SlideShare una empresa de Scribd logo
1 de 60
Descargar para leer sin conexión
Caderno de Conservação e Restauro de Obras de

Arte Popular Brasileira
UNESCO

Representação da UNESCO no Brasil
Representante
Vincent Defourny

Coordenação para a área de Cultura
Coordenadora
Jurema Machado




Museu Casa do Pontal

Diretora-presidente
Angela Mascelani

Vice-presidente
Jacqueline Van de Beuque

Patrocínio Institucional
Ministério da Cultura
BNDES
Petrobras
Light

Parceria Institucional
IPHAN / Departamento de Museus e Centros Culturais




Museu Casa do Pontal
Estrada do Pontal, nº 3295, Recreio dos Bandeirantes
Rio de Janeiro – RJ – Brasil – CEP: 22785-580
Tel/fax: (55) (21) 2490-3278 2490-4013
institucional@museucasadopontal.com.br
www.museucasadopontal.com.br
www.popular.art.br
Caderno de Conservação e Restauro de Obras de

Arte Popular Brasileira
                    ______
                    1a edição




              Rio de janeiro | 2008
Caderno de Conservação e Restauro de Obras de Arte Popular Brasileira
© Associação de Amigos da Arte Popular Brasileira - Museu Casa do Pontal / Unesco




Coordenação
Museu Casa do Pontal                                                   Documentação fotográfica
                                                                       Lucas Van de Beuque
Pesquisa e textos
Ana Gabriela Dickstein                                                 Revisão de conteúdos
Angela Mascelani                                                       Simone Mesquita
Joana Ortigão Corrêa
Moana Van de Beuque                                                    Revisão de textos
Sergio dos Santos                                                      Sergio Lamarão
                                                                       Elisa Rosa
Produção Editorial
Ana Gabriela Dickstein                                                 Projeto gráfico
Joana Ortigão Corrêa                                                   Clarice Soter
                                                                       Eneida Déchery
Consultoria
Ione H. Pereira Couto                                                  Agradecimentos
                                                                       COPPE/UFRJ, CECOR/UFMG, Museu Nacional/UFRJ,
Procedimentos museológicos                                             Museu de Folclore Edison Carneiro, Museu Histórico
Sergio dos Santos                                                      Nacional, Museu do Índio e Museu da Chácara do Céu.




                              Caderno de Conservação e Restauro de Obras de Arte Popular Brasileira /
                              Museu Casa do Pontal. Rio de Janeiro: Associação dos Amigos da Arte Popular
                              Brasileira; Brasília: UNESCO, 2008
                                  60 pp. ; 19,5 x 26,8 cm
                                  ISBN 978-85-60346-01-1
                                  1. Museologia. 2. Conservação e Restauro. 3. Arte Popular Brasileira.
                                  I. Museu Casa do Pontal. II. UNESCO




Este caderno foi produzido no Contexto de Cooperação UNESCO / Associação dos Amigos da Arte Popular Brasileira – Museu Casa
do Pontal, Projeto “Caderno de Conservação e Restauro de Obras de Arte Popular Brasileira”, contrato nº CLT05999/2006. As opi-
niões aqui expressas são de responsabilidade dos autores e não refletem necessariamente a visão da UNESCO sobre o assunto.
07   Abertura | UNESCO - Vincent Defourny
09   Abertura | Museu Casa do Pontal - Angela Mascelani
13   O diálogo com os parceiros:
     implantação de uma política de conservação participativa - Ione H. Pereira Couto

19   I. Considerações sobre conservação e restauro na arte popular brasileira
19   1. As múltiplas interfaces dos processos de conservação e restauro
22   2. Documentação de acervos
24   3. Conservação preventiva
27   4. Conservação e restauro

31   II. Procedimentos básicos de conservação e restauro
31   1. Procedimentos iniciais
32   2. Limpeza
32   2.1. A seco	
32   2.2. Em meio aquoso
33   2.3. Com solvente
33   2.4. Com tolueno
34   3. Imunização
34   4. Restauração de partes danificadas
35   4.1. Colagem de partes que se quebram ou se descolam 			
     sem comprometer a sustentação
35   4.2. Colagem de partes em que houve fragmentação
35   4.3. Recuperação da sustentação
36   4.4. Recomposição estética
37   4.5. Recuperação da estrutura
38   4.6. Faceamento

39   III. Conservação e restauro em obras do acervo do Museu Casa do Pontal
40   1. Lavadeira, de Zé Caboclo
42   2. Casal com bebê, de Noemisa
44   3. Eletricista Trabalhando, de Luiz Antonio
46   4. Aguadeiro, de Domingos
48   5. Cidade baixa com dois grandes prédios, de Dadinho
50   6. Lampião e Maria Bonita, de Manuel Graciano
52   7. Escravidão, de Saúba
54   8. Serra Pelada, de Adalton

56   Bibliografia consultada
Obra de Mestre Vitalino, Alto do Moura, PE – acervo Museu Casa do Pontal / Fotógrafo: Rômulo Fialdini
Abertura | UNESCO
     Assim como o conhecimento transcende, cada vez mais, as fronteiras das especialidades, o desafio
atual da UNESCO tem sido tratar de maneira articulada e complementar seus programas e instrumentos
normativos na área da Cultura. E nesse ambiente de interdisciplinaridade, os Museus são vistos como
um espaço-síntese para um enfoque integrado do patrimônio e da diversidade cultural, uma vez que re-
presentam, por excelência, espaços educadores para a compreensão mútua e a coesão social. Com base
nesses pressupostos, a UNESCO tem optado por focalizar sua ação na área de Museus nos países menos
desenvolvidos, nas regiões de conflito e nas coleções mais significativas para a compreensão integrada
do patrimônio e sua potencial contribuição para o desenvolvimento econômico, social e humano.
     Elemento central dessa estratégia é a construção de programas de formação para profissionais que
atuam nos mais diversos contextos, muitos deles demandados a gerir ou a agir diretamente sobre temas que
requerem uma vasta gama de áreas de conhecimento e de habilidades, desde a promoção de programas
educativos, até a conservação preventiva e a segurança das coleções. Por essa razão, os programas de
formação promovidos ou apoiados pela UNESCO têm privilegiado as técnicas simples e eficazes para a sal-
vaguarda das obras, produzido material pedagógico e reforçado as redes de profissionais e de associações.
     A contribuição da UNESCO ao Museu Casa do Pontal para a sistematização e difusão do seu
conhecimento sobre conservação de sua coleção de arte popular alinha-se perfeitamente com as
preocupações e prioridades que descrevemos.
     O Museu reúne um conjunto de práticas exemplares, a começar pela origem da coleção, resultado do
rigor e da persistência de anos de um particular, situação ainda tão rara no Brasil. Jacques Van de Beuque
reuniu, e hoje estão disponíveis ao público, peças de arte popular de todo o país, objetos até então condena-
dos à efemeridade, não apenas pelo seu suporte físico, mas por não serem considerados arte, menos ainda
merecedores de tratamento museológico. Essa origem se relaciona diretamente com a vocação do Museu
do Pontal para as parcerias, para o trabalho integrado com a comunidade e para a educação.
     Por utilizarem os materiais que se tem à mão, sobretudo o barro e a madeira, ou outros ainda mais
frágeis e diversos, como a areia, palha, contas, tecidos, latões, penas de aves, e, ainda, por não terem sido
produzidos com a intenção consciente de perenidade, os objetos de arte popular desafiam as técnicas de
conservação. Somente o enfrentamento cotidiano de uma variedade de situações concretas poderia dar sub-
sídio a um mínimo de generalização, se não de técnicas, pelo menos de critérios que possam ser transporta-
dos para outras situações. Esse é o resultado imediato que almejamos ter alcançado com esse caderno.
     Mas, além de um manual que possa ser disseminado entre os museus com vistas à conservação de
coleções análogas, pretende-se um pouco mais.
     É importante estimular a conservação de acervos existentes, não disponibilizados ou precariamente
disponibilizados ao público, valorizando e ampliando o acesso à produção de arte popular em um país
tão vasto e diverso como o Brasil. Segundo Angela Mascelani, diretora do Museu Casa do Pontal, essa
produção que “apresenta os principais temas da vida social e do imaginário - seja por meio da criação de
seres fantásticos ou de simples cenas do cotidiano - numa linguagem em que o bom humor, a perspicácia
e a determinação têm lugar de destaque. (...) tem um “forte poder de comunicação, que ultrapassa as
fronteiras de estilos de vida, situação socioeconômica e visão de mundo, interessando a todos de maneira
indistinta.” Além do seu valor em si, pode desempenhar um papel importante na valorização das práticas,
dos conhecimentos e das visões de mundo de parcela da população cujas expressões são pouco ou nada
visíveis, apartada dos museus e das oportunidades de trocas culturais mais justas e equilibradas.

                                                                                     Vincent Defourny
                                                                    Representante da UNESCO no Brasil
Obra de de Manuel Galdino, Alto do Moura, PE – acervo Museu Casa do Pontal / Fotógrafo: Aníbal Sciarretta
Abertura | Museu Casa do Pontal
    O Museu Casa do Pontal é considerado            des de pesquisa, educação, preservação e di-
atualmente o maior e mais significativo mu-         vulgação. Dessa forma, a instituição construiu
seu de arte popular do país. Está instalado em      alicerces que permitem que o acervo seja so-
um sítio de 12.000 m² localizado no bairro do       cialmente protegido e amplamente usufruído.
Recreio dos Bandeirantes, na Zona Oeste da          Em 1991, parte significativa da coleção e da
cidade do Rio de Janeiro, a poucos metros do        edificação foram tombadas pelo Conselho de
mar. Seus amplos jardins foram especialmente        Defesa do Patrimônio Artístico e Cultural do
desenhados para promover a integração entre         Rio de Janeiro. O Museu já promoveu mais de
a vegetação, as galerias do museu e a reserva       quarenta exposições no Brasil e em 13 diferen-
ecológica que se estende em torno.                  tes países. Desde 1996, desenvolve um Pro-
    Seu acervo, resultado de 40 anos de pes-        grama Educacional e Social que, em 12 anos
quisas e viagens por todo país do designer          de atuação, já atendeu a mais de cento e cin-
francês Jacques Van de Beuque, é composto           qüenta mil participantes por meio de visitas
por oito mil obras, feitas por mais de duzen-       teatralizadas, exposições itinerantes e capa-
tos artistas brasileiros e produzidas a partir de   citação de educadores e gestores de projetos
meados do século XX. A exposição permanen-          sócio-culturais. A partir de 2006, a instituição
te exibe, em seus 1.500 m² de galerias, cerca       ampliou o leque de atividades culturais, ofe-
de 4.500 obras organizadas tematicamente. A         recendo, com maior regularidade, seminários,
mostra abrange conteúdos relativos às ativi-        oficinas e espetáculos.
dades cotidianas, festivas, imaginárias e reli-          A atuação do Museu Casa do Pontal em
giosas, com obras representativas de variadas       prol da divulgação e da democratização do
culturas rurais e urbanas do Brasil.                acesso à arte popular brasileira rendeu-lhe
    A missão do Museu é trabalhar pela me-          diversas premiações. Em 1996, recebeu o
mória, pelo reconhecimento e pela valorização       Prêmio Rodrigo Melo Franco de Andrade, con-
da arte popular do país, promovendo ativida-        cedido pelo Instituto do Patrimônio Histórico
e Artístico Nacional, por sua ação a favor da      conta desses ou de outros métodos de limpeza.
preservação histórica e artística do acervo. Em         O que importa ressaltar é que houve um
2000, foi agraciado com o Prêmio D. Sebastião      “processo”, tumultuado e negociado, através
de Cultura outorgado pela Arquidiocese do Rio      do qual as próprias pessoas da família – além
de Janeiro. Em 2005, o Museu foi condecora-        dos empregados, e seguramente, o coleciona-
do com a Ordem do Mérito Cultural, principal       dor – aprenderam a lidar com os objetos. Por
comenda de caráter nacional que é oferecida        se tratar de um gênero novo, suas regras de
pelo governo federal e o Ministério da Cultura a   conservação foram aparecendo à medida que
pessoas e instituições com relevantes serviços     a própria coleção avançava e se instituía en-
prestados à cultura. Em 2006, a Assembléia         quanto tal. Isso também mostra que havia uma
Legislativa do Estado do Rio de Janeiro ofertou    técnica a ser aprendida.
à instituição a Medalha Tiradentes.                     O período de profissionalização da coleção
    É importante não perder de vista que essa      – quando ela muda de grandeza e estatuto,
atuação é o resultado de um processo no qual       passando de uma ordem simbólica à outra –
está implícita a disposição permanente para        inaugura um outro momento, no qual o acervo
a aprendizagem. Este caderno é fruto, exata-       torna-se público e novas formas de tratamento
mente, da longa trajetória do museu em prol da     se impõem.
conservação e preservação de seu acervo.                A especificidade e a variedade das maté-
    Um dia, essa coleção foi pequena. Cabia        rias-primas, presentes no conjunto total das
no espaço de uma pequena sala, mas, mesmo          obras, fizeram com que o Museu aprimorasse
assim, teve que receber cuidados especiais         técnicas e sistematizasse suas práticas.
para chegar até nós hoje. Recuperar alguns              Contudo, nem sempre é fácil falar sobre
dados acerca da história da formação dessa         a construção de certos conhecimentos que
coleção pode ter uma dimensão didática im-         passam ao largo da escolaridade formal e
portante. Iniciada como uma coleção privada        da vida acadêmica. Quando Jacques Van de
em 1952, as obras começaram a ser acumu-           Beuque criou este acervo, ele o fez, em parte,
ladas, sem muita reflexão, como parte de um        maravilhado com a destreza, a capacidade e
projeto de ordem íntima. Integrante do universo    a fluidez dos artesãos e artistas na feitura de
essencialmente doméstico, os objetos ainda         obras sobre os mais variados temas e formas.
transitavam um pouco ingenuamente pelos            Ele estabeleceu uma relação de identidade
cômodos da casa, sem um lugar determinado.         com os artistas populares e também assumiu,
Os cuidados que eles recebiam também eram          sem nenhum constrangimento, que não dese-
muito simples e visavam, sobretudo, evitar o       java teorizar sobre o assunto: apenas compra-
acúmulo de poeira.                                 va as obras que o instigavam, deixando sua
    Qualquer pessoa que tenha tido objetos         imaginação fluir em consonância com o que
desse gênero em casa, especialmente as ce-         concebia como sendo a própria essência desse
râmicas, pode testemunhar o quanto é difícil       fazer. A construção do acervo uniu-se à cons-
mantê-las “inteiras” por longo tempo. No caso      trução de sua própria vida. Assim, Jacques
em questão, as regras sobre a conservação das      olhou para si e para os artistas e, desse modo,
esculturas e modelagens foram sendo “desco-        cuidou para que esse acervo chegasse íntegro
bertas” através da prática. Ou seja, é provável    aos dias atuais.
que os objetos tenham passado por uma limpe-            Pode parecer paradoxal que Jacques Van
za geral em algum momento, assim como é pos-       de Beuque não fosse um homem de museus.
sível que muitas peças tenham se quebrado por      Não havia trabalhado em um, nem havia es-


                                  10
tudado na universidade para isso. A coleção        grando exposições itinerantes e na exposição
se deu a partir de seu investimento afetivo, de    permanente. Além disso, com o passar do
seu “apaixonamento” pela arte popular, de seu      tempo, aparecem os desgastes maiores, tanto
interesse em produzir algo que viesse a suprir     para o próprio acervo como para a edificação
uma lacuna na sociedade, de sua obstinação         que o abriga, para os jardins e para as áreas
em aprender de maneira autodidata. Contudo,        sombreadas. Até o aumento de público impli-
embora não tenha estudado museologia, fre-         ca em tempo maior de luzes acesas sobre as
qüentava museus e especializou-se nesse mé-        obras e em providências a serem tomadas no
tier durante a vida por meio de sua profissão de   sentido de minimizar sua deterioração.
designer de exposições.                                 As técnicas de vanguarda existem, mas
     Reunindo sua curiosidade intelectual, sua     também é sabido que os recursos para ma-
capacidade analítica, seu interesse pela siste-    nutenção de acervos não são abundantes.
matização, colocou-os, todos, a trabalhar para     Portanto, é necessário contar com o trabalho
a consecução de seu objetivo: criar um acervo      de pessoas habilidosas, que colaborem com a
e um espaço no qual as pessoas pudessem co-        preservação dos objetos ao longo dos tempos.
nhecer a arte feita pelo povo brasileiro em toda   Isso não implica em descartar a importância
sua grandeza.                                      dos especialistas, dos estudantes que fizeram
     Essa mesma inspiração esteve radical-         a universidade e foram se aperfeiçoando pouco
mente presente no projeto deste museu. Em-         a pouco porque esse tipo de conhecimento é
bora, inicialmente, não houvesse nem restau-       cumulativo e os problemas que ocorrem podem
radores nem museólogos, isso não quer dizer        sempre se apresentar de novas maneiras. Uma
que Jacques Van de Beuque tenha se colocado        quebra nunca é exatamente igual à outra.
à parte das discussões que se travavam nes-             Como na vida dos homens, a diversidade
ses ambientes. Além de assinante de revistas       também prepondera na vida dos objetos. Aliar
e publicações especializadas em museus e ex-       os saberes é a maior virtude que conservadores
posições, sempre que possível ele consultava       de uma instituição ou colecionadores podem
e contratava profissionais brasileiros, quando     ter. O que se deseja é que todos os trabalha-
a necessidade e o dinheiro apresentavam-se         dores do museu possam colaborar na manu-
juntos, coincidiam. Mas essas ocasiões eram        tenção preventiva de seu acervo. O objetivo do
raras. Na maior parte das vezes, cercou-se de      Caderno de Conservação e Restauro de Obras
pessoas não formalmente especializadas, de         de Arte Popular Brasileira é transmitir a expe-
marceneiros, pintores, mestres de obras, estu-     riência adquirida pelo Museu Casa do Pontal
dantes de arte e arquitetura, desenhistas, de-     ao longo de trinta anos. Temos sempre o que
signers – autodidatas na arte da restauração.      aprender e trocar. Aqui, compartilhamos o co-
     A lição que esse caderno traz é justamente    nhecimento que adquirimos, e que tem sido
que se podem unir saberes de origens muito         aplicado em favor da proteção do patrimônio
diversas e obter bons resultados. É evidente       cultural brasileiro que nasce das camadas
que não defendemos a precarização do tra-          populares e representa parte fundamental da
balho de conservação e restauro, entre outros      memória, do imaginário e do potencial criativo
motivos porque as múltiplas funções desem-         de nosso país.
penhadas na atualidade pelos museus trazem
maiores desgastes para as obras. Hoje, os
acervos estão mais dinamizados: em viagens,                                    Angela Mascelani
emprestados para instituições locais, inte-                     Diretora do Museu Casa do Pontal


                                                              11
Obra de Nhozim, São Luís, MA - acervo Museu Casa do Pontal / Fotógrafo: Lucas Van de Beque
                                           12
O diálogo com os parceiros:
implantação de uma política
de conservação participativa

    Os museus não são lugares naturais. Foram – e são – construídos com vários objetivos, sendo
uma de suas premissas básicas preservar os objetos para perpetuar sua existência. O ato de
preservar inclui coleta, aquisição, acondicionamento e conservação dos bens materiais. Porém, o
simples fato de serem objetos de museus não garante, a princípio, sua sobrevivência, visto que
vários deles foram e são elaborados com materiais cuja permanência só é alcançada devido ao
trabalho constante de conservação. Devido a esta característica, quando o processo de deteriora-
ção se instaura por fatores endógenos ou exógenos é necessário intervir, sendo a restauração um
dos caminhos mais comuns.
    A variada tipologia de objetos existentes em acervos museológicos é um dos grandes proble-
mas enfrentados pelos profissionais dos museus quanto à adoção de política de preservação de
seus bens materiais. Assim sendo, as informações levantadas a partir de cada objeto da coleção
tornam-se reducionistas, pois não basta registrar a autoria do objeto, a matéria-prima emprega-
da, fazer um estudo sobre o produtor (indivíduo ou grupo), conhecer o contexto de produção ou
levantar os significados práticos e metafísicos que acompanham os objetos. Inserido em coleções,
sua existência e permanência vão demandar outros níveis informacionais, associados a uma sis-
temática de procedimentos concretos por parte daqueles que os conservam.
    Mas por que é necessário preservar os objetos de coleção? Muito se vem falando sobre
“coleções”. Para o historiador alemão Philipp Blom, as coleções ajudam a livrar os indivíduos
da impotência de não poder coordenar tudo, inclusive suas próprias vidas. Tal afirmação remete
a uma observação feita por Auguste Comte1 sobre o equilíbrio mental promovido pelos objetos.
Para ele, os objetos com os quais estamos em contato diário ajudam-nos a manter o equilíbrio
mental, visto que mudam pouco e oferecem-nos uma sensação de permanência e estabilidade.
Assemelham-se a uma sociedade silenciosa e imóvel, indiferente à nossa agitação e às nossas
                                                                                                   1. In: HALBWACHS, Maurice. A
mudanças, dando-nos a impressão de ordem e quietude. Mesmo estando alheios ao entorno,
                                                                                                   memória coletiva. São Paulo:
os objetos levam, ao mesmo tempo, a nossa marca e a dos outros; eles nos prendem a uma             Vértice, Editora Revista dos
determinada sociedade, sensível e invisível, pois servem como elementos de distinção social,       Tribunais, 1990. p.131.



                                                            13
revelam os nossos gostos, reportam-nos a costumes e tradições, evocam-nos o passado, tanto
pessoal como coletivo.
    As coleções também são comparadas a “retratos instantâneos”, visto que congelam momen-
tos que a investigação histórica é capaz de revelar, apontando as situações nas quais os objetos
se encontravam envolvidos quando da sua confecção. Vista dessa perspectiva, principalmente
pelo olhar daquele que contempla e que busca conhecer sua estrutura mais profunda, a coleção
revela que os objetos se encontram conectados a vários domínios, tanto aqueles relacionados
ao produtor do objeto, indivíduos ou grupos, como aqueles relacionados a quem os coleciona e
os conserva.
    Quanto ao produtor, podemos levantar informação sobre o meio social, econômico, seus valo-
res morais e religiosos. Podemos estudar questões referentes ao gosto, à estética e às preferências
no uso de determinadas matérias-primas. Podemos ainda, a partir de cada objeto, falar sobre os
significados práticos e simbólicos que ele carrega. Sondar estas produções significa olhá-las de
modo diverso, buscando esgotar a pluralidade de informações que acompanham cada objeto de
coleção, visto que estes se encontram relacionados a outros tantos que foram elaborados isolada-
mente e em momentos diferentes.
    Assim sendo, as informações obtidas a partir de cada item da coleção ampliam sua comuni-
cação, revelando o quanto cada objeto suporta de informação, uma vez que eles possuem marcas
específicas de memória, reveladoras da vida de seus produtores e usuários originais. Como es-
tas marcas não são imanentes, cabe à instituição que o abriga tanto preservar o objeto quanto
recuperar a informação que cada um carrega, qualificando-o como documento. Dessa forma, é
papel das instituições que abrigam acervos criarem métodos, mecanismos e práticas capazes de
garantir a conservação dos seus bens culturais. Daí a importância de preservar.
    A tarefa de preservar é central na gestão das instituições detentoras de acervos. A fim de ga-
rantir a existência e a permanência dos objetos colecionados, sobretudo em instituições pequenas,
é preciso conseguir a adesão de todos os profissionais que nela atuam. A adoção de medidas pre-
ventivas simples auxilia, de maneira fundamental, o trabalho especializado exercido pelos conser-
vadores, restauradores e museólogos. Este ponto é nevrálgico, pois envolve uma série de medidas
que requerem, por parte da instituição, a adoção de políticas de conservação que abarquem as
seguintes iniciativas: o treinamento do conjunto de trabalhadores, visando conscientizá-los do
“valor” dos bens culturais que ali se encontram depositados; a qualificação dos profissionais di-
retamente envolvidos com a preservação do acervo; a adoção de medidas de segurança mediante
a instalação de equipamentos contra furtos e sinistros; e por último, mas não menos importante,
a execução de melhoria das condições físicas dos locais onde os acervos se encontram. Essas
providências são fundamentais para assegurar a longevidade do acervo.
    Independente dos motivos que levam um determinado objeto ser selecionado em detrimento
de outro, o fato é que ser coletado significa ser valorizado e lembrado institucionalmente e ser
exposto significa ser incorporado à memória, extra-institucional, dos visitantes do museu. São mo-
vimentos realizados sobre o objeto por agentes públicos ou privados, que, por meio de um capital
simbólico ou político, viabilizaram a escolha. Quando nos detemos na análise das circunstâncias
que motivaram a reunião de um grupo de objetos em coleção, vemos que, na maioria das vezes,
as motivações foram orientadas pelo valor sentimental, pelo gosto, pelo valor científico ou ainda
pelo valor financeiro que cada objeto pode alcançar. Reunidos em coleções de museus, em centros
de memória, em casas de cultura, em projetos científicos, os objetos têm seu público ampliado


                                 14
e passam, então, pela primeira transformação, aquela que os organiza, tendendo a reuni-los de
forma a apresentar conteúdos de identidade cultural ou de conhecimento científico. É o caso de
muitos acervos particulares que se tornaram públicos ou passaram a constituir museus. No Rio de
Janeiro, temos como exemplos o Museu Casa do Pontal, o Museu Chácara do Céu e o Sítio Roberto
Burle Marx, entre outros.
    Temos ainda coleções que, montadas inicialmente como parte de uma pesquisa, foram, mais
tarde, integradas a instituições públicas, sendo os colecionadores orientados por variados obje-
tivos. Como exemplo, temos as coleções do Museu do Índio, reunidas por diversos antropólogos,
etnólogos e sertanistas que trabalharam, ou não, na instituição. Temos ainda museus ligados à
história dos países, como é o caso do Museu Nacional, que nasceu da coleção particular de D.
Pedro II e que hoje possui coleções de diversas origens e temas, ou do Museu Histórico Nacional,
que constituiu seu núcleo principal a partir de um projeto de construção de nação. Atualmente, os
museus comunitários inovam nas formas de constituição de acervos, reunindo objetos expressivos
na história e memória de grupos socialmente marginalizados.
    Os objetos inseridos em coleções acabam determinando investimentos de conservação, exi-
gindo daqueles que os conservam a implementação de práticas rotineiras de manejo e exposição.
Daí a necessidade da utilização de “soluções” corretas para a higienização das peças, associadas
a uma constante vigilância dos locais de acondicionamento e exposição, a fim de evitar a ação
de agentes deletérios como insetos, roedores, fungos e outros microorganismos que se ali se ins-
talam, seja devido à precariedade ou às características próprias dos ambientes de exposição, do
acondicionamento ou do mobiliário. Há que se considerar ainda os fatores climáticos que colabo-
ram para a deterioração das peças, como a umidade, a temperatura e a luminosidade.
    Por que é difícil conservar? Primeiro, porque os objetos, independente de estarem reunidos em
coleção, não foram concebidos para “durar para sempre”. Um segundo fator está relacionado à
ampla diversidade desse campo, cujas especificidades não são inteiramente contempladas pela
bibliografia existente, o que acarreta conseqüências para o trabalho exercido pelos profissionais,
que nem sempre têm a quem recorrer para esclarecer suas dúvidas. Um outro fator está ligado
às descontinuidades de recursos financeiros disponibilizados nas instituições, os quais, às vezes,
não são suficientes sequer para a manutenção de suas atividades.
    O diálogo proposto por esse Caderno de Conservação e Restauração de Obras de Arte Popular
Brasileira é bem-vindo, sobretudo porque se assumiu como premissa a tendência atual de agir
sobre o acervo utilizando-se de técnicas de conservação preventiva. Tais técnicas evitam trata-
mentos mais drásticos, enfatizando a prevenção em detrimento da cura, principalmente dos acer-
vos de arte popular e etnográficos, cuja bibliografia é mais restrita. O caderno também responde
ao crescente interesse pela conservação preventiva dos bens culturais, fazendo dela um campo
de trabalho interdisciplinar. Com efeito, a conversação preventiva vem sendo considerada como a
solução mais eficaz e econômica para a realidade brasileira.
    Consultando a literatura recente, percebemos que as técnicas, assim como os métodos em-
pregados, não se esgotam, do mesmo modo que não se esgotam os procedimentos adotados por
cada instituição. Isso se deve, em grande parte, à especificidade de cada acervo, o que acaba por
exigir o emprego diferenciado de técnicas de conservação; ao mesmo tempo, verifica-se que elas
não são nem únicas nem definitivas. Na medida em que novas pesquisas sobre materiais vão
sendo divulgadas, oriundas dos centros de ensino bem como de publicações especializadas, novas
práticas podem ser gradativamente implementadas.


                                                              15
Hoje já contamos com alguns cursos voltados para a formação profissional nas áreas de
                                   pesquisa, conservação e restauração, oferecidos por universidades, associações especializadas
                                   e entidades de classe, tanto em nível de graduação quanto em pós-graduação. O diálogo entre
                                   cientistas e profissionais de museus é elemento decisivo para o avanço nesta área. Notamos,
                                   tanto nos programas dos cursos que são oferecidos pelas instituições supracitadas como nos
                                   programas dos congressos, que o público-alvo são profissionais de áreas distintas, como museo-
                                   logia, química, física, engenharia, arquitetura e biologia, entre outros. A reunião de uma gama tão
                                   variada de pesquisadores oriundos das ciências exatas, biológicas e humanas, levou à geração
                                   de conhecimento sobre materiais e produtos que foram aproveitados, tanto no acondicionamento
                                   dos acervos quanto na higienização. Assim, podemos afirmar que o aperfeiçoamento dos métodos
                                   e técnicas empregadas na área de conservação e restauração é fruto da interdisciplinaridade, na
                                   busca de soluções técnicas e práticas para os mais distintos problemas.
                                        Atualmente, a conservação preventiva vem sendo apontada como a medida mais eficaz para
                                   os problemas enfrentados pelos profissionais da área de preservação de acervos museológicos.
                                   O conhecimento produzido nas mais distintas áreas visa identificar os fatores que interferem
                                   na estabilidade, assim como aqueles que danificam a estrutura dos objetos de coleção. O le-
                                   vantamento bibliográfico sumário das publicações recentes e a rápida leitura das referências
                                   bibliográficas dos textos e artigos voltados para a conservação de acervos museológicos reve-
                                   lam, o que não deixa de ser surpreendente, como a maioria dos textos está direcionada para a
                                   conservação e a restauração de acervos tradicionalmente ligados às práticas culturais ditas
                                   eruditas, oficiais ou mais refinadas.
                                        Esses textos encontram-se voltados para a conservação de telas, cuja base é o têxtil, princi-
                                   palmente o algodão, de esculturas de madeira ou pedra, de obras sobre papel, mobiliário e metal.
                                   Outros elementos surgem em menor escala, tais como as cerâmicas, os couros e as fibras vege-
                                   tais. Examinemos mais de perto estas últimas. As fibras vegetais mais abordadas são o algodão
                                   e o linho, além de outras, como o sisal, a juta e o líber, amplamente empregadas em várias partes
                                   do mundo, e também entre as populações regionais e indígenas do Brasil. Quando se tratam de
                                   cerâmicas, termo que abrange somente as cozidas, destacam-se principalmente a terracota, a
                                   louça, as faianças, as porcelanas e os arenitos. Por outro lado, a argila – simples ou decorada,
                                   com incisões ou pinturas – não vem sendo abordada, o mesmo ocorrendo com as peças de ces-
                                   taria, couro, borracha, sementes, espinhos, miçangas, penas, entre outros materiais. A plumária
                                   também serve como exemplo, uma vez que são poucos os artigos disponíveis a seu respeito e,
                                   além disso, a maioria deles está publicada em língua estrangeira, o que restringe muitas vezes a
                                   assimilação da informação.
                                        São estas matérias-primas comumente empregadas na elaboração de objetos de arte popular,
                                   utilizadas de maneira combinada ou não com outros elementos, que fazem da sua conservação
                                   um verdadeiro trabalho de pesquisa, associado à experiência pessoal que cada profissional ad-
                                   quire no contato diário com o acervo. A diversidade de acervos e de instituições museológicas está
        2. A coleção Museologia
– roteiros práticos, publicada
                                   diretamente relacionada à diversidade de profissionais de conservação e restauro, mas isso não
  originalmente pelo Museums,      resultou ainda em diversidade de textos que abranjam os mais distintos materiais. Até mesmo a
Libraries and Archives Council,    conservação de arquivos digitais já encontra espaço nas publicações. Com base neste levanta-
 foi traduzida para o português
                                   mento verifica-se que o maior número de textos são traduções, cujos autores tiveram seus textos
     numa edição da Editora da
Universidade de São Paulo com      impressos originalmente em publicações especializadas, editadas por institutos de conservação
               a Fundação Vitae.   internacionais tais como o Museums, Libraries and Archives Council2.


                                                                    16
Essas publicações são organizadas pela iniciativa de profissionais e de agências que se res-
sentem da carência de informação que afeta a atividade de conservação dos acervos brasileiros.
Hoje, mesmo dispondo de um maior número de publicações, as traduções nem sempre atendem
a nossa realidade. Os fatores climáticos também constituem um sério problema. Temos acervos
distribuídos em todo o território nacional, com variações climáticas consideráveis, que vão de clima
tropical úmido, seco e árido ao subtropical, variações que fazem enorme diferença na adoção de
medidas preventivas. Essas diferenças climáticas não são apontadas nas publicações disponíveis,
visto que são frutos de realidades distintas.
    Pode-se verificar, entretanto, que os profissionais que atuam nos museus brasileiros pos-
suem conhecimento, farto e abrangente, sobre os acervos com os quais lidam. Encontram-se
atualizados a respeito das medidas preventivas na conservação e restauração. Essas informa-
ções são adquiridas mediante a participação em congressos, workshops, jornadas e conferên-
cias, tanto no Brasil quanto no exterior. Outra forma de troca de informações são as visitas que
os profissionais fazem a outras instituições com o objetivo de conhecer as instalações, tais como
reservas técnicas e laboratórios de restauração. Nessas oportunidades, é possível saber sobre
bibliografia especializada, sem deixar de conferir ou confirmar dados sobre novos materiais,
produtos e equipamentos.
    Não podemos esquecer também toda a atualização tornada possível pelo acesso à web, ins-
trumento cada vez mais importante na disseminação do conhecimento. Algumas revistas especia-
lizadas encontram-se disponíveis por meio eletrônico. Mesmo que a busca não seja rápida e fácil,
a disponibilidade da informação é um fato. Entretanto, as dificuldades relacionadas à aquisição
dos materiais indicados ainda não foram superadas, seja por se tratarem de artigos importados,
cuja substituição por similar nacional nem sempre é possível, seja devido à falta de verbas insti-
tucionais para sua aquisição.
    É interessante assinalar que a maioria dos textos sobre a conservação ou restauração de obje-
tos museológicos enfatiza a necessidade do estudo do imóvel, do controle climático e dos materiais
a serem utilizados no acondicionamento, informando que são estes elementos a chave para a con-
servação preventiva. Essas medidas, associadas ao conhecimento da natureza de cada objeto da
coleção, servem como ponto de partida para garantir a longevidade dos acervos museológicos. En-
tretanto, poucos destes textos destacam que o fator humano é a coluna vertebral de toda conserva-
ção, pois são as equipes de conservação que levarão a cabo as tarefas necessárias à preservação.




                                                                              Ione H. Pereira Couto
   Museóloga do Serviço de Museologia do Museu do Índio/RJ e doutoranda do Programa de Pós-Graduação
                        em Memória Social da Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro – UNIRIO




                                                                17
Nhô Caboclo, Águas Belas, PE - acervo Museu Casa do Pontal / Fotógrafo: Rômulo Fialdini



                                          18
I.                                                                                                        3. Noemisa Batista dos Santos
                                                                                                          (1947 - ). Nasceu em Caraí, no

Considerações                                                                                             Vale do Jequitinhonha, MG, onde
                                                                                                          vive e trabalha como ceramista.


sobre conservação
                                                                                                          Com estilo singular, tornou-se
                                                                                                          referência na arte popular brasi-
                                                                                                          leira. Utiliza o próprio barro, em

e restauro na arte                                                                                        suas muitas tonalidades, para
                                                                                                          pintar as obras que cria.


popular brasileira                                                                                        4. Adalton Fernandes Lopes
                                                                                                          (1938- 2005). Nasceu em Niterói,
                                                                                                          RJ, onde passou toda a sua vida.
                                                                                                          Autor de obra vasta e diversifica-
1. As múltiplas interfaces dos processos de          que imprimiu aos personagens em suas “gerin-         da, privilegiou os tipos populares,
conservação e restauro                               gonças”5, contrariando as expectativas sobre a       compondo uma verdadeira
                                                     capacidade do barro de suportar movimentos me-       etnografia da vida fluminense.
                                                                                                          Criou engenhocas imensas, nas
     A arte popular apresenta uma ampla diversi-     cânicos quando queimado de forma tradicional.        quais centenas de personagens
dade de matérias-primas e de técnicas aplicadas           As variações entre o método de trabalho e as    se movimentam animadamente.
em seu processamento. Os artistas empregam           técnicas adotadas são enormes e mesmo os ma-
                                                                                                          5. A geringonça é um tipo de
– às vezes, simultaneamente – métodos sim-           teriais usados por cada um deles, em uma única       máquina de fabricação caseira,
ples associados a procedimentos complexos, o         obra, podem ser bastante diversos. Nhô Caboclo6,     inventada por alguns artistas para
que configura um campo dinâmico, marcado por         um dos grandes artistas com obras em exposição       dotar de movimento suas criações
                                                                                                          escultóricas. Em sua feitura são
experimentações e pelo uso de materiais alter-       no Museu Casa do Pontal, usava madeira, ferro,
                                                                                                          utilizados diversos materiais,
nativos, em alguns casos orgânicos e de baixo        penas, linhas, tecidos e folha de flandres em seus   como peças e engrenagens
custo. Nessa produção, a criatividade não está       trabalhos. A originalidade deste artista popular é   industrializadas, arames, fios e
necessariamente ligada a profundas informa-          assim destacada por Sílvia Coimbra:                  quaisquer outros produtos que,
                                                                                                          reciclados, possam vir a contribuir
ções de técnicas e à destreza nos modos de fazer;
                                                                                                          para a criação de um sistema que
autores que pouco dominam os materiais que           O instrumental de Caboclo, com o qual conse-         permita a articulação das figuras
utilizam convivem com artistas que são exímios       gue os mais precisos efeitos, faz parte de sua       e personagens. Por ser uma
                                                                                                          criação única, e não obedecer a
conhecedores da madeira, seus cortes e diferen-      produção própria, é quase todo construído por
                                                                                                          projetos e planos prévios, poucos,
tes possibilidades de emprego, ou das etapas de      ele: velhas facas de mesa, com apenas 3 cm de        além de seus próprios idealizado-
processamento da argila. Alguns se aprofundam        gume, afiadíssimas; hastes de guarda-chuva           res, são capazes de consertá-las.
nessa relação e nas possibilidades de uso de de-     improvisadas em estiletes; um monte de tam-          Embora o significado da palavra,
                                                                                                          no dicionário Aurélio, remeta a
terminados materiais, fazem experimentações e        pas de latas de filmes recortadas, esperando
                                                                                                          “objeto de estrutura precária”, as
descobrem caminhos próprios. Outros se mantêm        a vez de servirem como cata-vento; marretas,         geringonças ou “engenhocas”,
fiéis às técnicas aprendidas no ambiente familiar    martelos, pregos e parafusos de todos os tama-       podem ser criações complexas.
ou comunitário, reproduzindo na atualidade for-      nhos; prensa, pua, grosas, serrotes, tesouras;
                                                                                                          6. Nhô Caboclo (? – 1976). Sabe-
mas de fazer cujas origens se perdem no tempo.       extrato de nogueira, bugigangas que ele não          se que ele é descendente direto
     Noemisa Batista3, por exemplo, apesar de ter    pode ver passar sem pegar, no desejo de, um          de índios e que nasceu na aldeia
inovado em formas e temas, dá prosseguimento à       dia, aproveitá-las em uma invenção.                  de Águas Belas, no interior de
                                                                                                          Pernambuco. Trabalhou basica-
mesma técnica de modelagem e ao processo de          (Coimbra, 1980, p. 277)                              mente com madeira e sucata,
queima ensinado por sua mãe. Adalton Fernandes                                                            alcançando resultados surpre-
Lopes4 não parou de inventar misturas de mate-           Além de inventar seu próprio instrumental,       endentes e estilo original. Em
                                                                                                          suas composições, privilegiou o
riais, acrescentando cimento ao barro e, às vezes,   certos artistas populares chegam a criar, com
                                                                                                          movimento, em obras em que os
incorporando nas esculturas produtos diferentes,     materiais mais acessíveis, produtos que, mesmo       diversos elementos perseguem o
como o papel machê. Isso sem falar na animação       sem conservantes ou fixadores, produzem efeitos      equilíbrio. Explorou a temática



                                                                 19
semelhantes a outros, desenvolvidos pela indús-             Adalton Lopes foi um dos artistas que
                            (cont.)
                                      tria química com largo uso no mercado.                 passou vários períodos no Museu, consertando
  marítima, com navios de guerrei-
   ros e escravos acorrentados. In-
                                           A freqüente mistura de clara de ovo com pig-      suas geringonças. As trocas realizadas durante
ventou linhas temáticas, nas quais    mento em algumas obras, por exemplo, produz o          essas visitas permitiram que se adquirisse in-
 se destacam os torés e os rachos.    mesmo resultado que a têmpera7. A cola branca          timidade e se acumulassem informações sobre
Seu trabalho é caracterizado ainda
                                      diluída com pigmento pode ser comparada à tinta        o funcionamento dos mecanismos criados por
 pelo uso intenso de penas de aves
     e das cores negra e vermelha.    acrílica, enquanto o breu8 diluído em querosene e      ele, como a determinação das velocidades com
                                      misturado com pigmento, tal como usado por Mes-        que se movimentam as variadas hastes, as ra-
          7. Pintura normalmente
 feita à base de pigmento e com       tre Vitalino9, seria uma espécie de tinta a óleo. Em   zões pelas quais cada uma delas se move num
adesivo orgânico, como gelatina       alguns casos, materiais aparentemente reprová-         sentido diferente, os recursos utilizados para
    e clara de ovo, ou inorgânico,    veis podem vir a se tornar recursos interessantes      que cada personagem tivesse uma dinâmica
                     como a cera.
                                      nos processos de conservação e restauração. Ma-        própria e os materiais preferidos do artista.
  8. Sólido usado na fabricação       nuel Galdino10, por exemplo, usava durepox para             Embora nem sempre a presença viva dos
  de uma resina que tanto dilui       colar suas peças, o que é mais eficiente no caso de    criadores das obras seja acessível, existem
  em solvente de petróleo como
                       no calor.
                                      estruturas pesadas do que a cola branca. Embora        outras maneiras de se obter informações rele-
                                      seu uso não seja recomendado, sendo preciso mui-       vantes sobre o acervo, que incluem a consulta
9. Mestre Vitalino (1909-1963).       ta experiência para saber avaliar corretamente sua     a instituições ou colecionadores de acervos si-
   Nasceu na vila de Ribeira dos
      Santos, próximo a Caruaru,
                                      necessidade, o artista lançava mão desse recurso       milares, a pesquisadores da área e a parceiros
 PE. Criado em ambiente oleiro,       porque já havia tentado outras soluções, todas         técnicos, além da investigação em publicações.
 cedo começa a modelar louças         malsucedidas. Ele tornou-se um especialista em         Especialmente no caso de instituições, é reco-
     e brinquedos em miniatura.
                                      sua própria arte, conquistando uma grande sabe-        mendável reunir e organizar as publicações exis-
 Dotado de forte senso estético,
     produziu obras que, na ma-       doria com relação aos materiais nela utilizados.       tentes sobre os artistas e obras que fazem parte
    turidade, atraíram a atenção           Como se vê, um dos grandes desafios da            do acervo e tornar este material disponível para
     de críticos e colecionadores     instituição ou do colecionador de arte popular é       os profissionais de conservação e restauro.
      de arte. Em 1947, algumas
                                      conhecer as técnicas desenvolvidas ou utilizadas            Essa soma de conhecimentos vai orientar a
        de suas esculturas foram
expostas no Rio de Janeiro. Esta      originalmente pelos artistas. Cada trabalho é          construção de indicadores para as intervenções de
   exposição foi considerada um       realizado com diferentes gradações de materiais,       conservação e restauro. Isso vale tanto para cole-
  marco na história do interesse      técnicas de preparo específicas e muitas experi-       cionadores como para instituições; no caso destas
    pela arte popular, não só por
      revelar ao grande público a
                                      mentações. Portanto, todos esses aspectos pre-         últimas, esse processo integrado deve reunir di-
 obra de Vitalino, como também        cisam ser identificados antes do início das ações      versos tipos de profissionais e colaboradores.
     por chamar a atenção sobre       de preservação, conservação e restauro, num                 Livros como O mundo encantado de Antônio
    a existência desse gênero de
                                      conhecimento que deve agregar atualização téc-         de Oliveira11 (Guimarães, 1983), no qual o próprio
   criação em diferentes regiões
   do país. Foi reconhecido como      nica, vivência, disciplina e curiosidade. E, como      artista fala da sua obra e do contexto em que
  Mestre por sua virtuose e pela      cada obra tem a sua história, cada acervo de arte      criou seus trabalhos, foram essenciais para nor-
  liderança que exerceu entre os      popular apresenta características próprias, que        tear os procedimentos que o Museu Casa do Pon-
    ceramistas do Alto do Moura,
                                      devem orientar a maneira como será cuidado.            tal adotou na catalogação e na manutenção das
               bairro de Caruaru. 
                                           As particularidades da composição do              peças. Da mesma forma, o acesso aos materiais
      10. Manuel Galdino (1929-
                                      acervo do Museu Casa do Pontal – no qual a             e tipos de pintura utilizados por Mestre Vitalino
1996). Nasceu na cidade de São
 Caetano, PE. Em 1940, mudou-
                                      aquisição das obras passou, muitas vezes, por          foi resultado de processos formais de pesquisa.
se para Caruaru, onde tornou-se       relações diretas entre o colecionador Jacques               Mesmo quando não há publicações específi-
 funcionário municipal. Sua tra-      Van de Beuque e os artistas – permitiram que           cas sobre os artistas, vale a pena buscar livros e
  jetória como artista teve início
                                      diversas técnicas adotadas por seus autores            artigos periféricos, que falem sobre os contextos
 em 1974, quando foi destacado
    pela prefeitura para executar     fossem conhecidas e levadas em consideração            culturais, a região de origem e os recursos natu-
       serviços no Alto do Moura.     no processo de conservação das obras.                  rais disponíveis. Um exemplo desse tipo de relação


                                                                          20
aconteceu no restauro da “Casa de Farinha”, de        trajetória desse museu tem mostrado que existe
João José12, obra que chegou ao Museu Casa do         uma íntima correlação entre a eficácia obtida e o
Pontal com várias partes descoladas. Nesse caso,      comprometimento dos trabalhadores. Daí a im-
                                                                                                          (cont.) Lá fez amigos que o
foi necessário entender a dinâmica de funciona-       portância da experiência acumulada. Contudo,        introduziram na arte de “bone-
mento de uma casa de farinha verdadeira para que      é recomendável adotar um manual de procedi-         cos”, principal atividade local.
a obra pudesse ser adequadamente reconstituída.       mentos para os encarregados da manutenção e         Apaixonou-se de tal maneira
                                                                                                          pela modelagem em cerâmica,
     As metodologias resultantes da sistemati-        limpeza do espaço, de modo que a substituição       que abandonou o serviço públi-
zação de conhecimentos não só permitem acom-          de pessoas não resulte em perda de memória dos      co e mudou-se definitivamente
panhar as ações como ajudam a tomar decisões          processos e nem acarrete a queda na qualidade       para o Alto do Moura. Suas
                                                                                                          criações formam um repertório
sobre os tipos de intervenção adotados pelas di-      do serviço prestado. Além disso, o manual pode
                                                                                                          de obras delirantes e originais,
ferentes instituições. No Museu Casa do Pontal,       colaborar para a minimização de acidentes, que      consagrando os monstros auto-
o setor de pesquisa foi responsável por sistema-      também podem acontecer.                             fágicos, e outros personagens
tizar e organizar as informações e os documen-             Um manual não suprime, entretanto, a ne-       de forte conteúdo onírico, como
                                                                                                          Lampião-Sereia e São Francisco
tos sobre as obras e os artistas que fazem parte      cessidade de diálogo permanente. A troca de
                                                                                                          Cangaceiro.
da coleção reunida por Jacques Van de Beuque.         informações sobre métodos e técnicas de con-
                                                                                                          11. Antônio de Oliveira (1912-
Portanto, os pesquisadores também integram            servação, a adoção de diferentes práticas de
                                                                                                          1996). Nasceu em Belmiro Braga,
os processos de conservação e restauração,            limpeza e de segurança e a introdução do uso de     Minas Gerais. Aos seis anos,
contribuindo com conteúdos sobre os aspectos          materiais mais eficientes e comprovadamente         começou a esculpir carrinhos
históricos, sociológicos e formais. Além disso, os    testados compõem um conjunto de medidas e           de bois e outras peças com as
                                                                                                          quais brincava. Na adolescên-
profissionais desse setor podem ser responsáveis      práticas que, aplicadas de maneira integrada,
                                                                                                          cia, trabalhava consertando
por definir, por exemplo, que obras participarão      colaboram decisivamente para o sucesso da           móveis durante o dia e esculpindo
de exposições itinerantes. As peças selecionadas      conservação e manutenção do acervo.                 “bonecos” à noite. Seduzido pela
deverão passar por um processo de avaliação e,             No Museu Casa do Pontal, são feitos plane-     possibilidade de contar histórias
                                                                                                          com seus conjuntos de esculturas
se necessário, por uma intervenção prioritária.       jamentos constantes para definir as obras que       miniaturizadas, Antônio de Oliveira
     Os encarregados pelos procedimentos de           devem prioritariamente passar por tratamento        entregou-se com paixão à recria-
manutenção e limpeza do espaço físico onde um         preventivo e de restauro. Esses critérios são       ção de cenas reais ou imaginárias,
                                                                                                          que compunham o que chamava
acervo está exposto ou em reserva também de-          definidos em intercâmbio com os profissionais
                                                                                                          de “meu mundo encantado”.
vem estabelecer comunicação direta com os pro-        responsáveis pela elaboração dos projetos de-       Refletiu sobre seu processo de
fissionais de conservação. Quase sempre são os        senvolvidos pela instituição. No planejamento       criação, deixando muitas observa-
responsáveis pela limpeza diária os primeiros a       também são definidas as readequações do mo-         ções escritas e gravadas.

identificar o aparecimento de infestação por in-      biliário e das dependências físicas, bem como
                                                                                                          12. João José Paiva (1928 – ). Nas-
setos, o que não se mostra facilmente. Por isso, a    a aquisição de novos equipamentos.                  ceu em Cajá, próximo a Caruaru,
preservação das obras depende da colaboração e             Essas relações inter-institucionais desem-     PE. Na adolescência transferiu-se
do trabalho integrado entre vários profissionais. A   penham um papel relevante porque nem sempre         para o Alto do Moura, PE, onde
                                                                                                          vive até hoje. Aprendeu a modelar
agilidade na comunicação dos problemas encon-         profissionais, mesmo os mais experientes, têm       o barro observando o trabalho de
trados é fundamental, porque permite interromper      isoladamente soluções capazes de abranger           artistas da região, especialmente
processos de deterioração com menores danos.          tudo. Quando se trata de um acervo composto         o de Mestre Vitalino. Com ele,
                                                                                                          chegou a vender seus bonecos
     No Museu Casa do Pontal, são feitas ins-         por materiais extremamente variados, como é o
                                                                                                          na feira de Caruaru. Gostava de
peções periódicas e conjuntas pelas equipes           caso da arte popular brasileira, as necessidades    fazer principalmente obras que
de limpeza e conservação, nas quais ambas as          podem ser muito diferentes. Os processos de con-    reproduziam cenas de famílias:
áreas podem aportar novos procedimentos num           servação e restauro, dessa maneira, são multi-      retirantes, trabalho e casamento.
                                                                                                          Atualmente, não trabalha mais
intercâmbio saudável e necessário. Embora a           facetados, incluindo uma gama de pessoas com
                                                                                                          com o barro, mas transmitiu seus
limpeza e a conservação do espaço físico não          diferentes formações, que devem cultivar uma        conhecimentos aos filhos, que dão
sejam consideradas funções especializadas, a          atitude aberta em relação às novas descobertas.     continuidade à arte cerâmica.



                                                                 21
2. Documentação de acervos                           garismos ou do número total, neste caso quatro
                                                                                            algarismos, relativo ao ano em que o objeto deu
                                            A documentação constitui-se como um             entrada no museu, seguindo-se de um elemen-
                                       ponto primordial para o trabalho de conser-          to de separação e, então, a numeração comum,
                                       vação, pois identifica e registra o histórico da     de forma seqüencial, composta por quatro dí-
                                       obra. A catalogação de acervos pode ser feita        gitos (Cândido, 2006, p. 40).
                                       de muitas maneiras e a partir de diversos su-             No caso do Museu, mesmo com a colabo-
                                       portes. Fichas catalográficas, livros de registro,   ração do colecionador, verificou-se a impos-
                                       fotografias e desenhos de diferentes ângulos         sibilidade de precisar as datas de aquisição
                                       facilitam a identificação do estado das peças.       das obras e, por conseguinte, decidiu-se não
                                            A catalogação das obras que compõem o           adotar o uso desta informação. A numeração
                                       acervo do Museu Casa do Pontal foi iniciada          das obras do acervo do Museu Casa do Pontal
                                       muitos anos após o princípio da coleção. Jacques     é, portanto, composta somente por numeração
                                       Van de Beuque começou seu acervo na década           seqüencial acrescida de uma letra quando se
                                       de 1950, e posteriormente adquiriu peças de ou-      tratam de conjuntos de obras que não se en-
                                       tros colecionadores que abarcavam produções          contram sobre base comum.
                                       feitas a partir da década de 1930. Em princípio,          Como a arte popular se constitui, via de re-
                                       ele não dimensionava a representatividade e          gra, por representações e criações envolvendo
                                       a abrangência que a coleção alcançaria. Seus         conjuntos de peças que descrevem cenas do
                                       anseios voltavam-se para o apreço e a admira-        cotidiano ou do fantástico, as peças do acer-
                                       ção que passou a nutrir sobre o universo da arte     vo foram classificadas em conjuntos e obras.
                                       popular. Dessa forma, o processo de catalogação      Assim, um conjunto é fichado inicialmente em
                                       só teve início na década de 1990, quando a Casa      sua totalidade e, em seguida, cada obra recebe
                                       do Pontal adotou um novo perfil, que veio a soli-    individualmente uma ficha especial.
                                       dificar seu papel museológico.                            O número de identificação das obras e con-
                                            Na instituição, o processo de catalogação       juntos do acervo é fixado em suas bases, ou
                                       foi iniciado na mesma época que o de infor-          quaisquer outros pontos menos acessíveis à
                                       matização. Os dados sobre as obras foram,            vista. A mesma numeração identifica suas fi-
                                       em primeiro lugar, cadastrados em plataforma         chas de catalogação. O Museu Casa do Pontal
                                       digital e, posteriormente, geraram documen-          adota na ficha de conjunto os seguintes itens:
                                       tação impressa. Na época, foi feito um amplo         Número, Nome do Conjunto13, Artista, Localidade
                                       levantamento acerca de bases de informações          (Região), Tema, Década de Aquisição, Aquisi-
                                       adotadas por outras instituições e tais análises     ção, Ano Provável de feitura, Número de Partes,
                                       levaram à adoção da plataforma Macintosh e           Número de Obras, Peso, Altura, Largura, Com-
                                       ao uso do software File Maker Pro, indicado por      primento, Situação Atual, Conjunto (Fixo, Livre
   13. No caso da arte popular, são    permitir agilidade e cruzamento de informa-          etc.), Gênero, Suporte, Assinatura (Tem ou Não
comuns os casos em que o próprio       ções mesmo em consultas complexas.                   Tem), Tipo de Assinatura (Manuscrito, Carimbo
  autor não atribui um título à sua
                                            De um modo mais amplo, a numeração das          etc.), Texto da Assinatura (o que foi escrito pelo
obra, entretanto, mesmo as peças
    que originalmente não tenham
                                       obras é um dos pontos de partida do processo         artista), Estado de Conservação (com cam-
     sido nomeadas pelos artistas,     de catalogação. Segundo Maria Inez Cândido,          po para laudo resumido), Defeito (com campo
recebem um título descritivo, para     não existe uma normatização rígida quanto à          para laudo resumido), Descrição do Conjunto,
  facilitar sua identificação. Esses
                                       padronização da numeração. O mais comum,             Material Principal, Características do Material
    títulos nunca devem se repetir,
 especialmente quando se tratam        no entanto, é a utilização de registro binário       Principal, Outros Materiais, Localização do Con-
        de obras do mesmo artista.     seqüencial, que compreende o uso de três al-         junto no Museu (Reserva Técnica ou Exposição


                                                                          22
Permante, incluindo Módulo e Setor). E na ficha   bem-vindos, quando as instituições ou colecio-
de obra, os itens: Número, Nome da Obra, Peso,    nadores possuem muitos diferentes gêneros de
Altura, Largura, Comprimento, Situação Atual      objeto (objetos de arte, artesanato, utilitários,
(onde está localizada no momento, por exem-       festivos, rituais, indumentária etc.). Especifica-
plo: em Exposição Temporária ou em Restauro),     mente no Museu Casa do Pontal, como o acervo
Situação Padrão (qual a localização padrão da     é majoritariamente constituído por objetos de
obra), Estado de Conservação (com campo para      arte, essa opção classificatória não foi adota-
laudo resumido), Defeito (com campo para lau-     da. Vale ainda acrescentar a possibilidade de
do resumido), Descrição da Obra. A carência de    documentar os objetos por coleções, de modo a
dados de campo consistentes e das caracte-        recuperar as histórias de formação do acervo.
rísticas específicas da arte popular brasileira        As obras do acervo do Museu Casa do Pon-
dificultou o trabalho de sistematização na fase   tal também foram classificadas em 12 temas
de catalogação das obras. Além disso, a inten-    principais, obedecendo grosso modo a organi-
ção de atender a vários objetivos simultâneos     zação do roteiro da exposição permanente es-
tornou esse processo bastante complexo. A idéia   tabelecida por Jacques: profissões, vida rural,
era, ao mesmo tempo, produzir uma informação      ciclo da vida, festas, jogos e diversões, areias
direta, em linguagem elegante, mas coloquial,     e bichos, arte incomum, arte erótica, cangaço,
incorporando, sempre que possível, as informa-    história do Brasil, religião e ex-votos, carnaval.
ções geradas nos diferentes meios onde se ori-    Cada um destes temas, por sua vez, foi repar-
ginaram as produções que integram o acervo do     tido em 79 subtemas e estes em 380 assuntos.
Museu e respeitando o longo trabalho de pes-      Com essa classificação, é possível, por meio
quisa empreendido por Jacques Van de Beuque.      de uma busca tipológica no banco de dados,
     A partir dessa experiência, algumas so-      conhecer rapidamente a quais obras, artistas
luções mostraram-se mais eficientes. Para         ou regiões se referem cada um desses temas,
                                                                                                       14. Recentemente, o campo
determinar um nome para as obras, por exem-       subtemas ou assuntos. Para facilitar os me-          da arte e da cultura popular
plo, e para padronizar a descrição dos temas      canismos de busca, muitas obras mereceram            brasileira ganhou duas novas
abordados, recomenda-se a adoção de dicioná-      dupla ou tripla classificação.                       publicações que contribuem
                                                                                                       para a normatização de vocabu-
rios, tesauros e bibliografia de referência so-        Os procedimentos de conservação e res-
                                                                                                       lário específico: o Pequeno
bre a temática específica de cada acervo14. Na    tauração pelos quais passam as obras tam-            dicionário da arte do povo
época, foram adotadas como referência obras       bém devem ser documentados. Esses dados              brasileiro (2005), de Lélia
como Dicionário do folclore brasileiro (Cascu-    podem ser agregados à ficha de catalogação ou        Coelho Frota, e o Tesauro de
                                                                                                       Folclore e Cultura Popular Bra-
do, 1988), Folclore Nacional (Araújo, 1964) e O   apontados separadamente. Neste caso, pode-           sileira (2006), organizado pelo
Reinado da Lua (Coimbra, 1980). A base con-       se criar uma ficha de restauro, na qual serão        Centro Nacional de Folclore e
ceitual adotada foi posteriormente publicada      registrados laudos do estado de conservação          Cultura Popular. A classificação
                                                                                                       das obras do Museu Casa do
pelo Museu Casa do Pontal em O Mundo da Arte      da peça, incluindo constatação de sujidades,
                                                                                                       Pontal foi feita, entretanto,
Popular Brasileira (Mascelani, 2002).             detritos e interferências físicas, como quebras      antes destas publicações, com
     A ficha catalográfica pode ainda conter      e perdas, a data em que a obra foi retirada da       o suporte integral da área de
outros diferentes campos, inseridos de acor-      exposição ou da reserva técnica15 e uma pro-         pesquisa para o controle da
                                                                                                       terminologia.
do com a especificidade de cada acervo. Um        gramação de atividades a serem realizadas
recurso visualmente interessante é indicar        a cada processo de recuperação. Quando as            15. Espaço onde se armazenam
os dados da obra diretamente sobre imagens        ações previstas são finalizadas, o ideal é voltar    as obras que não estão em
                                                                                                       exposição, com condições
fotográficas (ou desenhos), com setas expli-      à ficha de catalogação para atualizá-la com
                                                                                                       específicas de conservação,
cando o estado de conservação de cada parte.      observações sucintas sobre os procedimentos          como armários especiais e
Esquemas classificatórios também podem ser        e datas de realização.                               climatização.



                                                              23
O Museu Casa do Pontal adota os seguin-        3. Conservação preventiva
                                  tes itens nas fichas de restauro: Número, Nome,
                                  Artista, Data de Início do Restauro, Data de Fim        Para qualquer coleção, o ideal é que se mi-
                                  do Restauro, Restaurador, Estado do Conjunto e      nimize a necessidade de realizar intervenções.
                                  informações sobre cada tratamento realizado         Uma conservação preventiva eficiente, ou seja,
                                  (Data, Colaboradores, Tratamento, Material Utili-   aquela que se antecipa à necessidade de agir
                                  zado, Equipamentos Utilizados).                     diretamente sobre as obras, adia o processo
                                       Quando as obras forem emprestadas para         natural de deterioração das peças. Segundo
                                  exposições em outros locais, também é recomen-      Maria Cecília Drummond,
                                  dável preencher fichas de saída. Este documento
                                  deve registrar o local de destino das obras, as     [...] o desafio para o conservador de museu
                                  datas de deslocamentos entre a instituição de       é estabelecer procedimentos que conciliem,
                                  origem e a de destino (e vice-versa) e a ocasião    harmonicamente, exposição e conservação.
                                  para as quais foram emprestadas. Outros dados       Procurando alcançar condições próximas das
                                  também podem ser importantes, inclusive para a      ideais de preservação, o profissional deve estar
                                  eventual realização de seguro nas obras, como os    sempre ciente de todos os riscos aos quais os
                                  responsáveis pela recepção da obra nos locais de    objetos freqüentemente se acham sujeitos...
                                  destino, especificações sobre embalagens, danos     (Drummond, 2006, p. 111)
                                  identificados durante o processo, entre outros.
                                       Finalmente, arquivar de maneira prática e          As condições ambientais – como tempe-
                                  eficiente todas essas fichas deve ser uma prio-     ratura, umidade, luminosidade – situam-se
                                  ridade da instituição e do colecionador, já que     entre os principais agentes de degradação das
                                  esses dados são utilizados com freqüência. Os       peças. Por isso, para a adoção de medidas pre-
                                  meios digitais auxiliam o processo de armazena-     ventivas, é fundamental conhecer o comporta-
                                  mento de dados, seja para construir bancos de       mento dos materiais utilizados nas obras diante
                                  fichas catalográficas, seja para obter registros    das condições às quais estão submetidas. Por
                                  visuais dos objetos, a partir das câmeras digi-     exemplo, quando não há condições econômicas
                                  tais. No entanto, como a tecnologia encontra-se     de se manter o ar-condicionado permanente-
                                  em rápida evolução, as demandas de reade-           mente ligado, sobretudo em regiões de clima
                                  quação são constantes, sob pena dos suportes        quente e úmido, o emprego de ventilação me-
                                  tornarem-se obsoletos e inoperantes. O banco        cânica, associado ao uso de desumidificador16
                                  de dados do Museu Casa do Pontal, por diversas      para controle da umidade, pode ser uma opção
                                  razões, teve que ser transposto de Machintosh       mais segura, já que evita a oscilação drástica
                                  para PC, alterando o programa de armazena-          e recorrente de temperatura.
                                  mento de dados para SQL, em base especial-              Da mesma forma, é necessário avaliar os
                                  mente desenvolvida para o acervo. A nova base       tipos de iluminação adotados. A luz natural,
                                  trouxe novas possibilidades de pesquisa, combi-     que pode ser economicamente mais viável e
                                  nação e armazenamento de dados. Entretanto, o       ambientalmente mais correta, é quase sempre
                                  processo de migração de dados, como é de pra-       uma boa opção, desde que se tenha o cuidado
                                  xe, precisou ser revisado com base nos arquivos     de utilizar filtros que impeçam a incidência di-
                                  originais. Desta forma, é importante alertar para   reta dos raios solares sobre as obras.
    16. Aparelho que serve pra
                                  o fato de que sejam mantidos arquivos físicos,          Já a poluição atmosférica e a poeira podem
controlar a umidade relativa do
  ar em ambientes caseiros ou     pois ainda não se sabe muito sobre a durabilida-    causar manchas nas peças, modificando o as-
                   industriais.   de e confiabilidade dos arquivos digitais.          pecto original delas. Esses agentes são prati-


                                                                    24
camente inevitáveis, mas seus efeitos podem           raramente uma instituição dispõe de peritos
ser suavizados com sistemas de filtragem do           em todas as áreas necessárias. Embora, em
ar e controle de ventilação.                          geral, os responsáveis pelas coleções e pelos
     Agentes biológicos – como fungos, micro-         projetos saibam avaliar corretamente os pro-
organismos, roedores e insetos, principalmente        blemas existentes e seus efeitos no dia-a-dia,
baratas, traças, cupins e brocas – também são         é de grande valia a presença de observadores
grandes inimigos no processo de preservação           externos, atualizados em relação aos avanços
de acervos. Algumas soluções recomendadas             tecnológicos e voltados para uma reflexão mais
são a imunização, a dedetização e a desratiza-        sistemática sobre determinados temas.
ção periódicas das dependências que abrigam                Com o objetivo de aperfeiçoar sua atua-
as coleções. Morcegos e pássaros, comuns em           ção, o Museu Casa do Pontal, com a parceria
locais onde as janelas são mantidas abertas,          do Laboratório de Ciências da Conservação da
também devem ser evitados, pois suas fezes            Universidade Federal de Minas Gerais e o incen-
podem danificar as obras.                             tivo da Secretaria de Patrimônio, Museus e Artes
     Além desses agentes, deve-se levar em conta      Plásticas do Ministério da Cultura, realizou no
o efeito da ação humana sobre as obras. Quando        biênio 2000/2001 um completo levantamento de
não estão protegidas por vitrines ou por outro tipo   suas instalações. Nessa ocasião, foram levadas
de isolante, as peças correm o risco de serem to-     em conta, inclusive, as condições ambientais
cadas e os contatos físicos, mesmo quando não         do Rio de Janeiro, onde o calor e a umidade são
provocam acidentes visíveis, depositam sobre as       extremos, e da região específica onde se encon-
obras partículas de gordura do corpo, que progres-    tra a instituição, entre o mar e a Mata Atlântica.
sivamente danificam os materiais. Mais ainda, a       A experiência contou com a participação de toda
fumaça de cigarro e os flashes de máquinas foto-      a equipe da instituição e de profissionais de en-
gráficas também constituem fatores prejudiciais       genharia civil, mecânica e elétrica, arquitetura,
à preservação das obras de arte.                      restauração, museografia e ciência da conser-
     Portanto, todo projeto de conservação pre-       vação. Foram projetadas novas soluções para
ventiva eficaz deve levar em conta uma multi-         vitrines, pisos, alvenarias, telhados, drenagem
plicidade de fatores. Embora o foco principal         e entorno, bem como a readequação das insta-
seja dirigido às obras, muitos outros itens           lações elétricas e hidráulicas.
devem ser analisados, a maior parte deles de               Esse diagnóstico orientou a elaboração do
fácil execução e ligados à observação criteriosa      plano museológico17 da instituição, visando uma
do ambiente e à capacidade de implantar roti-         ação global em prol da conservação e da melho-
nas que não sofram descontinuidades.                  ria de seus espaços e do desempenho de suas
     Em relação ao ambiente, todas as infor-          funcionalidades, compreendida no âmbito da
                                                                                                           17. De acordo com o art. 1º.
mações são relevantes, desde os suportes e            multidisciplinaridade de ações que caracterizam      da Portaria Normativa/IPHAN
vitrines utilizados até as características da         o museu contemporâneo. No ano de 2005, esse          n° 01, de 5.7.2006, o plano
localidade onde se encontra a instituição, bem        planejamento foi revisado e atualizado, em par-      museológico é a “ferramenta
                                                                                                           básica de planejamento
como os níveis de umidade relativa do ar, a           ceria com a Fundação Coordenação de Projetos,
                                                                                                           estratégico, de sentido global e
incidência solar, os sistemas de ventilação,          Pesquisas e Estudos Tecnológicos (COPPETEC),         integrador, indispensável para
os tipos de materiais utilizados na edificação,       da Universidade Federal do Rio de Janeiro.           a identificação da missão da
as peculiaridades do seu entorno, a quantida-              Nesse planejamento, três ambientes me-          instituição museal e para a
                                                                                                           definição, o ordenamento e a
de e a freqüência do público etc. Todos esses         receram atenção mais cuidadosa porque esta-
                                                                                                           priorização dos objetivos e das
aspectos podem ser investigados com a parce-          vam diretamente associados à conservação e à         ações de cada uma de suas
ria de equipes técnicas especializadas, já que        restauração do acervo: o espaço e o mobiliário       áreas de funcionamento”.



                                                                  25
expositivo, a reserva técnica e o laboratório. A    reserva técnica, um colecionador pode contar
                                     substituição progressiva das vitrines do circuito   apenas com um depósito para armazenar suas
                                     expositivo, por exemplo, tem sido um importante     peças; um laboratório pode ser uma pequena
                                     passo para a conservação das obras. Os novos        mesa disponível, e assim por diante. O impor-
                                     modelos respeitam o design original, mas são        tante é estudar esses espaços de modo a en-
                                     mais adequados para a limpeza de rotina por-        contrar suas melhores possibilidades. É certo
                                     que o sistema de fechamento foi modificado.         que algumas soluções que, na atualidade, pa-
                                     Além disso, no lugar das madeiras antigas, mui-     recem convenientes serão futuramente ultra-
                                     to suscetíveis aos freqüentes ataques de cupins,    passadas, em virtude de novos experimentos
                                     foram adotados na estrutura o cedro e outras        e descobertas. Assim, a experiência, a inves-
                                     madeiras nobres, em associação com o MDF18.         tigação e a troca de informações constituem
                                          Na reserva técnica, a circulação de funcio-    elementos importantes na atualização dos cui-
                                     nários para a retirada da água acumulada no         dados com o acervo.
                                     desumidificador foi reduzida a partir da criação         Qualquer instituição ou colecionador pode
                                     de uma saída direta. Isso permitiu que o apare-     aplicar medidas de segurança simples nos
                                     lho ficasse ligado ininterruptamente, jogando a     espaços que abrigam obras de arte popular.
                                     água nos jardins. Os armários têm uma espécie       Além de uma vigilância constante das condi-
                                     de forro com Ph neutro, que é trocado periodi-      ções de umidade, temperatura e luminosidade,
     18. Placa fabricada a partir    camente, evitando o contato da obra com o me-       é necessário atentar para fatores que muitas
    da aglomeração e prensa de       tal das prateleiras.                                vezes passam despercebidos. Certos sinais po-
    madeira moída e resina, que
                                          No caso do laboratório de conservação e        dem indicar a necessidade de adequação dos
   apresenta grande resistência
a insetos como o cupim. A eficá-     restauro, a elaboração do projeto de adequação      espaços, como ferrugem, manchas, goteiras e
cia de seu uso, contudo, ainda é     foi realizada com o auxílio das informações e       respingos de água nas paredes ou no piso, o
                   experimental.     experiências colhidas durante visitas técnicas      que pode esconder rachaduras, umidade, mofo
      19. Aparelho utilizado para
                                     ao Museu Histórico Nacional, ao Museu da Chá-       etc. Todos os materiais que constituem o abri-
 desinfestar obras atacadas por      cara do Céu, ao Museu do Índio e ao Museu de        go das obras, externa e internamente, como en-
  insetos e fungos, com o auxílio    Folclore Edison Carneiro. Como um dos princi-       canamentos, telhado, fiação e calhas, devem
   de um inseticida. Seu aspecto
                                     pais agentes deteriorantes do acervo do Museu       ser vistoriados. Porém, ainda que se observem
assemelha-se ao de um armário
     e possui um compartimento       Casa do Pontal é o cupim, foi adquirida a maior     todas essas medidas preventivas, procedimen-
 vedado com borracha, onde são       câmara de fumigação19 disponível no mercado,        tos de conservação sempre serão necessários.
             colocadas as obras.     capacitada para a imunização de obras de            Grande parte das obras vai para o laboratório
 20. Espécie de prateleira, com
                                     quaisquer formatos e dimensões. Foram utili-        porque é necessário realizar uma manutenção
espaço para a higienização das       zadas duas máquinas nas etapas de higieni-          periódica: fezes e urina de insetos, teias de
   obras a vácuo. Uma entrada        zação: uma de sucção de sólidos20 e outra de        aranha, poeira, partículas sólidas, rastros de
    com um filtro de feltro e um
                                     sucção de líquidos21. A climatização é feita com    lagartixas, ovos de baratas, asas de cupins,
  mecanismo de sucção suga e
 retêm as partículas sólidas da      desumidificadores e ventiladores, que, juntos,      por exemplo, devem ser retirados constante-
                     superfície.     equilibram umidade e temperatura. Optou-se          mente da superfície das obras. Certos proce-
                                     por um controle padrão de umidade que favo-         dimentos preventivos também podem garantir
    21. Mesa perfurada de metal.
  Tem um duto para a sucção de
                                     recesse a ambientação da variedade de mate-         uma grande longevidade às obras, tais como a
líquidos, ligado a um aspirador.     riais que passam pelo laboratório.                  adoção de regras de conduta nos espaços que
       A umidade é sugada pelos           Outros espaços que abrigam coleções de         abrigam os acervos. Fumar, comer, beber ou
 poros da mesa e depositada no
                                     arte popular certamente terão outras necessi-       mesmo portar alimentos e bebida, por exemplo,
   interior do aspirador, evitando
     que a umidade produzida se      dades e, em muitos casos, a própria separação       são atitudes que devem ser evitadas em todas
           espalhe pelo ambiente.    dos espaços pode ser diferente. No lugar da         essas áreas.


                                                                       26
Conservando a Arte Popular Brasileira
Conservando a Arte Popular Brasileira
Conservando a Arte Popular Brasileira
Conservando a Arte Popular Brasileira
Conservando a Arte Popular Brasileira
Conservando a Arte Popular Brasileira
Conservando a Arte Popular Brasileira
Conservando a Arte Popular Brasileira
Conservando a Arte Popular Brasileira
Conservando a Arte Popular Brasileira
Conservando a Arte Popular Brasileira
Conservando a Arte Popular Brasileira
Conservando a Arte Popular Brasileira
Conservando a Arte Popular Brasileira
Conservando a Arte Popular Brasileira
Conservando a Arte Popular Brasileira
Conservando a Arte Popular Brasileira
Conservando a Arte Popular Brasileira
Conservando a Arte Popular Brasileira
Conservando a Arte Popular Brasileira
Conservando a Arte Popular Brasileira
Conservando a Arte Popular Brasileira
Conservando a Arte Popular Brasileira
Conservando a Arte Popular Brasileira
Conservando a Arte Popular Brasileira
Conservando a Arte Popular Brasileira
Conservando a Arte Popular Brasileira
Conservando a Arte Popular Brasileira
Conservando a Arte Popular Brasileira
Conservando a Arte Popular Brasileira
Conservando a Arte Popular Brasileira
Conservando a Arte Popular Brasileira
Conservando a Arte Popular Brasileira
Conservando a Arte Popular Brasileira

Más contenido relacionado

La actualidad más candente

Ondados fios de ouro reluzente
Ondados fios de ouro reluzenteOndados fios de ouro reluzente
Ondados fios de ouro reluzenteHelena Coutinho
 
Arquitetura grega
Arquitetura gregaArquitetura grega
Arquitetura gregaforte10pm1
 
O que é a arte (1)
O que é a arte (1)O que é a arte (1)
O que é a arte (1)Vasco L
 
Apresentacao Plano Pedagogico JOVEM APRENDIZ AESCON slide share
Apresentacao Plano Pedagogico JOVEM APRENDIZ AESCON slide shareApresentacao Plano Pedagogico JOVEM APRENDIZ AESCON slide share
Apresentacao Plano Pedagogico JOVEM APRENDIZ AESCON slide shareVania Bastos Nacaxe
 
História da engenharia no brasil
História da engenharia no brasilHistória da engenharia no brasil
História da engenharia no brasilCarmem Rodrigues
 
Proposta de trabalho ficha nº2
Proposta de trabalho ficha nº2Proposta de trabalho ficha nº2
Proposta de trabalho ficha nº2turmab
 
Estatuto moral dos animais - Filosofia 12º ano
Estatuto moral dos animais - Filosofia 12º anoEstatuto moral dos animais - Filosofia 12º ano
Estatuto moral dos animais - Filosofia 12º anoDaniela França
 
Missão Artística Francesa
Missão Artística Francesa Missão Artística Francesa
Missão Artística Francesa Andrea Dressler
 
Os orgãos políticos em atenas
Os orgãos políticos em atenasOs orgãos políticos em atenas
Os orgãos políticos em atenasAna Cristina F
 
Cursos Da Área De Linguas E Humanidades
Cursos Da Área De Linguas E HumanidadesCursos Da Área De Linguas E Humanidades
Cursos Da Área De Linguas E HumanidadesJoanach
 
Cultura medieval
Cultura medievalCultura medieval
Cultura medievalcattonia
 
Dossier Temático
Dossier Temático Dossier Temático
Dossier Temático AK47J
 
Atividade piscatória
Atividade piscatóriaAtividade piscatória
Atividade piscatóriaIlda Bicacro
 
Trabalho Azulejaria
Trabalho AzulejariaTrabalho Azulejaria
Trabalho AzulejariaESMA
 

La actualidad más candente (20)

Ondados fios de ouro reluzente
Ondados fios de ouro reluzenteOndados fios de ouro reluzente
Ondados fios de ouro reluzente
 
Arte Egípcia
Arte EgípciaArte Egípcia
Arte Egípcia
 
Arquitetura grega
Arquitetura gregaArquitetura grega
Arquitetura grega
 
O que é a arte (1)
O que é a arte (1)O que é a arte (1)
O que é a arte (1)
 
Reflexão - CP5
Reflexão - CP5Reflexão - CP5
Reflexão - CP5
 
Reflexão - CP4
Reflexão - CP4Reflexão - CP4
Reflexão - CP4
 
Apresentacao Plano Pedagogico JOVEM APRENDIZ AESCON slide share
Apresentacao Plano Pedagogico JOVEM APRENDIZ AESCON slide shareApresentacao Plano Pedagogico JOVEM APRENDIZ AESCON slide share
Apresentacao Plano Pedagogico JOVEM APRENDIZ AESCON slide share
 
Guião renova
Guião renovaGuião renova
Guião renova
 
História da engenharia no brasil
História da engenharia no brasilHistória da engenharia no brasil
História da engenharia no brasil
 
Proposta de trabalho ficha nº2
Proposta de trabalho ficha nº2Proposta de trabalho ficha nº2
Proposta de trabalho ficha nº2
 
Estatuto moral dos animais - Filosofia 12º ano
Estatuto moral dos animais - Filosofia 12º anoEstatuto moral dos animais - Filosofia 12º ano
Estatuto moral dos animais - Filosofia 12º ano
 
O Nascimento de Vênus
O Nascimento de VênusO Nascimento de Vênus
O Nascimento de Vênus
 
Missão Artística Francesa
Missão Artística Francesa Missão Artística Francesa
Missão Artística Francesa
 
Os orgãos políticos em atenas
Os orgãos políticos em atenasOs orgãos políticos em atenas
Os orgãos políticos em atenas
 
Cursos Da Área De Linguas E Humanidades
Cursos Da Área De Linguas E HumanidadesCursos Da Área De Linguas E Humanidades
Cursos Da Área De Linguas E Humanidades
 
Escultura grega
Escultura gregaEscultura grega
Escultura grega
 
Cultura medieval
Cultura medievalCultura medieval
Cultura medieval
 
Dossier Temático
Dossier Temático Dossier Temático
Dossier Temático
 
Atividade piscatória
Atividade piscatóriaAtividade piscatória
Atividade piscatória
 
Trabalho Azulejaria
Trabalho AzulejariaTrabalho Azulejaria
Trabalho Azulejaria
 

Destacado

Ernesto de sousa: A Arte Popular de Rosa Ramalho e de Franklin Vilas Boas
Ernesto de sousa: A Arte Popular de Rosa Ramalho e de Franklin Vilas BoasErnesto de sousa: A Arte Popular de Rosa Ramalho e de Franklin Vilas Boas
Ernesto de sousa: A Arte Popular de Rosa Ramalho e de Franklin Vilas BoasVanda Pereira Bregieiro
 
Arte popular brasileira
Arte popular brasileiraArte popular brasileira
Arte popular brasileiraItamir Beserra
 
Poesia de cordel e cultura popular brasileira
Poesia de cordel e cultura popular brasileiraPoesia de cordel e cultura popular brasileira
Poesia de cordel e cultura popular brasileiraAndrea Nascimento
 
Arte erudita popular e de massa
Arte erudita popular e de massaArte erudita popular e de massa
Arte erudita popular e de massaGilson Ribeiro
 
Unidade 1 - Aula 2 - Cultura popular, folclore e cultura popular brasileira
Unidade 1 - Aula 2 - Cultura popular, folclore e cultura popular brasileiraUnidade 1 - Aula 2 - Cultura popular, folclore e cultura popular brasileira
Unidade 1 - Aula 2 - Cultura popular, folclore e cultura popular brasileiraCleverson Sobrenome
 
Manifestações da Arte Popular
Manifestações da Arte PopularManifestações da Arte Popular
Manifestações da Arte Popularcarlosbidu
 
Origem das Manifestações Artísticas
Origem das Manifestações Artísticas   Origem das Manifestações Artísticas
Origem das Manifestações Artísticas Andrea Dressler
 
Engenharia de Produção Mecânica - FMU
Engenharia de Produção Mecânica - FMUEngenharia de Produção Mecânica - FMU
Engenharia de Produção Mecânica - FMUFMU - Oficial
 
Conservação e restauro: sector da actividade económica versus domínio científ...
Conservação e restauro: sector da actividade económica versus domínio científ...Conservação e restauro: sector da actividade económica versus domínio científ...
Conservação e restauro: sector da actividade económica versus domínio científ...Fernando Antunes
 
E-Governo e E-Serviços na Administração Pública de Florianópolis
E-Governo e E-Serviços na Administração Pública de FlorianópolisE-Governo e E-Serviços na Administração Pública de Florianópolis
E-Governo e E-Serviços na Administração Pública de FlorianópolisWladimir Crippa
 
Hip-Hop: a Periferia Grita
Hip-Hop: a Periferia GritaHip-Hop: a Periferia Grita
Hip-Hop: a Periferia GritaEdinho Silva
 
Acervo dvd mec
Acervo dvd   mecAcervo dvd   mec
Acervo dvd mecTV Escola
 
O mito da "Super-Tecnologia da Informação e Comunicação: os problemas e desaf...
O mito da "Super-Tecnologia da Informação e Comunicação: os problemas e desaf...O mito da "Super-Tecnologia da Informação e Comunicação: os problemas e desaf...
O mito da "Super-Tecnologia da Informação e Comunicação: os problemas e desaf...Naira Michelle Alves Pereira
 
Notas de corte sisu 20-01-2011
Notas de corte sisu   20-01-2011Notas de corte sisu   20-01-2011
Notas de corte sisu 20-01-2011Garybas
 
Comunicação em rede (2)
Comunicação em rede (2)Comunicação em rede (2)
Comunicação em rede (2)Yasmin Buriti
 
Revista de-quimica
Revista de-quimicaRevista de-quimica
Revista de-quimicaafermartins
 
Atelier de escrita de Natal
Atelier de escrita de Natal Atelier de escrita de Natal
Atelier de escrita de Natal Ana Paula Santos
 
Livro Ecologia de Campo 2010
Livro Ecologia de Campo 2010Livro Ecologia de Campo 2010
Livro Ecologia de Campo 2010Limnos Ufsc
 

Destacado (20)

Ernesto de sousa: A Arte Popular de Rosa Ramalho e de Franklin Vilas Boas
Ernesto de sousa: A Arte Popular de Rosa Ramalho e de Franklin Vilas BoasErnesto de sousa: A Arte Popular de Rosa Ramalho e de Franklin Vilas Boas
Ernesto de sousa: A Arte Popular de Rosa Ramalho e de Franklin Vilas Boas
 
Arte popular brasileira
Arte popular brasileiraArte popular brasileira
Arte popular brasileira
 
Poesia de cordel e cultura popular brasileira
Poesia de cordel e cultura popular brasileiraPoesia de cordel e cultura popular brasileira
Poesia de cordel e cultura popular brasileira
 
Arte erudita popular e de massa
Arte erudita popular e de massaArte erudita popular e de massa
Arte erudita popular e de massa
 
Unidade 1 - Aula 2 - Cultura popular, folclore e cultura popular brasileira
Unidade 1 - Aula 2 - Cultura popular, folclore e cultura popular brasileiraUnidade 1 - Aula 2 - Cultura popular, folclore e cultura popular brasileira
Unidade 1 - Aula 2 - Cultura popular, folclore e cultura popular brasileira
 
Manifestações da Arte Popular
Manifestações da Arte PopularManifestações da Arte Popular
Manifestações da Arte Popular
 
Origem das Manifestações Artísticas
Origem das Manifestações Artísticas   Origem das Manifestações Artísticas
Origem das Manifestações Artísticas
 
Engenharia de Produção Mecânica - FMU
Engenharia de Produção Mecânica - FMUEngenharia de Produção Mecânica - FMU
Engenharia de Produção Mecânica - FMU
 
Conservação e restauro: sector da actividade económica versus domínio científ...
Conservação e restauro: sector da actividade económica versus domínio científ...Conservação e restauro: sector da actividade económica versus domínio científ...
Conservação e restauro: sector da actividade económica versus domínio científ...
 
E-Governo e E-Serviços na Administração Pública de Florianópolis
E-Governo e E-Serviços na Administração Pública de FlorianópolisE-Governo e E-Serviços na Administração Pública de Florianópolis
E-Governo e E-Serviços na Administração Pública de Florianópolis
 
Hip-Hop: a Periferia Grita
Hip-Hop: a Periferia GritaHip-Hop: a Periferia Grita
Hip-Hop: a Periferia Grita
 
Quimica
QuimicaQuimica
Quimica
 
Acervo dvd mec
Acervo dvd   mecAcervo dvd   mec
Acervo dvd mec
 
Maceió
MaceióMaceió
Maceió
 
O mito da "Super-Tecnologia da Informação e Comunicação: os problemas e desaf...
O mito da "Super-Tecnologia da Informação e Comunicação: os problemas e desaf...O mito da "Super-Tecnologia da Informação e Comunicação: os problemas e desaf...
O mito da "Super-Tecnologia da Informação e Comunicação: os problemas e desaf...
 
Notas de corte sisu 20-01-2011
Notas de corte sisu   20-01-2011Notas de corte sisu   20-01-2011
Notas de corte sisu 20-01-2011
 
Comunicação em rede (2)
Comunicação em rede (2)Comunicação em rede (2)
Comunicação em rede (2)
 
Revista de-quimica
Revista de-quimicaRevista de-quimica
Revista de-quimica
 
Atelier de escrita de Natal
Atelier de escrita de Natal Atelier de escrita de Natal
Atelier de escrita de Natal
 
Livro Ecologia de Campo 2010
Livro Ecologia de Campo 2010Livro Ecologia de Campo 2010
Livro Ecologia de Campo 2010
 

Similar a Conservando a Arte Popular Brasileira

Cartilha_Digital_Jornadas_Arqueologia_Missioneira_NArq_MMJOM_(RECH_et_al_2015)
Cartilha_Digital_Jornadas_Arqueologia_Missioneira_NArq_MMJOM_(RECH_et_al_2015)Cartilha_Digital_Jornadas_Arqueologia_Missioneira_NArq_MMJOM_(RECH_et_al_2015)
Cartilha_Digital_Jornadas_Arqueologia_Missioneira_NArq_MMJOM_(RECH_et_al_2015)Raquel Machado Rech
 
Cartilha educação patrimonial jocenaide rosetto
Cartilha educação patrimonial   jocenaide rosettoCartilha educação patrimonial   jocenaide rosetto
Cartilha educação patrimonial jocenaide rosettoGleibiane Silva
 
Guia 10-semana museus-2012
Guia 10-semana museus-2012Guia 10-semana museus-2012
Guia 10-semana museus-2012DenizecomZ
 
Educação patrimonial lt taubaté nova iguaçu (versão de abril 2014)
Educação patrimonial lt taubaté nova iguaçu (versão de abril 2014)Educação patrimonial lt taubaté nova iguaçu (versão de abril 2014)
Educação patrimonial lt taubaté nova iguaçu (versão de abril 2014)Andre Lima Carvalho
 
Convite Cadernos Cenpec número 7 Educação e Cultura
Convite Cadernos Cenpec  número  7 Educação e CulturaConvite Cadernos Cenpec  número  7 Educação e Cultura
Convite Cadernos Cenpec número 7 Educação e CulturaCenpec
 
Convite Cadernos Cenpec número 7 Educação e Cultura
Convite Cadernos Cenpec número 7 Educação e CulturaConvite Cadernos Cenpec número 7 Educação e Cultura
Convite Cadernos Cenpec número 7 Educação e CulturaCenpec
 
11h00 aline rocha 24 08 barra
11h00 aline rocha 24 08 barra11h00 aline rocha 24 08 barra
11h00 aline rocha 24 08 barraslides-mci
 
PPT - Conselho Geral.pptx
PPT - Conselho Geral.pptxPPT - Conselho Geral.pptx
PPT - Conselho Geral.pptxMarilia Ceia
 
Apresentação do plano anual de atividades de 2015
Apresentação do plano anual de atividades de 2015Apresentação do plano anual de atividades de 2015
Apresentação do plano anual de atividades de 2015Luis Ludmer
 
Patrimonio imaterial ajtg
Patrimonio imaterial ajtgPatrimonio imaterial ajtg
Patrimonio imaterial ajtgElsa Fernandes
 
Projeto de Educação Patrimonial - levantamento e criação acervo museológico
Projeto de Educação Patrimonial - levantamento e criação acervo museológicoProjeto de Educação Patrimonial - levantamento e criação acervo museológico
Projeto de Educação Patrimonial - levantamento e criação acervo museológicoMuriel Pinto
 
Guia do Arquivo Público Municipal Olímpio Michael Gonzaga
Guia do Arquivo Público Municipal Olímpio Michael GonzagaGuia do Arquivo Público Municipal Olímpio Michael Gonzaga
Guia do Arquivo Público Municipal Olímpio Michael GonzagaArquivo Público de Paracatu
 
Boletim unesco2
Boletim unesco2Boletim unesco2
Boletim unesco2BE123AEN
 

Similar a Conservando a Arte Popular Brasileira (20)

Cartilha_Digital_Jornadas_Arqueologia_Missioneira_NArq_MMJOM_(RECH_et_al_2015)
Cartilha_Digital_Jornadas_Arqueologia_Missioneira_NArq_MMJOM_(RECH_et_al_2015)Cartilha_Digital_Jornadas_Arqueologia_Missioneira_NArq_MMJOM_(RECH_et_al_2015)
Cartilha_Digital_Jornadas_Arqueologia_Missioneira_NArq_MMJOM_(RECH_et_al_2015)
 
Cartilha educação patrimonial jocenaide rosetto
Cartilha educação patrimonial   jocenaide rosettoCartilha educação patrimonial   jocenaide rosetto
Cartilha educação patrimonial jocenaide rosetto
 
Imersão na prática ed. patrimonial
Imersão na prática   ed. patrimonialImersão na prática   ed. patrimonial
Imersão na prática ed. patrimonial
 
Kit Jovens
Kit JovensKit Jovens
Kit Jovens
 
Encontro dos Museus Salesianos de Dom Bosco
Encontro dos Museus Salesianos de Dom BoscoEncontro dos Museus Salesianos de Dom Bosco
Encontro dos Museus Salesianos de Dom Bosco
 
Património cultural imaterial da humanidade - o Cante Alentejano - Artur Fili...
Património cultural imaterial da humanidade - o Cante Alentejano - Artur Fili...Património cultural imaterial da humanidade - o Cante Alentejano - Artur Fili...
Património cultural imaterial da humanidade - o Cante Alentejano - Artur Fili...
 
Guia 10-semana museus-2012
Guia 10-semana museus-2012Guia 10-semana museus-2012
Guia 10-semana museus-2012
 
Educação patrimonial lt taubaté nova iguaçu (versão de abril 2014)
Educação patrimonial lt taubaté nova iguaçu (versão de abril 2014)Educação patrimonial lt taubaté nova iguaçu (versão de abril 2014)
Educação patrimonial lt taubaté nova iguaçu (versão de abril 2014)
 
Convite Cadernos Cenpec número 7 Educação e Cultura
Convite Cadernos Cenpec  número  7 Educação e CulturaConvite Cadernos Cenpec  número  7 Educação e Cultura
Convite Cadernos Cenpec número 7 Educação e Cultura
 
Convite Cadernos Cenpec número 7 Educação e Cultura
Convite Cadernos Cenpec número 7 Educação e CulturaConvite Cadernos Cenpec número 7 Educação e Cultura
Convite Cadernos Cenpec número 7 Educação e Cultura
 
11h00 aline rocha 24 08 barra
11h00 aline rocha 24 08 barra11h00 aline rocha 24 08 barra
11h00 aline rocha 24 08 barra
 
Museu
MuseuMuseu
Museu
 
PPT - Conselho Geral.pptx
PPT - Conselho Geral.pptxPPT - Conselho Geral.pptx
PPT - Conselho Geral.pptx
 
catalogo-ceramica-marajoara.pdf
catalogo-ceramica-marajoara.pdfcatalogo-ceramica-marajoara.pdf
catalogo-ceramica-marajoara.pdf
 
Apresentação do plano anual de atividades de 2015
Apresentação do plano anual de atividades de 2015Apresentação do plano anual de atividades de 2015
Apresentação do plano anual de atividades de 2015
 
Patrimonio imaterial ajtg
Patrimonio imaterial ajtgPatrimonio imaterial ajtg
Patrimonio imaterial ajtg
 
Projeto de Educação Patrimonial - levantamento e criação acervo museológico
Projeto de Educação Patrimonial - levantamento e criação acervo museológicoProjeto de Educação Patrimonial - levantamento e criação acervo museológico
Projeto de Educação Patrimonial - levantamento e criação acervo museológico
 
Guia do Arquivo Público Municipal Olímpio Michael Gonzaga
Guia do Arquivo Público Municipal Olímpio Michael GonzagaGuia do Arquivo Público Municipal Olímpio Michael Gonzaga
Guia do Arquivo Público Municipal Olímpio Michael Gonzaga
 
Boletim unesco2
Boletim unesco2Boletim unesco2
Boletim unesco2
 
Livro Museus de Maceió.pdf
Livro Museus de Maceió.pdfLivro Museus de Maceió.pdf
Livro Museus de Maceió.pdf
 

Último

Bullying - Atividade com caça- palavras
Bullying   - Atividade com  caça- palavrasBullying   - Atividade com  caça- palavras
Bullying - Atividade com caça- palavrasMary Alvarenga
 
Família de palavras.ppt com exemplos e exercícios interativos.
Família de palavras.ppt com exemplos e exercícios interativos.Família de palavras.ppt com exemplos e exercícios interativos.
Família de palavras.ppt com exemplos e exercícios interativos.Susana Stoffel
 
Simulado 1 Etapa - 2024 Proximo Passo.pdf
Simulado 1 Etapa - 2024 Proximo Passo.pdfSimulado 1 Etapa - 2024 Proximo Passo.pdf
Simulado 1 Etapa - 2024 Proximo Passo.pdfEditoraEnovus
 
Lírica Camoniana- A mudança na lírica de Camões.pptx
Lírica Camoniana- A mudança na lírica de Camões.pptxLírica Camoniana- A mudança na lírica de Camões.pptx
Lírica Camoniana- A mudança na lírica de Camões.pptxfabiolalopesmartins1
 
Apostila da CONQUISTA_ para o 6ANO_LP_UNI1.pptx
Apostila da CONQUISTA_ para o 6ANO_LP_UNI1.pptxApostila da CONQUISTA_ para o 6ANO_LP_UNI1.pptx
Apostila da CONQUISTA_ para o 6ANO_LP_UNI1.pptxIsabelaRafael2
 
Governo Provisório Era Vargas 1930-1934 Brasil
Governo Provisório Era Vargas 1930-1934 BrasilGoverno Provisório Era Vargas 1930-1934 Brasil
Governo Provisório Era Vargas 1930-1934 Brasillucasp132400
 
Guia completo da Previdênci a - Reforma .pdf
Guia completo da Previdênci a - Reforma .pdfGuia completo da Previdênci a - Reforma .pdf
Guia completo da Previdênci a - Reforma .pdfEyshilaKelly1
 
AD2 DIDÁTICA.KARINEROZA.SHAYANNE.BINC.ROBERTA.pptx
AD2 DIDÁTICA.KARINEROZA.SHAYANNE.BINC.ROBERTA.pptxAD2 DIDÁTICA.KARINEROZA.SHAYANNE.BINC.ROBERTA.pptx
AD2 DIDÁTICA.KARINEROZA.SHAYANNE.BINC.ROBERTA.pptxkarinedarozabatista
 
Época Realista y la obra de Madame Bovary.
Época Realista y la obra de Madame Bovary.Época Realista y la obra de Madame Bovary.
Época Realista y la obra de Madame Bovary.keislayyovera123
 
UFCD_10392_Intervenção em populações de risco_índice .pdf
UFCD_10392_Intervenção em populações de risco_índice .pdfUFCD_10392_Intervenção em populações de risco_índice .pdf
UFCD_10392_Intervenção em populações de risco_índice .pdfManuais Formação
 
Sociologia Contemporânea - Uma Abordagem dos principais autores
Sociologia Contemporânea - Uma Abordagem dos principais autoresSociologia Contemporânea - Uma Abordagem dos principais autores
Sociologia Contemporânea - Uma Abordagem dos principais autoresaulasgege
 
Modelos de Desenvolvimento Motor - Gallahue, Newell e Tani
Modelos de Desenvolvimento Motor - Gallahue, Newell e TaniModelos de Desenvolvimento Motor - Gallahue, Newell e Tani
Modelos de Desenvolvimento Motor - Gallahue, Newell e TaniCassio Meira Jr.
 
BRASIL - DOMÍNIOS MORFOCLIMÁTICOS - Fund 2.pdf
BRASIL - DOMÍNIOS MORFOCLIMÁTICOS - Fund 2.pdfBRASIL - DOMÍNIOS MORFOCLIMÁTICOS - Fund 2.pdf
BRASIL - DOMÍNIOS MORFOCLIMÁTICOS - Fund 2.pdfHenrique Pontes
 
Cultura e Sociedade - Texto de Apoio.pdf
Cultura e Sociedade - Texto de Apoio.pdfCultura e Sociedade - Texto de Apoio.pdf
Cultura e Sociedade - Texto de Apoio.pdfaulasgege
 
William J. Bennett - O livro das virtudes para Crianças.pdf
William J. Bennett - O livro das virtudes para Crianças.pdfWilliam J. Bennett - O livro das virtudes para Crianças.pdf
William J. Bennett - O livro das virtudes para Crianças.pdfAdrianaCunha84
 
A Arte de Escrever Poemas - Dia das Mães
A Arte de Escrever Poemas - Dia das MãesA Arte de Escrever Poemas - Dia das Mães
A Arte de Escrever Poemas - Dia das MãesMary Alvarenga
 
activIDADES CUENTO lobo esta CUENTO CUARTO GRADO
activIDADES CUENTO  lobo esta  CUENTO CUARTO GRADOactivIDADES CUENTO  lobo esta  CUENTO CUARTO GRADO
activIDADES CUENTO lobo esta CUENTO CUARTO GRADOcarolinacespedes23
 
trabalho wanda rocha ditadura
trabalho wanda rocha ditaduratrabalho wanda rocha ditadura
trabalho wanda rocha ditaduraAdryan Luiz
 

Último (20)

Bullying - Atividade com caça- palavras
Bullying   - Atividade com  caça- palavrasBullying   - Atividade com  caça- palavras
Bullying - Atividade com caça- palavras
 
XI OLIMPÍADAS DA LÍNGUA PORTUGUESA -
XI OLIMPÍADAS DA LÍNGUA PORTUGUESA      -XI OLIMPÍADAS DA LÍNGUA PORTUGUESA      -
XI OLIMPÍADAS DA LÍNGUA PORTUGUESA -
 
Família de palavras.ppt com exemplos e exercícios interativos.
Família de palavras.ppt com exemplos e exercícios interativos.Família de palavras.ppt com exemplos e exercícios interativos.
Família de palavras.ppt com exemplos e exercícios interativos.
 
Simulado 1 Etapa - 2024 Proximo Passo.pdf
Simulado 1 Etapa - 2024 Proximo Passo.pdfSimulado 1 Etapa - 2024 Proximo Passo.pdf
Simulado 1 Etapa - 2024 Proximo Passo.pdf
 
Lírica Camoniana- A mudança na lírica de Camões.pptx
Lírica Camoniana- A mudança na lírica de Camões.pptxLírica Camoniana- A mudança na lírica de Camões.pptx
Lírica Camoniana- A mudança na lírica de Camões.pptx
 
Em tempo de Quaresma .
Em tempo de Quaresma                            .Em tempo de Quaresma                            .
Em tempo de Quaresma .
 
Apostila da CONQUISTA_ para o 6ANO_LP_UNI1.pptx
Apostila da CONQUISTA_ para o 6ANO_LP_UNI1.pptxApostila da CONQUISTA_ para o 6ANO_LP_UNI1.pptx
Apostila da CONQUISTA_ para o 6ANO_LP_UNI1.pptx
 
Governo Provisório Era Vargas 1930-1934 Brasil
Governo Provisório Era Vargas 1930-1934 BrasilGoverno Provisório Era Vargas 1930-1934 Brasil
Governo Provisório Era Vargas 1930-1934 Brasil
 
Guia completo da Previdênci a - Reforma .pdf
Guia completo da Previdênci a - Reforma .pdfGuia completo da Previdênci a - Reforma .pdf
Guia completo da Previdênci a - Reforma .pdf
 
AD2 DIDÁTICA.KARINEROZA.SHAYANNE.BINC.ROBERTA.pptx
AD2 DIDÁTICA.KARINEROZA.SHAYANNE.BINC.ROBERTA.pptxAD2 DIDÁTICA.KARINEROZA.SHAYANNE.BINC.ROBERTA.pptx
AD2 DIDÁTICA.KARINEROZA.SHAYANNE.BINC.ROBERTA.pptx
 
Época Realista y la obra de Madame Bovary.
Época Realista y la obra de Madame Bovary.Época Realista y la obra de Madame Bovary.
Época Realista y la obra de Madame Bovary.
 
UFCD_10392_Intervenção em populações de risco_índice .pdf
UFCD_10392_Intervenção em populações de risco_índice .pdfUFCD_10392_Intervenção em populações de risco_índice .pdf
UFCD_10392_Intervenção em populações de risco_índice .pdf
 
Sociologia Contemporânea - Uma Abordagem dos principais autores
Sociologia Contemporânea - Uma Abordagem dos principais autoresSociologia Contemporânea - Uma Abordagem dos principais autores
Sociologia Contemporânea - Uma Abordagem dos principais autores
 
Modelos de Desenvolvimento Motor - Gallahue, Newell e Tani
Modelos de Desenvolvimento Motor - Gallahue, Newell e TaniModelos de Desenvolvimento Motor - Gallahue, Newell e Tani
Modelos de Desenvolvimento Motor - Gallahue, Newell e Tani
 
BRASIL - DOMÍNIOS MORFOCLIMÁTICOS - Fund 2.pdf
BRASIL - DOMÍNIOS MORFOCLIMÁTICOS - Fund 2.pdfBRASIL - DOMÍNIOS MORFOCLIMÁTICOS - Fund 2.pdf
BRASIL - DOMÍNIOS MORFOCLIMÁTICOS - Fund 2.pdf
 
Cultura e Sociedade - Texto de Apoio.pdf
Cultura e Sociedade - Texto de Apoio.pdfCultura e Sociedade - Texto de Apoio.pdf
Cultura e Sociedade - Texto de Apoio.pdf
 
William J. Bennett - O livro das virtudes para Crianças.pdf
William J. Bennett - O livro das virtudes para Crianças.pdfWilliam J. Bennett - O livro das virtudes para Crianças.pdf
William J. Bennett - O livro das virtudes para Crianças.pdf
 
A Arte de Escrever Poemas - Dia das Mães
A Arte de Escrever Poemas - Dia das MãesA Arte de Escrever Poemas - Dia das Mães
A Arte de Escrever Poemas - Dia das Mães
 
activIDADES CUENTO lobo esta CUENTO CUARTO GRADO
activIDADES CUENTO  lobo esta  CUENTO CUARTO GRADOactivIDADES CUENTO  lobo esta  CUENTO CUARTO GRADO
activIDADES CUENTO lobo esta CUENTO CUARTO GRADO
 
trabalho wanda rocha ditadura
trabalho wanda rocha ditaduratrabalho wanda rocha ditadura
trabalho wanda rocha ditadura
 

Conservando a Arte Popular Brasileira

  • 1. Caderno de Conservação e Restauro de Obras de Arte Popular Brasileira
  • 2. UNESCO Representação da UNESCO no Brasil Representante Vincent Defourny Coordenação para a área de Cultura Coordenadora Jurema Machado Museu Casa do Pontal Diretora-presidente Angela Mascelani Vice-presidente Jacqueline Van de Beuque Patrocínio Institucional Ministério da Cultura BNDES Petrobras Light Parceria Institucional IPHAN / Departamento de Museus e Centros Culturais Museu Casa do Pontal Estrada do Pontal, nº 3295, Recreio dos Bandeirantes Rio de Janeiro – RJ – Brasil – CEP: 22785-580 Tel/fax: (55) (21) 2490-3278 2490-4013 institucional@museucasadopontal.com.br www.museucasadopontal.com.br www.popular.art.br
  • 3. Caderno de Conservação e Restauro de Obras de Arte Popular Brasileira ______ 1a edição Rio de janeiro | 2008
  • 4. Caderno de Conservação e Restauro de Obras de Arte Popular Brasileira © Associação de Amigos da Arte Popular Brasileira - Museu Casa do Pontal / Unesco Coordenação Museu Casa do Pontal Documentação fotográfica Lucas Van de Beuque Pesquisa e textos Ana Gabriela Dickstein Revisão de conteúdos Angela Mascelani Simone Mesquita Joana Ortigão Corrêa Moana Van de Beuque Revisão de textos Sergio dos Santos Sergio Lamarão Elisa Rosa Produção Editorial Ana Gabriela Dickstein Projeto gráfico Joana Ortigão Corrêa Clarice Soter Eneida Déchery Consultoria Ione H. Pereira Couto Agradecimentos COPPE/UFRJ, CECOR/UFMG, Museu Nacional/UFRJ, Procedimentos museológicos Museu de Folclore Edison Carneiro, Museu Histórico Sergio dos Santos Nacional, Museu do Índio e Museu da Chácara do Céu. Caderno de Conservação e Restauro de Obras de Arte Popular Brasileira / Museu Casa do Pontal. Rio de Janeiro: Associação dos Amigos da Arte Popular Brasileira; Brasília: UNESCO, 2008 60 pp. ; 19,5 x 26,8 cm ISBN 978-85-60346-01-1 1. Museologia. 2. Conservação e Restauro. 3. Arte Popular Brasileira. I. Museu Casa do Pontal. II. UNESCO Este caderno foi produzido no Contexto de Cooperação UNESCO / Associação dos Amigos da Arte Popular Brasileira – Museu Casa do Pontal, Projeto “Caderno de Conservação e Restauro de Obras de Arte Popular Brasileira”, contrato nº CLT05999/2006. As opi- niões aqui expressas são de responsabilidade dos autores e não refletem necessariamente a visão da UNESCO sobre o assunto.
  • 5. 07 Abertura | UNESCO - Vincent Defourny 09 Abertura | Museu Casa do Pontal - Angela Mascelani 13 O diálogo com os parceiros: implantação de uma política de conservação participativa - Ione H. Pereira Couto 19 I. Considerações sobre conservação e restauro na arte popular brasileira 19 1. As múltiplas interfaces dos processos de conservação e restauro 22 2. Documentação de acervos 24 3. Conservação preventiva 27 4. Conservação e restauro 31 II. Procedimentos básicos de conservação e restauro 31 1. Procedimentos iniciais 32 2. Limpeza 32 2.1. A seco 32 2.2. Em meio aquoso 33 2.3. Com solvente 33 2.4. Com tolueno 34 3. Imunização 34 4. Restauração de partes danificadas 35 4.1. Colagem de partes que se quebram ou se descolam sem comprometer a sustentação 35 4.2. Colagem de partes em que houve fragmentação 35 4.3. Recuperação da sustentação 36 4.4. Recomposição estética 37 4.5. Recuperação da estrutura 38 4.6. Faceamento 39 III. Conservação e restauro em obras do acervo do Museu Casa do Pontal 40 1. Lavadeira, de Zé Caboclo 42 2. Casal com bebê, de Noemisa 44 3. Eletricista Trabalhando, de Luiz Antonio 46 4. Aguadeiro, de Domingos 48 5. Cidade baixa com dois grandes prédios, de Dadinho 50 6. Lampião e Maria Bonita, de Manuel Graciano 52 7. Escravidão, de Saúba 54 8. Serra Pelada, de Adalton 56 Bibliografia consultada
  • 6. Obra de Mestre Vitalino, Alto do Moura, PE – acervo Museu Casa do Pontal / Fotógrafo: Rômulo Fialdini
  • 7. Abertura | UNESCO Assim como o conhecimento transcende, cada vez mais, as fronteiras das especialidades, o desafio atual da UNESCO tem sido tratar de maneira articulada e complementar seus programas e instrumentos normativos na área da Cultura. E nesse ambiente de interdisciplinaridade, os Museus são vistos como um espaço-síntese para um enfoque integrado do patrimônio e da diversidade cultural, uma vez que re- presentam, por excelência, espaços educadores para a compreensão mútua e a coesão social. Com base nesses pressupostos, a UNESCO tem optado por focalizar sua ação na área de Museus nos países menos desenvolvidos, nas regiões de conflito e nas coleções mais significativas para a compreensão integrada do patrimônio e sua potencial contribuição para o desenvolvimento econômico, social e humano. Elemento central dessa estratégia é a construção de programas de formação para profissionais que atuam nos mais diversos contextos, muitos deles demandados a gerir ou a agir diretamente sobre temas que requerem uma vasta gama de áreas de conhecimento e de habilidades, desde a promoção de programas educativos, até a conservação preventiva e a segurança das coleções. Por essa razão, os programas de formação promovidos ou apoiados pela UNESCO têm privilegiado as técnicas simples e eficazes para a sal- vaguarda das obras, produzido material pedagógico e reforçado as redes de profissionais e de associações. A contribuição da UNESCO ao Museu Casa do Pontal para a sistematização e difusão do seu conhecimento sobre conservação de sua coleção de arte popular alinha-se perfeitamente com as preocupações e prioridades que descrevemos. O Museu reúne um conjunto de práticas exemplares, a começar pela origem da coleção, resultado do rigor e da persistência de anos de um particular, situação ainda tão rara no Brasil. Jacques Van de Beuque reuniu, e hoje estão disponíveis ao público, peças de arte popular de todo o país, objetos até então condena- dos à efemeridade, não apenas pelo seu suporte físico, mas por não serem considerados arte, menos ainda merecedores de tratamento museológico. Essa origem se relaciona diretamente com a vocação do Museu do Pontal para as parcerias, para o trabalho integrado com a comunidade e para a educação. Por utilizarem os materiais que se tem à mão, sobretudo o barro e a madeira, ou outros ainda mais frágeis e diversos, como a areia, palha, contas, tecidos, latões, penas de aves, e, ainda, por não terem sido produzidos com a intenção consciente de perenidade, os objetos de arte popular desafiam as técnicas de conservação. Somente o enfrentamento cotidiano de uma variedade de situações concretas poderia dar sub- sídio a um mínimo de generalização, se não de técnicas, pelo menos de critérios que possam ser transporta- dos para outras situações. Esse é o resultado imediato que almejamos ter alcançado com esse caderno. Mas, além de um manual que possa ser disseminado entre os museus com vistas à conservação de coleções análogas, pretende-se um pouco mais. É importante estimular a conservação de acervos existentes, não disponibilizados ou precariamente disponibilizados ao público, valorizando e ampliando o acesso à produção de arte popular em um país tão vasto e diverso como o Brasil. Segundo Angela Mascelani, diretora do Museu Casa do Pontal, essa produção que “apresenta os principais temas da vida social e do imaginário - seja por meio da criação de seres fantásticos ou de simples cenas do cotidiano - numa linguagem em que o bom humor, a perspicácia e a determinação têm lugar de destaque. (...) tem um “forte poder de comunicação, que ultrapassa as fronteiras de estilos de vida, situação socioeconômica e visão de mundo, interessando a todos de maneira indistinta.” Além do seu valor em si, pode desempenhar um papel importante na valorização das práticas, dos conhecimentos e das visões de mundo de parcela da população cujas expressões são pouco ou nada visíveis, apartada dos museus e das oportunidades de trocas culturais mais justas e equilibradas. Vincent Defourny Representante da UNESCO no Brasil
  • 8. Obra de de Manuel Galdino, Alto do Moura, PE – acervo Museu Casa do Pontal / Fotógrafo: Aníbal Sciarretta
  • 9. Abertura | Museu Casa do Pontal O Museu Casa do Pontal é considerado des de pesquisa, educação, preservação e di- atualmente o maior e mais significativo mu- vulgação. Dessa forma, a instituição construiu seu de arte popular do país. Está instalado em alicerces que permitem que o acervo seja so- um sítio de 12.000 m² localizado no bairro do cialmente protegido e amplamente usufruído. Recreio dos Bandeirantes, na Zona Oeste da Em 1991, parte significativa da coleção e da cidade do Rio de Janeiro, a poucos metros do edificação foram tombadas pelo Conselho de mar. Seus amplos jardins foram especialmente Defesa do Patrimônio Artístico e Cultural do desenhados para promover a integração entre Rio de Janeiro. O Museu já promoveu mais de a vegetação, as galerias do museu e a reserva quarenta exposições no Brasil e em 13 diferen- ecológica que se estende em torno. tes países. Desde 1996, desenvolve um Pro- Seu acervo, resultado de 40 anos de pes- grama Educacional e Social que, em 12 anos quisas e viagens por todo país do designer de atuação, já atendeu a mais de cento e cin- francês Jacques Van de Beuque, é composto qüenta mil participantes por meio de visitas por oito mil obras, feitas por mais de duzen- teatralizadas, exposições itinerantes e capa- tos artistas brasileiros e produzidas a partir de citação de educadores e gestores de projetos meados do século XX. A exposição permanen- sócio-culturais. A partir de 2006, a instituição te exibe, em seus 1.500 m² de galerias, cerca ampliou o leque de atividades culturais, ofe- de 4.500 obras organizadas tematicamente. A recendo, com maior regularidade, seminários, mostra abrange conteúdos relativos às ativi- oficinas e espetáculos. dades cotidianas, festivas, imaginárias e reli- A atuação do Museu Casa do Pontal em giosas, com obras representativas de variadas prol da divulgação e da democratização do culturas rurais e urbanas do Brasil. acesso à arte popular brasileira rendeu-lhe A missão do Museu é trabalhar pela me- diversas premiações. Em 1996, recebeu o mória, pelo reconhecimento e pela valorização Prêmio Rodrigo Melo Franco de Andrade, con- da arte popular do país, promovendo ativida- cedido pelo Instituto do Patrimônio Histórico
  • 10. e Artístico Nacional, por sua ação a favor da conta desses ou de outros métodos de limpeza. preservação histórica e artística do acervo. Em O que importa ressaltar é que houve um 2000, foi agraciado com o Prêmio D. Sebastião “processo”, tumultuado e negociado, através de Cultura outorgado pela Arquidiocese do Rio do qual as próprias pessoas da família – além de Janeiro. Em 2005, o Museu foi condecora- dos empregados, e seguramente, o coleciona- do com a Ordem do Mérito Cultural, principal dor – aprenderam a lidar com os objetos. Por comenda de caráter nacional que é oferecida se tratar de um gênero novo, suas regras de pelo governo federal e o Ministério da Cultura a conservação foram aparecendo à medida que pessoas e instituições com relevantes serviços a própria coleção avançava e se instituía en- prestados à cultura. Em 2006, a Assembléia quanto tal. Isso também mostra que havia uma Legislativa do Estado do Rio de Janeiro ofertou técnica a ser aprendida. à instituição a Medalha Tiradentes. O período de profissionalização da coleção É importante não perder de vista que essa – quando ela muda de grandeza e estatuto, atuação é o resultado de um processo no qual passando de uma ordem simbólica à outra – está implícita a disposição permanente para inaugura um outro momento, no qual o acervo a aprendizagem. Este caderno é fruto, exata- torna-se público e novas formas de tratamento mente, da longa trajetória do museu em prol da se impõem. conservação e preservação de seu acervo. A especificidade e a variedade das maté- Um dia, essa coleção foi pequena. Cabia rias-primas, presentes no conjunto total das no espaço de uma pequena sala, mas, mesmo obras, fizeram com que o Museu aprimorasse assim, teve que receber cuidados especiais técnicas e sistematizasse suas práticas. para chegar até nós hoje. Recuperar alguns Contudo, nem sempre é fácil falar sobre dados acerca da história da formação dessa a construção de certos conhecimentos que coleção pode ter uma dimensão didática im- passam ao largo da escolaridade formal e portante. Iniciada como uma coleção privada da vida acadêmica. Quando Jacques Van de em 1952, as obras começaram a ser acumu- Beuque criou este acervo, ele o fez, em parte, ladas, sem muita reflexão, como parte de um maravilhado com a destreza, a capacidade e projeto de ordem íntima. Integrante do universo a fluidez dos artesãos e artistas na feitura de essencialmente doméstico, os objetos ainda obras sobre os mais variados temas e formas. transitavam um pouco ingenuamente pelos Ele estabeleceu uma relação de identidade cômodos da casa, sem um lugar determinado. com os artistas populares e também assumiu, Os cuidados que eles recebiam também eram sem nenhum constrangimento, que não dese- muito simples e visavam, sobretudo, evitar o java teorizar sobre o assunto: apenas compra- acúmulo de poeira. va as obras que o instigavam, deixando sua Qualquer pessoa que tenha tido objetos imaginação fluir em consonância com o que desse gênero em casa, especialmente as ce- concebia como sendo a própria essência desse râmicas, pode testemunhar o quanto é difícil fazer. A construção do acervo uniu-se à cons- mantê-las “inteiras” por longo tempo. No caso trução de sua própria vida. Assim, Jacques em questão, as regras sobre a conservação das olhou para si e para os artistas e, desse modo, esculturas e modelagens foram sendo “desco- cuidou para que esse acervo chegasse íntegro bertas” através da prática. Ou seja, é provável aos dias atuais. que os objetos tenham passado por uma limpe- Pode parecer paradoxal que Jacques Van za geral em algum momento, assim como é pos- de Beuque não fosse um homem de museus. sível que muitas peças tenham se quebrado por Não havia trabalhado em um, nem havia es- 10
  • 11. tudado na universidade para isso. A coleção grando exposições itinerantes e na exposição se deu a partir de seu investimento afetivo, de permanente. Além disso, com o passar do seu “apaixonamento” pela arte popular, de seu tempo, aparecem os desgastes maiores, tanto interesse em produzir algo que viesse a suprir para o próprio acervo como para a edificação uma lacuna na sociedade, de sua obstinação que o abriga, para os jardins e para as áreas em aprender de maneira autodidata. Contudo, sombreadas. Até o aumento de público impli- embora não tenha estudado museologia, fre- ca em tempo maior de luzes acesas sobre as qüentava museus e especializou-se nesse mé- obras e em providências a serem tomadas no tier durante a vida por meio de sua profissão de sentido de minimizar sua deterioração. designer de exposições. As técnicas de vanguarda existem, mas Reunindo sua curiosidade intelectual, sua também é sabido que os recursos para ma- capacidade analítica, seu interesse pela siste- nutenção de acervos não são abundantes. matização, colocou-os, todos, a trabalhar para Portanto, é necessário contar com o trabalho a consecução de seu objetivo: criar um acervo de pessoas habilidosas, que colaborem com a e um espaço no qual as pessoas pudessem co- preservação dos objetos ao longo dos tempos. nhecer a arte feita pelo povo brasileiro em toda Isso não implica em descartar a importância sua grandeza. dos especialistas, dos estudantes que fizeram Essa mesma inspiração esteve radical- a universidade e foram se aperfeiçoando pouco mente presente no projeto deste museu. Em- a pouco porque esse tipo de conhecimento é bora, inicialmente, não houvesse nem restau- cumulativo e os problemas que ocorrem podem radores nem museólogos, isso não quer dizer sempre se apresentar de novas maneiras. Uma que Jacques Van de Beuque tenha se colocado quebra nunca é exatamente igual à outra. à parte das discussões que se travavam nes- Como na vida dos homens, a diversidade ses ambientes. Além de assinante de revistas também prepondera na vida dos objetos. Aliar e publicações especializadas em museus e ex- os saberes é a maior virtude que conservadores posições, sempre que possível ele consultava de uma instituição ou colecionadores podem e contratava profissionais brasileiros, quando ter. O que se deseja é que todos os trabalha- a necessidade e o dinheiro apresentavam-se dores do museu possam colaborar na manu- juntos, coincidiam. Mas essas ocasiões eram tenção preventiva de seu acervo. O objetivo do raras. Na maior parte das vezes, cercou-se de Caderno de Conservação e Restauro de Obras pessoas não formalmente especializadas, de de Arte Popular Brasileira é transmitir a expe- marceneiros, pintores, mestres de obras, estu- riência adquirida pelo Museu Casa do Pontal dantes de arte e arquitetura, desenhistas, de- ao longo de trinta anos. Temos sempre o que signers – autodidatas na arte da restauração. aprender e trocar. Aqui, compartilhamos o co- A lição que esse caderno traz é justamente nhecimento que adquirimos, e que tem sido que se podem unir saberes de origens muito aplicado em favor da proteção do patrimônio diversas e obter bons resultados. É evidente cultural brasileiro que nasce das camadas que não defendemos a precarização do tra- populares e representa parte fundamental da balho de conservação e restauro, entre outros memória, do imaginário e do potencial criativo motivos porque as múltiplas funções desem- de nosso país. penhadas na atualidade pelos museus trazem maiores desgastes para as obras. Hoje, os acervos estão mais dinamizados: em viagens, Angela Mascelani emprestados para instituições locais, inte- Diretora do Museu Casa do Pontal 11
  • 12. Obra de Nhozim, São Luís, MA - acervo Museu Casa do Pontal / Fotógrafo: Lucas Van de Beque 12
  • 13. O diálogo com os parceiros: implantação de uma política de conservação participativa Os museus não são lugares naturais. Foram – e são – construídos com vários objetivos, sendo uma de suas premissas básicas preservar os objetos para perpetuar sua existência. O ato de preservar inclui coleta, aquisição, acondicionamento e conservação dos bens materiais. Porém, o simples fato de serem objetos de museus não garante, a princípio, sua sobrevivência, visto que vários deles foram e são elaborados com materiais cuja permanência só é alcançada devido ao trabalho constante de conservação. Devido a esta característica, quando o processo de deteriora- ção se instaura por fatores endógenos ou exógenos é necessário intervir, sendo a restauração um dos caminhos mais comuns. A variada tipologia de objetos existentes em acervos museológicos é um dos grandes proble- mas enfrentados pelos profissionais dos museus quanto à adoção de política de preservação de seus bens materiais. Assim sendo, as informações levantadas a partir de cada objeto da coleção tornam-se reducionistas, pois não basta registrar a autoria do objeto, a matéria-prima emprega- da, fazer um estudo sobre o produtor (indivíduo ou grupo), conhecer o contexto de produção ou levantar os significados práticos e metafísicos que acompanham os objetos. Inserido em coleções, sua existência e permanência vão demandar outros níveis informacionais, associados a uma sis- temática de procedimentos concretos por parte daqueles que os conservam. Mas por que é necessário preservar os objetos de coleção? Muito se vem falando sobre “coleções”. Para o historiador alemão Philipp Blom, as coleções ajudam a livrar os indivíduos da impotência de não poder coordenar tudo, inclusive suas próprias vidas. Tal afirmação remete a uma observação feita por Auguste Comte1 sobre o equilíbrio mental promovido pelos objetos. Para ele, os objetos com os quais estamos em contato diário ajudam-nos a manter o equilíbrio mental, visto que mudam pouco e oferecem-nos uma sensação de permanência e estabilidade. Assemelham-se a uma sociedade silenciosa e imóvel, indiferente à nossa agitação e às nossas 1. In: HALBWACHS, Maurice. A mudanças, dando-nos a impressão de ordem e quietude. Mesmo estando alheios ao entorno, memória coletiva. São Paulo: os objetos levam, ao mesmo tempo, a nossa marca e a dos outros; eles nos prendem a uma Vértice, Editora Revista dos determinada sociedade, sensível e invisível, pois servem como elementos de distinção social, Tribunais, 1990. p.131. 13
  • 14. revelam os nossos gostos, reportam-nos a costumes e tradições, evocam-nos o passado, tanto pessoal como coletivo. As coleções também são comparadas a “retratos instantâneos”, visto que congelam momen- tos que a investigação histórica é capaz de revelar, apontando as situações nas quais os objetos se encontravam envolvidos quando da sua confecção. Vista dessa perspectiva, principalmente pelo olhar daquele que contempla e que busca conhecer sua estrutura mais profunda, a coleção revela que os objetos se encontram conectados a vários domínios, tanto aqueles relacionados ao produtor do objeto, indivíduos ou grupos, como aqueles relacionados a quem os coleciona e os conserva. Quanto ao produtor, podemos levantar informação sobre o meio social, econômico, seus valo- res morais e religiosos. Podemos estudar questões referentes ao gosto, à estética e às preferências no uso de determinadas matérias-primas. Podemos ainda, a partir de cada objeto, falar sobre os significados práticos e simbólicos que ele carrega. Sondar estas produções significa olhá-las de modo diverso, buscando esgotar a pluralidade de informações que acompanham cada objeto de coleção, visto que estes se encontram relacionados a outros tantos que foram elaborados isolada- mente e em momentos diferentes. Assim sendo, as informações obtidas a partir de cada item da coleção ampliam sua comuni- cação, revelando o quanto cada objeto suporta de informação, uma vez que eles possuem marcas específicas de memória, reveladoras da vida de seus produtores e usuários originais. Como es- tas marcas não são imanentes, cabe à instituição que o abriga tanto preservar o objeto quanto recuperar a informação que cada um carrega, qualificando-o como documento. Dessa forma, é papel das instituições que abrigam acervos criarem métodos, mecanismos e práticas capazes de garantir a conservação dos seus bens culturais. Daí a importância de preservar. A tarefa de preservar é central na gestão das instituições detentoras de acervos. A fim de ga- rantir a existência e a permanência dos objetos colecionados, sobretudo em instituições pequenas, é preciso conseguir a adesão de todos os profissionais que nela atuam. A adoção de medidas pre- ventivas simples auxilia, de maneira fundamental, o trabalho especializado exercido pelos conser- vadores, restauradores e museólogos. Este ponto é nevrálgico, pois envolve uma série de medidas que requerem, por parte da instituição, a adoção de políticas de conservação que abarquem as seguintes iniciativas: o treinamento do conjunto de trabalhadores, visando conscientizá-los do “valor” dos bens culturais que ali se encontram depositados; a qualificação dos profissionais di- retamente envolvidos com a preservação do acervo; a adoção de medidas de segurança mediante a instalação de equipamentos contra furtos e sinistros; e por último, mas não menos importante, a execução de melhoria das condições físicas dos locais onde os acervos se encontram. Essas providências são fundamentais para assegurar a longevidade do acervo. Independente dos motivos que levam um determinado objeto ser selecionado em detrimento de outro, o fato é que ser coletado significa ser valorizado e lembrado institucionalmente e ser exposto significa ser incorporado à memória, extra-institucional, dos visitantes do museu. São mo- vimentos realizados sobre o objeto por agentes públicos ou privados, que, por meio de um capital simbólico ou político, viabilizaram a escolha. Quando nos detemos na análise das circunstâncias que motivaram a reunião de um grupo de objetos em coleção, vemos que, na maioria das vezes, as motivações foram orientadas pelo valor sentimental, pelo gosto, pelo valor científico ou ainda pelo valor financeiro que cada objeto pode alcançar. Reunidos em coleções de museus, em centros de memória, em casas de cultura, em projetos científicos, os objetos têm seu público ampliado 14
  • 15. e passam, então, pela primeira transformação, aquela que os organiza, tendendo a reuni-los de forma a apresentar conteúdos de identidade cultural ou de conhecimento científico. É o caso de muitos acervos particulares que se tornaram públicos ou passaram a constituir museus. No Rio de Janeiro, temos como exemplos o Museu Casa do Pontal, o Museu Chácara do Céu e o Sítio Roberto Burle Marx, entre outros. Temos ainda coleções que, montadas inicialmente como parte de uma pesquisa, foram, mais tarde, integradas a instituições públicas, sendo os colecionadores orientados por variados obje- tivos. Como exemplo, temos as coleções do Museu do Índio, reunidas por diversos antropólogos, etnólogos e sertanistas que trabalharam, ou não, na instituição. Temos ainda museus ligados à história dos países, como é o caso do Museu Nacional, que nasceu da coleção particular de D. Pedro II e que hoje possui coleções de diversas origens e temas, ou do Museu Histórico Nacional, que constituiu seu núcleo principal a partir de um projeto de construção de nação. Atualmente, os museus comunitários inovam nas formas de constituição de acervos, reunindo objetos expressivos na história e memória de grupos socialmente marginalizados. Os objetos inseridos em coleções acabam determinando investimentos de conservação, exi- gindo daqueles que os conservam a implementação de práticas rotineiras de manejo e exposição. Daí a necessidade da utilização de “soluções” corretas para a higienização das peças, associadas a uma constante vigilância dos locais de acondicionamento e exposição, a fim de evitar a ação de agentes deletérios como insetos, roedores, fungos e outros microorganismos que se ali se ins- talam, seja devido à precariedade ou às características próprias dos ambientes de exposição, do acondicionamento ou do mobiliário. Há que se considerar ainda os fatores climáticos que colabo- ram para a deterioração das peças, como a umidade, a temperatura e a luminosidade. Por que é difícil conservar? Primeiro, porque os objetos, independente de estarem reunidos em coleção, não foram concebidos para “durar para sempre”. Um segundo fator está relacionado à ampla diversidade desse campo, cujas especificidades não são inteiramente contempladas pela bibliografia existente, o que acarreta conseqüências para o trabalho exercido pelos profissionais, que nem sempre têm a quem recorrer para esclarecer suas dúvidas. Um outro fator está ligado às descontinuidades de recursos financeiros disponibilizados nas instituições, os quais, às vezes, não são suficientes sequer para a manutenção de suas atividades. O diálogo proposto por esse Caderno de Conservação e Restauração de Obras de Arte Popular Brasileira é bem-vindo, sobretudo porque se assumiu como premissa a tendência atual de agir sobre o acervo utilizando-se de técnicas de conservação preventiva. Tais técnicas evitam trata- mentos mais drásticos, enfatizando a prevenção em detrimento da cura, principalmente dos acer- vos de arte popular e etnográficos, cuja bibliografia é mais restrita. O caderno também responde ao crescente interesse pela conservação preventiva dos bens culturais, fazendo dela um campo de trabalho interdisciplinar. Com efeito, a conversação preventiva vem sendo considerada como a solução mais eficaz e econômica para a realidade brasileira. Consultando a literatura recente, percebemos que as técnicas, assim como os métodos em- pregados, não se esgotam, do mesmo modo que não se esgotam os procedimentos adotados por cada instituição. Isso se deve, em grande parte, à especificidade de cada acervo, o que acaba por exigir o emprego diferenciado de técnicas de conservação; ao mesmo tempo, verifica-se que elas não são nem únicas nem definitivas. Na medida em que novas pesquisas sobre materiais vão sendo divulgadas, oriundas dos centros de ensino bem como de publicações especializadas, novas práticas podem ser gradativamente implementadas. 15
  • 16. Hoje já contamos com alguns cursos voltados para a formação profissional nas áreas de pesquisa, conservação e restauração, oferecidos por universidades, associações especializadas e entidades de classe, tanto em nível de graduação quanto em pós-graduação. O diálogo entre cientistas e profissionais de museus é elemento decisivo para o avanço nesta área. Notamos, tanto nos programas dos cursos que são oferecidos pelas instituições supracitadas como nos programas dos congressos, que o público-alvo são profissionais de áreas distintas, como museo- logia, química, física, engenharia, arquitetura e biologia, entre outros. A reunião de uma gama tão variada de pesquisadores oriundos das ciências exatas, biológicas e humanas, levou à geração de conhecimento sobre materiais e produtos que foram aproveitados, tanto no acondicionamento dos acervos quanto na higienização. Assim, podemos afirmar que o aperfeiçoamento dos métodos e técnicas empregadas na área de conservação e restauração é fruto da interdisciplinaridade, na busca de soluções técnicas e práticas para os mais distintos problemas. Atualmente, a conservação preventiva vem sendo apontada como a medida mais eficaz para os problemas enfrentados pelos profissionais da área de preservação de acervos museológicos. O conhecimento produzido nas mais distintas áreas visa identificar os fatores que interferem na estabilidade, assim como aqueles que danificam a estrutura dos objetos de coleção. O le- vantamento bibliográfico sumário das publicações recentes e a rápida leitura das referências bibliográficas dos textos e artigos voltados para a conservação de acervos museológicos reve- lam, o que não deixa de ser surpreendente, como a maioria dos textos está direcionada para a conservação e a restauração de acervos tradicionalmente ligados às práticas culturais ditas eruditas, oficiais ou mais refinadas. Esses textos encontram-se voltados para a conservação de telas, cuja base é o têxtil, princi- palmente o algodão, de esculturas de madeira ou pedra, de obras sobre papel, mobiliário e metal. Outros elementos surgem em menor escala, tais como as cerâmicas, os couros e as fibras vege- tais. Examinemos mais de perto estas últimas. As fibras vegetais mais abordadas são o algodão e o linho, além de outras, como o sisal, a juta e o líber, amplamente empregadas em várias partes do mundo, e também entre as populações regionais e indígenas do Brasil. Quando se tratam de cerâmicas, termo que abrange somente as cozidas, destacam-se principalmente a terracota, a louça, as faianças, as porcelanas e os arenitos. Por outro lado, a argila – simples ou decorada, com incisões ou pinturas – não vem sendo abordada, o mesmo ocorrendo com as peças de ces- taria, couro, borracha, sementes, espinhos, miçangas, penas, entre outros materiais. A plumária também serve como exemplo, uma vez que são poucos os artigos disponíveis a seu respeito e, além disso, a maioria deles está publicada em língua estrangeira, o que restringe muitas vezes a assimilação da informação. São estas matérias-primas comumente empregadas na elaboração de objetos de arte popular, utilizadas de maneira combinada ou não com outros elementos, que fazem da sua conservação um verdadeiro trabalho de pesquisa, associado à experiência pessoal que cada profissional ad- quire no contato diário com o acervo. A diversidade de acervos e de instituições museológicas está 2. A coleção Museologia – roteiros práticos, publicada diretamente relacionada à diversidade de profissionais de conservação e restauro, mas isso não originalmente pelo Museums, resultou ainda em diversidade de textos que abranjam os mais distintos materiais. Até mesmo a Libraries and Archives Council, conservação de arquivos digitais já encontra espaço nas publicações. Com base neste levanta- foi traduzida para o português mento verifica-se que o maior número de textos são traduções, cujos autores tiveram seus textos numa edição da Editora da Universidade de São Paulo com impressos originalmente em publicações especializadas, editadas por institutos de conservação a Fundação Vitae. internacionais tais como o Museums, Libraries and Archives Council2. 16
  • 17. Essas publicações são organizadas pela iniciativa de profissionais e de agências que se res- sentem da carência de informação que afeta a atividade de conservação dos acervos brasileiros. Hoje, mesmo dispondo de um maior número de publicações, as traduções nem sempre atendem a nossa realidade. Os fatores climáticos também constituem um sério problema. Temos acervos distribuídos em todo o território nacional, com variações climáticas consideráveis, que vão de clima tropical úmido, seco e árido ao subtropical, variações que fazem enorme diferença na adoção de medidas preventivas. Essas diferenças climáticas não são apontadas nas publicações disponíveis, visto que são frutos de realidades distintas. Pode-se verificar, entretanto, que os profissionais que atuam nos museus brasileiros pos- suem conhecimento, farto e abrangente, sobre os acervos com os quais lidam. Encontram-se atualizados a respeito das medidas preventivas na conservação e restauração. Essas informa- ções são adquiridas mediante a participação em congressos, workshops, jornadas e conferên- cias, tanto no Brasil quanto no exterior. Outra forma de troca de informações são as visitas que os profissionais fazem a outras instituições com o objetivo de conhecer as instalações, tais como reservas técnicas e laboratórios de restauração. Nessas oportunidades, é possível saber sobre bibliografia especializada, sem deixar de conferir ou confirmar dados sobre novos materiais, produtos e equipamentos. Não podemos esquecer também toda a atualização tornada possível pelo acesso à web, ins- trumento cada vez mais importante na disseminação do conhecimento. Algumas revistas especia- lizadas encontram-se disponíveis por meio eletrônico. Mesmo que a busca não seja rápida e fácil, a disponibilidade da informação é um fato. Entretanto, as dificuldades relacionadas à aquisição dos materiais indicados ainda não foram superadas, seja por se tratarem de artigos importados, cuja substituição por similar nacional nem sempre é possível, seja devido à falta de verbas insti- tucionais para sua aquisição. É interessante assinalar que a maioria dos textos sobre a conservação ou restauração de obje- tos museológicos enfatiza a necessidade do estudo do imóvel, do controle climático e dos materiais a serem utilizados no acondicionamento, informando que são estes elementos a chave para a con- servação preventiva. Essas medidas, associadas ao conhecimento da natureza de cada objeto da coleção, servem como ponto de partida para garantir a longevidade dos acervos museológicos. En- tretanto, poucos destes textos destacam que o fator humano é a coluna vertebral de toda conserva- ção, pois são as equipes de conservação que levarão a cabo as tarefas necessárias à preservação. Ione H. Pereira Couto Museóloga do Serviço de Museologia do Museu do Índio/RJ e doutoranda do Programa de Pós-Graduação em Memória Social da Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro – UNIRIO 17
  • 18. Nhô Caboclo, Águas Belas, PE - acervo Museu Casa do Pontal / Fotógrafo: Rômulo Fialdini 18
  • 19. I. 3. Noemisa Batista dos Santos (1947 - ). Nasceu em Caraí, no Considerações Vale do Jequitinhonha, MG, onde vive e trabalha como ceramista. sobre conservação Com estilo singular, tornou-se referência na arte popular brasi- leira. Utiliza o próprio barro, em e restauro na arte suas muitas tonalidades, para pintar as obras que cria. popular brasileira 4. Adalton Fernandes Lopes (1938- 2005). Nasceu em Niterói, RJ, onde passou toda a sua vida. Autor de obra vasta e diversifica- 1. As múltiplas interfaces dos processos de que imprimiu aos personagens em suas “gerin- da, privilegiou os tipos populares, conservação e restauro gonças”5, contrariando as expectativas sobre a compondo uma verdadeira capacidade do barro de suportar movimentos me- etnografia da vida fluminense. Criou engenhocas imensas, nas A arte popular apresenta uma ampla diversi- cânicos quando queimado de forma tradicional. quais centenas de personagens dade de matérias-primas e de técnicas aplicadas As variações entre o método de trabalho e as se movimentam animadamente. em seu processamento. Os artistas empregam técnicas adotadas são enormes e mesmo os ma- 5. A geringonça é um tipo de – às vezes, simultaneamente – métodos sim- teriais usados por cada um deles, em uma única máquina de fabricação caseira, ples associados a procedimentos complexos, o obra, podem ser bastante diversos. Nhô Caboclo6, inventada por alguns artistas para que configura um campo dinâmico, marcado por um dos grandes artistas com obras em exposição dotar de movimento suas criações escultóricas. Em sua feitura são experimentações e pelo uso de materiais alter- no Museu Casa do Pontal, usava madeira, ferro, utilizados diversos materiais, nativos, em alguns casos orgânicos e de baixo penas, linhas, tecidos e folha de flandres em seus como peças e engrenagens custo. Nessa produção, a criatividade não está trabalhos. A originalidade deste artista popular é industrializadas, arames, fios e necessariamente ligada a profundas informa- assim destacada por Sílvia Coimbra: quaisquer outros produtos que, reciclados, possam vir a contribuir ções de técnicas e à destreza nos modos de fazer; para a criação de um sistema que autores que pouco dominam os materiais que O instrumental de Caboclo, com o qual conse- permita a articulação das figuras utilizam convivem com artistas que são exímios gue os mais precisos efeitos, faz parte de sua e personagens. Por ser uma criação única, e não obedecer a conhecedores da madeira, seus cortes e diferen- produção própria, é quase todo construído por projetos e planos prévios, poucos, tes possibilidades de emprego, ou das etapas de ele: velhas facas de mesa, com apenas 3 cm de além de seus próprios idealizado- processamento da argila. Alguns se aprofundam gume, afiadíssimas; hastes de guarda-chuva res, são capazes de consertá-las. nessa relação e nas possibilidades de uso de de- improvisadas em estiletes; um monte de tam- Embora o significado da palavra, no dicionário Aurélio, remeta a terminados materiais, fazem experimentações e pas de latas de filmes recortadas, esperando “objeto de estrutura precária”, as descobrem caminhos próprios. Outros se mantêm a vez de servirem como cata-vento; marretas, geringonças ou “engenhocas”, fiéis às técnicas aprendidas no ambiente familiar martelos, pregos e parafusos de todos os tama- podem ser criações complexas. ou comunitário, reproduzindo na atualidade for- nhos; prensa, pua, grosas, serrotes, tesouras; 6. Nhô Caboclo (? – 1976). Sabe- mas de fazer cujas origens se perdem no tempo. extrato de nogueira, bugigangas que ele não se que ele é descendente direto Noemisa Batista3, por exemplo, apesar de ter pode ver passar sem pegar, no desejo de, um de índios e que nasceu na aldeia inovado em formas e temas, dá prosseguimento à dia, aproveitá-las em uma invenção. de Águas Belas, no interior de Pernambuco. Trabalhou basica- mesma técnica de modelagem e ao processo de (Coimbra, 1980, p. 277) mente com madeira e sucata, queima ensinado por sua mãe. Adalton Fernandes alcançando resultados surpre- Lopes4 não parou de inventar misturas de mate- Além de inventar seu próprio instrumental, endentes e estilo original. Em suas composições, privilegiou o riais, acrescentando cimento ao barro e, às vezes, certos artistas populares chegam a criar, com movimento, em obras em que os incorporando nas esculturas produtos diferentes, materiais mais acessíveis, produtos que, mesmo diversos elementos perseguem o como o papel machê. Isso sem falar na animação sem conservantes ou fixadores, produzem efeitos equilíbrio. Explorou a temática 19
  • 20. semelhantes a outros, desenvolvidos pela indús- Adalton Lopes foi um dos artistas que (cont.) tria química com largo uso no mercado. passou vários períodos no Museu, consertando marítima, com navios de guerrei- ros e escravos acorrentados. In- A freqüente mistura de clara de ovo com pig- suas geringonças. As trocas realizadas durante ventou linhas temáticas, nas quais mento em algumas obras, por exemplo, produz o essas visitas permitiram que se adquirisse in- se destacam os torés e os rachos. mesmo resultado que a têmpera7. A cola branca timidade e se acumulassem informações sobre Seu trabalho é caracterizado ainda diluída com pigmento pode ser comparada à tinta o funcionamento dos mecanismos criados por pelo uso intenso de penas de aves e das cores negra e vermelha. acrílica, enquanto o breu8 diluído em querosene e ele, como a determinação das velocidades com misturado com pigmento, tal como usado por Mes- que se movimentam as variadas hastes, as ra- 7. Pintura normalmente feita à base de pigmento e com tre Vitalino9, seria uma espécie de tinta a óleo. Em zões pelas quais cada uma delas se move num adesivo orgânico, como gelatina alguns casos, materiais aparentemente reprová- sentido diferente, os recursos utilizados para e clara de ovo, ou inorgânico, veis podem vir a se tornar recursos interessantes que cada personagem tivesse uma dinâmica como a cera. nos processos de conservação e restauração. Ma- própria e os materiais preferidos do artista. 8. Sólido usado na fabricação nuel Galdino10, por exemplo, usava durepox para Embora nem sempre a presença viva dos de uma resina que tanto dilui colar suas peças, o que é mais eficiente no caso de criadores das obras seja acessível, existem em solvente de petróleo como no calor. estruturas pesadas do que a cola branca. Embora outras maneiras de se obter informações rele- seu uso não seja recomendado, sendo preciso mui- vantes sobre o acervo, que incluem a consulta 9. Mestre Vitalino (1909-1963). ta experiência para saber avaliar corretamente sua a instituições ou colecionadores de acervos si- Nasceu na vila de Ribeira dos Santos, próximo a Caruaru, necessidade, o artista lançava mão desse recurso milares, a pesquisadores da área e a parceiros PE. Criado em ambiente oleiro, porque já havia tentado outras soluções, todas técnicos, além da investigação em publicações. cedo começa a modelar louças malsucedidas. Ele tornou-se um especialista em Especialmente no caso de instituições, é reco- e brinquedos em miniatura. sua própria arte, conquistando uma grande sabe- mendável reunir e organizar as publicações exis- Dotado de forte senso estético, produziu obras que, na ma- doria com relação aos materiais nela utilizados. tentes sobre os artistas e obras que fazem parte turidade, atraíram a atenção Como se vê, um dos grandes desafios da do acervo e tornar este material disponível para de críticos e colecionadores instituição ou do colecionador de arte popular é os profissionais de conservação e restauro. de arte. Em 1947, algumas conhecer as técnicas desenvolvidas ou utilizadas Essa soma de conhecimentos vai orientar a de suas esculturas foram expostas no Rio de Janeiro. Esta originalmente pelos artistas. Cada trabalho é construção de indicadores para as intervenções de exposição foi considerada um realizado com diferentes gradações de materiais, conservação e restauro. Isso vale tanto para cole- marco na história do interesse técnicas de preparo específicas e muitas experi- cionadores como para instituições; no caso destas pela arte popular, não só por revelar ao grande público a mentações. Portanto, todos esses aspectos pre- últimas, esse processo integrado deve reunir di- obra de Vitalino, como também cisam ser identificados antes do início das ações versos tipos de profissionais e colaboradores. por chamar a atenção sobre de preservação, conservação e restauro, num Livros como O mundo encantado de Antônio a existência desse gênero de conhecimento que deve agregar atualização téc- de Oliveira11 (Guimarães, 1983), no qual o próprio criação em diferentes regiões do país. Foi reconhecido como nica, vivência, disciplina e curiosidade. E, como artista fala da sua obra e do contexto em que Mestre por sua virtuose e pela cada obra tem a sua história, cada acervo de arte criou seus trabalhos, foram essenciais para nor- liderança que exerceu entre os popular apresenta características próprias, que tear os procedimentos que o Museu Casa do Pon- ceramistas do Alto do Moura, devem orientar a maneira como será cuidado. tal adotou na catalogação e na manutenção das bairro de Caruaru.  As particularidades da composição do peças. Da mesma forma, o acesso aos materiais 10. Manuel Galdino (1929- acervo do Museu Casa do Pontal – no qual a e tipos de pintura utilizados por Mestre Vitalino 1996). Nasceu na cidade de São Caetano, PE. Em 1940, mudou- aquisição das obras passou, muitas vezes, por foi resultado de processos formais de pesquisa. se para Caruaru, onde tornou-se relações diretas entre o colecionador Jacques Mesmo quando não há publicações específi- funcionário municipal. Sua tra- Van de Beuque e os artistas – permitiram que cas sobre os artistas, vale a pena buscar livros e jetória como artista teve início diversas técnicas adotadas por seus autores artigos periféricos, que falem sobre os contextos em 1974, quando foi destacado pela prefeitura para executar fossem conhecidas e levadas em consideração culturais, a região de origem e os recursos natu- serviços no Alto do Moura. no processo de conservação das obras. rais disponíveis. Um exemplo desse tipo de relação 20
  • 21. aconteceu no restauro da “Casa de Farinha”, de trajetória desse museu tem mostrado que existe João José12, obra que chegou ao Museu Casa do uma íntima correlação entre a eficácia obtida e o Pontal com várias partes descoladas. Nesse caso, comprometimento dos trabalhadores. Daí a im- (cont.) Lá fez amigos que o foi necessário entender a dinâmica de funciona- portância da experiência acumulada. Contudo, introduziram na arte de “bone- mento de uma casa de farinha verdadeira para que é recomendável adotar um manual de procedi- cos”, principal atividade local. a obra pudesse ser adequadamente reconstituída. mentos para os encarregados da manutenção e Apaixonou-se de tal maneira pela modelagem em cerâmica, As metodologias resultantes da sistemati- limpeza do espaço, de modo que a substituição que abandonou o serviço públi- zação de conhecimentos não só permitem acom- de pessoas não resulte em perda de memória dos co e mudou-se definitivamente panhar as ações como ajudam a tomar decisões processos e nem acarrete a queda na qualidade para o Alto do Moura. Suas criações formam um repertório sobre os tipos de intervenção adotados pelas di- do serviço prestado. Além disso, o manual pode de obras delirantes e originais, ferentes instituições. No Museu Casa do Pontal, colaborar para a minimização de acidentes, que consagrando os monstros auto- o setor de pesquisa foi responsável por sistema- também podem acontecer. fágicos, e outros personagens tizar e organizar as informações e os documen- Um manual não suprime, entretanto, a ne- de forte conteúdo onírico, como Lampião-Sereia e São Francisco tos sobre as obras e os artistas que fazem parte cessidade de diálogo permanente. A troca de Cangaceiro. da coleção reunida por Jacques Van de Beuque. informações sobre métodos e técnicas de con- 11. Antônio de Oliveira (1912- Portanto, os pesquisadores também integram servação, a adoção de diferentes práticas de 1996). Nasceu em Belmiro Braga, os processos de conservação e restauração, limpeza e de segurança e a introdução do uso de Minas Gerais. Aos seis anos, contribuindo com conteúdos sobre os aspectos materiais mais eficientes e comprovadamente começou a esculpir carrinhos históricos, sociológicos e formais. Além disso, os testados compõem um conjunto de medidas e de bois e outras peças com as quais brincava. Na adolescên- profissionais desse setor podem ser responsáveis práticas que, aplicadas de maneira integrada, cia, trabalhava consertando por definir, por exemplo, que obras participarão colaboram decisivamente para o sucesso da móveis durante o dia e esculpindo de exposições itinerantes. As peças selecionadas conservação e manutenção do acervo. “bonecos” à noite. Seduzido pela deverão passar por um processo de avaliação e, No Museu Casa do Pontal, são feitos plane- possibilidade de contar histórias com seus conjuntos de esculturas se necessário, por uma intervenção prioritária. jamentos constantes para definir as obras que miniaturizadas, Antônio de Oliveira Os encarregados pelos procedimentos de devem prioritariamente passar por tratamento entregou-se com paixão à recria- manutenção e limpeza do espaço físico onde um preventivo e de restauro. Esses critérios são ção de cenas reais ou imaginárias, que compunham o que chamava acervo está exposto ou em reserva também de- definidos em intercâmbio com os profissionais de “meu mundo encantado”. vem estabelecer comunicação direta com os pro- responsáveis pela elaboração dos projetos de- Refletiu sobre seu processo de fissionais de conservação. Quase sempre são os senvolvidos pela instituição. No planejamento criação, deixando muitas observa- responsáveis pela limpeza diária os primeiros a também são definidas as readequações do mo- ções escritas e gravadas. identificar o aparecimento de infestação por in- biliário e das dependências físicas, bem como 12. João José Paiva (1928 – ). Nas- setos, o que não se mostra facilmente. Por isso, a a aquisição de novos equipamentos. ceu em Cajá, próximo a Caruaru, preservação das obras depende da colaboração e Essas relações inter-institucionais desem- PE. Na adolescência transferiu-se do trabalho integrado entre vários profissionais. A penham um papel relevante porque nem sempre para o Alto do Moura, PE, onde vive até hoje. Aprendeu a modelar agilidade na comunicação dos problemas encon- profissionais, mesmo os mais experientes, têm o barro observando o trabalho de trados é fundamental, porque permite interromper isoladamente soluções capazes de abranger artistas da região, especialmente processos de deterioração com menores danos. tudo. Quando se trata de um acervo composto o de Mestre Vitalino. Com ele, chegou a vender seus bonecos No Museu Casa do Pontal, são feitas ins- por materiais extremamente variados, como é o na feira de Caruaru. Gostava de peções periódicas e conjuntas pelas equipes caso da arte popular brasileira, as necessidades fazer principalmente obras que de limpeza e conservação, nas quais ambas as podem ser muito diferentes. Os processos de con- reproduziam cenas de famílias: áreas podem aportar novos procedimentos num servação e restauro, dessa maneira, são multi- retirantes, trabalho e casamento. Atualmente, não trabalha mais intercâmbio saudável e necessário. Embora a facetados, incluindo uma gama de pessoas com com o barro, mas transmitiu seus limpeza e a conservação do espaço físico não diferentes formações, que devem cultivar uma conhecimentos aos filhos, que dão sejam consideradas funções especializadas, a atitude aberta em relação às novas descobertas. continuidade à arte cerâmica. 21
  • 22. 2. Documentação de acervos garismos ou do número total, neste caso quatro algarismos, relativo ao ano em que o objeto deu A documentação constitui-se como um entrada no museu, seguindo-se de um elemen- ponto primordial para o trabalho de conser- to de separação e, então, a numeração comum, vação, pois identifica e registra o histórico da de forma seqüencial, composta por quatro dí- obra. A catalogação de acervos pode ser feita gitos (Cândido, 2006, p. 40). de muitas maneiras e a partir de diversos su- No caso do Museu, mesmo com a colabo- portes. Fichas catalográficas, livros de registro, ração do colecionador, verificou-se a impos- fotografias e desenhos de diferentes ângulos sibilidade de precisar as datas de aquisição facilitam a identificação do estado das peças. das obras e, por conseguinte, decidiu-se não A catalogação das obras que compõem o adotar o uso desta informação. A numeração acervo do Museu Casa do Pontal foi iniciada das obras do acervo do Museu Casa do Pontal muitos anos após o princípio da coleção. Jacques é, portanto, composta somente por numeração Van de Beuque começou seu acervo na década seqüencial acrescida de uma letra quando se de 1950, e posteriormente adquiriu peças de ou- tratam de conjuntos de obras que não se en- tros colecionadores que abarcavam produções contram sobre base comum. feitas a partir da década de 1930. Em princípio, Como a arte popular se constitui, via de re- ele não dimensionava a representatividade e gra, por representações e criações envolvendo a abrangência que a coleção alcançaria. Seus conjuntos de peças que descrevem cenas do anseios voltavam-se para o apreço e a admira- cotidiano ou do fantástico, as peças do acer- ção que passou a nutrir sobre o universo da arte vo foram classificadas em conjuntos e obras. popular. Dessa forma, o processo de catalogação Assim, um conjunto é fichado inicialmente em só teve início na década de 1990, quando a Casa sua totalidade e, em seguida, cada obra recebe do Pontal adotou um novo perfil, que veio a soli- individualmente uma ficha especial. dificar seu papel museológico. O número de identificação das obras e con- Na instituição, o processo de catalogação juntos do acervo é fixado em suas bases, ou foi iniciado na mesma época que o de infor- quaisquer outros pontos menos acessíveis à matização. Os dados sobre as obras foram, vista. A mesma numeração identifica suas fi- em primeiro lugar, cadastrados em plataforma chas de catalogação. O Museu Casa do Pontal digital e, posteriormente, geraram documen- adota na ficha de conjunto os seguintes itens: tação impressa. Na época, foi feito um amplo Número, Nome do Conjunto13, Artista, Localidade levantamento acerca de bases de informações (Região), Tema, Década de Aquisição, Aquisi- adotadas por outras instituições e tais análises ção, Ano Provável de feitura, Número de Partes, levaram à adoção da plataforma Macintosh e Número de Obras, Peso, Altura, Largura, Com- ao uso do software File Maker Pro, indicado por primento, Situação Atual, Conjunto (Fixo, Livre 13. No caso da arte popular, são permitir agilidade e cruzamento de informa- etc.), Gênero, Suporte, Assinatura (Tem ou Não comuns os casos em que o próprio ções mesmo em consultas complexas. Tem), Tipo de Assinatura (Manuscrito, Carimbo autor não atribui um título à sua De um modo mais amplo, a numeração das etc.), Texto da Assinatura (o que foi escrito pelo obra, entretanto, mesmo as peças que originalmente não tenham obras é um dos pontos de partida do processo artista), Estado de Conservação (com cam- sido nomeadas pelos artistas, de catalogação. Segundo Maria Inez Cândido, po para laudo resumido), Defeito (com campo recebem um título descritivo, para não existe uma normatização rígida quanto à para laudo resumido), Descrição do Conjunto, facilitar sua identificação. Esses padronização da numeração. O mais comum, Material Principal, Características do Material títulos nunca devem se repetir, especialmente quando se tratam no entanto, é a utilização de registro binário Principal, Outros Materiais, Localização do Con- de obras do mesmo artista. seqüencial, que compreende o uso de três al- junto no Museu (Reserva Técnica ou Exposição 22
  • 23. Permante, incluindo Módulo e Setor). E na ficha bem-vindos, quando as instituições ou colecio- de obra, os itens: Número, Nome da Obra, Peso, nadores possuem muitos diferentes gêneros de Altura, Largura, Comprimento, Situação Atual objeto (objetos de arte, artesanato, utilitários, (onde está localizada no momento, por exem- festivos, rituais, indumentária etc.). Especifica- plo: em Exposição Temporária ou em Restauro), mente no Museu Casa do Pontal, como o acervo Situação Padrão (qual a localização padrão da é majoritariamente constituído por objetos de obra), Estado de Conservação (com campo para arte, essa opção classificatória não foi adota- laudo resumido), Defeito (com campo para lau- da. Vale ainda acrescentar a possibilidade de do resumido), Descrição da Obra. A carência de documentar os objetos por coleções, de modo a dados de campo consistentes e das caracte- recuperar as histórias de formação do acervo. rísticas específicas da arte popular brasileira As obras do acervo do Museu Casa do Pon- dificultou o trabalho de sistematização na fase tal também foram classificadas em 12 temas de catalogação das obras. Além disso, a inten- principais, obedecendo grosso modo a organi- ção de atender a vários objetivos simultâneos zação do roteiro da exposição permanente es- tornou esse processo bastante complexo. A idéia tabelecida por Jacques: profissões, vida rural, era, ao mesmo tempo, produzir uma informação ciclo da vida, festas, jogos e diversões, areias direta, em linguagem elegante, mas coloquial, e bichos, arte incomum, arte erótica, cangaço, incorporando, sempre que possível, as informa- história do Brasil, religião e ex-votos, carnaval. ções geradas nos diferentes meios onde se ori- Cada um destes temas, por sua vez, foi repar- ginaram as produções que integram o acervo do tido em 79 subtemas e estes em 380 assuntos. Museu e respeitando o longo trabalho de pes- Com essa classificação, é possível, por meio quisa empreendido por Jacques Van de Beuque. de uma busca tipológica no banco de dados, A partir dessa experiência, algumas so- conhecer rapidamente a quais obras, artistas luções mostraram-se mais eficientes. Para ou regiões se referem cada um desses temas, 14. Recentemente, o campo determinar um nome para as obras, por exem- subtemas ou assuntos. Para facilitar os me- da arte e da cultura popular plo, e para padronizar a descrição dos temas canismos de busca, muitas obras mereceram brasileira ganhou duas novas abordados, recomenda-se a adoção de dicioná- dupla ou tripla classificação. publicações que contribuem para a normatização de vocabu- rios, tesauros e bibliografia de referência so- Os procedimentos de conservação e res- lário específico: o Pequeno bre a temática específica de cada acervo14. Na tauração pelos quais passam as obras tam- dicionário da arte do povo época, foram adotadas como referência obras bém devem ser documentados. Esses dados brasileiro (2005), de Lélia como Dicionário do folclore brasileiro (Cascu- podem ser agregados à ficha de catalogação ou Coelho Frota, e o Tesauro de Folclore e Cultura Popular Bra- do, 1988), Folclore Nacional (Araújo, 1964) e O apontados separadamente. Neste caso, pode- sileira (2006), organizado pelo Reinado da Lua (Coimbra, 1980). A base con- se criar uma ficha de restauro, na qual serão Centro Nacional de Folclore e ceitual adotada foi posteriormente publicada registrados laudos do estado de conservação Cultura Popular. A classificação das obras do Museu Casa do pelo Museu Casa do Pontal em O Mundo da Arte da peça, incluindo constatação de sujidades, Pontal foi feita, entretanto, Popular Brasileira (Mascelani, 2002). detritos e interferências físicas, como quebras antes destas publicações, com A ficha catalográfica pode ainda conter e perdas, a data em que a obra foi retirada da o suporte integral da área de outros diferentes campos, inseridos de acor- exposição ou da reserva técnica15 e uma pro- pesquisa para o controle da terminologia. do com a especificidade de cada acervo. Um gramação de atividades a serem realizadas recurso visualmente interessante é indicar a cada processo de recuperação. Quando as 15. Espaço onde se armazenam os dados da obra diretamente sobre imagens ações previstas são finalizadas, o ideal é voltar as obras que não estão em exposição, com condições fotográficas (ou desenhos), com setas expli- à ficha de catalogação para atualizá-la com específicas de conservação, cando o estado de conservação de cada parte. observações sucintas sobre os procedimentos como armários especiais e Esquemas classificatórios também podem ser e datas de realização. climatização. 23
  • 24. O Museu Casa do Pontal adota os seguin- 3. Conservação preventiva tes itens nas fichas de restauro: Número, Nome, Artista, Data de Início do Restauro, Data de Fim Para qualquer coleção, o ideal é que se mi- do Restauro, Restaurador, Estado do Conjunto e nimize a necessidade de realizar intervenções. informações sobre cada tratamento realizado Uma conservação preventiva eficiente, ou seja, (Data, Colaboradores, Tratamento, Material Utili- aquela que se antecipa à necessidade de agir zado, Equipamentos Utilizados). diretamente sobre as obras, adia o processo Quando as obras forem emprestadas para natural de deterioração das peças. Segundo exposições em outros locais, também é recomen- Maria Cecília Drummond, dável preencher fichas de saída. Este documento deve registrar o local de destino das obras, as [...] o desafio para o conservador de museu datas de deslocamentos entre a instituição de é estabelecer procedimentos que conciliem, origem e a de destino (e vice-versa) e a ocasião harmonicamente, exposição e conservação. para as quais foram emprestadas. Outros dados Procurando alcançar condições próximas das também podem ser importantes, inclusive para a ideais de preservação, o profissional deve estar eventual realização de seguro nas obras, como os sempre ciente de todos os riscos aos quais os responsáveis pela recepção da obra nos locais de objetos freqüentemente se acham sujeitos... destino, especificações sobre embalagens, danos (Drummond, 2006, p. 111) identificados durante o processo, entre outros. Finalmente, arquivar de maneira prática e As condições ambientais – como tempe- eficiente todas essas fichas deve ser uma prio- ratura, umidade, luminosidade – situam-se ridade da instituição e do colecionador, já que entre os principais agentes de degradação das esses dados são utilizados com freqüência. Os peças. Por isso, para a adoção de medidas pre- meios digitais auxiliam o processo de armazena- ventivas, é fundamental conhecer o comporta- mento de dados, seja para construir bancos de mento dos materiais utilizados nas obras diante fichas catalográficas, seja para obter registros das condições às quais estão submetidas. Por visuais dos objetos, a partir das câmeras digi- exemplo, quando não há condições econômicas tais. No entanto, como a tecnologia encontra-se de se manter o ar-condicionado permanente- em rápida evolução, as demandas de reade- mente ligado, sobretudo em regiões de clima quação são constantes, sob pena dos suportes quente e úmido, o emprego de ventilação me- tornarem-se obsoletos e inoperantes. O banco cânica, associado ao uso de desumidificador16 de dados do Museu Casa do Pontal, por diversas para controle da umidade, pode ser uma opção razões, teve que ser transposto de Machintosh mais segura, já que evita a oscilação drástica para PC, alterando o programa de armazena- e recorrente de temperatura. mento de dados para SQL, em base especial- Da mesma forma, é necessário avaliar os mente desenvolvida para o acervo. A nova base tipos de iluminação adotados. A luz natural, trouxe novas possibilidades de pesquisa, combi- que pode ser economicamente mais viável e nação e armazenamento de dados. Entretanto, o ambientalmente mais correta, é quase sempre processo de migração de dados, como é de pra- uma boa opção, desde que se tenha o cuidado xe, precisou ser revisado com base nos arquivos de utilizar filtros que impeçam a incidência di- originais. Desta forma, é importante alertar para reta dos raios solares sobre as obras. 16. Aparelho que serve pra o fato de que sejam mantidos arquivos físicos, Já a poluição atmosférica e a poeira podem controlar a umidade relativa do ar em ambientes caseiros ou pois ainda não se sabe muito sobre a durabilida- causar manchas nas peças, modificando o as- industriais. de e confiabilidade dos arquivos digitais. pecto original delas. Esses agentes são prati- 24
  • 25. camente inevitáveis, mas seus efeitos podem raramente uma instituição dispõe de peritos ser suavizados com sistemas de filtragem do em todas as áreas necessárias. Embora, em ar e controle de ventilação. geral, os responsáveis pelas coleções e pelos Agentes biológicos – como fungos, micro- projetos saibam avaliar corretamente os pro- organismos, roedores e insetos, principalmente blemas existentes e seus efeitos no dia-a-dia, baratas, traças, cupins e brocas – também são é de grande valia a presença de observadores grandes inimigos no processo de preservação externos, atualizados em relação aos avanços de acervos. Algumas soluções recomendadas tecnológicos e voltados para uma reflexão mais são a imunização, a dedetização e a desratiza- sistemática sobre determinados temas. ção periódicas das dependências que abrigam Com o objetivo de aperfeiçoar sua atua- as coleções. Morcegos e pássaros, comuns em ção, o Museu Casa do Pontal, com a parceria locais onde as janelas são mantidas abertas, do Laboratório de Ciências da Conservação da também devem ser evitados, pois suas fezes Universidade Federal de Minas Gerais e o incen- podem danificar as obras. tivo da Secretaria de Patrimônio, Museus e Artes Além desses agentes, deve-se levar em conta Plásticas do Ministério da Cultura, realizou no o efeito da ação humana sobre as obras. Quando biênio 2000/2001 um completo levantamento de não estão protegidas por vitrines ou por outro tipo suas instalações. Nessa ocasião, foram levadas de isolante, as peças correm o risco de serem to- em conta, inclusive, as condições ambientais cadas e os contatos físicos, mesmo quando não do Rio de Janeiro, onde o calor e a umidade são provocam acidentes visíveis, depositam sobre as extremos, e da região específica onde se encon- obras partículas de gordura do corpo, que progres- tra a instituição, entre o mar e a Mata Atlântica. sivamente danificam os materiais. Mais ainda, a A experiência contou com a participação de toda fumaça de cigarro e os flashes de máquinas foto- a equipe da instituição e de profissionais de en- gráficas também constituem fatores prejudiciais genharia civil, mecânica e elétrica, arquitetura, à preservação das obras de arte. restauração, museografia e ciência da conser- Portanto, todo projeto de conservação pre- vação. Foram projetadas novas soluções para ventiva eficaz deve levar em conta uma multi- vitrines, pisos, alvenarias, telhados, drenagem plicidade de fatores. Embora o foco principal e entorno, bem como a readequação das insta- seja dirigido às obras, muitos outros itens lações elétricas e hidráulicas. devem ser analisados, a maior parte deles de Esse diagnóstico orientou a elaboração do fácil execução e ligados à observação criteriosa plano museológico17 da instituição, visando uma do ambiente e à capacidade de implantar roti- ação global em prol da conservação e da melho- nas que não sofram descontinuidades. ria de seus espaços e do desempenho de suas Em relação ao ambiente, todas as infor- funcionalidades, compreendida no âmbito da 17. De acordo com o art. 1º. mações são relevantes, desde os suportes e multidisciplinaridade de ações que caracterizam da Portaria Normativa/IPHAN vitrines utilizados até as características da o museu contemporâneo. No ano de 2005, esse n° 01, de 5.7.2006, o plano localidade onde se encontra a instituição, bem planejamento foi revisado e atualizado, em par- museológico é a “ferramenta básica de planejamento como os níveis de umidade relativa do ar, a ceria com a Fundação Coordenação de Projetos, estratégico, de sentido global e incidência solar, os sistemas de ventilação, Pesquisas e Estudos Tecnológicos (COPPETEC), integrador, indispensável para os tipos de materiais utilizados na edificação, da Universidade Federal do Rio de Janeiro. a identificação da missão da as peculiaridades do seu entorno, a quantida- Nesse planejamento, três ambientes me- instituição museal e para a definição, o ordenamento e a de e a freqüência do público etc. Todos esses receram atenção mais cuidadosa porque esta- priorização dos objetivos e das aspectos podem ser investigados com a parce- vam diretamente associados à conservação e à ações de cada uma de suas ria de equipes técnicas especializadas, já que restauração do acervo: o espaço e o mobiliário áreas de funcionamento”. 25
  • 26. expositivo, a reserva técnica e o laboratório. A reserva técnica, um colecionador pode contar substituição progressiva das vitrines do circuito apenas com um depósito para armazenar suas expositivo, por exemplo, tem sido um importante peças; um laboratório pode ser uma pequena passo para a conservação das obras. Os novos mesa disponível, e assim por diante. O impor- modelos respeitam o design original, mas são tante é estudar esses espaços de modo a en- mais adequados para a limpeza de rotina por- contrar suas melhores possibilidades. É certo que o sistema de fechamento foi modificado. que algumas soluções que, na atualidade, pa- Além disso, no lugar das madeiras antigas, mui- recem convenientes serão futuramente ultra- to suscetíveis aos freqüentes ataques de cupins, passadas, em virtude de novos experimentos foram adotados na estrutura o cedro e outras e descobertas. Assim, a experiência, a inves- madeiras nobres, em associação com o MDF18. tigação e a troca de informações constituem Na reserva técnica, a circulação de funcio- elementos importantes na atualização dos cui- nários para a retirada da água acumulada no dados com o acervo. desumidificador foi reduzida a partir da criação Qualquer instituição ou colecionador pode de uma saída direta. Isso permitiu que o apare- aplicar medidas de segurança simples nos lho ficasse ligado ininterruptamente, jogando a espaços que abrigam obras de arte popular. água nos jardins. Os armários têm uma espécie Além de uma vigilância constante das condi- de forro com Ph neutro, que é trocado periodi- ções de umidade, temperatura e luminosidade, 18. Placa fabricada a partir camente, evitando o contato da obra com o me- é necessário atentar para fatores que muitas da aglomeração e prensa de tal das prateleiras. vezes passam despercebidos. Certos sinais po- madeira moída e resina, que No caso do laboratório de conservação e dem indicar a necessidade de adequação dos apresenta grande resistência a insetos como o cupim. A eficá- restauro, a elaboração do projeto de adequação espaços, como ferrugem, manchas, goteiras e cia de seu uso, contudo, ainda é foi realizada com o auxílio das informações e respingos de água nas paredes ou no piso, o experimental. experiências colhidas durante visitas técnicas que pode esconder rachaduras, umidade, mofo 19. Aparelho utilizado para ao Museu Histórico Nacional, ao Museu da Chá- etc. Todos os materiais que constituem o abri- desinfestar obras atacadas por cara do Céu, ao Museu do Índio e ao Museu de go das obras, externa e internamente, como en- insetos e fungos, com o auxílio Folclore Edison Carneiro. Como um dos princi- canamentos, telhado, fiação e calhas, devem de um inseticida. Seu aspecto pais agentes deteriorantes do acervo do Museu ser vistoriados. Porém, ainda que se observem assemelha-se ao de um armário e possui um compartimento Casa do Pontal é o cupim, foi adquirida a maior todas essas medidas preventivas, procedimen- vedado com borracha, onde são câmara de fumigação19 disponível no mercado, tos de conservação sempre serão necessários. colocadas as obras. capacitada para a imunização de obras de Grande parte das obras vai para o laboratório 20. Espécie de prateleira, com quaisquer formatos e dimensões. Foram utili- porque é necessário realizar uma manutenção espaço para a higienização das zadas duas máquinas nas etapas de higieni- periódica: fezes e urina de insetos, teias de obras a vácuo. Uma entrada zação: uma de sucção de sólidos20 e outra de aranha, poeira, partículas sólidas, rastros de com um filtro de feltro e um sucção de líquidos21. A climatização é feita com lagartixas, ovos de baratas, asas de cupins, mecanismo de sucção suga e retêm as partículas sólidas da desumidificadores e ventiladores, que, juntos, por exemplo, devem ser retirados constante- superfície. equilibram umidade e temperatura. Optou-se mente da superfície das obras. Certos proce- por um controle padrão de umidade que favo- dimentos preventivos também podem garantir 21. Mesa perfurada de metal. Tem um duto para a sucção de recesse a ambientação da variedade de mate- uma grande longevidade às obras, tais como a líquidos, ligado a um aspirador. riais que passam pelo laboratório. adoção de regras de conduta nos espaços que A umidade é sugada pelos Outros espaços que abrigam coleções de abrigam os acervos. Fumar, comer, beber ou poros da mesa e depositada no arte popular certamente terão outras necessi- mesmo portar alimentos e bebida, por exemplo, interior do aspirador, evitando que a umidade produzida se dades e, em muitos casos, a própria separação são atitudes que devem ser evitadas em todas espalhe pelo ambiente. dos espaços pode ser diferente. No lugar da essas áreas. 26