APELAÇÃO CÍVEL AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS POLO ATIVO ADVOGADO QUE ACOMPANHAVA CLIENTE NO CUMPRIMENTO DE MANDADO JUDICIAL PARA QUE PUDESSEM ADENTRAR NA SEDE DE SOCIEDADE EMPRESÁRIA POLO PASSIVO SÓCIO QUE INSISTIA EM
NÃO CUMPRIR A ORDEM EMPURRÕES E AGRESSÕES VERBAIS AO PROFISSIONAL DO DIREITO CONDUTA DESPROPOSITADA, EXPLOSIVA E DESTEMPERADA ABALO MORAL CONFIGURADO QUANTUM NECESSÁRIA
MAJORAÇÃO.
1. Apelação Cível n. 2006.008373-4, de Videira
Relator: Des. Subst. Jaime Luiz Vicari
APELAÇÃO CÍVEL ? AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS
MORAIS ? POLO ATIVO ? ADVOGADO QUE ACOMPANHAVA
CLIENTE NO CUMPRIMENTO DE MANDADO JUDICIAL PARA
QUE PUDESSEM ADENTRAR NA SEDE DE SOCIEDADE
EMPRESÁRIA ? POLO PASSIVO ? SÓCIO QUE INSISTIA EM
NÃO CUMPRIR A ORDEM ? EMPURRÕES E AGRESSÕES
VERBAIS AO PROFISSIONAL DO DIREITO ? CONDUTA
DESPROPOSITADA, EXPLOSIVA E DESTEMPERADA ?
ABALO MORAL CONFIGURADO ? QUANTUM ? NECESSÁRIA
MAJORAÇÃO.
Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Cível n.
2006.008373-4, da comarca de Videira (1ª Vara Cível), em que são apelantes e
apelados Dennyson Ferlin e Espólio de Gilberto Tonial:
ACORDAM, em Segunda Câmara de Direito Civil, por votação unânime,
conhecer de todos os recursos, desprover o agravo retido e a apelação interposta
pelo espólio de Gilberto Tonial e prover parcialmente o reclamo apresentado por
Dennyson Ferlin. Custas legais.
RELATÓRIO
Cuida-se de dois recursos de apelação interpostos contra a sentença
prolatada nos autos da "ação de indenização por dano moral e à imagem" ajuizada
por Dennyson Ferlin contra Gilberto Tonial.
Na inicial, o autor aduziu (fls. 2-9), em linhas gerais, que é advogado
militante e que patrocinou causa em favor de José Pozzan Neto em ações que
envolviam a sociedade empresária Auto Posto do Vinho Ltda., em que eram sócios o
seu cliente e o réu.
Em uma das demandas, foi concedida medida liminar para que José
Pozzan, ou pessoa por ele designada, tivesse acesso às dependências da sede da
sociedade e aos seus documentos contábeis.
Dessa forma, Wagner Natal de Lima foi nomeado procurador para atuar
na sociedade em nome de José Pozzan. Entretanto, em pouco tempo o réu expulsou,
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aos empurrões e ameaças, Wagner da sede da sociedade. Assim, o autor peticionou
ao Juízo no qual as ações tramitavam para que expedisse ordem de cumprimento da
decisão, o que foi deferido.
No dia 7 de julho de 2003, dirigiram-se ao posto o autor, José Pozzan,
Wagner Natal e o oficial de Justiça e, no decorrer do cumprimento do mandado
judicial, o réu começou a proferir diversas agressões verbais e empurrões, tudo
dirigido ao autor advogado ? esses fatos foram certificados pelo oficial de Justiça.
Após outras considerações sobre a vida pregressa do réu, do seu
patrimônio e de como sofreu abalo moral, pediu a condenação do demandado ao
pagamento de indenização.
O réu contestou sustentando (fls. 62-64), em linhas gerais, que o autor
invadiu a sede do posto sem a presença do oficial de Justiça e sem que ele (o réu)
estivesse presente, dirigindo-se diretamente ao cofre, do qual retirou documentos e
dinheiro em espécie. Ademais, o oficial não se identificou nem mostrou o mandado
judicial e que na discussão havida os ânimos ficaram acirrados - "foram proferidos
alguns xingões, foram lavadas algumas roupas sujas" (fl. 63).
O autor rechaçou a contestação (fls. 66-68) e informou que estava
sendo ameaçado de morte pelo réu (fls. 72-73) o qual, no entanto faleceu logo após
(fls. 81-82), havendo então a sucessão processual.
Foi então realizada audiência de instrução e julgamento (fls. 106 e
119-125), na qual foram ouvidas testemunhas e informantes, e interposto agravo
retido em razão de Dimi Mauro Vanz ter deposto na qualidade de informante; as
partes apresentaram alegações finais orais e a sentença acolheu o pedido,
condenando o espólio ao pagamento de indenização por danos morais no importe de
R$ 4.500,00.
Irresignadas, ambas as partes apelaram, pedindo o autor (fls. 132-135) a
majoração do quantum e o réu (fls. 137-143) o provimento do agravo retido e a
reforma da sentença, ao argumento de que os fatos alegados na contestação não
teriam sido comprovados; ou, sucessivamente, a redução da indenização.
Com as contrarrazões (fls. 147-149 e 151-155), os autos ascenderam a
este egrégio Tribunal de Justiça.
O Ministério Público, por meio do Procurador de Justiça Anselmo
Jerônimo de Oliveira, opinou (fls. 165-170) pelo conhecimento e provimento do
reclamo de Dennyson Ferlin e pelo conhecimento e desprovimento da apelação
interposta pelo espólio de Gilberto Tonial.
VOTO
Inicialmente, cabe a análise do agravo retido de fl. 119, interposto contra
a decisão prolatada em audiência, determinando que Dimi Mauro Vanz fosse ouvido
na qualidade de informante e não de testemunha.
Com efeito, está correta a decisão de primeiro grau. O artigo 405 do
Código de Processo Civil, § 3º, inciso III, dispõe que são suspeitos "o inimigo capital
da parte ou o seu amigo íntimo".
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Dimi Mauro Vanz, ao ser inquirido, disse já ter trabalhado com o falecido
réu e que ajudava, na data de seu depoimento, a companheira sobrevivente na
administração de uma empresa de transportes. Nesse sentido, veja-se como se
posicionou o Juiz de primeiro grau:
Mantenho a decisão de ouvir o Sr. Dimi Mauro Vanz na qualidade de
informante, posto que este mantém um grau de amizade não apenas com o falecido
réu, mas também com a Sra. Cesária Correa, representante legal do espólio. O
informante, na época dos fatos, era funcionário de carteira da empresa da qual o
requerido era sócio. Ademais, atualmente, ele, conforme afirmado em seu
depoimento, auxilia a Sra. Cesária na administração de uma empresa de transportes
da qual esta é proprietária, de modo que mantém de longa data, um grau de amizade
forte com o requerido, bem como seus herdeiros" (fls. 119-120).
Ora, o Magistrado a quo, próximo das partes e das testemunhas, ao
inquirir Dimi Mauro Vanz, concluiu que ele, conforme as suas próprias declarações,
era amigo íntimo tanto do falecido réu quanto de sua companheira sobrevivente e
representante do espólio. Dessa feita, pelos fatos narrados na decisão agravada (que
de fato demonstram amizade) e pelo princípio da confiança no juiz da causa, nega-se
provimento ao reclamo.
Passando às apelações, será analisada inicialmente a responsabilidade
do falecido Gilberto Tonial ? e a respectiva configuração do abalo moral ?
passando-se após, se for o caso, ao exame do quantum indenizatório fixado na
sentença.
Com efeito, em que pesem as razões desenvolvidas pelos herdeiros do
réu, restaram cabalmente provadas as alegações feitas na inicial e, por conseguinte,
o dever de reparar reclamado.
Às fls. 24 e 24v. encontram-se o "mandado de acompanhamento e
intimação" e a certidão do Oficial de Justiça, José Pedro Müller.
O mandado tinha por objeto efetuar "o acompanhamento junto ao
procurador do autor, para que o mesmo possa ter acesso às dependências do
estabelecimento comercial do Auto Posto do Vinho Ltda." e intimar Gilberto Tonial da
audiência de conciliação referente ao termo circunstanciado lavrado em decorrência
das ameaças anteriores.
Já a certidão conta com o seguinte teor:
CERTIFICO, que em cumprimento ao mandado retro, dirigi-me ao endereço
constante do mesmo, aí não encontrei o Sr. Gilberto Tonial. Enquanto aguardávamos
a chegada do requerido, os Senhores Dr. Dennyson Ferlin, procurador do
requerente, José Pozzan e Wagner Natal adentraram nas dependências do escritório
do requerido e de lá retiraram um pacote contendo notas fiscais e uma página do
relatório. Nesse interim o requerido chegou, já com o ânimo muito exaltado, retirou a
sua sobrinha que é funcionária da empresa, de dentro do escritório, deu empurrões
no Dr. Dennyson Ferlin e disse porque não entravam em seu escritório quanto ele ali
estivesse. Por várias vezes colocando a mão no rosto do Dr. Dennyson,
empurrando-o, disse-lhe palavras inconvenientes como: advogadinho de merda,
viadinho, putinha, e outras coisas. Para o senhor José Pozzan, o requerido disse que
era sujo e que por isso estava bem, o que o requerente retrucou que se ele fosse
sujo o requerido também era pois trabalhavam juntos, formando uma discussão
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bastante exaltada. O senhor Wagner Natal, disse-me que não tinha nenhuma
condição de continuar ali e retirar o que precisava. Dito isto o requerente e seu
defensor, mais o senhor Wagner Natal, mesmo em meio à discussão foram saindo
devagar, retirando-se do local. Após isso, li o inteiro teor do mandando, entreguei a
contrafé e intimei o requerido.
Em audiência de instrução e julgamento, o Oficial de Justiça foi ouvido,
confirmando a certidão e fornecendo mais alguns detalhes (fls. 109-110):
[...] que quando foi dar cumprimento ao mandado judicial, confirme fls. 24, o
autor, que era advogado de José Pozzan Neto, e este, se dirigiram ao
estabelecimento para acompanhar a diligência; que chegaram praticamente juntos
no posto; que o autor e seu cliente se dirigiram ao escritório, sempre acompanhados
do depoente, onde falaram com a secretária sobre o propósito da vinda deles; que no
momento Gilberto Tonial não estava presente; [...] que este [Gilberto] chegou uns 10
ou 15 minutos depois, bastante exaltado, e já mandando que saíssem dali, pois
ninguém podia entrar no escritório; que o depoente tentou explicar para o réu que
havia uma ordem judicial autorizando o ingresso deles no local, mas aquele estava
bastante nervoso e não ouvia ninguém; que o falecido requerido passou a ofender
principalmente o autor, com palavras de baixo calão e gestos impróprios; que o
falecido réu saiu empurrando o advogado, da porta do escritório, colocando a mão no
pescoço do advogado (pela parte de trás); que além disso o falecido réu chamou o
autor de "advogadinho de merda", "viadinho" e "putinha"; que o autor em nenhum
momento alterou a voz, mesmo com as ofensas de Gilberto, bem como, não revidou
com nenhuma palavra ou gesto à atitude do réu; [...] que o depoente confirma
também que enquanto xingava o advogado, Gilberto esfregava a mão no rosto do
mesmo, não com o objetivo de agredi-lo fisicamente, mas de forma inadequada para
a situação [...].
José Pozzan Neto, apesar de ouvido como informante, também
corroborou a versão apresentada na inicial.
Do outro lado, há fraca prova ? depoimento dos informantes Juceli
Debastiani (então secretária e sobrinha do falecido) e Dimi Mauro Vanz, com versões
divergentes da prova do autor da demanda e muito pouco críveis, pois o Oficial de
Justiça não teria se identificado, nem apresentado mandado judicial e tampouco
acompanhado Dennyson, José e Wagner para que entrassem na sede do posto de
combustíveis. Estes ainda teriam levado documentos que não poderiam e aberto o
cofre (com a insinuação de que levaram dinheiro).
Pode-se dizer que "o que configura o dano moral é aquela alteração no
bem-estar psicofísico do indivíduo. Se do ato de outra pessoa resultar alteração
desfavorável, aquela dor profunda que causa modificações no estado anímico, aí está
o início da busca do dano moral" (SANTOS, Antonio Jeová. Dano moral indenizável.
3. ed. São Paulo: Editora Método, 2001. p. 100).
Com efeito, não se trata aqui de fatos que geraram apenas um dissabor,
um incômodo cotidiano. Levando-se em conta o conjunto probatório, conclui-se que,
de fato, o recorrido foi xingado, humilhado, rebaixado, desdenhado, empurrado, isso
na frente do seu cliente e de outras pessoas e ao tentar cumprir o seu mister.
A atitude do falecido ofensor é injustificável, não havendo qualquer fato
que legitime a atitude no mínimo extremada, destemperada, explosiva e
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despropositada.
É inegável, pois, a ocorrência do abalo moral sofrido pelo recorrente, o
que leva à análise do quantum fixado pelo Juízo a quo em R$ 4.500,00, que, em
valores atualizados, perfazem aproximadamente R$ 5.171,00.
É certo que não existem parâmetros legais para a fixação da
indenização, devendo o órgão julgador observar, basicamente, a dor sofrida pela
vítima, ou seja, sua intensidade, duração e gravidade, assim como a capacidade
econômica e a condição social do lesante, de modo que o valor final compense, de
alguma forma, o dano, e, do outro, puna a ocorrência.
Como já dito antes, a conduta do apelado foi extremamente reprovável ?
o seu patrimônio, de outra banda, não é baixo, pois além ser sócio do posto já citado,
foi atribuído ao seu inventário o valor de R$ 250.000,00 (fl. 86).
Dessa forma, observados os parâmetros citados, o quantum deve ser
fixado em R$ 15.000,00, valor que se afigura proporcional, razoável e justo ante a
gravidade dos fatos e a capacidade econômica da parte lesante, bem como atende,
de um lado, ao efeito punitivo e, de outro, ao efeito compensatório-reconfortante.
Ante o exposto, o recurso de agravo retido de fl. 119 é conhecido e
desprovido, as apelações são conhecidas e a interposta pelo espólio de Gilberto
Tonial é desprovida e a apresentada por Dennyson Ferlin é provida, para fixar a
indenização por danos morais em R$ 15.000,00. Esse valor deve ser corrigido
monetariamente a partir do arbitramento (Súmula 362 do STJ), ou seja, do presente
acórdão, com incidência de juros a partir do evento (Súmula 54 do STJ), de 1% ao
mês.
DECISÃO
Nos termos do voto do Relator, esta Segunda Câmara de Direito Civil
decide, por unanimidade, conhecer de todos os recursos, desprover o agravo retido e
a apelação interposta pelo espólio de Gilberto Tonial e prover parcialmente o reclamo
apresentado por Dennyson Ferlin.
O julgamento, realizado no dia 25 de fevereiro de 2010, foi presidido
pelo Excelentíssimo Senhor Desembargador Nelson Schaefer Martins, com voto, e
dele participou o Excelentíssimo Senhor Desembargador Luiz Carlos Freyesleben.
Funcionou como representante do Ministério Público o Excelentíssimo
Senhor Procurador de Justiça Paulo Roberto de Carvalho Roberge.
Florianópolis, 8 de março de 2010.
Jaime Luiz Vicari
RELATOR
Gabinete Des. Subst. Jaime Luiz Vicari