A sentença, transitada em julgado, determina que o Estado mantenha permanentemente quadro adequado para o pleno funcionamento da Delegacia de Polícia, com pelo menos um delegado de polícia, um investigador, um comissário de polícia, um escrivão e um escrevente, todos servidores públicos concursados. Além disso, deve-se oferecer também atendimento durante as 24 horas do dia e durante o ano inteiro, em regime de plantão.
Protocolo Pisc Protocolo de Rede Intersetorial de Atenção à Pessoa Idosa em S...
Delegacia de Polícia de Forquilhinha - Sentença de 2012
1. ESTADO DE SANTA CATARINA
PODER JUDICIÁRIO
Comarca de Forquilhinha4
Vara Única
ESTADO DE SANTA CATARINA
PODER JUDICIÁRIO
Comarca de Forquilhinha4
Vara Única
Autos n°166.05.001079-9
Ação: Ação Civil Pública/Lei Especial
Autor: Ministério Público
Réu: Estado de Santa Catarina
Vistos, etc.
I – RELATÓRIO.
Cuida-se de ação civil pública ajuizada pelo Ministério Público
Estadual em face do Estado de Santa Catarina, ambos qualificados nos autos.
Aduziu a parte autora, em suma, a existência de inúmeras
irregularidades relacionadas à atividade da Polícia Civil na Comarca de
Forquilhinha/SC, apuradas preliminarmente em inquérito civil. Ressaltou exemplos de
irregularidades: a negativa dos servidores da Delegacia de Polícia em lavrar boletins
de ocorrência; a baixa de inquéritos policiais, termos circunstanciados e demais
procedimentos à Delegacia de Polícia para diligências, tornando e retardando a
prestação jurisdicional, sem prejuízo do decurso dos prazos decadencial e
prescricional; a instauração de inquérito policial enquanto se exigia a lavratura de auto
de prisão em flagrante; a ausência de recursos humanos na Delegacia de Polícia,
gerando o não atendimento durante os finais de semana e feriados, inclusive em caso
de prisões em flagrante, afora inquéritos policiais parados por mais de seis anos.
Sustentou, ainda, que não há Delegado de Polícia exclusivo, nem investigador
policial, contando com poucos funcionários, ocasionando inércia estatal, à medida
que cerca de 80% dos casos registrados deixam de ser apurados, sem falar na
circunstância do precário atendimento prestado. Sustentando, assim, sua legitimidade
para propor a presente demanda e também os direitos difusos e coletivos da
sociedade em jogo, consubstanciados nos direitos fundamentais do cidadão,
notadamente o da segurança pública, e o dever de proteção do Estado e o papel da
Polícia Judiciária, requereu a procedência do pedido para condenar o Estado a
manter permanentemente na Delegacia de Polícia desta Comarca, pelo menos, um
delegado de polícia, um investigador de polícia, um comissário de polícia, um
escrivão de polícia e um escrevente de polícia, como também a manter a Delegacia
de Polícia acessível à população 24 horas por dia, todos os dias do ano. Juntou
documentos (fls. 39/821).
1
Houve pedido de antecipação dos efeitos da tutela, o qual foi
Endereço: Rodovia Antônio Valmor Canela, 106, Santa Izabel - CEP 88.850-000, Forquilhinha-SC - E-mail: forquilhinha.unica@tjsc.jus.br
2. ESTADO DE SANTA CATARINA
PODER JUDICIÁRIO
Comarca de Forquilhinha4
Vara Única
ESTADO DE SANTA CATARINA
PODER JUDICIÁRIO
Comarca de Forquilhinha4
Vara Única
postergado até a oitiva do réu (fls. 822 e 833/838). Após a manifestação do Estado,
sobreveio sentença de extinção do feito sem resolução de mérito, por falta de
interesse de agir superveniente (fls. 843/845).
O Ministério Público interpôs recurso de apelação, ao qual foi
dado parcial provimento para "reconhecer a perda parcial do objeto e determinar o
prosseguimento do feito em relação aos pedidos remanescentes" (fls. 909/914).
Os autos retornaram a este juízo, quando se deu o recebimento
da inicial e o indeferimento do pedido de antecipação de tutela (fl. 925).
Contra esta decisão, o Ministério Público interpôs agravo de
instrumento, com a concessão parcial dos efeitos da tutela recursal (fls. 944/946).
O Estado foi citado, apresentando contestação às fls. 948/971.
Em preliminar, aduziu ausência de interesse processual do autor, pois superado o
objeto da ação por ele manejada e também impossibilidade jurídica do pedido, por
afronta ao princípio da separação dos poderes. No mérito, sustentou que qualquer
medida que atenda aos pedidos constantes na inicial implicará na indevida ingerência
do Poder Judiciário nas decisões do Poder Executivo, razão pela qual pugnou pela
improcedência dos pedidos. Acostou documentos (fls. 972/973).
Réplica às fls. 974/975.
As partes foram instadas a declinar as provas que pretendiam
produzir (fl. 984), tendo o autor postulado a designação de audiência para oitiva de
testemunhas e outras diligências (fl. 985), enquanto o réu, o julgamento antecipado
(fl. 930).
Designada audiência à fl. 1.006. Na ocasião, foram inquiridas
seis testemunhas (fls. 1.010/1.015; 1.034/1.035 e 1.044/1.045).
Encerrada a instrução, os autos foram ao Ministério Público que
ofereceu alegações finais (fls. 1.048/1.053), seguindo ao Estado que apresentou
memoriais às fls. 1.058/1.061.
Sobrevieram ao feito novos documentos (fls. 1.064/1.066),
dando-se nova vista às partes para, querendo, aditar as alegações finais.
O Ministério Público o fez às fls. 1.068/1.074, juntando nova
manifestação e documentos às fls. 1.076/1.099, do que ciência teve a parte ré,
2
Endereço: Rodovia Antônio Valmor Canela, 106, Santa Izabel - CEP 88.850-000, Forquilhinha-SC - E-mail: forquilhinha.unica@tjsc.jus.br
3. ESTADO DE SANTA CATARINA
PODER JUDICIÁRIO
Comarca de Forquilhinha4
Vara Única
ESTADO DE SANTA CATARINA
PODER JUDICIÁRIO
Comarca de Forquilhinha4
Vara Única
apresentando aditamento às alegações finais às fls. 1.103/1.105.
Juntados novos documentos pela parte autora (fls. 1.153/1.157),
ouviu-se a parte ré, manifestando-se às fls. 1.582/1.583.
É o relatório.
II – FUNDAMENTAÇÃO.
Cuida-se de ação civil pública aforada pelo Ministério Público
Estadual em face do Estado de Santa Catarina, buscando a condenação desta de
cunho cominatório de obrigação de fazer.
A legitimidade da parte autora para propor a presente
demandada decorre do disposto no artigo 129, inciso II, da Constituição Federal;
artigo 25 da Lei n.º 8.625/93, e artigo 1º, IV, 3º e 5º, todos da Lei n.º 7.347/85, os
quais concedem ao Ministério Público a prerrogativa e o dever de tutelar, afora outros,
os direitos difusos e coletivos, in casu consubstanciados pelo dever do Estado em
garantir ao cidadão o direito à segurança pública por meio de seus órgãos de
execução (CF, art. 5º, caput e 144), bem como de prestar serviço público contínuo e
adequado, conforme se depreende do disposto no artigo 175, parágrafo único, inciso
IV, da CF, e dos princípios que regem (ou deveriam reger) a Administração Pública.
Ultrapassada esta questão, passo ao exame da preliminar de
impossibilidade jurídica do pedido, pois a de falta de interesse processual
confunde-se com o mérito e com ele será analisado.
A prefacial de impossibilidade jurídica do pedido arguída pelo
Estado ao fundamento de que qualquer decisão aqui proferida violaria a
independência e a harmonia entre os três Poderes, sepultando o artigo 2º da
Constituição Federal, não merece trânsito.
Há muito que o E. Supremo Tribunal Federal, na qualidade de
guardião da Carta Constitucional, entende que pode e deve o Poder Judiciário
determinar à Administração Pública que adote medidas assecuratórias de direitos
constitucionalmente reconhecidos como essenciais, sem violar o princípio da
separação de poderes.
Na espécie, como mencionado, em foco está o direito individual
do cidadão à garantia constitucional concernente à segurança pública, cabendo
indubitavelmente ao Poder Público, entenda-se aqui Poder Executivo, a
3
Endereço: Rodovia Antônio Valmor Canela, 106, Santa Izabel - CEP 88.850-000, Forquilhinha-SC - E-mail: forquilhinha.unica@tjsc.jus.br
4. ESTADO DE SANTA CATARINA
PODER JUDICIÁRIO
Comarca de Forquilhinha4
Vara Única
ESTADO DE SANTA CATARINA
PODER JUDICIÁRIO
Comarca de Forquilhinha4
Vara Única
implementação de medidas para isso alcançar minimamente, sob pena de malferir
outros preceitos constitucionais.
Nessa senda, lanço julgados do STF:
Agravo regimental no agravo de instrumento. Constitucional. Ação civil
pública. Obrigação de fazer. Implementação de políticas públicas.
Possibilidade. Violação do princípio da separação dos poderes. Não
ocorrência. Precedentes. 1. O Poder Judiciário, em situações excepcionais,
pode determinar que a Administração Pública adote medidas assecuratórias
de direitos constitucionalmente reconhecidos como essenciais, sem que isso
configure violação do princípio da separação de poderes. 2. Agravo
regimental não provido." (AI 708667 AgR, Relator(a): Min. DIAS TOFFOLI,
Primeira Turma, julgado em 28/02/2012, ACÓRDÃO ELETRÔNICO DJe-069
DIVULG 09-04-2012 PUBLIC 10-04-2012).
AGRAVO REGIMENTAL EM RECURSO EXTRAORDINÁRIO.
CONSTITUCIONAL. ADMINISTRATIVO. ILEGALIDADE DO ATO QUE
INDEFERIU O PEDIDO DE REINTEGRAÇÃO DO SERVIDOR NO QUADRO
DA POLÍCIA MILITAR. OFENSA AO PRINCÍPIO DA SEPARAÇÃO DOS
PODERES. INEXISTÊNCIA. 1. Ato administrativo vinculado. Indeferimento do
pedido de reintegração do servidor na Corporação. Ilegalidade por não terem
sido observados os direitos e garantias individuais assegurados pela
Constituição Federal. 2. Reexame da decisão administrativa pelo Poder
Judiciário. Ofensa ao princípio da separação de poderes. Inexistência. A
Carta Federal conferiu ao Poder Judiciário a função precípua de controlar os
excessos cometidos em qualquer das esferas governamentais, quando estes
incidirem em abuso de
poder ou desvios inconstitucionais. Precedente. Agravo regimental não
provido’ (RE nº 259.335/RJ-AgR, Segunda Turma, Relator o Ministro Maurício
Corrêa, DJ de 7/12/2000).
Rejeito, assim, a preliminar.
Antes de adentrar ao mérito propriamente dito, mister ressaltar
que houve superação parcial do objeto da presente ação, conforme decidiu o E.
Tribunal de Justiça de Santa Catarina, ao manter em parte a sentença de fls. 833/838,
quando extinguiu o feito sem resolução de mérito, pela superveniência de falta de
interesse de agir do Ministério Público.
Na ocasião, consoante se infere do acórdão de fls. 909/914, o
eminente Desembargador Relator deixou expresso que:
"(...) não bastasse a falta de funcionários específicos ao desempenho
satisfatório das atividades, vislumbra-se a precariedade dos serviços
prestados na Delegacia de Polícia de Forquilhinha.
4
Endereço: Rodovia Antônio Valmor Canela, 106, Santa Izabel - CEP 88.850-000, Forquilhinha-SC - E-mail: forquilhinha.unica@tjsc.jus.br
5. ESTADO DE SANTA CATARINA
PODER JUDICIÁRIO
Comarca de Forquilhinha4
Vara Única
ESTADO DE SANTA CATARINA
PODER JUDICIÁRIO
Comarca de Forquilhinha4
Vara Única
Assim, conclui-se que a actio perdeu tão somente parte de seu objeto, em
razão da ocorrência de fato superveniente, qual seja, a contratação de
parcela dos funcionários requeridos à Delegacia (...)." [grifei]
Tal circunstância deu-se porque, no curso do feito, aportou aos
autos informação de que alguns dos cargos descritos na inicial foram preenchidos,
razão pela qual remanescem outros requerimentos formulados na peça exordial e que
reclamam análise.
Ainda que tente o Estado-réu argumentar a falta de interesse de
agir superveniente, em razão de que, em princípio, superadas as causas que deram
ensejo à presente demanda, não é este, definitivamente, o quadro que se desenhou
ao longo do processo, que já tramita nesta unidade jurisdicional desde o ano de 2005.
Com efeito, o fundamento básico da ação civil pública ora em
análise prende-se, como referido, no direito do cidadão à segurança pública e no
dever do Estado em garantir minimamente o serviço que daí decorre, implementando
políticas e meios materiais e humanos para tanto, de forma a prestar serviço público
adequado, eficiente, seguro e especialmente contínuo.
Nessas águas, a propósito, transcrevo parte do voto proferido
pelo ínclito Desembargador Newton Janke, ao apreciar o mérito do agravo de
instrumento interposto contra a decisão que indeferiu o pedido liminar (agravo de
instrumento n.º 2008.033556-7), in verbis:
"(...) É intuitivo que situações dessa natureza comprometem a prestação dos
serviços que, para ser eficiente, há de ser contínua, em áreas tão sensíveis,
como a saúde e a segurança públicas.
O risco de dano para a população é por demais evidente.
Ainda que se resvale para o óbvio, é preciso gizar que o serviço de
segurança a cargo das autoridades policiais não tolera solução de
continuidade. Crimes e ocorrências não esperam, nem marcam hora.
Não se ignora que, não apenas na área de segurança pública, há carência de
pessoal, mesmo quando a Administração providencie a realização de
concursos públicos para supri-la. No entanto, é inaceitável que isso se
prolongue indefinidamente, ainda mais em um Município que é sede de
Comarca e vizinho contíguo do maior Município do sul do Estado, Criciúma,
local de origem do Exmo. Sr. Secretário da Segurança Pública do Estado.
Não cabe, no caso específico, invocar o recorrente argumento de que, em
respeitoso obséquio ao princípio constitucional da separação dos poderes,
refoge à competência do Judiciário imiscuir-se e ditar ordens para o
Executivo, como seria o caso de impor aos administradores a nomeação ou a
contratação de servidores.
O Supremo Tribunal Federal, intérprete último e máximo da Constituição
Federal, excepciona a possibilidade da ingerência do Poder Judiciário nos
5
Endereço: Rodovia Antônio Valmor Canela, 106, Santa Izabel - CEP 88.850-000, Forquilhinha-SC - E-mail: forquilhinha.unica@tjsc.jus.br
6. ESTADO DE SANTA CATARINA
PODER JUDICIÁRIO
Comarca de Forquilhinha4
Vara Única
ESTADO DE SANTA CATARINA
PODER JUDICIÁRIO
Comarca de Forquilhinha4
Vara Única
casos em que a omissão administrativa importa em clara inobservância de
comando legal cogente. A propósito:
"Embora resida, primariamente, nos Poderes Legislativo e Executivo, a
prerrogativa de formular e executar políticas públicas, revela-se possível, no
entanto, ao Poder Judiciário, determinar, ainda que em bases excepcionais,
especialmente nas hipóteses de políticas públicas definidas pela própria
Constituição, sejam estas implementadas pelos órgãos estatais
inadimplentes, cuja omissão - por importar em descumprimento dos encargos
político-jurídicos que sobre eles incidem em caráter mandatário - mostra-se
apta a comprometer a eficácia e a integridade de direitos sociais e culturais
impregnados de estatura constitucional" (STF, RE-AgR nº 410.715/SP, Rel.
Min. Celso de Mello, j. em 22/11/05).
Segundo a Constituição Federal, "a segurança pública, dever do Estado,
direito e responsabilidade de todos, é exercida para a preservação da ordem
pública e da incolumidade das pessoas e do patrimônio" (art. 144). Como se
vê, o legislador constituinte conferiu à segurança pública status tão relevante
quanto a educação e a saúde, uma e outra conceituadas também como
direito de todos e dever do Estado (arts. 196 e 205, ambos da CF).
Como serviço voltado à garantia da paz social, a segurança pública deve ser
prestada em obediência ao comando previsto no art. 22 do Código de Defesa
do Consumidor: "Os órgãos públicos, por si ou suas empresas,
concessionárias, permissionárias ou sob qualquer outra forma de
empreendimento, são obrigados a fornecer serviços adequados, eficientes,
seguros e, quanto aos essenciais, contínuos".
Logo, em face de preceptivos tão incisivos, não há falar em afronta ao
princípio da separação dos poderes se o Judiciário se limita a determinar o
cumprimento de mandamento legal incontrastável.
Mutatis mutandis, nesse sentido evoca-se pronunciamento desta Corte:
"O art. 95 da LEP é claro ao determinar que "em cada região haverá, pelo
menos, uma Casa do Albergado, a qual deverá conter, além dos aposentos
para acomodar os presos, local adequado para cursos e palestras". Por isso,
a ausência de Casa do Albergado na região de Araranguá configura omissão
da Administração Pública quanto à obrigação imposta por lei, não se podendo
falar, de qualquer modo, em discricionariedade. Assim sendo, nada impede
que o Poder Judiciário seja acionado para suprir dita omissão, sem configurar
invasão na competência do Poder Executivo, porque não há qualquer
interferência no mérito administrativo (conveniência e oportunidade).
Ademais, pensamento diverso acarretaria ofensa ao art. 5º, XXXV, da CRFB
(princípio da inafastabilidade do Judiciário ou acesso à Justiça), segundo o
qual o Poder Judiciário não pode se esquivar da apreciação de lesão ou
ameaça a direito, o que autoriza, inclusive, a intervenção deste nos demais
Poderes para suprir ilegalidades. [...]
Não se pode falar em violação à separação dos poderes, nem em
discricionariedade administrativa, quando houver norma constitucional ou
infraconstitucional que imponha uma obrigação ao Poder Público, exigível em
ação civil pública ajuizada pelo Ministério Público. Isto porque o Estado não
pode se eximir do cumprimento das obrigações expressamente impostas na
legislação ordinária e na Constituição, o que retira a discricionariedade do ato
6
administrativo, tornando-o vinculado.
Endereço: Rodovia Antônio Valmor Canela, 106, Santa Izabel - CEP 88.850-000, Forquilhinha-SC - E-mail: forquilhinha.unica@tjsc.jus.br
7. ESTADO DE SANTA CATARINA
PODER JUDICIÁRIO
Comarca de Forquilhinha4
Vara Única
ESTADO DE SANTA CATARINA
PODER JUDICIÁRIO
Comarca de Forquilhinha4
Vara Única
'As meras diretrizes traçadas pelas políticas públicas não são ainda direitos
senão promessas de lege ferenda, encartando-se na esfera insindicável pelo
Poder Judiciário, qual a da oportunidade de sua implementação.
Diversa é a hipótese segundo a qual a Constituição Federal consagra um
direito e a norma infraconstitucional o explicita, impondo-se ao judiciário
torná-lo realidade, ainda que para isso, resulte obrigação de fazer, com
repercussão na esfera orçamentária.
Ressoa evidente que toda imposição jurisdicional à Fazenda Pública implica
em dispêndio e atuar, sem que isso infrinja a harmonia dos poderes,
porquanto no regime democrático e no estado de direito o Estado soberano
submete-se à própria justiça que instituiu. Afastada, assim, a ingerência entre
os poderes, o judiciário, alegado o malferimento da lei, nada mais fez do que
cumpri-la ao determinar a realização prática da promessa constitucional.'
(STJ. REsp 577836/SC. Rel. Min. Luiz Fux. Julgado em 21.10.2004)' (Ap. Civ.
nº 2007.063653-8, Rel. Des. Sérgio Roberto Baasch Luz, j. em 29/08/08).
(...)".
Da análise do autos, extrai-se, de fato, que após o ajuizamento
da ação houve algum esforço do Estado com o fito de reverter a situação aqui
verificada, ou seja, dar efetividade à garantia constitucional do cidadão à segurança
pública, equipando com material humano a Delegacia de Polícia local e preenchendo,
na medida do possível, as omissões anteriores.
A falta estrutural da Polícia Judiciária, aliás, acabou por ser
reconhecida pelo Estado de forma reflexa, pois, como dito, tentou minimizar o
precário serviço que era, ao tempo em que ajuizada a ação civil pública, contratando
pessoal, implementando escalas de plantão e mantendo, por determinado período,
atendimento integral nas 24 horas do dia.
Houve, sem dúvida, reconhecimento do pedido.
Tal situação se extrai dos ofícios de fls. 972/973 e 977/979,
assim como dos relatos das testemunhas inquiridas no decorrer do feito (fls.
1.011/1.014; 1.034/1.035 e 1.044/1.045), dando conta de que, em tese, atendidos
efetivamente os reclamos do Ministério Público.
Todavia, a ação foi intentada em 12/08/2005, calcada em farto
material documental acostado ao feito (fls. 39/821), o qual demonstra com toda
segurança a calamitosa situação enfrentada pela população de Forquilhinha,
pontualmente no que dizia respeito com a falta de funcionários junto à Delegacia de
Polícia, a ausência de atendimento integral durante as 24 horas diárias e também a
consequência daí decorrente, como a precariedade nas investigações, a adoção de
procedimentos equivocados, a morosidade policial, dentre outros aspectos.
7
Endereço: Rodovia Antônio Valmor Canela, 106, Santa Izabel - CEP 88.850-000, Forquilhinha-SC - E-mail: forquilhinha.unica@tjsc.jus.br
8. ESTADO DE SANTA CATARINA
PODER JUDICIÁRIO
Comarca de Forquilhinha4
Vara Única
ESTADO DE SANTA CATARINA
PODER JUDICIÁRIO
Comarca de Forquilhinha4
Vara Única
Engana-se o Estado, contudo, que as medidas adotadas desde
o longínquo ano de 2005 superaram o objeto desta demandada, pois muitas delas se
deram de maneira paliativa, demonstrando unicamente um verdadeiro círculo vicioso.
Por tal razão, é que ainda hígida a alegação do Ministério
Público quando do recurso de apelação, ao aduzir que:
"[...] O cerne da questão está no fato de que durante muito tempo houve
grave deficiência nos serviços de segurança pública prestados pela polícia
civil no Município e a necessidade de imposição de obrigação de fazer, o que
foi reconhecido expressamente pelo requerido como procedente ao afirmar
que as providências requeridas pelo Ministério Público foram atendidas
posteriormente ao requerimento formulado em Juízo.
Demais disso, quanto ao interesse de agir, persistem a necessidade e a
utilidade da demanda na medida em que a tutela judicial perseguida não só
acabaria com as deficiências detectadas como também asseguraria que não
mais houvesse retrocesso àquele estado de abandono da Delegacia de
Polícia (...)". (fl. 856)
Tal constatação se verifica facilmente dos autos, pois depois de
mais de cinco anos do ajuizamento da ação, a situação voltou a se repetir, denotando
ainda persistir o interesse de agir do demandante.
Veja-se, a exemplo disso, o oficio de fls. 1.064/1.066, datado de
20/10/2010, em que remetente o Delegado de Polícia, Dr. Carlos Emílio da Silva,
endereçado a este juízo, no qual noticiado, em resumo, que dos cinco funcionários
lotados na Delegacia de Polícia, dois não mais ali estavam, dada a aposentadoria de
uma e a transferência de outro. Continua o signatário a informar que:
"[...] Frize-se, que pelo volume de serviço produzido diariamente nesta
unidade, àquele número de cinco policiais já era insuficiente para dar conta
com eficiência dos trabalhos policiais, razão porque se priorizou o
atendimento dos casos atuais de maior urgência e relevância, justificando-se,
assim, os constantes atrasos involuntários no atendimento de requisições
deste Juízo e na conclusão de procedimentos em curso nos cartórios desta
unidade policial, sobretudo dos mais antigos 'herdados' de outras autoridades
policiais (...).
Destarte, considerando-se que cinco policiais não davam conta de vencer a
carga de trabalho exigida pela delegacia, quanto mais com apenas três. Aliás,
a situação que já era ruim tornou-se ainda pior (...).
Portanto, em consequência das precárias condições de trabalho as quais se
está submetido nesta delegacia referente ao exíguo número de policias aqui
lotados (...).
Por derradeiro, informa-se que por força desta defasagem de pessoal,
buscou-se uma solução paliativa de menor prejuízo à população a nosso ver,
no sentido de manter o atendimento diário ao público com apenas dois
policiais, qual seja: um dos policiais permaneceu no sistema de plantão de 24
8
Endereço: Rodovia Antônio Valmor Canela, 106, Santa Izabel - CEP 88.850-000, Forquilhinha-SC - E-mail: forquilhinha.unica@tjsc.jus.br
9. ESTADO DE SANTA CATARINA
PODER JUDICIÁRIO
Comarca de Forquilhinha4
Vara Única
ESTADO DE SANTA CATARINA
PODER JUDICIÁRIO
Comarca de Forquilhinha4
Vara Única
horas de trabalho por 48 horas de folga. O outro passou a trabalhar das 8 às
18 horas diariamente e permanecer de sobre-aviso das 18 às 8 horas do dia
seguinte, devendo ser acionado pela Polícia Militar em casos de emergência
que resultem em prisões em flagrante, bem como durante as 24 horas de
cada dia do final de semana não coberto pelo policial plantonista."
Já em ofício dirigido à Presidente da Câmara Municipal, à
época, Sra. Ivone Minatto, o mesmo Delegado de Polícia em missiva de novembro de
2010 reafirma a falta de funcionários na Delegacia de Polícia, por inexistir "pelo
menos cinco setores básicos devidamente preenchidos por policiais preparados para
cada função", bem como por não haver escrivão de carreira, por estar o setor de
investigação desativado por falta de policiais; o comissariado funcionar com três
policiais em regime de plantão e a secretaria contar com um funcionário terceirizado
contratado pela Secretaria de Segurança para uma jornada de seis horas (fl. 1.088).
Após, foram juntados às fls. 1.154/1.157 os documentos datados
de fevereiro de 2011, indicando mais uma vez persistirem os fatos descritos na inicial
– mesmo depois de seis anos de seu ajuizamento! -, notadamente por não apurado
fato tido como crime ocorrido em 29/07/2010 por falta de pessoal e, também, pela
circunstância de, ao que parece, não estar funcionando a Delegacia de Polícia
durante o dia inteiro como, a propósito, determinado pela Superior Instância.
Todas estas razões demonstram a necessidade de procedência
dos pedidos iniciais, a fim de garantir à população local a prestação de serviço
contínuo, adequado e eficiente, como reza a Constituição Federal, bem como para
assegurar que não haja mais retrocesso ao estado de abandono inicial da Delegacia
de Polícia.
Não pode o Estado, garantidor que deve ser do direito
constitucional à segurança pública (CF, art. 144), seguir em linha diametralmente
oposta à necessidade local, porquanto, na medida em que ascendem
vertiginosamente os índices de criminalidade – os números confirmam essa premissa
– o réu mantém desguarnecida a Polícia Judiciária, deixando de prestar, nesta
cidade, de forma adequada e eficiente, o necessário serviço relacionado à segurança
pública.
Não bastasse o efetivo da Polícia Militar que na cidade de
Forquilhinha é reduzido e não atende de forma adequada aos anseios da população
que clama por mais segurança, ficando deficiente a atuação do Estado nesta sensível
área, mormente quando chamada à atuação preventiva de ilícitos de toda ordem que
ocorrem por aqui, tem-se ainda a precária situação vivenciada há muito no âmbito da
Polícia Civil, na função investigativa, merecendo, por isso, resposta do Poder
9
Judiciário para se tentar minimizar a situação, trazendo à população que circula nesta
Endereço: Rodovia Antônio Valmor Canela, 106, Santa Izabel - CEP 88.850-000, Forquilhinha-SC - E-mail: forquilhinha.unica@tjsc.jus.br
10. ESTADO DE SANTA CATARINA
PODER JUDICIÁRIO
Comarca de Forquilhinha4
Vara Única
ESTADO DE SANTA CATARINA
PODER JUDICIÁRIO
Comarca de Forquilhinha4
Vara Única
região uma sensação maior de segurança.
Ressalta-se, neste aspecto, que a extinção parcial da presente
ação, mantida pelo E. TJSC (fls. 909/914), leva à procedência integral dos pedidos
remanescentes iniciais, especificamente a necessidade de que o quadro de
funcionários da Delegacia de Polícia seja aquele requerido na inicial, todos servidores
públicos concursados e de forma permanente, ressalvados aqueles cargos já
ocupados por servidores públicos, além de prestar atendimento durante as vinte
quatro horas do dia e durante todo o ano.
III – DISPOSITIVO.
Em face do que foi dito, julgo procedentes os pedidos
deduzidos na ação civil pública ajuizada pelo Ministério Público Estadual em face
do Estado de Santa Catarina para condenar o réu à obrigação de fazer,
consubstanciada em manter permanentemente quadro adequado para o pleno
funcionamento da Delegacia de Polícia da Comarca de Forquilhinha/SC, com pelo
menos um delegado de polícia, um investigador, um comissário de polícia, um
escrivão e um escrevente, todos servidores públicos concursados e prestar
atendimento durante as 24 (vinte quatro) horas do dia e durante o ano inteiro, em
regime de plantão.
Por consequência, deverá o Estado observar o comando da
presente decisão, implementando-a no prazo máximo de 90 (noventa) dias, acaso
ainda não tenha feito, tudo sob pena da multa de R$ 5.000,00 (cinco mil reais) por
dia.
Renumere-se o feito a partir da fl. 1.117.
Sentença sujeita ao reexame necessário.
Sem custas e honorários advocatícios.
Publique-se. Registre-se. Intimem-se.
Forquilhinha (SC), 10 de maio de 2012.
Felippi Ambrósio
Juiz de Direito
10
Endereço: Rodovia Antônio Valmor Canela, 106, Santa Izabel - CEP 88.850-000, Forquilhinha-SC - E-mail: forquilhinha.unica@tjsc.jus.br