2. A origem da palavra barroco tem suscitado muitas discussões. Segundo
alguns autores, a palavra tem origem no vocábulo espanhol barrueco, um
termo usado pelos joalheiros desde o século XVI, para designar um tipo de
pérola irregular e de formação defeituosa. Assim, o termo técnico, aplicado
às diferentes artes, passou a designar tudo o que era exagerado,
irregular.
3. O Barroco, embora tenha ganhado força a partir do século XVII,
está muito relacionado ao contexto da Contrarreforma, cujos marcos
históricos vêm do século anterior. Em 1517, o movimento religioso
conhecido como Reforma começa a dividir a igreja cristã em católicos e
protestantes. Essa divisão enfraquece a influência do catolicismo na
Europa, questionada há tempos pelo racionalismo dos humanistas e
renascentistas.
Com a Reforma, acentua-se a queda de poder político e
econômico do Vaticano, pois muitas regiões da Europa Ocidental em que
antes o catolicismo imperava passam a ser, majoritariamente,
protestantes.
A reação a esse quadro vem com a Contrarreforma, em 1563. A
igreja católica tenta recuperar prestígio e influência de vários modos. Um
deles é o incentivo às manifestações artísticas de temática religiosa, como
arma para fortalecer a fé católica.
4. No final do século XVI, a igreja reafirma a interpretação
dogmática e teocêntrica do mundo, combatendo o racionalismo
renascentista ainda em vigor. No meio disso está o artista, que, ao lidar
com esse embate filosófico e psicológico vivido nesse período, começa
a reconsiderar a importância da religiosidade, sem, no entanto,
desconsiderar as conquistas racionais.
Como expressão da crise em que vive, ou como tentativa de
escapar dela, o artista barroco lança mão de um grande rebuscamento
formal: ornamenta e decora suas igrejas e catedrais ostensivamente;
produz uma música rica em nuances; cria pinturas dominadas pelo jogo
de claro e escuro; constrói esculturas de alta dramaticidade e escreve
uma literatura repleta de jogos de palavras e de ideias.
Dentre os artistas barrocos, destacam-se as figuras dos italianos
Michelangelo Merisi da Caravaggio (1571-1610) e Gian Lorenzo Bernini
(1598-1680).
5. Por ser uma produção bastante diversificada, a poesia barroca atingia
leitores de diferentes estratos sociais: enquanto a lírica amorosa, religiosa
circulava nos salões da corte e nos ambientes frequentados pela burguesia mais
abastada, a poesia satírica encontrava receptividade entre a grande massa da
população. Já no caso da prosa, como são exemplos os Sermões de padre
Antônio Vieira no Brasil, os textos eram lidos por membros do clero, da nobreza
e da população em geral.
Formalmente, o Barroco apresenta duas vertentes bem definidas:
Cultismo: baseia-se na convicção de que o conhecimento do mundo pode se
dar por meio de sua descrição plástica; tal ideia se realiza por meio de jogos de
imagens, de palavras e de construções sintáticas.
Conceptismo: exploração dos jogos de ideias ou de conceitos; lança mão do
raciocínio, da lógica, de figuras de linguagem como a antítese e o paradoxo
na abordagem de temas escolhidos.
6. O padre Antônio Vieira é visto como o principal representante da oratória
sacra em língua portuguesa. Apesar de sacros, seus sermões abordam temas
que ultrapassam a esfera religiosa: trata de questões metalinguísticas, como
o próprio ato de discursar; jurídicas e humanísticas, quando faz a defesa de
leis contra a escravização dos indígenas; e políticas, quando critica a
corrupção e opina sobre as invasões holandesas no Brasil.
A obra de Vieira adota o conceptismo, trabalhando, sobretudo, com elaborados
jogos de ideias e argumentos de autoridade. No entanto, não lhe seria
possível chegar ao refinado trabalho conceitual que faz em seus Sermões se
não empregasse também jogos de palavras ,igualmente, rebuscados.
Compilado em 16 volumes, o conjunto de sermões do padre Vieira é numeroso
e variado. Pregado na capela real de Lisboa em 1655, o Sermão da
Sexagésima é um dos mais célebres. Nele, o orador discorre sobre o estilo dos
pregadores de sua época, considerando-os culpados pelo fato de a palavra de
Deus não fazer frutos, ou seja, não causar a conversão dos ouvintes.
7. O período de produção que pode ser delimitado como Barroco na literatura
brasileira dura aproximadamente um século (1601-1705), como em Portugal e
na Espanha. Já nas artes plásticas, principalmente a escultura, o período
prolonga-se pelo século XVIII e chega até princípios do século XIX.
Bento Teixeira (1561-1600) é considerado o autor da obra que marca o começo
do Barroco no Brasil: Prosopopeia. Publicado em 1601, o livro é um longo
poema narrativo sobre Jorge de Albuquerque Coelho, na época o donatário da
capitania de Pernambuco.
A crítica atribui pouco valor literário ao poema de Bento Teixeira, que
geralmente só é citado pelo seu valor histórico como introdutor da estética
barroca no Brasil. O grande realizador dessa estética em nosso país foi
Gregório de Matos (1636-1696).
8. A lírica de Gregório de Matos, composta principalmente de sonetos, é marcada pela
leitura que o escritor fez de poetas clássicos. Os poemas de Gregório de Matos podem
ser divididos em dois núcleos principais: um deles formado pelos que tratam da
problemática amorosa e outro que reúne os poemas de natureza reflexiva e filosófica.
A preferência pelos contrastes, tão ao gosto da arte barroca, aparecerá em ambos.
No primeiro núcleo de poemas, destacam-se textos que versam sobre a beleza da mulher,
contrastando-a com a passagem do tempo, que a deteriora. O tema do carpe diem, que
exalta as felicidades momentâneas, marca alguns dos seus versos.
Já os poemas de natureza reflexiva e filosófica tratam dos temas do
desconcerto/inconstância do mundo.
Mas a poesia satírica é, provavelmente, a parte mais popular da obra de Gregório de
Matos. Pelas críticas frequentes e impiedosas que fez a políticos e à organização social
da Bahia, o poeta ficou conhecido pelo famoso apelido de Boca do inferno.
Outro aspecto importante a ser observado na poesia de Gregório de Matos é a
recorrência da temática religiosa. Nesse ponto, manifesta-se com bastante clareza o
conflito entre a razão e a fé, muito presente na arte barroca.