SlideShare uma empresa Scribd logo
1 de 3
Baixar para ler offline
Elísio Estanque*
Jornal PÚBLICO, 26.02.2013
Visto do Brasil: greves, “manifs” e “passeatas”
Estamos habituados a pensar o Norte “desenvolvido” olhando para cima, mas talvez
seja o momento de inverter o mapa-mundi e exercitar a nossa reflexão crítica
imaginando um Sul “promissor” que olha para os europeus “de cima para baixo”.
Sentimentalmente constrangido ou levianamente divertido, o Brasil assiste ao definhar
da sua ex-metrópole, vivendo tempos eufóricos. É difícil saber se o atual processo de
“brasileirização” de Portugal (com o desmantelar do Estado social e dos direitos
laborais) terá como contrapartida uma futura “europeização” do Brasil ou uma
reinvenção da Europa a partir de um olhar sulista. Ironias à parte, é, apesar de tudo,
consensual que os problemas sociais do continente sul-americano e do Brasil em
particular são bem mais graves do que os da Europa. Nós, europeus, é que estávamos
– segundo a leitura do poder vigente – “mal habituados”. Enfim, essa é outra conversa.
O ponto aqui é o modo como portugueses e brasileiros pensam e agem no campo da
contestação social, no momento em que se aproxima mais uma vaga de conflitualidade
no nosso país.
Em primeiro lugar, as greves em Portugal só foram intensas e mobilizadoras quando
a nossa Revolução de Abril já tinha posto fim à ditadura do Estado Novo. Quando
participar numa greve ou mesmo ocupar uma fábrica era quase, passe o termo, uma
brincadeira de crianças. Nesse tempo, era maior o risco de ser “fura greves” do que o
de aderir à greve. No mesmo período no Brasil invejava-se a nossa revolução
democrática, mas cantava-se a festa dos cravos com a sonoridade tropical do Chico.
Mais tarde, as greves do operariado do ABC paulista deram lugar ao novo sindicalismo
brasileiro e alastraram a outras regiões e sectores da classe trabalhadora, incluindo
movimentos dos “sem terra”, conduzindo ao nascimento do PT e à queda da ditadura
militar. Hoje, as greves em Portugal, mesmo as consideradas “gerais”, são sempre
muito parciais, de curta duração e comportam elevados riscos (e cortes salariais
significativos). Enquanto aqui no Brasil, mesmo as greves setoriais são “gerais”, podem
durar meses, sem qualquer risco e em geral os dias de greve são pagos (sobretudo no
caso dos servidores públicos).
Quanto às “manifestações” de rua, em Portugal adquirem um cunho dramático e
suscitam as habituais reações negativas das mentes bem-pensantes, sempre dispostas
a achincalhar tudo o que cheire a profano ou a popular. Mas, enquanto no Brasil os
direitos do povo suscitam a fúria da classe média instalada, por cá esta classe
“desinstalou-se” (e desfaz-se a cada dia), engrossando as fileiras da contestação. Os
brandos costumes lusitanos tendem a esconder a vertente lúdica e festiva de cada
“jornada de luta” (que, como se sabe, é apenas uma desculpa para mais um convivio
excursionista nas ruas da capital); já do lado sul do Atlântico a diversão assume-se
logo à partida no próprio nome: trata-se de “passeatas”(!). À maior gravidade das
injustiças sociais no Brasil, corresponde a maior intensidade do preconceito racial ou
de classe, ao mesmo tempo que a violência dos media (e da classe média) não faz
esmorecer o fervor classista nem o radicalismo colorido e festivo das lutas sociais. Por
exemplo, São Paulo é palco da maior “manif” mundial de movimentos LGBT. E
ninguém pode dizer que a cor e a festa faltem na parada gay da Av Paulista (que se
repete anualmente e que já atingiu os 4 milhões de participantes).
Para além desta, as lutas estudantis em 1968 e em 1992, a campanha das “diretas
já” (anos 1980), as mobilizações pelo impeachement de Collor de Melo (92), as
marchas do MST (97 e anos 2000), as lutas contra a violência e a corrupção no Rio de
Janeiro, além do sindicalismo dos metalúrgicos, que revelou Lula da Silva como líder
(anos 80), são somente alguns dos momentos altos dos protestos no Brasil. Em
Portugal, por seu lado, o tempo das “manifs” e das concentrações apoteóticas – do 1º
de Maio de 1974 à Fonte Luminosa de 75, e do cerco de São Bento à da bombinha da
Pça do Comércio (afinal “só fumaça”) – passou rápido e perdeu-se na memória coletiva
durante mais de trinta anos. Voltou recentemente, empurrado pela crise internacional e
europeia. As maiores e mais impactantes “manifs” dos últimos dois anos foram as da
Geração à Rasca (12/03/2011) e a dos desempregados, precários, pensionistas e
jovens sem futuro (Que se Lixe a Troika, de 15/09/2012), que iniciaram um novo ciclo
no protesto público luso, com provável continuidade nos próximos tempos e talvez com
música de fundo, menos alegre mas bem compassada (inspirada no cante alentejano).
O sindicalismo português, em vez de aliar-se, compete com a rebeldia “inorgânica”.
O velho operariado – da Marinha Grande no início do salazarismo ou da Lisnave e
Setenave dos anos da revolução –, foi rapidamente cooptado pelo PCP e, entretanto,
implodiu, sendo substituído pelos sindicatos corporativistas do sector dos serviços,
mais disciplinados e previsíveis. Divididos e enfraquecidos a cada dia que passa, os
sindicatos (mesmo os da CGTP), já não fazem mossa; menos ainda enquanto a
direção sindical e quem a comanda banalizar greves e “manifs”, tornando-as mero um
ritual (cada vez mais cinzento e tristonho). Pelo contrário, no Brasil, tudo é muito mais
matizado e dinâmico. Maior diversidade de correntes sindicais e maior indefinição
ideológica (nos campos sindical e partidário), mas também maior poder transformador
no plano político e social. O “lulismo” brasileiro tem pouco ou nada a ver com o velho
“ludismo” britânico (foi mais político e menos violento), mas não foi menos importante
no plano doméstico, dado o significado da mudança sociopolítica que induziu,
sobretudo enquanto se abriu aos movimentos sociais. Além de derrubar uma ditadura,
produziu um líder que transformou o país. Já as lideranças sindicais portuguesas não
deram, até hoje, nenhum fruto desse teor. Quando o discurso sindical afirma um novo
líder com base na retórica “anti-líder”, muito provavelmente o verdadeiro líder só nasce
depois de se despir da armadura discursiva do unanimismo coletivista.
__
* Investigador do Centro de Estudos Sociais da Universidade de Coimbra;
Professor visitante da UNICAMP – Campinas, Brasil.

Mais conteúdo relacionado

Mais procurados

Onde pára o socialismo ee publico_02.06.14
Onde pára o socialismo ee publico_02.06.14Onde pára o socialismo ee publico_02.06.14
Onde pára o socialismo ee publico_02.06.14Elisio Estanque
 
Ambivalências da sociologia ee 14.04.14
Ambivalências da sociologia ee 14.04.14Ambivalências da sociologia ee 14.04.14
Ambivalências da sociologia ee 14.04.14Elisio Estanque
 
Público 1 autarquicas democracia 07.01.2013
Público 1 autarquicas democracia 07.01.2013Público 1 autarquicas democracia 07.01.2013
Público 1 autarquicas democracia 07.01.2013Elisio Estanque
 
Para redefinir a classe média ee 16.08.2013
Para redefinir a classe média ee 16.08.2013Para redefinir a classe média ee 16.08.2013
Para redefinir a classe média ee 16.08.2013Elisio Estanque
 
Uma critica construtiva ao sindicalismo
Uma critica construtiva ao sindicalismoUma critica construtiva ao sindicalismo
Uma critica construtiva ao sindicalismoElisio Estanque
 
Os sentidos do trabalho a ee
Os sentidos do trabalho a eeOs sentidos do trabalho a ee
Os sentidos do trabalho a eeElisio Estanque
 
Ee juventude bloqueada (i) publico_18.05.17
Ee juventude bloqueada (i) publico_18.05.17Ee juventude bloqueada (i) publico_18.05.17
Ee juventude bloqueada (i) publico_18.05.17Elisio Estanque
 
Entre o populismo e o euroceticismo
Entre o populismo e o euroceticismo Entre o populismo e o euroceticismo
Entre o populismo e o euroceticismo Elisio Estanque
 
Ee juventude bloqueada (ii) publico_2017.05
Ee juventude bloqueada (ii) publico_2017.05Ee juventude bloqueada (ii) publico_2017.05
Ee juventude bloqueada (ii) publico_2017.05Elisio Estanque
 
Democracia e socialismo
Democracia e socialismoDemocracia e socialismo
Democracia e socialismoDaylson Lima
 
àS portas do trabalho escravo ee 6.08.2012
àS portas do trabalho escravo ee 6.08.2012àS portas do trabalho escravo ee 6.08.2012
àS portas do trabalho escravo ee 6.08.2012Elisio Estanque
 
Soltar as ideias, libertar a esquerda
Soltar as ideias, libertar a esquerdaSoltar as ideias, libertar a esquerda
Soltar as ideias, libertar a esquerdaElisio Estanque
 
Precariado e luta de classes 15.07.2012
Precariado e luta de classes 15.07.2012Precariado e luta de classes 15.07.2012
Precariado e luta de classes 15.07.2012Elisio Estanque
 
Rosa luxemburgo versao-web
Rosa luxemburgo versao-webRosa luxemburgo versao-web
Rosa luxemburgo versao-webCláudio Rennó
 
Como nasceu e como morreu o marxismo ocidental
Como nasceu e como morreu o marxismo ocidentalComo nasceu e como morreu o marxismo ocidental
Como nasceu e como morreu o marxismo ocidentalCésar Pereira
 
Uma 'geringonça' para o Brasil?
Uma 'geringonça' para o Brasil?Uma 'geringonça' para o Brasil?
Uma 'geringonça' para o Brasil?Elisio Estanque
 
Clc 5 OpiniãOpublica
Clc 5 OpiniãOpublicaClc 5 OpiniãOpublica
Clc 5 OpiniãOpublicaLuís Costa
 
Opinião classe média, beja santos
Opinião classe média, beja santosOpinião classe média, beja santos
Opinião classe média, beja santosElisio Estanque
 

Mais procurados (20)

Onde pára o socialismo ee publico_02.06.14
Onde pára o socialismo ee publico_02.06.14Onde pára o socialismo ee publico_02.06.14
Onde pára o socialismo ee publico_02.06.14
 
Ambivalências da sociologia ee 14.04.14
Ambivalências da sociologia ee 14.04.14Ambivalências da sociologia ee 14.04.14
Ambivalências da sociologia ee 14.04.14
 
Público 1 autarquicas democracia 07.01.2013
Público 1 autarquicas democracia 07.01.2013Público 1 autarquicas democracia 07.01.2013
Público 1 autarquicas democracia 07.01.2013
 
Para redefinir a classe média ee 16.08.2013
Para redefinir a classe média ee 16.08.2013Para redefinir a classe média ee 16.08.2013
Para redefinir a classe média ee 16.08.2013
 
Uma critica construtiva ao sindicalismo
Uma critica construtiva ao sindicalismoUma critica construtiva ao sindicalismo
Uma critica construtiva ao sindicalismo
 
Os sentidos do trabalho a ee
Os sentidos do trabalho a eeOs sentidos do trabalho a ee
Os sentidos do trabalho a ee
 
Ee juventude bloqueada (i) publico_18.05.17
Ee juventude bloqueada (i) publico_18.05.17Ee juventude bloqueada (i) publico_18.05.17
Ee juventude bloqueada (i) publico_18.05.17
 
Entre o populismo e o euroceticismo
Entre o populismo e o euroceticismo Entre o populismo e o euroceticismo
Entre o populismo e o euroceticismo
 
Ee juventude bloqueada (ii) publico_2017.05
Ee juventude bloqueada (ii) publico_2017.05Ee juventude bloqueada (ii) publico_2017.05
Ee juventude bloqueada (ii) publico_2017.05
 
Democracia e socialismo
Democracia e socialismoDemocracia e socialismo
Democracia e socialismo
 
àS portas do trabalho escravo ee 6.08.2012
àS portas do trabalho escravo ee 6.08.2012àS portas do trabalho escravo ee 6.08.2012
àS portas do trabalho escravo ee 6.08.2012
 
Soltar as ideias, libertar a esquerda
Soltar as ideias, libertar a esquerdaSoltar as ideias, libertar a esquerda
Soltar as ideias, libertar a esquerda
 
Precariado e luta de classes 15.07.2012
Precariado e luta de classes 15.07.2012Precariado e luta de classes 15.07.2012
Precariado e luta de classes 15.07.2012
 
Rosa luxemburgo versao-web
Rosa luxemburgo versao-webRosa luxemburgo versao-web
Rosa luxemburgo versao-web
 
O Socialismo Petista
O Socialismo PetistaO Socialismo Petista
O Socialismo Petista
 
978 613-9-60525-5
978 613-9-60525-5978 613-9-60525-5
978 613-9-60525-5
 
Como nasceu e como morreu o marxismo ocidental
Como nasceu e como morreu o marxismo ocidentalComo nasceu e como morreu o marxismo ocidental
Como nasceu e como morreu o marxismo ocidental
 
Uma 'geringonça' para o Brasil?
Uma 'geringonça' para o Brasil?Uma 'geringonça' para o Brasil?
Uma 'geringonça' para o Brasil?
 
Clc 5 OpiniãOpublica
Clc 5 OpiniãOpublicaClc 5 OpiniãOpublica
Clc 5 OpiniãOpublica
 
Opinião classe média, beja santos
Opinião classe média, beja santosOpinião classe média, beja santos
Opinião classe média, beja santos
 

Destaque

A ucrania e o maniqueísmo neo sovietico ee-nn
A ucrania e o maniqueísmo neo sovietico ee-nnA ucrania e o maniqueísmo neo sovietico ee-nn
A ucrania e o maniqueísmo neo sovietico ee-nnElisio Estanque
 
As praxes e o poder ee jan2014
As praxes e o poder ee jan2014As praxes e o poder ee jan2014
As praxes e o poder ee jan2014Elisio Estanque
 
Público 12 passos troikados ee_16.09.2012
Público 12 passos troikados ee_16.09.2012Público 12 passos troikados ee_16.09.2012
Público 12 passos troikados ee_16.09.2012Elisio Estanque
 
Portugues com sotaque publico 2014-11jan_ee
Portugues com sotaque publico 2014-11jan_eePortugues com sotaque publico 2014-11jan_ee
Portugues com sotaque publico 2014-11jan_eeElisio Estanque
 
Ee .carta aberta de um ex militante-jun_2014
Ee .carta aberta de um ex militante-jun_2014Ee .carta aberta de um ex militante-jun_2014
Ee .carta aberta de um ex militante-jun_2014Elisio Estanque
 
Público 11 passos inseguros ee_3.09.2012
Público 11 passos inseguros ee_3.09.2012Público 11 passos inseguros ee_3.09.2012
Público 11 passos inseguros ee_3.09.2012Elisio Estanque
 
Praxe vs comandos_publico_2016.09.20
  Praxe vs comandos_publico_2016.09.20  Praxe vs comandos_publico_2016.09.20
Praxe vs comandos_publico_2016.09.20Elisio Estanque
 
Os 'lambe cus', público_27.10.2016
Os 'lambe cus', público_27.10.2016Os 'lambe cus', público_27.10.2016
Os 'lambe cus', público_27.10.2016Elisio Estanque
 
A praxe e o novo tribalismo 22.out.14
A praxe e o novo tribalismo 22.out.14A praxe e o novo tribalismo 22.out.14
A praxe e o novo tribalismo 22.out.14Elisio Estanque
 
Ee_publico_entrevista-1
  Ee_publico_entrevista-1  Ee_publico_entrevista-1
Ee_publico_entrevista-1Elisio Estanque
 
Público 14 rebeliao e resistência organizada 30.09.2012
Público 14 rebeliao e resistência organizada 30.09.2012Público 14 rebeliao e resistência organizada 30.09.2012
Público 14 rebeliao e resistência organizada 30.09.2012Elisio Estanque
 
Público 13 realismo utopico ee_29.09.2012
Público 13 realismo utopico ee_29.09.2012Público 13 realismo utopico ee_29.09.2012
Público 13 realismo utopico ee_29.09.2012Elisio Estanque
 
Currículo referência da rede estadual de educação de goiás
Currículo referência da rede estadual de educação de goiásCurrículo referência da rede estadual de educação de goiás
Currículo referência da rede estadual de educação de goiásheliane
 

Destaque (14)

A ucrania e o maniqueísmo neo sovietico ee-nn
A ucrania e o maniqueísmo neo sovietico ee-nnA ucrania e o maniqueísmo neo sovietico ee-nn
A ucrania e o maniqueísmo neo sovietico ee-nn
 
As praxes e o poder ee jan2014
As praxes e o poder ee jan2014As praxes e o poder ee jan2014
As praxes e o poder ee jan2014
 
Público 12 passos troikados ee_16.09.2012
Público 12 passos troikados ee_16.09.2012Público 12 passos troikados ee_16.09.2012
Público 12 passos troikados ee_16.09.2012
 
Portugues com sotaque publico 2014-11jan_ee
Portugues com sotaque publico 2014-11jan_eePortugues com sotaque publico 2014-11jan_ee
Portugues com sotaque publico 2014-11jan_ee
 
Ee .carta aberta de um ex militante-jun_2014
Ee .carta aberta de um ex militante-jun_2014Ee .carta aberta de um ex militante-jun_2014
Ee .carta aberta de um ex militante-jun_2014
 
Público 11 passos inseguros ee_3.09.2012
Público 11 passos inseguros ee_3.09.2012Público 11 passos inseguros ee_3.09.2012
Público 11 passos inseguros ee_3.09.2012
 
Praxe vs comandos_publico_2016.09.20
  Praxe vs comandos_publico_2016.09.20  Praxe vs comandos_publico_2016.09.20
Praxe vs comandos_publico_2016.09.20
 
Os 'lambe cus', público_27.10.2016
Os 'lambe cus', público_27.10.2016Os 'lambe cus', público_27.10.2016
Os 'lambe cus', público_27.10.2016
 
A praxe e o novo tribalismo 22.out.14
A praxe e o novo tribalismo 22.out.14A praxe e o novo tribalismo 22.out.14
A praxe e o novo tribalismo 22.out.14
 
Ee_publico_entrevista-1
  Ee_publico_entrevista-1  Ee_publico_entrevista-1
Ee_publico_entrevista-1
 
Público 14 rebeliao e resistência organizada 30.09.2012
Público 14 rebeliao e resistência organizada 30.09.2012Público 14 rebeliao e resistência organizada 30.09.2012
Público 14 rebeliao e resistência organizada 30.09.2012
 
Público 13 realismo utopico ee_29.09.2012
Público 13 realismo utopico ee_29.09.2012Público 13 realismo utopico ee_29.09.2012
Público 13 realismo utopico ee_29.09.2012
 
Fugas ee 3.11.2012
Fugas ee 3.11.2012Fugas ee 3.11.2012
Fugas ee 3.11.2012
 
Currículo referência da rede estadual de educação de goiás
Currículo referência da rede estadual de educação de goiásCurrículo referência da rede estadual de educação de goiás
Currículo referência da rede estadual de educação de goiás
 

Semelhante a Greves, manifestações e protestos sociais no Brasil e em Portugal

A miséria da esquerda que anda por aí. um “case study”, a cimeira da nato
A miséria da esquerda que anda por aí.  um “case study”, a cimeira da natoA miséria da esquerda que anda por aí.  um “case study”, a cimeira da nato
A miséria da esquerda que anda por aí. um “case study”, a cimeira da natoGRAZIA TANTA
 
Um olhar sobre Abril
Um olhar sobre AbrilUm olhar sobre Abril
Um olhar sobre AbrilJoão Camacho
 
Inconfidência nº 251
Inconfidência nº 251Inconfidência nº 251
Inconfidência nº 251Lucio Borges
 
A classe média realidade e ficção
A classe média realidade e ficçãoA classe média realidade e ficção
A classe média realidade e ficçãoElisio Estanque
 
Florestan fernandes nova republica
Florestan fernandes   nova republicaFlorestan fernandes   nova republica
Florestan fernandes nova republicaDaylson Lima
 
E.Municipal dr lauro chaves (a guerra fria)
E.Municipal dr lauro chaves (a guerra fria)E.Municipal dr lauro chaves (a guerra fria)
E.Municipal dr lauro chaves (a guerra fria)Prof:Carlos Oliveira
 
RAGO_Margareth_O efeito Foucault na historiografia brasileira.pdf
RAGO_Margareth_O efeito Foucault na historiografia brasileira.pdfRAGO_Margareth_O efeito Foucault na historiografia brasileira.pdf
RAGO_Margareth_O efeito Foucault na historiografia brasileira.pdfElisaCaetano12
 
Inconfidência nº 261
Inconfidência nº 261 Inconfidência nº 261
Inconfidência nº 261 Lucio Borges
 
Chacina da Lapa 30 anos - Herois da luta pela democracia e pelo socialismo
Chacina da Lapa 30 anos - Herois da luta pela democracia e pelo socialismoChacina da Lapa 30 anos - Herois da luta pela democracia e pelo socialismo
Chacina da Lapa 30 anos - Herois da luta pela democracia e pelo socialismoJuventude Campinense
 
Entrevista josé murilo de carvalho
Entrevista josé murilo de carvalhoEntrevista josé murilo de carvalho
Entrevista josé murilo de carvalhojosafaslima
 
O-Cotidiano-Da-Republica.pdfjjjjjjjjjjjjjjjjjjjjjjjj
O-Cotidiano-Da-Republica.pdfjjjjjjjjjjjjjjjjjjjjjjjjO-Cotidiano-Da-Republica.pdfjjjjjjjjjjjjjjjjjjjjjjjj
O-Cotidiano-Da-Republica.pdfjjjjjjjjjjjjjjjjjjjjjjjjAntonioVieira539017
 
Um olhar sobre Abril (Josué Rogério, 12º A)
Um olhar sobre Abril (Josué Rogério, 12º A)Um olhar sobre Abril (Josué Rogério, 12º A)
Um olhar sobre Abril (Josué Rogério, 12º A)João Camacho
 
Reverente e Filial Mensagem de Dom Bertrand a Francisco I‏
Reverente e Filial Mensagem de Dom Bertrand a Francisco I‏Reverente e Filial Mensagem de Dom Bertrand a Francisco I‏
Reverente e Filial Mensagem de Dom Bertrand a Francisco I‏Lucio Borges
 

Semelhante a Greves, manifestações e protestos sociais no Brasil e em Portugal (20)

Jlo262 blog20
Jlo262 blog20Jlo262 blog20
Jlo262 blog20
 
Musica e ditadura
Musica e ditaduraMusica e ditadura
Musica e ditadura
 
A tropicalia
A tropicaliaA tropicalia
A tropicalia
 
A miséria da esquerda que anda por aí. um “case study”, a cimeira da nato
A miséria da esquerda que anda por aí.  um “case study”, a cimeira da natoA miséria da esquerda que anda por aí.  um “case study”, a cimeira da nato
A miséria da esquerda que anda por aí. um “case study”, a cimeira da nato
 
434 an-03-julho-2013.ok
434 an-03-julho-2013.ok434 an-03-julho-2013.ok
434 an-03-julho-2013.ok
 
O lulismo
O lulismoO lulismo
O lulismo
 
Um olhar sobre Abril
Um olhar sobre AbrilUm olhar sobre Abril
Um olhar sobre Abril
 
Inconfidência nº 251
Inconfidência nº 251Inconfidência nº 251
Inconfidência nº 251
 
Chile
ChileChile
Chile
 
A classe média realidade e ficção
A classe média realidade e ficçãoA classe média realidade e ficção
A classe média realidade e ficção
 
Florestan fernandes nova republica
Florestan fernandes   nova republicaFlorestan fernandes   nova republica
Florestan fernandes nova republica
 
E.Municipal dr lauro chaves (a guerra fria)
E.Municipal dr lauro chaves (a guerra fria)E.Municipal dr lauro chaves (a guerra fria)
E.Municipal dr lauro chaves (a guerra fria)
 
RAGO_Margareth_O efeito Foucault na historiografia brasileira.pdf
RAGO_Margareth_O efeito Foucault na historiografia brasileira.pdfRAGO_Margareth_O efeito Foucault na historiografia brasileira.pdf
RAGO_Margareth_O efeito Foucault na historiografia brasileira.pdf
 
Guerra fria
Guerra friaGuerra fria
Guerra fria
 
Inconfidência nº 261
Inconfidência nº 261 Inconfidência nº 261
Inconfidência nº 261
 
Chacina da Lapa 30 anos - Herois da luta pela democracia e pelo socialismo
Chacina da Lapa 30 anos - Herois da luta pela democracia e pelo socialismoChacina da Lapa 30 anos - Herois da luta pela democracia e pelo socialismo
Chacina da Lapa 30 anos - Herois da luta pela democracia e pelo socialismo
 
Entrevista josé murilo de carvalho
Entrevista josé murilo de carvalhoEntrevista josé murilo de carvalho
Entrevista josé murilo de carvalho
 
O-Cotidiano-Da-Republica.pdfjjjjjjjjjjjjjjjjjjjjjjjj
O-Cotidiano-Da-Republica.pdfjjjjjjjjjjjjjjjjjjjjjjjjO-Cotidiano-Da-Republica.pdfjjjjjjjjjjjjjjjjjjjjjjjj
O-Cotidiano-Da-Republica.pdfjjjjjjjjjjjjjjjjjjjjjjjj
 
Um olhar sobre Abril (Josué Rogério, 12º A)
Um olhar sobre Abril (Josué Rogério, 12º A)Um olhar sobre Abril (Josué Rogério, 12º A)
Um olhar sobre Abril (Josué Rogério, 12º A)
 
Reverente e Filial Mensagem de Dom Bertrand a Francisco I‏
Reverente e Filial Mensagem de Dom Bertrand a Francisco I‏Reverente e Filial Mensagem de Dom Bertrand a Francisco I‏
Reverente e Filial Mensagem de Dom Bertrand a Francisco I‏
 

Mais de Elisio Estanque

O outro lado da revol (ii) publico20180215
O outro lado da revol (ii) publico20180215O outro lado da revol (ii) publico20180215
O outro lado da revol (ii) publico20180215Elisio Estanque
 
O outro lado da reovol (i) publico 20180214
O outro lado da reovol (i) publico 20180214O outro lado da reovol (i) publico 20180214
O outro lado da reovol (i) publico 20180214Elisio Estanque
 
Passado e futuro do trabalho (II)
Passado e futuro do trabalho (II)Passado e futuro do trabalho (II)
Passado e futuro do trabalho (II)Elisio Estanque
 
Passado e futuro do trabalho (I)
Passado e futuro do trabalho (I)Passado e futuro do trabalho (I)
Passado e futuro do trabalho (I)Elisio Estanque
 
Queima das fitas alcoolizada publico 14.05.2016
Queima das fitas alcoolizada publico 14.05.2016Queima das fitas alcoolizada publico 14.05.2016
Queima das fitas alcoolizada publico 14.05.2016Elisio Estanque
 
Des globalização do trabalho ee
Des globalização do trabalho eeDes globalização do trabalho ee
Des globalização do trabalho eeElisio Estanque
 
Alentejo ee público_11.03.2016
Alentejo ee público_11.03.2016Alentejo ee público_11.03.2016
Alentejo ee público_11.03.2016Elisio Estanque
 
03_english_rccs annual review_e_estanque_rev2
  03_english_rccs annual review_e_estanque_rev2  03_english_rccs annual review_e_estanque_rev2
03_english_rccs annual review_e_estanque_rev2Elisio Estanque
 
(Des)globalização do trabalho publico 2016.07.14
(Des)globalização do trabalho publico 2016.07.14(Des)globalização do trabalho publico 2016.07.14
(Des)globalização do trabalho publico 2016.07.14Elisio Estanque
 
Queima das fitas alcoolizada publico 14.05.2016
Queima das fitas alcoolizada publico 14.05.2016Queima das fitas alcoolizada publico 14.05.2016
Queima das fitas alcoolizada publico 14.05.2016Elisio Estanque
 
Alentejo ee público_11.03.2016
Alentejo ee público_11.03.2016Alentejo ee público_11.03.2016
Alentejo ee público_11.03.2016Elisio Estanque
 
Rebeliao de classe media_precariedade de movimentos sociais
Rebeliao de classe media_precariedade de movimentos sociaisRebeliao de classe media_precariedade de movimentos sociais
Rebeliao de classe media_precariedade de movimentos sociaisElisio Estanque
 
Middle class rebellions_2015
Middle class rebellions_2015Middle class rebellions_2015
Middle class rebellions_2015Elisio Estanque
 
Cromos e cargos_31.12-2015
Cromos e cargos_31.12-2015Cromos e cargos_31.12-2015
Cromos e cargos_31.12-2015Elisio Estanque
 
Portugal, Alentejo - industrailização tardia
Portugal, Alentejo - industrailização tardiaPortugal, Alentejo - industrailização tardia
Portugal, Alentejo - industrailização tardiaElisio Estanque
 
Entrevista expresso_Brasil
Entrevista expresso_BrasilEntrevista expresso_Brasil
Entrevista expresso_BrasilElisio Estanque
 
Transformação social, democracia e cultura de empresa
Transformação social, democracia e cultura de empresaTransformação social, democracia e cultura de empresa
Transformação social, democracia e cultura de empresaElisio Estanque
 

Mais de Elisio Estanque (20)

O outro lado da revol (ii) publico20180215
O outro lado da revol (ii) publico20180215O outro lado da revol (ii) publico20180215
O outro lado da revol (ii) publico20180215
 
O outro lado da reovol (i) publico 20180214
O outro lado da reovol (i) publico 20180214O outro lado da reovol (i) publico 20180214
O outro lado da reovol (i) publico 20180214
 
Passado e futuro do trabalho (II)
Passado e futuro do trabalho (II)Passado e futuro do trabalho (II)
Passado e futuro do trabalho (II)
 
Passado e futuro do trabalho (I)
Passado e futuro do trabalho (I)Passado e futuro do trabalho (I)
Passado e futuro do trabalho (I)
 
Queima das fitas alcoolizada publico 14.05.2016
Queima das fitas alcoolizada publico 14.05.2016Queima das fitas alcoolizada publico 14.05.2016
Queima das fitas alcoolizada publico 14.05.2016
 
Des globalização do trabalho ee
Des globalização do trabalho eeDes globalização do trabalho ee
Des globalização do trabalho ee
 
Alentejo ee público_11.03.2016
Alentejo ee público_11.03.2016Alentejo ee público_11.03.2016
Alentejo ee público_11.03.2016
 
03_english_rccs annual review_e_estanque_rev2
  03_english_rccs annual review_e_estanque_rev2  03_english_rccs annual review_e_estanque_rev2
03_english_rccs annual review_e_estanque_rev2
 
(Des)globalização do trabalho publico 2016.07.14
(Des)globalização do trabalho publico 2016.07.14(Des)globalização do trabalho publico 2016.07.14
(Des)globalização do trabalho publico 2016.07.14
 
Queima das fitas alcoolizada publico 14.05.2016
Queima das fitas alcoolizada publico 14.05.2016Queima das fitas alcoolizada publico 14.05.2016
Queima das fitas alcoolizada publico 14.05.2016
 
Alentejo ee público_11.03.2016
Alentejo ee público_11.03.2016Alentejo ee público_11.03.2016
Alentejo ee público_11.03.2016
 
Rebeliao de classe media_precariedade de movimentos sociais
Rebeliao de classe media_precariedade de movimentos sociaisRebeliao de classe media_precariedade de movimentos sociais
Rebeliao de classe media_precariedade de movimentos sociais
 
Middle class rebellions_2015
Middle class rebellions_2015Middle class rebellions_2015
Middle class rebellions_2015
 
GLU column
GLU column  GLU column
GLU column
 
Cromos e cargos_31.12-2015
Cromos e cargos_31.12-2015Cromos e cargos_31.12-2015
Cromos e cargos_31.12-2015
 
Portugal, Alentejo - industrailização tardia
Portugal, Alentejo - industrailização tardiaPortugal, Alentejo - industrailização tardia
Portugal, Alentejo - industrailização tardia
 
Voos de borboleta
Voos de borboletaVoos de borboleta
Voos de borboleta
 
Entrevista expresso_Brasil
Entrevista expresso_BrasilEntrevista expresso_Brasil
Entrevista expresso_Brasil
 
Transformação social, democracia e cultura de empresa
Transformação social, democracia e cultura de empresaTransformação social, democracia e cultura de empresa
Transformação social, democracia e cultura de empresa
 
Duas classes medias
Duas classes mediasDuas classes medias
Duas classes medias
 

Greves, manifestações e protestos sociais no Brasil e em Portugal

  • 1. Elísio Estanque* Jornal PÚBLICO, 26.02.2013 Visto do Brasil: greves, “manifs” e “passeatas” Estamos habituados a pensar o Norte “desenvolvido” olhando para cima, mas talvez seja o momento de inverter o mapa-mundi e exercitar a nossa reflexão crítica imaginando um Sul “promissor” que olha para os europeus “de cima para baixo”. Sentimentalmente constrangido ou levianamente divertido, o Brasil assiste ao definhar da sua ex-metrópole, vivendo tempos eufóricos. É difícil saber se o atual processo de “brasileirização” de Portugal (com o desmantelar do Estado social e dos direitos laborais) terá como contrapartida uma futura “europeização” do Brasil ou uma reinvenção da Europa a partir de um olhar sulista. Ironias à parte, é, apesar de tudo, consensual que os problemas sociais do continente sul-americano e do Brasil em particular são bem mais graves do que os da Europa. Nós, europeus, é que estávamos – segundo a leitura do poder vigente – “mal habituados”. Enfim, essa é outra conversa. O ponto aqui é o modo como portugueses e brasileiros pensam e agem no campo da contestação social, no momento em que se aproxima mais uma vaga de conflitualidade no nosso país. Em primeiro lugar, as greves em Portugal só foram intensas e mobilizadoras quando a nossa Revolução de Abril já tinha posto fim à ditadura do Estado Novo. Quando participar numa greve ou mesmo ocupar uma fábrica era quase, passe o termo, uma brincadeira de crianças. Nesse tempo, era maior o risco de ser “fura greves” do que o de aderir à greve. No mesmo período no Brasil invejava-se a nossa revolução democrática, mas cantava-se a festa dos cravos com a sonoridade tropical do Chico. Mais tarde, as greves do operariado do ABC paulista deram lugar ao novo sindicalismo brasileiro e alastraram a outras regiões e sectores da classe trabalhadora, incluindo movimentos dos “sem terra”, conduzindo ao nascimento do PT e à queda da ditadura militar. Hoje, as greves em Portugal, mesmo as consideradas “gerais”, são sempre muito parciais, de curta duração e comportam elevados riscos (e cortes salariais significativos). Enquanto aqui no Brasil, mesmo as greves setoriais são “gerais”, podem
  • 2. durar meses, sem qualquer risco e em geral os dias de greve são pagos (sobretudo no caso dos servidores públicos). Quanto às “manifestações” de rua, em Portugal adquirem um cunho dramático e suscitam as habituais reações negativas das mentes bem-pensantes, sempre dispostas a achincalhar tudo o que cheire a profano ou a popular. Mas, enquanto no Brasil os direitos do povo suscitam a fúria da classe média instalada, por cá esta classe “desinstalou-se” (e desfaz-se a cada dia), engrossando as fileiras da contestação. Os brandos costumes lusitanos tendem a esconder a vertente lúdica e festiva de cada “jornada de luta” (que, como se sabe, é apenas uma desculpa para mais um convivio excursionista nas ruas da capital); já do lado sul do Atlântico a diversão assume-se logo à partida no próprio nome: trata-se de “passeatas”(!). À maior gravidade das injustiças sociais no Brasil, corresponde a maior intensidade do preconceito racial ou de classe, ao mesmo tempo que a violência dos media (e da classe média) não faz esmorecer o fervor classista nem o radicalismo colorido e festivo das lutas sociais. Por exemplo, São Paulo é palco da maior “manif” mundial de movimentos LGBT. E ninguém pode dizer que a cor e a festa faltem na parada gay da Av Paulista (que se repete anualmente e que já atingiu os 4 milhões de participantes). Para além desta, as lutas estudantis em 1968 e em 1992, a campanha das “diretas já” (anos 1980), as mobilizações pelo impeachement de Collor de Melo (92), as marchas do MST (97 e anos 2000), as lutas contra a violência e a corrupção no Rio de Janeiro, além do sindicalismo dos metalúrgicos, que revelou Lula da Silva como líder (anos 80), são somente alguns dos momentos altos dos protestos no Brasil. Em Portugal, por seu lado, o tempo das “manifs” e das concentrações apoteóticas – do 1º de Maio de 1974 à Fonte Luminosa de 75, e do cerco de São Bento à da bombinha da Pça do Comércio (afinal “só fumaça”) – passou rápido e perdeu-se na memória coletiva durante mais de trinta anos. Voltou recentemente, empurrado pela crise internacional e europeia. As maiores e mais impactantes “manifs” dos últimos dois anos foram as da Geração à Rasca (12/03/2011) e a dos desempregados, precários, pensionistas e jovens sem futuro (Que se Lixe a Troika, de 15/09/2012), que iniciaram um novo ciclo no protesto público luso, com provável continuidade nos próximos tempos e talvez com música de fundo, menos alegre mas bem compassada (inspirada no cante alentejano). O sindicalismo português, em vez de aliar-se, compete com a rebeldia “inorgânica”. O velho operariado – da Marinha Grande no início do salazarismo ou da Lisnave e Setenave dos anos da revolução –, foi rapidamente cooptado pelo PCP e, entretanto, implodiu, sendo substituído pelos sindicatos corporativistas do sector dos serviços, mais disciplinados e previsíveis. Divididos e enfraquecidos a cada dia que passa, os sindicatos (mesmo os da CGTP), já não fazem mossa; menos ainda enquanto a direção sindical e quem a comanda banalizar greves e “manifs”, tornando-as mero um ritual (cada vez mais cinzento e tristonho). Pelo contrário, no Brasil, tudo é muito mais
  • 3. matizado e dinâmico. Maior diversidade de correntes sindicais e maior indefinição ideológica (nos campos sindical e partidário), mas também maior poder transformador no plano político e social. O “lulismo” brasileiro tem pouco ou nada a ver com o velho “ludismo” britânico (foi mais político e menos violento), mas não foi menos importante no plano doméstico, dado o significado da mudança sociopolítica que induziu, sobretudo enquanto se abriu aos movimentos sociais. Além de derrubar uma ditadura, produziu um líder que transformou o país. Já as lideranças sindicais portuguesas não deram, até hoje, nenhum fruto desse teor. Quando o discurso sindical afirma um novo líder com base na retórica “anti-líder”, muito provavelmente o verdadeiro líder só nasce depois de se despir da armadura discursiva do unanimismo coletivista. __ * Investigador do Centro de Estudos Sociais da Universidade de Coimbra; Professor visitante da UNICAMP – Campinas, Brasil.