2. Definição
Delirium é uma emergência geriátrica e, ao mesmo tempo, o distúrbio
psiquiátrico mais comum em pacientes idosos hospitalizados.
É uma síndrome que se inicia subitamente, tem curso flutuante e
manifesta-se por comprometimento global das funções cognitivas, distúrbio da
atenção e do ciclo sono-vigília e actividade psicomotora anormalmente elevada
ou reduzida.
Raramente é diagnosticado e/ou tratado, quando eventualmente
reconhecido. Na maioria das vezes é confundido com depressão, demência ou
psicose.
Diagnóstico
A palavra delirium define um estado de confusão mental aguda
potencialmente reversível. No vocabulário leigo, delirium denota um estado de
hiperactividade francamente psicótico. No idoso, a forma mais comum de
apresentação de delirium é a hipoactiva, com sonolência, por isso mesmo
raramente diagnosticada. Nessas situações, geralmente são os familiares os
primeiros a perceberem as primeiras alterações do estado mental do paciente.
De acordo com a versão mais recente do Manual Estatístico e Diagnóstico da
Associação Psiquiátrica Americana (DSM-IV), para o diagnóstico de delirium
requer-se a presença de quatro características fundamentais (Tabela). As três
primeiras características definem a síndrome de delirium e a quarta, sua
provável etiologia: doença física, toxicidade medicamentosa, abstinência,
múltiplas etiologias e, no caso de não se poder atribuir a nenhuma causa, sem
outra especificação (SOE).
Tabela – Critérios diagnósticos para delirium devido a doença clínica
A. Distúrbio da consciência (isso é, diminuição da percepção do ambiente) com
diminuição na capacidade para focalizar, manter ou mudar a atenção.
B. Uma alteração na cognição (tal como uma deficiência de memória,
desorientação, ou distúrbio de linguagem) ou o desenvolvimento de um
distúrbio da percepção que não possa ser atribuído a uma demência
preexistente, estabelecida ou em evolução.
3. C. O distúrbio desenvolve-se em curto espaço de tempo (usualmente horas a
dias) e tende a flutuar durante o curso do dia.
D. Há evidência na história, exame físico ou exames laboratoriais de que o
distúrbio seja causado pelas consequências fisiológicas directas de uma
condição clínica geral qualquer.
Fonte: American Psychiatric Association. Diagnostic and Statistical Manual of
Mental Disorders, Fourth Edition, 1994.
A primeira característica do delirium é o distúrbio da consciência, que
envolve alteração do nível de percepção do ambiente e redução da capacidade
para concentrar, manter ou mudar a atenção. O paciente idoso usualmente
mostra-se desatento, letárgico, sonolento, incapaz de obedecer a ordens
complexas ou manter raciocínio sequenciado, distraindo-se com muita
facilidade. Raramente o idoso com delirium apresenta-se hiperactivo, agitado
ou agressivo.
A segunda característica do delirium é a presença de distúrbios
cognitivos muito além do que se poderia esperar de uma demência
preexistente ou em evolução. Nesse caso, as manifestações vão da perda
evidente de memória, desorientação e alucinações até distúrbios leves de
linguagem e percepção. Nos pacientes com delirium, a fala é arrastada e
desconexa, a compreensão é falha e a escrita quase impraticável. O fenómeno
de perseverança é comum. A resposta à primeira pergunta geralmente é dada
à segunda ou terceira, denunciando a dificuldade que esses pacientes
apresentam para concentrar e mudar a atenção. Podem ocorrer também
ilusões e alucinações, mas, entre idosos, são mais comuns erros de
interpretação e identificação.
A terceira característica do delirium é a sua instalação aguda e seu
curso flutuante. Desenvolve-se em horas ou dias, característica de grande
importância cronológica no diagnóstico diferencial com demência. Acumulam-
se evidências de que os sintomas de delirium se tornem mais intensos ao
entardecer e durante a noite.
A quarta característica do delirium é a presença de uma ou mais
doenças clínicas ou de toxicidade medicamentosa. Os idosos são susceptíveis
ao desenvolvimento de delirium como consequência de uma grande variedade
4. de factores orgânicos que podem actuar isolados ou, com maior frequência, em
associação.
Prevenção
Desde a constatação de que delirium se acompanha de elevados índices
de morbidade e mortalidade, prevenir delirium tornou-se uma grande
preocupação e uma árdua tarefa, nem sempre coroada de êxito, já que os
factores determinantes são muitas vezes assintomáticos. Recente trabalho de
Inouye e colaboradores demonstra que podemos reduzir a incidência global de
delirium abordando preventivamente factores de risco como deficiências
cognitiva, visual e auditiva, privação do sono, imobilidade e desidratação. Essa
intervenção pode reduzir a incidência de delirium em 40%.