1. DECISÕES CLÍNICAS Rio de janeiro, 26 JUL 2014
PROFESSOR RICARDO R BASTOS
“...o pior é ouvir as pessoas dizendo
que é tudo da sua cabeça...”
PARTE I. Uma professora, de 37 anos, começa com “dor debaixo
da costela direita”. Segurada de plano de saúde, ela busca uma
consulta.
1ª pergunta: Quem ela vai procurar?
PARTE II. A consulta, que dura 10 minutos, leva a uma solicitação
de ultra-sonografia abdominal. Com o resultado, obtido em 2 dias,
há uma prescrição de escopolamina/dipirona e omeprazol.
2ª pergunta: Ao final de uma primeira consulta, 3 objetivos devem
ser alcançados; quais?
PARTE III. Sem melhora, retorna. A médica, agora, solicita
colonoscopia e TC abdominal, mantendo a prescrição.
3ª pergunta: Quando de uma consulta de retorno, o médico deve
iniciar com dois procedimentos; do que se trata?
PARTE IV. Os exames são completados em 1 semana. Durante
este período, a paciente tem dor constante, passando a acrescentar
ibuprofeno, por conta própria, às suas medicações. No retorno, a
médica lhe explica que existe um cisto no lobo hepático direito, que
mede 1,6cm, e propõe acrescentar cloxazolam.
4ª pergunta: O que está acontecendo aqui?
PARTE V. Com dores constantes, procura, por insistência de
familiares, outro especialista, que solicita uma urografia excretora.
Quando do resultado, o médico diz: você precisa procurar um
psiquiatra.
5ª pergunta: O que está acontecendo aqui?
PARTE VI. Já com 2 meses de dor, a professora procura outro
profissional. Chega para a consulta acompanhada do pai e portando
USG abdominal, TC abdominal, colonoscopia e urografia excretora.
O médico a acolhe, recebe os exames que, delicadamente, coloca
sobre uma escrivaninha, faz uma identificação preliminar, propõe a
primeira pergunta propiciatória e escuta a paciente contar sua saga.
2. Quando a mesma encerra sua fala, o médico começa a fazer
perguntas voltadas para a caracterização de sua dor.
6ª pergunta: O que está sendo posto em prática aqui?
PARTE VII. Esta primeira parte da entrevista permite a construção
do seguinte: Professora de 37 anos, em fins de doutorado, há 2
meses com dor no hipocôndrio direito, sem irradiação, constante
mas de intensidade variável, que a acorda à noite, sem relação com
posições ou alimentação, de caráter constritivo, sem febre, sem
náusea, sem vômitos e sem alteração nos ritmos excretores ou no
aspecto de urina ou fezes.
7ª pergunta: Como se chama o que foi construído?
8ª pergunta: Para que serve o que foi construído?
PARTE VIII. Na segunda parte da entrevista, o médico ainda fica
aprendendo que a professora não fuma, é etilista social, sofreu
acidente automobilístico há 9 meses (com traumatismo craniano
fechado/concussão cerebral/cefaléia prolongada na seqüência),
intolerância a bacalhau, hipotireoidismo há 3 anos (repõe l-tiroxina),
fluoxetina há 1 ano, trombose da veia central da retina direita após
2 anos de CO (isto há 15 anos), operada de apêndice e cisto
ovariano benigno.
8ª pergunta: Que grande objetivo da entrevista foi alcançado aqui?
PARTE IX. O médico procede ao exame físico de abordagem (EFA)
que é todo normal, à exceção de dor á palpação hipocôndrio direito,
que tem sua sensibilidade superficial diminuída, entretanto. O
reflexo cutâneo-abdominal superior está abolido à direita. O médico
faz então uma interpretação da dor (que explica à paciente) e faz
uma proposta de uma investigação básica de triagem (no sangue),
com provisão de um exame de imagem se a triagem for negativa.
9ª pergunta: Quais devem ter sido a interpretação da dor e o exame
de triagem?
PARTE X. O exame de triagem fica pronto em poucas horas e, com
o resultado positivo, a paciente é referenciada à hematologia e
hospitalizada, com prescrição de anti-coagulação e ampla
investigação, incluindo ângio-ressonância de tórax e abdome e
USG com dopplervelocimetria do eixo espleno-portal. Tem alta
medicada e com diagnóstico definido.
10ª pergunta: Qual deve ter sido o diagnóstico?
PARTE XI. Persiste com a dor, entretanto. Forte, a precisar de
opióides. Volta à consulta, com o mesmo médico que a referenciou.
3. O profissional repete o exame físico (com os mesmos achados já
descritos), prescreve medicação específica, e providencia o exame
de imagem que havia considerado na consulta pré-hospitalização.
O exame fica pronto e o diagnóstico se fecha.
11ª pergunta: Qual o diagnóstico final?
12ª pergunta: O que aprendemos aqui?