Ação civil pública objetivando o ressarcimento ao erario de valores recebidos
Sentença usucapião - inferior módulo
1. fls. 1
Autos n° 080.07.004624-7
Ação: Usucapião/Especial de Jurisdição Contenciosa
Requerente: José Claudir Hamester e outros
Requerido: Espólio de Hélio Pissetti e outro
SENTENÇA
Vistos, etc.
Tratam os autos de ação de usucapião ajuizada por JOSÉ CLAUDIR
HAMESTER e DINAIR ALFF HAMESTER em que pretendem receber provimento
jurisdicional que declare o seu domínio sobre parte do imóvel de propriedade do ESPÓLIO
DE HÉLIO PISSETTI, qual seja, parte do lote nº 08 da Quadra nº 05, do loteamento das
chácaras nº 05 e 06, com área de 229,50 m² (duzentos e vinte e nove metros e cinquenta
centímetros quadrados), localizado no município de Xanxerê.
Alega que o imóvel foi adquirido pelo Sr. Edgar de Quadros, o qual, após a
separação, deixou o imóvel para sua mulher e filhos, os quais, por sua vez, teriam vendido o
imóvel ao requerente. Aduz que, com a soma de todas as posses, já teria 32 anos de posse a
amparar seu pedido.
Instruiu a inicial com documentos e requereu a procedência do pedido com a
declaração do domínio.
Deferido aos autores os benefícios da Justiça Gratuita (fl. 38).
Foram intimadas as Fazendas Públicas da União (fl. 62), do Estado (fl. 59) e
do município (fl. 58), nenhuma das quais demonstrou interesse no feito.
Os confrontantes foram citados: Sra. Marisa Carlott (fl. 140); Sra. Rosemari
Kubnech (fl. 117); Sra. Salete Diair de Oliveira (fl. 138). Os herdeiros do proprietário também
restaram citados, assim como seus cônjuges: Sr. Carlos Augusto Delpizzo (fl. 78); Sra. Raquel
Terezinha Rauen Delpizzo (fl. 146) e Sra. Marlene Fernandes Pissetti (fl. 55).
Vieram-me os autos conclusos.
É o relatório.
DECIDO
A presente demanda comporta julgamento antecipado, na forma do art. 330,
I, CPC, visto se tratar de matéria de direito e fato, onde os fatos relevantes já estão
documentalmente demonstrados.
É desnecessária a produção de outras provas se as existentes nos autos são
suficientes ao convencimento do julgador, não caracterizando cerceamento de defesa o
julgamento antecipado da lide.
"Presentes as condições que ensejam o julgamento antecipado da causa, é
dever do juiz, e não mera faculdade, assim proceder" (STJ-4ª Turma, Resp 2.832-RJ, Rel. Min.
Sálvio de Figueiredo).
DA USUCAPIÃO
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2. fls. 2
A usucapião é modo originário de aquisição de propriedade. Em síntese, é a
aquisição do domínio decorrente de posse prolongada. Este conceito já revela dois requisitos
para a usucapião: a posse e o tempo. Há ainda outros requisitos necessários para a configuração
do instituto, como o animus domini: o ânimo de dono.
Entretanto, o presente caso apresenta, ainda, outras particularidades. O
tamanho da área em que se pretende a usucapião perfaz, tão somente, a área de 229,50 m²
(duzentos e vinte e nove metros e cinquenta centímetros quadrados), conforme leitura do
documento de fl. 29.
Ressalte-se que referida área é somente parte do lote de nº 8 (fl. 29), ou seja,
não se trata de todo o lote nº 8, mas apenas parte de sua área.
Ocorre que o imóvel está localizado no município de Xanxerê, onde existe
Lei municipal que impede o desmembramento de imóveis em área inferior ao limite mínimo de
360 m².
Referida Lei municipal (Lei Complementar nº AM. 2917/06) de fato veda o
desmembramento em área inferior à 360 m², conforme disposto em seu art. 43. Ressalte-se
ainda que a Lei Complementar BLB. 3274/10 alterou a redação original do art. 43 da Lei
2.917/06, abrindo possibilidade de terrenos criados por loteamento populares terem metragem
.inferior à 360m², respeitando, nesse caso, o mínimo de 200m².
Entretanto, o caso dos autos não versa sobre loteamento popular, eis que em
momento algum tal fato é mencionado nos autos.
Ressalte-se que, embora a Constituição Federal estipule o limite de 250m²
para usucapir em casos de usucapião especial urbano, esse limite está condicionado ao respeito
à lei local da situação do imóvel, ou seja, da lei de parcelamento de solo, de competência da
municipalidade.
A usucapião não pode ser contrária à lei, sob pena de utilizar-se esse instituto
de direito civil para burlar a legislação vigente.
Veja-se que, eventual limite municipal para parcelamento de solo em valor
superior ao pretendido impõe a impossibilidade jurídica do pedido, eis que haveria vedação
legal a obstar a pretensão.
O STJ já se pronunciou nesse sentido:
"[...] In casu, como bem ressaltado no acórdão impugnado, “o imóvel que se
pretende usucapir não atende às normas municipais que estabelecem o
módulo mínimo local, para parcelamento do solo urbano.” (fls. 168/169),
não constituindo o referido imóvel, portanto, objeto legalizável, nos termos
da lei municipal. Conforme evidenciado pela Prefeitura Municipal de
Socorro, no Ofício de fls. 135, o módulo mínimo para o parcelamento do solo
urbano daquele município é de 250m2, e o imóvel em questão possui apenas
126m2. Ora, caso se admitisse o usucapião de tal área, estar-se-ia
viabilizando, de forma direta, o registro de área inferior àquela permitida
pela lei daquele município. Há, portanto, vício na própria relação jurídica
que se pretende modificar com a aquisição definitiva do imóvel. 2 - Destarte,
incensurável o v. acórdão recorrido (fls. 169) quando afirmou que "o
entendimento do pedido implicaria em ofensa a norma municipal relativa ao
parcelamento do solo urbano, pela via reflexa do usucapião. Seria, com isso,
legalizado o que a Lei não permite. [...]" (STJ - REsp 402792 / SP –
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2002/0001317-5. Rel: Min. Jorge Scartezzini. Quarta Turma. Julgado em
26/10/2004)
Nesse mesmo sentido, o TJRJ:
"DIREITO CIVIL. Ação de usucapião extraordinária. Imóvel usucapiendo
com metragem inferior a 225 m2, mínimo do módulo urbano determinado
por lei municipal. Impossibilidade jurídica do pedido por força da
inadmissibilidade de desmembramento do terreno, e conseqüentemente, do
registro junto à serventia competente. Desprovimento do apelo. Unânime."
(TJRJ – Apelação Cível 0005594-30.2004.8.19.0202 – 2008.001.43107. Rel:
Des. Fernando Foch Lemos. Terceira Câmara Cível. Julgado em 04/11/2008).
.
Assim sendo, não possuindo o imóvel área mínima para efetuar o
desmembramento, impõe-se a extinção do feito, diante da impossibilidade jurídica do pedido.
A "impossibilidade jurídica do pedido diz respeito à existência de vedação legal à outorga da
pretensão formulada na inicial" (Apelação Cível Nº 70046256244, Décima Segunda Câmara
Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Umberto Guaspari Sudbrack, Julgado em
13/02/2012).
DISPOSITIVO
Ante o exposto, com fulcro no art. 267, VI, do CPC, JULGO EXTINTA,
sem julgamento de mérito, a presente ação proposta por JOSÉ CLAUDIR HAMESTER e
DINAIR ALFF HAMESTER em face de ESPÓLIO DE HÉLIO PISSETTI.
Arcarão os autores com as despesas processuais. Sem honorários, eis que não
houve pretensão resistida. "Nas ações de usucapião [...] nos casos em que existir oposição
formal à pretensão do autor - por meio de contestação ou recurso -, a parte demandada deverá
ser condenada ao pagamento de honorários [...]" (TJRS - Apelação Cível Nº 70041174145,
Décima Sétima Câmara Cível, Relator: Liege Puricelli Pires, Julgado em 10/11/2011).
Observe-se a regra do art. 12 da Lei 1.060/50, eis que os autores litigam sob o amparo da
gratuidade de Justiça.
Transitada em julgado, pagas as custas, arquive-se.
P. R. I.
Xanxerê (SC), 21 de março de 2012.
Giuseppe Battistotti Bellani
Juiz de Direito
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