brasileiro, nesse período, buscava a introdução de imigrantes no país como uma forma
propícia para mudança de vários parâmetros nacionais. As idéias de “branqueamento” da
população tomam forma quando, ainda na época de colônia, o país sofreu com sucessivos
levantes de escravos. O perigo representado pelo negro toma conta das elites nacionais e uma
ideologia racista é combinada com idéias da construção de um novo país, onde acreditava-se,
que a raça branca, introduzida através da imigração, traria progresso94. Parte das terras
destinadas aos imigrantes foi designada como “devoluta”. Tais áreas eram de procedência
indígena ou localizações estratégicas das fronteiras nacionais. Logo os colonos estrangeiros
têm a posse de territórios que devem ser não só cultivados para o desenvolvimento econômico
da região, como também para defesa desta contra eventuais ataques estrangeiros e indígenas.
Assim, a questão imigratória também foi motivada pela segurança nacional, pois lugares
desprovidos de populações são habitados e protegidos pelo estabelecimento de colônias de
imigrantes95. Estes elementos também foram utilizados pelo governo brasileiro para
proporcionar a valorização dessas terras. O trabalho do colono valorizou não só o local em
que a colônia estava situada, mas de igual modo toda a área vizinha. De modo geral, os
núcleos coloniais estavam situados em locais de difícil acesso. Isto fez com que o estrangeiro
se ocupasse em abrir e conservar estradas, criando melhores condições para toda a região e
conseqüentemente aumentando o valor das terras desses locais. Por outro lado, muitas dessas
colônias não conseguiram se desenvolver justamente em função das dificuldades de acesso a
esses locais. Além de todas estas questões, destaca-se a mão-de-obra barata que se buscava
atrair como força de trabalho para as regiões latifundiárias96. Na medida em que a crise do
sistema escravocrata aumenta ao longo do século, o imigrante é visto como saída para suprir o
trabalho do negro de outrora97.




94
   DREHER, Martin N. Protestantismo de imigração no Brasil: Sua implantação no contexto do projeto
liberal-modernizador e as conseqüências desse projeto. IN: DREHER, Martin N. Imigrações e história da
Igreja no Brasil. Aparecida SP: Editora Santuário, 1993. p. 112-113.
95
   Ibid. , p. 114-115.
96
   Ibid. , p. 116-117.
97
   BEOZZO, José Oscar. As igrejas e a imigração. IN: DREHER, Martin N. Imigrações e história da Igreja
no Brasil. Aparecida SP: Editora Santuário, 1993. p. 9-11.
25




       O fator “migração” pode ocorrer quando há a necessidade de preencher um “espaço
vazio”98. A busca por este espaço pode ser por motivações políticas, econômicas, sociais ou
religiosas. Geralmente o emigrante busca melhorar suas condições de vida em outro local,
pois a sua própria foi desestruturada por algum desses motivos ou a soma deles99. O século
XIX é formado por um quadro em que há várias transformações, sobretudo na economia em
escala internacional. A revolução industrial e suas conseqüências modificaram a divisão do
trabalho entre as nações. Novas tecnologias, mudanças nos padrões de comercialização de
produtos e principalmente a incorporação de novas terras para plantio, provocaram o colapso
nas zonas rurais da Europa. Milhões de pessoas são colocadas às margens desse sistema. Na
medida em que não conseguem incorporar-se ao novo sistema industrial e agrícola agora
existentes, acabam emigrando para mudarem suas condições100.
       As camadas populares do leste europeu, viviam em condições de submissão local e
tinham ainda relações com a aristocracia que lembravam o feudalismo. Desprovidos de
condições políticas e econômicas favoráveis, no camponês o anseio de ser senhor de si
mesmo, uma das formas de mobilidade social encontrada era a emigração101. As tensões
sociais encontradas nessa região da Europa impulsionam grupos de eslavos a emigrarem,
sobretudo os poloneses e ucranianos, responsáveis pela formação de várias colônias no sul do
Brasil e principalmente no território paranaense.
       Na Europa, os ucranianos foram desprovidos da posse de terras destinadas a sua
sobrevivência, como também foram impedidos de ter acesso a terras comunais102. Apesar de
reformas feitas pela coroa austríaca visando a limitar o poder da aristocracia e favorecer os
camponeses, estes continuaram a serem forçados a trabalhar mais em períodos anteriores a
colheita e preparo do feno. As mudanças feitas pelo governo pouco ajudaram para uma maior
mudança na relação entre as camadas populares e seus nobres, o que gerou um clima de
tensão ao longo do século XIX103.
      A situação dos poloneses também era de dificuldade. Foram atingidos por uma reforma
agrária que diminuiu o tamanho de suas terras, o que dificultou sua condição de vida. Agora,
além de trabalhar em sua propriedade, o camponês teve que procurar trabalhos alternativos
fora de suas posses para complementar seu sustento. Adicionado a esta situação está a grave

98
   MENDONÇA, Antonio Gouvêa. Protestantes na diáspora: A imigração européia enorte-americana e as
igrejas evangélicas no Estado de São Paulo. IN: DREHER, Martin N. Imigrações e história da Igreja no
Brasil. Aparecida SP: Editora Santuário, 1993. p. 138.
99
   Ibid. , p. 138-139.
100
    BEOZZO, op. cit., p. 14-16.
101
    ANDREAZZA, op.cit., p. 14-16.
102
    Florestas e campos de pasto que eram utilizados coletivamente pelas aldeias. (Ibid., p. 20)
26




crise econômica procedente de fenômenos climáticos, que prejudicaram as colheitas, e da
Guerra da Criméia104, que trouxe transtornos com relação à alta do preço e falta de alimentos,
pois estes que eram dirigidos para abastecimento do exército russo. A subalimentação da
população polaca, causada por esses fatores, trouxeram epidemias de cólera, tifo e disenteria
105
      .
          Todas essas situações vividas no leste europeu, principalmente por poloneses e
ucranianos, foram fatores de emigração. E, nesse cenário, o Novo Mundo se destaca no
imaginário destes povos como “Terra Prometida”106, onde a idéia principal de “fazer” a
América surge como um sonho que pode se tornar real. O Brasil aparece, ao lado dos Estados
Unidos e da Argentina, como país que mais recebeu imigrantes107. Em fins do século XIX,
estes dois países da América do Sul chegaram a receber em média 200 mil imigrantes por ano,
provindos de várias partes do mundo108. No caso brasileiro o impulso para que essas massas
de imigrantes viessem ocorreu por alguns fatores: a terra em abundância destinada aos
colonos e, a partir da década de 1890, o transporte marítimo gratuito oferecido pelo
governo109. Deste modo a chegada de poloneses e ucranianos no Brasil ocorre a partir de
meados do século XIX, aumentando em fins desse período. O século XX igualmente traz
levas desses imigrantes, porém em muito menor escala.
          A emigração de russos para o Brasil já acontece de outra maneira. Esses praticaram a
emigração de forma individualizada ou em pequenos grupos e sempre misturados com outros
grupos de eslavos110. Isto ocorre pelo fato de que, desde meados do século XIX, os elementos
cujo governo russo reprime e persegue são destinados a povoar a região da Sibéria. Este
território pode ser visto, sobretudo em fins desse período, com uma vasta rede ferroviária que



103
    ANDREAZZA, op.cit., p. 18-20.
104
    Um conflito militar que aconteceu em meados da década de 1850, envolvendo a Rússia, a França, o reino de
Piemonte-Sardenha, o império Turco-Otamano e o Reino Unido. A guerra tinha como intuito refrear a expansão
russa sobre a região dos Bálcãs. (KENNEDY, op. cit., p. 168-175)
105
    WACHOWICZ, op. cit., p. 36.
106
    ANDREAZZA, op.cit., p. 14.
107
    SCARANO, Julita.O Imigrante nas terras do café. IN: DREHER, Martin N. Imigrações e história da
Igreja no Brasil. Aparecida SP: Editora Santuário, 1993. p. 160.
108
    HOBSBAWN, Eric. A era dos impérios: 1875-1914. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1988. p. 58.
109
    WACHOWICZ, op. cit., p. 40.
110
    Havia uma única imigração oficial de russos para o Brasil. Os chamados “russos brancos”, denominados
como “velhos crentes”, eram provenientes de um cisma da Igreja Ortodoxa na Rússia, que foram perseguidos por
fatores religiosos e fixaram-se na Sibéria. Após vivenciarem conflitos pelas revoluções bolchevistas, foram
obrigados a emigrar e refugiaram-se em províncias da China. Depois de trinta anos estabelecidos ali, se sentem
novamente ameaçados pelo advento do comunismo e, em 1953, recorrem às Nações Unidas solicitando ajuda
para emigrarem para países livres, onde pudessem dar continuidade a suas tradições. Em 1958 chegam às
primeiras famílias de “russos brancos”, como ficaram conhecidos, ao Brasil e instalam-se na região dos Campos
Gerais, no Paraná. (BALHANA & BORUSZENKO, op. cit., p. 324-326.)
27




liga o extremo leste do continente asiático à capital russa111. Além do crescimento econômico,
a Sibéria também se torna uma área povoada e rapidamente é vista como o segundo celeiro do
império, ficando atrás apenas da Ucrânia112. Esse fator indica as razões da escassez de grandes
grupos emigrantes russos. Todos os revoltosos e contrários às políticas do governo são
enviados à Sibéria como forma de punição. Há várias dificuldades para conseguir sair pelas
fronteiras do império czarista e mais tarde da União Soviética.
       No início do século XX a emigração do leste da Europa ainda é intensa, sobretudo de
ucranianos113. Porém, após o início da Primeira Guerra Mundial e da Revolução Russa o
número de pessoas que deixam a região se torna muito menor. A evasão era ainda mais difícil
e a região siberiana continua a receber cada vez mais levas de grupos eslavos e povos
alógenos provindos de dentro da fronteira das Repúblicas Soviéticas114. No período entre
guerras desenvolve-se a imigração no Brasil dos primeiros batistas eslavos. Partem da Ucrânia
50 famílias, não só ucranianos, mas também batistas russos e letos, que aproveitaram a
ocasião para emigrarem juntos, e chegam ao Brasil no ano de 1926115. Este grupo específico
foge do comunismo e das dificuldades vividas nesse momento de turbulência européia. Foram
indivíduos dessa imigração particular que iniciaram os trabalhos de propagação do Evangelho
na cidade de Curitiba. Ainda no período entre guerras, também chegam pequenos grupos de
eslavos que emigraram para o Brasil. Graças a esse pequeno contingente de pessoas chegadas
à capital paranaense, aliado aos trabalhos missionários da Primeira Igreja Batista Russa de
São Paulo, foi formada, na década de 1930, na cidade de Curitiba, a Congregação Batista
Eslava.
       O movimento migratório de eslavos torna a crescer após o término da Segunda Guerra
Mundial. Aqueles que chegam à América provem de regiões que estão fora dos domínios
soviéticos e requereram às Nações Unidas o seu desejo de emigrar para locais que não fosse
seu país de origem, fugindo assim do comunismo. Deste modo todos os eslavos, sobretudo
russos, que se encontram fora do domínio das Repúblicas Soviéticas conseguem estabelecer-
se em novos territórios. Em Curitiba, podemos observar a chegada de grupos constituídos por
esses povos no ano de 1949116. Em virtude dessa imigração a Congregação Batista Eslava
aumentará seus trabalhos missionários na capital paranaense e no ano de 1955, já com mais
membros, organizar-se-á na Primeira Igreja Evangélica Batista Eslava de Curitiba.

111
    PORTAL, op. cit., p. 274.
112
    Ibid. , p. 274.
113
    ANDREAZZA, op.cit., p. 92.
114
    Entrevista com Professora Dra. Oksana Boruszenko.
115
    PEREIRA, José Reis. História dos Batistas no Brasil. Rio de Janeiro: JUERP; 2001. p. 244-245.
28




3.1 Primeira Igreja Batista Eslava de Curitiba – motivações étnicas?


          No início da década de 1930, a Primeira Igreja Evangélica Batista Russa de São Paulo
iniciou um trabalho missionário na cidade de Curitiba. Ao enviar alguns pastores e
evangelistas à capital paranaense, visava à pregação do evangelho a todas as pessoas de
“etnia eslava”. Identificadas algumas famílias que se dispunham a ouvir a mensagem trazida
pelos evangelistas, eles começaram a realizar cultos nas casas destas pessoas, distribuindo
Bíblias e outras literaturas com intuito de proclamar a “salvação em Cristo”. Deste modo,
conseguiram desenvolver seu trabalho de evangelização, pois as famílias se identificavam
pela forma como eram tratadas: comunicavam-se com o pastor e outros missionários em seu
próprio idioma. Como os idiomas eslavos são parecidos entre si, houve a possibilidade desses
eslavos dialogarem utilizando tanto a língua russa, como o ucraniano e o polonês. Conforme o
trabalho foi progredindo, a empatia entre eles aumentou, e já nos primeiros anos da década de
1930 alguns foram aceitando a mensagem que lhes era pregada. Na medida em que foram se
convertendo, russos, ucranianos e poloneses foram batizados e arrolados como membros da
Primeira Igreja Batista de Curitiba, a única Igreja Batista, até então, na cidade.
          Embora freqüentassem os cultos desta Igreja, alguns destes eslavos tinham certa
dificuldade de entenderem o português, o que comprometia o melhor aprendizado das
mensagens transmitidas pelos brasileiros. Assim, apesar de serem batizados na Primeira
Igreja, continuaram a realizar seus cultos em suas próprias residências, com o objetivo de
aprenderem os ensinamentos bíblicos em russo, ucraniano e polonês, conservando portanto
seus idiomas. Já que empregavam essas línguas em suas atividades religiosas, passaram a
convidar os familiares, vizinhos e conhecidos que ainda não haviam aderido ao evangelho
para também ouvirem a mensagem. Como esses eslavos em sua maioria eram católicos de rito
latino ou ortodoxo, tinham receio de serem excomungados pelo seu comportamento, seja pela
sua nova devoção, seja por freqüentarem outra igreja117. Ao serem convidados para irem à
residência de um parente, vizinho ou amigo, não precisando ir até a Primeira Igreja Batista de
Curitiba, sentiam-se mais à vontade em comparecer apenas nos locais onde as reuniões eram
realizadas. As mensagens trazidas em uma língua que todos os eslavos presentes pudessem
melhor compreender atraíram vários visitantes, de forma que sempre havia a presença de
pessoas “crentes e não crentes” para participar dos trabalhos. Logo alguns destes visitantes
que freqüentavam os cultos também se converteram. Alguns se batizaram na Primeira Igreja

116
      Entrevista com Professora Dra. Oksana Boruszenko.
117
      Entrevista 1.
29




Batista de Curitiba e se tornaram membros desta Igreja. Como o número de russos, poloneses
e ucranianos “convertidos” aumentou, em 1934 organizaram a Congregação Eslava de
Curitiba, com intuito de continuarem a se reunir e propagar ainda mais o evangelho entre
estas etnias. Nessa mesma ocasião, alguns indivíduos foram batizados pelo pastor Simeon
Molochenco na Primeira Igreja Batista de Curitiba. Porém, estes recém batizados foram
inclusos no rol de membros da Igreja Russa em São Paulo, que implantou a nova congregação
e era a responsável por fornecer “assistência espiritual” e material a seus novos membros na
capital paranaense. Periodicamente missionários vinham de São Paulo para celebrar batismos
e a Santa Ceia para esses batistas.
       Os “batistas eslavos” prosseguiram se reunindo nas casas dos membros da recém
formada Congregação, porém as residências não comportavam todos os indivíduos
pertencentes ao grupo, de forma que essas reuniões começaram a ser feitas apenas durante a
semana. Tendo em vista o aumento do número de pessoas que assistiam às reuniões, houve a
necessidade de congregar em um local maior, para melhor acomodação das pessoas que
desejavam participar dos trabalhos eclesiásticos realizados. A Primeira Igreja Batista de
Curitiba disponibilizou suas dependências para que estes “batistas eslavos” pudessem
desenvolver suas atividades religiosas aos domingos à tarde. Aqueles eslavos que haviam sido
batizados antes da organização da Congregação Eslava de Curitiba e estavam integrados à
membresia da Primeira Igreja Batista de Curitiba, foram transferindo-se para o rol de
membros da Primeira Igreja Evangélica Batista Russa de São Paulo, que era a comunidade
responsável pela congregação eslava. Com o passar dos anos, estas pessoas desligaram-se aos
poucos dos trabalhos juntos aos brasileiros, dando prioridade aos cultos que eram dirigidos,
nas residências e aos domingos à tarde, em língua russa, polonesa e ucraniana. Deste modo,
estas etnias criaram um espaço à parte dos brasileiros, fornecendo “assistência espiritual” e
dirigindo seus serviços religiosos em idiomas próprios.
       Essa manifestação de uma “consciência de separação e de formas de interação”118 entre
os “batistas eslavos” e os “batistas brasileiros” foi desenvolvido dentro da Primeira Igreja
Batista de Curitiba, na medida em que os primeiros se converteram a essa religião e iniciaram
a convivência com os brasileiros. Como não conseguiram integrar-se completamente aos
trabalhos dessa comunidade, pois não se sentiram à vontade com o idioma que era




118
   POUTIGNAT, Philippe & STREIFF-FENART, Jocelyne. Teorias da Etnicidade; seguido de Grupos
Étnicos e suas Fronteiras, de Fredrik Barth. São Paulo: Fundação Editora da UNESP, 1998.p. 124.
30




empregado, ficaram à parte dos demais membros da Igreja e em grupo separado119, realizavam
cultos próprios.
        Por outro lado, os membros da Primeira Igreja, ao notarem que estas pessoas não
compreendiam perfeitamente o português e que formavam um grupo próprio, os
denominavam “irmãos ukrainos”120. Essa atribuição englobava todos os eslavos e se dá pelo
fato de que a Congregação Eslava de Curitiba estava sendo representada por alguns membros
que eram ucranianos, e seriam as responsáveis por tratar e intermediar, com o pastor da
Primeira Igreja, com as assembléias de membros dessa comunidade e a sua “igreja mãe” em
São Paulo, todas as questões que diziam respeito aos trabalhos eclesiásticos da Congregação.
Assim, os brasileiros identificaram os “batistas eslavos” como um grupo que estava separado,
por um idioma e uma cultura diferente da sua, o que possibilitou a criação de grupos que
conviviam num mesmo espaço e que se diferenciavam uns dos outros.
        “A formação de grupos étnicos ocorre quando se dá uma atribuição categorial que
classifica as pessoas em função de sua suposta origem e que se acha validada na interação
social pela ativação de signos culturais socialmente diferenciadores”121. Os eslavos
identificaram-se e foram identificados pelos brasileiros na base de uma dicotomia Nós/ Eles,
estabelecidas a partir de traços culturais que se supõem derivados de uma origem comum122.
Uma das formas pela qual houve identificação entre estes eslavos foi a proximidade de seus
idiomas, havendo melhor compreensão entre as línguas russa, ucraniana e polonesa do que
com o português. Por não falarem corretamente e não entenderem por completo a língua
portuguesa e usarem outros idiomas que os brasileiros não entendiam, foram tratados como
estrangeiros e denominados como “ukrainos”. Deste modo os membros do grupo eslavo
iniciaram uma demarcação de uma fronteira étnica através da língua123. Mas, nesse primeiro
momento, não foi apenas esse fator que os diferenciou dos brasileiros124. Todos estes russos,
ucranianos e poloneses eram recém-convertidos e ainda não tinham amplo conhecimento de
todas as doutrinas batistas, sendo necessário “mais tempo na fé” para que fossem doutrinados
e conhecessem melhor os mandamentos da denominação.



119
    Ibid., p. 123.
120
    Ata da Primeira Igreja Batista de Curitiba, Livro 4, p. 13.
121
    POUTIGNAT, Philippe & STREIFF-FENART, Jocelyne, op. cit., 141.
122
    Ibid., p. 141.
123
    Ibid., p. 51.
124
    Nas análises discutidas por POUTIGNAT e STREIFF-FENART, tanto a língua, como território, ou outros
atributos em comum, não podem ser fatores únicos pelos quais um grupo étnico forma fronteiras para distinguir-
se dos demais grupos que estão ao seu redor. Estes elementos apenas representam atributos étnicos quando
utilizados “como marcadores de pertença por aqueles que reivindicam uma origem comum”. (Ibid., p. 163)
31




        Além desses fatores que ocorreram dentro da Primeira Igreja Batista de Curitiba, é
significativo que alguns eslavos, ao migrarem para o Brasil, vieram em condições muito
semelhantes. Todos os eslavos que se “converteram ao evangelho” em Curitiba saíram de seu
lugar de origem por receio de eventuais conflitos que estariam por vir sobre toda Europa125.
Algumas dessas pessoas conheceram-se na viagem ao Brasil e estabeleceram relações de
amizade ao longo da travessia do Atlântico126. Outros, no momento em que se estabeleceram
na capital paranaense, ao exercerem uma mesma atividade econômica, ou habitarem próximos
uns aos outros, acabaram criando relações entre si127. Quando esses indivíduos deixaram de
viver nos locais com que estavam habituados e se acharam diretamente confrontados com
uma outra sociedade, suas especificidades culturais tornaram-se fontes de uma mobilização
coletiva, o que desenvolveu uma “etnicidade simbólica” entre eles128. Deste modo, através da
imigração, essas pessoas forjaram uma origem em comum e por conta das dificuldades que
encontraram em Curitiba, foram inclusas num grupo étnico que estava separado da sociedade
brasileira129.
        No início da década de 1930, estes eslavos, já estabelecidos na capital paranaense,
tiveram mais um ponto em comum com o qual puderam criar suas identificações. Ao serem
alvo do missionarismo batista, sentiram–se bem acolhidos130 por ele e com o tempo mudaram
suas convicções religiosas. Tendo “assistência espiritual” através de cultos, Bíblias e folhetos
evangelísticos, em um idioma no qual entendiam a mensagem pregada, aos poucos alguns

125
    Todos os entrevistados relatam que o fator principal de seus pais e/ ou avós emigrarem foi um grande rumor
gerado por ocasião de conflitos militares que iniciariam em toda a Europa, sobretudo no leste europeu onde se
encontravam. Como houve possibilidade de virem para o Brasil, alguns chegaram com suas famílias, ou grupo
de amigos e outros vieram sozinhos.
126
    É o caso de duas famílias com o mesmo sobrenome Ghenov e que não tinham nenhum tipo de parentesco. Por
terem o mesmo sobrenome, conheceram-se no navio que trouxe imigrantes do leste europeu ao Brasil. Uma
família estabeleceu-se em Curitiba e a outra no interior do estado de São Paulo, para cultivar as lavouras de café.
Depois que os filhos cresceram, a família que estava no interior de São Paulo veio encontrar os que estavam em
Curitiba para casar um dos filhos. Apesar de não habitarem nos mesmos locais, ambas as famílias haviam “se
convertido ao evangelho” e eram frutos do missionarismo batista empregado entre os eslavos do interior de São
Paulo e Curitiba. Esses fatores fizeram com que houvesse uma identificação entre essas pessoas, partilhando uma
mesma experiência imigratória, um nome e uma “fé” em comum. (Entrevista 5)
127
    Muitos desses imigrantes trabalhavam na abertura de estradas e ficavam longe de suas casas e famílias. Ao
trabalharem um grande período de tempo juntos, acabavam se conhecendo e se comunicando num idioma
próximo ao seu, constituindo relações de proximidade. Da mesma forma outros, ao residirem em um mesmo
bairro, identificavam-se como imigrantes e criavam afinidades. Um exemplo ressaltado a partir dessas
condições, são os casamentos realizados entre esses imigrantes. Na década de 1930, todos os entrevistados
apontam que seus pais casavam-se com indivíduos que também vieram do leste europeu. (Entrevista 1)
128
    POUTIGNAT, Philippe & STREIFF-FENART, Jocelyne, op. cit., p. 78.
129
    Ibid., p. 71-72.
130
    Os depoentes indicam que os eslavos criaram uma empatia com os missionários, pelo fato de que conseguiam
comunicar-se num idioma comum ou muito próximo do seu. Sempre que isso acontecia ficavam contentes por
terem uma pessoa com a qual pudessem conversar. Isso teria facilitado a abertura de suas residências para que as
pessoas tivessem interesse e pudessem ouvir a mensagem que lhes era transmitida. Além disso, há o caso de um
32




indivíduos aderiram a uma nova forma de crença. Essa mudança de religião proporcionou o
reforço de uma solidariedade étnica no meio destes eslavos131. Através dos cultos empregados
nas residências de algumas famílias, logo tiveram o interesse de propagar o evangelho aos
outros imigrantes de “sua mesma origem”. Eis o fator pelo qual foi possível a fundação da
Congregação Eslava de Curitiba e o conseqüente crescimento do grupo.
       Os membros da Primeira Igreja Batista de Curitiba, ao entrarem em contato com
pessoas que tinham costumes e tradições distantes dos seus, não se preocuparam em
identificar russos, poloneses e ucranianos no âmbito dos “irmãos ukrainos”. Com efeito, ao
perceberem que os recém chegados à comunidade tinham traços culturais diferentes dos seus,
sobretudo o idioma, rotularam-nos por meio de uma identificação que abrangesse a todos de
uma forma simples, ignorando suas especificidades nacionais, culturais e lingüísticas132. Para
dar conta do que os unia, os novos convertidos que entraram na Primeira Igreja Batista
designaram-se como “eslavos”. Esta indicação amenizava suas dissensões e também fazia
com que se identificassem dentro de uma mesma origem. Ambas atribuições cooperaram,
mais uma vez, por criar uma solidariedade real entre as pessoas assim designadas, pois em
decorrência destas denominações, “irmãos ukrainos” ou “eslavos”, eram tratados de forma
igual pelos membros da Primeira Igreja Batista de Curitiba, bem como entre si 133.
        São todas essas características, portanto, que definiram o grupo religioso como um
grupo étnico eslavo, que emergiu da diferenciação cultural entre agrupamentos que interagiam
em um contexto de relações interétnicas134.
       A Congregação Eslava de Curitiba reuniu-se nas dependências da Primeira Igreja
Batista de Curitiba até por volta do início da década de 1940. A partir do ano de 1936,
começa-se uma discussão entre os membros eslavos e brasileiros com relação à utilização do
salão de cultos da Primeira Igreja Batista. Como as reuniões dessa Congregação eram
realizadas aos domingos à tarde, os zeladores da Igreja necessitavam arrumar o salão para os
cultos da noite e ficavam impossibilitados de terem um período de lazer com sua família. Esta
dificuldade fez os membros da Igreja disponibilizarem outro salão para que os eslavos
desenvolvessem suas atividades religiosas135. Em um espaço menor, estes não demoraram a
solicitar novamente o salão principal da Igreja, pois lá conseguiam acomodar-se de maneira


missionário, Nicon Danilenco, que ensinou seu ofício de fabricar doces e balas e ao mesmo tempo lhes fornecia
“assistência espiritual.”
131
    POUTIGNAT, Philippe & STREIFF-FENART, Jocelyne, op. cit., p. 163.
132
    Ibid., p. 144.
133
    Ibid., p. 145.
134
    Ibid., p. 82.
135
    Ata da Primeira Igreja Batista de Curitiba, Livro 4, p. 49-50.
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Batistas Eslavos em Curitiba

  • 1. ANTONIO CESAR CAMARGO MIRANDA BATISTAS ESLAVOS EM CURITIBA: RELIGIÃO E ETNICIDADE Monografia Final do Curso de História, Setor de Ciências Humanas, Letras e Artes, da Universidade Federal do Paraná. Orientador: Prof. Sérgio Odilon Nadalin CURITIBA 2009
  • 2. AGRADECIMENTOS É com alegria que concluo mais esta etapa. A realização de um trabalho proporciona a abertura de novos caminhos, aquisição de conhecimentos e amizades construídas no decorrer do período em que estive participando da vida universitária. Em primeiro lugar gostaria de agradecer a Deus por me oferecer uma oportunidade de concretizar meus objetivos, criando valores e perspectivas de vida que sempre me estimularam para alcançar as metas traçadas. Agradeço também a atenção e disponibilidade das pessoas que contribuíram para que esse simples trabalho pudesse ser realizado. Ao professor Doutor Sergio Odilon Nadalin pela orientação nos rumos e ajustes da pesquisa. A professora Doutora Oksana O. Boruszenko por tirar dúvidas, esclarecer muitas das questões que estavam em aberto e contribuir de maneira direta para construção de meu conhecimento. A professora Maria Luiza Andreazza por, no início, encaminhar e incentivar a pesquisa. Meus sinceros agradecimentos ao professor Iedo Néspolo, por revisar e corrigir todo o texto, e ao professor e pastor Ebenézer Soares Ferreira, pelas indicações bibliográficas. Outro grupo de pessoas que não posso deixar de citar são aqueles que disponibilizaram toda a documentação que tive contato e entenderam o propósito desse trabalho. Agradeço a Lidiane Xavier Iurk Querino, Coordenadora Administrativa da Convenção Batista Paranaense, a Doris Körber, secretária da Convenção Batista Pioneira do Sul do Brasil, a Nelita Morais, secretária da Primeira Igreja Batista de Curitiba, a Marcia Aline Paraszczuk, secretária da Igreja Batista Avenida dos Estados, a Rangel Ramiro Ramos, secretário da Igreja Evangélica Batista da Água Verde e a Olga Waculicz, responsável pelas atas da comunidade eslava. De igual modo agradeço a todos os entrevistados que me receberam em suas casas e disponibilizaram um tempo precioso para que, através de suas memórias familiares e suas experiências pessoais, eu pudesse aprimorar meu conhecimento. Por fim, mas não menos especial, minha gratidão aos meus amigos e familiares. Principalmente a minha mãe, Lindamir, minha tia, Eliete, e minha avó, Santina, os grandes alicerces da minha vida. Sem vocês nada disso seria possível e teria valor.
  • 3. SUMÁRIO INTRODUÇÃO.....................................................................................................................1 1. Capítulo 1 1.1 A Igreja Batista.................................................................................................................3 1.2 O advento da Igreja Batista em Curitiba, história e organização....................................10 1.3 “Configurações étnicas” na Igreja: o caso das Igrejas Eslavas no Brasil........................12 2. Capítulo 2 2.1 Os “eslavos”: identificações e diferenças.......................................................................18 2.2 Imigrações eslavas para o Brasil.....................................................................................24 3. Capítulo 3 3.1 Primeira Igreja Batista Eslava de Curitiba – motivações étnicas?..................................28 CONCLUSÃO.....................................................................................................................40 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS..............................................................................44 ENTREVISTAS...................................................................................................................46 NOMES DAS FAMÍLIAS ENCONTRADAS NAS ATAS DA COMUNIDADE ESLAVA DE CURITIBA.....................................................................................................................55
  • 4. 1 Introdução: O interesse por uma “história da religião” surge através da curiosidade de “como”, “quando” e os “porquês” da formação de grupos religiosos. Cada um com especificidade diferente, próprios ritos, crenças e costumes – especialmente, a denominação batista. Essa “Igreja” se instala no Brasil e difunde suas crenças, num primeiro momento, através de missionários, geralmente oriundos dos Estados Unidos, sustentados financeiramente por instituições ou Igrejas da denominação, especificamente com o objetivo de propagar sua fé. No entanto, o desenvolvimento desses trabalhos não é restrito apenas à atuação desses indivíduos, como geralmente se pensa, pois através de movimentos imigratórios, há pessoas que transportam consigo suas crenças, dando início a suas formas de culto e expandem sua fé. Nesse sentido, desde fins do século XIX observam-se grupos de batistas vindos da Europa que se instalam no Brasil. Ao estabelecerem colônias, muitos desses indivíduos iniciam uma ação missionária própria, ou solicitam a presença de obreiros de seus países, alemães, suecos, húngaros, letos, estonianos e os “eslavos”, para que o trabalho possa se alargar em diversos pontos do território brasileiro. O nosso primeiro contato com o grupo batista eslavo em Curitiba ocorreu através de uma foto existente na Convenção Batista Paranaense, em cuja fachada aparecia escrito “Primeira Igreja Evangélica Batista Eslava de Curitiba”. Indagamos “como” era possível a existência de um grupo batista “eslavo” em Curitiba, pois não conhecíamos um grupo desse gênero. Através de contatos com membros da Igreja Evangélica Batista da Água Verde tivemos acesso à documentação da comunidade, iniciando a nossa pesquisa sobre um grupo religioso específico. A falta de trabalhos acadêmicos que tratam da questão de grupos batistas eslavos no Brasil, congregando pessoas de diferentes etnias, ao mesmo tempo, em uma comunidade de fé, instigaram ainda mais a pesquisa. Há apenas apontamentos sobre o surgimento de grupos batistas eslavos no Brasil e a organização de Igrejas formadas por russos, poloneses, ucranianos e outros. Assim, há a possibilidade de, através de estudos da imigração, observar a formação de grupos religiosos, estudando a maneira como acontecem suas atuações em lugares diferentes de sua origem e “como” desenvolveram seus trabalhos eclesiásticos. Nesse caso específico, a formação de um grupo religioso denominado “eslavo”, em que várias etnias apresentando diferenças significativas, reúnem- se em torno de uma profissão de fé comum, relativamente estranha às suas culturas originais: poloneses são de uma tradição
  • 5. 2 católica de rito latino, russos e ucranianos pertencem ao catolicismo ortodoxo e parte dos ucranianos acabaram tornando-se católicos uniatas. Somadas às questões religiosas, os eslavos ainda reúnem grupos com diferenças históricas, lingüísticas e culturais bastante significativas. Através dessas questões houve a busca dos elementos que proporcionaram a congregação destas diferentes etnias em um mesmo espaço, abrangendo ou não todas suas especificidades. Num primeiro momento, criaram perante os brasileiros, uma identidade de “eslavos”, por cantarem e fazerem suas leituras bíblicas e expressarem-se em idiomas próprios. Como as línguas de origem “eslava” são parecidas entre si, foi possível a conversação e emprego do próprio idioma de cada etnia em seus trabalhos religiosos. Assim todos conversavam utilizando as línguas russa, ucraniana e polonesa, deixando o português de lado. Posteriormente, algumas pessoas não se identificando mais como “eslavos”, reivindicaram uma organização em separado, para que cada trabalho pudesse respeitar tradições e idiomas próprios de cada etnia. A comunidade deu prosseguimento a seus trabalhos até o momento em que a Primeira Igreja Evangélica Batista Eslava de Curitiba muda seu nome para Igreja Evangélica Batista da Água Verde. Essa mudança de nome traduz uma transformação importante no “regimento” da Igreja. Os trabalhos deixam de ser destinados somente a “eslavos” e é disponibilizada “assistência espiritual” aos brasileiros. O primeiro capítulo visa a abordar o advento da Igreja Batista no mundo, no Brasil, em Curitiba e o caso de Igrejas Eslavas no Brasil. Os “eslavos” e suas divergências histórico- culturais serão estudados no segundo capítulo, quando se deverão traçar algumas características dessas diferenças. Por fim, o terceiro capítulo trata da comunidade “eslava” em si, desde sua formação, objetivando “como” foi possível congregar diversas etnias “eslavas” em um mesmo espaço religioso, até o momento em que, em sua substituição, organiza-se a Igreja Evangélica Batista da Água Verde, em 1978.
  • 6. 3 1.1 A Igreja Batista. O início da história batista é muito incerto. Há três versões que tentam apontar para o possível surgimento dessa denominação religiosa. A primeira delas, defendida por alguns historiadores batistas1, é conhecida como “Teoria do Rastro de Sangue” ou “Teoria do JJJ- Jerusalém-Jordão-João”. Os historiadores que seguem esta hipótese veem uma “descendência histórica” partindo de uma linhagem ininterrupta desde os tempos bíblicos, quando João Batista efetuava batismos no rio Jordão. Assim, essa denominação é vista como uma filiação proveniente de uma época anterior a Cristo e que foi se desenvolvendo ao longo dos séculos com vários nomes diferentes2 e chegou até nós com o nome “batistas”3. A segunda proposição correlaciona essa denominação a um parentesco com os anabatistas do século XVI4. Levando em conta essa ligação, alguns historiadores sugerem que grupos na Idade Média5 já praticavam preceitos, como o batismo por imersão, uma crença contrária à veneração de imagens de santos e a transubstanciação na eucaristia, que depois foram utilizados pelos anabatistas. Outros autores, porém, veem o nascimento dos anabatistas em Zurique, na Suíça, paralelamente à Reforma praticada por Ulrico Zuínglio6. Um grupo de pessoas teria estudado a Bíblia e identificado que o batismo infantil era um erro e só pessoas em condições de professarem sua fé e regeneradas deveriam ser batizadas. Depois de ocorridos alguns batismos na cidade, as autoridades locais decretaram que os pais deveriam batizar seus filhos ainda sob pena de desterro e que rebatismos teriam pena de afogamento7. Com o não cumprimento da lei, um dos líderes do movimento foi condenado à morte e afogado no rio que corta a cidade8. Os demais líderes foram perseguidos e dispersos pelas autoridades de Zurique. Para unificação e consolidação dos pontos que eram pregados por 1 LIMA, Jaime Augusto, História dos Batistas Regulares no Brasil. São Paulo: Editora Batista Regular, 1997. p. 15. 2 PEREIRA, José Reis. História dos Batistas no Brasil. Rio de Janeiro: JUERP; 2001. p. 19-47. 3 KEIDANN, D. M. Uma Introdução à história dos batistas no Rio Grande do Sul numa perspectiva transcultural. Minas Gerais: IEPG; 1996. p. 24-25. 4 Os anabatistas, cujo nome significa rebatizadores, surgiram e foram assim denominados durante a Reforma e considerados radicais por seus opositores. Defendiam a autoridade da Bíblia, discordando em alguns aspectos dos reformadores do século XVI, principalmente sendo contrários ao batismo infantil e a conseqüente entrada automática à Igreja. Defendiam a idéia de uma Igreja formada apenas por pessoas regeneradas, crendo que o batismo deveria ser ministrado somente a adultos que cressem em Cristo e tivessem vontade de ingressar em uma Igreja. Podem ser identificados durante esse período em vários locais da Europa e em alguns aspectos doutrinários podem estar ligados às primeiras Igrejas Batistas, chamadas de Gerais no início do século XVII. (Ibid., p. 28-31) 5 Valdenses, Lolardos, Petrobrusianos, henriquianos e outros. (PEREIRA, op. cit., p. 34-36) 6 Ibid., p. 44. 7 KEIDANN, op. cit., p. 30.
  • 7. 4 esses anabatistas, tornou-se de extrema importância a criação de uma declaração de fé que compilasse todas as doutrinas seguidas por eles. Aqueles que escaparam à perseguição elaboraram um documento, entre a cidade de Zurique e Schaffhausen na Suíça, que ficou conhecido como “Confissão de Fé de Schleitheim”, nome da cidade onde se reuniram e redigiram sua declaração. Após longo tempo de perseguição e com suas doutrinas já estabilizadas, vários grupos de anabatistas migraram para áreas de maior tolerância religiosa na Europa. Alguns soberanos acabaram aceitando a vinda desses imigrantes para povoar territórios escassamente habitados e os anabatistas se dirigiram para regiões do Palatinado, Alsácia, Morávia9, Itália, Alemanha, Inglaterra e Holanda10. Nos Países Baixos, foram bem recebidos, pois já havia uma rejeição a doutrinas católicas empregadas, sendo de maior facilidade aderirem à nova religião. Antes da chegada desses grupos à região, houve alguns desastres naturais, como o rompimento de diques, que causou perdas totais das colheitas, e problemas políticos, como embargos comerciais que causaram inflação, fome e desemprego, que resultaram num sentimento apocalíptico entre as massas, catalisando a expansão do anabatismo na região11. Os anabatistas embora formassem um movimento religioso pacífico, com discursos proféticos e apocalípticos numa época de desagregação social, agitaram alguns grupos que se tornaram revolucionários. O caso mais conhecido é o de Thomas Müntzer, que pregava uma idéia milenarista de que o reino de Deus deveria ser estabelecido o mais breve possível e se necessária a violência deveria ser empregada. Após várias perturbações e ataques a igrejas e mosteiros entre o noroeste da Alemanha e diversas províncias dos Países Baixos, Müntzer e seus seguidores tomaram a cidade de Münster na Alemanha tentando estabelecer suas crenças à força. Em resposta a cidade foi sitiada e tomada por tropas do príncipe-arcebispo da cidade auxiliado pelo exército imperial alemão12. Os anabatistas foram mortos e a fama de sua violência, decorrente do terror causado por Müntzer, foi espalhada pela Europa. Por outro lado, os anabatistas pacíficos pregavam um isolamento do mundo e o estabelecimento de colônias próprias, onde o reino de Deus seria empregado pela desistência de padrões mundanos e obediência somente às Escrituras. Com a derrota de Thomas Müntzer e sua popularidade, vários grupos pacíficos foram perseguidos e mais uma vez dispersos. Posteriormente, reagruparam-se sob a liderança de Menno Simons e deram origem aos 8 PEREIRA, op. cit., p. 45-47. 9 MASKE, Wilson. Os menonitas e a Construção do Novo Reino. HISTÓRIA: QUESTÕES E DEBATES, Curitiba, n. 28, 77-105 , 1998. p. 91. 10 PEREIRA, op. cit., p. 43. 11 MASKE, op. cit., p. 87.
  • 8. 5 menonitas13. Estes grupos acabaram por isolar-se em comunidades fechadas, tendo direito a terra e à liberdade de religião. A Morávia, Palatinado, Galícia, Volínia, Dantzig, Prússia Ocidental e Oriental foram alguns dos locais onde esses grupos se estabeleceram. A terceira hipótese defende que a origem dos batistas estaria relacionada aos separatistas ingleses14 do início do século XVII. Esses grupos ansiavam por estabelecer Igrejas com modelo baseado no Novo Testamento, segundo suas interpretações e alegavam que para a admissão de membros em uma Igreja o batismo deveria ser feito após profissão de fé. Como o costume era o batismo infantil, verificaram que deveriam batizar-se novamente caso almejassem formar uma Igreja fundamentada em princípios neotestamentários. A perseguição a grupos como esse se tornou mais intensa na Inglaterra e o desejo por uma igreja independente do estado se tornava crescente. Assim migraram para a Holanda e fundaram uma Igreja Batista em Amsterdã mas após dissidência desse grupo, ex-membros voltaram para a Inglaterra e fundaram uma Igreja Batista nos arredores de Londres15. Ainda no século XVII, derivam dos separatistas ingleses duas denominações: os “Batistas Gerais” e os “Batistas Particulares”. Os primeiros são assim designados por acreditarem que a morte de Cristo poderia se aplicar a todos e em suas doutrinas limitavam a autonomia das igrejas locais que eram ligadas a associações. Este aspecto limitou a atuação das igrejas individualmente, centralizando e retardando o crescimento destas, que aos poucos foram enfraquecidas. Os “Batistas Particulares” acreditavam na doutrina da eleição, em que a salvação em Cristo era apenas destinada a algumas pessoas, e zelavam pela independência de cada igreja local, relegando às associações apenas funções extras. Alguns grupos aos poucos foram deixando de lado o princípio da eleição, proporcionando a propagação da fé dos batistas a um número maior de pessoas e, como conseqüência, floresceram Igrejas Batistas em toda Inglaterra16. Com relação às perseguições feitas no século XVII, outro movimento migratório pode ser observado nesse período. Alguns separatistas ao invés de irem para o continente europeu, preferiram a América do Norte e estabeleceram colônias em que todas as pessoas professavam a mesma crença. Porém, do mesmo modo, houve no Novo Mundo uma série de reclamações 12 Ibid., p. 88. 13 Ibid., p. 89-103. 14 Com o surgimento de várias seitas protestantes na Inglaterra no século XVII, os separatistas ingleses diferenciavam-se dos demais movimentos religiosos por serem congregacionais em sua eclesiologia, insistindo no batismo somente à pessoas regeneradas pelo Espírito Santo. Este movimento tinha como origem o puritanismo inglês e defendia mudanças mais profundas dentro da Igreja, insistindo que as reformas feitas no século XVI na Inglaterra não foram completas. (PEREIRA, op. cit., p. 14) 15 Ibid., p. 49-51. 16 KEIDANN, op. cit., p. 34-36.
  • 9. 6 que envolviam a união entre Estado e Igreja. O pastor Roger Williams demonstrava sua desaprovação ao sistema em que as colônias viviam, em comunidades atreladas ao poder do governo. Após acusação e conseqüente punição retirou-se da igreja em que estava e unindo-se a outros dissidentes chegou ao pleno entendimento de que Igreja e Estado deveriam ser dissociados. Além disso, estudou a Bíblia e concluiu que o batismo infantil não era válido e que Cristo havia instituído o batismo a pessoas adultas e conscientes de tal ato. Desse modo o grupo todo se batizou novamente e organizou a Primeira Igreja Batista em solo norte- americano, na localidade de Providence, no estado de Rhode Island17. Após o estabelecimento dessa comunidade surgem outros grupos ou pessoas que migraram para a América do Norte e em contato com batistas ou ainda ao examinarem a Bíblia, aderiram às idéias que eram pregadas por essa denominação e acabaram fundando igrejas espalhadas por diversas colônias ao longo do território da Nova Inglaterra18. Um exemplo que ilustra esta questão é o grupo ligado a John Clarke. Perseguidos por convicções religiosas na Inglaterra, fugiram para a América do Norte, porém não se adaptaram ao sistema das colônias americanas que também sufocava sua liberdade religiosa. Clarke, assim que chegou à América, teria entrado em contato com um grupo de batistas. Comprou um território de índios locais, a qual chamou de Rhode Island, onde fundou uma colônia e igreja próprias. Essa comunidade reivindica para si o fato de serem a Primeira Igreja Batista em território americano. Porém não há evidencias que provem que a Igreja por ele fundada nessa localidade fosse batista. Os documentos existentes informam haver uma Igreja Batista em Newport, em Rhode Island, em 1648, cerca de dez anos após a fundação da Igreja de Providence19. As três explicações para o surgimento dos batistas têm um fundamento em comum: todos os batistas creem na Bíblia como livro que contém suas principais regras de fé e prática, na separação entre Igreja e o Estado e no batismo por submersão, ministrado somente àqueles que creram em Cristo e no Evangelho. Ou seja, o batismo por aspersão e o infantil não são considerados bíblicos e nesses casos há a necessidade do “rebatismo” por imersão. Essa última característica, que forneceu o nome de “batistas” a essa denominação, daria oportunidade ao indivíduo de fazer parte de uma Igreja formada apenas por pessoas regeneradas por Cristo e que fossem conscientes do ato batismal a que estavam se submetendo. Tendo em vista a falta da liberdade religiosa e as perseguições que decorreram 17 PEREIRA, op. cit., p. 53-54. 18 Ibid., p. 55-56. 19 Ibid., p. 55.
  • 10. 7 delas na Europa, no século XVII, essa denominação é a favor da separação entre Igreja e Estado e prega a liberdade de culto e consciência a todas as pessoas. Assim sendo, outra característica dos batistas é a autonomia e soberania da Igreja local frente à outra instituição eclesiástica ou governamental. Toda Igreja Batista tem artigos de fé e estatutos de regimento interno próprios e está sujeita a decisões tomadas em conjunto e democraticamente por seus membros, não estando subordinada a nenhuma outra entidade. Um pequeno grupo de indivíduos, a partir de duas ou três pessoas, que observam e ao praticar todos esses ensinamentos da denominação, pode dar início a uma Igreja Batista. É através das formações de associações, convenções ou as chamadas “Juntas” que os batistas cooperam entre si e estabelecem interdependência. A criação de tais instituições por parte das igrejas, serve para exercer as mais variadas atividades como educação, saúde, missionarismo e caridade. Deste modo, há maior facilidade para as igrejas bancarem suas obras visando à expansão da denominação. Essas associações são uma cooperação voluntária de cada Igreja, sendo mantidas, fiscalizadas e formadas pelos membros daquelas que se prontificaram a este convênio20. Uma comunidade batista pode surgir através da implantação de uma congregação diretamente vinculada a uma “igreja mãe”, que lhe concede “assistência espiritual” através de um pastor ou outro responsável que possa presidir suas atividades eclesiásticas. Ao mesmo tempo, disponibiliza-lhe recursos financeiros para despesas necessárias como compra ou aluguel de propriedade, materiais para os cultos e demais despesas. Muitas vezes há o desejo por parte de alguns indivíduos, pertencentes a uma Igreja já constituída, de reunirem-se em outro local. Por morarem em municípios, regiões ou bairros muito afastados da comunidade à qual pertencem, necessitam de um local mais próximo, onde eles possam desenvolver suas atividades religiosas. Geralmente, num primeiro momento, os cultos começam a ser feitos nos lares desses indivíduos, trazendo a população vizinha para apresentação do evangelho. Ao desenvolver-se essa atividade, procura-se um local mais espaçoso para que possa melhor comportar aqueles que desejam freqüentar as reuniões. Outra forma comum para a formação de uma congregação são os pontos de pregação nos bairros: uma localidade, uma praça, ou uma rua, onde rotineiramente, uma vez por semana, ou mensalmente, acontece um trabalho de propagação do evangelho, com distribuição de panfletos, pregações e apresentações musicais. A congregação pode organizar-se em igreja a partir do momento em que consiga manter-se fisicamente, sustentando todos os seus gastos financeiros, e “espiritualmente”,
  • 11. 8 tendo pastor próprio ou algum outro responsável que fique à frente de suas atividades eclesiásticas. Constitui-se, portanto, igreja ao preencher essas condições e os indivíduos demonstrem vontade para que possa efetivar-se a organização. Na medida em que estejam sujeitos à doutrina batista, seus artigos de fé, os ensinos bíblicos que seguem, sua responsabilidade para com a denominação batista e os estatutos da Igreja que expostos não devem contrariar a crença doutrinária da denominação, surge uma nova comunidade batista. O missionarismo batista pode ser observado desde a sua formação como Igreja. O primeiro ponto a ser destacado na doutrina batista para com pessoas de fora da Igreja é justamente “o pregar o evangelho”21. Partindo da interpretação do Novo Testamento e os ensinamentos de Cristo, essa deve ser a principal tarefa das pessoas que se congregam em uma comunidade batista. Ao relacionar-se com pessoas que ainda não foram regeneradas22, o crente deve prontificar-se a lhe apresentar o sacrifício de Cristo. Este trabalho pode ser feito de várias maneiras. Uma delas é a formulação e distribuição de literatura, evangelismos em locais públicos e convites a eventos especiais onde a Igreja se reúne. O movimento de enviar pessoas específicas para outras localidades com o intuito de propagar o evangelho em várias partes do mundo surgiu ainda em fins do século XVIII. Após a influência de John Wesley e um movimento que despertou igrejas na Inglaterra, algumas denominações iniciaram um trabalho visando à expansão de suas crenças. Dentre elas, os batistas enviaram William Carey e John Thomas em 1793 para a Índia, dando início as Missões Protestantes Modernas23. Após estes primeiros missionários, fez-se necessária a criação de Convenções e Juntas Missionárias que reunissem as igrejas no intuito de angariar fundos para manter esses trabalhos. Tais instituições proporcionaram a manutenção de vários missionários espalhados por múltiplos territórios24 e fez com que o missionarismo batista fosse ampliado durante o século XIX, chegando inclusive ao Brasil. Uma das Juntas Missionárias de maior expressão foi a Junta de Richmond, criada no ano de 1845, ligada à Convenção Batista do Sul dos Estados Unidos. Seu objetivo era enviar e sustentar missionários e trabalhos de introdução do evangelho em locais onde ainda não havia pessoas que conhecessem ou tivessem algum tipo de contato real e mais profundo com os ensinamentos evangélicos. No entender desta instituição, o Brasil era um país que se 20 KEIDANN, op. cit., p. 50. 21 PORTER, op. cit., p. 23-24. 22 Os indivíduos só são considerados regenerados na medida em que são vistos com padrões de comportamento que se aproximem àqueles que estejam conforme as doutrinas ensinadas pelo Novo Testamento. A partir disso, a prova principal dessa condição é a restauração feita após o batismo por imersão. 23 PEREIRA, op. cit., p. 52. 24 Pontos da África, América e Ásia, com crescente demanda ao enviar pessoas para a China. (Ibid., p. 57-58)
  • 12. 9 encaixava nessa condição, pois o catolicismo era julgado como idólatra e apegado ao culto a Maria e aos santos. Nessas circunstâncias, apesar do Brasil ser considerado, num âmbito geral, uma nação cristã, fazia-se muito necessária a introdução de um evangelho puro e a conversão de todos os católicos, não só brasileiros, mas de todo o mundo25. Nessa perspectiva de pregar a palavra de Deus aos brasileiros, o primeiro missionário enviado pela instituição, em 1860, foi Thomas Jefferson Bowen. O evangelista não teve sucesso em sua missão. Um motivo foi sua saúde que já se encontrava muito debilitada, agravada com o clima da cidade do Rio de Janeiro, o risco de contrair febre amarela e o alto custo de vida que lhe dificultava o sustento. Além disso não tinha um planejamento que lhe norteasse o trabalho, ficando perdido em seus deveres e obrigações. Bowen era conhecedor de alguns dialetos africanos, pois havia sido missionário na África antes de vir ao Brasil, e começou a relacionar-se com escravos que encontrava, sendo preso em virtude dessa atividade. Todos esses motivos fizeram com que ele regressasse para os Estados Unidos. Após a vinda desse missionário, outros grupos de batistas a chegarem ao Brasil teriam sido imigrantes oriundos do sul dos Estados Unidos, em decorrência da Guerra de Secessão, e que se estabeleceram em Santa Bárbara, na província de São Paulo. Na colônia que se organizou, foram criadas algumas igrejas no ano de 1871, sendo uma batista. Assim, a primeira Igreja dessa denominação fundada no Brasil tinha a intenção de atender apenas os imigrantes, sendo seus cultos realizados na língua inglesa26. É possível observar que esta comunidade também se preocupa em apresentar suas crenças aos brasileiros e faz algumas solicitações a Junta de Richmond para que se enviem missionários para evangelizar os brasileiros27. Um dos responsáveis pela introdução de trabalhos batistas no Brasil foi Alexander Travis Hawthorne que, após a Guerra de Secessão, dirigiu-se para o estado da Bahia pensando em estabelecer uma colônia de imigrantes. Não sendo possível esse seu desejo retornou ao país de origem e tornou-se um grande incentivador do envio de missionários para o Brasil. Os primeiros missionários apoiados por Hawthorne foi o casal Bagby28 que chegou à cidade do Rio de Janeiro no ano de 1881, e dirigiu-se a Santa Bárbara para contato com os batistas lá situados. Como a intenção era aprender a língua portuguesa, mudaram-se para cidade de Campinas onde havia um colégio presbiteriano que lhes proporcionou melhor estudo29. Em seu contato com os imigrantes norte-americanos, conheceram um ex-padre católico, Antônio 25 Ibid., p. 67-68. 26 Ibid., p. 69. 27 KEIDANN, op. cit., p. 69. 28 Ibid., p. 70. 29 PEREIRA, op. cit., p. 73-76.
  • 13. 10 Teixeira de Albuquerque. Este, ao estudar a Bíblia durante e após fazer seminário em Pernambuco, criou convicções que estavam fora dos ensinamentos católicos. Resolveu então largar o sacerdócio e, mais uma vez estudando os mandamentos do Novo Testamento, começou a acreditar que o batismo deveria ser ministrado por imersão. Tendo o conhecimento que havia batistas em Santa Bárbara dirigiu-se para a colônia e solicitou o batismo. Como possuía vasto conhecimento bíblico foi ordenado ao ministério batista30. Para compor o grupo de missionários pioneiros aparece Zachary Clay Taylor, que tinha intenções de vir para o Brasil antes mesmo da vinda do casal Bagby. Taylor havia se impressionado com o livro “O Brasil e os Brasileiros” de Kidder e Fletcher, pregadores metodistas que estiveram no país no período regencial. Terminou os estudos e foi consagrado ao ministério batista. Encorajado, assim como os outros missionários, por Hawthorne embarcou com sua esposa em 1882, juntando-se aos missionários citados acima. Essas pessoas são as responsáveis pela fundação da Primeira Igreja Batista propriamente brasileira, figurando entre seus membros não só os missionários norte-americanos, mas também um brasileiro. O local escolhido por eles foi a cidade de Salvador, uma cidade populosa e centro de religião onde se situava o arcebispo primaz do país, considerada desprovida de trabalho missionário de qualquer denominação. Na medida em que a Igreja cresceu e se desenvolveu, os missionários resolveram expandir o trabalho em outras regiões. Em 1884 os Bagby dirigiram-se para o Rio de Janeiro e, junto com outros imigrantes e brasileiros que se converteram à mensagem apresentada pelos evangelistas, fundaram a Segunda Igreja Batista em solo brasileiro. A partir daí, com a chegada de outros missionários31 e a conseqüente propagação do evangelho, várias comunidades batistas foram sendo criadas por todo país32. 1.2 O advento da Igreja Batista em Curitiba, história e organização. A chegada dos batistas a Curitiba está vinculada à iniciação dos trabalhos dessa denominação no litoral paranaense. Uma caravana de evangelistas congregacionais partiu da cidade de Santos, em 1902, visando a estabelecer um trabalho de pregação do evangelho no Rio Grande do Sul. Ao chegarem a Curitiba, o grupo separou-se. Ao que tudo indica a literatura que distribuíam teria terminado e por isso enquanto um grupo avançava, o outro retornaria a Santos para munir-se de mais material. Samuel Pires de Mello, que se convertera 30 Ibid., p. 77-78. 31 Ibid., p. 97-103. 32 Ibid., p. 85-90.
  • 14. 11 havia pouco33, foi o encarregado de voltar. Após sua estada em Curitiba foi a Paranaguá, onde alugou uma sala e começou a fazer reuniões e pregar o evangelho. Em seguida dirigiu-se a Santos e retornou dois meses mais tarde à cidade paranaense, trazendo consigo sua família34. Ao estabelecer-se em solo parnanguara, continuou propagando sua fé em Cristo e em 1903, após executar os primeiros batismos, criou a “Igreja Cristã”. A princípio esta Igreja não era batista e não estava ligada a nenhuma denominação religiosa. A comunidade era dirigida apenas por Mello, que enviava relatórios anuais ao grupo a que estava ligado em São Paulo, pois não perdera o vínculo inicial com seus mentores na fé35. O trabalho do missionário expandiu-se ao longo no tempo, não só em Paranaguá, mas também em demais localidades do litoral paranaense chegando inclusive a serem realizadas duas reuniões na cidade de Curitiba. Outros líderes se integraram na propagação do evangelho pela região, fazendo com que mais pessoas pudessem ter contato com a obra que estava sendo feita. No ano de 1908, com os recursos financeiros escassos e saúde debilitada, Mello optou por passar seu trabalho a alguém que pudesse dar continuidade. Diante da recusa por parte do grupo que o apoiava em São Paulo e como sua “Igreja Cristã” não estava filiada a qualquer denominação, voltou-se para os batistas pedindo ajuda36. Após um exame da Missão Paulistana para averiguar se a Igreja de Mello estava de acordo com as doutrinas do Novo Testamento e se nenhuma de suas práticas comprometia as doutrinas batistas, a comunidade passou ao vínculo da denominação. Em 1910, a Igreja foi considerada como batista, sendo incluída no rol de Igrejas que compunham a Convenção Batista Brasileira37. Deste modo, iniciou-se o trabalho batista no estado do Paraná: uma comunidade religiosa já estabelecida e sem qualquer ligação denominacional, acaba por passar ao campo de trabalho dos batistas. A denominação começou a fazer vários investimentos financeiros no trabalho que fora desenvolvido, como aquisição para um novo templo, e o envio de missionários para continuidade na evangelização do litoral. Um destes evangelistas, Manoel Virgínio de Souza, que chegou a Paranaguá em 1912 para auxílio na obra, transferiu- se no mesmo ano para Curitiba com intuito de organizar uma nova frente de atuação38. No ano de 1914, outro 33 CAVALLARI, Nivaldo. Centenário de Fé: História da Primeira Igreja Batista de Paranaguá. Paraná: Edição A. D. Santos Editora, 2003. p. 19-22. 34 Ibid., p. 23. 35 Ibid., p. 33. 36 Ibid., p. 50-55. 37 A primeira Convenção Batista Brasileira foi criada no ano de 1907, reunindo pastores e missionários de todo o país. O objetivo proposto era aumentar ainda mais o trabalho batista, não só no Brasil, mas também enviando missionários para Chile e Portugal, locais onde havia necessidade e oportunidade de pregar o evangelho. (PEREIRA, op. cit., p. 141-156) 38 CAVALLARI, op. cit., p. 63.
  • 15. 12 missionário, Robert Pettigrew, que também estava no litoral apoiando a comunidade batista, se transfere para a capital paranaense com a intenção de criar um colégio batista na cidade39. Manoel Virgínio de Souza fazia reuniões para pregar o evangelho em sua própria casa e com a vinda de Pettigrew de Paranaguá, organizou-se a Primeira Igreja Batista de Curitiba constituída por nove membros. Com o crescimento da comunidade fez-se necessária a compra de uma sede própria e, com o auxílio de outro obreiro recém chegado de São Paulo, Arthur Beriah Deter, foi possível a aquisição de um terreno na rua Visconde de Guarapuava, esquina com a rua Desembargador Westphalen. A Igreja, então com cerca de 115 membros, terminou a construção e inaugurou seu templo em 192440. Em seguida a comunidade continuou crescendo com a visão de prosseguir espalhando o evangelho por toda a cidade, criando congregações que virariam Igrejas constituídas. 1.3 “Configurações étnicas” na Igreja: o caso das Igrejas Eslavas no Brasil. A história dos batistas eslavos está estritamente ligada aos batistas letos, vindos entre o fim do século XIX e início do século XX. Eles se instalaram no sul do país onde organizaram duas igrejas batistas: a Primeira Igreja Batista Leta foi fundada em Rio Novo, Santa Catarina, em 1892 e a segunda, a Igreja Batista Leta de Ijuí, no Rio Grande do Sul, foi organizada em 189541. Os batistas na Letônia emigraram porque estavam sofrendo perseguições por meio de leis, proibições, prisões e até mesmo o exílio, por parte de autoridades políticas e eclesiásticas, que limitavam a atuação de pastores e líderes das comunidades. Somando-se a essa série de restrições à sua liberdade de culto e fé, as camadas populares da Letônia tinham o anseio crescente de cultivarem terras próprias, pois estariam submissas a “senhores de terras germânicos”42. A busca pela terra e melhores condições materiais proporcionaram o advento da emigração de letos para outros locais, dentre eles o Brasil43. O segundo grande movimento imigratório de batistas letos para o Brasil acontece nos anos de 1922/1923. Após o estabelecimento dos primeiros letos em suas colônias no sul do país, os que aqui estavam mandavam cartas para seus parentes e amigos que haviam ficado na Letônia, fazendo propaganda da nova terra e as condições favoráveis em que estavam 39 Ibid., p. 68. 40 SOUZA, Sóstenes Borges de. Enciclopédia Batista Brasileira. Salvador: Artios, 1996. p. 77. 41 KEIDANN, op. cit., p. 168-169. 42 RONIS, Osvaldo. Uma Epopéia da Fé: História dos Batistas Letos no Brasil. Casa Publicadora Batista. Rio de Janeiro, 1974. p. 84.
  • 16. 13 vivendo. A inquietação política vivida antes da Primeira Guerra Mundial fazia “os que lá estavam” refletirem melhor na possibilidade de procurar outro local como refúgio. Os sofrimentos causados pela guerra e a inquietação vivida nos anos que se sucederam a ela aguçaram a vontade de emigrar. Aliado a esses sentimentos, houve entre os batistas um “despertamento espiritual” que apontava para a fuga “das forças do mal, materialistas e ateístas” que dominariam o país44. O avanço comunista sobre o leste europeu, fez estas comunidades religiosas atentarem para a saída do país o mais rápido possível, tendo uma visão profética e apocalíptica do que aconteceria com aqueles que continuassem sob jugo dos invasores. Superadas as burocracias com o governo brasileiro45, em 1922 começaram a embarcar pequenos grupos de batistas letos para o Brasil. O primeiro grupo desses imigrantes, eram famílias mais abastadas que traziam recursos financeiros para aquisição de terras onde instalariam uma grande colônia. Assim criaram a Colônia de Varpa, em São Paulo, que tinha por objetivo abrigar os demais colonos provenientes da Letônia46. Paralelamente, em condições muito semelhantes a esses batistas letos, um outro grupo da mesma denominação que vivia na Ucrânia tinha o anseio de embarcar para o Brasil. Um dos membros da Colônia de Varpa havia deixado uma filha, casada com um russo, na U.R.S.S. Ela sempre lhe escrevia colocando as dificuldades materiais e “espirituais” em que se encontravam todos os que viviam na Rússia comunista. Outras pessoas da mesma região também se queixavam das condições em que estavam e os líderes dessa Colônia disponibilizaram dois pastores para irem à Europa auxiliar e trazer cerca de 50 famílias para o Brasil. Divididas em dois grupos, vieram da Ucrânia, não só ucranianos, mas também batistas russos e letos, que aproveitaram a ocasião para emigrarem juntos, para se fixarem nas proximidades da Colônia de Varpa47. Ambos os grupos chegaram ao Brasil em 192648. Um desses novos colonos que estava entre esses batistas era o pastor Simeon Molochenco, que alguns dias após sua chegada não continuou no interior de São Paulo e dirigiu-se a capital do estado. Estabeleceu contato com os missionários norte-americanos que lá estavam, entre eles o casal Bagby que já havia fundado o Colégio Batista Brasileiro com intuito de evangelizar os brasileiros através da educação. O casal de missionários disponibilizou as instalações do 43 Ibid., p. 79-86. 44 Ibid., p. 191-208. 45 O governo brasileiro preocupava-se com imigrantes vindos dessa região da Europa, pois poderiam vir com estes, o perigo da infiltração do esquerdismo bolchevista no país, além de que outros letos que estavam no Estado de São Paulo que se negavam a trabalhar nas fazendas em época de colheita. (Ibid., p. 210) 46 Ibid., p. 217. 47 Ibid., p. 317-319. 48 PEREIRA, op. cit., p. 244-245.
  • 17. 14 colégio para os trabalhos realizados pelo pastor Molochenco. Deste modo, em 1926, fundou a Primeira Igreja Evangélica Batista Russa de São Paulo. Passados alguns meses outros colonos batistas que trabalhavam no interior foram a São Paulo e integraram-se a essa nova comunidade. O objetivo de Molochenco era, assim como os demais batistas que aqui se encontravam, propagar o evangelho, principalmente entre os eslavos. Com sua visão missionária teve influência em trabalhos no interior de São Paulo e no estado do Paraná. No entanto, para aqueles que optaram por permanecer no interior do estado, os batistas letos que lá estavam criaram congregações para lhes fornecer “assistência espiritual”. Uma das congregações foi dirigida pelo pastor leto Karlis Grigorowitsch, que ficou como responsável pela celebração da Ceia do Senhor e ministrando batismos49. Os membros da Igreja Batista Leta entenderam que deveriam apresentar o evangelho a todos os eslavos que chegavam ao interior do estado de São Paulo, pois os missionários brasileiros não podiam fazê-lo pelo fato de não conseguir comunicar-se com estes imigrantes do leste europeu. Os letos, por falarem e entenderem melhor as línguas eslavas, sobretudo o russo, teriam maior facilidade em praticar o missionarismo dentre os eslavos, pois entendiam melhor seu idioma. Enquanto isso os mais jovens já conseguiam falar o português, o que proporcionou tanto o evangelismo de brasileiros, como dos imigrantes vindos de outras partes da Europa50. Assim, na década de 1920, há dois segmentos de atuação batista entre os eslavos; de um lado, o pastor Simeon Molochenco desenvolvendo evangelização com povos eslavos em várias partes de São Paulo e Paraná e, por outro, os letos, atingindo desde eslavos até os brasileiros no interior do estado de São Paulo51. Das três hipóteses levantadas para o surgimento dos batistas, a que melhor condiz com a origem dessa denominação é a versão que trata dos separatistas ingleses do século XVII. A “reforma puritana” praticada na Inglaterra desse período provocou transformações na política e na religião, possíveis de distinguir através de documentos referentes não só ao o aparecimento dos batistas, mas também de outros movimentos religiosos52. Os postulados da Reforma Protestante, praticada no século XVI53, foram todos complementares a essa cisão dos movimentos protestantes ingleses. Ao reforçarem os debates em torno da liberdade religiosa, 49 Ibid., p. 244. 50 RONIS, op. cit., p. 320. 51 PEREIRA, op. cit., p. 244-245. 52 AZEVEDO, Israel Belo de. A celebração do indivíduo: a formação do pensamento batista brasileiro. São Paulo: Editora Unimpe, 1996. p. 75-76. 53 A justificação pela fé, autoridade da bíblia e sacerdócio de todos os crentes. (Ibid., p.27)
  • 18. 15 os batistas criaram sua própria teoria política da separação entre Estado e Igreja54, criticando o modo como viviam na Inglaterra elisabetana e posteriormente na América do Norte. Este caráter político fez com que os grupos fossem perseguidos e empreendessem uma estratégia de expansionismo da denominação por meio do missionarismo visando a uma “sobrevida em outros locais”55. Ao contrário das comunidades anabatistas que, ao fugirem de perseguições religiosas, buscavam viver em comunidades isoladas, os batistas se diferenciavam pelo fato de empregarem uma “evangelização direta”, exigindo das pessoas que escutam a respeito de sua fé, uma tomada de decisão a respeito de sua crença. Deste modo, o missionarismo é empregado de forma individual por cada membro de uma comunidade batista. Esta característica, aliada à perseguição política empregada contra a denominação, fez as Igrejas se unirem em torno de associações voluntárias visando ao envio de missionários a outros locais para propagação de sua fé. Através destas associações as comunidades, independentes entre si, começaram a trabalhar em conjunto e a desenvolver uma consciência propriamente denominacional, desenvolvida posteriormente nos Estados Unidos56. Com o protestantismo de imigração, as comunidades batistas foram adentrando nos Estados Unidos e na Europa. À medida que os imigrantes iam chegando, as igrejas foram surgindo, sem começar de um centro específico, mas sim a partir de várias comunidades que aos poucos foram crescendo57. A teologia expansionista de missão veio a se desenvolver nos Estados Unidos, onde a partir da segunda metade do século XIX, as sociedades missionárias ampliaram sua atuação e enviaram missionários para vários locais, entre eles o Brasil, com intuito de propagar o evangelho pelo mundo e fornecer “salvação a outros indivíduos” 58. A existência de grupos religiosos denominados “eslavos” é muito intrigante, pois a reunião dessas várias etnias, nada homogêneas entre si, não pode ser feita de forma simples. As várias diferenças históricas, diversidades lingüísticas e suas distinções a respeito da religião, mostram que os “eslavos” diferem-se muito culturalmente. Dentre todos esses fatores, a marca religiosa acaba por separá-los ainda mais: os poloneses são católicos de rito latino, os russos e parte dos ucranianos pertencem ao catolicismo ortodoxo e outra parte dos ucranianos tornaram-se católicos uniatistas. Porém, ocorreu, na cidade de Curitiba, a congregação de todas essas etnias heterogêneas, em um mesmo espaço religioso. 54 Era pregada a liberdade de consciência, surgindo a idéia de “igrejas livres em sociedades livres.” (Ibid., p. 20) 55 Ibid., p. 79. 56 Ibid., p. 80. 57 Ibid., p. 116. 58 Ibid., p.151.
  • 19. 16 Pode-se observar a existência de cerimônias, na capital paranaense, que fornecem “assistência espiritual” a estes povos que é anterior ao início do desenvolvimento de suas atividades. Nesse sentido, podemos observar que houve primeiramente a conversão a uma outra religião, e o interesse destes em prosseguirem e organizarem-se em torno de uma profissão de fé comum, não se enquadrando mais no catolicismo latino, o ortodoxo ou o uniatismo. Com isto há a busca dos elementos que proporcionaram a congregação destas diferentes etnias em um mesmo espaço, de forma a dialogarem e como conseguir ou não abranger todas essas manifestações culturais tão divergentes. A maneira como se comunicavam ainda é muito importante, pois foi através dela que se diferenciaram, mantendo sua identidade perante os demais grupos. Ao cantarem e realizarem suas leituras bíblicas, os russos, poloneses e ucranianos empregavam seu próprio idioma e não o português. Isto proporcionou uma diversidade lingüística dentro da comunidade durante o período em que estiveram reunidos. Os batistas “eslavos” se preocuparam em desenvolver uma forte atuação missionária. Tiveram o propósito de levar o evangelho àqueles que não pertenciam à sua comunidade. Nesse sentido, nota-se que não se afastaram do convívio com outras pessoas pertencentes a sua etnia, mas buscaram a interação com elas através da propagação da sua fé, visando à expansão não só de suas crenças, como também da denominação batista na cidade, já que se preocupavam em alcançar aqueles que não eram brasileiros, e sim de sua mesma origem (poloneses, russos e ucranianos). Com isto contribuíam para propagar o evangelho, juntamente com as demais comunidades batistas. Para isso eram disponibilizados investimentos, através da entrega de folhetos, de Bíblias e visitas a casas de pessoas “eslavas” na cidade de Curitiba, objetivando fornecer-lhes “assistência espiritual” e também o convite a ingressarem nas atividades de sua Igreja. Os objetivos principais de discussão entre todos os membros da comunidade era o bem– estar que deveria haver através da comunhão de seus participantes, visando ao desenvolvimento e ao progresso de sua Igreja, principalmente no que diz respeito a evangelizar os “eslavos” que não pertenciam a sua comunidade de fé. O seio de uma comunidade batista fornece elementos, para que todos os que são membros da igreja, possam se pronunciar, colocar propostas, votar, etc. A partir disto é notável que em igrejas dessa denominação aconteçam discussões, várias reuniões para decisões consensuais e exclusão de membros que não aderem ao propósito maior da comunidade. Portanto, a partir do momento em que todos esses “eslavos” conseguem se comunicar, desejando desenvolver e propagar suas crenças, adicionaram uma prática religiosa
  • 20. 17 comum, que proporcionou uma “democracia”59 entre todos os membros, o que fornece a supressão de elementos antagônicos entre essas etnias. Isto proporcionou a coexistência e a relação desses “eslavos” em um mesmo espaço até um dado momento. Porém a partir do falecimento de membros mais antigos e o afastamento das tradições por parte das pessoas que continuaram na comunidade, mudaram-se as formas de se fazerem os trabalhos, culminando em 1978 quando a Igreja passou a chamar-se Igreja Evangélica Batista da Água Verde, e dedicar-se exclusivamente aos brasileiros. 59 PORTER, op. cit., p. 27-31.
  • 21. 18 2.1 Os “eslavos”: identificações e diferenças. Os “eslavos” podem ser inseridos em três designações: os orientais (russos, ucranianos e bielorussos), os ocidentais (polacos, tchecos e lusácios60) e os meridionais (eslovenos, croatas, sérvios, bósnios, montenegrinos, macedônios e búlgaros). Esses vários povos ocupam grande parte da Europa do leste e sudeste, estendendo-se da parte setentrional do continente asiático até o oceano Pacífico. Tendo como origem comum a Europa Central, estes grupos distintos podem ser caracterizados por individualidades que marcam destinos diferentes entre si. A partir da proximidade geográfica em que estão inseridos, é possível apontar para relações, identificações e diferenças evidenciadas entre esses diversos grupos a partir do século X61. Além de uma procedência geográfica comum, outro fator que os aproxima é uma linguagem de fundo aparentado: os idiomas eslavos têm procedência indo-européia62. Embora cada grupo tenha um dialeto próprio, a mesma origem morfológica permite a todas essas línguas eslavas serem semelhantes entre si, o que lhes possibilita a comunicação oral na própria língua “doméstica”. Entretanto, a grafia os divide: os eslavos de procedência ocidental usam o alfabeto latino, enquanto os eslavos orientais e meridionais distinguem-se por sua escrita cirílica. Diferentes também são algumas particularidades apresentadas pelos alfabetos, uma vez que alguns contêm letras ou sinais que outras escritas não empregam. Por exemplo: se de um lado russos e ucranianos utilizam-se da escrita cirílica, de outro, os ucranianos apresentam letras e sinais que os russos desconhecem63. A influência do Ocidente pode ser observada principalmente entre os poloneses, que aderiram ao catolicismo romano ainda no século X, quando Mieszko converteu-se ao cristianismo e a Polônia aderiu ao novo rito, deixando suas práticas pagãs. Assim, o latim se tornou a língua oficial da administração do reino64. Paralelamente, a influência oriental de Bizâncio atingiu e doutrinou a região dos Balcãs e chegou até o reino de Kiev. Logo, toda a área meridional e oriental da Europa, habitada pelos eslavos, converteu-se ao catolicismo sob sua forma grega65. Mas notam-se especificidades religiosas dentro da ortodoxia que movimentaram grupos distintos que buscaram novas formas de praticar sua religiosidade. Na 60 Os lusácios eram um pequeno grupo eslavo, constituído por sérvios, que vivem em regiões da Alemanha, como Brandemburgo e Saxônia. (PORTAL, Roger. Os eslavos, povos e nações. Rio de Janeiro: Editora Cosmos, 1968. p. 9) 61 Ibid., p. 9-11. 62 Ibid., p. 11. 63 Entrevista com Professora Dra. Oksana Boruszenko. 64 Ibid., p.79-80.
  • 22. 19 Ucrânia, houve uma parte de fiéis que optaram por ligar-se à autoridade pontifícia romana, estabelecendo acordos políticos com Roma. Porém, conservaram seu rito oriental e organização interna, ficando conhecidos como Uniatas de rito greco-católico66. Outra cisão aconteceu na Rússia do século XVII, quando o Sínodo de Moscou decretou a correção das traduções da Bíblia e Livros Litúrgicos utilizados pela Igreja Russa, o que proporcionou a revolta e conseqüente retirada daqueles que estavam decididos a dar continuidade em seus ritos antigos. Intitularam-se como únicos membros da antiga e verdadeira Igreja Russa, denominando-se “velhos crentes”67. O catolicismo e suas várias dissensões não foram as únicas formas de religião entre os eslavos. A conquista otomana dos balcãs, no século XIV, implantou a religião muçulmana entre alguns indivíduos dessa região, que se transformaram em súditos turcos68. Por ser um território muito vasto, toda a região do leste europeu também recebeu outras formas de culto durante e após o período da reforma protestante. Essas reformas ocorreram na medida em que grupos religiosos buscavam por um lado locais onde pudessem ter liberdade de praticar seus cultos, não sofrendo qualquer tipo de perseguição ou restrição a sua fé, e por outro, terras para o desenvolvimento de sua agricultura. Ainda, vários soberanos buscavam contingentes populacionais para preenchimento de territórios vazios, defesa de fronteiras e subseqüente crescimento agrícola e econômico dessas regiões não habitadas. Em conseqüência, é possível observar o estabelecimento de comunidades anabatistas no século XVI e XVII que se refugiaram desde as regiões da Galícia, até áreas como Prússia Oriental e Ocidental que então estavam sob o domínio da Polônia69. Esta que também fora fortemente influenciada pelo movimento hussista70. Após um período de resistência de seus soberanos católicos, a Polônia começa a abrigar ideais da reforma protestante, principalmente sobre a forma luterana e calvinista. Ao autorizarem o culto em seu aspecto “reformado”, possibilitando a igualdade de direitos e liberdade de consciência a adeptos de qualquer 65 Ibid., p. 44-46. 66 ANDREAZZA, Maria Luiza. Paraíso das Delícias. Estudo de um grupo imigrante Ucraniano 1895-1995. Curitiba, 1996. p. 81. 67 BALHANA, Altiva Pilatti & BORUSZENKO, Oksana. Alguns Problemas de Aculturação nos Campos Gerais. REVISTA DO MUSEU PAULISTA - Nova Série - Volume XIV, São Paulo, 1963. p. 324-325. 68 PORTAL, op. cit., p.13. 69 MASKE, Wilson. Os menonitas e a Construção do Novo Reino. HISTÓRIA: QUESTÕES E DEBATES, Curitiba, n. 28, 77-105 , 1998. p. 91-95. 70 Movimento que teve como precursor John Huss, que no início do século XV revolta-se e aponta para os abusos exercidos pelo clero no que diz respeito a venda de indulgências e os pesados impostos cobrados pela Igreja numa época de dificuldades econômicas. Após fuga, Huss aceita comparecer ao Concílio de Constança para defender suas idéias e é condenado a fogueira. Sua morte causa o aumento da agitação popular contra a Igreja e os governantes. Os motins favorecem a tomada do poder pela burguesia das cidades e essas diversas
  • 23. 20 religião, a Polônia é acusada de asilo de heréticos. Os judeus também se favorecem dessa situação pois o reino polonês conta com cerca de um milhão deles no reinado de Augusto III71. Essas questões abrem a possibilidade de refúgio e imigração de perseguidos religiosos na terra polaca72. Outra abertura para grupos religiosos adentrarem no leste europeu ocorreu em meados do século XVIII, quando a rainha Catarina II, da Rússia, publica um édito que convida alemães de diversas religiões para se estabelecerem nos territórios recém conquistados dos turcos. Várias colônias de alemães católicos e luteranos são estabelecidas na região da Ucrânia e no vale do Rio Volga. À proporção que restrições econômicas e religiosas dificultam a vida na Prússia, grupos de menonitas são encorajados a emigrarem e aos poucos se estabelecem entre a Prússia Ocidental e a Ucrânia e ao leste do rio Dnieper73. Ainda na primeira metade do século XIX, grupos desse mesmo segmento religioso dão continuidade ao estabelecimento de colônias no território russo. Nesse mesmo período, camponeses letos teriam deixado a condição de submissão em que se encontravam em latifúndios alemães e dirigiam-se para a região de Novgorod, na Rússia, para cultivarem terras próprias. Os batistas letos já haviam se instalado nos estados Bálticos no início do século e, agora, se dirigiam para terras russas visando melhores condições econômicas. Em fins do século XIX e início do século XX é possível identificar três igrejas batistas estabelecidas na capital do império Russo e uma na cidade de São Petersburgo, que foram estabelecidas por grupos alemães que chegaram anteriormente74. Neste mesmo momento também se observa o surgimento desta denominação na Ucrânia pela região leste do país, Dnipropetrovsk, Kharkiv, Odessa, Sebastopol, e sobretudo na Península da Criméia – Ialta, e na Rússia, de Saratov até Novosibirsk e Krasnoiarsk. Na Polônia havia comunidades batistas estabelecidas em Gdynia, Gdansk e Thorn75. No entanto, a falta de acesso a uma bibliografia mais especializada impede a melhor identificação da procedência desses grupos e melhor precisão nestas informações. Ao que tudo indica, a disponibilidade de terras nessas regiões do leste europeu, adicionado a dificuldades na vida material e religiosa, rebeliões duram ao longo de dez anos. Após negociações para manter os privilégios conquistados, o novo imperador Sigismundo termina com o conflito. (PORTAL, op. cit., p. 95-100) 71 Gozando dessa liberdade que não há em outros estados, os judeus conseguem estabelecer uma organização autônoma que possui escolas, bairros e justiça própria para cuidarem de seus próprios assuntos. Porém ainda situam-se as margens da sociedade e são constantemente desprezados pela população e explorados pela nobreza. (Ibid., p. 236-237) 72 Ibid., p. 218. 73 MASKE, op. cit., p. 98. 74 RONIS, Osvaldo. Uma Epopéia da Fé: História dos Batistas Letos no Brasil. Casa Publicadora Batista. Rio de Janeiro, 1974. p. 84-85. 75 Entrevista com Professora Dra. Oksana Boruszenko.
  • 24. 21 assim como os casos dos grupos menonitas, proporcionaram que estes grupos batistas emigrassem em busca de melhores condições de vida. Na medida em que suas comunidades se fixaram, alguns indivíduos buscaram oportunidades de trabalho nos grandes centros urbanos, estabeleceram igrejas e começaram a propagação de sua fé76. Todos esses fatores auxiliaram para que houvesse um contingente significativo de pessoas que professavam “outra” fé, mas evidentemente ainda muito menor do que as religiões oficiais, o que aumentou a efervescência de questões religiosas, políticas e econômicas dentro de cada estado. O fato do catolicismo latino e ortodoxo, já separados e em disputas entre si, não ser a única religião provoca o mal-estar entre o alto clero dessas igrejas, como também causa o desconforto daquelas minorias religiosas77. A Igreja ortodoxa, em fins do século XIX, já não dispõe do mesmo poder que antes. O reduzido número de igrejas e mosteiros num vasto território, que se estende do leste europeu ao interior do continente asiático, não atende a grande quantidade de ortodoxos existentes. Isso favorece que regiões distantes dos grandes centros urbanos, onde se concentra grande parte das organizações religiosas, tenham contatos com superstições e práticas pagãs. Deste modo, a ortodoxia é um rótulo empregado pela Igreja, em que a influência e poder do clero pode ser relativizado78. Esta situação adversa faz com que, a partir do século XX, haja uma diminuição expressiva da prática religiosa naquelas regiões. Sob advento do comunismo ateu há a redução do clero a proporções ínfimas, o fechamento de igrejas, mosteiros e seminários, o que contribui para enorme decadência religiosa entre toda população dentro da União Soviética79. Na região da Polônia, acontece o mesmo, pois alguns indivíduos das camadas populares começam a ver o clero como figura relacionada às classes senhoriais que os exploram. Isso favorece para que o poder da Igreja enfraqueça, pois agora os padres têm dificuldades em infiltrar idéias de submissão aos grupos mais pobres da população80. As divergências entre os eslavos não ficam somente em torno da religião. Durante muito tempo russos, poloneses e ucranianos são protagonistas de vários embates políticos, econômicos e sociais na região do leste europeu. Constantemente surgem desavenças entre os estados e seus componentes. Russos e polacos tem várias dissensões a respeito de territórios e disputas para reinar ou influenciar outros grupos de eslavos e povos alógenos. Desde o século XIV os estados Bálticos, sobretudo a região da Lituânia, é dividida entre esses dominadores. 76 RONIS, op. cit., p.85. 77 PORTAL, op. cit., p. 230-232. 78 Ibid., p. 299-301. 79 Ibid., p. 426-427.
  • 25. 22 Ora são governados pelos poloneses e existe uma forte pressão da religião ortodoxa sobre sua população. Ora são governados por russos e há uma “reconquista” por parte do catolicismo de rito latino81. Durante o século XVII, a guerra polaco-russa novamente mexeu com os aspectos geográficos dos estados. Soberanos do Estado Polaco-lituano propuseram uma aliança com o reino de Moscovo, que uniria os tronos e faria com que ambos os reinos futuramente se unissem em torno de apenas uma coroa. Essa proposta tinha como objetivo uma política externa e militar de paz e também traria vantagens nas questões de direitos religiosos e propriedade da terra. Como a proposta não foi aceita a guerra irrompeu. As conseqüências foram as mudanças de fronteiras, uma delas com parte do território da Ucrânia sob protetorado dos russos, e sucessivos conflitos entre as duas coroas82. O final do século XVIII trouxe a partilha do território polonês entre os estados da Prússia, Áustria e Rússia. Os ressentimentos causados por esta situação, estão aliados a uma crescente desconfiança do polonês para com o estrangeiro que tem interesses econômicos em seu território e que retira suas condições de participar da vida política de seu país e melhorar suas condições83. Ao mesmo tempo, inicia-se uma mobilização por parte de ucranianos, que estiveram durante muito tempo sob o jugo polaco, e esporadicamente conseguem se desvencilhar da opressão polonesa84. A partir do século XIX, sobretudo com o reinado de Alexandre I, enfatiza-se a idéia da Rússia como “polícia da Europa”, atuante ao longo de todo o leste europeu85. Grande parte do exército russo se ocupava em regiões fora de suas fronteiras, principalmente na Polônia e Finlândia, onde eram responsáveis pela manutenção da ordem e evitar sublevações desses povos86. Aspirações a uma independência por parte de poloneses frente ao governo russo, fizeram os conflitos e a repressão aumentarem durante todo o século XIX, de modo a acentuar as rivalidades entre esses povos. Nesse mesmo sentido é plausível a união de populações pobres constituídas de ucranianos e polacos contra as forças do czar que lhes tiram a 87 independência . A Ucrânia, nesse período, cujo progresso econômico se expande em larga escala, também está dividida entre estrangeiros: os reinos da Áustria e da Rússia. A vasta região que 80 WACHOWICZ, Ruy Christovam. O camponês no Brasil. Curitiba: Fundação Cultural, Casa Romário Martins, 1981. p. 55-56. 81 Ibid., p. 62-65. 82 Ibid., p. 152. 83 WACHOWICZ, op. cit., p. 10-11. 84 PORTAL, op. cit., p. 14. 85 KENNEDY, Paul. Ascensão e queda das grandes potências: Transformação econômica e conflito militar de 1500 a 2000. Rio de Janeiro: Campus, 1989. p. 168. 86 Ibid., p. 170.
  • 26. 23 abriga o território ucraniano ainda sofre uma forte mistura de populações eslavas, pois grande parte de trabalhadores é recrutada fora de seu território88. Todos esses fatores contribuem para um acirramento de ânimos por parte dos grupos locais que necessitam se submeter a estrangeiros em diversos segmentos da sua vida política e econômica, conseguindo apenas manter intacto alguns de seus costumes culturais e sua língua. Ou seja, desde o início do século XIX tanto poloneses como ucranianos são contrários as forças de assimilação e russificação do czarismo. Todas estas características conflituosas entre estes eslavos se farão muito presentes ao longo do século XX. Ainda no início desse período, o exército do czar estava ocupando regiões ao longo do leste europeu e sufocando minorias étnicas polonesas, ucranianas, finlandesas, georgianas, lituanas, estonianas, armênias etc., que buscavam preservar as hesitantes concessões sobre a “russificação” obtidas na fase de debilidade do regime czarista, resultante da guerra Russo-Japonesa e das insurreições promovidas nos anos de 1905-190689. Após a Primeira Guerra também houve várias modificações territoriais que deixaram vários grupos étnicos fora das fronteiras de seus estados de origem, causando vários conflitos internos e ressentimentos externos90. A situação se agravou quando, depois do término da Segunda Guerra, as fronteiras soviéticas ampliaram-se às custas dos territórios dos estados Bálticos, da Polônia, Ucrânia, entre outros91. Os líderes da U.R.S.S. ainda seriam acusados, ao longo da década de 1960 e 1970, de muitos crimes cometidos contra as identidades nacionais desses povos. Grandes intelectuais, que representavam idéias de liberdade em prol dos costumes de seus países, teriam sido presos, torturados e até mortos pelo regime soviético. Núcleos que abrangiam a cultura e a história dessas repúblicas, como museus e bibliotecas, teriam sido saqueados, queimados, destruídos, total ou parcialmente92. Todos esses episódios marcam uma trajetória de conflitos existentes entre esses diferentes grupos étnicos. Os eslavos têm mais diferenças do que semelhanças e uma história separada modelaram tradições, gêneros de vida e uma mentalidade que os caracteriza de forma muito distinta93. 87 PORTAL, op. cit., p. 357. 88 Ibid., p. 274-277. 89 KENNEDY, op. cit., p. 231. 90 Ibid., p. 280. 91 Ibid., p. 346. 92 HANEIKO, Valdemiro Pe. Em defesa de uma cultura. Rio de Janeiro: Cobrag, 1974. 93 PORTAL, op. cit., p. 21.
  • 27. 24 2.2 Imigrações eslavas para o Brasil. As políticas imigratórias no Brasil remontam a inícios do século XIX. O governo brasileiro, nesse período, buscava a introdução de imigrantes no país como uma forma propícia para mudança de vários parâmetros nacionais. As idéias de “branqueamento” da população tomam forma quando, ainda na época de colônia, o país sofreu com sucessivos levantes de escravos. O perigo representado pelo negro toma conta das elites nacionais e uma ideologia racista é combinada com idéias da construção de um novo país, onde acreditava-se, que a raça branca, introduzida através da imigração, traria progresso94. Parte das terras destinadas aos imigrantes foi designada como “devoluta”. Tais áreas eram de procedência indígena ou localizações estratégicas das fronteiras nacionais. Logo os colonos estrangeiros têm a posse de territórios que devem ser não só cultivados para o desenvolvimento econômico da região, como também para defesa desta contra eventuais ataques estrangeiros e indígenas. Assim, a questão imigratória também foi motivada pela segurança nacional, pois lugares desprovidos de populações são habitados e protegidos pelo estabelecimento de colônias de imigrantes95. Estes elementos também foram utilizados pelo governo brasileiro para proporcionar a valorização dessas terras. O trabalho do colono valorizou não só o local em que a colônia estava situada, mas de igual modo toda a área vizinha. De modo geral, os núcleos coloniais estavam situados em locais de difícil acesso. Isto fez com que o estrangeiro se ocupasse em abrir e conservar estradas, criando melhores condições para toda a região e conseqüentemente aumentando o valor das terras desses locais. Por outro lado, muitas dessas colônias não conseguiram se desenvolver justamente em função das dificuldades de acesso a esses locais. Além de todas estas questões, destaca-se a mão-de-obra barata que se buscava atrair como força de trabalho para as regiões latifundiárias96. Na medida em que a crise do sistema escravocrata aumenta ao longo do século, o imigrante é visto como saída para suprir o trabalho do negro de outrora97. 94 DREHER, Martin N. Protestantismo de imigração no Brasil: Sua implantação no contexto do projeto liberal-modernizador e as conseqüências desse projeto. IN: DREHER, Martin N. Imigrações e história da Igreja no Brasil. Aparecida SP: Editora Santuário, 1993. p. 112-113. 95 Ibid. , p. 114-115. 96 Ibid. , p. 116-117. 97 BEOZZO, José Oscar. As igrejas e a imigração. IN: DREHER, Martin N. Imigrações e história da Igreja no Brasil. Aparecida SP: Editora Santuário, 1993. p. 9-11.
  • 28. 25 O fator “migração” pode ocorrer quando há a necessidade de preencher um “espaço vazio”98. A busca por este espaço pode ser por motivações políticas, econômicas, sociais ou religiosas. Geralmente o emigrante busca melhorar suas condições de vida em outro local, pois a sua própria foi desestruturada por algum desses motivos ou a soma deles99. O século XIX é formado por um quadro em que há várias transformações, sobretudo na economia em escala internacional. A revolução industrial e suas conseqüências modificaram a divisão do trabalho entre as nações. Novas tecnologias, mudanças nos padrões de comercialização de produtos e principalmente a incorporação de novas terras para plantio, provocaram o colapso nas zonas rurais da Europa. Milhões de pessoas são colocadas às margens desse sistema. Na medida em que não conseguem incorporar-se ao novo sistema industrial e agrícola agora existentes, acabam emigrando para mudarem suas condições100. As camadas populares do leste europeu, viviam em condições de submissão local e tinham ainda relações com a aristocracia que lembravam o feudalismo. Desprovidos de condições políticas e econômicas favoráveis, no camponês o anseio de ser senhor de si mesmo, uma das formas de mobilidade social encontrada era a emigração101. As tensões sociais encontradas nessa região da Europa impulsionam grupos de eslavos a emigrarem, sobretudo os poloneses e ucranianos, responsáveis pela formação de várias colônias no sul do Brasil e principalmente no território paranaense. Na Europa, os ucranianos foram desprovidos da posse de terras destinadas a sua sobrevivência, como também foram impedidos de ter acesso a terras comunais102. Apesar de reformas feitas pela coroa austríaca visando a limitar o poder da aristocracia e favorecer os camponeses, estes continuaram a serem forçados a trabalhar mais em períodos anteriores a colheita e preparo do feno. As mudanças feitas pelo governo pouco ajudaram para uma maior mudança na relação entre as camadas populares e seus nobres, o que gerou um clima de tensão ao longo do século XIX103. A situação dos poloneses também era de dificuldade. Foram atingidos por uma reforma agrária que diminuiu o tamanho de suas terras, o que dificultou sua condição de vida. Agora, além de trabalhar em sua propriedade, o camponês teve que procurar trabalhos alternativos fora de suas posses para complementar seu sustento. Adicionado a esta situação está a grave 98 MENDONÇA, Antonio Gouvêa. Protestantes na diáspora: A imigração européia enorte-americana e as igrejas evangélicas no Estado de São Paulo. IN: DREHER, Martin N. Imigrações e história da Igreja no Brasil. Aparecida SP: Editora Santuário, 1993. p. 138. 99 Ibid. , p. 138-139. 100 BEOZZO, op. cit., p. 14-16. 101 ANDREAZZA, op.cit., p. 14-16. 102 Florestas e campos de pasto que eram utilizados coletivamente pelas aldeias. (Ibid., p. 20)
  • 29. 26 crise econômica procedente de fenômenos climáticos, que prejudicaram as colheitas, e da Guerra da Criméia104, que trouxe transtornos com relação à alta do preço e falta de alimentos, pois estes que eram dirigidos para abastecimento do exército russo. A subalimentação da população polaca, causada por esses fatores, trouxeram epidemias de cólera, tifo e disenteria 105 . Todas essas situações vividas no leste europeu, principalmente por poloneses e ucranianos, foram fatores de emigração. E, nesse cenário, o Novo Mundo se destaca no imaginário destes povos como “Terra Prometida”106, onde a idéia principal de “fazer” a América surge como um sonho que pode se tornar real. O Brasil aparece, ao lado dos Estados Unidos e da Argentina, como país que mais recebeu imigrantes107. Em fins do século XIX, estes dois países da América do Sul chegaram a receber em média 200 mil imigrantes por ano, provindos de várias partes do mundo108. No caso brasileiro o impulso para que essas massas de imigrantes viessem ocorreu por alguns fatores: a terra em abundância destinada aos colonos e, a partir da década de 1890, o transporte marítimo gratuito oferecido pelo governo109. Deste modo a chegada de poloneses e ucranianos no Brasil ocorre a partir de meados do século XIX, aumentando em fins desse período. O século XX igualmente traz levas desses imigrantes, porém em muito menor escala. A emigração de russos para o Brasil já acontece de outra maneira. Esses praticaram a emigração de forma individualizada ou em pequenos grupos e sempre misturados com outros grupos de eslavos110. Isto ocorre pelo fato de que, desde meados do século XIX, os elementos cujo governo russo reprime e persegue são destinados a povoar a região da Sibéria. Este território pode ser visto, sobretudo em fins desse período, com uma vasta rede ferroviária que 103 ANDREAZZA, op.cit., p. 18-20. 104 Um conflito militar que aconteceu em meados da década de 1850, envolvendo a Rússia, a França, o reino de Piemonte-Sardenha, o império Turco-Otamano e o Reino Unido. A guerra tinha como intuito refrear a expansão russa sobre a região dos Bálcãs. (KENNEDY, op. cit., p. 168-175) 105 WACHOWICZ, op. cit., p. 36. 106 ANDREAZZA, op.cit., p. 14. 107 SCARANO, Julita.O Imigrante nas terras do café. IN: DREHER, Martin N. Imigrações e história da Igreja no Brasil. Aparecida SP: Editora Santuário, 1993. p. 160. 108 HOBSBAWN, Eric. A era dos impérios: 1875-1914. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1988. p. 58. 109 WACHOWICZ, op. cit., p. 40. 110 Havia uma única imigração oficial de russos para o Brasil. Os chamados “russos brancos”, denominados como “velhos crentes”, eram provenientes de um cisma da Igreja Ortodoxa na Rússia, que foram perseguidos por fatores religiosos e fixaram-se na Sibéria. Após vivenciarem conflitos pelas revoluções bolchevistas, foram obrigados a emigrar e refugiaram-se em províncias da China. Depois de trinta anos estabelecidos ali, se sentem novamente ameaçados pelo advento do comunismo e, em 1953, recorrem às Nações Unidas solicitando ajuda para emigrarem para países livres, onde pudessem dar continuidade a suas tradições. Em 1958 chegam às primeiras famílias de “russos brancos”, como ficaram conhecidos, ao Brasil e instalam-se na região dos Campos Gerais, no Paraná. (BALHANA & BORUSZENKO, op. cit., p. 324-326.)
  • 30. 27 liga o extremo leste do continente asiático à capital russa111. Além do crescimento econômico, a Sibéria também se torna uma área povoada e rapidamente é vista como o segundo celeiro do império, ficando atrás apenas da Ucrânia112. Esse fator indica as razões da escassez de grandes grupos emigrantes russos. Todos os revoltosos e contrários às políticas do governo são enviados à Sibéria como forma de punição. Há várias dificuldades para conseguir sair pelas fronteiras do império czarista e mais tarde da União Soviética. No início do século XX a emigração do leste da Europa ainda é intensa, sobretudo de ucranianos113. Porém, após o início da Primeira Guerra Mundial e da Revolução Russa o número de pessoas que deixam a região se torna muito menor. A evasão era ainda mais difícil e a região siberiana continua a receber cada vez mais levas de grupos eslavos e povos alógenos provindos de dentro da fronteira das Repúblicas Soviéticas114. No período entre guerras desenvolve-se a imigração no Brasil dos primeiros batistas eslavos. Partem da Ucrânia 50 famílias, não só ucranianos, mas também batistas russos e letos, que aproveitaram a ocasião para emigrarem juntos, e chegam ao Brasil no ano de 1926115. Este grupo específico foge do comunismo e das dificuldades vividas nesse momento de turbulência européia. Foram indivíduos dessa imigração particular que iniciaram os trabalhos de propagação do Evangelho na cidade de Curitiba. Ainda no período entre guerras, também chegam pequenos grupos de eslavos que emigraram para o Brasil. Graças a esse pequeno contingente de pessoas chegadas à capital paranaense, aliado aos trabalhos missionários da Primeira Igreja Batista Russa de São Paulo, foi formada, na década de 1930, na cidade de Curitiba, a Congregação Batista Eslava. O movimento migratório de eslavos torna a crescer após o término da Segunda Guerra Mundial. Aqueles que chegam à América provem de regiões que estão fora dos domínios soviéticos e requereram às Nações Unidas o seu desejo de emigrar para locais que não fosse seu país de origem, fugindo assim do comunismo. Deste modo todos os eslavos, sobretudo russos, que se encontram fora do domínio das Repúblicas Soviéticas conseguem estabelecer- se em novos territórios. Em Curitiba, podemos observar a chegada de grupos constituídos por esses povos no ano de 1949116. Em virtude dessa imigração a Congregação Batista Eslava aumentará seus trabalhos missionários na capital paranaense e no ano de 1955, já com mais membros, organizar-se-á na Primeira Igreja Evangélica Batista Eslava de Curitiba. 111 PORTAL, op. cit., p. 274. 112 Ibid. , p. 274. 113 ANDREAZZA, op.cit., p. 92. 114 Entrevista com Professora Dra. Oksana Boruszenko. 115 PEREIRA, José Reis. História dos Batistas no Brasil. Rio de Janeiro: JUERP; 2001. p. 244-245.
  • 31. 28 3.1 Primeira Igreja Batista Eslava de Curitiba – motivações étnicas? No início da década de 1930, a Primeira Igreja Evangélica Batista Russa de São Paulo iniciou um trabalho missionário na cidade de Curitiba. Ao enviar alguns pastores e evangelistas à capital paranaense, visava à pregação do evangelho a todas as pessoas de “etnia eslava”. Identificadas algumas famílias que se dispunham a ouvir a mensagem trazida pelos evangelistas, eles começaram a realizar cultos nas casas destas pessoas, distribuindo Bíblias e outras literaturas com intuito de proclamar a “salvação em Cristo”. Deste modo, conseguiram desenvolver seu trabalho de evangelização, pois as famílias se identificavam pela forma como eram tratadas: comunicavam-se com o pastor e outros missionários em seu próprio idioma. Como os idiomas eslavos são parecidos entre si, houve a possibilidade desses eslavos dialogarem utilizando tanto a língua russa, como o ucraniano e o polonês. Conforme o trabalho foi progredindo, a empatia entre eles aumentou, e já nos primeiros anos da década de 1930 alguns foram aceitando a mensagem que lhes era pregada. Na medida em que foram se convertendo, russos, ucranianos e poloneses foram batizados e arrolados como membros da Primeira Igreja Batista de Curitiba, a única Igreja Batista, até então, na cidade. Embora freqüentassem os cultos desta Igreja, alguns destes eslavos tinham certa dificuldade de entenderem o português, o que comprometia o melhor aprendizado das mensagens transmitidas pelos brasileiros. Assim, apesar de serem batizados na Primeira Igreja, continuaram a realizar seus cultos em suas próprias residências, com o objetivo de aprenderem os ensinamentos bíblicos em russo, ucraniano e polonês, conservando portanto seus idiomas. Já que empregavam essas línguas em suas atividades religiosas, passaram a convidar os familiares, vizinhos e conhecidos que ainda não haviam aderido ao evangelho para também ouvirem a mensagem. Como esses eslavos em sua maioria eram católicos de rito latino ou ortodoxo, tinham receio de serem excomungados pelo seu comportamento, seja pela sua nova devoção, seja por freqüentarem outra igreja117. Ao serem convidados para irem à residência de um parente, vizinho ou amigo, não precisando ir até a Primeira Igreja Batista de Curitiba, sentiam-se mais à vontade em comparecer apenas nos locais onde as reuniões eram realizadas. As mensagens trazidas em uma língua que todos os eslavos presentes pudessem melhor compreender atraíram vários visitantes, de forma que sempre havia a presença de pessoas “crentes e não crentes” para participar dos trabalhos. Logo alguns destes visitantes que freqüentavam os cultos também se converteram. Alguns se batizaram na Primeira Igreja 116 Entrevista com Professora Dra. Oksana Boruszenko. 117 Entrevista 1.
  • 32. 29 Batista de Curitiba e se tornaram membros desta Igreja. Como o número de russos, poloneses e ucranianos “convertidos” aumentou, em 1934 organizaram a Congregação Eslava de Curitiba, com intuito de continuarem a se reunir e propagar ainda mais o evangelho entre estas etnias. Nessa mesma ocasião, alguns indivíduos foram batizados pelo pastor Simeon Molochenco na Primeira Igreja Batista de Curitiba. Porém, estes recém batizados foram inclusos no rol de membros da Igreja Russa em São Paulo, que implantou a nova congregação e era a responsável por fornecer “assistência espiritual” e material a seus novos membros na capital paranaense. Periodicamente missionários vinham de São Paulo para celebrar batismos e a Santa Ceia para esses batistas. Os “batistas eslavos” prosseguiram se reunindo nas casas dos membros da recém formada Congregação, porém as residências não comportavam todos os indivíduos pertencentes ao grupo, de forma que essas reuniões começaram a ser feitas apenas durante a semana. Tendo em vista o aumento do número de pessoas que assistiam às reuniões, houve a necessidade de congregar em um local maior, para melhor acomodação das pessoas que desejavam participar dos trabalhos eclesiásticos realizados. A Primeira Igreja Batista de Curitiba disponibilizou suas dependências para que estes “batistas eslavos” pudessem desenvolver suas atividades religiosas aos domingos à tarde. Aqueles eslavos que haviam sido batizados antes da organização da Congregação Eslava de Curitiba e estavam integrados à membresia da Primeira Igreja Batista de Curitiba, foram transferindo-se para o rol de membros da Primeira Igreja Evangélica Batista Russa de São Paulo, que era a comunidade responsável pela congregação eslava. Com o passar dos anos, estas pessoas desligaram-se aos poucos dos trabalhos juntos aos brasileiros, dando prioridade aos cultos que eram dirigidos, nas residências e aos domingos à tarde, em língua russa, polonesa e ucraniana. Deste modo, estas etnias criaram um espaço à parte dos brasileiros, fornecendo “assistência espiritual” e dirigindo seus serviços religiosos em idiomas próprios. Essa manifestação de uma “consciência de separação e de formas de interação”118 entre os “batistas eslavos” e os “batistas brasileiros” foi desenvolvido dentro da Primeira Igreja Batista de Curitiba, na medida em que os primeiros se converteram a essa religião e iniciaram a convivência com os brasileiros. Como não conseguiram integrar-se completamente aos trabalhos dessa comunidade, pois não se sentiram à vontade com o idioma que era 118 POUTIGNAT, Philippe & STREIFF-FENART, Jocelyne. Teorias da Etnicidade; seguido de Grupos Étnicos e suas Fronteiras, de Fredrik Barth. São Paulo: Fundação Editora da UNESP, 1998.p. 124.
  • 33. 30 empregado, ficaram à parte dos demais membros da Igreja e em grupo separado119, realizavam cultos próprios. Por outro lado, os membros da Primeira Igreja, ao notarem que estas pessoas não compreendiam perfeitamente o português e que formavam um grupo próprio, os denominavam “irmãos ukrainos”120. Essa atribuição englobava todos os eslavos e se dá pelo fato de que a Congregação Eslava de Curitiba estava sendo representada por alguns membros que eram ucranianos, e seriam as responsáveis por tratar e intermediar, com o pastor da Primeira Igreja, com as assembléias de membros dessa comunidade e a sua “igreja mãe” em São Paulo, todas as questões que diziam respeito aos trabalhos eclesiásticos da Congregação. Assim, os brasileiros identificaram os “batistas eslavos” como um grupo que estava separado, por um idioma e uma cultura diferente da sua, o que possibilitou a criação de grupos que conviviam num mesmo espaço e que se diferenciavam uns dos outros. “A formação de grupos étnicos ocorre quando se dá uma atribuição categorial que classifica as pessoas em função de sua suposta origem e que se acha validada na interação social pela ativação de signos culturais socialmente diferenciadores”121. Os eslavos identificaram-se e foram identificados pelos brasileiros na base de uma dicotomia Nós/ Eles, estabelecidas a partir de traços culturais que se supõem derivados de uma origem comum122. Uma das formas pela qual houve identificação entre estes eslavos foi a proximidade de seus idiomas, havendo melhor compreensão entre as línguas russa, ucraniana e polonesa do que com o português. Por não falarem corretamente e não entenderem por completo a língua portuguesa e usarem outros idiomas que os brasileiros não entendiam, foram tratados como estrangeiros e denominados como “ukrainos”. Deste modo os membros do grupo eslavo iniciaram uma demarcação de uma fronteira étnica através da língua123. Mas, nesse primeiro momento, não foi apenas esse fator que os diferenciou dos brasileiros124. Todos estes russos, ucranianos e poloneses eram recém-convertidos e ainda não tinham amplo conhecimento de todas as doutrinas batistas, sendo necessário “mais tempo na fé” para que fossem doutrinados e conhecessem melhor os mandamentos da denominação. 119 Ibid., p. 123. 120 Ata da Primeira Igreja Batista de Curitiba, Livro 4, p. 13. 121 POUTIGNAT, Philippe & STREIFF-FENART, Jocelyne, op. cit., 141. 122 Ibid., p. 141. 123 Ibid., p. 51. 124 Nas análises discutidas por POUTIGNAT e STREIFF-FENART, tanto a língua, como território, ou outros atributos em comum, não podem ser fatores únicos pelos quais um grupo étnico forma fronteiras para distinguir- se dos demais grupos que estão ao seu redor. Estes elementos apenas representam atributos étnicos quando utilizados “como marcadores de pertença por aqueles que reivindicam uma origem comum”. (Ibid., p. 163)
  • 34. 31 Além desses fatores que ocorreram dentro da Primeira Igreja Batista de Curitiba, é significativo que alguns eslavos, ao migrarem para o Brasil, vieram em condições muito semelhantes. Todos os eslavos que se “converteram ao evangelho” em Curitiba saíram de seu lugar de origem por receio de eventuais conflitos que estariam por vir sobre toda Europa125. Algumas dessas pessoas conheceram-se na viagem ao Brasil e estabeleceram relações de amizade ao longo da travessia do Atlântico126. Outros, no momento em que se estabeleceram na capital paranaense, ao exercerem uma mesma atividade econômica, ou habitarem próximos uns aos outros, acabaram criando relações entre si127. Quando esses indivíduos deixaram de viver nos locais com que estavam habituados e se acharam diretamente confrontados com uma outra sociedade, suas especificidades culturais tornaram-se fontes de uma mobilização coletiva, o que desenvolveu uma “etnicidade simbólica” entre eles128. Deste modo, através da imigração, essas pessoas forjaram uma origem em comum e por conta das dificuldades que encontraram em Curitiba, foram inclusas num grupo étnico que estava separado da sociedade brasileira129. No início da década de 1930, estes eslavos, já estabelecidos na capital paranaense, tiveram mais um ponto em comum com o qual puderam criar suas identificações. Ao serem alvo do missionarismo batista, sentiram–se bem acolhidos130 por ele e com o tempo mudaram suas convicções religiosas. Tendo “assistência espiritual” através de cultos, Bíblias e folhetos evangelísticos, em um idioma no qual entendiam a mensagem pregada, aos poucos alguns 125 Todos os entrevistados relatam que o fator principal de seus pais e/ ou avós emigrarem foi um grande rumor gerado por ocasião de conflitos militares que iniciariam em toda a Europa, sobretudo no leste europeu onde se encontravam. Como houve possibilidade de virem para o Brasil, alguns chegaram com suas famílias, ou grupo de amigos e outros vieram sozinhos. 126 É o caso de duas famílias com o mesmo sobrenome Ghenov e que não tinham nenhum tipo de parentesco. Por terem o mesmo sobrenome, conheceram-se no navio que trouxe imigrantes do leste europeu ao Brasil. Uma família estabeleceu-se em Curitiba e a outra no interior do estado de São Paulo, para cultivar as lavouras de café. Depois que os filhos cresceram, a família que estava no interior de São Paulo veio encontrar os que estavam em Curitiba para casar um dos filhos. Apesar de não habitarem nos mesmos locais, ambas as famílias haviam “se convertido ao evangelho” e eram frutos do missionarismo batista empregado entre os eslavos do interior de São Paulo e Curitiba. Esses fatores fizeram com que houvesse uma identificação entre essas pessoas, partilhando uma mesma experiência imigratória, um nome e uma “fé” em comum. (Entrevista 5) 127 Muitos desses imigrantes trabalhavam na abertura de estradas e ficavam longe de suas casas e famílias. Ao trabalharem um grande período de tempo juntos, acabavam se conhecendo e se comunicando num idioma próximo ao seu, constituindo relações de proximidade. Da mesma forma outros, ao residirem em um mesmo bairro, identificavam-se como imigrantes e criavam afinidades. Um exemplo ressaltado a partir dessas condições, são os casamentos realizados entre esses imigrantes. Na década de 1930, todos os entrevistados apontam que seus pais casavam-se com indivíduos que também vieram do leste europeu. (Entrevista 1) 128 POUTIGNAT, Philippe & STREIFF-FENART, Jocelyne, op. cit., p. 78. 129 Ibid., p. 71-72. 130 Os depoentes indicam que os eslavos criaram uma empatia com os missionários, pelo fato de que conseguiam comunicar-se num idioma comum ou muito próximo do seu. Sempre que isso acontecia ficavam contentes por terem uma pessoa com a qual pudessem conversar. Isso teria facilitado a abertura de suas residências para que as pessoas tivessem interesse e pudessem ouvir a mensagem que lhes era transmitida. Além disso, há o caso de um
  • 35. 32 indivíduos aderiram a uma nova forma de crença. Essa mudança de religião proporcionou o reforço de uma solidariedade étnica no meio destes eslavos131. Através dos cultos empregados nas residências de algumas famílias, logo tiveram o interesse de propagar o evangelho aos outros imigrantes de “sua mesma origem”. Eis o fator pelo qual foi possível a fundação da Congregação Eslava de Curitiba e o conseqüente crescimento do grupo. Os membros da Primeira Igreja Batista de Curitiba, ao entrarem em contato com pessoas que tinham costumes e tradições distantes dos seus, não se preocuparam em identificar russos, poloneses e ucranianos no âmbito dos “irmãos ukrainos”. Com efeito, ao perceberem que os recém chegados à comunidade tinham traços culturais diferentes dos seus, sobretudo o idioma, rotularam-nos por meio de uma identificação que abrangesse a todos de uma forma simples, ignorando suas especificidades nacionais, culturais e lingüísticas132. Para dar conta do que os unia, os novos convertidos que entraram na Primeira Igreja Batista designaram-se como “eslavos”. Esta indicação amenizava suas dissensões e também fazia com que se identificassem dentro de uma mesma origem. Ambas atribuições cooperaram, mais uma vez, por criar uma solidariedade real entre as pessoas assim designadas, pois em decorrência destas denominações, “irmãos ukrainos” ou “eslavos”, eram tratados de forma igual pelos membros da Primeira Igreja Batista de Curitiba, bem como entre si 133. São todas essas características, portanto, que definiram o grupo religioso como um grupo étnico eslavo, que emergiu da diferenciação cultural entre agrupamentos que interagiam em um contexto de relações interétnicas134. A Congregação Eslava de Curitiba reuniu-se nas dependências da Primeira Igreja Batista de Curitiba até por volta do início da década de 1940. A partir do ano de 1936, começa-se uma discussão entre os membros eslavos e brasileiros com relação à utilização do salão de cultos da Primeira Igreja Batista. Como as reuniões dessa Congregação eram realizadas aos domingos à tarde, os zeladores da Igreja necessitavam arrumar o salão para os cultos da noite e ficavam impossibilitados de terem um período de lazer com sua família. Esta dificuldade fez os membros da Igreja disponibilizarem outro salão para que os eslavos desenvolvessem suas atividades religiosas135. Em um espaço menor, estes não demoraram a solicitar novamente o salão principal da Igreja, pois lá conseguiam acomodar-se de maneira missionário, Nicon Danilenco, que ensinou seu ofício de fabricar doces e balas e ao mesmo tempo lhes fornecia “assistência espiritual.” 131 POUTIGNAT, Philippe & STREIFF-FENART, Jocelyne, op. cit., p. 163. 132 Ibid., p. 144. 133 Ibid., p. 145. 134 Ibid., p. 82. 135 Ata da Primeira Igreja Batista de Curitiba, Livro 4, p. 49-50.