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CENTRO UNIVERSITÁRIO FMU
CURSO DE SERVIÇO SOCIAL
DANIELA NASCIMENTO DE OLIVEIRA

SERVIÇO SOCIAL E DIREITOS HUMANOS:
um estudo sobre os solicitantes de refúgio
e refugiados na cidade de São Paulo

São Paulo
2012
DANIELA NASCIMENTO DE OLIVEIRA

SERVIÇO SOCIAL E DIREITOS HUMANOS:
um estudo sobre os solicitantes de refúgio
e refugiados na cidade de São Paulo

Trabalho de Conclusão de Curso apresentado
ao Curso de Serviço Social do Centro
Universitário FMU, como exigência para
obtenção do título de Bacharel em Serviço
Social, sob orientação da Professora Ms.
Tania Elias.

São Paulo
2012
DANIELA NASCIMENTO DE OLIVEIRA
SERVIÇO SOCIAL E DIREITOS HUMANOS:
um estudo sobre os solicitantes de refúgio
e refugiados na cidade de São Paulo
Trabalho de Conclusão de Curso apresentado ao Curso de Serviço Social do Centro
Universitário FMU, como exigência para obtenção do título de Bacharel em Serviço
Social, sendo integrantes da banca: Prof.ª Ms. Tania Elias e Prof.ª Dra. Elza
Koumrouyan.

São Paulo, 10 de dezembro de 2012.

_______________________________________
_______________________________________
A Deus que me proporcionou a
oportunidade e força para chegar até aqui...
A todos os profissionais e estudantes do
curso de Serviço Social.
A todos os refugiados e refugiadas que
perderam quase tudo, principalmente aos
que tiveram que deixar para trás sua
família e partiram com a incerteza de poder
vê-los de novo antes de perderem aquilo
que era primordial em tal momento, a vida.
AGRADECIMENTOS
Este Trabalho de Conclusão de Curso, assim como o curso de Serviço Social,
permitiu a minha transição à um outro campo de visão.
Em primeiro lugar a Deus por ter me permitido chegar até aqui, e por fazer da minha
vida um verdadeiro milagre todos os dias. Deus obrigada por me fortalecer sempre!
À minha querida e admirada orientadora Tania Elias que, desde o início, me deu
forças e apoio para trabalhar um tema diferente. Obrigada pela motivação, paciência
e pelo acompanhamento no processo de desenvolvimento do TCC. Obrigada
principalmente por ter aceitado me orientar, obrigada pelas broncas, mas
principalmente por ser tão admirável profissional como a senhora é. “orgulho”
Agradeço à minha supervisora de campo Denise Orlandi Collus que me apresentou
a temática do refúgio e, com sua enorme paixão pelo trabalho, me inspirou a cada
dia.
Agradeço às professoras que com certeza fizeram uma enorme diferença no meu
processo de formação. Entre as quais eu jamais poderia deixar de citar: Professora
Elza Koumrouyan que sempre nos deu orientações e apoio para lutar sempre em
prol do usuário, pelas conversas e, principalmente pela preocupação com a
qualidade do ensino; Professora Therezinha Lourdes Lopes que sempre me deu
apoio desde o início, obrigada pela grande força no meu Projeto!
Agradeço à minha família de uma forma geral por ter me ajudado a descobrir que
nem só as motivações positivas nos dão força para continuar, mas que as negativas
nos dão muito mais.

Agradeço às pessoas maravilhosas e inesquecíveis que

conheci nesse processo, que fizeram diferença na minha vida. Agradeço em
especial àquelas que me apoiaram pessoal e materialmente para a conclusão desse
trabalho.
O que você é é um presente de Deus para você;
O que você faz consigo, é um presente seu para
Deus. Provérbio dinamarquês
Obrigada!
Daniela N. de Oliveira
Nós estamos aqui hoje para falar sobre milhões de famílias em desespero. Famílias
tão afastadas da civilização, que eles nem sabem que um dia como este existe ao
seu favor. Milhões... E... Números podem iluminar, mas também podem iludir. Então,
eu estou aqui hoje para falar que os refugiados não são números... E não apenas
refugiados. Eles são mães, e filhas, e pais, e filhos. Eles são fazendeiros,
professores, médicos, engenheiros. Eles são indivíduos. E acima de tudo eles são
sobreviventes. Cada um com uma extraordinária história sobre como se recuperar
frente às grandes perdas. Eles são as pessoas mais impressionantes que eu já
conheci. E eles também são as mais vulneráveis do mundo. Exilados de suas casas
e países, refugiados estão desprotegidos e perdidos ao redor do planeta [...].
Eu me lembro que antes de termos nos despedido da mulher grávida, ela apontou
para um garoto jovem. Limpou a poeira da face e eram os olhos verdes mais
brilhantes que já tinha visto [...]. Era um olhar tão triste e ela me explicou que ele
está sempre pedindo por mais comida. E dói para elas dizerem que elas não tem
nada. E ela nos perguntou se iríamos considerar em levar ele. Nós levaríamos o filho
dela para que ele pudesse comer? Ela disse isso entre lágrimas, ela estava
desesperada. Um desespero inimaginável para quaisquer pais nesta sala. Algumas
semanas depois, a guerra no Afeganistão começou, e lutas pesadas começaram
exatamente onde eles estavam. Eu voltei até aquela região três vezes, e procurei
por eles em todas elas. [...]
A ameaça das mudanças climáticas, a competição por recursos e a sempre
crescente desigualdade global tem criado profundos conflitos. Migrações em massa
serão características do nosso futuro. E nós temos que nos preparar para esta
realidade. E mais uma vez eu peço para que vocês olhem para os indivíduos no
lugar dos simples números [...].
E então eu lembro que no dia seguinte eu andei pelo campo e eu vi mais vítimas da
guerra. Eu vi crianças pequenas cheias de fome e medo, mães chorando, pais
feridos. Eu vi um oceano de pessoas, todas desesperadas, todas dignas. Eles eram
centenas de milhares naquele campo, e são milhões ao redor do mundo [...]. E
naquele momento eu me senti sem esperança e oprimida pela realização da
magnitude do problema [...]. E naquela viajem e nas outras seguintes eu cheguei a
conhecer os refugiados não somente como as pessoas mais vulneráveis na terra,
mas como as mais alegres.
Como uma americana, eu conheço a força que a diversidade tem dado ao meu país
[...]. Um país construído por aquilo que agora desmentem como buscadores do
silêncio ou migrantes econômicos. E eu acredito que nós devemos persuadir o
mundo de que os refugiados não devem ser vistos como simples miseráveis [...].
Nos últimos nove anos eu fiz muitas visitas para estes campos. E faço isso para
aumentar a conscientização pelos refugiados, mas também por mim mesma. Os
refugiados os quais encontrei e passei meu tempo mudaram profundamente a minha
vida. A garota de oito anos que salvou o seu irmão me ensinou o que é ser valente.
A mulher grávida no Paquistão me ensinou o que é ser uma mãe. E o menino
paralisado, que levou um tiro nas costas com o seu grande sorriso, me ensinou a
força de um espírito inquebrável.
Então hoje, no Dia Mundial dos Refugiados eu agradeço a eles por me deixarem
entrar em suas vidas eu agradeço a vocês por terem vindo.
Angelina Jolie Embaixadora da Paz do ACNUR-, em
seu discurso no dia Mundial do Refugiado20/06/2009.
RESUMO
A questão do refúgio e dos refugiados vem se apresentando como um tema
instigante a ser estudado, porém pouco se conhece sobre o assunto, bem como
sobre a atuação do Serviço Social neste novo campo, que parece se descortinar
para a profissão. Nesse sentido, o presente estudo buscou estudar e compreender a
questão do refúgio e dos refugiados no Brasil, especificamente na cidade de São
Paulo, primeiramente a partir da revisão da literatura especializada, na qual se
constata que a temática está intimamente relacionada aos Direitos Humanos.
Procurou-se então conhecer os marcos legais que orientam a proteção ao refugiado,
no âmbito internacional e nacional. Para o estudo da atuação do Serviço Social
foram estudados os serviços oferecidos pelas instituições Cáritas Arquidiocesana de
São Paulo e pelo Serviço Social Do Comércio – SESC, unidade do Carmo. Na
pesquisa de campo este estudo procurou aproximações com os sujeitos refugiados
ou solicitantes de refúgio, realizando entrevistas com os sujeitos de diferentes
nacionalidades, que vivem na cidade de São Paulo, que utilizam os serviços sociais
no sentido de identificar a efetividade destas ações. Os resultados em síntese
demonstram falhas que foram registradas a partir da coleta dos dados.
Palavras-chave: Direitos Humanos; Refúgio; Refugiados; Serviço Social.

ABSTRACT
Asylum seekers and refugee affairs in Brazil are intriguing and underexplored
subjects to be studied, as well as the social work role in this new field, which social
workers are still beginning to unfold. This study shows the refugees and refugee
applicant issues in Brazil, specifically in the city of São Paulo. First and foremost the
literature, which relates the issue closely to Human Rights, is reviewed in this
assignment. Then the legal framework dealing with refugee protection under national
and international law was also researched. This paper on Social Work evaluates the
facilities offered by the institutions Cáritas Arquidiocese de São Paulo - a branch of
Caritas International - and by SESC Carmo, which is the social service of commerce
employees at Rua do Carmo, São Paulo. Refugee and asylum-seekers from different
nationalities, who live in the great São Paulo area, were interviewed. The aim was to
identify the effectiveness of the social integration actions promoted by the two above
mentioned institutions. The results of field research demonstrate that notwithstanding
the efforts of these non-profit organizations, some gaps are still there to be filled.
Keywords: Human Rights; Refuge; Refugees; Social Service.
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO.....................................................................................................................................

10

CAPÍTULO 1- PARA ENTENDER O REFÚGIO E O REFUGIADO.....................................................

13

1.1

Motivos
geradores
do
refúgio
humanitária..............................

ajuda

13

1.2

A
questão
legal
do
refúgio
Brasil..................................................................

no

22

1.3

Dados
quantitativos
sobre
Brasil..................................................

no

28

1.4

Perfil e situação dos solicitantes de refúgio e dos refugiados na cidade de São
Paulo............

29

CAPÍTULO 2 – DIREITOS HUMANOS E SERVIÇO SOCIAL E AS REDES DE PROTEÇÃO
SOCIAL AO REFUGIADO EM SÃO PAULO.....................................................................................

33

2.1

Serviço Social e Direitos Humanos.....................................................................................

33

2.2

Serviço Social do Comércio – SESC-SP.............................................................................

35

2.3

Cáritas Arquidiocesana de São Paulo – CASP..................................................................

38

CAPITULO 3 – METODOLOGIA DA PESQUISA................................................................................

41

3.1

Apresentação dos sujeitos da pesquisa.............................................................................

43

3.2

Análise dos dados................................................................................................................

44

CONSIDERAÇÕES FINAIS..................................................................................................................

53

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS..................................................................................................

56

APÊNDICE A – Roteiro de Perguntas............................................................................................

59

APÊNDICE B - Pesquisa na íntegra.............................................................................................

59

ANEXO A – Lei Federal 9.474 de 1997..........................................................................................

82

ANEXO B- Perfil da população de solicitantes de refúgio e refugiados cadastrados no
Estado de São Paulo.....................................................................................................................

89

os

e

a

institucionalização

e

refugiados

dos

no

da

refugiados

mundo

e
10

Introdução
O presente Trabalho de Conclusão de Curso – TCC, aborda o tema dos
refugiados que vivem em São Paulo. Uma das razões da escolha deste tema é a
pouca visibilidade e o desconhecimento com relação aos refugiados. Outra razão
refere-se ao fato de cumprirmos estágio supervisionado no Serviço Social do
Comércio - SESC Carmo, entidade esta que atende refugiados procedentes de
diversos países, que chegam diariamente ao Brasil, especialmente na cidade de São
Paulo. Podemos ressaltar, ainda, que escolhemos estudar os refugiados, por serem
pessoas que tiveram de deixar sua casa, sua família, sua história, seus bens, sua
pátria, e que não lhes restaram alternativas, a não ser refugiarem-se em outros
locais. Além disso, a proteção ao refugiado vem se destacando como um novo
campo de atuação do Serviço Social.
Os refugiados são homens, mulheres, crianças, idosos, enfim, pessoas de
todas as idades, que tiveram de deixar seu país de origem por estarem sofrendo
graves e generalizadas violações de direitos humanos ou, por temerem ser
perseguidas por motivos étnicos, raciais, religiosos, políticos, de nacionalidade, ou
ainda, por associação a determinados grupos sociais, que fogem porque seu país de
nacionalidade não é capaz de protegê-las, ou seja, o Estado não pode fornecer a
proteção fundamental que está expressa na Declaração Universal dos Direitos
Humanos de 1948, qual seja, o direito à vida.
Pela falta de intimidade com o tema, muitos confundem os refugiados com os
migrantes econômicos. Diferentemente de quem migra de um país para o outro com
intenção de melhorar suas condições econômicas, os refugiados são obrigados a
fugir de seu país se quiserem salvar suas vidas, conforme explicitamos acima.
Muitos refugiados chegam ao país de acolhida carregados de traumas, mas com a
esperança de recomeçar e contando em receber proteção do Estado, no caso, do
governo brasileiro.
Nesse sentido, e em relação ao tema em foco, cabe perguntar: por que pesquisar a
situação dos refugiados no Brasil? A esse respeito, Silva destaca:
[...] falta de emprego, moradias inadequadas, falta de integração com a
sociedade civil. Nada muito diferente dos problemas enfrentados pela pobre
população brasileira é verdade. Acrescente apenas um fator extra - a
diferença cultural que às vezes choca, agride e humilha. Eles também
sofrem isso. Esqueça a idéia de que o Brasil é uma terra cheia de gente
simpática que adora receber estrangeiros. Pode funcionar no Rio de Janeiro
11

ou em Salvador onde os turistas gastam um monte de dinheiro, mas não
funciona com refugiados (2008, p.14).

Mello também nos faz refletir sobre o questionamento que norteia este estudo,
conforme segue:
Há dívidas históricas a saldar com a camada mais sofrida da população
brasileira, que, entretanto – não custa lembrar-, nem de longe passa pelo
desconforto da condição de exilado - sem pátria, sem família, sem direitos
políticos, sem bens, às vezes até sem identidade ou memória (2003, p.1011).

A falta de informação sobre a situação dos refugiados tem graves consequências,
gerando preconceitos e exclusões. Na revisão da literatura sobre o tema, verificouse que a ausência de conhecimento pode ser prejudicial, deixando de existir o
efetivo reconhecimento da sociedade sobre estes cidadãos, desrespeitando, assim,
sua cultura e sua história, além da ausência de projetos sociais efetivos para sua
integração no país de acolhimento.
No intuito de aprofundarmos o entendimento sobre a temática escolhida e,
tendo em vista esse novo campo de atuação para o Serviço Social, definimos como
objetivo geral da presente pesquisa estudar, compreender e analisar a questão do
refúgio na cidade de São Paulo, bem como o trabalho social desenvolvido por
instituições que atendem ao refugiado.
Para que possamos atingir o objetivo acima proposto, consideramos pertinente
desmembrá-lo em objetivos específicos, quais sejam: apresentar os motivos da
existência de refugiados no mundo; identificar e descrever os programas, projetos e
serviços oferecidos pelas instituições que fazem o atendimento aos sujeitos
refugiados; pesquisar e avaliar o atendimento social aos refugiados, a partir das
falas dos sujeitos da pesquisa.
Para alcançar os objetivos explicitados, abordamos, no primeiro capítulo, a
existência dos refugiados no mundo. Apresentamos o refugiado ao leitor, bem como
as condições para ser considerado oficialmente um refugiado, segundo a Lei Federal
9.4741 de 22 de julho de 1997 que define mecanismos para implementação do
Estatuto dos Refugiados2 instituído pela Organização das Nações Unidas – ONU.
Ainda neste capítulo, apresentamos o perfil do refugiado na cidade de São Paulo,
locus desta pesquisa.

1
2

Vide anexo A
No Capítulo 1 serão tratados e explicados tais marcos legais
12

No segundo capítulo, estudamos a relação existente entre o Serviço Social e os
Direitos Humanos. Identificamos e descrevemos ainda que de maneira sumária os
espaços institucionais em que o Serviço Social atua no atendimento a esta
demanda, descrevendo os programas, projetos e ações oferecidos aos refugiados.
As instituições são: Cáritas Arquidiocesana de São Paulo3, e Serviço Social do
Comércio – SESC Carmo - SP.
No terceiro capítulo, voltado à pesquisa de campo, apresentamos as expectativas
dos refugiados em relação aos serviços e atendimentos oferecidos.
O presente estudo, ao cumprir seus objetivos, busca desvelar as diferenças
existentes quanto ao entendimento do senso comum sobre deslocamento forçado e
imigração por motivos econômicos.
Cabe esclarecer que foram estabelecidas, nos estudos sobre o tema,
denominações diferenciadas relativas à população refugiada sendo estas: os
solicitantes de refúgio, que são as pessoas que já solicitaram refúgio e que estão
aguardando decisão jurídica do Comitê Nacional para os Refugiados -CONARE
sobre tal pedido; os refugiados que são aqueles que tiveram o seu status de
refugiados reconhecido pelo órgão competente.

3

A Cáritas é uma organização da sociedade civil que tem parceria com o Alto Comissariado das Nações Unidas
para os Refugiados- ACNUR.
13

CAPÍTULO 1 – PARA ENTENDER O REFÚGIO E O REFUGIADO
Todo ser humano tem capacidade para
gozar os direitos e as liberdades estabelecidos
nesta Declaração, sem distinção de qualquer
espécie, seja de raça, cor, sexo, idioma,
religião, opinião política ou de outra natureza,
origem nacional ou social, riqueza, nascimento,
ou qualquer outra condição.
Não será também feita nenhuma distinção
fundada na condição política, jurídica ou
internacional do país ou território a que pertença
uma pessoa, quer se trate de um território
independente, sob tutela, sem governo
próprio, quer sujeito a qualquer outra limitação
de soberania.
Artigo II - Declaração Universal dos Direitos Humanos

1.1 Motivos geradores do refúgio e a institucionalização legal da ajuda
humanitária
O refúgio existe porque a humanidade sempre viveu conflitos de todos os
tipos que ocasionaram perseguições raciais, religiosas, políticas, por associação a
determinados grupos sociais, ou através de desastres ambientais, pobrezas
extremas, secas, gerando assim situações de graves e generalizadas violações de
direitos humanos.
Conflitos aconteceram e continuam a acontecer em todos os continentes do planeta.
Podemos constatar sua existência com base no que segue:
A angustiante situação dos refugiados confunde-se com a própria história do
homem. Ao longo dos séculos, as pessoas têm sido obrigadas a fugir de
seus países ou das suas comunidades em virtude de perseguições, conflitos
armados ou de violência. Em todos os cantos do mundo, os governos, os
exércitos e os movimentos rebeldes, na busca de objetivos militares e
políticos, têm recorrido à deslocação forçada das populações, sobretudo,
aquelas mais marginalizadas da sociedade: membros de grupos
minoritários, apátridas, populações autóctones e outros excluídos das
estruturas do poder político (ACNUR, 1998, p.1).

Segundo o Dicionário Aurélio (2004), a palavra refúgio significa “local para onde
alguém foge a fim de estar em segurança; asilo, abrigo. Apoio, amparo, proteção...”.
O mesmo Dicionário, para o verbo refugiar-se, traz o seguinte significado: retirar-se
(para um lugar seguro); acolher-se, abrigar-se. Tomar asilo; asilar-se, expatriar-se.
Procurar abrigo ou proteção; resguardar-se, amparar-se.
14

Os refugiados são pessoas comuns, homens, mulheres, crianças e idosos que
tiveram de fugir de seu país de origem para salvar suas vidas, pela razão de serem
perseguidas, ou por recearem tal perseguição e, algumas poucas vezes, fogem na
tentativa de poupar os seus familiares, levando consigo apenas sua vida e sua
memória. O refugiado é uma pessoa ou grupo de pessoas “que deixam seu país
forçados – embora não necessariamente ‘perseguidos’ – por fome, desemprego,
questões raciais, étnicas, desordem política interna do país, motivos religiosos, e
buscam segurança ou perspectivas de vida e sobrevivência em outro país” (Fórum
de Entidades nacionais de Direitos Humanos). Barreto explica o que é ser um
refugiado de forma muito expressiva, conforme segue:
O nome, uma nacionalidade, uma raça, uma religião. Nesse momento, em
muitos pontos do mundo, há gente sendo obrigada a sair de seus países, há
gente sendo presa, há gente sendo morta. [...]. Quantas vezes alguns
países fazem discriminação com base na nacionalidade. Dizem: a partir de
agora não queremos mais pessoas de tal país em nosso território, porque
há um confronto étnico, político, guerra, ou o que quer que seja! Quantas
vezes há raças discriminadas, até atos oficias, leis restringem o acesso de
determinada raça à universidade, à escola, aos direitos básicos e começa a
haver sistemas de perseguição! A resposta da religião, simples, podia ser
católica, podia ser muçulmana, podia ser budista, qualquer uma, mas,
quantas vezes, por causa de sua religião, de exercício de seu credo, as
pessoas têm de sair de seus países, caso contrário serão perseguidas! Por
esses temas, envolvendo etnia, raça, credo, existem perseguições em
várias partes do mundo (2006, p.33-34).

Em conformidade à, pode-se confirmar que os refugiados são pessoas comuns;
homens e mulheres que viviam suas vidas normalmente, com seus valores, suas
culturas, suas crenças, e que muitas vezes não fizeram nada além de serem eles
mesmos e, por conta disso, foram perseguidos, mortos, presos, torturados,
simplesmente por serem “diferentes” do que certos grupos de pessoas desejam.
A problemática dos refugiados é tão antiga quanto a própria humanidade. Conforme
afirma Marinucci:
Desde criança sabemos da existência de guerras, conflitos, imperialismos,
colonialismos, perseguições políticas e religiosas que perpassaram a
caminhada histórica de todos os povos. Infelizmente, as informações nem
sempre se referiam às conseqüências que tais acontecimentos causaram na
vida cotidiana das pessoas. Mesmo assim, sabemos que houve refugiados
e deslocados em todas as épocas da história da humanidade (2003, p. 12).
15

Observando o mapa que segue abaixo, podemos verificar as situações que
provocam (ou provocaram) deslocamentos forçados, tais como terrorismos, guerras
civis, separatismos e perseguições étnicas ou religiosas:

Fonte: BORGES4
Dessa forma, refugiados e refugiadas estão por todas as partes do mundo, com a
esperança de serem protegidos e protegidas pelo Estado de acolhida. A situação dos
refugiados pode ser considerada uma das mais precárias conforme afirma a
seguinte reflexão de Barbosa e Hora:
A situação dos refugiados é uma das mais precárias a que se pode sujeitar
o ser humano, pois vulneráveis e distantes de tudo o que habitualmente
alicerçam as relações entre as pessoas, deparam-se com muitos desafios,
poucas condições materiais e uma abalada estrutura emocional,
esperançosos apenas de que alguém os acolha e proteja,fornecendo um
novo sopro de vida (2007, p.83).

Ainda segundo os referidos autores, a trágica situação dos refugiados é um
fenômeno que acompanha os homens desde sua origem na terra. Como já
afirmamos antes, são pessoas que são perseguidas pelo simples fato de serem
“diferentes”: por se posicionarem de forma divergente do ponto de vista político; por
seguirem outras orientações religiosas (e às vezes fanáticas) dos grupos
dominantes, etc.

4

Site completo nas referências finais
16

O homem, ao longo de sua história na terra, passou por desastres, desbravou os
mares, fez grandes inovações, chegou à Lua e à Marte; em contra partida a terrível
situação das perseguições por variados motivos (raça, religião, nacionalidade)
continua insolúvel, ou melhor, continua existindo em diferentes partes do mundo.
Ainda que a dramática situação dos refugiados seja um problema que perdura
há séculos, apenas após a 1ª Guerra Mundial a comunidade internacional
preocupou-se com a situação destes, criando assim a Liga das Nações no ano de
1920, instituição esta que tinha como um de seus objetivos promover a cooperação,
a paz e a segurança internacional. A partir de então começou um processo de
institucionalização de proteção ao refugiado. Porém, existia um mecanismo que
protegia apenas pessoas que estavam em situação de refúgio por ocasião da 1ª
Guerra Mundial, essas pessoas eram reconhecidas através de um passaporte
denominado “Nansen”5. Pessoas e grupos vítimas de outros conflitos pós a 1ª
Guerra não recebiam proteção.
Após o fim da Segunda Guerra Mundial, em 1945, cria-se a Organização das
Nações Unidas - ONU, com a intenção de que outras atrocidades fossem evitadas
em âmbito global, promovendo assim a paz e a harmonia entre os países. Em 1948
é publicada a Declaração Universal dos Direitos Humanos, documento este que é
referência para a proteção dos direitos do homem até os dias de hoje. Por
consequência dos grandes fluxos de refugiados pós-Segunda Guerra mundial,
percebeu-se a importância de existir um órgão específico para a temática dos
refugiados. Adotou-se então a Convenção Relativa ao Estatuto dos Refugiados de
1951, criada com base, além de outros instrumentos, no artigo 14° da Declaração
Universal dos Direitos Humanos que assegura:
Todo ser humano, vítima de perseguição, tem o direito de procurar e de
gozar asilo em outros países. Este direito não pode ser invocado em caso
de perseguição legitimamente motivada por crimes de direito comum ou por
atos contrários aos objetivos e princípios das Nações Unidas.

A Convenção de 1951, relativa ao Estatuto dos Refugiados, instituiu
universalmente uma definição para o termo “refugiado”. O artigo 1º, entre outras

5

O Dr. Fridtjof Nansen foi delegado da Noruega na Liga das Nações. Além de ser cientista e explorador. Por
seus esforços contínuos em prol do trabalho humanitário, recebeu como resultado o prêmio Nobel da Paz, no
ano de 1923. Posteriormente, o ACNUR passou a homenagear as pessoas que exercem esforços humanitários
com a medalha Nansen, até os dias de hoje. O Escritório Internacional Nansen para refugiados, criado de acordo
com o estabelecido no artigo 24 do Pacto da Liga das Nações, herdou e deu continuidade ao trabalho iniciado
pelo Dr. Fridtjof Nansen. (BARBOSA ; HORA, 2007, p.15-16).
17

alíneas, destaca, na alínea c, que o “termo refugiado se aplicará a qualquer pessoa”
que:
[...] em conseqüência de acontecimentos ocorridos antes de 1 de Janeiro de
1951, e temendo ser perseguida por motivos de raça, religião,
nacionalidade, grupo social ou das suas opiniões políticas, se encontra fora
do país de sua nacionalidade e que não pode ou, em virtude desse temor,
não quer valer-se da proteção desse país, ou que, se não tem nacionalidade
e se encontra fora do país no qual tinha a sua residência habitual em
conseqüências de tais acontecimentos, não pode ou, devido ao referido
temor, não quer voltar a ele. (Coletânea de Instrumentos de proteção ao
refugiado)

Subsequente a isso, ainda no ano de 1951, cria-se o Alto Comissariado das
Nações Unidas para Refugiados – ACNUR, que tem a função de proporcionar
proteção internacional aos refugiados. O ACNUR possui agências em mais de 100
países. Sua missão é, dentre outras, velar pela aplicação das convenções
internacionais que possibilitem a proteção dos refugiados. Seu caráter é
humanitário, social e, fundamentalmente, apolítico. Foi designado primordialmente
para que providenciasse a proteção internacional e para buscar soluções duráveis,
ou seja, soluções que não sejam paliativas e emergenciais, mas que incluam a
tentativa de estabelecer a paz nos países que porventura estiverem vivenciando
algum tipo de conflito. Tais soluções e providências devem ser aplicadas levando-se
em consideração as seguintes diretrizes oferecidas pelo Estatuto do ACNUR, como
abaixo referimos:
Art. 8º O Alto Comissário deverá assegurar a proteção dos refugiados
abrangidos pela competência do seu Comissariado pelos seguintes meios:
a) Promovendo a conclusão e ratificação de convenções internacionais para
proteção dos refugiados, velando pela sua aplicação e propondo alterações
aos mesmos;
b) Promovendo, mediante acordos especiais com os Governos, a execução
de todas as medidas destinadas a melhorar a situação dos refugiados e a
reduzir o número dos que requerem proteção;
c) Apoiando os Governos e os particulares no seu esforço para fomentar o
repatriamento voluntário dos refugiados ou a sua integração no seio de
novas comunidades nacionais;
d) Promovendo a admissão de refugiados, sem excluir os mais
desamparados, nos territórios dos Estados;
e) Envidando esforços para que se conceda autorização aos refugiados
para transferir os seus haveres, especialmente os necessários à sua
reinstalação;
18

f) Obtendo dos Governos informação acerca do número e da situação dos
refugiados que se encontrem nos seus territórios e sobre as leis e
regulamentos que lhes dizem respeito;
g) Mantendo-se em contato estreito com os Governos e organizações
intergovernamentais envolvidas;
h) Estabelecendo contato, da forma que julgue mais conveniente, com as
organizações privadas que se ocupem de questões de refugiados;
i) Facilitando a coordenação de esforços das organizações privadas que se
ocupem do bem-estar social dos refugiados

O ACNUR, além de tratar da causa dos refugiados, também se ocupa de
outras causas de deslocamentos forçados, tais como as das populações
denominadas como:
Repatriados – pessoas que voltaram ao seu país de origem. O ACNUR trabalha com
a reintegração na sociedade.
Deslocados – pessoas que fugiram, mas não conseguiram sair de dentro de seu
próprio país (estão deslocados internamente).
Apátridas – pessoas que nascem sem uma nacionalidade ou as perdem, porque o
Estado retira, e a pessoa fica sem proteção de qualquer Estado. Ou seja, não há
vinculo de nacionalidade com qualquer País. Há pessoas que tem a sua
nacionalidade negada por motivos de raça, religião, pertencimentos a um grupo
social ou por opiniões políticas. De acordo com estimativas do ACNUR podem existir
em torno de 12 milhões de apátridas em todo o mundo.
Passados alguns anos, os critérios que definiam a situação de refúgio, tais
como a data limite dos acontecimentos ocorridos, que era até 1° de Janeiro de 1951,
bem como a reserva geográfica que reconhecia apenas solicitantes de refúgio os
europeus, tornaram-se obstáculos para que outras pessoas, vítimas de outros
conflitos, que não a Segunda Guerra Mundial, fossem amparadas. Nessa
perspectiva, ampliou-se o conceito de refugiado com o objetivo de amparar as novas
vítimas de acontecimentos que violem o campo dos direitos humanos. Essa
ampliação acontece com o surgimento do Protocolo de 1967. Este documento
extinguiu da Convenção de

1951 as expressões: ”em conseqüência de

acontecimentos ocorridos antes de 1º de Janeiro de 1951” e, também, “como
conseqüência de tais acontecimentos”. Um dos motivos causadores desta ampliação
foram os conflitos na América Latina e no Continente Africano.
19

Em 1984 a Declaração de Cartagena6 tornou-se um marco para a proteção
internacional dos refugiados, ou seja, um instrumento para reafirmar o compromisso
dos países com a causa dos refugiados, e que também contribuiu para a ampliação
do conceito de refugiado, porém com aplicação aos países da América Latina. Para
Piovesan (2001), a declaração de Cartagena possui um valor inestimável pelo fato
de ter incluído no conceito de refugiado a “violação maciça” dos Direitos Humanos
conforme segue:
A definição ou o conceito de refugiado recomendável para sua utilização na
região é o que, além de conter os elementos da Convenção de 1951 e do
Protocolo de 1967, considere também como refugiados as pessoas que
tenham fugido dos seus países porque a sua vida, segurança ou liberdade
tenham sido ameaçadas pela violência generalizada, a agressão
estrangeira, os conflitos internos, a violação maciça dos direitos humanos
ou outras circunstâncias que tenham perturbado gravemente a ordem
pública (Declaração de Cartagena, 1984, p.3).

Podemos então considerar até aqui que, a causa dos refugiados associa-se
intrinsecamente com a causa dos Direitos Humanos:
Não é difícil perceber que a causa do refúgio está diretamente relacionada à
causa dos Direitos Humanos, na medida em que direitos fundamentais
como o direito à vida e à liberdade são constantemente violados.
(SAMPAIO, 2008, p.443).

Nesta mesma perspectiva, afirma Piovesan:
A proteção internacional dos refugiados tem como fundamento a
universalidade dos direitos humanos, que afirma que a dignidade é inerente
à pessoa e dessa condição decorrem direitos, independentemente de
qualquer outro elemento. Os refugiados são assim, titulares de direitos
humanos que devem ser respeitados em todo momento, circunstância e
lugar. A proteção internacional dos refugiados tem ainda por fundamento a
indivisibilidade dos direitos humanos, que devem ser concebidos como uma
unidade indivisível, interdependente e inter-relacionada, ou seja, essa
proteção alcança tanto direitos sociais, econômicos e culturais (2001, p.39).

É difícil imaginar que ainda possam existir pessoas que nem ao menos
conseguem atravessar uma fronteira e ficam presas nos campos de refúgio, sobre
proteção do ACNUR. Essas pessoas ficam isoladas em um determinado território e
não podem sair porque há riscos para sua vida, ou porque não existem países com
condições para recebê-las. Esses seres humanos ficam no meio do nada, muitas

6

É um documento construído por Representantes Governamentais e especialistas de 10 países latinoamericanos com o objetivo de pensar a situação dos refugiados de toda a América Central. Esse encontro
aconteceu em Cartagena das Índias, na Colômbia.
20

pessoas, inclusive crianças, morrem por não terem acesso aos direitos como saúde,
alimentação e etc. As condições são lamentavelmente desumanas.
A existência e a medida de tais situações podem ser constatadas nos estudos de
Faial:
De acordo com o órgão das Nações Unidas há, atualmente, 4.5 milhões de
refugiados e 1,1 milhão ainda vivem em 59 campos de refugiados: na
Margem Ocidental do Jordão, em Gaza, no Líbano, na Síria e na Jordânia
vivendo em campos de refugiados, muitos sonham em voltar. Por isso têm a
chave da casa que, provavelmente, não existe mais (2003, p.28).

Ainda segundo Faial (2003), as condições de sobrevivência e habitação na maioria
dos campos são deploráveis, praticamente não existem serviços sanitários, os
sistemas de saneamento básico e esgoto são possíveis apenas em 35% das casas,
como o que ocorre nos campos de refugiados em Gaza.
Abaixo segue uma foto de um campo de refugiados em Dadaad, no norte do Quênia.
Segundo o ACNUR, é um dos maiores campos de refugiados do mundo e abriga em
torno de 460 mil pessoas.

Fonte: EL País

7

7

Site completo nas referências finais
21

Sabemos que as guerras e conflitos, de maneira generalizada, assentam-se,
mesmo que não explicitamente, em interesses econômicos, muito embora possamos
perceber que vários conflitos armados acabaram como um mau negócio para o
capitalismo. Segundo Enzensberger:
A guerra, o meio mais simples de enriquecimento no passado, passou a ser
um mau negócio. O capitalismo reconheceu que o massacre organizado
oficialmente não gera lucro bastante. Obviamente, o entusiasmo pela
política de paz manifestada pelos governos dos países industrializados não
se deve a uma súbita conversão moral, mas uma estratégia formulada com
frieza. O capital como instrumento de paz passa a ser uma visão insólita.
Sem dúvida, alguns ainda esperam da guerra prósperos índices de
crescimento econômico (1995, p.13).

Na atualidade, alguns conflitos não têm a mesma intensidade dos anteriores, porém
sabemos que eles são mais prolongados e, quem acaba por sustentá-los são as
grandes potências mundiais, como os Estados Unidos da América (EUA), a Rússia e
a China, por serem, de acordo com Ninio (2011), os países que mais
vendem/exportam armas em todo o mundo.
Em contrapartida, e com grande ironia, são países membros permanentes do
Conselho de Segurança da ONU, o único Conselho que tem poder de veto dentre as
decisões das Nações Unidas. Dentre as funções deste Conselho estão: “manter a
paz e a segurança internacionais”, de acordo com os princípios das Nações Unidas.
(ONU-Brasil). Tais informações reforçam a ideia de Enzensberger (1995) quando
este afirma que, o capital (grandes potências mundiais) espera das guerras e dos
conflitos índices elevados de crescimento econômico, e que a política de paz,
manifestada por alguns países industrializados, não passa de uma estratégia
capitalista formulada com frieza.
Podemos reforçar o acima exposto, com base em Lafer:
As decisões das Nações Unidas refletem o que pensam os países mais
poderosos detentores do poder do veto no caso do Conselho de Segurança
e, no caso da Assembléia – Geral o que pensa a maioria dos países
membros, sendo que só terão alguma chance de prosperar de imediato
aquelas decisões que não encontrem a objeção da maior parte dos países
mais poderosos. Em síntese, na interação entre as múltiplas soberanias, a
anarquia dos significados é frequentemente equacionada com base no que
os mais fortes pensam. (1995, p.183).
22

1.2 A questão legal do refúgio e dos refugiados no Brasil
Em relação à questão do refúgio e dos refugiados no Brasil, vigora a Lei
Federal 9.474, de 22 de julho de 1997, identificada como uma das mais modernas
do mundo porque, além de considerar todos os princípios da Convenção de 1951,
bem como do Protocolo de 1967, assimila as reflexões mais modernas e
contemporâneas relativas ao direito internacional dos refugiados como a “violação
maciça dos direitos humanos”, conceito incorporado a partir da declaração de
Cartagena em 1984 como já mencionado em itens anteriores.
A esse respeito Leão nos diz:
A lei brasileira relativa à temática dos refugiados é inovadora. Ademais de
incorporar os conceitos tanto da Convenção de 1951 quanto do seu
protocolo de 1967, ela agrega, como definição de refugiado e refugiada,
todas aquelas pessoas que “devido a grave e generalizada violação de
direitos humanos, é obrigada a deixar seu país de nacionalidade para
buscar refúgio em outro país”. (2003, p.175,) destaques do autor.

A referida Lei traz em seu Artigo 1º que “Será reconhecido como refugiado”, no
território brasileiro, “todo o indivíduo que”:
I – devido a fundados temores de perseguição por motivos de raça, religião,
nacionalidade, grupo social ou opiniões políticas encontra-se fora de seu
país de nacionalidade e não possa ou não queira acolher-se à proteção de
tal país;
II – não tendo nacionalidade e estando fora do país onde antes teve sua
residência habitual não possa ou não queira regressar a ele, em função das
circunstâncias descritas no inciso anterior;
III – devido a grave e generalizada violação de direitos humanos é obrigado
a deixar seu país de nacionalidade para buscar refúgio em outro país.

No artigo 7º, a mesma legislação afirma que:
O estrangeiro que chegar ao território nacional poderá expressar sua
vontade de solicitar reconhecimento como refugiado a qualquer autoridade
migratória que se encontre na fronteira, a qual lhe proporcionará as
informações necessárias quanto ao procedimento cabível.

Cabe elucidar que a referida Lei, entre outras determinações, institui a criação do
Comitê Nacional para os Refugiados (CONARE) 8. Ao Comitê, dentre suas funções,

A Lei N° 9.474, de 22 de Julho de 1997 em seu Artigo 11 cria o CONARE: “Fica criado o Comitê
Nacional para os Refugiados - CONARE, órgão de deliberação coletiva, no âmbito do Ministério da
Justiça”. (Coletânea de Instrumentos de Proteção Internacional dos Refugiados 3° Edição - IMDH,
Brasília, 2010).
8
23

compete “reconhecer” a condição de refugiado das pessoas que solicitam abrigo no
Brasil, como destacaremos abaixo.
Ligado ao Ministério da Justiça, o CONARE é composto por diversos organismos
públicos, dentre eles: Ministério da Justiça, que o preside, Ministério das Relações
Exteriores, que assume a vice-presidência, Ministério da Educação, da Saúde, do
Trabalho e Emprego e a Polícia Federal. Representando a sociedade civil
organizada está a Cáritas Arquidiocesana de São Paulo e Rio de Janeiro.
Vale ressaltar que o ACNUR também compõe o CONARE, tendo direito a voz, mas
sem direito a voto.
O CONARE segue modelo tripartite com a participação de representantes do Estado,
da sociedade civil organizada e da comunidade internacional. A criação do CONARE
incentivou a reabertura do Escritório do ACNUR no Brasil no ano de 2004, que havia
fechado em 1998, por faltarem recursos para a sua manutenção.
A seguir destacamos o Artigo 12 da Lei 9.474, que trata das competências deste
organismo:
Compete ao CONARE, em consonância com a Convenção sobre o Estatuto
dos refugiados de 1951, com o Protocolo sobre o Estatuto dos Refugiados
de 1967 e com as demais fontes de direito internacional dos refugiados:
I - analisar o pedido e declarar o reconhecimento, em primeira
instância, da condição de refugiado;
II - decidir a cessação, em primeira instância, ex officio ou mediante
requerimento das autoridades competentes, da condição de refugiado;
III - determinar a perda, em primeira instância, da condição de
refugiado;
IV - orientar e coordenar as ações necessárias à eficácia da proteção,
assistência e apoio jurídico aos refugiados;
V - aprovar instruções normativas esclarecedoras à execução desta Lei.

Dessa forma, podemos perceber que o CONARE é um órgão de fundamental
importância no processo de requerimento de uma pessoa ao estatuto de
refugiado. Segundo Leão (2003), as atividades do CONARE poderiam ser mais
fáceis se não dependessem de recursos que são destinados à Diretoria de
Estrangeiros do Ministério da Justiça, ou seja, se tivessem autonomia financeira.
No Brasil, a proteção ao refugiado acontece por três vias: integração,
assistência e proteção. O refugiado é acolhido pela sociedade civil organizada, com
destaque para a ação da Cáritas que tem engendrado grandes esforços para a
integração destes indivíduos na sociedade brasileira.
24

No caso brasileiro, a sociedade civil tem assumido papel de grande
destaque no trabalho realizado visando à integração de refugiados,
fornecendo, por meio de suas atividades diretas ou de parcerias, pouco
mais de 60% do total da verba envolvida nos trabalhos com integração no
País (HAYDU, 2011, p.139).

A parceria da Cáritas com alguns albergues ou Casas de Acolhida é de fundamental
importância, pois são elas que propiciam acolhimento imediato a muitas pessoas
que chegam pedindo refúgio no Brasil. Segundo Haydu (2011), a parceria com o
sistema “S” (SENAI, SESI e SESC), torna possível a inserção de alguns refugiados
em cursos profissionalizantes e do idioma português. Na atualidade, o Brasil conta
com a maior rede de apoio ao refugiado da América Latina, com quase 100
organizações envolvidas.
O governo brasileiro oferece os serviços sociais básicos aos refugiados, tais como
educação e saúde. Porém, a partir dos anos 2000, o governo federal vem
demonstrando maiores esforços para a inserção de refugiados nas políticas públicas
em vigor no Brasil. A esse respeito Haydu nos esclarece:
Além de alguns benefícios que solicitantes de refúgio e refugiados já obtêm,
como é o caso da carteira de trabalho e de documento de identidade, o que
lhes dá permissão para trabalhar legalmente no Brasil, a política nacional
para refugiados, mesmo que de maneira ainda tímida, tem dado sinais de
que pretende aumentar esforços visando novos e melhores benefícios aos
refugiados. Exemplo disso é a inserção de alguns poucos refugiados no
programa de assistência governamental (Bolsa Família) e o adensamento
de debates em torno ao acesso de refugiados a políticas de habitação e
novas formas de inclusão no mercado de trabalho, como foi o caso do
evento organizado pelo Ministério do Trabalho e ACNUR, ocorrido em São
Paulo, em 2011 (2011, p.140).

De acordo com Sampaio (2007), a proteção aos refugiados acontece através
de ações governamentais, que incluem garantia de direito à vida, à segurança e à
liberdade, confirmando-se, através de políticas positivas, que reconhecem a
condição de refugiado perante o Estado brasileiro. A assistência acontece como
ajuda humanitária ao refugiado que ainda não possui condições suficientes para sua
auto dependência profissional, tal como inserir-se no mercado de trabalho nacional,
portanto a assistência acontece transitoriamente. Ainda segundo Sampaio (2007),
por um período a Cáritas e alguns parceiros prestam um auxílio imediato para que
os refugiados possam obter moradia, alimentação, educação e saúde.
Segundo Santos, a conquista da integração no país de acolhida é o momento mais
importante para o solicitante de refúgio ou refugiado, que ultrapassa o ingresso no
25

mercado de trabalho, o auxílio na educação, bem como a possibilidade de
aprendizagem do idioma local, ensino universitário, criação de políticas de emprego
e etc. O autor citado acima assim se expressa:
A busca da integração é a forma de refúgio mais plena e, contudo, mais
complexa. Ultrapassa as expressões iniciais de acolhida, documentação,
atendimento a necessidades básicas e imediatas. É algo mais profundo e
abrangente (2003, p.139).

Cabe ressaltar que quando uma pessoa chega ao território nacional para
solicitar refúgio, o Brasil tem a obrigação de acolhê-lo, pois é um país signatário da
ONU. Santos expressa essa questão da seguinte maneira:
Acolher refugiados é, em primeiro plano, tarefa obrigatória de um governo
que discurse sob uma mínima égide dos direitos humanos, preocupação
essencial do ACNUR, criado em 1950 pela ONU para isso destacado, é um
preceito religioso para as igrejas, mas também é posto como um
compromisso de toda uma sociedade civil, humana, que consegue
enxergar no outro um semelhante que sofre (2003, p. 136).

A esse respeito Jubilut e Apolinário destacam:
A população refugiada tem direito, assim, como todas as pessoas, a um
padrão de vida, alimentação e moradia adequados, assim como saúde física
e mental. A Convenção de 51 contem algumas disposições, ainda que
limitadas, relacionadas aos direitos econômicos, sociais e culturais. Deste
modo, a proteção destes direitos não é apenas uma questão de assistência
humanitária, mas uma obrigação internacional assumida pelo Estado que
ratificou aquele instrumento internacional, e que está obrigado
constitucionalmente a garantir os direitos humanos também aos
estrangeiros residentes em território brasileiro (2009, p.21).

No entanto, cabe uma ressalva com base em Milesi. Esta autora afirma que se por
um lado, o país tem uma das melhores legislações e um espírito humanitário por
outro, faltam as condições econômicas e políticas públicas concretas para
integração dos refugiados na sociedade.
É também função do governo brasileiro averiguar a veracidade das informações e a
intenção do indivíduo ao solicitar proteção em território nacional. Porém, enquanto
esta verificação não acontece, o governo precisa respeitar o princípio do nonrefoullement (não devolução), ou seja, o Estado não pode devolver o refugiado ao
seu país onde, por ventura, sua vida e liberdade estejam sendo ameaçadas. Este
princípio caracteriza-se como o primeiro direito internacional dos refugiados.
26

Ainda segundo Sampaio (2007), ao conceder o status de refugiado a um indivíduo o
governo brasileiro fica em “termos” responsável por este. Contando com o apoio do
ACNUR e da sociedade civil, o Estado tem a obrigação de velar pela proteção legal,
pela inserção do refugiado em políticas públicas, bem como sua integração na
sociedade.
A esse respeito, Haydu destaca:
Em primeiro lugar, o Estado de acolhimento deve aceitar plenamente e
apoiar ativamente os esforços com vistas a facilitar a integração local dos
refugiados; uma segunda condição seria a aceitação da comunidade local,
desses refugiados, como forma de evitar possíveis animosidades; um
terceiro ponto de fundamental importância se dá em torno da questão
econômica, ou seja, a integração local tem que ser economicamente viável;
os programas de integração local, sobretudo em sua fase inicial, devem ter
a garantia de financiamento externo suficiente que lhe proporcione êxito;
para ser duradoura a integração local deve ser voluntária; e, por fim, os
refugiados devem ser plenamente integrados na nova sociedade, tendo,
inclusive, a possibilidade de adquirir a nacionalidade do país (2011, p.139).

Assim, se por um lado, o Estado brasileiro tem obrigações e deveres para
com os refugiados. Por outro lado, estes compõem grupos de sujeitos de direitos e
deveres, conforme podemos observar abaixo:
Direitos dos refugiados
Pedir refúgio
Procedimento
de
solicitação
gratuitamente
Não ser devolvido ao seu País
de
origem
enquanto
sua
vida
e segurança estejam em perigo
e no período de análise de sua
solicitação do status de refugiado.

Deveres dos refugiados
Seguir as Leis brasileiras
Ter os documentos atualizados
Estar sempre com o endereço
atualizado junto à Polícia Federal

Dar
continuidade
aos
procedimentos
para
reconhecimento
da condição de refugiado enquanto
for solicitante.

Abaixo segue um quadro sobre os procedimentos para solicitação de refúgio em
território nacional, orientado, dentre outras legislações, pelo Título IV da Lei
9.474/97:
27

Chegada
ao país

POLÍCIA FEDERAL
-Termo de declarações-

CÁRITAS ou entidade parceira
-Questionário de Solicitação de Refúgio
- Serviços: moradia, saúde, educação e
outros.
- Advogados Cáritas/ACNUR/OAB:
parecer
- Entrevista com representante do
CONARE
04 a 06
meses
MEDIDAS INTERMEDIÁRIAS
-CONARE: Autoriza o Protocolo
Provisório
-Protocolo provisório expedido pela PF
- Carteira de trabalho provisória pela
DRT.

DECISÃO DO CONARE

DECISÃO POSITIVA

- Refugiado solicita a carteira
de identidade na PF
- Refugiado assina termo de
Responsabilidade na PF
- Assistência do ACNUR

DECISÃO NEGATIVA

-Recurso ao MJ pode ser
apresentado até 15 dias
-Recurso pode ser
orientado pela Cáritas

DECISÃO NEGATIVA
MINISTRO DA JUSTIÇA

Solicitante fica sujeito à
legislação de estrangeiros
28

1.3 Dados quantitativos sobre os refugiados no Brasil e no mundo

O ACNUR faz uma estimativa do número de pessoas que estão sobre a sua
responsabilidade e proteção. Através da tabela abaixo podemos verificar a
diversidade de nacionalidades bem como a sua maior representatividade até 2011
no Brasil, conforme segue:

Brasil

Nacionalidades

Vias
Tradicionais:
(regularizados)

Reassentados

Maior representatividade

4477 pessoas
dos cinco
continentes

77

4053

424

Continente Africano
(2824 Angolanos em
2011)
Continente Americano
(628 Colombianos em
2011)

O continente Africano, por sua vez, representa o maior número muito embora
não só composto por angolanos, mas também por pessoas de países como: Congo,
Marrocos, Costa do Marfim, Camarões, Sudão, Senegal, Mauritânia, Nigéria, Guiné
– Bissau dentre outros. O Continente Americano é representado por países como:
Colômbia, Peru, Cuba, dentre outros. Abaixo os gráficos nos mostram uma
estimativa da quantidade de pessoas por continentes, e a representatividade por
países, que o Brasil recebeu até 2011, ficando estes classificados da seguinte
maneira:
Refugiados por Continente:
29

Fonte: CONARE 9

Países com maior representatividade:

Fonte: CONARE 10

Segundo estimativas mundiais do ACNUR, no final de 2010, haviam 43,7
milhões de pessoas forçadas a se deslocar em todo o mundo. Mais de 15.500
solicitações em 69 países diferentes foram realizadas por crianças separadas ou
desacompanhadas de suas famílias. Esses pedidos foram realizados principalmente
por crianças afegãs e somalis. Ainda segundo o ACNUR, em 2010, mais de 845 mil
pessoas fizeram pedidos individuais de refúgio.
Nesse sentido, segundo Barbosa e Hora, “Havemos ainda de ter em mente que
atrás de cada número há um ser humano. Atrás de cada estatística, ocultam-se
sofrimentos pessoais e coletivos” (2007, p.84).

1.4 Perfil e situação dos solicitantes de refúgio e dos refugiados na cidade de
São Paulo
Grande parte dos solicitantes de refúgio e refugiados na cidade de São Paulo
são homens, com idades que variam entre 25 e 40 anos. Em sua maioria residem no
centro da capital. Normalmente dominam o inglês, francês e o espanhol. Frequentam

9

Dados extraídos do Ministério da Justiça, site completo nas referências finais.

10

Dados extraídos do Ministério da Justiça, site completo nas referências finais.
30

ou frequentaram cursos de português, tendo, em geral, o conhecimento básico deste
idioma. Quando chegam à cidade de São Paulo, os refugiados encontram alguns
problemas tais como: moradia, língua, trabalho, atenção à saúde, bem como
grandes obstáculos na hora de revalidar documentos profissionais e escolares,
como diplomas, experiências profissionais e etc.
Com a intenção de melhor visualizarmos, em termos quantitativos os solicitantes de
refúgio e suas consequências, apresentamos o quadro abaixo:
Solicitantes de refúgio
Dados acumulados entre Jan. à dez. de 2011
Dados acumulados de Jan. à jun. de 2012
Total acumulado
Fonte: MORELLI

661
1003
1664

11

Desde o início dos registros realizados pela Cáritas, do total de solicitantes de
refúgio, segundo relatório disponibilizado pela Cáritas São Paulo 12, existem 1592
refugiados, ou seja, pessoas que foram reconhecidas como refugiadas na cidade de
São Paulo. Vale ressaltar que no período de jan. a jun. de 2012 apenas 14 pessoas
foram reconhecidas como refugiadas. Isto demonstra a morosidade dos processos
de reconhecimento da condição de refugiado. Outro dado interessante, diz respeito
às solicitações negadas, num total de 62 e os números de arquivamentos e
desistências, num total de 314. Este último dado reforça que muitos solicitantes de
refúgio podem estar vivendo ilegalmente.
Ainda no sentido de melhor expor o perfil dos solicitantes de refúgio, abaixo
apresentamos a seguinte tabela, compreendendo o período de janeiro a junho de
2012:

11
12

Referências completas na bibliografia
Vide Anexo B
31

Origem

Solicitantes

Continentes
África
Nigéria, Senegal,
Guiné Bissau,
República
Democrática do
Congo, e Somália.

Refugiados

953

1439

612

317

929

-

30

30

Ásia
Bangladesh, Butão
e Afeganistão.

76

62

138

Oriente Médio
Paquistão, Síria e
Iraque.

101

238

339

Apátrida

01

02

03

1276

1602

2878

América Latina
Haiti, Colômbia e
Cuba

486

Total

Europa

Total
Fonte: MORELLI 13

Quanto à composição, por formação profissional, da população economicamente
ativa, abaixo apresentamos o seguinte quadro:

13

Referências Completas na bibliografia
32

Fonte: MORELLI 14

Com relação à formação educacional, segue o seguinte quadro:

Fonte: MORELLI 15

14
15

Referências Completas na bibliografia
Referências Completas na bibliografia
33

CAPÍTULO 2 – SERVIÇO SOCIAL E DIREITOS HUMANOS E AS REDES DE
PROTEÇÃO SOCIAL AO REFUGIADO EM SÃO PAULO
Todos são iguais perante a lei e têm direito,
sem qualquer distinção, a igual proteção da
lei. Todos têm direito a igual proteção contra
qualquer discriminação que viole a presente
Declaração e contra qualquer incitamento a tal
discriminação.
Artigo VII -Declaração Universal dos Direitos Humanos

No presente capítulo, inicialmente, apresentaremos algumas reflexões
sobre a relação existente entre o Serviço Social e os Direitos Humanos. Num
segundo momento intencionamos apresentar e descrever, ainda que de maneira
sumária, os organismos não governamentais que integram a rede de apoio e
proteção aos solicitantes de refúgio, na cidade de São Paulo, bem como suas ações
neste sentido.
2.1 Serviço Social e Direitos Humanos

Como já referido em itens anteriores, a causa dos refugiados associa-se,
contundentemente, à causa dos Direitos Humanos. Nesse sentido, acreditamos que
essa mesma associação pode ser realizada com o Serviço Social que tem em seus
princípios fundamentais a defesa intransigente dos direitos humanos. De acordo com
o Conselho Federal de Serviço Social – CFESS, o Serviço Social brasileiro desde a
década de 1970 incorporou uma série de estudos que possibilitaram aos
profissionais uma compreensão das reais condições de vida dos usuários, com
quem nos deparamos cotidianamente. Compreensão esta orientada na perspectiva
da totalidade.
Nesse sentido, com base em Barroco (2004), embora a profissão tenha em seu
histórico um vínculo teórico e prático com os direitos – com destacada atenção para
os direitos sociais – a discussão dos Direitos Humanos ganha maior visibilidade na
década de 1990, com o último Código de Ética Profissional.
Vale destacar que em 1998 comemorou-se os cinquenta anos da Declaração dos
Direitos Humanas, levando a profissão a retomar as reflexões sobre a temática.
Ainda segundo a referida autora, a década de 1990 passava por um momento
em

que

os

direitos

historicamente

conquistados

estavam

sendo

destituídos/precarizados, conforme avançavam os processos de “globalização
34

neoliberal”, implementados no sentido de garantir a reprodução do capital. Segundo
Barroco:
Este contexto assinala a atualidade do tema e da defesa dos direitos
humanos; trata-se do avanço da barbárie, em nível mundial, e da
necessidade de discussão e compreensão das diferentes formas de
violência e pobreza espiritual que coexistem com a miséria material, o
desemprego, a exclusão social e institucional dos indivíduos sociais (2004,
p.39).

De acordo com a ONU (1999), o Serviço Social desde a sua criação, vem
consolidando uma luta em defesa dos Direitos Humanos, levando como princípio
base o valor inestimável de cada ser humano, tendo como um de seus principais
objetivos a defesa da igualdade entre as classes sociais, defendendo que as
pessoas possam ter segurança, e possam se desenvolver com dignidade. É o que
podemos observar na definição de Serviço Social apresentada pelo CFESS:
Definição: o (a) assistente social ou trabalhador (a) social atua no âmbito
das relações sociais, junto a indivíduos, grupos, famílias, comunidade e
movimentos sociais, desenvolvendo ações que fortaleçam sua autonomia,
participação e exercício de cidadania, com vistas à mudança nas suas
condições de vida. Os princípios de defesa dos direitos humanos e justiça
social são elementos fundamentais para o trabalho social, com vistas à
superação da desigualdade social e de situações de violência, opressão,
pobreza, fome e desemprego. (2011)

“Os Direitos Humanos podem ser definidos, em termos gerais, como aqueles direitos
que são inerentes à nossa natureza e sem os quais não podemos viver como seres
humanos” (ONU, 1999, p.19).
Segundo Barroco (2006), no Código de Ética do Serviço Social ficam bem
explicitados, em seus princípios fundamentais, que os assistentes sociais defendem
a liberdade, a democracia, a equidade, a justiça social, empenham-se na eliminação
de discriminações por questões gênero, religião, nacionalidade, opção sexual,
condição física, bem como de todas as formas de preconceito. De acordo com esta
mesma autora, apesar de o Serviço Social ser reconhecido como uma profissão
humanista, o Código de Ética de 1993 é o primeiro a registrar um compromisso ético
– político para com os direitos humanos.
Ainda segundo Barroco, no cenário da sociedade burguesa, defender os direitos
humanos coloca-se mais como uma frente de luta, da qual o projeto profissional é
objetivado em dimensões éticas e políticas: “Éticas, porque supõem escolhas de
valor dirigidas à liberdade; políticas porque buscam criar condições objetivas, no
âmbito da luta pela hegemonia, para a defesa daqueles valores”. (2004, p.41).
35

Esta mesma autora afirma que o Serviço Social tem uma grande tradição de luta
pelos Direitos Humanos. Em todos os países e continentes em que tem atuação, o
Serviço Social fica caracterizado por ter compromisso ético com a dignidade
humana, pelo empenho do respeito ao outro em todas as suas formas de escolhas e
a procura, sempre, de eliminar preconceitos e discriminações.
De acordo com o Conselho Federal de Serviço Social - CFESS:
A defesa dos direitos humanos é uma luta constante contra todas as formas
de violência, discriminação, opressão e exploração. Não se trata de
defender os direitos como mecanismo de sobrevivência no capitalismo, mas
como mediação fundamental na luta pela construção de uma nova ordem
social. (CFESS)

A fim de registrar o envolvimento do Serviço Social com a defesa dos Direitos
Humanos, reproduzimos os princípios fundamentais que norteiam a atuação do
assistente social. Destacaremos aqueles que acreditamos ter uma íntima relação
com a temática trabalhada nesta investigação. Vejamos abaixo:
Princípios Fundamentais
Reconhecimento da liberdade como valor ético central e das demandas
políticas a ela inerentes - autonomia, emancipação e plena expansão dos
indivíduos sociais;
Defesa intransigente dos direitos humanos e recusa do arbítrio e do
autoritarismo; [...].
Posicionamento em favor da eqüidade e justiça social, que assegure
universalidade de acesso aos bens e serviços relativos aos programas e
políticas sociais, bem como sua gestão democrática;
Empenho na eliminação de todas as formas de preconceito, incentivando o
respeito à diversidade, à participação de grupos socialmente discriminados
e à discussão das diferenças;
(Código de ética Profissional dos Assistentes Sociais, 1993).

Assim sendo, podemos perceber que o Serviço Social caminha no intuito de
considerar os Direitos Humanos como um dos princípios que organiza a sua prática
profissional, reafirmando, historicamente, sua posição humanitária.
2.2 SERVIÇO SOCIAL DO COMÉRCIO – SESC-SP
O Serviço Social do Comércio-SESC é uma “entidade privada” mantida pelos
empresários do comércio de bens e serviços. Esta entidade age no intuito de
objetivar “o bem-estar e a qualidade de vida do comerciário, sua família e da
sociedade”. O SESC foi fundado na década de 1940, no dia 13 de Setembro de
1946. A primeira unidade surge no bairro Engenho de Dentro, no Rio de Janeiro.
36

Suas principais ações eram assistência à maternidade infância e combate à
tuberculose com o objetivo de diminuir os índices de mortalidade. A proposta de
criação do SESC surgiu, pela primeira vez, na “Carta da Paz Social” (1946), que foi
escrita por um dos primeiros presidentes do Conselho Nacional do Comércio – CNC,
- o gaúcho João Daudt d'Oliveira.
Na década de 1950 começam as primeiras iniciativas de atividades culturais e
a “modernização do Serviço Social do Comércio”. Começam, então, a surgir os
primeiros centros esportivos do SESC. A partir da década de 1980, com a renovação
social que aconteceu no Brasil com a Constituição Federativa, começam então a
serem lançados os primeiros projetos culturais que se instalam em âmbito Nacional.
Na atualidade, existem SESC’s em todos os estados brasileiros. Suas
programações são norteadas por um conceito de educação como fator determinante
para a “transformação social”, com atividades voltadas para o campo da cultura, com
programas específicos para o público de todas as idades e classes sociais.
Em todo o Estado de São Paulo o SESC possui 32 unidades que oferecem as mais
diversas atividades que vão do turismo social, aos programas específicos voltados
para a terceira idade e para crianças. Ao mesmo tempo, são oferecidos programas
como saúde e educação ambiental, além de ser pioneiro no programa Mesa Brasil
SESC São Paulo, com o intuito de combater a fome e o desperdício de alimentos.
Nesse sentido, busca desenvolver ações educativas e culturais com a intenção de
aguçar a autonomia individual e valorizar as pessoas16.
O SESC - SP vem desenvolvendo, nos últimos 16 anos, um trabalho
humanitário em prol dos refugiados. Este trabalho teve início a partir de um
“convênio” celebrado, em 05 de dezembro de 1995, entre o ACNUR, o Serviço
Nacional de Aprendizagem Comercial-SENAC, a Cáritas Arquidiocesana de São
Paulo e o próprio SESC.17
O SESC – Carmo tornou-se uma unidade de referência, dentre outros motivos, por
estar localizado no centro da cidade de São Paulo, próximo à Praça da Sé, onde

16
17

Informações extraídas do site oficial do SESC. Referências completas na bibliografia.
Naquele período, os representantes das instituições que celebraram o referido convênio eram Abram Abe

Szajman (SENAC e SESC) e o Cardeal Dom Paulo Evaristo Arns (Cáritas). Além de seus diretores Luiz
Francisco de Assis Salgado e Danilo Santos de Miranda, respectivamente.
37

também ficam situados o escritório da Cáritas18 e os albergues, que são as
moradias provisórias para os solicitantes de refúgio.
A unidade do Carmo torna-se ponto de encontros para o solicitante de refúgio e dos
refugiados, pois estes tentam reconstruir suas vidas e suas relações sociais,
buscando assim uma nova rotina, enquanto aguardam a resposta do CONARE.
Além da parceria existente, entre as já citadas entidades, o SESC-Carmo não se
limita apenas ao atendimento a estes sujeitos, mas tem o compromisso de
esclarecer à sociedade sobre a realidade dos refugiados,através de palestras,
seminários, exposições, entrevistas, entre outros, pois se sabe que a situação
destes é um fenômeno mundial.
Podemos constatar o acima exposto, com base em Santos :
Talvez o exemplo mais bem sucedido, dentre as parcerias que a Cáritas
Arquidiocesana de São Paulo estabeleceu no tangente à questão dos
refugiados tenha sido com o Serviço Social do Comércio (SESC). (...) O
SESC, de forma mais profunda que outras parcerias, estabeleceu o cuidado
de formar seus funcionários e criar uma cultura de solidariedade ao
refugiado. Os grandes objetivos ao se estabelecerem parcerias quer seja a
propagação do compromisso humanitário com o refugiado, quer se trate da
integração do mesmo no meio social, estão sendo, pouco a pouco,
conquistados pelo SESC. (2003, p.143-144):

Dados ainda não computados estimam em aproximadamente mais de dois mil
solicitantes de refúgio e refugiados, recebidos pelo SESC - Carmo, provenientes das
mais diversas nacionalidades. Dentre as obrigações apontadas pelo convênio, o
SESC- Carmo deve disponibilizar ao refugiado, de acordo com as normas internas
da unidade, o acesso às mais variadas atividades culturais, como música, teatro,
atividades físicas, colocando o refugiado mais perto da cultura brasileira,
contribuindo assim para sua integração local.
Dentre as atividades e serviços oferecidos destacam-se:
Alimentação, descontos nas refeições (almoço e jantar), acesso à rede mundial de
computadores, acesso ao curso básico de português, atualmente (Módulo I),
atividades culturais, recreativas e esportivas, biblioteca e áreas de convivência
(Jogos, teatro, música, oficinas e etc). Os solicitantes de refúgio após conseguirem
documentos básicos têm direito de realizar sua matrícula no SESC podendo, assim,
utilizá-los em todas as unidades do Estado de São Paulo.

18

A Cáritas é responsável por realizar os encaminhamentos legais, além de ser responsável pela
situação dos solicitantes. Como será detalhado mais adiante.
38

Vale destacar que o SESC e o SENAC foram condecorados pelo ACNUR no ano de
2005, pela relevância do trabalho humanitário em prol dos refugiados, e pelos 10
anos de parceria. Em 2007 ambas entidades receberam o Prêmio de
Reconhecimento Solidário, entregue pelo Ministério da Justiça.
2.3 Cáritas Arquidiocesana de São Paulo – CASP

A Cáritas é uma instituição da Igreja Católica Apostólica Romana, atuante em
200 países e territórios, sendo sediada em Roma, Vaticano, fundada em 1897.
Segundo Barbosa e Hora (2007), a Cáritas tem destacada atuação em projetos
sociais espalhados pelos cinco continentes, e é considerada o braço social da Igreja
Católica. A Cáritas trabalha com organismos nacionais e internacionais, com foco na
temática dos direitos humanos e tem suas ações voltadas para uma linha
ecumênica.

Possui

o

status

“Consultivo

Geral”

entregue

pelo

Conselho

Socioeconômico da ONU. Os autores acima referidos assim se expressam:
Devido a sua intensa e reconhecida atuação, a Cáritas Internacional
mantém o status de observadora junto ao Conselho Econômico e Social da
ONU há mais de trinta e cinco anos e, no Brasil, é de crucial importância na
questão dos refugiados (2007, p.72).

Além disso, a Cáritas vem apoiando projetos de iniciativas populares de geração de
trabalho e renda, denominados Programas Alternativos Comunitários (PACs). Tais
projetos agem com intuito educativo, na perspectiva de que seus integrantes saiam
da passividade assistencialista para a autonomia política e econômica, por
intermédio de atividades que influenciem no exercício da cidadania.
A Cáritas Arquidiocena de São Paulo (CASP) é parte da Rede Cáritas
Internacional. É um organismo integrante da Conferência Nacional dos Bispos do
Brasil – CNBB, sendo criada no dia 12 de novembro de 1956. Além disso, é
reconhecida juridicamente como um órgão de utilidade pública federal.
Na atualidade existem quatro diretrizes institucionais com as quais a Cáritas
Brasileira realiza o seu trabalho, sendo estas: defesa e promoção de direitos;
incidência e controle social de políticas públicas; construção de um projeto de
desenvolvimento solidário e sustentável, bem como o fortalecimento da Rede
Cáritas.
39

De acordo com Santos (2003), a CASP começou seu trabalho com refugiados no
ano de 1988, o mesmo ano em que foi promulgada a Constituição Federal do Brasil,
e que foram criadas possibilidades de lutas democráticas em defesa dos direitos
humanos. Ainda segundo Santos (2003), o grande interesse da Cáritas desde o
início do trabalho para com os refugiados, foram os conceitos de proteção,
assistência e, o principal deles, a integração. Barbosa e Hora expressam:
O ACNUR sempre contou com o apoio das Cáritas Arquidiciocesanas do Rio
de Janeiro e de São Paulo, mediante convênio específico, além da
Comissão Pontifícia Justiça e Paz, dentro de suas três linhas mestras de
atuação: proteção, assistência e integração local do refugiado no
Brasil.(2007, p.72) Grifo do autor.

De acordo com os autores acima referidos, o programa de proteção é realizado
através de orientações e apoio jurídico, garantindo assim que os refugiados e
solicitantes de refúgio tenham seus direitos assegurados com base nos acordos
internacionais e na Lei brasileira nº 9747/97. O programa de assistência é voltado ao
auxílio ao refugiado e suas famílias em suas necessidades essenciais como saúde,
moradia, alimentação e atendimento social em geral. A integração acontece por
intermédio de um programa de encaminhamentos para o curso de português,
revalidação de diplomas, encaminhamento para entrevistas de empregos,
formatação de currículos e, através de diversas parcerias, possibilita o acesso a
cursos profissionalizantes. Atualmente é oferecido pela Cáritas São Paulo, em
consequência de diversos traumas ocasionados pelas condições individuais de fuga,
um programa de atendimentos psicológicos e psiquiátricos.
Os programas e serviços oferecidos pela Cáritas São Paulo são realizados através
de convênios entre Cáritas-ACNUR e CONARE e, também, contam com parcerias
de

diversas

empresas

SENAC/SESC/SENAI,

e

organizações

SASECOP

(Serviço

da
de

sociedade
Apoio

civil

Sócio

dentre
Educativo

elas:
de

Capacitação e Orientação Profissional), CESPROM (Centro Scalabriniano de
Promoção do Migrante), Casa de Acolhida para Mulheres, Casa do Migrante, Arsenal
da Esperança, Superintendência Regional do Trabalho e Emprego do Estado de São
Paulo, Secretaria Municipal de Desenvolvimento Econômico e do Trabalho, da
Prefeitura de São Paulo, Instituto de Psiquiatria do Hospital das Clínicas do Estado
de São Paulo, Empresa de Prestação de Serviços Nacionais e Internacionais-
40

EMDOC, entre outros. A população atendida pela Cáritas atualmente é de 287819
pessoas de 8120 nacionalidades diferentes.

Dados extraídos de relatórios disponibilizados pela Cáritas – SP referências completas na
bibliografia.
19
41

CAPÍTULO 3 – METODOLOGIA DA PESQUISA

Segundo Gil (2010), a pesquisa é definida como o procedimento racional e
sistemático que tem por finalidade trazer respostas aos objetivos que são propostos.
A pesquisa se desenvolve através de conhecimentos disponíveis e a cuidadosa
utilização dos métodos e técnicas de investigação científica.
Consideramos pertinente usar a pesquisa qualitativa, pois, de acordo com Minayo,
“[...] a abordagem qualitativa aprofunda-se no mundo dos significados das ações e
das relações humanas, um lado não perceptível e não captável em equações,
médias e estatísticas” (1996, p.22).
Para o aprofundamento do conhecimento acerca do tema em foco, iniciamos
este estudo com pesquisas bibliográficas que abordavam os assuntos referentes à
problemática do refúgio, das migrações, e da proteção internacional aos refugiados.
Foram utilizados livros e artigos científicos publicados por diversos pesquisadores,
dentre os quais se destacam grandes estudiosos sobre o tema, tais como: Milesi
(2003), Barreto (2006), Barbosa; Hora (2007), Mello (2003), Marinucci (2003), Silva
(2008), Trindade (2008), Faial (2003).
A revisão das obras mais utilizadas foi de extrema importância, uma vez que nos fez
entender e, por conseguinte, melhor compreender a realidade do refugiado, os
motivos geradores do refúgio e consequentemente quem de fato pode ser
considerado refugiado, segundo a Lei Federal 9.474/97.
Foi necessária a consulta de documentos tais como a Convenção de 1951, relativa
ao Estatuto dos Refugiados, o Protocolo de 1967, da Declaração Universal dos
Direitos Humanos bem como da Declaração de Cartagena de 1984.
Subsequentemente pesquisamos algumas instituições que fazem o atendimento ao
solicitante de refúgio e ao refugiado na cidade de São Paulo. Estudamos os serviços
oferecidos por estas instituições, em prol da proteção ao refugiado no Brasil.
Portanto, esta fase do trabalho nos deu subsídios para que conhecêssemos a
proteção e os serviços que se voltam ao atendimento dos direitos dos refugiados.
Posteriormente à pesquisa bibliográfica e documental, procedemos ao estudo da
realidade do refugiado no sentido de dar confirmação empírica a esta investigação.
De acordo com Martinelli (1999):
Cada pesquisa é única, pois se o sujeito é singular, conhecê-lo significa
ouvi-lo, escutá-lo, permiti-lhe que se revele. E onde o sujeito se revela? No
discurso e na ação. Assim, se a pesquisa pretende ser qualitativa e
42

pretende conhecer o sujeito, precisa ir exatamente ao sujeito, ao contexto
em que vive sua vida. (p. 22).

O estudo da realidade foi construído utilizando-se como técnica a entrevista
focalizada. Trata-se de uma modalidade de entrevista que permite ao entrevistado
falar livremente sobre o tema em foco, porém, se este desviar do assunto cabe ao
pesquisador fazer a sua retomada. Segundo Gil (2008), esta técnica é bastante
utilizada em grupos de pessoas, no caso os sujeitos dessa pesquisa que passaram
por alguma situação semelhante, tais como “assistir a um filme” ou, presenciar
algum tipo de catástrofe.
Além disso, de acordo com Gil, a entrevista é uma técnica em que o investigador
apresenta – se ao investigado face a face com o objetivo de lhe fazer perguntas e
obter dados que interessem à investigação. Segundo o referido autor: “A entrevista
é, portanto, uma forma de interação social. Mais especificamente, é uma forma de
diálogo assimétrico, em que uma das partes busca coletar dados e a outra se
apresenta como fonte de informação” (2008, p. 109).
Assim sendo, é uma técnica muito utilizada por diversos profissionais inclusive das
ciências humanas tais como; psicólogos, assistentes sociais, cientistas sociais.
Conforme Gil (2008), “[...] praticamente todos os outros profissionais que tratam de
problemas humanos” utilizam-se desta técnica.
Quanto aos sujeitos entrevistados, usamos como critério para a seleção da
amostra, visando a coleta de dados, os seguintes sujeitos: solicitantes de refúgio e
refugiados, participantes ou que participaram do curso de português oferecido pelo
SESC - Carmo entre o período de 2000 a 2012, de diferentes nacionalidades.
Consideramos também aspectos como: facilidade de comunicação, tendo em vista
que não conhecem bem o idioma português e a disposição do refugiado em falar
sobre sua realidade no país que o acolheu e avaliar os serviços aqui oferecidos.
Para coleta de dados, utilizamos um roteiro de entrevista previamente elaborado,
contendo perguntas abertas, possibilitando ao entrevistado falar livremente.
Salientamos que as entrevistas foram gravadas, com autorização dos entrevistados,
que contribuíram de forma muito significativa para o estudo. O contato com os
sujeitos da pesquisa se deu no ambiente em que fazemos estágio qual seja, o SESC
– Carmo. As entrevistas foram realizadas nesta mesma unidade. Utilizamos para
aplicação das entrevistas a sala do curso de português com a autorização da
coordenadora técnica da unidade.
43

3.1 Apresentação dos sujeitos da pesquisa
“O refugiado deixa sua casa, deixa seu bairro, sua aldeia.
Deixa tudo o que o envolve como um manto protetor.
Seus sons, seus odores, o tom da cor de suas paisagens,
os gritos das crianças brincando, os pássaros no
amanhecer. O galo sempre tão presente em suas
madrugadas. Tudo isto desaparece. De repente encontrase desprotegido em um ambiente desconhecido e aquilo
que o protegia já não existe mais. Foge para salvar sua
vida, e a de seus filhos. (...) Este é o reflexo da fuga, o
espelho do abandono”. (Luis Varese - Representante do
ACNUR)

SUJEITO 1:
Nacionalidade: Paquistanês
Idade: 30 anos
Escolaridade: Sup. Completo- Pós em língua Inglesa Inc.
Profissão: Administrador Gráfico em designer
Religião: Islã
Sexo: Masculino
Estado civil: Solteiro
Dependentes: Não
Tempo no Brasil: 1 ano e 4 meses.
Status: Solicitante de refúgio

SUJEITO: 2
Nacionalidade: Angolano
Idade: 33 anos
Escolaridade: Técnico
Profissão: Técnico em engenharia eletricista
Religião: Católico
Sexo: Masculino
Estado Civil: Solteiro
Dependentes: sim
Tempo no Brasil: 8 meses
44

Status: Solicitante de refúgio

SUJEITO 3
Nacionalidade: Colombiano
Idade: 53
Escolaridade: Superior
Profissão: Jornalista
Religião: Não tem
Sexo: Masculino
Estado Civil: Separado
Dependentes: 4 filhos
Tempo no Brasil: 10 anos
Status: refugiado

SUJEITO 4
Nacionalidade: Congolesa
Idade: 20 anos
Escolaridade: Superior Incompleto
Profissão: Estudante
Religião: Católica
Sexo: Feminino
Estado Civil: Solteira
Dependentes: Não
Tempo no Brasil: 2 meses
Status: Solicitante de refúgio

Para melhor compreensão dos dados levantados, o roteiro de perguntas está
disponível no apêndice A, e a fala dos entrevistados no apêndice B.

3.2 Análise dos dados
Com base em relatos extraídos das entrevistas bem como amparados em
contribuições

teóricas,

objetivamos

reafirmar

(ou

não)

algumas

hipóteses

apresentadas na introdução, bem como dar respostas a alguns questionamentos e
45

indagações que nos acompanharam na construção do presente trabalho. Em relação
às indagações, destacamos: O refugiado é um individuo que é obrigado a sair de
seu país se quiser salvar sua vida? Quais os motivos geradores do refúgio? Quem é
o refugiado? Por falta de informação os refugiados são confundidos com migrantes
econômicos? Dentre outras.
Quando perguntados sobre como avaliam sua condição de refugiado, tanto do
ponto de vista pessoal bem como em relação à sociedade que os acolheu, a maioria
dos entrevistados assim se expressam:
“Na minha vida é a primeira vez que eu sou refugiado”.
“O refugiado é uma pessoa que saiu do país dele, por problemas na política,
problemas sociais, problemas da vida”.
“Ele vem para fugir daquela situação do país dele e vai para outros países.
“Quando a pessoa deixou o país dele fugindo (...), significa que ele vem com
esperança de outro país proteger, guardar e cuidar para ele, ajudar ele até o
dia que o problema que ele fugiu do país dele acabe (...).” Sujeito 1
“Não muito bom, eu acho que não muito bom”.
“Porque eles pensam que..., muitas pessoas me falou direto que é nosso
dinheiro [do Brasil] que ele está gastando para essas pessoas de fora do
Brasil” (...).
“Para mim é um pouquinho diferente por causa do Paquistão, porque eles
pensam sobre Osama Biladen essa coisa que tem guerras, só coisas ruins,
por isso que aqui essas pessoas aqui do Afeganistão, do Paquistão, Índia,
não muito bom. Por isso não tem tratamento bom.” Sujeito 2
“Chegamos nessa condição porque precisávamos salvar a vida, porque
precisávamos proteger a família, porque precisávamos sobreviver, e não era
por necessariamente questões financeiras, não era por esporte, não era por
aventura, não era por turismo”.
“Geralmente a população relaciona a imagem do refugiado com os pobres,
então num país que tem 200 milhões de pessoas e tem somente 4.500
refugiados é muito fácil diluir isso, e as pessoas falam ‘ah, mas temos aqui
milhões de pessoas pobres, ’ e para pensar em dois, três mil, quatro mil, isso
é brincadeira, isso são massas que se juntam a essa multidão de pessoas
46

carentes, mas não tem nada a ver com isso, tem a ver com aspectos de
coisas valiosas para a humanidade (...)”. Sujeito 3
Assim sendo, podemos perceber através desses trechos retirados das falas
dos entrevistados, que o refugiado é obrigado a fugir por diversas circunstâncias que
provocam variadas violações de direitos. Para Leão (2011), as pessoas são forçadas
a fugir de seus países de origem para salvaguardarem sua própria segurança,
dignidade e integridade, bem como de suas próprias famílias, vivendo assim um
percurso de violações. Ainda com base no referido autor:
As pessoas que viajam dessa maneira constantemente expõem suas vidas
ao risco, são obrigadas a viajar em condições inumanas, tornando-se
prezas fáceis da exploração e do abuso. Especificamente com relação aos
refugiados e aos solicitantes de refúgio, estes apenas conformam uma
pequena e relativa porção dos movimentos mundiais de pessoas,
frequentemente transladando-se de um país ou de um continente ao outro.
(p.85)

Pudemos perceber, baseados em nossa revisão da literatura específica, que a
legislação brasileira (especificamente a Lei 9.474 de 1997) é referência mundial no
acolhimento/atendimento ao refugiado. Nesse sentido, quando perguntados sobre as
suas expectativas (o que espera ou esperava) no que se refere ao acolhimento, os
entrevistados assim se expressam:
“O Brasil fala que vai acolher/apoiar a pessoa, mas quando a pessoa chega,
quando a pessoa foi lá na Cáritas, conforme que ele escutou, o grande país
como o Brasil uma coisa que ele vai acontecer aqui”.
“A assistência social não está fazendo nada, não ta cuidando dos
refugiados”.
“Os refugiados estão como pessoas que os pais deles morreram, ele ta
abandonado, procura toda tua vida sozinho”.
“Você espera o dia que o protocolo vai sair, agora protocolo 4 meses
imagine, a pessoa não tem pai não tem mãe não tem casa, vai comer
como?” Sujeito 1
“O refugiado aqui no Brasil fica como tipo uma pessoa que não tem família,
não tem pai, não tem mãe não tem nada”.
“Eles são assim como uma coisa que não tem valor (...).” Sujeito 1
47

“Aqui nada é fácil”.
“Quando você pensa sobre RNE mais difícil”.
Às vezes quando eu encontrei com muitas pessoas aqui de fora do Brasil,
que agora tem RNE, às vezes eles, dois três pessoas me falou que depois
de seis meses ele consegue pegar RNE, três, quatro pessoas me falou que
depois de dois anos para RNE, dois anos para RNE, de novo, de novo, de
novo, para entrevista com advogado.” Sujeito 2
“Agora para falar da Lei eu penso que é referência no papel, que é quando
se cria um marco legal muito bonito”
“Eu sempre afirmo que nestes dois primeiros marcos, do Direito
Internacional Humanitário, e nos Direitos dos refugiados, o Brasil funciona
perfeito, o problema está no terceiro marco, que já é responsabilidade local,
é responsabilidade de onde as pessoas chegam, então teria a ver com o
Estado de São Paulo, com a cidade de São Paulo, com as autoridades
locais, com o olhar que localmente se der ao refugiado, e aí se está
falhando”. Sujeito 3
“Eu penso que quando você falou que a Lei é referência aqui, é muito
relativo, penso que tem países que tem menos discurso, menos leis, menos
fantasias legais, e fazem um trabalho muito mais técnico, mais humanitário,
mais enquadrado, em elementos de justiça mesmo”.
“Aqui tem 4.500 [refugiados] para uma população de um país de 200 milhões
de pessoas, e tem pessoas que levam mais de um ano esperando, e ainda
não se define a situação deles, ou seja, é muito relativo isso”. Sujeito 3

De acordo com a fala dos sujeitos pesquisados, podemos perceber que ainda
há muito a ser realizado pelos refugiados em São Paulo. Baseados em Pinto (2011),
pode-se afirmar que os refugiados no Brasil sofrem as mesmas limitações que
afetam os brasileiros. Esta autora afirma que esse fenômeno só poderá ser resolvido
com a melhora das condições sociais e econômicas vigentes no país.
Assim, pode-se inferir que esse quadro não difere muito quando se relaciona
as expectativas dos refugiados frente aos serviços oferecidos, de modo geral, pelas
instituições Arquidiocesanas de São Paulo e o SESC.
48

“(...) segunda coisa vou falar sobre os refugiados, os países como o Brasil
não tem problemas com refugiados”.
“O problema, mais, maior, grande, está no Cáritas. Cáritas está a cuidar
muito mal dos refugiados”.
“O refugiado não recebe nada como sobreviver, não recebe nada, ele vive a
vida sozinho, ele vive sozinho”.
“Você vai esperar o apoio do Cáritas até o dia que o Cáritas vai aceitar tua
explicação, ou teu documento que você entrar no Cáritas”.
“Se faz um ano, você também vai esperar um ano, sem nada, sem ajuda,
sem nenhuma coisa que sai da mão do Cáritas para mão do refugiado”.
Sujeito 1
“O SESC acho que tem muitas coisas melhor”.
“Cáritas também, mas Cáritas precisa mais pessoas para trabalhar em
Cáritas, só uma Dona Maria para atender refugiados”. Sujeito 2
“Quando chegamos, num país como o Brasil, não estamos chegando para
pedir esmolas, não estamos chegando pra (...) como coitados, estamos
chegando como dizendo, não dá para morar mais no espaço que me
corresponde dentro de uma sociedade e, para garantir a vida e a
sobrevivência da família, a própria, eu preciso de um apoio”.
“Apoio que basicamente são oportunidades, quando quem recebe está
pensando em caridade, boa vontade”.
“Geralmente o que pensam é oferecer um prato de comida, uma coisa de
assistência básica, que é necessária na maioria dos casos. Não estou
dizendo que não, mas que não pode só limitar-se a isso”.
“Oportunidade é o reconhecimento de que quem chega é também um
sujeito, é autor da sua própria história, e tem potencialidades, tem
possibilidade de crescer.” Sujeito 3

Cabe destacarmos, a partir da fala acima, que dos 4 entrevistados, 3
possuem curso Superior. De acordo com Morelli (2011), dados demonstram que em
São Paulo 10% dos refugiados possuem curso superior. Isto está ligado diretamente
49

com o aspecto de oportunidades, referido pelo sujeito da pesquisa. Nesse sentido,
afirmamos a dificuldade e frustração de quem busca o refúgio. Muitos são
profissionais

especializados,

com

ricas

bagagens

em

suas

experiências

profissionais, e que se sentem tendo que recomeçar do zero, ou seja, como se seus
estudos e suas experiências não valessem nada no Brasil.
“O Brasil não pode deixar essa responsabilidade toda na mão da Cáritas”.
“Se o Brasil falou assim: vou deixar tudo na mão do Cáritas, Cáritas não
aguentar isso, não vai conseguir fazer nada, para muita gente (...)”. Sujeito 1

Cabe aqui uma ressalva. A responsabilidade da acolhida de refugiados em
São Paulo não é apenas da Cáritas. O acolhimento segue um modelo tripartite: o
CONARE representando o Governo Federal; o ACNUR, representando as
Organizações das Nações Unidas e a Cáritas, representando a sociedade civil. Por
falta de acesso às informações, por vezes, o refugiado pode pensar que a
responsabilidade de sua acolhida está apenas nas mãos da Cáritas.
“Aqui também no SESC... Cáritas dá um papel para comer no SESC.
Cartãozinho para comer no SESC, mas Cáritas não dá dinheiro para gente
comer no SESC, e se você não trabalha, mesmo R$ 2,00, você vai pegar
dinheiro aonde para comer no SESC?” Sujeito 1
“Quando cheguei eu estava com problema da vista, cheguei aqui, passou
um mês, dois meses, eu comecei a sofrer mais aquela dor, eu fiquei uma
semana na Casa do Migrante não saia para nada, não conseguia andar não
conseguia sair, então eu fui lá, esse exemplo é para mim, eu fui lá na
Cáritas, Cáritas me fala só ‘então você já recebeu o protocolo?’ “.
“Ele constou no registro que eu não recebi protocolo, ela falou ‘não, a
Cáritas não pode ajudar porque você ainda não recebeu o protocolo’”.
“Eu faço uma pergunta para você, se a pessoa cair lá e morrer, como ele
não tem protocolo a Cáritas não vai fazer nada me explica aí, o Cáritas não
vai fazer nada vai deixar aquela pessoa morrer mesmo assim, eu estava
bem doente, a Cáritas não fez nada (...)”. Sujeito 1
50

“Recebi colaboração da Cáritas e do SESC por que quando eu cheguei eu
não falava nada de português, só ouvi as palavras que parecem em francês,
e agora estou aqui aprendi muito coisa entendeu?”.
“Acho que é bom, mas vai ser melhor depois de um tempo, para aprender a
língua um mês dois meses não é suficiente”.
“Por que mesmo lá no livro a professora falou que tem muitas coisas que
não vamos estudar, por que não vai ter tempo (...)”. Sujeito 4
“(...) a grande falha para mim é colocar nas mãos de instituições ‘igreja’,
neste caso a Igreja Católica, todo o contrato de acolhida do refugiado”.
“Eu nego porque a Igreja não sabe fazer isso”.
“A Igreja sabe fazer obra de caridade, a Igreja sabe fazer obra de boa
vontade, a Igreja sabe fazer (...) a Igreja sabe enganar fiéis”.
“A Igreja não sabe de humanitarismo”.
“E mais, na doutrina da Igreja o humanitarismo vai contra a fé”.
“E essas coisas [o atendimento] devem enquadrar-se em um marco legal, o
marco de direito, é o humanitarismo que é lei, ou seja, é um marco de
direito, a fé não é marco de direito.” Sujeito 3

Devemos ter em mente que a fala acima reflete as impressões pessoais do
sujeito entrevistado. No entanto, cabe observar que algumas ações institucionais
denotam uma visão assistencialista, deixando de reconhecer os refugiados como
sujeitos de direito, Nesse sentido, são negados princípios fundamentais expressos
no Código de Ética Profissional, tais como: autonomia, plena expansão dos
indivíduos sociais, ampliação e consolidação da cidadania.
As práticas assistencialistas, caritativas e conservadoras são visões
ultrapassadas do Serviço Social, porém sabemos que é um desafio constante e
incansável romper com essa identidade que foi, por muitos anos, atribuída ao
Serviço Social. Assim sendo, é necessário sempre que os profissionais estejam
embasados no atual Projeto Ético Político Profissional, bem como no conjunto de
conhecimentos teóricos e metodológicos para a intervenção profissional.

Segundo Vedovato (2011), a proteção internacional aos refugiados nasceu do
desejo de proporcionar ajuda humanitária a determinadas populações em
51

sofrimento. Entretanto, mesmo após muitos anos desde a sua estruturação, o
sistema vigente na atualidade, se esforça para alcançar tal meta. Ainda segundo o
referido autor, a proteção internacional dos refugiados conta com dois componentes
fundamentais: “os acordos internacionais sobre o tema, no campo do direito,” e o
ACNUR, que é caracterizado como a principal instituição internacional responsável
de responder as expectativas e os anseios dos refugiados. Vedovato, afirma ainda
que “o sistema não reflete as realidades encontradas no cotidiano dos refugiados, os
quais enfrentam problemas reais que colocam em dúvida a eficiência da estrutura”
(p.289).
“(...) você não imagina como são tratadas as famílias, inclusive em
albergues, albergues que não são parte do sistema de acolhida, porque são
como terceirizações de quem já tem o contrato com o ACNUR”.
“Então isso, manejar isso através de terceirizações é uma estratégia muito
boa, para criar desordem, criar confusão, e no meio da desordem e da
confusão, podem fazer muitas coisas erradas (...)”. Sujeito 3
“Trabalho tem muito, aqui tem oportunidade, para brasileiro, também para
estrangeiros”.
“Mas eu senti muita dificuldade por causa da língua, muitos lugares que
quando eu fui eu pensei essa vaga é para mim, eu fui para entrevista, mas
ele me falou que você não fala muito bem português.” Sujeito 1
“Eu e minha irmã queremos ficar bem aqui no Brasil”.
“A gente tem vontade de estudar, primeiramente falar bem português”.
“Aqui não temos diploma de ensino médio, a gente tem obrigação de fazer a
escola de novo para tirar o diploma e entrar na universidade”.
“A gente quer estudar por que estamos aqui para procurar uma nova vida
para esquecer muita coisa na cabeça e para esperar a resposta de Deus
para ver se a gente vai encontrar tudo o que agente perdeu no nosso país”.
Sujeito 4
Muitos refugiados deixam para trás não só seus pertences pessoais como
também documentos (tais como, diploma, comprovantes de escolaridades, ou
qualquer outro documento). Isto ocorre porque em alguns casos a fuga diante do
52

conflito se dá de forma muito violenta, restando tempo apenas para salvar a própria
vida.
A fala da entrevistada acima nos remete refletir sobre a situação dos
refugiados, e o que de fato eles buscam no país de acolhimento. Oportunidade de
reconstruir uma nova vida, oportunidade de ser protagonista de sua própria história,
oportunidade de ser um ser humano e de ter dignidade. É preciso ter clareza que os
refugiados são vítimas de conflitos e não produtos deles.

De acordo com Haydu (2011), os solicitantes de refúgio e refugiados
encontram muitas dificuldades para conseguir emprego, bem como grandes
dificuldades de acesso a serviços públicos básicos com saúde e moradia. Ainda
segundo Haydu, por vezes, sentem-se discriminados pela sociedade, por faltarem
campanhas consistentes de humanização e informação com a relação a causa dos
deslocamentos forçados. Não raramente os refugiados são confundidos como
fugitivos da justiça, dificultando ainda mais seu ingresso no mercado de trabalho.
Segundo Vedovato (2011), é possível através de casos/ histórias do cotidiano
do refugiado, identificar a diferença no Brasil, “entre o direito declarado e a realidade
do refugiado em nosso território”, ou seja, direito declarado e direito alcançado.
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  • 1. CENTRO UNIVERSITÁRIO FMU CURSO DE SERVIÇO SOCIAL DANIELA NASCIMENTO DE OLIVEIRA SERVIÇO SOCIAL E DIREITOS HUMANOS: um estudo sobre os solicitantes de refúgio e refugiados na cidade de São Paulo São Paulo 2012
  • 2. DANIELA NASCIMENTO DE OLIVEIRA SERVIÇO SOCIAL E DIREITOS HUMANOS: um estudo sobre os solicitantes de refúgio e refugiados na cidade de São Paulo Trabalho de Conclusão de Curso apresentado ao Curso de Serviço Social do Centro Universitário FMU, como exigência para obtenção do título de Bacharel em Serviço Social, sob orientação da Professora Ms. Tania Elias. São Paulo 2012
  • 3. DANIELA NASCIMENTO DE OLIVEIRA SERVIÇO SOCIAL E DIREITOS HUMANOS: um estudo sobre os solicitantes de refúgio e refugiados na cidade de São Paulo Trabalho de Conclusão de Curso apresentado ao Curso de Serviço Social do Centro Universitário FMU, como exigência para obtenção do título de Bacharel em Serviço Social, sendo integrantes da banca: Prof.ª Ms. Tania Elias e Prof.ª Dra. Elza Koumrouyan. São Paulo, 10 de dezembro de 2012. _______________________________________ _______________________________________
  • 4. A Deus que me proporcionou a oportunidade e força para chegar até aqui... A todos os profissionais e estudantes do curso de Serviço Social. A todos os refugiados e refugiadas que perderam quase tudo, principalmente aos que tiveram que deixar para trás sua família e partiram com a incerteza de poder vê-los de novo antes de perderem aquilo que era primordial em tal momento, a vida.
  • 5. AGRADECIMENTOS Este Trabalho de Conclusão de Curso, assim como o curso de Serviço Social, permitiu a minha transição à um outro campo de visão. Em primeiro lugar a Deus por ter me permitido chegar até aqui, e por fazer da minha vida um verdadeiro milagre todos os dias. Deus obrigada por me fortalecer sempre! À minha querida e admirada orientadora Tania Elias que, desde o início, me deu forças e apoio para trabalhar um tema diferente. Obrigada pela motivação, paciência e pelo acompanhamento no processo de desenvolvimento do TCC. Obrigada principalmente por ter aceitado me orientar, obrigada pelas broncas, mas principalmente por ser tão admirável profissional como a senhora é. “orgulho” Agradeço à minha supervisora de campo Denise Orlandi Collus que me apresentou a temática do refúgio e, com sua enorme paixão pelo trabalho, me inspirou a cada dia. Agradeço às professoras que com certeza fizeram uma enorme diferença no meu processo de formação. Entre as quais eu jamais poderia deixar de citar: Professora Elza Koumrouyan que sempre nos deu orientações e apoio para lutar sempre em prol do usuário, pelas conversas e, principalmente pela preocupação com a qualidade do ensino; Professora Therezinha Lourdes Lopes que sempre me deu apoio desde o início, obrigada pela grande força no meu Projeto! Agradeço à minha família de uma forma geral por ter me ajudado a descobrir que nem só as motivações positivas nos dão força para continuar, mas que as negativas nos dão muito mais. Agradeço às pessoas maravilhosas e inesquecíveis que conheci nesse processo, que fizeram diferença na minha vida. Agradeço em especial àquelas que me apoiaram pessoal e materialmente para a conclusão desse trabalho. O que você é é um presente de Deus para você; O que você faz consigo, é um presente seu para Deus. Provérbio dinamarquês Obrigada! Daniela N. de Oliveira
  • 6. Nós estamos aqui hoje para falar sobre milhões de famílias em desespero. Famílias tão afastadas da civilização, que eles nem sabem que um dia como este existe ao seu favor. Milhões... E... Números podem iluminar, mas também podem iludir. Então, eu estou aqui hoje para falar que os refugiados não são números... E não apenas refugiados. Eles são mães, e filhas, e pais, e filhos. Eles são fazendeiros, professores, médicos, engenheiros. Eles são indivíduos. E acima de tudo eles são sobreviventes. Cada um com uma extraordinária história sobre como se recuperar frente às grandes perdas. Eles são as pessoas mais impressionantes que eu já conheci. E eles também são as mais vulneráveis do mundo. Exilados de suas casas e países, refugiados estão desprotegidos e perdidos ao redor do planeta [...]. Eu me lembro que antes de termos nos despedido da mulher grávida, ela apontou para um garoto jovem. Limpou a poeira da face e eram os olhos verdes mais brilhantes que já tinha visto [...]. Era um olhar tão triste e ela me explicou que ele está sempre pedindo por mais comida. E dói para elas dizerem que elas não tem nada. E ela nos perguntou se iríamos considerar em levar ele. Nós levaríamos o filho dela para que ele pudesse comer? Ela disse isso entre lágrimas, ela estava desesperada. Um desespero inimaginável para quaisquer pais nesta sala. Algumas semanas depois, a guerra no Afeganistão começou, e lutas pesadas começaram exatamente onde eles estavam. Eu voltei até aquela região três vezes, e procurei por eles em todas elas. [...] A ameaça das mudanças climáticas, a competição por recursos e a sempre crescente desigualdade global tem criado profundos conflitos. Migrações em massa serão características do nosso futuro. E nós temos que nos preparar para esta realidade. E mais uma vez eu peço para que vocês olhem para os indivíduos no lugar dos simples números [...]. E então eu lembro que no dia seguinte eu andei pelo campo e eu vi mais vítimas da guerra. Eu vi crianças pequenas cheias de fome e medo, mães chorando, pais feridos. Eu vi um oceano de pessoas, todas desesperadas, todas dignas. Eles eram centenas de milhares naquele campo, e são milhões ao redor do mundo [...]. E naquele momento eu me senti sem esperança e oprimida pela realização da magnitude do problema [...]. E naquela viajem e nas outras seguintes eu cheguei a
  • 7. conhecer os refugiados não somente como as pessoas mais vulneráveis na terra, mas como as mais alegres. Como uma americana, eu conheço a força que a diversidade tem dado ao meu país [...]. Um país construído por aquilo que agora desmentem como buscadores do silêncio ou migrantes econômicos. E eu acredito que nós devemos persuadir o mundo de que os refugiados não devem ser vistos como simples miseráveis [...]. Nos últimos nove anos eu fiz muitas visitas para estes campos. E faço isso para aumentar a conscientização pelos refugiados, mas também por mim mesma. Os refugiados os quais encontrei e passei meu tempo mudaram profundamente a minha vida. A garota de oito anos que salvou o seu irmão me ensinou o que é ser valente. A mulher grávida no Paquistão me ensinou o que é ser uma mãe. E o menino paralisado, que levou um tiro nas costas com o seu grande sorriso, me ensinou a força de um espírito inquebrável. Então hoje, no Dia Mundial dos Refugiados eu agradeço a eles por me deixarem entrar em suas vidas eu agradeço a vocês por terem vindo. Angelina Jolie Embaixadora da Paz do ACNUR-, em seu discurso no dia Mundial do Refugiado20/06/2009.
  • 8. RESUMO A questão do refúgio e dos refugiados vem se apresentando como um tema instigante a ser estudado, porém pouco se conhece sobre o assunto, bem como sobre a atuação do Serviço Social neste novo campo, que parece se descortinar para a profissão. Nesse sentido, o presente estudo buscou estudar e compreender a questão do refúgio e dos refugiados no Brasil, especificamente na cidade de São Paulo, primeiramente a partir da revisão da literatura especializada, na qual se constata que a temática está intimamente relacionada aos Direitos Humanos. Procurou-se então conhecer os marcos legais que orientam a proteção ao refugiado, no âmbito internacional e nacional. Para o estudo da atuação do Serviço Social foram estudados os serviços oferecidos pelas instituições Cáritas Arquidiocesana de São Paulo e pelo Serviço Social Do Comércio – SESC, unidade do Carmo. Na pesquisa de campo este estudo procurou aproximações com os sujeitos refugiados ou solicitantes de refúgio, realizando entrevistas com os sujeitos de diferentes nacionalidades, que vivem na cidade de São Paulo, que utilizam os serviços sociais no sentido de identificar a efetividade destas ações. Os resultados em síntese demonstram falhas que foram registradas a partir da coleta dos dados. Palavras-chave: Direitos Humanos; Refúgio; Refugiados; Serviço Social. ABSTRACT Asylum seekers and refugee affairs in Brazil are intriguing and underexplored subjects to be studied, as well as the social work role in this new field, which social workers are still beginning to unfold. This study shows the refugees and refugee applicant issues in Brazil, specifically in the city of São Paulo. First and foremost the literature, which relates the issue closely to Human Rights, is reviewed in this assignment. Then the legal framework dealing with refugee protection under national and international law was also researched. This paper on Social Work evaluates the facilities offered by the institutions Cáritas Arquidiocese de São Paulo - a branch of Caritas International - and by SESC Carmo, which is the social service of commerce employees at Rua do Carmo, São Paulo. Refugee and asylum-seekers from different nationalities, who live in the great São Paulo area, were interviewed. The aim was to identify the effectiveness of the social integration actions promoted by the two above mentioned institutions. The results of field research demonstrate that notwithstanding the efforts of these non-profit organizations, some gaps are still there to be filled. Keywords: Human Rights; Refuge; Refugees; Social Service.
  • 9. SUMÁRIO INTRODUÇÃO..................................................................................................................................... 10 CAPÍTULO 1- PARA ENTENDER O REFÚGIO E O REFUGIADO..................................................... 13 1.1 Motivos geradores do refúgio humanitária.............................. ajuda 13 1.2 A questão legal do refúgio Brasil.................................................................. no 22 1.3 Dados quantitativos sobre Brasil.................................................. no 28 1.4 Perfil e situação dos solicitantes de refúgio e dos refugiados na cidade de São Paulo............ 29 CAPÍTULO 2 – DIREITOS HUMANOS E SERVIÇO SOCIAL E AS REDES DE PROTEÇÃO SOCIAL AO REFUGIADO EM SÃO PAULO..................................................................................... 33 2.1 Serviço Social e Direitos Humanos..................................................................................... 33 2.2 Serviço Social do Comércio – SESC-SP............................................................................. 35 2.3 Cáritas Arquidiocesana de São Paulo – CASP.................................................................. 38 CAPITULO 3 – METODOLOGIA DA PESQUISA................................................................................ 41 3.1 Apresentação dos sujeitos da pesquisa............................................................................. 43 3.2 Análise dos dados................................................................................................................ 44 CONSIDERAÇÕES FINAIS.................................................................................................................. 53 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS.................................................................................................. 56 APÊNDICE A – Roteiro de Perguntas............................................................................................ 59 APÊNDICE B - Pesquisa na íntegra............................................................................................. 59 ANEXO A – Lei Federal 9.474 de 1997.......................................................................................... 82 ANEXO B- Perfil da população de solicitantes de refúgio e refugiados cadastrados no Estado de São Paulo..................................................................................................................... 89 os e a institucionalização e refugiados dos no da refugiados mundo e
  • 10. 10 Introdução O presente Trabalho de Conclusão de Curso – TCC, aborda o tema dos refugiados que vivem em São Paulo. Uma das razões da escolha deste tema é a pouca visibilidade e o desconhecimento com relação aos refugiados. Outra razão refere-se ao fato de cumprirmos estágio supervisionado no Serviço Social do Comércio - SESC Carmo, entidade esta que atende refugiados procedentes de diversos países, que chegam diariamente ao Brasil, especialmente na cidade de São Paulo. Podemos ressaltar, ainda, que escolhemos estudar os refugiados, por serem pessoas que tiveram de deixar sua casa, sua família, sua história, seus bens, sua pátria, e que não lhes restaram alternativas, a não ser refugiarem-se em outros locais. Além disso, a proteção ao refugiado vem se destacando como um novo campo de atuação do Serviço Social. Os refugiados são homens, mulheres, crianças, idosos, enfim, pessoas de todas as idades, que tiveram de deixar seu país de origem por estarem sofrendo graves e generalizadas violações de direitos humanos ou, por temerem ser perseguidas por motivos étnicos, raciais, religiosos, políticos, de nacionalidade, ou ainda, por associação a determinados grupos sociais, que fogem porque seu país de nacionalidade não é capaz de protegê-las, ou seja, o Estado não pode fornecer a proteção fundamental que está expressa na Declaração Universal dos Direitos Humanos de 1948, qual seja, o direito à vida. Pela falta de intimidade com o tema, muitos confundem os refugiados com os migrantes econômicos. Diferentemente de quem migra de um país para o outro com intenção de melhorar suas condições econômicas, os refugiados são obrigados a fugir de seu país se quiserem salvar suas vidas, conforme explicitamos acima. Muitos refugiados chegam ao país de acolhida carregados de traumas, mas com a esperança de recomeçar e contando em receber proteção do Estado, no caso, do governo brasileiro. Nesse sentido, e em relação ao tema em foco, cabe perguntar: por que pesquisar a situação dos refugiados no Brasil? A esse respeito, Silva destaca: [...] falta de emprego, moradias inadequadas, falta de integração com a sociedade civil. Nada muito diferente dos problemas enfrentados pela pobre população brasileira é verdade. Acrescente apenas um fator extra - a diferença cultural que às vezes choca, agride e humilha. Eles também sofrem isso. Esqueça a idéia de que o Brasil é uma terra cheia de gente simpática que adora receber estrangeiros. Pode funcionar no Rio de Janeiro
  • 11. 11 ou em Salvador onde os turistas gastam um monte de dinheiro, mas não funciona com refugiados (2008, p.14). Mello também nos faz refletir sobre o questionamento que norteia este estudo, conforme segue: Há dívidas históricas a saldar com a camada mais sofrida da população brasileira, que, entretanto – não custa lembrar-, nem de longe passa pelo desconforto da condição de exilado - sem pátria, sem família, sem direitos políticos, sem bens, às vezes até sem identidade ou memória (2003, p.1011). A falta de informação sobre a situação dos refugiados tem graves consequências, gerando preconceitos e exclusões. Na revisão da literatura sobre o tema, verificouse que a ausência de conhecimento pode ser prejudicial, deixando de existir o efetivo reconhecimento da sociedade sobre estes cidadãos, desrespeitando, assim, sua cultura e sua história, além da ausência de projetos sociais efetivos para sua integração no país de acolhimento. No intuito de aprofundarmos o entendimento sobre a temática escolhida e, tendo em vista esse novo campo de atuação para o Serviço Social, definimos como objetivo geral da presente pesquisa estudar, compreender e analisar a questão do refúgio na cidade de São Paulo, bem como o trabalho social desenvolvido por instituições que atendem ao refugiado. Para que possamos atingir o objetivo acima proposto, consideramos pertinente desmembrá-lo em objetivos específicos, quais sejam: apresentar os motivos da existência de refugiados no mundo; identificar e descrever os programas, projetos e serviços oferecidos pelas instituições que fazem o atendimento aos sujeitos refugiados; pesquisar e avaliar o atendimento social aos refugiados, a partir das falas dos sujeitos da pesquisa. Para alcançar os objetivos explicitados, abordamos, no primeiro capítulo, a existência dos refugiados no mundo. Apresentamos o refugiado ao leitor, bem como as condições para ser considerado oficialmente um refugiado, segundo a Lei Federal 9.4741 de 22 de julho de 1997 que define mecanismos para implementação do Estatuto dos Refugiados2 instituído pela Organização das Nações Unidas – ONU. Ainda neste capítulo, apresentamos o perfil do refugiado na cidade de São Paulo, locus desta pesquisa. 1 2 Vide anexo A No Capítulo 1 serão tratados e explicados tais marcos legais
  • 12. 12 No segundo capítulo, estudamos a relação existente entre o Serviço Social e os Direitos Humanos. Identificamos e descrevemos ainda que de maneira sumária os espaços institucionais em que o Serviço Social atua no atendimento a esta demanda, descrevendo os programas, projetos e ações oferecidos aos refugiados. As instituições são: Cáritas Arquidiocesana de São Paulo3, e Serviço Social do Comércio – SESC Carmo - SP. No terceiro capítulo, voltado à pesquisa de campo, apresentamos as expectativas dos refugiados em relação aos serviços e atendimentos oferecidos. O presente estudo, ao cumprir seus objetivos, busca desvelar as diferenças existentes quanto ao entendimento do senso comum sobre deslocamento forçado e imigração por motivos econômicos. Cabe esclarecer que foram estabelecidas, nos estudos sobre o tema, denominações diferenciadas relativas à população refugiada sendo estas: os solicitantes de refúgio, que são as pessoas que já solicitaram refúgio e que estão aguardando decisão jurídica do Comitê Nacional para os Refugiados -CONARE sobre tal pedido; os refugiados que são aqueles que tiveram o seu status de refugiados reconhecido pelo órgão competente. 3 A Cáritas é uma organização da sociedade civil que tem parceria com o Alto Comissariado das Nações Unidas para os Refugiados- ACNUR.
  • 13. 13 CAPÍTULO 1 – PARA ENTENDER O REFÚGIO E O REFUGIADO Todo ser humano tem capacidade para gozar os direitos e as liberdades estabelecidos nesta Declaração, sem distinção de qualquer espécie, seja de raça, cor, sexo, idioma, religião, opinião política ou de outra natureza, origem nacional ou social, riqueza, nascimento, ou qualquer outra condição. Não será também feita nenhuma distinção fundada na condição política, jurídica ou internacional do país ou território a que pertença uma pessoa, quer se trate de um território independente, sob tutela, sem governo próprio, quer sujeito a qualquer outra limitação de soberania. Artigo II - Declaração Universal dos Direitos Humanos 1.1 Motivos geradores do refúgio e a institucionalização legal da ajuda humanitária O refúgio existe porque a humanidade sempre viveu conflitos de todos os tipos que ocasionaram perseguições raciais, religiosas, políticas, por associação a determinados grupos sociais, ou através de desastres ambientais, pobrezas extremas, secas, gerando assim situações de graves e generalizadas violações de direitos humanos. Conflitos aconteceram e continuam a acontecer em todos os continentes do planeta. Podemos constatar sua existência com base no que segue: A angustiante situação dos refugiados confunde-se com a própria história do homem. Ao longo dos séculos, as pessoas têm sido obrigadas a fugir de seus países ou das suas comunidades em virtude de perseguições, conflitos armados ou de violência. Em todos os cantos do mundo, os governos, os exércitos e os movimentos rebeldes, na busca de objetivos militares e políticos, têm recorrido à deslocação forçada das populações, sobretudo, aquelas mais marginalizadas da sociedade: membros de grupos minoritários, apátridas, populações autóctones e outros excluídos das estruturas do poder político (ACNUR, 1998, p.1). Segundo o Dicionário Aurélio (2004), a palavra refúgio significa “local para onde alguém foge a fim de estar em segurança; asilo, abrigo. Apoio, amparo, proteção...”. O mesmo Dicionário, para o verbo refugiar-se, traz o seguinte significado: retirar-se (para um lugar seguro); acolher-se, abrigar-se. Tomar asilo; asilar-se, expatriar-se. Procurar abrigo ou proteção; resguardar-se, amparar-se.
  • 14. 14 Os refugiados são pessoas comuns, homens, mulheres, crianças e idosos que tiveram de fugir de seu país de origem para salvar suas vidas, pela razão de serem perseguidas, ou por recearem tal perseguição e, algumas poucas vezes, fogem na tentativa de poupar os seus familiares, levando consigo apenas sua vida e sua memória. O refugiado é uma pessoa ou grupo de pessoas “que deixam seu país forçados – embora não necessariamente ‘perseguidos’ – por fome, desemprego, questões raciais, étnicas, desordem política interna do país, motivos religiosos, e buscam segurança ou perspectivas de vida e sobrevivência em outro país” (Fórum de Entidades nacionais de Direitos Humanos). Barreto explica o que é ser um refugiado de forma muito expressiva, conforme segue: O nome, uma nacionalidade, uma raça, uma religião. Nesse momento, em muitos pontos do mundo, há gente sendo obrigada a sair de seus países, há gente sendo presa, há gente sendo morta. [...]. Quantas vezes alguns países fazem discriminação com base na nacionalidade. Dizem: a partir de agora não queremos mais pessoas de tal país em nosso território, porque há um confronto étnico, político, guerra, ou o que quer que seja! Quantas vezes há raças discriminadas, até atos oficias, leis restringem o acesso de determinada raça à universidade, à escola, aos direitos básicos e começa a haver sistemas de perseguição! A resposta da religião, simples, podia ser católica, podia ser muçulmana, podia ser budista, qualquer uma, mas, quantas vezes, por causa de sua religião, de exercício de seu credo, as pessoas têm de sair de seus países, caso contrário serão perseguidas! Por esses temas, envolvendo etnia, raça, credo, existem perseguições em várias partes do mundo (2006, p.33-34). Em conformidade à, pode-se confirmar que os refugiados são pessoas comuns; homens e mulheres que viviam suas vidas normalmente, com seus valores, suas culturas, suas crenças, e que muitas vezes não fizeram nada além de serem eles mesmos e, por conta disso, foram perseguidos, mortos, presos, torturados, simplesmente por serem “diferentes” do que certos grupos de pessoas desejam. A problemática dos refugiados é tão antiga quanto a própria humanidade. Conforme afirma Marinucci: Desde criança sabemos da existência de guerras, conflitos, imperialismos, colonialismos, perseguições políticas e religiosas que perpassaram a caminhada histórica de todos os povos. Infelizmente, as informações nem sempre se referiam às conseqüências que tais acontecimentos causaram na vida cotidiana das pessoas. Mesmo assim, sabemos que houve refugiados e deslocados em todas as épocas da história da humanidade (2003, p. 12).
  • 15. 15 Observando o mapa que segue abaixo, podemos verificar as situações que provocam (ou provocaram) deslocamentos forçados, tais como terrorismos, guerras civis, separatismos e perseguições étnicas ou religiosas: Fonte: BORGES4 Dessa forma, refugiados e refugiadas estão por todas as partes do mundo, com a esperança de serem protegidos e protegidas pelo Estado de acolhida. A situação dos refugiados pode ser considerada uma das mais precárias conforme afirma a seguinte reflexão de Barbosa e Hora: A situação dos refugiados é uma das mais precárias a que se pode sujeitar o ser humano, pois vulneráveis e distantes de tudo o que habitualmente alicerçam as relações entre as pessoas, deparam-se com muitos desafios, poucas condições materiais e uma abalada estrutura emocional, esperançosos apenas de que alguém os acolha e proteja,fornecendo um novo sopro de vida (2007, p.83). Ainda segundo os referidos autores, a trágica situação dos refugiados é um fenômeno que acompanha os homens desde sua origem na terra. Como já afirmamos antes, são pessoas que são perseguidas pelo simples fato de serem “diferentes”: por se posicionarem de forma divergente do ponto de vista político; por seguirem outras orientações religiosas (e às vezes fanáticas) dos grupos dominantes, etc. 4 Site completo nas referências finais
  • 16. 16 O homem, ao longo de sua história na terra, passou por desastres, desbravou os mares, fez grandes inovações, chegou à Lua e à Marte; em contra partida a terrível situação das perseguições por variados motivos (raça, religião, nacionalidade) continua insolúvel, ou melhor, continua existindo em diferentes partes do mundo. Ainda que a dramática situação dos refugiados seja um problema que perdura há séculos, apenas após a 1ª Guerra Mundial a comunidade internacional preocupou-se com a situação destes, criando assim a Liga das Nações no ano de 1920, instituição esta que tinha como um de seus objetivos promover a cooperação, a paz e a segurança internacional. A partir de então começou um processo de institucionalização de proteção ao refugiado. Porém, existia um mecanismo que protegia apenas pessoas que estavam em situação de refúgio por ocasião da 1ª Guerra Mundial, essas pessoas eram reconhecidas através de um passaporte denominado “Nansen”5. Pessoas e grupos vítimas de outros conflitos pós a 1ª Guerra não recebiam proteção. Após o fim da Segunda Guerra Mundial, em 1945, cria-se a Organização das Nações Unidas - ONU, com a intenção de que outras atrocidades fossem evitadas em âmbito global, promovendo assim a paz e a harmonia entre os países. Em 1948 é publicada a Declaração Universal dos Direitos Humanos, documento este que é referência para a proteção dos direitos do homem até os dias de hoje. Por consequência dos grandes fluxos de refugiados pós-Segunda Guerra mundial, percebeu-se a importância de existir um órgão específico para a temática dos refugiados. Adotou-se então a Convenção Relativa ao Estatuto dos Refugiados de 1951, criada com base, além de outros instrumentos, no artigo 14° da Declaração Universal dos Direitos Humanos que assegura: Todo ser humano, vítima de perseguição, tem o direito de procurar e de gozar asilo em outros países. Este direito não pode ser invocado em caso de perseguição legitimamente motivada por crimes de direito comum ou por atos contrários aos objetivos e princípios das Nações Unidas. A Convenção de 1951, relativa ao Estatuto dos Refugiados, instituiu universalmente uma definição para o termo “refugiado”. O artigo 1º, entre outras 5 O Dr. Fridtjof Nansen foi delegado da Noruega na Liga das Nações. Além de ser cientista e explorador. Por seus esforços contínuos em prol do trabalho humanitário, recebeu como resultado o prêmio Nobel da Paz, no ano de 1923. Posteriormente, o ACNUR passou a homenagear as pessoas que exercem esforços humanitários com a medalha Nansen, até os dias de hoje. O Escritório Internacional Nansen para refugiados, criado de acordo com o estabelecido no artigo 24 do Pacto da Liga das Nações, herdou e deu continuidade ao trabalho iniciado pelo Dr. Fridtjof Nansen. (BARBOSA ; HORA, 2007, p.15-16).
  • 17. 17 alíneas, destaca, na alínea c, que o “termo refugiado se aplicará a qualquer pessoa” que: [...] em conseqüência de acontecimentos ocorridos antes de 1 de Janeiro de 1951, e temendo ser perseguida por motivos de raça, religião, nacionalidade, grupo social ou das suas opiniões políticas, se encontra fora do país de sua nacionalidade e que não pode ou, em virtude desse temor, não quer valer-se da proteção desse país, ou que, se não tem nacionalidade e se encontra fora do país no qual tinha a sua residência habitual em conseqüências de tais acontecimentos, não pode ou, devido ao referido temor, não quer voltar a ele. (Coletânea de Instrumentos de proteção ao refugiado) Subsequente a isso, ainda no ano de 1951, cria-se o Alto Comissariado das Nações Unidas para Refugiados – ACNUR, que tem a função de proporcionar proteção internacional aos refugiados. O ACNUR possui agências em mais de 100 países. Sua missão é, dentre outras, velar pela aplicação das convenções internacionais que possibilitem a proteção dos refugiados. Seu caráter é humanitário, social e, fundamentalmente, apolítico. Foi designado primordialmente para que providenciasse a proteção internacional e para buscar soluções duráveis, ou seja, soluções que não sejam paliativas e emergenciais, mas que incluam a tentativa de estabelecer a paz nos países que porventura estiverem vivenciando algum tipo de conflito. Tais soluções e providências devem ser aplicadas levando-se em consideração as seguintes diretrizes oferecidas pelo Estatuto do ACNUR, como abaixo referimos: Art. 8º O Alto Comissário deverá assegurar a proteção dos refugiados abrangidos pela competência do seu Comissariado pelos seguintes meios: a) Promovendo a conclusão e ratificação de convenções internacionais para proteção dos refugiados, velando pela sua aplicação e propondo alterações aos mesmos; b) Promovendo, mediante acordos especiais com os Governos, a execução de todas as medidas destinadas a melhorar a situação dos refugiados e a reduzir o número dos que requerem proteção; c) Apoiando os Governos e os particulares no seu esforço para fomentar o repatriamento voluntário dos refugiados ou a sua integração no seio de novas comunidades nacionais; d) Promovendo a admissão de refugiados, sem excluir os mais desamparados, nos territórios dos Estados; e) Envidando esforços para que se conceda autorização aos refugiados para transferir os seus haveres, especialmente os necessários à sua reinstalação;
  • 18. 18 f) Obtendo dos Governos informação acerca do número e da situação dos refugiados que se encontrem nos seus territórios e sobre as leis e regulamentos que lhes dizem respeito; g) Mantendo-se em contato estreito com os Governos e organizações intergovernamentais envolvidas; h) Estabelecendo contato, da forma que julgue mais conveniente, com as organizações privadas que se ocupem de questões de refugiados; i) Facilitando a coordenação de esforços das organizações privadas que se ocupem do bem-estar social dos refugiados O ACNUR, além de tratar da causa dos refugiados, também se ocupa de outras causas de deslocamentos forçados, tais como as das populações denominadas como: Repatriados – pessoas que voltaram ao seu país de origem. O ACNUR trabalha com a reintegração na sociedade. Deslocados – pessoas que fugiram, mas não conseguiram sair de dentro de seu próprio país (estão deslocados internamente). Apátridas – pessoas que nascem sem uma nacionalidade ou as perdem, porque o Estado retira, e a pessoa fica sem proteção de qualquer Estado. Ou seja, não há vinculo de nacionalidade com qualquer País. Há pessoas que tem a sua nacionalidade negada por motivos de raça, religião, pertencimentos a um grupo social ou por opiniões políticas. De acordo com estimativas do ACNUR podem existir em torno de 12 milhões de apátridas em todo o mundo. Passados alguns anos, os critérios que definiam a situação de refúgio, tais como a data limite dos acontecimentos ocorridos, que era até 1° de Janeiro de 1951, bem como a reserva geográfica que reconhecia apenas solicitantes de refúgio os europeus, tornaram-se obstáculos para que outras pessoas, vítimas de outros conflitos, que não a Segunda Guerra Mundial, fossem amparadas. Nessa perspectiva, ampliou-se o conceito de refugiado com o objetivo de amparar as novas vítimas de acontecimentos que violem o campo dos direitos humanos. Essa ampliação acontece com o surgimento do Protocolo de 1967. Este documento extinguiu da Convenção de 1951 as expressões: ”em conseqüência de acontecimentos ocorridos antes de 1º de Janeiro de 1951” e, também, “como conseqüência de tais acontecimentos”. Um dos motivos causadores desta ampliação foram os conflitos na América Latina e no Continente Africano.
  • 19. 19 Em 1984 a Declaração de Cartagena6 tornou-se um marco para a proteção internacional dos refugiados, ou seja, um instrumento para reafirmar o compromisso dos países com a causa dos refugiados, e que também contribuiu para a ampliação do conceito de refugiado, porém com aplicação aos países da América Latina. Para Piovesan (2001), a declaração de Cartagena possui um valor inestimável pelo fato de ter incluído no conceito de refugiado a “violação maciça” dos Direitos Humanos conforme segue: A definição ou o conceito de refugiado recomendável para sua utilização na região é o que, além de conter os elementos da Convenção de 1951 e do Protocolo de 1967, considere também como refugiados as pessoas que tenham fugido dos seus países porque a sua vida, segurança ou liberdade tenham sido ameaçadas pela violência generalizada, a agressão estrangeira, os conflitos internos, a violação maciça dos direitos humanos ou outras circunstâncias que tenham perturbado gravemente a ordem pública (Declaração de Cartagena, 1984, p.3). Podemos então considerar até aqui que, a causa dos refugiados associa-se intrinsecamente com a causa dos Direitos Humanos: Não é difícil perceber que a causa do refúgio está diretamente relacionada à causa dos Direitos Humanos, na medida em que direitos fundamentais como o direito à vida e à liberdade são constantemente violados. (SAMPAIO, 2008, p.443). Nesta mesma perspectiva, afirma Piovesan: A proteção internacional dos refugiados tem como fundamento a universalidade dos direitos humanos, que afirma que a dignidade é inerente à pessoa e dessa condição decorrem direitos, independentemente de qualquer outro elemento. Os refugiados são assim, titulares de direitos humanos que devem ser respeitados em todo momento, circunstância e lugar. A proteção internacional dos refugiados tem ainda por fundamento a indivisibilidade dos direitos humanos, que devem ser concebidos como uma unidade indivisível, interdependente e inter-relacionada, ou seja, essa proteção alcança tanto direitos sociais, econômicos e culturais (2001, p.39). É difícil imaginar que ainda possam existir pessoas que nem ao menos conseguem atravessar uma fronteira e ficam presas nos campos de refúgio, sobre proteção do ACNUR. Essas pessoas ficam isoladas em um determinado território e não podem sair porque há riscos para sua vida, ou porque não existem países com condições para recebê-las. Esses seres humanos ficam no meio do nada, muitas 6 É um documento construído por Representantes Governamentais e especialistas de 10 países latinoamericanos com o objetivo de pensar a situação dos refugiados de toda a América Central. Esse encontro aconteceu em Cartagena das Índias, na Colômbia.
  • 20. 20 pessoas, inclusive crianças, morrem por não terem acesso aos direitos como saúde, alimentação e etc. As condições são lamentavelmente desumanas. A existência e a medida de tais situações podem ser constatadas nos estudos de Faial: De acordo com o órgão das Nações Unidas há, atualmente, 4.5 milhões de refugiados e 1,1 milhão ainda vivem em 59 campos de refugiados: na Margem Ocidental do Jordão, em Gaza, no Líbano, na Síria e na Jordânia vivendo em campos de refugiados, muitos sonham em voltar. Por isso têm a chave da casa que, provavelmente, não existe mais (2003, p.28). Ainda segundo Faial (2003), as condições de sobrevivência e habitação na maioria dos campos são deploráveis, praticamente não existem serviços sanitários, os sistemas de saneamento básico e esgoto são possíveis apenas em 35% das casas, como o que ocorre nos campos de refugiados em Gaza. Abaixo segue uma foto de um campo de refugiados em Dadaad, no norte do Quênia. Segundo o ACNUR, é um dos maiores campos de refugiados do mundo e abriga em torno de 460 mil pessoas. Fonte: EL País 7 7 Site completo nas referências finais
  • 21. 21 Sabemos que as guerras e conflitos, de maneira generalizada, assentam-se, mesmo que não explicitamente, em interesses econômicos, muito embora possamos perceber que vários conflitos armados acabaram como um mau negócio para o capitalismo. Segundo Enzensberger: A guerra, o meio mais simples de enriquecimento no passado, passou a ser um mau negócio. O capitalismo reconheceu que o massacre organizado oficialmente não gera lucro bastante. Obviamente, o entusiasmo pela política de paz manifestada pelos governos dos países industrializados não se deve a uma súbita conversão moral, mas uma estratégia formulada com frieza. O capital como instrumento de paz passa a ser uma visão insólita. Sem dúvida, alguns ainda esperam da guerra prósperos índices de crescimento econômico (1995, p.13). Na atualidade, alguns conflitos não têm a mesma intensidade dos anteriores, porém sabemos que eles são mais prolongados e, quem acaba por sustentá-los são as grandes potências mundiais, como os Estados Unidos da América (EUA), a Rússia e a China, por serem, de acordo com Ninio (2011), os países que mais vendem/exportam armas em todo o mundo. Em contrapartida, e com grande ironia, são países membros permanentes do Conselho de Segurança da ONU, o único Conselho que tem poder de veto dentre as decisões das Nações Unidas. Dentre as funções deste Conselho estão: “manter a paz e a segurança internacionais”, de acordo com os princípios das Nações Unidas. (ONU-Brasil). Tais informações reforçam a ideia de Enzensberger (1995) quando este afirma que, o capital (grandes potências mundiais) espera das guerras e dos conflitos índices elevados de crescimento econômico, e que a política de paz, manifestada por alguns países industrializados, não passa de uma estratégia capitalista formulada com frieza. Podemos reforçar o acima exposto, com base em Lafer: As decisões das Nações Unidas refletem o que pensam os países mais poderosos detentores do poder do veto no caso do Conselho de Segurança e, no caso da Assembléia – Geral o que pensa a maioria dos países membros, sendo que só terão alguma chance de prosperar de imediato aquelas decisões que não encontrem a objeção da maior parte dos países mais poderosos. Em síntese, na interação entre as múltiplas soberanias, a anarquia dos significados é frequentemente equacionada com base no que os mais fortes pensam. (1995, p.183).
  • 22. 22 1.2 A questão legal do refúgio e dos refugiados no Brasil Em relação à questão do refúgio e dos refugiados no Brasil, vigora a Lei Federal 9.474, de 22 de julho de 1997, identificada como uma das mais modernas do mundo porque, além de considerar todos os princípios da Convenção de 1951, bem como do Protocolo de 1967, assimila as reflexões mais modernas e contemporâneas relativas ao direito internacional dos refugiados como a “violação maciça dos direitos humanos”, conceito incorporado a partir da declaração de Cartagena em 1984 como já mencionado em itens anteriores. A esse respeito Leão nos diz: A lei brasileira relativa à temática dos refugiados é inovadora. Ademais de incorporar os conceitos tanto da Convenção de 1951 quanto do seu protocolo de 1967, ela agrega, como definição de refugiado e refugiada, todas aquelas pessoas que “devido a grave e generalizada violação de direitos humanos, é obrigada a deixar seu país de nacionalidade para buscar refúgio em outro país”. (2003, p.175,) destaques do autor. A referida Lei traz em seu Artigo 1º que “Será reconhecido como refugiado”, no território brasileiro, “todo o indivíduo que”: I – devido a fundados temores de perseguição por motivos de raça, religião, nacionalidade, grupo social ou opiniões políticas encontra-se fora de seu país de nacionalidade e não possa ou não queira acolher-se à proteção de tal país; II – não tendo nacionalidade e estando fora do país onde antes teve sua residência habitual não possa ou não queira regressar a ele, em função das circunstâncias descritas no inciso anterior; III – devido a grave e generalizada violação de direitos humanos é obrigado a deixar seu país de nacionalidade para buscar refúgio em outro país. No artigo 7º, a mesma legislação afirma que: O estrangeiro que chegar ao território nacional poderá expressar sua vontade de solicitar reconhecimento como refugiado a qualquer autoridade migratória que se encontre na fronteira, a qual lhe proporcionará as informações necessárias quanto ao procedimento cabível. Cabe elucidar que a referida Lei, entre outras determinações, institui a criação do Comitê Nacional para os Refugiados (CONARE) 8. Ao Comitê, dentre suas funções, A Lei N° 9.474, de 22 de Julho de 1997 em seu Artigo 11 cria o CONARE: “Fica criado o Comitê Nacional para os Refugiados - CONARE, órgão de deliberação coletiva, no âmbito do Ministério da Justiça”. (Coletânea de Instrumentos de Proteção Internacional dos Refugiados 3° Edição - IMDH, Brasília, 2010). 8
  • 23. 23 compete “reconhecer” a condição de refugiado das pessoas que solicitam abrigo no Brasil, como destacaremos abaixo. Ligado ao Ministério da Justiça, o CONARE é composto por diversos organismos públicos, dentre eles: Ministério da Justiça, que o preside, Ministério das Relações Exteriores, que assume a vice-presidência, Ministério da Educação, da Saúde, do Trabalho e Emprego e a Polícia Federal. Representando a sociedade civil organizada está a Cáritas Arquidiocesana de São Paulo e Rio de Janeiro. Vale ressaltar que o ACNUR também compõe o CONARE, tendo direito a voz, mas sem direito a voto. O CONARE segue modelo tripartite com a participação de representantes do Estado, da sociedade civil organizada e da comunidade internacional. A criação do CONARE incentivou a reabertura do Escritório do ACNUR no Brasil no ano de 2004, que havia fechado em 1998, por faltarem recursos para a sua manutenção. A seguir destacamos o Artigo 12 da Lei 9.474, que trata das competências deste organismo: Compete ao CONARE, em consonância com a Convenção sobre o Estatuto dos refugiados de 1951, com o Protocolo sobre o Estatuto dos Refugiados de 1967 e com as demais fontes de direito internacional dos refugiados: I - analisar o pedido e declarar o reconhecimento, em primeira instância, da condição de refugiado; II - decidir a cessação, em primeira instância, ex officio ou mediante requerimento das autoridades competentes, da condição de refugiado; III - determinar a perda, em primeira instância, da condição de refugiado; IV - orientar e coordenar as ações necessárias à eficácia da proteção, assistência e apoio jurídico aos refugiados; V - aprovar instruções normativas esclarecedoras à execução desta Lei. Dessa forma, podemos perceber que o CONARE é um órgão de fundamental importância no processo de requerimento de uma pessoa ao estatuto de refugiado. Segundo Leão (2003), as atividades do CONARE poderiam ser mais fáceis se não dependessem de recursos que são destinados à Diretoria de Estrangeiros do Ministério da Justiça, ou seja, se tivessem autonomia financeira. No Brasil, a proteção ao refugiado acontece por três vias: integração, assistência e proteção. O refugiado é acolhido pela sociedade civil organizada, com destaque para a ação da Cáritas que tem engendrado grandes esforços para a integração destes indivíduos na sociedade brasileira.
  • 24. 24 No caso brasileiro, a sociedade civil tem assumido papel de grande destaque no trabalho realizado visando à integração de refugiados, fornecendo, por meio de suas atividades diretas ou de parcerias, pouco mais de 60% do total da verba envolvida nos trabalhos com integração no País (HAYDU, 2011, p.139). A parceria da Cáritas com alguns albergues ou Casas de Acolhida é de fundamental importância, pois são elas que propiciam acolhimento imediato a muitas pessoas que chegam pedindo refúgio no Brasil. Segundo Haydu (2011), a parceria com o sistema “S” (SENAI, SESI e SESC), torna possível a inserção de alguns refugiados em cursos profissionalizantes e do idioma português. Na atualidade, o Brasil conta com a maior rede de apoio ao refugiado da América Latina, com quase 100 organizações envolvidas. O governo brasileiro oferece os serviços sociais básicos aos refugiados, tais como educação e saúde. Porém, a partir dos anos 2000, o governo federal vem demonstrando maiores esforços para a inserção de refugiados nas políticas públicas em vigor no Brasil. A esse respeito Haydu nos esclarece: Além de alguns benefícios que solicitantes de refúgio e refugiados já obtêm, como é o caso da carteira de trabalho e de documento de identidade, o que lhes dá permissão para trabalhar legalmente no Brasil, a política nacional para refugiados, mesmo que de maneira ainda tímida, tem dado sinais de que pretende aumentar esforços visando novos e melhores benefícios aos refugiados. Exemplo disso é a inserção de alguns poucos refugiados no programa de assistência governamental (Bolsa Família) e o adensamento de debates em torno ao acesso de refugiados a políticas de habitação e novas formas de inclusão no mercado de trabalho, como foi o caso do evento organizado pelo Ministério do Trabalho e ACNUR, ocorrido em São Paulo, em 2011 (2011, p.140). De acordo com Sampaio (2007), a proteção aos refugiados acontece através de ações governamentais, que incluem garantia de direito à vida, à segurança e à liberdade, confirmando-se, através de políticas positivas, que reconhecem a condição de refugiado perante o Estado brasileiro. A assistência acontece como ajuda humanitária ao refugiado que ainda não possui condições suficientes para sua auto dependência profissional, tal como inserir-se no mercado de trabalho nacional, portanto a assistência acontece transitoriamente. Ainda segundo Sampaio (2007), por um período a Cáritas e alguns parceiros prestam um auxílio imediato para que os refugiados possam obter moradia, alimentação, educação e saúde. Segundo Santos, a conquista da integração no país de acolhida é o momento mais importante para o solicitante de refúgio ou refugiado, que ultrapassa o ingresso no
  • 25. 25 mercado de trabalho, o auxílio na educação, bem como a possibilidade de aprendizagem do idioma local, ensino universitário, criação de políticas de emprego e etc. O autor citado acima assim se expressa: A busca da integração é a forma de refúgio mais plena e, contudo, mais complexa. Ultrapassa as expressões iniciais de acolhida, documentação, atendimento a necessidades básicas e imediatas. É algo mais profundo e abrangente (2003, p.139). Cabe ressaltar que quando uma pessoa chega ao território nacional para solicitar refúgio, o Brasil tem a obrigação de acolhê-lo, pois é um país signatário da ONU. Santos expressa essa questão da seguinte maneira: Acolher refugiados é, em primeiro plano, tarefa obrigatória de um governo que discurse sob uma mínima égide dos direitos humanos, preocupação essencial do ACNUR, criado em 1950 pela ONU para isso destacado, é um preceito religioso para as igrejas, mas também é posto como um compromisso de toda uma sociedade civil, humana, que consegue enxergar no outro um semelhante que sofre (2003, p. 136). A esse respeito Jubilut e Apolinário destacam: A população refugiada tem direito, assim, como todas as pessoas, a um padrão de vida, alimentação e moradia adequados, assim como saúde física e mental. A Convenção de 51 contem algumas disposições, ainda que limitadas, relacionadas aos direitos econômicos, sociais e culturais. Deste modo, a proteção destes direitos não é apenas uma questão de assistência humanitária, mas uma obrigação internacional assumida pelo Estado que ratificou aquele instrumento internacional, e que está obrigado constitucionalmente a garantir os direitos humanos também aos estrangeiros residentes em território brasileiro (2009, p.21). No entanto, cabe uma ressalva com base em Milesi. Esta autora afirma que se por um lado, o país tem uma das melhores legislações e um espírito humanitário por outro, faltam as condições econômicas e políticas públicas concretas para integração dos refugiados na sociedade. É também função do governo brasileiro averiguar a veracidade das informações e a intenção do indivíduo ao solicitar proteção em território nacional. Porém, enquanto esta verificação não acontece, o governo precisa respeitar o princípio do nonrefoullement (não devolução), ou seja, o Estado não pode devolver o refugiado ao seu país onde, por ventura, sua vida e liberdade estejam sendo ameaçadas. Este princípio caracteriza-se como o primeiro direito internacional dos refugiados.
  • 26. 26 Ainda segundo Sampaio (2007), ao conceder o status de refugiado a um indivíduo o governo brasileiro fica em “termos” responsável por este. Contando com o apoio do ACNUR e da sociedade civil, o Estado tem a obrigação de velar pela proteção legal, pela inserção do refugiado em políticas públicas, bem como sua integração na sociedade. A esse respeito, Haydu destaca: Em primeiro lugar, o Estado de acolhimento deve aceitar plenamente e apoiar ativamente os esforços com vistas a facilitar a integração local dos refugiados; uma segunda condição seria a aceitação da comunidade local, desses refugiados, como forma de evitar possíveis animosidades; um terceiro ponto de fundamental importância se dá em torno da questão econômica, ou seja, a integração local tem que ser economicamente viável; os programas de integração local, sobretudo em sua fase inicial, devem ter a garantia de financiamento externo suficiente que lhe proporcione êxito; para ser duradoura a integração local deve ser voluntária; e, por fim, os refugiados devem ser plenamente integrados na nova sociedade, tendo, inclusive, a possibilidade de adquirir a nacionalidade do país (2011, p.139). Assim, se por um lado, o Estado brasileiro tem obrigações e deveres para com os refugiados. Por outro lado, estes compõem grupos de sujeitos de direitos e deveres, conforme podemos observar abaixo: Direitos dos refugiados Pedir refúgio Procedimento de solicitação gratuitamente Não ser devolvido ao seu País de origem enquanto sua vida e segurança estejam em perigo e no período de análise de sua solicitação do status de refugiado. Deveres dos refugiados Seguir as Leis brasileiras Ter os documentos atualizados Estar sempre com o endereço atualizado junto à Polícia Federal Dar continuidade aos procedimentos para reconhecimento da condição de refugiado enquanto for solicitante. Abaixo segue um quadro sobre os procedimentos para solicitação de refúgio em território nacional, orientado, dentre outras legislações, pelo Título IV da Lei 9.474/97:
  • 27. 27 Chegada ao país POLÍCIA FEDERAL -Termo de declarações- CÁRITAS ou entidade parceira -Questionário de Solicitação de Refúgio - Serviços: moradia, saúde, educação e outros. - Advogados Cáritas/ACNUR/OAB: parecer - Entrevista com representante do CONARE 04 a 06 meses MEDIDAS INTERMEDIÁRIAS -CONARE: Autoriza o Protocolo Provisório -Protocolo provisório expedido pela PF - Carteira de trabalho provisória pela DRT. DECISÃO DO CONARE DECISÃO POSITIVA - Refugiado solicita a carteira de identidade na PF - Refugiado assina termo de Responsabilidade na PF - Assistência do ACNUR DECISÃO NEGATIVA -Recurso ao MJ pode ser apresentado até 15 dias -Recurso pode ser orientado pela Cáritas DECISÃO NEGATIVA MINISTRO DA JUSTIÇA Solicitante fica sujeito à legislação de estrangeiros
  • 28. 28 1.3 Dados quantitativos sobre os refugiados no Brasil e no mundo O ACNUR faz uma estimativa do número de pessoas que estão sobre a sua responsabilidade e proteção. Através da tabela abaixo podemos verificar a diversidade de nacionalidades bem como a sua maior representatividade até 2011 no Brasil, conforme segue: Brasil Nacionalidades Vias Tradicionais: (regularizados) Reassentados Maior representatividade 4477 pessoas dos cinco continentes 77 4053 424 Continente Africano (2824 Angolanos em 2011) Continente Americano (628 Colombianos em 2011) O continente Africano, por sua vez, representa o maior número muito embora não só composto por angolanos, mas também por pessoas de países como: Congo, Marrocos, Costa do Marfim, Camarões, Sudão, Senegal, Mauritânia, Nigéria, Guiné – Bissau dentre outros. O Continente Americano é representado por países como: Colômbia, Peru, Cuba, dentre outros. Abaixo os gráficos nos mostram uma estimativa da quantidade de pessoas por continentes, e a representatividade por países, que o Brasil recebeu até 2011, ficando estes classificados da seguinte maneira: Refugiados por Continente:
  • 29. 29 Fonte: CONARE 9 Países com maior representatividade: Fonte: CONARE 10 Segundo estimativas mundiais do ACNUR, no final de 2010, haviam 43,7 milhões de pessoas forçadas a se deslocar em todo o mundo. Mais de 15.500 solicitações em 69 países diferentes foram realizadas por crianças separadas ou desacompanhadas de suas famílias. Esses pedidos foram realizados principalmente por crianças afegãs e somalis. Ainda segundo o ACNUR, em 2010, mais de 845 mil pessoas fizeram pedidos individuais de refúgio. Nesse sentido, segundo Barbosa e Hora, “Havemos ainda de ter em mente que atrás de cada número há um ser humano. Atrás de cada estatística, ocultam-se sofrimentos pessoais e coletivos” (2007, p.84). 1.4 Perfil e situação dos solicitantes de refúgio e dos refugiados na cidade de São Paulo Grande parte dos solicitantes de refúgio e refugiados na cidade de São Paulo são homens, com idades que variam entre 25 e 40 anos. Em sua maioria residem no centro da capital. Normalmente dominam o inglês, francês e o espanhol. Frequentam 9 Dados extraídos do Ministério da Justiça, site completo nas referências finais. 10 Dados extraídos do Ministério da Justiça, site completo nas referências finais.
  • 30. 30 ou frequentaram cursos de português, tendo, em geral, o conhecimento básico deste idioma. Quando chegam à cidade de São Paulo, os refugiados encontram alguns problemas tais como: moradia, língua, trabalho, atenção à saúde, bem como grandes obstáculos na hora de revalidar documentos profissionais e escolares, como diplomas, experiências profissionais e etc. Com a intenção de melhor visualizarmos, em termos quantitativos os solicitantes de refúgio e suas consequências, apresentamos o quadro abaixo: Solicitantes de refúgio Dados acumulados entre Jan. à dez. de 2011 Dados acumulados de Jan. à jun. de 2012 Total acumulado Fonte: MORELLI 661 1003 1664 11 Desde o início dos registros realizados pela Cáritas, do total de solicitantes de refúgio, segundo relatório disponibilizado pela Cáritas São Paulo 12, existem 1592 refugiados, ou seja, pessoas que foram reconhecidas como refugiadas na cidade de São Paulo. Vale ressaltar que no período de jan. a jun. de 2012 apenas 14 pessoas foram reconhecidas como refugiadas. Isto demonstra a morosidade dos processos de reconhecimento da condição de refugiado. Outro dado interessante, diz respeito às solicitações negadas, num total de 62 e os números de arquivamentos e desistências, num total de 314. Este último dado reforça que muitos solicitantes de refúgio podem estar vivendo ilegalmente. Ainda no sentido de melhor expor o perfil dos solicitantes de refúgio, abaixo apresentamos a seguinte tabela, compreendendo o período de janeiro a junho de 2012: 11 12 Referências completas na bibliografia Vide Anexo B
  • 31. 31 Origem Solicitantes Continentes África Nigéria, Senegal, Guiné Bissau, República Democrática do Congo, e Somália. Refugiados 953 1439 612 317 929 - 30 30 Ásia Bangladesh, Butão e Afeganistão. 76 62 138 Oriente Médio Paquistão, Síria e Iraque. 101 238 339 Apátrida 01 02 03 1276 1602 2878 América Latina Haiti, Colômbia e Cuba 486 Total Europa Total Fonte: MORELLI 13 Quanto à composição, por formação profissional, da população economicamente ativa, abaixo apresentamos o seguinte quadro: 13 Referências Completas na bibliografia
  • 32. 32 Fonte: MORELLI 14 Com relação à formação educacional, segue o seguinte quadro: Fonte: MORELLI 15 14 15 Referências Completas na bibliografia Referências Completas na bibliografia
  • 33. 33 CAPÍTULO 2 – SERVIÇO SOCIAL E DIREITOS HUMANOS E AS REDES DE PROTEÇÃO SOCIAL AO REFUGIADO EM SÃO PAULO Todos são iguais perante a lei e têm direito, sem qualquer distinção, a igual proteção da lei. Todos têm direito a igual proteção contra qualquer discriminação que viole a presente Declaração e contra qualquer incitamento a tal discriminação. Artigo VII -Declaração Universal dos Direitos Humanos No presente capítulo, inicialmente, apresentaremos algumas reflexões sobre a relação existente entre o Serviço Social e os Direitos Humanos. Num segundo momento intencionamos apresentar e descrever, ainda que de maneira sumária, os organismos não governamentais que integram a rede de apoio e proteção aos solicitantes de refúgio, na cidade de São Paulo, bem como suas ações neste sentido. 2.1 Serviço Social e Direitos Humanos Como já referido em itens anteriores, a causa dos refugiados associa-se, contundentemente, à causa dos Direitos Humanos. Nesse sentido, acreditamos que essa mesma associação pode ser realizada com o Serviço Social que tem em seus princípios fundamentais a defesa intransigente dos direitos humanos. De acordo com o Conselho Federal de Serviço Social – CFESS, o Serviço Social brasileiro desde a década de 1970 incorporou uma série de estudos que possibilitaram aos profissionais uma compreensão das reais condições de vida dos usuários, com quem nos deparamos cotidianamente. Compreensão esta orientada na perspectiva da totalidade. Nesse sentido, com base em Barroco (2004), embora a profissão tenha em seu histórico um vínculo teórico e prático com os direitos – com destacada atenção para os direitos sociais – a discussão dos Direitos Humanos ganha maior visibilidade na década de 1990, com o último Código de Ética Profissional. Vale destacar que em 1998 comemorou-se os cinquenta anos da Declaração dos Direitos Humanas, levando a profissão a retomar as reflexões sobre a temática. Ainda segundo a referida autora, a década de 1990 passava por um momento em que os direitos historicamente conquistados estavam sendo destituídos/precarizados, conforme avançavam os processos de “globalização
  • 34. 34 neoliberal”, implementados no sentido de garantir a reprodução do capital. Segundo Barroco: Este contexto assinala a atualidade do tema e da defesa dos direitos humanos; trata-se do avanço da barbárie, em nível mundial, e da necessidade de discussão e compreensão das diferentes formas de violência e pobreza espiritual que coexistem com a miséria material, o desemprego, a exclusão social e institucional dos indivíduos sociais (2004, p.39). De acordo com a ONU (1999), o Serviço Social desde a sua criação, vem consolidando uma luta em defesa dos Direitos Humanos, levando como princípio base o valor inestimável de cada ser humano, tendo como um de seus principais objetivos a defesa da igualdade entre as classes sociais, defendendo que as pessoas possam ter segurança, e possam se desenvolver com dignidade. É o que podemos observar na definição de Serviço Social apresentada pelo CFESS: Definição: o (a) assistente social ou trabalhador (a) social atua no âmbito das relações sociais, junto a indivíduos, grupos, famílias, comunidade e movimentos sociais, desenvolvendo ações que fortaleçam sua autonomia, participação e exercício de cidadania, com vistas à mudança nas suas condições de vida. Os princípios de defesa dos direitos humanos e justiça social são elementos fundamentais para o trabalho social, com vistas à superação da desigualdade social e de situações de violência, opressão, pobreza, fome e desemprego. (2011) “Os Direitos Humanos podem ser definidos, em termos gerais, como aqueles direitos que são inerentes à nossa natureza e sem os quais não podemos viver como seres humanos” (ONU, 1999, p.19). Segundo Barroco (2006), no Código de Ética do Serviço Social ficam bem explicitados, em seus princípios fundamentais, que os assistentes sociais defendem a liberdade, a democracia, a equidade, a justiça social, empenham-se na eliminação de discriminações por questões gênero, religião, nacionalidade, opção sexual, condição física, bem como de todas as formas de preconceito. De acordo com esta mesma autora, apesar de o Serviço Social ser reconhecido como uma profissão humanista, o Código de Ética de 1993 é o primeiro a registrar um compromisso ético – político para com os direitos humanos. Ainda segundo Barroco, no cenário da sociedade burguesa, defender os direitos humanos coloca-se mais como uma frente de luta, da qual o projeto profissional é objetivado em dimensões éticas e políticas: “Éticas, porque supõem escolhas de valor dirigidas à liberdade; políticas porque buscam criar condições objetivas, no âmbito da luta pela hegemonia, para a defesa daqueles valores”. (2004, p.41).
  • 35. 35 Esta mesma autora afirma que o Serviço Social tem uma grande tradição de luta pelos Direitos Humanos. Em todos os países e continentes em que tem atuação, o Serviço Social fica caracterizado por ter compromisso ético com a dignidade humana, pelo empenho do respeito ao outro em todas as suas formas de escolhas e a procura, sempre, de eliminar preconceitos e discriminações. De acordo com o Conselho Federal de Serviço Social - CFESS: A defesa dos direitos humanos é uma luta constante contra todas as formas de violência, discriminação, opressão e exploração. Não se trata de defender os direitos como mecanismo de sobrevivência no capitalismo, mas como mediação fundamental na luta pela construção de uma nova ordem social. (CFESS) A fim de registrar o envolvimento do Serviço Social com a defesa dos Direitos Humanos, reproduzimos os princípios fundamentais que norteiam a atuação do assistente social. Destacaremos aqueles que acreditamos ter uma íntima relação com a temática trabalhada nesta investigação. Vejamos abaixo: Princípios Fundamentais Reconhecimento da liberdade como valor ético central e das demandas políticas a ela inerentes - autonomia, emancipação e plena expansão dos indivíduos sociais; Defesa intransigente dos direitos humanos e recusa do arbítrio e do autoritarismo; [...]. Posicionamento em favor da eqüidade e justiça social, que assegure universalidade de acesso aos bens e serviços relativos aos programas e políticas sociais, bem como sua gestão democrática; Empenho na eliminação de todas as formas de preconceito, incentivando o respeito à diversidade, à participação de grupos socialmente discriminados e à discussão das diferenças; (Código de ética Profissional dos Assistentes Sociais, 1993). Assim sendo, podemos perceber que o Serviço Social caminha no intuito de considerar os Direitos Humanos como um dos princípios que organiza a sua prática profissional, reafirmando, historicamente, sua posição humanitária. 2.2 SERVIÇO SOCIAL DO COMÉRCIO – SESC-SP O Serviço Social do Comércio-SESC é uma “entidade privada” mantida pelos empresários do comércio de bens e serviços. Esta entidade age no intuito de objetivar “o bem-estar e a qualidade de vida do comerciário, sua família e da sociedade”. O SESC foi fundado na década de 1940, no dia 13 de Setembro de 1946. A primeira unidade surge no bairro Engenho de Dentro, no Rio de Janeiro.
  • 36. 36 Suas principais ações eram assistência à maternidade infância e combate à tuberculose com o objetivo de diminuir os índices de mortalidade. A proposta de criação do SESC surgiu, pela primeira vez, na “Carta da Paz Social” (1946), que foi escrita por um dos primeiros presidentes do Conselho Nacional do Comércio – CNC, - o gaúcho João Daudt d'Oliveira. Na década de 1950 começam as primeiras iniciativas de atividades culturais e a “modernização do Serviço Social do Comércio”. Começam, então, a surgir os primeiros centros esportivos do SESC. A partir da década de 1980, com a renovação social que aconteceu no Brasil com a Constituição Federativa, começam então a serem lançados os primeiros projetos culturais que se instalam em âmbito Nacional. Na atualidade, existem SESC’s em todos os estados brasileiros. Suas programações são norteadas por um conceito de educação como fator determinante para a “transformação social”, com atividades voltadas para o campo da cultura, com programas específicos para o público de todas as idades e classes sociais. Em todo o Estado de São Paulo o SESC possui 32 unidades que oferecem as mais diversas atividades que vão do turismo social, aos programas específicos voltados para a terceira idade e para crianças. Ao mesmo tempo, são oferecidos programas como saúde e educação ambiental, além de ser pioneiro no programa Mesa Brasil SESC São Paulo, com o intuito de combater a fome e o desperdício de alimentos. Nesse sentido, busca desenvolver ações educativas e culturais com a intenção de aguçar a autonomia individual e valorizar as pessoas16. O SESC - SP vem desenvolvendo, nos últimos 16 anos, um trabalho humanitário em prol dos refugiados. Este trabalho teve início a partir de um “convênio” celebrado, em 05 de dezembro de 1995, entre o ACNUR, o Serviço Nacional de Aprendizagem Comercial-SENAC, a Cáritas Arquidiocesana de São Paulo e o próprio SESC.17 O SESC – Carmo tornou-se uma unidade de referência, dentre outros motivos, por estar localizado no centro da cidade de São Paulo, próximo à Praça da Sé, onde 16 17 Informações extraídas do site oficial do SESC. Referências completas na bibliografia. Naquele período, os representantes das instituições que celebraram o referido convênio eram Abram Abe Szajman (SENAC e SESC) e o Cardeal Dom Paulo Evaristo Arns (Cáritas). Além de seus diretores Luiz Francisco de Assis Salgado e Danilo Santos de Miranda, respectivamente.
  • 37. 37 também ficam situados o escritório da Cáritas18 e os albergues, que são as moradias provisórias para os solicitantes de refúgio. A unidade do Carmo torna-se ponto de encontros para o solicitante de refúgio e dos refugiados, pois estes tentam reconstruir suas vidas e suas relações sociais, buscando assim uma nova rotina, enquanto aguardam a resposta do CONARE. Além da parceria existente, entre as já citadas entidades, o SESC-Carmo não se limita apenas ao atendimento a estes sujeitos, mas tem o compromisso de esclarecer à sociedade sobre a realidade dos refugiados,através de palestras, seminários, exposições, entrevistas, entre outros, pois se sabe que a situação destes é um fenômeno mundial. Podemos constatar o acima exposto, com base em Santos : Talvez o exemplo mais bem sucedido, dentre as parcerias que a Cáritas Arquidiocesana de São Paulo estabeleceu no tangente à questão dos refugiados tenha sido com o Serviço Social do Comércio (SESC). (...) O SESC, de forma mais profunda que outras parcerias, estabeleceu o cuidado de formar seus funcionários e criar uma cultura de solidariedade ao refugiado. Os grandes objetivos ao se estabelecerem parcerias quer seja a propagação do compromisso humanitário com o refugiado, quer se trate da integração do mesmo no meio social, estão sendo, pouco a pouco, conquistados pelo SESC. (2003, p.143-144): Dados ainda não computados estimam em aproximadamente mais de dois mil solicitantes de refúgio e refugiados, recebidos pelo SESC - Carmo, provenientes das mais diversas nacionalidades. Dentre as obrigações apontadas pelo convênio, o SESC- Carmo deve disponibilizar ao refugiado, de acordo com as normas internas da unidade, o acesso às mais variadas atividades culturais, como música, teatro, atividades físicas, colocando o refugiado mais perto da cultura brasileira, contribuindo assim para sua integração local. Dentre as atividades e serviços oferecidos destacam-se: Alimentação, descontos nas refeições (almoço e jantar), acesso à rede mundial de computadores, acesso ao curso básico de português, atualmente (Módulo I), atividades culturais, recreativas e esportivas, biblioteca e áreas de convivência (Jogos, teatro, música, oficinas e etc). Os solicitantes de refúgio após conseguirem documentos básicos têm direito de realizar sua matrícula no SESC podendo, assim, utilizá-los em todas as unidades do Estado de São Paulo. 18 A Cáritas é responsável por realizar os encaminhamentos legais, além de ser responsável pela situação dos solicitantes. Como será detalhado mais adiante.
  • 38. 38 Vale destacar que o SESC e o SENAC foram condecorados pelo ACNUR no ano de 2005, pela relevância do trabalho humanitário em prol dos refugiados, e pelos 10 anos de parceria. Em 2007 ambas entidades receberam o Prêmio de Reconhecimento Solidário, entregue pelo Ministério da Justiça. 2.3 Cáritas Arquidiocesana de São Paulo – CASP A Cáritas é uma instituição da Igreja Católica Apostólica Romana, atuante em 200 países e territórios, sendo sediada em Roma, Vaticano, fundada em 1897. Segundo Barbosa e Hora (2007), a Cáritas tem destacada atuação em projetos sociais espalhados pelos cinco continentes, e é considerada o braço social da Igreja Católica. A Cáritas trabalha com organismos nacionais e internacionais, com foco na temática dos direitos humanos e tem suas ações voltadas para uma linha ecumênica. Possui o status “Consultivo Geral” entregue pelo Conselho Socioeconômico da ONU. Os autores acima referidos assim se expressam: Devido a sua intensa e reconhecida atuação, a Cáritas Internacional mantém o status de observadora junto ao Conselho Econômico e Social da ONU há mais de trinta e cinco anos e, no Brasil, é de crucial importância na questão dos refugiados (2007, p.72). Além disso, a Cáritas vem apoiando projetos de iniciativas populares de geração de trabalho e renda, denominados Programas Alternativos Comunitários (PACs). Tais projetos agem com intuito educativo, na perspectiva de que seus integrantes saiam da passividade assistencialista para a autonomia política e econômica, por intermédio de atividades que influenciem no exercício da cidadania. A Cáritas Arquidiocena de São Paulo (CASP) é parte da Rede Cáritas Internacional. É um organismo integrante da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil – CNBB, sendo criada no dia 12 de novembro de 1956. Além disso, é reconhecida juridicamente como um órgão de utilidade pública federal. Na atualidade existem quatro diretrizes institucionais com as quais a Cáritas Brasileira realiza o seu trabalho, sendo estas: defesa e promoção de direitos; incidência e controle social de políticas públicas; construção de um projeto de desenvolvimento solidário e sustentável, bem como o fortalecimento da Rede Cáritas.
  • 39. 39 De acordo com Santos (2003), a CASP começou seu trabalho com refugiados no ano de 1988, o mesmo ano em que foi promulgada a Constituição Federal do Brasil, e que foram criadas possibilidades de lutas democráticas em defesa dos direitos humanos. Ainda segundo Santos (2003), o grande interesse da Cáritas desde o início do trabalho para com os refugiados, foram os conceitos de proteção, assistência e, o principal deles, a integração. Barbosa e Hora expressam: O ACNUR sempre contou com o apoio das Cáritas Arquidiciocesanas do Rio de Janeiro e de São Paulo, mediante convênio específico, além da Comissão Pontifícia Justiça e Paz, dentro de suas três linhas mestras de atuação: proteção, assistência e integração local do refugiado no Brasil.(2007, p.72) Grifo do autor. De acordo com os autores acima referidos, o programa de proteção é realizado através de orientações e apoio jurídico, garantindo assim que os refugiados e solicitantes de refúgio tenham seus direitos assegurados com base nos acordos internacionais e na Lei brasileira nº 9747/97. O programa de assistência é voltado ao auxílio ao refugiado e suas famílias em suas necessidades essenciais como saúde, moradia, alimentação e atendimento social em geral. A integração acontece por intermédio de um programa de encaminhamentos para o curso de português, revalidação de diplomas, encaminhamento para entrevistas de empregos, formatação de currículos e, através de diversas parcerias, possibilita o acesso a cursos profissionalizantes. Atualmente é oferecido pela Cáritas São Paulo, em consequência de diversos traumas ocasionados pelas condições individuais de fuga, um programa de atendimentos psicológicos e psiquiátricos. Os programas e serviços oferecidos pela Cáritas São Paulo são realizados através de convênios entre Cáritas-ACNUR e CONARE e, também, contam com parcerias de diversas empresas SENAC/SESC/SENAI, e organizações SASECOP (Serviço da de sociedade Apoio civil Sócio dentre Educativo elas: de Capacitação e Orientação Profissional), CESPROM (Centro Scalabriniano de Promoção do Migrante), Casa de Acolhida para Mulheres, Casa do Migrante, Arsenal da Esperança, Superintendência Regional do Trabalho e Emprego do Estado de São Paulo, Secretaria Municipal de Desenvolvimento Econômico e do Trabalho, da Prefeitura de São Paulo, Instituto de Psiquiatria do Hospital das Clínicas do Estado de São Paulo, Empresa de Prestação de Serviços Nacionais e Internacionais-
  • 40. 40 EMDOC, entre outros. A população atendida pela Cáritas atualmente é de 287819 pessoas de 8120 nacionalidades diferentes. Dados extraídos de relatórios disponibilizados pela Cáritas – SP referências completas na bibliografia. 19
  • 41. 41 CAPÍTULO 3 – METODOLOGIA DA PESQUISA Segundo Gil (2010), a pesquisa é definida como o procedimento racional e sistemático que tem por finalidade trazer respostas aos objetivos que são propostos. A pesquisa se desenvolve através de conhecimentos disponíveis e a cuidadosa utilização dos métodos e técnicas de investigação científica. Consideramos pertinente usar a pesquisa qualitativa, pois, de acordo com Minayo, “[...] a abordagem qualitativa aprofunda-se no mundo dos significados das ações e das relações humanas, um lado não perceptível e não captável em equações, médias e estatísticas” (1996, p.22). Para o aprofundamento do conhecimento acerca do tema em foco, iniciamos este estudo com pesquisas bibliográficas que abordavam os assuntos referentes à problemática do refúgio, das migrações, e da proteção internacional aos refugiados. Foram utilizados livros e artigos científicos publicados por diversos pesquisadores, dentre os quais se destacam grandes estudiosos sobre o tema, tais como: Milesi (2003), Barreto (2006), Barbosa; Hora (2007), Mello (2003), Marinucci (2003), Silva (2008), Trindade (2008), Faial (2003). A revisão das obras mais utilizadas foi de extrema importância, uma vez que nos fez entender e, por conseguinte, melhor compreender a realidade do refugiado, os motivos geradores do refúgio e consequentemente quem de fato pode ser considerado refugiado, segundo a Lei Federal 9.474/97. Foi necessária a consulta de documentos tais como a Convenção de 1951, relativa ao Estatuto dos Refugiados, o Protocolo de 1967, da Declaração Universal dos Direitos Humanos bem como da Declaração de Cartagena de 1984. Subsequentemente pesquisamos algumas instituições que fazem o atendimento ao solicitante de refúgio e ao refugiado na cidade de São Paulo. Estudamos os serviços oferecidos por estas instituições, em prol da proteção ao refugiado no Brasil. Portanto, esta fase do trabalho nos deu subsídios para que conhecêssemos a proteção e os serviços que se voltam ao atendimento dos direitos dos refugiados. Posteriormente à pesquisa bibliográfica e documental, procedemos ao estudo da realidade do refugiado no sentido de dar confirmação empírica a esta investigação. De acordo com Martinelli (1999): Cada pesquisa é única, pois se o sujeito é singular, conhecê-lo significa ouvi-lo, escutá-lo, permiti-lhe que se revele. E onde o sujeito se revela? No discurso e na ação. Assim, se a pesquisa pretende ser qualitativa e
  • 42. 42 pretende conhecer o sujeito, precisa ir exatamente ao sujeito, ao contexto em que vive sua vida. (p. 22). O estudo da realidade foi construído utilizando-se como técnica a entrevista focalizada. Trata-se de uma modalidade de entrevista que permite ao entrevistado falar livremente sobre o tema em foco, porém, se este desviar do assunto cabe ao pesquisador fazer a sua retomada. Segundo Gil (2008), esta técnica é bastante utilizada em grupos de pessoas, no caso os sujeitos dessa pesquisa que passaram por alguma situação semelhante, tais como “assistir a um filme” ou, presenciar algum tipo de catástrofe. Além disso, de acordo com Gil, a entrevista é uma técnica em que o investigador apresenta – se ao investigado face a face com o objetivo de lhe fazer perguntas e obter dados que interessem à investigação. Segundo o referido autor: “A entrevista é, portanto, uma forma de interação social. Mais especificamente, é uma forma de diálogo assimétrico, em que uma das partes busca coletar dados e a outra se apresenta como fonte de informação” (2008, p. 109). Assim sendo, é uma técnica muito utilizada por diversos profissionais inclusive das ciências humanas tais como; psicólogos, assistentes sociais, cientistas sociais. Conforme Gil (2008), “[...] praticamente todos os outros profissionais que tratam de problemas humanos” utilizam-se desta técnica. Quanto aos sujeitos entrevistados, usamos como critério para a seleção da amostra, visando a coleta de dados, os seguintes sujeitos: solicitantes de refúgio e refugiados, participantes ou que participaram do curso de português oferecido pelo SESC - Carmo entre o período de 2000 a 2012, de diferentes nacionalidades. Consideramos também aspectos como: facilidade de comunicação, tendo em vista que não conhecem bem o idioma português e a disposição do refugiado em falar sobre sua realidade no país que o acolheu e avaliar os serviços aqui oferecidos. Para coleta de dados, utilizamos um roteiro de entrevista previamente elaborado, contendo perguntas abertas, possibilitando ao entrevistado falar livremente. Salientamos que as entrevistas foram gravadas, com autorização dos entrevistados, que contribuíram de forma muito significativa para o estudo. O contato com os sujeitos da pesquisa se deu no ambiente em que fazemos estágio qual seja, o SESC – Carmo. As entrevistas foram realizadas nesta mesma unidade. Utilizamos para aplicação das entrevistas a sala do curso de português com a autorização da coordenadora técnica da unidade.
  • 43. 43 3.1 Apresentação dos sujeitos da pesquisa “O refugiado deixa sua casa, deixa seu bairro, sua aldeia. Deixa tudo o que o envolve como um manto protetor. Seus sons, seus odores, o tom da cor de suas paisagens, os gritos das crianças brincando, os pássaros no amanhecer. O galo sempre tão presente em suas madrugadas. Tudo isto desaparece. De repente encontrase desprotegido em um ambiente desconhecido e aquilo que o protegia já não existe mais. Foge para salvar sua vida, e a de seus filhos. (...) Este é o reflexo da fuga, o espelho do abandono”. (Luis Varese - Representante do ACNUR) SUJEITO 1: Nacionalidade: Paquistanês Idade: 30 anos Escolaridade: Sup. Completo- Pós em língua Inglesa Inc. Profissão: Administrador Gráfico em designer Religião: Islã Sexo: Masculino Estado civil: Solteiro Dependentes: Não Tempo no Brasil: 1 ano e 4 meses. Status: Solicitante de refúgio SUJEITO: 2 Nacionalidade: Angolano Idade: 33 anos Escolaridade: Técnico Profissão: Técnico em engenharia eletricista Religião: Católico Sexo: Masculino Estado Civil: Solteiro Dependentes: sim Tempo no Brasil: 8 meses
  • 44. 44 Status: Solicitante de refúgio SUJEITO 3 Nacionalidade: Colombiano Idade: 53 Escolaridade: Superior Profissão: Jornalista Religião: Não tem Sexo: Masculino Estado Civil: Separado Dependentes: 4 filhos Tempo no Brasil: 10 anos Status: refugiado SUJEITO 4 Nacionalidade: Congolesa Idade: 20 anos Escolaridade: Superior Incompleto Profissão: Estudante Religião: Católica Sexo: Feminino Estado Civil: Solteira Dependentes: Não Tempo no Brasil: 2 meses Status: Solicitante de refúgio Para melhor compreensão dos dados levantados, o roteiro de perguntas está disponível no apêndice A, e a fala dos entrevistados no apêndice B. 3.2 Análise dos dados Com base em relatos extraídos das entrevistas bem como amparados em contribuições teóricas, objetivamos reafirmar (ou não) algumas hipóteses apresentadas na introdução, bem como dar respostas a alguns questionamentos e
  • 45. 45 indagações que nos acompanharam na construção do presente trabalho. Em relação às indagações, destacamos: O refugiado é um individuo que é obrigado a sair de seu país se quiser salvar sua vida? Quais os motivos geradores do refúgio? Quem é o refugiado? Por falta de informação os refugiados são confundidos com migrantes econômicos? Dentre outras. Quando perguntados sobre como avaliam sua condição de refugiado, tanto do ponto de vista pessoal bem como em relação à sociedade que os acolheu, a maioria dos entrevistados assim se expressam: “Na minha vida é a primeira vez que eu sou refugiado”. “O refugiado é uma pessoa que saiu do país dele, por problemas na política, problemas sociais, problemas da vida”. “Ele vem para fugir daquela situação do país dele e vai para outros países. “Quando a pessoa deixou o país dele fugindo (...), significa que ele vem com esperança de outro país proteger, guardar e cuidar para ele, ajudar ele até o dia que o problema que ele fugiu do país dele acabe (...).” Sujeito 1 “Não muito bom, eu acho que não muito bom”. “Porque eles pensam que..., muitas pessoas me falou direto que é nosso dinheiro [do Brasil] que ele está gastando para essas pessoas de fora do Brasil” (...). “Para mim é um pouquinho diferente por causa do Paquistão, porque eles pensam sobre Osama Biladen essa coisa que tem guerras, só coisas ruins, por isso que aqui essas pessoas aqui do Afeganistão, do Paquistão, Índia, não muito bom. Por isso não tem tratamento bom.” Sujeito 2 “Chegamos nessa condição porque precisávamos salvar a vida, porque precisávamos proteger a família, porque precisávamos sobreviver, e não era por necessariamente questões financeiras, não era por esporte, não era por aventura, não era por turismo”. “Geralmente a população relaciona a imagem do refugiado com os pobres, então num país que tem 200 milhões de pessoas e tem somente 4.500 refugiados é muito fácil diluir isso, e as pessoas falam ‘ah, mas temos aqui milhões de pessoas pobres, ’ e para pensar em dois, três mil, quatro mil, isso é brincadeira, isso são massas que se juntam a essa multidão de pessoas
  • 46. 46 carentes, mas não tem nada a ver com isso, tem a ver com aspectos de coisas valiosas para a humanidade (...)”. Sujeito 3 Assim sendo, podemos perceber através desses trechos retirados das falas dos entrevistados, que o refugiado é obrigado a fugir por diversas circunstâncias que provocam variadas violações de direitos. Para Leão (2011), as pessoas são forçadas a fugir de seus países de origem para salvaguardarem sua própria segurança, dignidade e integridade, bem como de suas próprias famílias, vivendo assim um percurso de violações. Ainda com base no referido autor: As pessoas que viajam dessa maneira constantemente expõem suas vidas ao risco, são obrigadas a viajar em condições inumanas, tornando-se prezas fáceis da exploração e do abuso. Especificamente com relação aos refugiados e aos solicitantes de refúgio, estes apenas conformam uma pequena e relativa porção dos movimentos mundiais de pessoas, frequentemente transladando-se de um país ou de um continente ao outro. (p.85) Pudemos perceber, baseados em nossa revisão da literatura específica, que a legislação brasileira (especificamente a Lei 9.474 de 1997) é referência mundial no acolhimento/atendimento ao refugiado. Nesse sentido, quando perguntados sobre as suas expectativas (o que espera ou esperava) no que se refere ao acolhimento, os entrevistados assim se expressam: “O Brasil fala que vai acolher/apoiar a pessoa, mas quando a pessoa chega, quando a pessoa foi lá na Cáritas, conforme que ele escutou, o grande país como o Brasil uma coisa que ele vai acontecer aqui”. “A assistência social não está fazendo nada, não ta cuidando dos refugiados”. “Os refugiados estão como pessoas que os pais deles morreram, ele ta abandonado, procura toda tua vida sozinho”. “Você espera o dia que o protocolo vai sair, agora protocolo 4 meses imagine, a pessoa não tem pai não tem mãe não tem casa, vai comer como?” Sujeito 1 “O refugiado aqui no Brasil fica como tipo uma pessoa que não tem família, não tem pai, não tem mãe não tem nada”. “Eles são assim como uma coisa que não tem valor (...).” Sujeito 1
  • 47. 47 “Aqui nada é fácil”. “Quando você pensa sobre RNE mais difícil”. Às vezes quando eu encontrei com muitas pessoas aqui de fora do Brasil, que agora tem RNE, às vezes eles, dois três pessoas me falou que depois de seis meses ele consegue pegar RNE, três, quatro pessoas me falou que depois de dois anos para RNE, dois anos para RNE, de novo, de novo, de novo, para entrevista com advogado.” Sujeito 2 “Agora para falar da Lei eu penso que é referência no papel, que é quando se cria um marco legal muito bonito” “Eu sempre afirmo que nestes dois primeiros marcos, do Direito Internacional Humanitário, e nos Direitos dos refugiados, o Brasil funciona perfeito, o problema está no terceiro marco, que já é responsabilidade local, é responsabilidade de onde as pessoas chegam, então teria a ver com o Estado de São Paulo, com a cidade de São Paulo, com as autoridades locais, com o olhar que localmente se der ao refugiado, e aí se está falhando”. Sujeito 3 “Eu penso que quando você falou que a Lei é referência aqui, é muito relativo, penso que tem países que tem menos discurso, menos leis, menos fantasias legais, e fazem um trabalho muito mais técnico, mais humanitário, mais enquadrado, em elementos de justiça mesmo”. “Aqui tem 4.500 [refugiados] para uma população de um país de 200 milhões de pessoas, e tem pessoas que levam mais de um ano esperando, e ainda não se define a situação deles, ou seja, é muito relativo isso”. Sujeito 3 De acordo com a fala dos sujeitos pesquisados, podemos perceber que ainda há muito a ser realizado pelos refugiados em São Paulo. Baseados em Pinto (2011), pode-se afirmar que os refugiados no Brasil sofrem as mesmas limitações que afetam os brasileiros. Esta autora afirma que esse fenômeno só poderá ser resolvido com a melhora das condições sociais e econômicas vigentes no país. Assim, pode-se inferir que esse quadro não difere muito quando se relaciona as expectativas dos refugiados frente aos serviços oferecidos, de modo geral, pelas instituições Arquidiocesanas de São Paulo e o SESC.
  • 48. 48 “(...) segunda coisa vou falar sobre os refugiados, os países como o Brasil não tem problemas com refugiados”. “O problema, mais, maior, grande, está no Cáritas. Cáritas está a cuidar muito mal dos refugiados”. “O refugiado não recebe nada como sobreviver, não recebe nada, ele vive a vida sozinho, ele vive sozinho”. “Você vai esperar o apoio do Cáritas até o dia que o Cáritas vai aceitar tua explicação, ou teu documento que você entrar no Cáritas”. “Se faz um ano, você também vai esperar um ano, sem nada, sem ajuda, sem nenhuma coisa que sai da mão do Cáritas para mão do refugiado”. Sujeito 1 “O SESC acho que tem muitas coisas melhor”. “Cáritas também, mas Cáritas precisa mais pessoas para trabalhar em Cáritas, só uma Dona Maria para atender refugiados”. Sujeito 2 “Quando chegamos, num país como o Brasil, não estamos chegando para pedir esmolas, não estamos chegando pra (...) como coitados, estamos chegando como dizendo, não dá para morar mais no espaço que me corresponde dentro de uma sociedade e, para garantir a vida e a sobrevivência da família, a própria, eu preciso de um apoio”. “Apoio que basicamente são oportunidades, quando quem recebe está pensando em caridade, boa vontade”. “Geralmente o que pensam é oferecer um prato de comida, uma coisa de assistência básica, que é necessária na maioria dos casos. Não estou dizendo que não, mas que não pode só limitar-se a isso”. “Oportunidade é o reconhecimento de que quem chega é também um sujeito, é autor da sua própria história, e tem potencialidades, tem possibilidade de crescer.” Sujeito 3 Cabe destacarmos, a partir da fala acima, que dos 4 entrevistados, 3 possuem curso Superior. De acordo com Morelli (2011), dados demonstram que em São Paulo 10% dos refugiados possuem curso superior. Isto está ligado diretamente
  • 49. 49 com o aspecto de oportunidades, referido pelo sujeito da pesquisa. Nesse sentido, afirmamos a dificuldade e frustração de quem busca o refúgio. Muitos são profissionais especializados, com ricas bagagens em suas experiências profissionais, e que se sentem tendo que recomeçar do zero, ou seja, como se seus estudos e suas experiências não valessem nada no Brasil. “O Brasil não pode deixar essa responsabilidade toda na mão da Cáritas”. “Se o Brasil falou assim: vou deixar tudo na mão do Cáritas, Cáritas não aguentar isso, não vai conseguir fazer nada, para muita gente (...)”. Sujeito 1 Cabe aqui uma ressalva. A responsabilidade da acolhida de refugiados em São Paulo não é apenas da Cáritas. O acolhimento segue um modelo tripartite: o CONARE representando o Governo Federal; o ACNUR, representando as Organizações das Nações Unidas e a Cáritas, representando a sociedade civil. Por falta de acesso às informações, por vezes, o refugiado pode pensar que a responsabilidade de sua acolhida está apenas nas mãos da Cáritas. “Aqui também no SESC... Cáritas dá um papel para comer no SESC. Cartãozinho para comer no SESC, mas Cáritas não dá dinheiro para gente comer no SESC, e se você não trabalha, mesmo R$ 2,00, você vai pegar dinheiro aonde para comer no SESC?” Sujeito 1 “Quando cheguei eu estava com problema da vista, cheguei aqui, passou um mês, dois meses, eu comecei a sofrer mais aquela dor, eu fiquei uma semana na Casa do Migrante não saia para nada, não conseguia andar não conseguia sair, então eu fui lá, esse exemplo é para mim, eu fui lá na Cáritas, Cáritas me fala só ‘então você já recebeu o protocolo?’ “. “Ele constou no registro que eu não recebi protocolo, ela falou ‘não, a Cáritas não pode ajudar porque você ainda não recebeu o protocolo’”. “Eu faço uma pergunta para você, se a pessoa cair lá e morrer, como ele não tem protocolo a Cáritas não vai fazer nada me explica aí, o Cáritas não vai fazer nada vai deixar aquela pessoa morrer mesmo assim, eu estava bem doente, a Cáritas não fez nada (...)”. Sujeito 1
  • 50. 50 “Recebi colaboração da Cáritas e do SESC por que quando eu cheguei eu não falava nada de português, só ouvi as palavras que parecem em francês, e agora estou aqui aprendi muito coisa entendeu?”. “Acho que é bom, mas vai ser melhor depois de um tempo, para aprender a língua um mês dois meses não é suficiente”. “Por que mesmo lá no livro a professora falou que tem muitas coisas que não vamos estudar, por que não vai ter tempo (...)”. Sujeito 4 “(...) a grande falha para mim é colocar nas mãos de instituições ‘igreja’, neste caso a Igreja Católica, todo o contrato de acolhida do refugiado”. “Eu nego porque a Igreja não sabe fazer isso”. “A Igreja sabe fazer obra de caridade, a Igreja sabe fazer obra de boa vontade, a Igreja sabe fazer (...) a Igreja sabe enganar fiéis”. “A Igreja não sabe de humanitarismo”. “E mais, na doutrina da Igreja o humanitarismo vai contra a fé”. “E essas coisas [o atendimento] devem enquadrar-se em um marco legal, o marco de direito, é o humanitarismo que é lei, ou seja, é um marco de direito, a fé não é marco de direito.” Sujeito 3 Devemos ter em mente que a fala acima reflete as impressões pessoais do sujeito entrevistado. No entanto, cabe observar que algumas ações institucionais denotam uma visão assistencialista, deixando de reconhecer os refugiados como sujeitos de direito, Nesse sentido, são negados princípios fundamentais expressos no Código de Ética Profissional, tais como: autonomia, plena expansão dos indivíduos sociais, ampliação e consolidação da cidadania. As práticas assistencialistas, caritativas e conservadoras são visões ultrapassadas do Serviço Social, porém sabemos que é um desafio constante e incansável romper com essa identidade que foi, por muitos anos, atribuída ao Serviço Social. Assim sendo, é necessário sempre que os profissionais estejam embasados no atual Projeto Ético Político Profissional, bem como no conjunto de conhecimentos teóricos e metodológicos para a intervenção profissional. Segundo Vedovato (2011), a proteção internacional aos refugiados nasceu do desejo de proporcionar ajuda humanitária a determinadas populações em
  • 51. 51 sofrimento. Entretanto, mesmo após muitos anos desde a sua estruturação, o sistema vigente na atualidade, se esforça para alcançar tal meta. Ainda segundo o referido autor, a proteção internacional dos refugiados conta com dois componentes fundamentais: “os acordos internacionais sobre o tema, no campo do direito,” e o ACNUR, que é caracterizado como a principal instituição internacional responsável de responder as expectativas e os anseios dos refugiados. Vedovato, afirma ainda que “o sistema não reflete as realidades encontradas no cotidiano dos refugiados, os quais enfrentam problemas reais que colocam em dúvida a eficiência da estrutura” (p.289). “(...) você não imagina como são tratadas as famílias, inclusive em albergues, albergues que não são parte do sistema de acolhida, porque são como terceirizações de quem já tem o contrato com o ACNUR”. “Então isso, manejar isso através de terceirizações é uma estratégia muito boa, para criar desordem, criar confusão, e no meio da desordem e da confusão, podem fazer muitas coisas erradas (...)”. Sujeito 3 “Trabalho tem muito, aqui tem oportunidade, para brasileiro, também para estrangeiros”. “Mas eu senti muita dificuldade por causa da língua, muitos lugares que quando eu fui eu pensei essa vaga é para mim, eu fui para entrevista, mas ele me falou que você não fala muito bem português.” Sujeito 1 “Eu e minha irmã queremos ficar bem aqui no Brasil”. “A gente tem vontade de estudar, primeiramente falar bem português”. “Aqui não temos diploma de ensino médio, a gente tem obrigação de fazer a escola de novo para tirar o diploma e entrar na universidade”. “A gente quer estudar por que estamos aqui para procurar uma nova vida para esquecer muita coisa na cabeça e para esperar a resposta de Deus para ver se a gente vai encontrar tudo o que agente perdeu no nosso país”. Sujeito 4 Muitos refugiados deixam para trás não só seus pertences pessoais como também documentos (tais como, diploma, comprovantes de escolaridades, ou qualquer outro documento). Isto ocorre porque em alguns casos a fuga diante do
  • 52. 52 conflito se dá de forma muito violenta, restando tempo apenas para salvar a própria vida. A fala da entrevistada acima nos remete refletir sobre a situação dos refugiados, e o que de fato eles buscam no país de acolhimento. Oportunidade de reconstruir uma nova vida, oportunidade de ser protagonista de sua própria história, oportunidade de ser um ser humano e de ter dignidade. É preciso ter clareza que os refugiados são vítimas de conflitos e não produtos deles. De acordo com Haydu (2011), os solicitantes de refúgio e refugiados encontram muitas dificuldades para conseguir emprego, bem como grandes dificuldades de acesso a serviços públicos básicos com saúde e moradia. Ainda segundo Haydu, por vezes, sentem-se discriminados pela sociedade, por faltarem campanhas consistentes de humanização e informação com a relação a causa dos deslocamentos forçados. Não raramente os refugiados são confundidos como fugitivos da justiça, dificultando ainda mais seu ingresso no mercado de trabalho. Segundo Vedovato (2011), é possível através de casos/ histórias do cotidiano do refugiado, identificar a diferença no Brasil, “entre o direito declarado e a realidade do refugiado em nosso território”, ou seja, direito declarado e direito alcançado.