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ALCANCES E LIMITES DE UMA AÇÃO DE INCLUSÃO SOCIODIGITAL EM
                            JUIZ DE FORA

Bruno Fuser1; Lívia Carolina Gouvêa de Faria2; Fernanda dos Santos Rocha3

Resumo
        Este artigo relata as atividades desenvolvidas na segunda e terceira turmas da
oficina de inclusão digital “Novas Tecnologias e Ação Comunitária”, durante o 1º e 2º
semestres de 2008. Essa oficina integra os projetos “UFJF – Território de Oportunidades” e
“Comunicação para a Cidadania: tecnologias, identidade e ação comunitária”. Tem como
pressuposto que as ações de educação em novas tecnologias encontram semelhanças em
outras ações pedagógicas, e, a partir desse ponto de vista, alinha-se com perspectivas de
uma alfabetização crítica e libertadora. Entre os objetivos da oficina está o de ampliar a
cidadania dos seus participantes, garantindo o direito de interação social e de comunicação
através das redes informacionais, e as atividades prevêem o desenvolvimento de vários
módulos. No ano de 2008 a oficina foi oferecida a jovens dos bairros Granjas Bethânia e
Santa Cândida, da periferia de Juiz de Fora-MG. Em ambas as experiências percebeu-se a
familiaridade dos jovens com as tecnologias digitais, mas de maneira restrita a certos usos,
como Orkut e MSN, mas com desconhecimento de recursos como correio eletrônico ou
processador de texto. As atividades incluíram debates sobre temas diversos, como
violência, educação, saúde, direitos humanos, mas em muitos momentos a discussão a
respeito de tais assuntos, mesmo relacionados ao cotidiano dos jovens, ocorreu apenas de
maneira fragmentada e com significativa dificuldade. Uma das hipóteses para essa
resistência é o fato de a oficina se desenvolver em espaço distante daquele em que os
jovens circulam habitualmente, facilitando a resistência à abordagem de questões relativas
a tais contextos.

Palavras-chave: Sociedade em rede; Inclusão digital; Tecnologias da comunicação e da
informação

                                            1. Introdução

        Este trabalho dá continuidade às reflexões sobre a oficina “Novas Tecnologias e
Ação Comunitária”, desenvolvida como parte das atividades do projeto “UFJF – Território
de Oportunidades”, coordenado pela Faculdade de Serviço Social da UFJF, com
participação de diversas outras unidades, entre elas a Faculdade de Comunicação Social –
Facom. Uma primeira discussão já foi realizada4, relativa aos primeiros meses da oficina,
com jovens do bairro Santa Cândida (1º e 2º semestres de 2007). Aqui apresentamos uma
1
  Doutor em Ciências da Comunicação pela Universidade de São Paulo. É professor adjunto da UFJF e líder
do grupo de pesquisa Comunicação e Tecnologias. E-mail: bruno.fuser@ufjf.edu.br.
2
  Aluna da Faculdade de Comunicação Social da UFJF – 8º período; bolsista da oficina “Novas Tecnologias e
Ação Comunitária”. E-mail: liviacfaria@hotmail.com.
3
  Aluna da Faculdade de Comunicação Social da UFJF – 6º período; bolsista da oficina “Interação social em
rede”. E-mail: fenanda_rocha@yahoo.com.br.
4
  Trabalho realizado por dois dos co-autores deste texto, Bruno Fuser e Lívia Carolina Gouvêa de Faria, e
apresentado no XIII Congresso de Ciências de Comunicação da Região Sudeste, em maio de 2008.
Disponível na íntegra em http://www.intercom.org.br/papers/regionais/sudeste2008/resumos/R9-0335-1.pdf.




                                                                                                   1
discussão sobre os meses subseqüentes (1º e 2º semestres de 2008), quando a oficina
trabalhou com jovens do bairro Granjas Bethânia e com uma segunda turma do bairro
Santa Cândida. Iremos retomar algumas premissas gerais, algumas já descritas no texto
anterior, para permitir a necessária contextualização, antes de analisar especificamente
essas as novas experiências.
                               2. Opções teórico-metodológicas
                                   2.1. Inclusão sociodigital
        O crescimento do número de internautas, em especial aqueles com acesso
residencial, amplamente noticiado pela grande mídia, pode conduzir ao raciocínio, entre
ingênuo e mal-intencionado, de que a exclusão digital ficará superada em poucos anos e
que esforços nesse sentido apenas significariam gastos com equipamentos para aumentar os
lucros das empresas de informática e telefonia. É como se a questão do acesso universal às
tecnologias da comunicação e da informação estivesse resolvida, no curto ou médio prazo,
dispensando, assim, iniciativas públicas ou de Estado no sentido de superar a chamada
fratura digital.
        André Lemos (2005) apresenta, em interessante texto sobre inclusão digital,
algumas questões importantes de retomar. Ele reconhece que “estar inserido digitalmente
passa a ser considerado um direito dos cidadãos (...) uma obrigação para os poderes
públicos já que comumente associa-se inclusão digital como uma forma de inclusão social”
(LEMOS, 2005, p.2). Mas faz um primeiro alerta, justamente sobre as tendências
majoritárias na “ênfase ao aprendizado técnico”, o que “não parece ser o melhor caminho
para que a inclusão digital se transforme efetivamente em uma inclusão social” (idem, p.3).
        No debate sobre as possibilidades de as tecnologias digitais estimularem, ou
significarem nova dimensão da cidadania, Rousiley Maia (2002) adverte:
             (...) a Internet pode proporcionar um ambiente informativo rico (...) plataformas de
             diálogo (...). [Contudo] O alto custo dessa tecnologia (e das ligações telefônicas) e o
             elevado índice de analfabetismo barram o acesso de muitos ao espaço cibernético (...)
             as barreiras digitais tendem a reforçar os eixos de exclusão socioeconômicos e
             culturais quando as instituições políticas decidem utilizar as novas tecnologias para
             implementar políticas públicas (MAIA, 2002, p.51).

        Dessa forma, o ambiente comunicacional proporcionado pelas tecnologias digitais,
em especial a Internet: a) reveste-se de tal importância que não estar incluído no mesmo
significa a exclusão de um direito de cidadania; b) essa dimensão da cidadania exige que o
acesso ao mesmo se constitua em política pública; c) o acesso, simplesmente, não garante a
inclusão na perspectiva cidadã, pois pode significar adaptação, e não construção de um
paradigma de enriquecimento técnico, cultural, social e intelectual.


                                                                                              2
No planejamento da oficina, outra referência essencial é a da pedagogia a ser
aplicada nas atividades a serem desenvolvidas. Muitas das metodologias, técnicas e
instrumentos que são utilizados para a alfabetização convencional são também úteis e
aplicáveis na alfabetização digital, também chamada tecnológica, base das iniciativas de
inclusão social que abrangem a inclusão digital. Há vertentes que enfatizam a formação
instrumental, e outras que buscam incorporar tal saber instrumental em uma visão global,
crítica e transformadora da realidade, e esta atividade busca enquadrar-se entre estas
últimas. O fundamento dessas vertentes é, essencialmente, a pedagogia de Paulo Freire.
       O Mova - Movimento de Alfabetização, criado por Paulo Freire quando esteve na
Secretaria de Educação do Município de São Paulo, apresenta reflexões sobre que
significados pode ter uma alfabetização crítica e libertadora, como a preconizada pelo
educador pernambucano, ao se traduzi-la para uma alfabetização digital (ver
http://www.movadigital.pucsp.br).
       Uma alfabetização digital pode, portanto, ser compreendida como o processo de se
tomar consciência do mundo e de capacitação para a tomada de decisões a partir do
domínio das chamadas novas tecnologias. O MOVA salienta que "não se trata de uma
alfabetização restrita ao ensino de linguagens ou domínio de uso de software ou de novos
aplicativos como planilhas ou o uso da internet".
       Paulo Freire criticou veementemente o que denominava educação "bancária", na
qual o aluno é visto como um depósito a ser preenchido com o conhecimento transmitido
de maneira mecânica pelo professor. Nessa pedagogia “bancária", “o educador é o que
atua: os educandos, os que têm a ilusão de que atuam, na atuação do educador: o educador
escolhe o conteúdo programático, os educandos, jamais ouvidos nessa escolha, se
acomodam a ele" (FREIRE,1975b, p. 68).
       Em Freire (1975a) encontramos também aquelas que são para nós importantes
referências sobre a dimensão dialógica de que se reveste a comunicação, sob pena de se
constituir em "extensão", ausência de diálogo, imposição, "invasão cultural", na qual "o
invasor reduz os homens do espaço invadido a meros objetivos de sua ação" (FREIRE,
1975a, p.41).
       Gómez (ca. 2000) tece reflexões sobre a teoria da informática na educação à luz de
Paulo Freire:
           Na relação educador-educando deve-se privilegiar a responsabilidade mediadora do
           professor. Ou seja, sua capacidade de mediar o educando e o computador,
           gerenciando democraticamente a complexa rede propiciada pela informática.
           (GÓMEZ, ca. 2000).



                                                                                      3
Uma perspectiva de aplicação de metodologias de educação “não-bancárias” em
inclusão digital é apresentada por Thiago Guimarães, ao descrever a perspectiva adotada na
criação de oficinas nos telecentros do município de São Paulo (GUIMARÃES, 2003, p.
249).
                                3. Procedimentos iniciais
                3.1. A oficina “Novas Tecnologias e Ação Comunitária”
        Em Juiz de Fora, a Faculdade de Serviço Social, através do projeto UFJF –
Território de Oportunidades, que reúne várias oficinas, busca combater a exclusão social de
jovens moradores do entorno da Universidade, em especial aqueles provenientes de setores
populares. A oficina “Novas Tecnologias e Ação Comunitária”, que desenvolvemos desde
o 1º semestre de 2007 como parte de tal projeto, ocorreu inicialmente na Facom –
Faculdade de Comunicação Social da UFJF, e posteriormente na Casa de Cultura dessa
Universidade, que abriga o Pólo de Suporte às Políticas de Proteção à Família, à Infância e
à Juventude, da Faculdade de Serviço Social. A partir de dezembro de 2007, a participação
da Facom começou a se dar a partir do projeto “Comunicação para a Cidadania:
tecnologias, identidade e ação comunitária”, coordenado pela professora Cláudia Regina
Lahni, com a participação de vários docentes, inclusive de um dos co-autores deste artigo,
professor Bruno Fuser.
        A oficina de inclusão sociodigital que desenvolvemos tem por objetivos: ampliar a
cidadania dos seus participantes, garantindo o direito de interação social e de comunicação
através das redes informacionais; contribuir no sentido de construir conhecimento para
potencializar vocações profissionais existentes entre os participantes da oficina;
desenvolver atividades de educação não formal em tecnologias de comunicação e
informação. As atividades previstas são, de maneira sintética, desenvolver vários módulos:
de construção da história do bairro; construção da história da família; de interação social
(endereço eletrônico, MSN); de interação comunitária (blog do bairro).
        No ano de 2007 foram selecionadas duas turmas de 15 jovens (entre 15 e 17 anos)
cada uma para participar do projeto. Uma turma do bairro Santa Cândida e outra do bairro
Granjas Bethânia, ambos localizados na cidade de Juiz de Fora. Durante o 1º e 2º semestres
de 2007 a turma de jovens do bairro Santa Cândida participou da oficina de Novas
Tecnologias e Ação Comunitária. Durante o 1º semestre de 2008 coube à turma do bairro
Granjas Bethânia participar desta oficina e, no 2º semestre de 2008, uma nova turma de
jovens do bairro Santa Cândida se integrou – com algumas características diferenciadas, a
principal delas, sem dúvida, o fato de não haver bolsa para os jovens desta última turma.


                                                                                       4
Este trabalho consiste em uma análise das segunda e terceira turmas que
participaram da oficina, ou seja, os jovens do bairro Granjas Bethânia e aqueles da segunda
turma do bairro Santa Cândida, que não receberam bolsa e que desenvolveram, ademais, as
atividades de maneira intensa no contexto de ação do projeto “Comunicação para a
Cidadania: tecnologias, identidade e ação comunitária”. Tal projeto, como se afirmou
acima, foi iniciado em dezembro de 2007, com apoio da FAPEMIG.
                                3.2. Relato da experiência
                       3.2.1. A turma do bairro Granjas Bethânia
        Um dos principais pontos de apoio da estratégia da oficina, na primeira turma, de
2007,   havia   sido   a   criação   e   manutenção    do    blog   “Espaço   da   Galera”
(http://acaocomunitaria.zip.net/). O objetivo era o de que ele funcionasse como um espaço
comum para os alunos e até mesmo para os moradores de seus bairros. Um lugar de
discussões de problemas, apresentações de opiniões e que resultassem em apresentar
soluções. O blog também objetivava ser um lugar onde estes jovens pudessem expor sua
cultura, seu meio de vida e seu cotidiano.
        Da mesma forma como para os jovens da primeira turma do bairro Santa Cândida,
para aqueles do Granjas Bethânia foi mantida estrutura semelhante: a oficina de Novas
Tecnologias e Ação Comunitária foi oferecida uma vez por semana durante duas horas, no
laboratório de informática da Faculdade de Comunicação Social da UFJF.
        Nas primeiras oficinas fizemos uma apresentação dos diversos componentes do
computador (monitor, torre, HD, Ram, estabilizador, processador, a diferença entre
software e hardware, etc.). Também fizemos uma apresentação geral, na qual cada um
disse seu nome, idade, onde estudava, quais conhecimentos tinha sobre informática, se
possuía computador em casa e o que pretendia fazer quando terminasse o ensino médio.
Alguns tinham computador em casa e também já haviam feito um cursinho básico de
informática. Outros já tinham uma certa intimidade com a informática através de lan
house. A maioria queria fazer um curso superior, alguns, um curso técnico e outros,
concurso para Polícia Militar, Marinha e Corpo de Bombeiros.
        Em seguida mostramos como trabalhar com o Windows XP e suas diversas
ferramentas, como o “painel de controle”, “o meu computador” e “os meus documentos”.
Conversamos com os jovens sobre o que gostavam de ouvir, ler, ver, fazer e estudar.
        Então começamos a trabalhar no blog que fizemos com eles, denominado Oficina
de Inclusão Digital (http://oficinainclusaodigital.zip.net). Como havíamos feito uma visita
ao bairro Santa Cândida, colocamos fotos da visita no blog e nele discutimos e


                                                                                      5
comparamos os bairros Granjas Bethânia e Santa Cândida. No Granjas Bethânia não existe
uma pracinha como no Santa Cândida, mas em ambos as igrejas estão presentes na vida da
comunidade. Assim como o tráfico de drogas, a falta de segurança e de infra-estrutura
urbana, como um posto médico.
        Criamos um e-mail no Hotmail e um endereço de MSN para podermos enviar e
receber atividades. Trabalhamos no Word editando um trecho do relatório da oficina de
Geoprocessamento, em que uma das moradoras do bairro reclamava das poucas áreas de
lazer. Colocamos este trecho no blog e cada um falou sobre o que costuma fazer nos finais
de semana. As últimas oficinas foram mais lúdicas, ensinamos a baixar músicas na internet
e a gravar seus próprios CDs. Trabalhamos também com o PowerPoint, no qual eles
montaram uma apresentação de slides mostrando o que gostam de comer, ouvir, usar,
fazer, ler, etc.
        Em certa oficina, questionamos sobre as condições das escolas de cada um, sobre as
condições de ensino, lazer e merenda. Publicamos a discussão no blog e questionamos o
que deveria melhorar em suas escolas e como isso poderia acontecer. Os jovens
reclamaram bastante da má qualidade do ensino, de os professores faltarem bastante e da
falta de equipamento para utilizarem as quadras esportivas. Uma das escolas chegaria até a
cobrar dos alunos para comprar bolas de futebol, e outra não ofereceria merenda – fatos
que não puderam ser confirmados, pois o projeto não prevê visitas da equipe coordenadora
de todas oficinas ao bairro de origem dos jovens. Eles apontaram como possíveis soluções
uma maior dedicação dos professores e dos alunos nas atividades e uma maior organização
das escolas.
        Por último, montamos dois vídeos no Movie Maker, a partir da montagem de
imagens. O primeiro foi trabalhado a partir do Maio de 68, tema transversal a todas as
oficinas. Eles fizeram um vídeo sobre o que não gostam de fazer, mas são obrigados. Esta
atividade não teve o retorno esperado, a maioria dos alunos reclamou apenas da obrigação
de acordar cedo todos os dias. O segundo vídeo foi produzido a partir de outros elementos
de suas identidades, o cotidiano de cada um, a rotina e seus gostos.
        No geral, esta turma foi bastante fácil de trabalhar, pois, diferentemente da turma
anterior do Santa Cândida, a turma do Granjas Bethânia demonstrou uma intimidade muito
maior com o computador e com as novas tecnologias, o que facilitou na realização dos
trabalhos. Mas a turma se assemelhou à outra nos momentos de trabalhar as atividades
mais elaboradas, que exigem maior esforço de reflexão crítica sobre suas realidades. Da




                                                                                      6
mesma forma como seus colegas do outro bairro, não gostam de olhar para os problemas
do meio em que vivem e tentar buscar soluções.
                              3.2.2. A turma do Santa Cândida sem bolsa
        O projeto passou por importantes alterações em meados do ano de 2008. Finalizou-
se então na oficina de Novas Tecnologias e Ação Comunitária5 o trabalho com a turma do
bairro Granjas Bethânia, que, como as turmas anteriores, incluía o pagamento de uma bolsa
aos jovens, além de vale-transporte e lanche. A partir do 2º semestre de 2008, passou-se a
trabalhar com outra turma, também do bairro Santa Cândida, mas formada por jovens
selecionados a partir de sua participação na escola pública de ensino médio do bairro, e
sem pagamento de bolsa. A turma foi no entanto mais heterogênea em termos de idade,
abrangendo desde os 13 aos 17 anos.
        Inicialmente, havíamos programado utilizar o Orkut como um meio de discussão
dos temas abordados nas oficinas. Isso era possível, pois a oficina passou a se desenvolver
na Casa de Cultura da UFJF, onde foram instalados os equipamentos comprados com apoio
da FAPEMIG. Na Casa de Cultura o acesso ao Orkut não é bloqueado, como em todos os
computadores ligados à rede da UFJF no campus universitário. Cada oficina teria assim
três momentos: primeiro uma reflexão sobre um determinado tema (comum a todas as
oficinas), o que seria feito em uma sala sem computadores; depois, na comunidade do
Orkut, eles exporiam suas opiniões sobre o tema; por último, teríamos um momento de
síntese, com a produção de murais com as conclusões a que chegassem.
        A primeira oficina foi de apresentação, no dia 11 de setembro. Havia 15 jovens
presentes. A maioria já havia feito cursos de informática (mas mesmo assim sabia muito
pouco a respeito), não tinha computador em casa e acessava a internet em lan houses.
Mesmo os que tinham computador em casa diziam acessar em lan house porque os
computadores eram melhores e a internet mais rápida. Eles disseram costumar entrar em
Orkut, MSN e sites de jogos. Alguns acessavam o Youtube também para assistir a vídeos.
        O lazer foi o tema de debate da oficina seguinte. Aqui, falou-se de funk, pagode,
hip hop, lan house, bar e esporte (futebol, basquete). Em seguida, foi proposta aos jovens a
discussão sobre o lado negativo e positivo de cada atividade. Sobre o funk os jovens
destacaram que o lado positivo é dançar e a diversão que este ritmo proporciona nas festas.
Sobre o lado negativo, que algumas letras são pornográficas e outras incentivam brigas.

5
  A diferença temporal entre a primeira turma do Santa Cândida e a do Granjas Bethânia ocorreu apenas nas
oficinas de Novas Tecnologias e de Geoprocessamento. Nas demais, como de rádio, inglês, jornal, etc., as
turmas se mesclavam, e foram concomitantes. Essa heterogeneidade foi descrita como positiva no relato da
maioria das coordenações das demais oficinas.


                                                                                                   7
Além disso, um assunto muito discutido foram as brigas nos bailes funk. Os jovens
disseram que seria por causa do grande número de pessoas e o grande tumulto desses
bailes. Por isso, as brigas começariam por alguém olhar para o namorado (a) de outra
pessoa, ou empurrar outra pessoa, etc. A discussão ali vivenciada mostrou alguma
intolerância entre os jovens, no que diz respeito às formas de ser e se divertir.
       No Orkut foi criada a comunidade “Bairro Santa Cândida-JF”, e, nessa comunidade,
um fórum, “Lazer no Santa Cândida”. Ali eles apresentaram seus pontos de vista, de
maneira praticamente idêntica ao que haviam mencionado na discussão em sala, respostas
bem curtas, alguns apenas colocaram letras de música.
       O tema foi retomado na oficina seguinte, desta vez especificamente sobre lan
houses, bar e esporte. No início, discutiu-se o tipo preferido de lazer, e freqüentar bar
ganhou com 6 votos, 5 votos foram para esporte e 4 para lan houses (cada jovem podia
votar de uma a duas opções). A partir dessa discussão pudemos observar que havia um
grupo de meninas – as mais velhas - que demonstravam gostar muito de bebidas alcoólicas
e que bebiam constantemente nos fins de semana. Sobre o bar, os jovens ressaltaram como
aspectos positivos, as conversas que têm quando estão sentados bebendo. Sobre os
aspectos negativos disseram que quando bebem demais pagam mico, choram, derrubam o
copo no chão.
       O tópico lan house levantou como aspectos positivos a internet, Orkut, MSN, jogos,
Youtube e o computador como um todo. Já os aspectos negativos citados foram ter que
pagar para usar, teclados ruins, computadores lentos.
       O último tema discutido nesta oficina foi o esporte. Os jovens disseram que
praticam na escola queimada, basquete, futebol, futsal, vôlei. Nos aspectos positivos
destacaram a diversão e o lazer que estes esportes lhes proporcionam. E os aspectos
negativos destacados foram a violência entre os jogadores, que acaba ocasionando brigas e
também o fato de só jogarem na escola porque não têm outro espaço. Depois da discussão,
foi pedido para que os jovens respondessem a três tópicos colocados na nossa comunidade
do Orkut, relativos a cada um dos temas abordados. As respostas foram quase sempre
curtas, houve respostas dadas sem a leitura da pergunta.
       Na oficina da semana seguinte, dos 15 jovens do início compareceram apenas
quatro. Dois deles deixariam o projeto por motivo de trabalho; uma menina estaria saindo
porque o pai teria lhe tirado do projeto como castigo, por motivos de comportamento.
Outros abandonaram gradualmente o projeto; ao final, havia sete jovens efetivamente
participando. Nesse encontro foi iniciado – com certo desalento, causado pelo


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esvaziamento da atividade, depois felizmente superado – o debate sobre o Estatuto da
Criança e do Adolescente, que estava sendo tratado na escola dos jovens e seria também o
tema transversal daquele momento em todas as oficinas do projeto Comunicação para
Cidadania. Apresentamos a versão “Turma da Mônica” do ECA, dando-lhes algum tempo
para leitura. Depois foi pedido que cada um escolhesse dois dos direitos do ECA para que
depois começassem a construir uma apresentação no PowerPoint com os temas escolhidos.
       Concentramos as atividades da oficina na produção em PowerPoint porque
estávamos tendo muitos problemas para acessar o Orkut com os computadores da Casa de
Cultura, por isso, o projeto inicial de discussão em sala, postagem no Orkut e montagem de
murais foi sendo modificado, até ser definitivamente abandonado.
       Em outra oportunidade, ao invés de oficina, foi feita uma visita ao Fórum da
Cultura da UFJF. As bolsistas nos apresentaram os diversos espaços do Fórum, o museu e
o teatro. Os jovens levaram as câmeras fotográficas do projeto e tiraram inúmeras fotos,
dos cômodos, objetos, e, principalmente, deles mesmos. Na oficina seguinte apresentou-se
o que é um e-mail (correio eletrônico) e como usá-lo. Foi proposto aos adolescentes que
enviassem um e-mail contando suas impressões sobre as visitas ao campus da UFJF e ao
Fórum da Cultura. Além disso, deveriam destacar pelo menos uma foto, que teriam feito no
dias das visitas, para anexar ao e-mail. A grande maioria das adolescentes nunca tinha
enviado um e-mail, apesar de já o possuírem devido ao cadastro no MSN ou no Orkut.
       Apresentou-se como bastante difícil desenvolver a discussão de temas relativos aos
direitos assegurados no ECA – como o direito à vida, saúde, liberdade, convivência
familiar e comunitária, cultura e ao respeito -, mesmo relacionando-os ao cotidiano dos
jovens. Isso depois foi de alguma maneira conseguido, muito se falou em “a sua liberdade
vai até o limite do outro”, “os pais deveriam conversar mais com os filhos antes de bater” e
em contrapartida “cada um tem um limite, não dá para obrigar a fazer determinadas
coisas”, “se só conversar funcionasse, eu seria um anjo”.
       A incorporação dessa discussão às apresentações em PowerPoint, no entanto, foi
deixada de lado pelos jovens, que se preocuparam mais em procurar fotos e formas de
enfeitar seus trabalhos. Para estimular a participação verbal – eles e elas, quando
começavam a falar, falavam bastante, embora pouco escrevessem - gravamos uma fala de
cada um dos jovens em que eles se apresentavam e comentavam algo do Estatuto. Essas
intervenções foram inseridas no início de seus trabalhos. Na gravação das falas os jovens se
mostraram intimidados e nervosos, mas ninguém se negou a fazer a atividade. Tais áudios




                                                                                       9
foram depois bastante apreciados na confraternização de final de ano, quando as
apresentações foram mostradas para todos os jovens e seus familiares.
       Por último, pedimos aos jovens que baixassem alguma música da internet para que
colocassem em seus trabalhos. Cada um procurou baixar uma música em seu estilo
preferido, embora alguns, por estarem em um momento diferenciado na produção da
apresentação, acabassem por escolher músicas que já estavam baixadas nas máquinas.
       No final, os jovens produziram trabalhos que eram capazes de reproduzir o jeito de
cada um e o estilo de vida deles também, de maneira produtiva e que os fizeram refletir,
durante o processo de produção, sobre suas vidas e suas histórias.        De maneira geral,
todos conseguiram concluir as atividades, alguns mostrando mais interesse, outros menos,
utilizando recursos variados, refletindo sobre o seu dia-a-dia e utilizando a imaginação para
a confecção das apresentações em PowerPoint. O interessante foi levantar novos
questionamentos e desafios para os participantes a cada dia, incitando-os a buscar na
internet mais do que notícias feitas ou coisas prontas, mas levá-los a produzir notícias e
discussões pessoais e do seu bairro, descobrindo desta forma a infinidade de opções que o
computador oferece. A maior dificuldade foi ultrapassar o uso corrente do Orkut e do MSN
entre os adolescentes em lan houses.
                                  4. Comentários finais
       Durante a oficina de Novas Tecnologias e Ação Comunitária, integrante do projeto
“Comunicação para a Cidadania: tecnologias, identidade e ação comunitária”, foi possível
perceber algumas questões, em especial a partir de setembro de 2009, quando o projeto
assumiu algumas feições específicas, como o fato de os jovens não receberem bolsa e as
atividades serem, quase todas, desenvolvidas na Casa de Cultura. A oficina foi planejada
para se desenvolver focada em especial na produção de material digital a partir da
discussão de temas comuns ao projeto. As informações e o estímulo à reflexão a serem
propiciados na discussão dos temas comuns seriam a base da redação de tópicos no Orkut,
realização de murais e criação de apresentações em PowerPoint.
       A oficina partiu do princípio de que a possibilidade de utilização do Orkut
(bloqueado no campus da UFJF) seria elemento de interesse dos jovens, como já havia sido
demonstrado nas turmas anteriores (do próprio Santa Cândida e do Granjas Bethânia).
Contudo, a dificuldade de utilização encontrada para acessar a internet, em especial o
Orkut, devido à presença de vírus e da lentidão da própria conexão à internet, causou uma
grande dificuldade inicial, o que configurou-se em elemento não previsto no planejamento
e que obrigou a uma revisão dos instrumentos técnicos previstos para a oficina. Desta


                                                                                        10
forma, o Orkut foi paulatinamente sendo abandonado, e privilegiou-se a produção de
apresentações em PowerPoint.
       Ao se utilizar o Orkut, nas primeiras sessões da oficina, mesmo com dificuldade de
acesso, percebeu-se que os tópicos trazidos para debate eram respondidos quase sempre
com frases repetitivas, curtas, com pouca ou nenhuma informação além da já apresentada
na discussão prévia dos temas. Avaliamos que isso ocorreu – e não apenas na dinâmica que
utilizou o Orkut – em parte pelo fato de a oficina dar-se distante do espaço primordial de
convívio dos jovens, seu bairro. Assim, não estaria suficientemente presente um elemento
importante para a reflexão crítica a respeito da situação de vida dos jovens que participam
do projeto, a discussão sobre seu próprio cotidiano, assim como a inserção dos elementos
desse cotidiano da produção da oficina.
       Essa discussão foi possível em alguns momentos – a partir dos temas unificadores
do projeto, como o Estatuto de Criança e do Adolescente (ECA). No entanto, a presença de
questões relativas ao cotidiano dos jovens, mesmo no que se refere ao ECA, em certa
medida viu-se prejudicada pela necessidade de abstração permanente. Tal fato se
intensifica na medida em que a oficina trabalha com o acesso a instrumentos tecnológicos
relacionados de maneira hegemônica com uma relação estritamente de consumo. Assim,
nos diversos momentos em que os jovens preferiam utilizar elementos da indústria cultural
em sua produção a inserção de elementos do cotidiano tornava-se difícil, ou apenas se dava
após uma discussão específica, para a qual muitas vezes havia resistência. A discussão
sobre o ECA, assim como a produção digital realizada, ressentiu-se dessa situação. Se por
um lado tal produção trouxe elementos estéticos que podem ser facilmente reconhecíveis
como parte do banco de imagens do Google, por outro não se realizou uma discussão mais
aprofundada sobre o cotidiano dos jovens.
       A turma que foi iniciada em setembro de 2008 demonstrou maior grau de adesão às
atividades propostas que a primeira turma do bairro Santa Cândida, com a qual se
trabalhou em 2007, e mesmo que a turma do Granjas Bethânia, que participou da oficina
no 1º semestre de 2008. A saída de alguns jovens, por motivos diversos, no entanto – e
alguns deles extremamente participantes e com acentuada visão crítica da sociedade – fez
com que se alterasse uma dinâmica que iniciara bastante promissora em termos de
profundidade de discussões sobre os temas propostos. Assim, se por um lado a não
concessão de bolsa garantiu a presença no projeto de jovens de fato interessados nas
atividades ali desenvolvidas (com nível menor de dispersão, maior empenho, interesse nas
propostas feitas, em relação a jovens que recebiam a bolsa e que chegavam às vezes a


                                                                                      11
demonstrar estar ali apenas para recebê-la), por outro esses jovens que tiveram de
abandonar as oficinas pela necessidade de garantir a si e a suas famílias talvez não o
tivessem feito se contassem com a bolsa – mesmo de R$ 200 ao mês.
                               5. Referências bibliográficas
FREIRE, P. (1975 a) Comunicação ou extensão. Paz e Terra : São Paulo, 1975. 2. ed.
FREIRE, P. (1975 b): Pedagogia do Oprimido. Rio de Janeiro, Paz e Terra, 1975. 3. ed.
FUSER, B. e OROÑA, B. Informática educativa em Juiz de Fora: ação de cidadania e
inclusão digital. In: Anais do XIII Congresso de Ciências da Comunicação na Região
Sudeste. São Paulo, Intercom, 2008.
GÓMES, M. V. Paulo Freire: Re-Leitura Para Uma Teoria Da Informática Na
Educação. São Paulo : ECA/USP, (ca 2000). Disponível em:
http://www.eca.usp.br/nucleos/nce/perfil_margari.html. Acesso realizado em 08.03.05.
GUIMARÃES, Thiago. “A luta pela inclusão digital: experiências e perspectivas dos
Telecentros em São Paulo”. In: SILVEIRA, Sérgio Amadeu da e CASSINO, João (orgs.)
Software livre e inclusão digital. São Paulo : Conrad Editora do Brasil, 2003. Págs. 237-
254.
LEMOS, A. e COSTA, L. F. Um modelo de inclusão digital: o caso da cidade de Salvador.
Revista de Economía Política de las Tecnologías de la Información y Comunicación.
www.eptic.com.br, Vol. VIII, n. 6, Sep. – Dic. 2005. Acesso: 01/07/2008.
MAIA, R. C. M. Redes cívicas e internet. Em: Eisenberg, José e Cepik, Marco. (orgs.)
Internet e Política: teoria e prática da democracia eletrônica. Belo Horizonte : Editora
UFMG, 2002. P. 141-163
MOVA DIGITAL. “Programa Municipal de Alfabetização Digital” [on line]
<http://www.movadigital.pucsp.br> [Consulta: 19 janeiro 2005]




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  • 1. ALCANCES E LIMITES DE UMA AÇÃO DE INCLUSÃO SOCIODIGITAL EM JUIZ DE FORA Bruno Fuser1; Lívia Carolina Gouvêa de Faria2; Fernanda dos Santos Rocha3 Resumo Este artigo relata as atividades desenvolvidas na segunda e terceira turmas da oficina de inclusão digital “Novas Tecnologias e Ação Comunitária”, durante o 1º e 2º semestres de 2008. Essa oficina integra os projetos “UFJF – Território de Oportunidades” e “Comunicação para a Cidadania: tecnologias, identidade e ação comunitária”. Tem como pressuposto que as ações de educação em novas tecnologias encontram semelhanças em outras ações pedagógicas, e, a partir desse ponto de vista, alinha-se com perspectivas de uma alfabetização crítica e libertadora. Entre os objetivos da oficina está o de ampliar a cidadania dos seus participantes, garantindo o direito de interação social e de comunicação através das redes informacionais, e as atividades prevêem o desenvolvimento de vários módulos. No ano de 2008 a oficina foi oferecida a jovens dos bairros Granjas Bethânia e Santa Cândida, da periferia de Juiz de Fora-MG. Em ambas as experiências percebeu-se a familiaridade dos jovens com as tecnologias digitais, mas de maneira restrita a certos usos, como Orkut e MSN, mas com desconhecimento de recursos como correio eletrônico ou processador de texto. As atividades incluíram debates sobre temas diversos, como violência, educação, saúde, direitos humanos, mas em muitos momentos a discussão a respeito de tais assuntos, mesmo relacionados ao cotidiano dos jovens, ocorreu apenas de maneira fragmentada e com significativa dificuldade. Uma das hipóteses para essa resistência é o fato de a oficina se desenvolver em espaço distante daquele em que os jovens circulam habitualmente, facilitando a resistência à abordagem de questões relativas a tais contextos. Palavras-chave: Sociedade em rede; Inclusão digital; Tecnologias da comunicação e da informação 1. Introdução Este trabalho dá continuidade às reflexões sobre a oficina “Novas Tecnologias e Ação Comunitária”, desenvolvida como parte das atividades do projeto “UFJF – Território de Oportunidades”, coordenado pela Faculdade de Serviço Social da UFJF, com participação de diversas outras unidades, entre elas a Faculdade de Comunicação Social – Facom. Uma primeira discussão já foi realizada4, relativa aos primeiros meses da oficina, com jovens do bairro Santa Cândida (1º e 2º semestres de 2007). Aqui apresentamos uma 1 Doutor em Ciências da Comunicação pela Universidade de São Paulo. É professor adjunto da UFJF e líder do grupo de pesquisa Comunicação e Tecnologias. E-mail: bruno.fuser@ufjf.edu.br. 2 Aluna da Faculdade de Comunicação Social da UFJF – 8º período; bolsista da oficina “Novas Tecnologias e Ação Comunitária”. E-mail: liviacfaria@hotmail.com. 3 Aluna da Faculdade de Comunicação Social da UFJF – 6º período; bolsista da oficina “Interação social em rede”. E-mail: fenanda_rocha@yahoo.com.br. 4 Trabalho realizado por dois dos co-autores deste texto, Bruno Fuser e Lívia Carolina Gouvêa de Faria, e apresentado no XIII Congresso de Ciências de Comunicação da Região Sudeste, em maio de 2008. Disponível na íntegra em http://www.intercom.org.br/papers/regionais/sudeste2008/resumos/R9-0335-1.pdf. 1
  • 2. discussão sobre os meses subseqüentes (1º e 2º semestres de 2008), quando a oficina trabalhou com jovens do bairro Granjas Bethânia e com uma segunda turma do bairro Santa Cândida. Iremos retomar algumas premissas gerais, algumas já descritas no texto anterior, para permitir a necessária contextualização, antes de analisar especificamente essas as novas experiências. 2. Opções teórico-metodológicas 2.1. Inclusão sociodigital O crescimento do número de internautas, em especial aqueles com acesso residencial, amplamente noticiado pela grande mídia, pode conduzir ao raciocínio, entre ingênuo e mal-intencionado, de que a exclusão digital ficará superada em poucos anos e que esforços nesse sentido apenas significariam gastos com equipamentos para aumentar os lucros das empresas de informática e telefonia. É como se a questão do acesso universal às tecnologias da comunicação e da informação estivesse resolvida, no curto ou médio prazo, dispensando, assim, iniciativas públicas ou de Estado no sentido de superar a chamada fratura digital. André Lemos (2005) apresenta, em interessante texto sobre inclusão digital, algumas questões importantes de retomar. Ele reconhece que “estar inserido digitalmente passa a ser considerado um direito dos cidadãos (...) uma obrigação para os poderes públicos já que comumente associa-se inclusão digital como uma forma de inclusão social” (LEMOS, 2005, p.2). Mas faz um primeiro alerta, justamente sobre as tendências majoritárias na “ênfase ao aprendizado técnico”, o que “não parece ser o melhor caminho para que a inclusão digital se transforme efetivamente em uma inclusão social” (idem, p.3). No debate sobre as possibilidades de as tecnologias digitais estimularem, ou significarem nova dimensão da cidadania, Rousiley Maia (2002) adverte: (...) a Internet pode proporcionar um ambiente informativo rico (...) plataformas de diálogo (...). [Contudo] O alto custo dessa tecnologia (e das ligações telefônicas) e o elevado índice de analfabetismo barram o acesso de muitos ao espaço cibernético (...) as barreiras digitais tendem a reforçar os eixos de exclusão socioeconômicos e culturais quando as instituições políticas decidem utilizar as novas tecnologias para implementar políticas públicas (MAIA, 2002, p.51). Dessa forma, o ambiente comunicacional proporcionado pelas tecnologias digitais, em especial a Internet: a) reveste-se de tal importância que não estar incluído no mesmo significa a exclusão de um direito de cidadania; b) essa dimensão da cidadania exige que o acesso ao mesmo se constitua em política pública; c) o acesso, simplesmente, não garante a inclusão na perspectiva cidadã, pois pode significar adaptação, e não construção de um paradigma de enriquecimento técnico, cultural, social e intelectual. 2
  • 3. No planejamento da oficina, outra referência essencial é a da pedagogia a ser aplicada nas atividades a serem desenvolvidas. Muitas das metodologias, técnicas e instrumentos que são utilizados para a alfabetização convencional são também úteis e aplicáveis na alfabetização digital, também chamada tecnológica, base das iniciativas de inclusão social que abrangem a inclusão digital. Há vertentes que enfatizam a formação instrumental, e outras que buscam incorporar tal saber instrumental em uma visão global, crítica e transformadora da realidade, e esta atividade busca enquadrar-se entre estas últimas. O fundamento dessas vertentes é, essencialmente, a pedagogia de Paulo Freire. O Mova - Movimento de Alfabetização, criado por Paulo Freire quando esteve na Secretaria de Educação do Município de São Paulo, apresenta reflexões sobre que significados pode ter uma alfabetização crítica e libertadora, como a preconizada pelo educador pernambucano, ao se traduzi-la para uma alfabetização digital (ver http://www.movadigital.pucsp.br). Uma alfabetização digital pode, portanto, ser compreendida como o processo de se tomar consciência do mundo e de capacitação para a tomada de decisões a partir do domínio das chamadas novas tecnologias. O MOVA salienta que "não se trata de uma alfabetização restrita ao ensino de linguagens ou domínio de uso de software ou de novos aplicativos como planilhas ou o uso da internet". Paulo Freire criticou veementemente o que denominava educação "bancária", na qual o aluno é visto como um depósito a ser preenchido com o conhecimento transmitido de maneira mecânica pelo professor. Nessa pedagogia “bancária", “o educador é o que atua: os educandos, os que têm a ilusão de que atuam, na atuação do educador: o educador escolhe o conteúdo programático, os educandos, jamais ouvidos nessa escolha, se acomodam a ele" (FREIRE,1975b, p. 68). Em Freire (1975a) encontramos também aquelas que são para nós importantes referências sobre a dimensão dialógica de que se reveste a comunicação, sob pena de se constituir em "extensão", ausência de diálogo, imposição, "invasão cultural", na qual "o invasor reduz os homens do espaço invadido a meros objetivos de sua ação" (FREIRE, 1975a, p.41). Gómez (ca. 2000) tece reflexões sobre a teoria da informática na educação à luz de Paulo Freire: Na relação educador-educando deve-se privilegiar a responsabilidade mediadora do professor. Ou seja, sua capacidade de mediar o educando e o computador, gerenciando democraticamente a complexa rede propiciada pela informática. (GÓMEZ, ca. 2000). 3
  • 4. Uma perspectiva de aplicação de metodologias de educação “não-bancárias” em inclusão digital é apresentada por Thiago Guimarães, ao descrever a perspectiva adotada na criação de oficinas nos telecentros do município de São Paulo (GUIMARÃES, 2003, p. 249). 3. Procedimentos iniciais 3.1. A oficina “Novas Tecnologias e Ação Comunitária” Em Juiz de Fora, a Faculdade de Serviço Social, através do projeto UFJF – Território de Oportunidades, que reúne várias oficinas, busca combater a exclusão social de jovens moradores do entorno da Universidade, em especial aqueles provenientes de setores populares. A oficina “Novas Tecnologias e Ação Comunitária”, que desenvolvemos desde o 1º semestre de 2007 como parte de tal projeto, ocorreu inicialmente na Facom – Faculdade de Comunicação Social da UFJF, e posteriormente na Casa de Cultura dessa Universidade, que abriga o Pólo de Suporte às Políticas de Proteção à Família, à Infância e à Juventude, da Faculdade de Serviço Social. A partir de dezembro de 2007, a participação da Facom começou a se dar a partir do projeto “Comunicação para a Cidadania: tecnologias, identidade e ação comunitária”, coordenado pela professora Cláudia Regina Lahni, com a participação de vários docentes, inclusive de um dos co-autores deste artigo, professor Bruno Fuser. A oficina de inclusão sociodigital que desenvolvemos tem por objetivos: ampliar a cidadania dos seus participantes, garantindo o direito de interação social e de comunicação através das redes informacionais; contribuir no sentido de construir conhecimento para potencializar vocações profissionais existentes entre os participantes da oficina; desenvolver atividades de educação não formal em tecnologias de comunicação e informação. As atividades previstas são, de maneira sintética, desenvolver vários módulos: de construção da história do bairro; construção da história da família; de interação social (endereço eletrônico, MSN); de interação comunitária (blog do bairro). No ano de 2007 foram selecionadas duas turmas de 15 jovens (entre 15 e 17 anos) cada uma para participar do projeto. Uma turma do bairro Santa Cândida e outra do bairro Granjas Bethânia, ambos localizados na cidade de Juiz de Fora. Durante o 1º e 2º semestres de 2007 a turma de jovens do bairro Santa Cândida participou da oficina de Novas Tecnologias e Ação Comunitária. Durante o 1º semestre de 2008 coube à turma do bairro Granjas Bethânia participar desta oficina e, no 2º semestre de 2008, uma nova turma de jovens do bairro Santa Cândida se integrou – com algumas características diferenciadas, a principal delas, sem dúvida, o fato de não haver bolsa para os jovens desta última turma. 4
  • 5. Este trabalho consiste em uma análise das segunda e terceira turmas que participaram da oficina, ou seja, os jovens do bairro Granjas Bethânia e aqueles da segunda turma do bairro Santa Cândida, que não receberam bolsa e que desenvolveram, ademais, as atividades de maneira intensa no contexto de ação do projeto “Comunicação para a Cidadania: tecnologias, identidade e ação comunitária”. Tal projeto, como se afirmou acima, foi iniciado em dezembro de 2007, com apoio da FAPEMIG. 3.2. Relato da experiência 3.2.1. A turma do bairro Granjas Bethânia Um dos principais pontos de apoio da estratégia da oficina, na primeira turma, de 2007, havia sido a criação e manutenção do blog “Espaço da Galera” (http://acaocomunitaria.zip.net/). O objetivo era o de que ele funcionasse como um espaço comum para os alunos e até mesmo para os moradores de seus bairros. Um lugar de discussões de problemas, apresentações de opiniões e que resultassem em apresentar soluções. O blog também objetivava ser um lugar onde estes jovens pudessem expor sua cultura, seu meio de vida e seu cotidiano. Da mesma forma como para os jovens da primeira turma do bairro Santa Cândida, para aqueles do Granjas Bethânia foi mantida estrutura semelhante: a oficina de Novas Tecnologias e Ação Comunitária foi oferecida uma vez por semana durante duas horas, no laboratório de informática da Faculdade de Comunicação Social da UFJF. Nas primeiras oficinas fizemos uma apresentação dos diversos componentes do computador (monitor, torre, HD, Ram, estabilizador, processador, a diferença entre software e hardware, etc.). Também fizemos uma apresentação geral, na qual cada um disse seu nome, idade, onde estudava, quais conhecimentos tinha sobre informática, se possuía computador em casa e o que pretendia fazer quando terminasse o ensino médio. Alguns tinham computador em casa e também já haviam feito um cursinho básico de informática. Outros já tinham uma certa intimidade com a informática através de lan house. A maioria queria fazer um curso superior, alguns, um curso técnico e outros, concurso para Polícia Militar, Marinha e Corpo de Bombeiros. Em seguida mostramos como trabalhar com o Windows XP e suas diversas ferramentas, como o “painel de controle”, “o meu computador” e “os meus documentos”. Conversamos com os jovens sobre o que gostavam de ouvir, ler, ver, fazer e estudar. Então começamos a trabalhar no blog que fizemos com eles, denominado Oficina de Inclusão Digital (http://oficinainclusaodigital.zip.net). Como havíamos feito uma visita ao bairro Santa Cândida, colocamos fotos da visita no blog e nele discutimos e 5
  • 6. comparamos os bairros Granjas Bethânia e Santa Cândida. No Granjas Bethânia não existe uma pracinha como no Santa Cândida, mas em ambos as igrejas estão presentes na vida da comunidade. Assim como o tráfico de drogas, a falta de segurança e de infra-estrutura urbana, como um posto médico. Criamos um e-mail no Hotmail e um endereço de MSN para podermos enviar e receber atividades. Trabalhamos no Word editando um trecho do relatório da oficina de Geoprocessamento, em que uma das moradoras do bairro reclamava das poucas áreas de lazer. Colocamos este trecho no blog e cada um falou sobre o que costuma fazer nos finais de semana. As últimas oficinas foram mais lúdicas, ensinamos a baixar músicas na internet e a gravar seus próprios CDs. Trabalhamos também com o PowerPoint, no qual eles montaram uma apresentação de slides mostrando o que gostam de comer, ouvir, usar, fazer, ler, etc. Em certa oficina, questionamos sobre as condições das escolas de cada um, sobre as condições de ensino, lazer e merenda. Publicamos a discussão no blog e questionamos o que deveria melhorar em suas escolas e como isso poderia acontecer. Os jovens reclamaram bastante da má qualidade do ensino, de os professores faltarem bastante e da falta de equipamento para utilizarem as quadras esportivas. Uma das escolas chegaria até a cobrar dos alunos para comprar bolas de futebol, e outra não ofereceria merenda – fatos que não puderam ser confirmados, pois o projeto não prevê visitas da equipe coordenadora de todas oficinas ao bairro de origem dos jovens. Eles apontaram como possíveis soluções uma maior dedicação dos professores e dos alunos nas atividades e uma maior organização das escolas. Por último, montamos dois vídeos no Movie Maker, a partir da montagem de imagens. O primeiro foi trabalhado a partir do Maio de 68, tema transversal a todas as oficinas. Eles fizeram um vídeo sobre o que não gostam de fazer, mas são obrigados. Esta atividade não teve o retorno esperado, a maioria dos alunos reclamou apenas da obrigação de acordar cedo todos os dias. O segundo vídeo foi produzido a partir de outros elementos de suas identidades, o cotidiano de cada um, a rotina e seus gostos. No geral, esta turma foi bastante fácil de trabalhar, pois, diferentemente da turma anterior do Santa Cândida, a turma do Granjas Bethânia demonstrou uma intimidade muito maior com o computador e com as novas tecnologias, o que facilitou na realização dos trabalhos. Mas a turma se assemelhou à outra nos momentos de trabalhar as atividades mais elaboradas, que exigem maior esforço de reflexão crítica sobre suas realidades. Da 6
  • 7. mesma forma como seus colegas do outro bairro, não gostam de olhar para os problemas do meio em que vivem e tentar buscar soluções. 3.2.2. A turma do Santa Cândida sem bolsa O projeto passou por importantes alterações em meados do ano de 2008. Finalizou- se então na oficina de Novas Tecnologias e Ação Comunitária5 o trabalho com a turma do bairro Granjas Bethânia, que, como as turmas anteriores, incluía o pagamento de uma bolsa aos jovens, além de vale-transporte e lanche. A partir do 2º semestre de 2008, passou-se a trabalhar com outra turma, também do bairro Santa Cândida, mas formada por jovens selecionados a partir de sua participação na escola pública de ensino médio do bairro, e sem pagamento de bolsa. A turma foi no entanto mais heterogênea em termos de idade, abrangendo desde os 13 aos 17 anos. Inicialmente, havíamos programado utilizar o Orkut como um meio de discussão dos temas abordados nas oficinas. Isso era possível, pois a oficina passou a se desenvolver na Casa de Cultura da UFJF, onde foram instalados os equipamentos comprados com apoio da FAPEMIG. Na Casa de Cultura o acesso ao Orkut não é bloqueado, como em todos os computadores ligados à rede da UFJF no campus universitário. Cada oficina teria assim três momentos: primeiro uma reflexão sobre um determinado tema (comum a todas as oficinas), o que seria feito em uma sala sem computadores; depois, na comunidade do Orkut, eles exporiam suas opiniões sobre o tema; por último, teríamos um momento de síntese, com a produção de murais com as conclusões a que chegassem. A primeira oficina foi de apresentação, no dia 11 de setembro. Havia 15 jovens presentes. A maioria já havia feito cursos de informática (mas mesmo assim sabia muito pouco a respeito), não tinha computador em casa e acessava a internet em lan houses. Mesmo os que tinham computador em casa diziam acessar em lan house porque os computadores eram melhores e a internet mais rápida. Eles disseram costumar entrar em Orkut, MSN e sites de jogos. Alguns acessavam o Youtube também para assistir a vídeos. O lazer foi o tema de debate da oficina seguinte. Aqui, falou-se de funk, pagode, hip hop, lan house, bar e esporte (futebol, basquete). Em seguida, foi proposta aos jovens a discussão sobre o lado negativo e positivo de cada atividade. Sobre o funk os jovens destacaram que o lado positivo é dançar e a diversão que este ritmo proporciona nas festas. Sobre o lado negativo, que algumas letras são pornográficas e outras incentivam brigas. 5 A diferença temporal entre a primeira turma do Santa Cândida e a do Granjas Bethânia ocorreu apenas nas oficinas de Novas Tecnologias e de Geoprocessamento. Nas demais, como de rádio, inglês, jornal, etc., as turmas se mesclavam, e foram concomitantes. Essa heterogeneidade foi descrita como positiva no relato da maioria das coordenações das demais oficinas. 7
  • 8. Além disso, um assunto muito discutido foram as brigas nos bailes funk. Os jovens disseram que seria por causa do grande número de pessoas e o grande tumulto desses bailes. Por isso, as brigas começariam por alguém olhar para o namorado (a) de outra pessoa, ou empurrar outra pessoa, etc. A discussão ali vivenciada mostrou alguma intolerância entre os jovens, no que diz respeito às formas de ser e se divertir. No Orkut foi criada a comunidade “Bairro Santa Cândida-JF”, e, nessa comunidade, um fórum, “Lazer no Santa Cândida”. Ali eles apresentaram seus pontos de vista, de maneira praticamente idêntica ao que haviam mencionado na discussão em sala, respostas bem curtas, alguns apenas colocaram letras de música. O tema foi retomado na oficina seguinte, desta vez especificamente sobre lan houses, bar e esporte. No início, discutiu-se o tipo preferido de lazer, e freqüentar bar ganhou com 6 votos, 5 votos foram para esporte e 4 para lan houses (cada jovem podia votar de uma a duas opções). A partir dessa discussão pudemos observar que havia um grupo de meninas – as mais velhas - que demonstravam gostar muito de bebidas alcoólicas e que bebiam constantemente nos fins de semana. Sobre o bar, os jovens ressaltaram como aspectos positivos, as conversas que têm quando estão sentados bebendo. Sobre os aspectos negativos disseram que quando bebem demais pagam mico, choram, derrubam o copo no chão. O tópico lan house levantou como aspectos positivos a internet, Orkut, MSN, jogos, Youtube e o computador como um todo. Já os aspectos negativos citados foram ter que pagar para usar, teclados ruins, computadores lentos. O último tema discutido nesta oficina foi o esporte. Os jovens disseram que praticam na escola queimada, basquete, futebol, futsal, vôlei. Nos aspectos positivos destacaram a diversão e o lazer que estes esportes lhes proporcionam. E os aspectos negativos destacados foram a violência entre os jogadores, que acaba ocasionando brigas e também o fato de só jogarem na escola porque não têm outro espaço. Depois da discussão, foi pedido para que os jovens respondessem a três tópicos colocados na nossa comunidade do Orkut, relativos a cada um dos temas abordados. As respostas foram quase sempre curtas, houve respostas dadas sem a leitura da pergunta. Na oficina da semana seguinte, dos 15 jovens do início compareceram apenas quatro. Dois deles deixariam o projeto por motivo de trabalho; uma menina estaria saindo porque o pai teria lhe tirado do projeto como castigo, por motivos de comportamento. Outros abandonaram gradualmente o projeto; ao final, havia sete jovens efetivamente participando. Nesse encontro foi iniciado – com certo desalento, causado pelo 8
  • 9. esvaziamento da atividade, depois felizmente superado – o debate sobre o Estatuto da Criança e do Adolescente, que estava sendo tratado na escola dos jovens e seria também o tema transversal daquele momento em todas as oficinas do projeto Comunicação para Cidadania. Apresentamos a versão “Turma da Mônica” do ECA, dando-lhes algum tempo para leitura. Depois foi pedido que cada um escolhesse dois dos direitos do ECA para que depois começassem a construir uma apresentação no PowerPoint com os temas escolhidos. Concentramos as atividades da oficina na produção em PowerPoint porque estávamos tendo muitos problemas para acessar o Orkut com os computadores da Casa de Cultura, por isso, o projeto inicial de discussão em sala, postagem no Orkut e montagem de murais foi sendo modificado, até ser definitivamente abandonado. Em outra oportunidade, ao invés de oficina, foi feita uma visita ao Fórum da Cultura da UFJF. As bolsistas nos apresentaram os diversos espaços do Fórum, o museu e o teatro. Os jovens levaram as câmeras fotográficas do projeto e tiraram inúmeras fotos, dos cômodos, objetos, e, principalmente, deles mesmos. Na oficina seguinte apresentou-se o que é um e-mail (correio eletrônico) e como usá-lo. Foi proposto aos adolescentes que enviassem um e-mail contando suas impressões sobre as visitas ao campus da UFJF e ao Fórum da Cultura. Além disso, deveriam destacar pelo menos uma foto, que teriam feito no dias das visitas, para anexar ao e-mail. A grande maioria das adolescentes nunca tinha enviado um e-mail, apesar de já o possuírem devido ao cadastro no MSN ou no Orkut. Apresentou-se como bastante difícil desenvolver a discussão de temas relativos aos direitos assegurados no ECA – como o direito à vida, saúde, liberdade, convivência familiar e comunitária, cultura e ao respeito -, mesmo relacionando-os ao cotidiano dos jovens. Isso depois foi de alguma maneira conseguido, muito se falou em “a sua liberdade vai até o limite do outro”, “os pais deveriam conversar mais com os filhos antes de bater” e em contrapartida “cada um tem um limite, não dá para obrigar a fazer determinadas coisas”, “se só conversar funcionasse, eu seria um anjo”. A incorporação dessa discussão às apresentações em PowerPoint, no entanto, foi deixada de lado pelos jovens, que se preocuparam mais em procurar fotos e formas de enfeitar seus trabalhos. Para estimular a participação verbal – eles e elas, quando começavam a falar, falavam bastante, embora pouco escrevessem - gravamos uma fala de cada um dos jovens em que eles se apresentavam e comentavam algo do Estatuto. Essas intervenções foram inseridas no início de seus trabalhos. Na gravação das falas os jovens se mostraram intimidados e nervosos, mas ninguém se negou a fazer a atividade. Tais áudios 9
  • 10. foram depois bastante apreciados na confraternização de final de ano, quando as apresentações foram mostradas para todos os jovens e seus familiares. Por último, pedimos aos jovens que baixassem alguma música da internet para que colocassem em seus trabalhos. Cada um procurou baixar uma música em seu estilo preferido, embora alguns, por estarem em um momento diferenciado na produção da apresentação, acabassem por escolher músicas que já estavam baixadas nas máquinas. No final, os jovens produziram trabalhos que eram capazes de reproduzir o jeito de cada um e o estilo de vida deles também, de maneira produtiva e que os fizeram refletir, durante o processo de produção, sobre suas vidas e suas histórias. De maneira geral, todos conseguiram concluir as atividades, alguns mostrando mais interesse, outros menos, utilizando recursos variados, refletindo sobre o seu dia-a-dia e utilizando a imaginação para a confecção das apresentações em PowerPoint. O interessante foi levantar novos questionamentos e desafios para os participantes a cada dia, incitando-os a buscar na internet mais do que notícias feitas ou coisas prontas, mas levá-los a produzir notícias e discussões pessoais e do seu bairro, descobrindo desta forma a infinidade de opções que o computador oferece. A maior dificuldade foi ultrapassar o uso corrente do Orkut e do MSN entre os adolescentes em lan houses. 4. Comentários finais Durante a oficina de Novas Tecnologias e Ação Comunitária, integrante do projeto “Comunicação para a Cidadania: tecnologias, identidade e ação comunitária”, foi possível perceber algumas questões, em especial a partir de setembro de 2009, quando o projeto assumiu algumas feições específicas, como o fato de os jovens não receberem bolsa e as atividades serem, quase todas, desenvolvidas na Casa de Cultura. A oficina foi planejada para se desenvolver focada em especial na produção de material digital a partir da discussão de temas comuns ao projeto. As informações e o estímulo à reflexão a serem propiciados na discussão dos temas comuns seriam a base da redação de tópicos no Orkut, realização de murais e criação de apresentações em PowerPoint. A oficina partiu do princípio de que a possibilidade de utilização do Orkut (bloqueado no campus da UFJF) seria elemento de interesse dos jovens, como já havia sido demonstrado nas turmas anteriores (do próprio Santa Cândida e do Granjas Bethânia). Contudo, a dificuldade de utilização encontrada para acessar a internet, em especial o Orkut, devido à presença de vírus e da lentidão da própria conexão à internet, causou uma grande dificuldade inicial, o que configurou-se em elemento não previsto no planejamento e que obrigou a uma revisão dos instrumentos técnicos previstos para a oficina. Desta 10
  • 11. forma, o Orkut foi paulatinamente sendo abandonado, e privilegiou-se a produção de apresentações em PowerPoint. Ao se utilizar o Orkut, nas primeiras sessões da oficina, mesmo com dificuldade de acesso, percebeu-se que os tópicos trazidos para debate eram respondidos quase sempre com frases repetitivas, curtas, com pouca ou nenhuma informação além da já apresentada na discussão prévia dos temas. Avaliamos que isso ocorreu – e não apenas na dinâmica que utilizou o Orkut – em parte pelo fato de a oficina dar-se distante do espaço primordial de convívio dos jovens, seu bairro. Assim, não estaria suficientemente presente um elemento importante para a reflexão crítica a respeito da situação de vida dos jovens que participam do projeto, a discussão sobre seu próprio cotidiano, assim como a inserção dos elementos desse cotidiano da produção da oficina. Essa discussão foi possível em alguns momentos – a partir dos temas unificadores do projeto, como o Estatuto de Criança e do Adolescente (ECA). No entanto, a presença de questões relativas ao cotidiano dos jovens, mesmo no que se refere ao ECA, em certa medida viu-se prejudicada pela necessidade de abstração permanente. Tal fato se intensifica na medida em que a oficina trabalha com o acesso a instrumentos tecnológicos relacionados de maneira hegemônica com uma relação estritamente de consumo. Assim, nos diversos momentos em que os jovens preferiam utilizar elementos da indústria cultural em sua produção a inserção de elementos do cotidiano tornava-se difícil, ou apenas se dava após uma discussão específica, para a qual muitas vezes havia resistência. A discussão sobre o ECA, assim como a produção digital realizada, ressentiu-se dessa situação. Se por um lado tal produção trouxe elementos estéticos que podem ser facilmente reconhecíveis como parte do banco de imagens do Google, por outro não se realizou uma discussão mais aprofundada sobre o cotidiano dos jovens. A turma que foi iniciada em setembro de 2008 demonstrou maior grau de adesão às atividades propostas que a primeira turma do bairro Santa Cândida, com a qual se trabalhou em 2007, e mesmo que a turma do Granjas Bethânia, que participou da oficina no 1º semestre de 2008. A saída de alguns jovens, por motivos diversos, no entanto – e alguns deles extremamente participantes e com acentuada visão crítica da sociedade – fez com que se alterasse uma dinâmica que iniciara bastante promissora em termos de profundidade de discussões sobre os temas propostos. Assim, se por um lado a não concessão de bolsa garantiu a presença no projeto de jovens de fato interessados nas atividades ali desenvolvidas (com nível menor de dispersão, maior empenho, interesse nas propostas feitas, em relação a jovens que recebiam a bolsa e que chegavam às vezes a 11
  • 12. demonstrar estar ali apenas para recebê-la), por outro esses jovens que tiveram de abandonar as oficinas pela necessidade de garantir a si e a suas famílias talvez não o tivessem feito se contassem com a bolsa – mesmo de R$ 200 ao mês. 5. Referências bibliográficas FREIRE, P. (1975 a) Comunicação ou extensão. Paz e Terra : São Paulo, 1975. 2. ed. FREIRE, P. (1975 b): Pedagogia do Oprimido. Rio de Janeiro, Paz e Terra, 1975. 3. ed. FUSER, B. e OROÑA, B. Informática educativa em Juiz de Fora: ação de cidadania e inclusão digital. In: Anais do XIII Congresso de Ciências da Comunicação na Região Sudeste. São Paulo, Intercom, 2008. GÓMES, M. V. Paulo Freire: Re-Leitura Para Uma Teoria Da Informática Na Educação. São Paulo : ECA/USP, (ca 2000). Disponível em: http://www.eca.usp.br/nucleos/nce/perfil_margari.html. Acesso realizado em 08.03.05. GUIMARÃES, Thiago. “A luta pela inclusão digital: experiências e perspectivas dos Telecentros em São Paulo”. In: SILVEIRA, Sérgio Amadeu da e CASSINO, João (orgs.) Software livre e inclusão digital. São Paulo : Conrad Editora do Brasil, 2003. Págs. 237- 254. LEMOS, A. e COSTA, L. F. Um modelo de inclusão digital: o caso da cidade de Salvador. Revista de Economía Política de las Tecnologías de la Información y Comunicación. www.eptic.com.br, Vol. VIII, n. 6, Sep. – Dic. 2005. Acesso: 01/07/2008. MAIA, R. C. M. Redes cívicas e internet. Em: Eisenberg, José e Cepik, Marco. (orgs.) Internet e Política: teoria e prática da democracia eletrônica. Belo Horizonte : Editora UFMG, 2002. P. 141-163 MOVA DIGITAL. “Programa Municipal de Alfabetização Digital” [on line] <http://www.movadigital.pucsp.br> [Consulta: 19 janeiro 2005] 12