1) Três pessoas são denunciadas por corromper produtos destinados a fins medicinais em uma farmácia para eliminar a concorrência, causando a morte de duas pessoas e danos à saúde de outras seis.
2) O promotor de justiça é acusado de prevaricação por atrasar a investigação intencionalmente para proteger um dos acusados, que era seu amigo.
3) O documento descreve os fatos do caso e as acusações contra os três denunciados.
1. DENÚNCIA CRIME N.º 863.107-0, DA VARA ÚNICA DA
COMARCA DE SÃO MIGUEL DO IGUAÇU
DENUNCIANTE: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO
DO PARANÁ
DENUNCIADOS: HAROLDO NOGIRI, VILSON
MARTINS RIGO E PEDRO PAULO
MIRANDA
RELATOR: DES. LUIZ OSÓRIO MORAES PANZA
DENÚNCIA CRIME – CORRUPÇAO DE PRODUTO
DESTINADO A FIM MEDICINAL, CRIME CONTRA A
ORDEM ECÔNOMICA, PREVARICAÇÃO E CORRUPÇÃO
PASSIVA – VALIDADE DA ESCUTA AMBIENTAL QUANDO
HÁ CIÊNCIA POR UM DOS INTERLOCUTORES –
PRECEDENTES - REQUISITOS DO ART. 41 DO CPP
PRESENTES – AUSÊNCIA DAS HIPÓTESES DE REJEIÇÃO
PREVISTAS NO ART. 395 DO CPP – DESCRIÇÃO DE
FATOS QUE, EM TESE, CONFIGURAM ILÍCITOS PENAIS –
NARRATIVA INDIVIDUALIZADA E QUE POSSIBILITA A
DEFESA DOS DENUNCIADOS – CRIME PREVISTO NO
ART. 4º, IV, DA LEI Nº 8.137/90 REVOGADO PELA LEI
12.529/2011 – ABOLITIO CRIMINIS – AVENTADA
CONEXÃO QUE NECESSITA DE INFORMAÇÕES –
MEDIDAS CAUTELARES REQUERIDAS PELO ÓRGÃO
MINISTERIAL – ACOLHIMENTO PARCIAL –
AFASTAMENTO, DE MOMENTO, DO PROMOTOR DE
JUSTIÇA DENUNCIADO DAS SUAS FUNÇÕES –
NECESSIDADE DE PRESERVAÇÃO DA INTEGRIDADE DA
AÇÃO PENAL, ALÉM DE IMPEDIMENTO DE REITERAÇÃO
DE CONDUTA DELITUOSA – NÃO DECRETAÇÃO DA
PRISÃO PREVENTIVA DO CO-RÉU – SEGUNDO
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2. Denúncia Crime nº. 579.184-8
DENUNCIADO QUE ESTARIA FORAGIDO – NÃO
CONFIGURAÇÃO – AGENTE QUE FOI INTIMADO
PESSOALMENTE DO ATOS PROCESSUAIS APÓS
DENÚNCIA DO MINISTÉRIO PÚBLICO, AFASTANDO,
POIS, A HIOPOTESE PREVISTA NO ART. 312, CPP –
RECEBIMENTO DA DENÚNCIA COM RESSALVA APENAS
EM RELAÇÃO AO CRIME CONTRA A ORDEM
ECONÔMICA.
VISTOS, relatados e discutidos estes autos de
Denúncia Crime nº 863.107-0 acima identificados.
O Ministério Público do Estado do Paraná denunciou
Haroldo Nogiri, Vilson Martins Rigo e Pedro Paulo Miranda pelos seguintes fatos
delituosos:
Segundo consta do quanto apurado nos procedimentos
investigatórios em anexo, no ano de 2008 os ora denunciados HAROLDO NOGIRI e VILSON
MARTINS RIGO, amigos pessoais íntimos e comparsas em diversos crimes de corrupção passiva
na Comarca de São Miguel do lguaçu1, o primeiro Promotor de Justiça da Comarca de São Miguel
do Iguaçu e o segundo Farmacêutico e proprietário de farmácia na cidade de São Miguel do
lguaçu, entabularam plano criminoso no sentido de eliminar a concorrência farmacêutica que a
Farmácia BioFórmula, de propriedade da vítima Yuka Nardelli Piloni Barbiero fazia à farmácia de
propriedade do ora acusado VILSON MARTINS RIGO, valendo-se, para tanto, da função pública
de Promotor de Justiça do denunciado HAROLDO NOGIRI e contando com a colaboração do
também ora denunciado PEDRO PAULO MIRANDA. Em paralelo à eliminação da concorrência
empresarial, os denunciados HAROLDO NOGIRI e VILSON MARTINS RIGO, sempre se valendo da
função pública de Promotor de Justiça de HAROLDO NOGIRI e sempre de comum acordo, um
aderindo à conduta do outro, também aproveitaram para criar situação processual contra Yuka
--
1
Segundo apurado na Sindicância realizada pela Corregedoria-Geral do Ministério Público, em
anexo, foram inúmeros os crimes de corrupção passiva realizados pela dupla HAROLDO NOGIRI
e VILSON MARTINS RIGO na Comarca de São Miguel do lguaçu, os quais, pela ausência de
conexão, serão objeto de diversas ações penais respectivas (fls. 1008 a 1116).
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3. Denúncia Crime nº. 579.184-8
que lhes permitiu dela solicitar vantagem indevida (duzentos mil reais em dinheiro), agindo nos
moldes a seguir descritos.
1. DOS CRIMES DE CORRUPÇAO DE PRODUTO DESTINADO A FIM
MEDICINAL E CONTRA A ORDEM ECÔNOMICA.
Em data não precisada, sabendo-se apenas que no mês de
setembro de 2008, nas dependências da empresa de manipulação de medicamentos, de nome
fantasia Farmácia BioFórmula (razão social: Nardelli & Piloni Ltda.), localizada à rua Castro
Alves, 245, Centro, São Miguel do Iguaçu, Paraná, de propriedade de Yuka Nardelli Piloni
Barbiero2, (farmacêutica responsável), o ora denunciado PEDRO PAULO MIRANDA, valendo-se da
condição de funcionário da referida empresa farmacêutica, tendo facilidade para nela ingressar
fora do horário de expediente, agindo a mando dos co-denunciados VILSON MARTINS RIGO e
HAROLDO NOGIRI, todos de prévio e comum acordo, um aderindo à conduta do outro,
dolosamente corrompeu a matéria-prima destinada a fabricação de produto destinado a fins
medicinais (Aciclovir 200mg) que estava no laboratório da referida Farmácia, nele inserindo
produto, venenoso e não identificado3, inutilizando esse bem de consumo, tudo no intuito de
eliminar parcialmente a concorrência frente à empresa do denunciado VILSON MARTINS RIGO,
no âmbito do mercado farmacêutico de São Miguel do Iguaçu.
Está matéria prima foi manipulada para a confecção do
medicamento Aciclovir 200mg, e o produto medicinal já corrompido e inutilizado, por ação de
PEDRO PAULO MIRANDA, a mando dos demais co-denunciados, sem que isso fosse do
conhecimento da Farmacêutica Yuka Nardelli Piloni Barbiero, acabou sendo adquirido por
compra na referida Farmácia e consumido por Natiely Aparecida Delfino, de 17 anos de idade,
nos dias 22 e 23 de outubro de 2008, tendo ela, em decorrência do consumo deste produto,
vindo à falecer em 23 de outubro de 20084.
O mesmo remédio com o produto medicinal adulterado foi
também adquirido por compra e consumido por Valdomiro Martins Pereira, de 65 anos de idade,
que também veio a falecer em 12 de outubro de 20085 .
Além de Natiely e de Valdomiro, outras 06 (seis) pessoas6,
adquiriram o produto medicinal manipulado na referida Farmácia, todos tendo sofrido reações
--
2
Conforme cópia da Sexta Alteração do Contrato Social às fis. 399 e ss.
3
Conforme laudo pericial da Fundação Osvaldo Cruz, juntado nos autos de ação civil movida
contra a Farmácia pelos familiares da vítima Natieli, aqui.encartado à fl. 363, onde o resultado
do exame nas amostras adquiridas na Farmácia e em poder da família de Natieli, afirma que
"não foi identificada a presença de Aciclovir na amostra através do método cromatográfico
farmacopéico. Utilizando-se outros métodos cromatográficos foi evidenciada a presença de duas
substâncias não identificadas".
4 Certidão de óbito à fl. 181.
5 Certidão de óbito à fl. 618.
6 Silas Murbach, Alida Marcelina Farias, Fabrício Ghellere, Alexandre Ghellere, Cida da Costa,
Claudia Berriel, conforme Relatório da Secretaria de Estado da Saúde do Paraná, às fls.165 e ss.
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4. Denúncia Crime nº. 579.184-8
adversas e tendo apresentado problemas de saúde decorrentes do consumo deste produto
corrompido.
2. DOS CRIMES DE PREVARICAÇÃO.
Os autos de inquérito policial nº 2008.1088-7, de São Miguel do
Iguaçu, foram instaurados para apurar o delito de corrupção de produto destinado à fim
medicinal, apresentando, desde seu nascedouro, indícios do envolvimento tanto de VILSON
MARTINS RIGO, quanto do Promotor de Justiça HAROLDO NOGIRI, então titular da Promotoria de
São Miguel do Iguaçu.
Diante deste quadro, quando o Inquérito Policial foi remetido ao
juízo, em data de 11 de dezembro de 2008, a Magistrada da Comarca, Dra. Sandra Tâmara
Gayer, pronunciou-se alertando quanto ao envolvimento do referido Promotor, despachando nos
seguintes termos (fl. 187):
"Vistos.
Ref. Oficio 2032/08
Considerando a notícia trazida aos autos no sentido de utilização
do nome do Dr. Promotor de Justiça para prática de tentativa de crime, determino seja dado
vista dos autos ao Ministério Público para que tenha conhecimento do fato.
Dil.
São Miguel do Iguaçu, 11 de dezembro de 2008.
Sandra Tâmara Gayer/Juíza de Direito”
O Promotor de Justiça HAROLDO NOGIRI, ao invés de dar-se por
impedido e suspeito de atuar no referido Inquérito Policial, já que era apontado como possível
co-autor do delito objeto da investigação, além de ser amigo íntimo de VILSON MARTINS RIGO
(igualmente, investigado naqueles autos de inquérito policial) não só não se deu por impedido e
suspeito como lhe exigia a lei processual penal7 , mas, sempre agindo para satisfazer interesse,
pessoal consistente em prejudicar a apuração do noticiado no inquérito policial, bem como
interferir diretamente na orientação das diligências que pudessem favorecer-lhe e também ao
co-investigado VILSON MARTINS RIGO, retardou o trâmite do feito, retendo-o por quatro meses
--
7 Conforme determina o artigo 258 combinado com o art. 252 e também com o art. 254, todos
do Código de Processo Penal, a saber:
"Art 258. Os órgãos do Ministério Público não funcionarão nos processos em que o juiz ou
qualquer das partes for seu cônjuge, ou parente, consanguíneo ou afim, em linha reta ou
colateral, até o terceiro grau, inclusive, e a eles se estendem, no que lhes for aplicável, as
prescrições relativas á suspeição e aos impedimentos dos juízes.
"Art. 252. O juiz não poderá exercer jurisdição no processo em que: (...) IV - ele próprio ou seu
cônjuge ou parente, consanguíneo ou afim em linha reta ou colateral, até o terceiro grau,
inclusive, for parte ou diretamente interessado no feito.”
"Art. 254. O juiz dar-se-á por suspeito, e, se não o fizer, poderá ser recusado por qualquer das
partes: I - se for amigo íntimo ou inimigo capital de qualquer deles.”
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5. Denúncia Crime nº. 579.184-8
(vista com carga feita no dia 18 de dezembro de 2008, conforme certidão de fl. 190 verso),
tendo assim se pronunciado em data de 15 de abril de 2009 (conforme. documento de fl. 191):
“MM. Juíza
1. O MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO PARANÁ, através de
seu Agente, requer o retorno dos autos à delegacia de policia de origem, para que a autoridade
policial proceda à ouvida da pessoa denominada VILSON RIGO, mencionada na portaria de fls.
02, para o fim de esclarecer os fatos.
2. E, em havendo contradições de declarações entre o que disse
YUKA BARBIERO, CLAITON BARBIERO e PEDRO MIRANDA e o que for declarado por VILSON RIGO,
desde já, requer-se a realização de ACAREAÇÃO (frente a frente) entre os depoimentos
eventualmente conflitantes.
3. Quanto ao pleito de fls. 44 (constante no oficio n° 2032/2008),
de exumação do cadáver de NATIELY APARECIDA DELFINO, o Órgão Ministerial, não se opõe a
sua realização, até porque na denúncia já oferecida, consta na cota Ministerial tal pleito (de
exumação).
São Miguel do Iguaçu/PR, 15 de abril de 2009
HAROLDO NOGIRI
Promotor de Justiça.”
O Promotor de Justiça HAROLDO NOGIRI ainda prosseguiu
atuando no referido Inquérito Policial, sem declarar-se impedido e suspeito, conforme acima
pontuado e conforme lhe determinava a legislação processual penal referida, materializando
suas intervenções no dia 07 de agosto de 2009 (fl. 207), no dia 21 de outubro de 2009 (fl. 302),
no dia 18 de dezembro de 2009 (fl. 305), no dia 22 de março de 2010 (fl. 308), no dia 31 de
maio de 2010 (fl. 314), no dia 10 de agosto de 2010 (fl. 319), e no dia 19 de outubro de 2010 (fl.
324), sempre através de manifestações genéricas de dilação de prazo. No dia 01 de abril de
2011, o Promotor de Justiça HAROLDO NOGIRI novamente manifestou-se no referido Inquérito
Policial, sem declarar-se impedido e suspeito, conforme acima pontuado e conforme lhe
determinava a legislação processual penal referida (fls. 332/333).
3. DO CRIME DE CORRUPÇÃO PASSIVA.
Dando Sequência ao plano de eliminar a concorrência
farmacêutica do ora acusado VILSON MARTINS RIGO, forçando a vítima Yuka Nardelli Piloni
Barbiero a vender-lhes sua farmácia de manipulação, bem como visando, ainda, dela obter
dinheiro, o acusado HAROLDO NOGIRI, de prévio e comum acordo com o acusado VILSON
MARTINS RIGO, um aderindo à conduta do outro, dolosamente e aproveitando-se de sua função
pública de Promotor de Justiça, fugindo ao seu padrão de atuação ministerial de não priorizar
procedimentos de investigação internos da Promotoria8, de forma absolutamente açodada, no
--
8 Conforme anotado no Relatório da Corregedoria-Geral do Ministério Público na Sindicância
instaurada contra o Promotor de Justiça HAROLDO NOGIRI, à fl. 47; e conforme certidão
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6. Denúncia Crime nº. 579.184-8
dia 11 de novembro de 2008, instaurou os Autos de Procedimento Interno Preliminar, registrado
na Promotoria de Justiça de São Miguel do Iguaçu sob n° 10/2008 – fls. 594 e ss. –, o qual serviu
de moeda de barganha para a prática de corrupção passiva por parte dos referidos
denunciados, além de antecipar-se-formalmente a qualquer possível providência da autoridade
policial que pudesse apontar a investigação para outro rumo, tudo no intuito de acobertar o
delito de corrupção de produto destinado a fim medicinal e também dolosamente solicitar, como
de fato o Promotor de Justiça HAROLDO NOGIRI dolosamente solicitou, no dia 20 de novembro
de 2008, através de seu comparsa e "porta-voz" VILSON MARTINS RIGO, diretamente para o
marido da farmacêutica Yuka Nardelli Pilloni Barbiero, de nome Clayton Antonio Barbiero,
vantagem indevida consistente em R$200.000,00 (duzentos mil reais) para que HAROLDO
NOGIRI se valesse de sua função pública de Promotor de Justiça e praticasse indevidamente atos
de oficio, infringindo deveres funcionais de exercer suas funções com zelo e probidade, de
manter ilibada conduta pública, de zelar pelo prestígio da Justiça e pela dignidade de suas
funções9, além de violar os deveres de honestidade, imparcialidade, legalidade e lealdade para
com a instituição do Ministério Público10, ou seja, para deixar de responsabilizá-la criminalmente
no caso que tinha sob seu controle funcional. Como o pedido não foi aceito por Yuka, o Promotor
de Justiça HAROLDO NOGIRI concluiu seu Procedimento no prazo exíguo de 16 (dezesseis) dias
e, sem qualquer laudo pericial que permitisse esclarecer as mortes, e sem considerar os dados
que Yuka tinha a respeito da suspeita de sabotagem em sua farmácia, enfim, de forma
desproporcional ao seu padrão de atuação, agindo propositadamente de forma açodada,
ofereceu denúncia crime contra Yuka Nardelli Piloni Barbiero pelos crimes de homicídio culposo
(dois, em concurso); exercício ilegal da medicina e falsidade ideológica (conforme denúncia de
fls. 588 e ss.)"
As condutas acima descritas foram tipificadas, em
relação ao denunciado HAROLDO NOGIRI, como incurso nas sanções do art.
273, §1º-A, c.c. art 285, c.c. art. 258, todos do Código Penal; art. 4º, IV, da Lei
explicativa a respeito da correições ordinárias e inspeções a que foi submetido o Promotor de
Justiça HAROLDO NOGIRI, às fls. 1146 e ss.
9 Art. 155, "caput" e inciso I, da Lei Complementar Estadual n° 85/99 (Lei Orgânica do Ministério
Público do Parana): "Art. 155. Os membros do Ministério Público devem exercer suas funções
com zelo e probidade, observando o decoro pessoal, as normas que regem a sua atividade e,
especialmente: I - manter ilibada conduta pública, e particular". No mesmo sentido o Art. 43, I e
II, da Lei Federal 8625/93 (Lei Orgânica Nacional do Ministério Público). Art. 43. São deveres dos
membros do Ministério Público, além de outros previstos em lei; I – manter ilibada conduta
pública e particular; II – zelar pelo prestígio da Justiça, por suas prerrogativas e pela dignidade
das funções".
10 Art. 11, "caput", I e II, da Lei.Federal n° 8429/90 (Lei de Improbidade) : "Art. 11. Constitui ato
de improbidade administrativa que atenta contra os princípios da administração pública
qualquer ação ou omissão que viole os deveres de honestidade, imparcialidade, legalidade, e
lealdade às instituições, e notadamente: I - praticar ato visando fim proibido em, lei ou
regulamento ou diverso- daquele previsto, na regra, de competência; II - retardar ou deixar de
praticar, indevidamente, ato de ofício;”
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7. Denúncia Crime nº. 579.184-8
8137/90; artigo 317 do Código Penal e art. 319, do Código Penal, todos
combinados com o art. 29 também do Código Penal; em relação ao
denunciado NILSON MARTINS RIDO como incurso nas sanções do artigo 273, §
1º-A, c.c. art. 285, c.c. art. 258, todos do Código Penal; art. 4°, IV, da Lei
8137/90; e artigo 317 do Código Penal, todos combinados com o art. 29
também do Código Penal; e em relação ao denunciado PEDRO PAULO
MIRANDA como incurso nas sanções do art. 273, § 1º-A, c.c. art. 285, c.c. art.
258, todos do Código Penal; art. 4°, IV, da Lei 8137/90, todos combinados com
o art. 29 também do Código Penal.
Requereu o Ministério Público, além do recebimento
da denúncia, que fossem avocados os autos de ação penal nº 2008.1031-3 em
trâmite na Vara Criminal de São Miguel do Iguaçu, diante da conexão com o
presente feito; a suspensão do exercício da função pública de Promotor de
Justiça do acusado Haroldo Nogiri e a decretação da prisão preventiva de
Vilson Martins Rigo.
Pela decisão de fls. 1215/1218 foi determinada a
notificação dos denunciados.
Pedro Paulo Miranda apresentou defesa preliminar às
fls. 1226/1241, sustentando, em síntese, que não há provas suficientes para se
averiguar sua participação nos delitos descritos na denúncia, principalmente
porque não tinha acesso à área onde eram manipulados os medicamentos,
tampouco há provas no sentido de que a morte das pessoas decorreu do uso
do medicamento manipulado. Impugnou a utilização da gravação clandestina
como meio de prova, requerendo, ao final, a retirada de seu nome do pólo
passivo da denúncia.
Vilson Martins Rigo apresentou resposta preliminar
às fls. 1259/1260 afirmando que “a presente denúncia nada mais é do que um
emaranhado de acusações infundadas lavradas contra o denunciado,
destituídas de qualquer fundamento e de qualquer elemento de prova, sequer
indiciário”.
Já Haroldo Nogiri ofereceu resposta às fls. 1266/1304
asseverando: a) que as acusações são fruto de vingança política devido a sua
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8. Denúncia Crime nº. 579.184-8
atuação funcional, consistente em propor investigações e ações judiciais em
face de seus detratores, várias delas já concluídas e julgadas procedentes,
culminando com a condenação e perda de cargos públicos, inclusive do
prefeito e da vice-prefeita do Município de Itaipulândia; b) que a denúncia é
inepta por violação aos arts. 41 e 395, I, ambos do CPP e art. 5º, LIV e LV, da
CF, por não descrever conduta típica nem estabelecer a relação entre a
conduta do denunciado com fatos típicos penais, como também por não estar
embasada em prova idônea, dotada de suficiente verossimilhança para
demonstrar a plausibilidade da acusação; c) falta de justa causa para a ação
diante da inexistência de quaisquer elementos indiciários concretos e objetivos
para sustentar a incriminação; d) que o fato narrado não constitui crime, por
estarem ausentes indícios de autoria e prova da materialidade; e) não há
motivos para seu afastamento do cargo. Pugnou, ao final, pela rejeição da
denúncia, ou, acaso recebida, pela sua absolvição sumária.
Sobreveio manifestação da douta Procuradoria Geral
de Justiça (fls. 1482/1497), pelo recebimento da denúncia e deferimento das
medidas cautelares requeridas.
Vieram os autos conclusos.
É o relatório.
Analiso os argumentos defensivos na ordem em que
foram apresentados.
Inicio com o argumento apresentado por Pedro Paulo
Miranda no sentido de que não haveria prova acerca de sua participação nos
delitos a si imputados.
Pois bem. Para o recebimento da denúncia não se
exigem provas conclusivas acerca da autoria delitiva, bastando que estejam
presentes os requisitos previstos no art. 41 do CPP, bem como que estejam
ausentes as hipóteses de rejeição da denúncia previstas no art. 395 do aludido
Codex.
No presente caso, vislumbro a presença dos indícios
de autoria em relação ao denunciado Pedro Paulo Miranda, pois, ao contrário
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9. Denúncia Crime nº. 579.184-8
do afirmado, há indícios de que este tinha acesso à área onde eram
manipulados os medicamentos, da mesma forma em relação à morte das
pessoas em decorrência do uso do medicamento manipulado.
Ilustro tal conclusão com a transcrição de
depoimentos:
“(...) que tinha a chave da farmácia para fazer atendimentos a
clientes que porventura telefonassem pedindo medicamento e afirma que por algumas vezes,
emprestou esta chave ao PEDRO, para que ele fosse até a farmácia para atender algum cliente
(...)” – fl. 178.
“(...) que depois da morte da adolescente, os funcionários
ficaram muito apreensivos, não sabiam o que estava acontecendo, não acreditavam ainda que
teria sido o medicamento Aciclovir que teria causado o óbito da adolescente, porém o
funcionário PEDRO parecia que não estava se importando, ao contrário dos demais, ele parecia
muito tranquilo; Que PEDRO não gostava de obedecer as normas da empresa quanto ao
laboratório, ele disse ‘que não precisava disso’, isso é, ele achava que não precisava de tanto
cuidado quanto ao laboratório; Que YUKA ficou preocupada com o fato de outros clientes
também estarem passando mal depois de ingerirem o Aciclovir e decidiu pegar um pacote que
ainda estava fechado para fazer análise do produto, para ver se tinha algum problema com o
lote, porém ela não comentou que foi mandado um pacote que estava fechado, e o pote que
estava sendo usado ela separou, e inclusive orientou para que ninguém mais fizesse
medicamentos manipulados com o Aciclovir e no dia que chegou da analise o PEDRO leu o
laudo, perguntou o que significava o resultado, e a depoente disse a ele que significava que não
tinha nada de irregular com o Aciclovir, ele ficou indignado, parecia surpreso (...)” – fl. 166/167.
“(...) que PEDRO costumava chegar na porta interna do
laboratório para pegar algum medicamento e enquanto a depoente procurava pelo
medicamento PEDRO costumava ficar observando, e mesmo constatando que PEDRO tinha um
comportamento diferente dos demais, a depoente sempre acreditou que todos os funcionários
da farmácia eram de absoluta confiança; Que até os acontecimentos dos fatos narrados acima,
as portas internas da farmácia não eram trancadas, ficavam apenas encostadas(...)” – fl. 169.
“(...) que ainda em meados de novembro, possivelmente uma
quinta-feira, dia 13/11/08, o declarante e sua esposa fizeram uma reunião com os funcionários
da farmácia, após o expediente e pelas 19:00 h, onde colocou-se a hipótese de existir uma
sabotagem e, um dos funcionários de nome PEDRO demonstrou certo nervosismo e
preocupação e sempre buscava argumentar contrário à possibilidade de sabotagem; que o
declarante percebeu que ele era a voz dissonante dentro do grupo, porque todos os demais
admitiam a possibilidade de uma sabotagem; que, partindo desse princípio o declarante passou
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10. Denúncia Crime nº. 579.184-8
a desconfiar do comportamento defensivo de PEDRO; que por volta das 13:10h desse mesmo
dia da reunião, o PEDRO ligou para o declarante aparentando nervosismo e preocupação,
dizendo-lhe que precisava com ele ter uma conversa urgente ainda naquela mesma noite e, ato
continuo o declarante e sua esposa YUKA foram até a casa de PEDRO, onde ele lhe disse que
estava tomando banho e teve ‘uma luz’ na mente e que realmente ele concordava com a
hipótese de sabotagem e sugeriu que fossem retirados todos os potes de medicamento do
laboratório (...) que em seguida o declarante e PEDRO foram ao encontro de VILSON, na chácara
onde ele mora; (...) VILSON começou a temorizar o declarante, dizendo-lhe detalhes acerca dos
depoimentos prestados por Yuka e Eliane na promotoria de justiça, e que ele (Vilson) tinha
conhecimento que elas seriam presas, mas que ‘ainda existia um jeito de resolver a situação’,
pois segundo VILSON ‘o promotor de justiça tem condições de abafar o caso, falar com a família
da vítima e resolver o problema e outros que poderiam advir’, porém VILSON disse que isso
tinha um custo (...) que VILSON insistia na proposta pecuniária e o declarante negava-se e
chegou a dizer que não tinha dinheiro e então o VILSON propôs que poderia comprar parte de
sua farmácia (...) que o declarante não aceitou a proposta e VILSON transpareceu ficar nervoso
e disse que YUKA iria mesmo para a cadeia então nisso o declarante disse que quem iria para a
cadeia seria outra pessoa, pois tinha uma gravação na qual uma pessoa (não falou quem era)
disse que foi feita uma sabotagem na farmácia de Yuka, a mando de VILSON e que tinha uma
autoridade por trás do VILSON; que então o VILSON pediu as tais gravações e o declarante
negou-se e ele perguntou se o declarante ‘iria tocar pra frente’ e diante da resposta afirmativa o
VILSON passou a ameaçar de morte tanto o declarante como seus familiares (...) que VILSON
insistiu para saber exatamente o conteúdo das gravações e o declarante não lhe disse tudo,
mas o VILSON pareceu suspeitar que a pessoa gravada seria o PEDRO, pois na presença do
próprio PEDRO o VILSON disse ao declarante ‘tu sabe o que vai acontecer... amanhã esse cara
aparece morto e vai ser a tua palavra contra a de um defunto... tu não vai provar nada e vai se
incomodar...’ nisso o PEDRO pareceu sentir-se incomodado com o comentário de VILSON e
depois o PEDRO comentou ainda, quando estavam no carro, saindo da casa de VILSON, que ele
não se suicidaria sob hipótese alguma (...)” fls. 172/173.
Na gravação mencionada no depoimento acima e
transcrita às fls. 158/165, efetivamente o denunciado Pedro afirma que a
sabotagem poderia ter ocorrido a mando de Vilson e Haroldo.
Especificamente sobre esta gravação, não há que se
falar em nulidade, pois dois dos interlocutores, à exceção do ora denunciado
Pedro, tinham ciência de que a conversa estava sendo gravada.
O Supremo Tribunal Federal já convalidou esta
espécie de prova quando um dos interlocutores tem ciência da gravação
inclusive em sede de recurso representativo de controvérsia:
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11. Denúncia Crime nº. 579.184-8
AÇÃO PENAL. Prova. Gravação ambiental. Realização por um dos
interlocutores sem conhecimento do outro. Validade.
Jurisprudência reafirmada. Repercussão geral reconhecida.
Recurso extraordinário provido. Aplicação do art. 543-B, § 3º, do
CPC. É lícita a prova consistente em gravação ambiental
realizada por um dos interlocutores sem conhecimento do outro.
(RE 583937 QO-RG, Relator(a): Min. CEZAR PELUSO, julgado em
19/11/2009, REPERCUSSÃO GERAL - MÉRITO DJe-237 DIVULG 17-
12-2009 PUBLIC 18-12-2009 EMENT VOL-02387-10 PP-01741
RJSP v. 58, n. 393, 2010, p. 181-194).
A defesa de Vilson Martins Rigo resumiu-se a afirmar
que “a presente denúncia nada mais é do que um emaranhado de acusações
infundadas lavradas contra o denunciado, destituídas de qualquer fundamento
e de qualquer elemento de prova, sequer indiciário”.
Como visto pelos depoimentos transcritos acima, há
fundados indícios acerca da participação do denunciado Vilson nos fatos
delituosos descritos na denúncia.
Especificamente sobre sua relação com o Promotor
de Justiça, transcrevo os seguintes depoimentos:
“(...) que após assumir a Delegacia de Polícia de São Miguel do
Iguaçu teve conhecimento da amizade do Promotor de Justiça Haroldo Nogiri com Vilson Martins
Rigo, que era conhecido na cidade por ser farmacêutico (...) que o declarante ouviu comentários
de que Vilson Martins Rigo extorquia as pessoas, principalmente em épocas eleitorais na cidade
de Itaipulândia; que os comentários mencionavam que Vilson Martins Rigo usava o nome do
Promotor de Justiça Haroldo Nogiri, dizendo que este poderia facilitar as coisas em questões
eleitorais (...) que quanto à fiança concedida para Vilson Martins Rigo em situação que envolvia
a Lei Maria da Penha (...) Vilson Martins Rigo insistiu para que o declarante entrasse em contato
com o Promotor de Justiça Haroldo Nigiri, dizendo que não haveria problema na concessão da
fiança; que o declarante não tinha o telefone do Promotor de Justiça, sendo que o número do
telefone foi passado ao declarante pelo indiciado Vilson Martins Rigo (...) parece ao declarante
que quem defende Vilson Martins Rigo é a própria esposa do Promotor de Justiça Haroldo Nogiri,
que é advogada militante em São Miguel do Iguaçu” (fls. 977/979).
“ que o declarante não chegou a procurar o promotor de Justiça
Haroldo Nogiri para reclamar porque sabia que ele era muito amigo de Vilson Rigo (...) que
Vilson Rigo e o Promotor de Justiça era ‘unha e carne’, que numa das audiências no Fórum, o
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12. Denúncia Crime nº. 579.184-8
Promotor de Justiça HAROLDO Nogiri disse que não iria atuar no caso porque tinha amizade com
Vilson Rigo (...) que o declarante perguntava para Vilson Rigo se não tinha medo de ir preso na
cadeia em razão de todos esses fatos que Vilson Rigo respondia que não iria preso porque o
Promotor de Justiça o defendia” (fls. 1006/1007).
Passo a analisar os argumentos da defesa de Haroldo
Nogiri.
Sustentou o mencionado denunciado que as
acusações são fruto de vingança política devido a sua atuação funcional,
consistente em propor investigações e ações judiciais em face de seus
detratores, várias delas já concluídas e julgadas procedentes, culminando com
a condenação e perda de cargos públicos, inclusive do prefeito e da vice-
prefeita do Município de Itaipulândia.
Ocorre que esta tese não restou cabalmente
demonstrada, nada impedindo que seja mais bem analisada no decorrer na
instrução criminal.
Também asseverou que a denúncia é inepta por
violação aos arts. 41 e 395, I, ambos do CPP e art. 5º, LIV e LV da CF, por não
descrever conduta típica nem estabelecer a relação entre a conduta do
denunciado com fatos típicos penais, como também por não estar embasada
em prova idônea, dotada de suficiente verossimilhança para demonstrar a
plausibilidade da acusação.
Como visto acima, não é necessário prova idônea
acerca da participação de Haroldo Nogiri nos fatos delituosos mencionados na
denúncia, bastando apenas a presença de indícios, os quais, pelo que já foi
apreciado, estão presentes.
Por outro lado, da simples leitura da denúncia, a qual
me remeto por brevidade, é possível perceber que esta descreve
perfeitamente as condutas típicas que imputa ao ora denunciado, as quais, em
tese, se subsumam aos tipos penais indicados, à exceção do delito contra a
ordem econômica previsto no art. 4º, IV, da Lei nº 8.137/90, o que será
abordado mais adiante.
Em que pesem as alegações ofertadas pelo
denunciado, não há, nesta fase pré-processual, necessidade de digressões
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13. Denúncia Crime nº. 579.184-8
específicas ou esgotadas de forma cabal, mas tão-somente, indícios e
indicativos quanto ao modo e forma pelo qual se engendraram os crimes de
corrupção de produto destinado a fins medicinais, corrupção passiva e
prevaricação, os quais estão presentes na descrição da denúncia.
O Superior Tribunal de Justiça tem precedentes sobre
a possibilidade de recebimento da denúncia apenas com as presenças de
indícios e materialidade, sem incursão em matéria de mérito, esta reservada
para a ação penal:
HABEAS CORPUS. FALSIDADE IDEOLÓGICA. CO-AUTORIA.
DENÚNCIA. ALEGADA INÉPCIA. INICIAL ACUSATÓRIA QUE
DESCREVE CRIME EM TESE E ATENDE AOS REQUISITOS LEGAIS
EXIGIDOS. CONSTRANGIMENTO ILEGAL NÃO CONFIGURADO.
1. Não pode ser acoimada de inepta a denúncia formulada em
obediência aos requisitos traçados no artigo 41 do Código de
Processo Penal, descrevendo perfeitamente a conduta típica,
cuja autoria é atribuída ao paciente devidamente qualificado,
circunstâncias que permitem o exercício da ampla defesa no seio
da persecução penal, na qual se observará o devido processo
legal.
(...)
(HC 211.586/PB, Rel. Ministro JORGE MUSSI, QUINTA TURMA,
julgado em 06/10/2011, DJe 13/10/2011).
Pela leitura da denúncia observa-se que o crime de
corrupção de produto destinado a fins medicinais foi descrito em relação ao
denunciado Haroldo Nogiri como se este, acompanhado de Vilson, tivesse
determinado que Pedro corrompesse a matéria-prima de produto destinado a
fins medicinais, mediante inserção de produto venenoso e não identificado.
Já o crime de prevaricação foi descrito como se o
denunciado Haroldo tivesse deixado de se declarar como suspeito ou impedido
em inquérito que envolvia seu nome, tendo interferido diretamente na
orientação de diligências para lhe favorecer e também ao co-denunciado
Vilson, além de retardar o feito indevidamente.
Por fim, o delito de corrupção passiva
consubstanciou-se, segundo a exordial acusatória, pelo fato de Haroldo ter
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14. Denúncia Crime nº. 579.184-8
solicitado através de Vilson vantagem indevida para deixar de responsabilizar
a farmacêutica em razão de suposto crime por ela cometido.
Como visto, a leitura da denúncia possibilita
estabelecer perfeitamente a relação do denunciado Haroldo com os delitos
descritos.
No que tange à aventada falta de justa causa para a
ação diante da inexistência de quaisquer elementos indiciários concretos e
objetivos para sustentar a incriminação, bem como ao argumento de que o
fato narrado não constitui crime, por estarem ausentes indícios de autoria e
prova da materialidade, verifica-se que os depoimentos já transcritos são
suficientes para a constatação dos indícios de autoria, aos quais me remeto
por brevidade.
Observa-se que, nesta fase, há que prevalecer a
máxima in dubio pro societate, uma vez que estamos na seara da mera
apreciação de eventual delito, mas não quanto à responsabilidade real ou não,
e, dessa forma, havendo a descrição dos fatos, a imputação de crimes em
tese, bem como qualificação dos acusados e não sendo o caso de rejeitá-la de
início, a denúncia deve ser recebida.
Por óbvio, não se afasta a possibilidade de serem
verdadeiros os argumentos da defesa, porém não se justifica a rejeição da
exordial quando há indícios da prática de um ou mais crimes.
Com a recepção da denúncia, facultar-se-á a ampla
produção das provas pelas partes, objetivando a busca da verdade real e a
adequada resposta penal.
Especificamente em relação ao crime contra a ordem
econômica previsto no art. 4º, inciso IV, da Lei nº 8.137/9011, observa-se que
este foi expressamente revogado pela Lei nº 12.529/201112, não tendo havido,
--
11
Eis a dicção do revogado artigo e seu inciso: “Art. 4º Constitui crime contra a ordem
econômica: (...) IV – açambarcar, sonegar, destruir ou inutilizar bens de produção ou de
consumo, com o fim de estabelecer monopólio ou de eliminar, total ou parcialmente, a
concorrência: (...).
12
Encontra-se hoje com a seguinte redação: “Art. 4º Constitui crime contra a ordem econômica:
I - abusar do poder econômico, dominando o mercado ou eliminando, total ou parcialmente, a
concorrência mediante qualquer forma de ajuste ou acordo de empresas;
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15. Denúncia Crime nº. 579.184-8
na nova lei, descrição de fato típico correlato à ação descrita na exordial,
motivo pelo qual a rejeição da denúncia quanto a este crime é medida que se
impõe diante da abolitio criminis.
Por fim, resta a análise das medidas cautelares
requeridas às fls. 1202 e ss para que fossem avocados os autos de ação penal
nº 2008.1031-3 em trâmite na Vara Criminal de São Miguel do Iguaçu diante
da conexão com o presente feito; a suspensão do exercício da função pública
de Promotor de Justiça do acusado Haroldo Nogiri; e a decretação da prisão
preventiva de Vilson Martins Rigo.
Em relação ao pedido para julgamento conjunto com
os autos nº 2008.1031-3, entendo prudente que sejam solicitadas informações
sobre o andamento e atual fase do aludido feito para evitar decisões
conflitantes.
No que tange à pretensão de suspensão do exercício
da função pública de Promotor de Justiça do acusado Haroldo Nogiri, tenho que
com razão o agente denunciante, invocando os arts. 282, I e II, e 319, VI,
ambos do Código de Processo Penal.13
Conforme narrado pelos representantes ministeriais
que assinaram a denúncia, houve os seguintes argumentos:
No caso concreto, os elementos de convicção apurados
demonstram que o Promotor de Justiça HAROLDO NOGIRI estaria fazendo use de suas funções
públicas como Promotor de Justiça para praticar reiteradas condutas de corrupção passiva,
lavagem de dinheiro, e outros crimes, conforme bem ilustrado na denúncia ora oferecida;
naquela outra denúncia oferecida contra o mesmo Promotor de Justiça e outras pessoas nos,
autos de Denúncia Crime n 841247-5, em trâmite nesse Egregio Tribunal de Justiça do Paraná;
e, ainda, no relatório de Sindicância da douta Corregedoria-Geral do Ministério Publico em
anexo.
--
13
Eis a leitura dos referidos artigos: Art. 282. As medidas cautelares previstas neste Título
deverão ser aplicadas observando-se a: (Redação dada pela Lei nº 12.403, de 2011). I -
necessidade para aplicação da lei penal, para a investigação ou a instrução criminal e, nos casos
expressamente previstos, para evitar a prática de infrações penais; (Incluído pela Lei nº 12.403,
de 2011). II - adequação da medida à gravidade do crime, circunstâncias do fato e condições
pessoais do indiciado ou acusado. (Incluído pela Lei nº 12.403, de 2011). Art. 319. São medidas
cautelares diversas da prisão: (Redação dada pela Lei nº 12.403, de 2011). (...)VI - suspensão do
exercício de função pública ou de atividade de natureza econômica ou financeira quando houver
justo receio de sua utilização para a prática de infrações penais; (Incluído pela Lei nº 12.403, de
2011).
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16. Denúncia Crime nº. 579.184-8
Diante deste quadro, o afastamento de suas funções publicas
leva em conta: a) o fato do acusado ser Promotor de Justiça, destacando-se, aqui, o modo de
ação centrado no uso de seus poderes enquanto tal; b) a condição funcional pessoal do acusado
e sua permanência na função implica em desprestígio da Instituição do Ministério Público,
perplexidade de subordinados, colegas, juízes, advogados e da própria sociedade civil; c) que já
foi denunciado uma vez e esta sendo novamente denunciado pelos crimes de corrupção passiva
e outros, revelando, assim, indicativo de comportamento absolutamente incompatível com -a
função de Promotor de Justiça; d) que foi determinado seu afastamento administrativo das
funções (esse, no entanto, com prazo máximo equivalente a 120 dias, nos termos do artigo 178,
caput, da Lei Orgânica Estadual do Ministério Público n.° 85/99); e) e que sua remoção para
outra Comarca não impede a reiteração do comportamento delituoso, haja vista que a
investigação revelou que ele se utilizaria de procedimentos sobre seus cuidados para a prática
delitiva.
Noutras palavras o que se tem é que um Promotor de Justiça,
valendo-se de sua função de combate a criminalidade, como instância formal de controle da
criminalidade, estaria abandonando os ideais da Instituição do Ministério Publico para agir de
forma exatamente inversa da expectativa de seus subalternos, de seus colegas, dos
magistrados, dos advogados e da própria sociedade. Tais dizeres não são genéricos, mas
apoiados nas provas dos autos, amplamente anotadas no Relatório de Sindicância da douta
Corregedoria-Geral do Ministério Público – em anexo – e no corpo da denúncia ora oferecida.
Em verdade, a posição de “intraneus”, na função de Promotor de
Justiça, com acesso a dados de investigação de diversos delitos que acabam servindo de moeda
de barganha para corrupção, agregado ao comportamento identificado, recomenda “per si” o
afastamento.
Somente a partir destes fundamentos trazidos pelo
agente ministerial já se mostra possível o afastamento do denunciado, não
apenas pelos crimes, em tese, cometidos, mas principalmente pela existência
de outra ação penal e por uma sindicância em andamento, o que enseja na
necessidade de utilizarmos daquele afastamento em atenção ao art. 282 e
incisos do CPP.
Ademais, o justo receio do uso do cargo de Promotor
de Justiça no eventual cometimento de novos crimes é patente, uma vez que
há a aparente reiteração delitiva.
Ora, a nova dicção dada ao Código de Processo
Penal, com as redações dos arts. 282 e 319, permite a conclusão de que tais
medidas foram elencadas como forma de proteção social e processual,
resultando em comandos judiciais contra aqueles que estejam respondendo a
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ações penais. Guardadas as proporções, o fato jurídico e a medida processual
em questão levam à concepção de medida urgente e protetiva à sociedade,
nos mesmos moldes da prisão preventiva, sendo certo e lembrando que o
denunciado foi intimado quanto ao pedido ministerial, cristalizando-se o
contraditório e a ampla defesa, em atenção ao art. 282, § 3º, CPP.
É de ser acolhida a argumentação da acusação
contra o ora denunciado, pois o cargo que ocupa poderá trazer como
consequência processual uma influência sobre o conjunto probatório e
eventual reiteração delitiva.
Os elementos concretos até agora trazidos aos autos
revelam a concretude deste temor, razão pela qual determino o seu
afastamento do cargo público, nos termos do art. 319, VI, CPP, até ulterior
deliberação.
Quanto ao acusado Vilson, verifico que ele foi
regularmente notificado no endereço indicado, conforme se vê da certidão de
fl. 1251-verso, não merecendo prevalecer a alegação de que se encontra em
local incerto e não sabido.
Voto, portanto, no sentido de receber a denúncia em
relação a todos os acusados pelos crimes imputados, à exceção do delito
previsto no art. 4º, inciso IV, da Lei nº 8.137/90, bem como o afastamento do
denunciado Haroldo Nogiri da função de Promotor de Justiça, devendo ser
requisitados aos órgãos competentes os antecedentes dos acusados, além de
solicitadas informações à Vara Criminal de São Miguel do Iguaçu acerca do
andamento e atual fase dos autos nº 2008.1031-3.
Face ao exposto,
ACORDAM os Magistrados que integram o órgão
Especial do Tribunal de Justiça do Estado do Paraná, por unanimidade de votos,
em receber a denúncia em relação a todos os acusados pelos crimes
imputados, à exceção do delito previsto no art. 4º, inciso IV, da Lei nº
8.137/90, e, por maioria de votos, vencido o Desembargador Paulo Habith,
afastar o denunciado Haroldo Nogiri das funções de Promotor de Justiça, nos
termos do voto do Relator.
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18. Denúncia Crime nº. 579.184-8
O julgamento foi presidido pelo Senhor
Desembargador Mendonça de Anunciação, sem voto, e dele participaram os
Senhores Desembargadores Telmo Cherem, Jesus Sarrão, Regina Afonso
Portes, Campos Marques, Guilherme Luiz Gomes, Sérgio Arenhart, Dulce Maria
Cecconi, Miguel Pessoa, Denise Kruger Pereira, Lauro Augusto Fabricio de
Mello, Prestes Mattar, Antonio Loyola Vieira, Paulo Habith, Nilson Mizuta,
Adalberto Jorge Xisto Pereira, D’Artagnan Serpa Sa, Jorge, Wagih Massad e
Ângela Khury Munhoz da Rocha.
Curitiba, 17 de setembro de 2012.
LUIZ OSÓRIO MORAES PANZA
Desembargador
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