Sentença condena autor por litigância de má-fé em mandado de segurança contra autuação de trânsito
1. ESTADO DE SANTA CATARINA
PODER JUDICIÁRIO
Comarca de Xanxerê
2ª Vara Cível
Autos n° 080.13.003499-1
Ação: Mandado de Segurança/Lei Especial
Impetrante: Felipe Scatolin
Impetrado: Delegado Regional da 16ª Circunscrição Regional de Trânsito - Ciretran
SENTENÇA
Vistos, etc.
Trata-se de Mandado de Segurança impetrado por FELIPE SCATOLIN
contra ato do SR. DELEGADO REGIONAL DA 16ª CIRCUNSCRIÇÃO REGIONAL DE
TRÂNSITO - CIRETRAN. Aduz que estaria sendo punido com a perda da CNH por infração
de trânsito, mas que não teria sido notificado acerca da autuação da infração, tampouco teria
sido notificado acerca da penalidade.
Defende ainda que não houve procedimento administrativo para a punição,
com ampla defesa e contraditório.
Requereu liminar para suspender o cancelamento de sua CNH. Pugnou, ao
final, pela concessão da segurança, anulando-se a decisão administrativa de imposição de
penalidade de perda da CNH.
Deferida a liminar (fls. 36/38).
A Autoridade Coatora prestou informações às fls. 45/70, afirmando, em
síntese, que o impetrante foi devidamente notificado. Sustentou a regularidade do
procedimento adotado, eis que ao permissionário não se aplicam as mesmas regras daqueles
que possuem a CNH definitiva, não sendo necessário processo administrativo. Requereu fosse
denegada a segurança pretendida.
O Ministério Público se manifestou pela denegação da segurança e
condenação do impetrante em litigância de má-fé (fls. 78/79).
O impetrante se manifestou às fls. 80/94.
Vieram-me os autos conclusos.
É o relatório necessário.
DECIDO.
Os fundamentos apresentados pelo impetrante foram, em síntese, três: 1ausência de notificação do auto de infração; 2- ausência de notificação da aplicação da sanção;
3- ausência de processo administrativo para cassar a habilitação, que assegurasse o
contraditório e a ampla defesa.
Passo a analisar cada um dos argumentos.
Em relação ao auto de infração, o autor foi devidamente notificado da
autuação, eis que ela se deu em flagrante. O autor foi parado por policiais militares que fizeram
o auto de constatação de embriaguez (fl. 58), sendo que o autor inclusive assinou tal
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documento (parte inferior da fl. 58).
No auto de infração (fl. 57) consta que o autor se recusou a assinar.
Entretanto, a recusa em assinar não altera o fato de que o autor teve pleno conhecimento da
autuação, o que é obvio, pois a autuação ocorreu em situação de flagrante.
Sobre a questão, cito nosso Tribunal:
"Assevera a Súmula 312, do Superior Tribunal de Justiça, que, "no processo
administrativo para imposição de multa de trânsito, são necessárias as
notificações da autuação e da aplicação da pena decorrente da infração".
Nesse sentido, "após a lavratura do auto de infração, haverá indispensável
duas notificações, ou seja, a primeira quando da lavratura do auto de
infração se a autuação ocorrer em flagrante, ou, por meio do correio,
quando a autuação se dê à distância ou por equipamentos eletrônicos. A
segunda, notificação deverá ocorrer após julgado o auto de infração com a
imposição da penalidade" (STJ, REsp 613728/RS, Rel. Ministro Franciulli
Netto, j. 15/04/2004). (TJSC, Reexame Necessário em Mandado de
Segurança n. 2008.070027-6, de Joinville, rel. Des. José Volpato de Souza, j.
10-9-2009). RECURSO CONHECIDO E PROVIDO. (TJSC, Apelação
Cível n. 2011.080755-6, de Joinville, rel. Des. Júlio César Knoll, j.
07-02-2013).
Assim, resta claro que a notificação da autuação ocorreu.
Em relação à notificação da imposição da penalidade ela também ocorreu,
eis que foram enviadas notificações para o endereço do autor (fl. 59/60). O fato de o
destinatário da correspondência ser o pai do autor é explicado por ser ele o proprietário do
veículo (à época).
Ressalto que a notificação da imposição de penalidade pode ser remetida para
o proprietário do veículo ou para o infrator. Nesse sentido o caput do art. 282 do CTB:
"Art. 282. Aplicada a penalidade será expedida notificação ao proprietário
do veículo ou ao infrator, por remessa postal ou por qualquer outro meio
tecnológico hábil, que assegure a ciência da imposição da penalidade."
Ainda, o §3º do citado artigo assim dispõe:
"§ 3.º Sempre que a penalidade de multa for imposta a condutor, à exceção
daquela de que trata o § 1.º do art. 259, a notificação será encaminhada ao
proprietário do veículo, responsável pelo seu pagamento."
Veja-se que o art. 282, caput e §3º, deixa claro que a notificação da
penalidade pode ser enviada para o proprietário do veículo, o que torna legítimo a notificação
efetuada.
Se, no endereço informado, a notificação foi recebida por algum parente, isso
pouco importa. Veja-se que quem recebeu a notificação possui igual sobrenome ao impetrante
e seu pai (fls. 59/60), proprietário do veículo à época.
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A notificação cumpriu sua função, que era notificar e dar ciência.
Frise-se que outra notificação foi enviada para o mesmo local (AR de fl. 64)
para notificar o impetrante acerca do cancelamento da CNH. Essa notificação, enviada para o
mesmo endereço e recebida por uma parente, chegou às mãos do impetrante, tanto que deu
origem à presente ação. Por certo que as notificações anteriores, todas no mesmo endereço,
também tiveram o mesmo efeito.
Tenho, portanto, que a autoridade de trânsito demonstrou a notificação acerca
da imposição da penalidade com o envio da notificação ao endereço do autor.
Nesse sentido, o TJSC:
"TRÂNSITO. IMPOSIÇÃO DE PENALIDADE. [...] NOTIFICAÇÃO DA
INFRAÇÃO ENCAMINHADA AO ENDEREÇO FORNECIDO PELA
PROPRIETÁRIA, DENTRO DO PRAZO LEGAL (ART. 281, PARÁGRAFO
ÚNICO, INC. II, DO CTB). ATO VÁLIDO (ART. 282, § 1º, DO CTB).
ORDEM DENEGADA." (TJSC, Apelação Cível em Mandado de Segurança
n. 2010.039321-2, da Capital, rel. Des. Newton Janke, j. 16-11-2010).
Ainda, para deixar mais claro a completa ciência acerca da penalidade, a
multa referente à infração foi quitada, pelo impetrante ou por seu pai, na data de 13/09/2009,
conforme se observa no histórico de multas do veículo (fl. 62).
Ora, como poderia não ter sido notificado acerca da penalidade se até mesmo
pagou a multa relacionada à infração- Diga-se de passagem que a multa paga foi em alto valor
(R$ 766,15), o que ninguém faria se não soubesse muito bem qual a origem do débito.
Por último, em relação à falta de processo administrativo para o
cancelamento da CNH, mais uma vez o impetrante não possui razão.
É que o cancelamento da CNH, no presente caso, decorre diretamente de lei,
pois o impetrante cometeu a infração quando ainda portava permissão para dirigir.
O processo administrativo para a cassação da CNH não se aplica nos casos
em que envolvem permissão para dirigir, como é o presente caso.
Cito a Resolução nº 182/2005 do CONTRAN:
"Art. 1º. Estabelecer o procedimento administrativo para aplicação das
penalidades de suspensão do direito de dirigir e cassação da Carteira
Nacional de Habilitação – CNH.
Parágrafo único. Esta resolução não se aplica à Permissão para Dirigir de
que trata os §§ 3º e 4º do art. 148 do CTB."
Como o impetrante cometeu a infração quando ainda portava permissão para
dirigir, é de se aplicar o §3º do art. 148 do Código de Trânsito Brasileiro, in verbis:
"§3º A Carteira Nacional de Habilitação será conferida ao condutor no
término de 1 (um) ano, desde que o mesmo não tenha cometido nenhuma
infração de natureza grave ou gravíssima ou seja reincidente em infração
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média."
Nesse sentido o TJRS:
"APELAÇÃO CÍVEL. DIREITO PÚBLICO NÃO ESPECIFICADO.
MANDADO DE SEGURANÇA. CNH PROVISÓRIA. INFRAÇÃO GRAVE E
DE NATUREZA ADMINISTRATIVA. NEGATIVA DE EXPEDIÇÃO DA CNH
DEFINITIVA. ILEGALIDADE. 1. O cometimento de infração grave ou
gravíssima durante o período de um ano após a conclusão do Curso de
Formação de Condutores enseja a perda da Carteira Nacional de
Habilitação, conforme dispõe o art. 148, §3º, do CTB." (TJRS - Apelação e
Reexame Necessário Nº 70053539318, Segunda Câmara Cível, Relator: João
Barcelos de Souza Junior, Julgado em 10/04/2013)
E mais:
"O cometimento de infração grave ou gravíssima relacionada à condução do
veículo automotor, durante o período de um ano após a conclusão do curso
de formação de condutores, impede a obtenção da Carteira Nacional de
Habilitação definitiva, conforme dispõe o art. 148, §3°, do CTB. Distinção
com os casos em que cometida infração administrativa." (TJRS - Agravo Nº
70054900535, Vigésima Segunda Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS,
Relator: Eduardo Kraemer, Julgado em 27/06/2013)
A segurança, portanto, não merece acolhimento.
Tenho ainda que o Ministério Público está com a razão quando requereu
fosse o autor condenado em litigância de má-fé (art. 17, II, CPC), por falsear os fatos. Aplico,
ainda, multa de 15% sobre o valor da causa a título de ato atentatório à dignidade da Justiça
(art. 14, I, II, e III, CPC), considerando o grau de reprovabilidade da conduta maliciosa,
responsável por deturpar a verdade a fim de obter a almejada liminar.
DISPOSTIVO
Ante o exposto, revogo a liminar e DENEGO A SEGURANÇA.
Comunique-se imediatamente a Autoridade de Trânsito.
Condeno o impetrante ao pagamento de multa de 16% do valor da causa,
conforme fundamentação acima.
Arcará o impetrante com as custas e despesas processuais.
Sem honorários, incabíveis à espécie.
P. R. I.
Xanxerê (SC), 11 de agosto de 2013.
Giuseppe Battistotti Bellani
Juiz de Direito
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