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            Linguagem e epistemologia
             em Tomás de Aquino
2|I   v a n a l d o   S a n t o s   ( O r g . )
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    Linguagem e epistemologia
     em Tomás de Aquino

                        Ivanaldo Santos (Org.)




                                           Ideia
                                        João Pessoa
                                           2011
4|I   v a n a l d o   S a n t o s    ( O r g . )




                             Todos os direitos reservados.


Diagramação / Capa
Magno Nicolau (www.ideiaeditora.com.br)




 S485h Linguagem e epistemologia em Tomás de Aquino.
           Ivanaldo Santos (Orgs.). - João Pessoa: Ideia, 2011.
           180 p.

                  1. Literatura Brasileira

                                                              CDU: 869



Os textos são de inteira responsabilidade dos respectivos autores.




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                                    ideiaeditora@uol.com.br

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                                     SUMÁRIO



Apresentação
Mauricio Beuchot

Introdução

O “De Natura Verbi Intellectus” como texto gênese para a
compreensão das teorias do conhecimento e da linguagem
em Tomás de Aquino: introdução, tradução e notas
Paulo Faitanin

O negativo na epistemologia de Tomás de Aquino e as
rationes necessariae de Anselmo
Jean Lauand

O problema da linguagem em Tomás de Aquino
Ivanaldo Santos

A linguagem da alteridade em Tomás de Aquino
Sergio de Souza Salles

Gêneros literários e formas do saber na Universidade de
Paris do século XIII
Sávio Laet de Barros Campos

Da metafísica à epistemologia: a filosofia primeira
Lucas Kattah Macedo

Sobre os autores
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                                    Apresentação


      O livro organizado pelo professor Ivanaldo Santos
sobre a filosofia da linguagem e a epistemologia de Tomás
de Aquino é de grande atualidade. Com efeito, é um livro
que promove o diálogo filosófico, neste caso, principalmente,
com a atual filosofia analítica, a qual teve grande desen-
volvimento no século XX e que tem centrado suas invés-
tigações em estudar os problemas da linguagem e do
conhecimento. O presente volume é uma aproximação com
esse diálogo, o qual tem dado muitos frutos, tanto para o
tomismo como para a filosofia analítica.
      Com justiça, deve-se considerar o professor Ivanaldo
Santos como um dos representantes do tomismo analítico, o
qual é uma expressão do tomismo que tem ganhado grande
respeitabilidade dentro da filosofia contemporânea. Com
efeito, a filosofia analítica é uma das correntes mais influen-
tes dentro do cenário filosófico atual. Por sua vez, o
tomismo, que está em constante diálogo com a filosofia
produzida em cada século, não podia deixar de se interessar
por essa corrente. Por esse motivo, tem havido notáveis
autores que fazem uso do método de análises para trabalhar
com a tradição tomista. Entre esses autores cita-se: Anthony
Kenny, Peter Thomas Geach e John Haldane.
      Nessa linha se coloca o professor Ivanaldo Santos, da
UERN, no Brasil. Ele tem apresentado o diálogo entre a
tradição tomista e a analítica em diversos artigos e agora nos
brinda com a organização do presente livro.
      Algo muito importante para a filosofia da linguagem
em Tomás de Aquino é a mediação que existe entre o verbo
exterior, a coisa significada e o verbo interior. Por isso, é
L i n g u a g e m   e   e p i s t e m o l o g i a   e m   T o m á s   d e   A q u i n o   |7


fundamental o trabalho de Paulo Faitanin sobre o De natura
verbi intellectus do Aquinate, o qual é o texto onde se
encontra o núcleo da sua teoria do significado e, ao mesmo
tempo, é o que distingue sua teoria de muitas que foram
desenvolvidas contemporaneamente.
       Uma comparação muito interessante realiza Jean
Lauand entre a epistemologia de Tomás de Aquino e as
rationes necessariae de Anselmo. É conhecido o fato do filó-
sofo de Cantorbery desejar essas razões para demostrar, sola
ratione, os conteúdos da fé, fundamentado pela existência de
Deus, porém o Aquinate buscou um caminho mais a
posteriori, com uma epistemologia mais atenta ao empírico.
       Mostra-se como fundamental o trabalho de Ivanaldo
Santos sobre o problema da linguagem em Tomás de Aqui-
no. É a exposição da intercessão e a articulação da discussão
realizada com a filosofia analítica. É precisamente o tipo de
trabalho que esperam os cultivadores das análises filosóficas,
às quais se pode associar Tomás de Aquino.
       O ensaio de Sergio de Souza Salles sobre a linguagem
da alteridade em Tomás de Aquino é muito pertinente. Essa
discussão foi algo que o Aquinate desenvolveu constante-
mente, pois sempre falou, de diversas formas, acerca do
outro. Parodiando Wittgenstein, poderíamos dizer que
Tomás se esforçou para dizer o que só se podia mostrar e
que, por isso, terminou juntando o dizer e o mostrar. E uma
das formas dele fazer essa junção é por meio da alteridade.
       Sávio Laet de Barros Campos fala-nos dos gêneros
literários e formas do saber na Universidade de Paris, no
século XIII, o qual é o âmbito onde Tomás de Aquino desen-
volveu grande parte de sua importante obra filosófica. Esses
gêneros literários influenciaram o Aquinate a compor seu
discurso.
       Ademais, uma questão muito importante é abordada
por Lucas Kattah Macedo, o qual discute a transposição da
metafísica à epistemologia, no âmbito da filosofia primeira.
8|I   v a n a l d o   S a n t o s   ( O r g . )




Com efeito, Tomás de Aquino, o qual foi muito cuidadoso ao
construir seu pensamento ontológico, com as condições de
possibilidade do mesmo a partir da dimensão epistemo-
lógica, a partir do ponto de vista semântico da mesma forma
como procedeu Aristóteles.
      Todos esses assuntos estão presentes no volume que
temos em mãos. Por esse motivo, trata-se de um instrumento
de estudo muito útil para continuar o diálogo, a partir do
tomismo, com as correntes que na atualidade fazem uso da
filosofia da linguagem e da epistemologia. Por tudo isso,
temos que agradecer o esforço de Ivanaldo Santos, que nos
entrega esse volume, produto de sua organização, e aos
demais pesquisadores que contribuíram para sua realização.

                                                     Mauricio Beuchot,
                                                  UNAM, México, 2011.
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                                   Introdução


      Tomás de Aquino (1225-1274) foi o grande filósofo da
escolástica medieval. Todavia, sua contribuição ao
pensamento universal não está preso à Idade Média. Pelo
contrário, ao longo da modernidade, um grande número de
pensadores, tomistas e não tomistas, recorreram as suas
ideias para dar continuidade a suas investigações. No século
XX e no início do XXI, a realidade não é diferente. Tomás de
Aquino é convocado, por meio de sua vasta obra, a
contribuir com os debates intelectuais. Sem Tomás é difícil
pensar na história das ideias no Ocidente.
      Ao longo do século XX e na primeira década do XXI,
houve um esforço para se estudar uma dimensão diferente
dos tradicionais estudos em torno da obra do aquinate.
Estudos que o apresentam como um estudioso da metafísica
e a ética. É claro que Tomás de Aquino é um grande
estudioso dessas duas dimensões, mas sua obra atinge
outros níveis, como, por exemplo, a lógica, a linguagem, a
epistemologia e a hermenêutica.
      Foi com esse propósito que, no final do século XX,
surgiu o chamado tomismo analítico, o qual propõe um
diálogo entre Tomás de Aquino e uma das correntes
filosóficas mais influentes do século XX, ou seja, a filosofia
analítica. Esse diálogo versa sobre temas importantes para a
tradição filosófica e para o tomismo, como, por exemplo, a
linguagem, o conhecimento e o método.
      O presente livro não se enquadra diretamente na
categoria de tomismo analítico. Pelo contrário, sua pretensão é
bem mais simples, qual seja: apresentar uma pequena
coletânea de artigos produzidos por estudiosos da obra do
Aquinate sobre dois temas caros à tradição filosófica e aos
estudos realizados no século XX, que são, a linguagem e a
10 | I   v a n a l d o   S a n t o s   ( O r g . )




epistemologia. E por isso o título do livro é Linguagem e
epistemologia em Tomás de Aquino.
      Nesse livro, o leitor encontrará uma grande variedade
de problemas que o Aquinate abordou, ao debater os temas
da linguagem e da epistemologia. Ficará espantado ao ver
que, em pleno século XIII, Tomás de Aquino tinha um
profundo conhecimento da tradição filosófica e dos pro-
blemas que realmente angustiam a filosofia. Problemas que,
de uma forma ou de outra, atravessaram a modernidade e
chegaram até o século XXI.
      Paulo Faitanin apresenta uma ótima tradução, com um
estudo introdutório, do De Natura Verbi Intellectus de Tomás
de Aquino. Um texto necessário para a compreensão das
teses desenvolvidas pelo Aquinate sobre a linguagem e a
epistemologia.
      Por sua vez, Jean Lauand apresenta um estudo sobre o
papel do negativo na epistemologia de Tomás de Aquino,
em comparação com as rationes necessariae de Anselmo.
      Ivanaldo Santos apresenta a linguagem enquanto
problema filosófico na obra de Tomás de Aquino e Sergio de
Souza Salles expõe um brilhante estudo sobre a linguagem
da alteridade no Aquinate.
      Já Sávio Laet de Barros Campos apresenta um
estudo sobre os gêneros literários e formas do saber na
Universidade de Paris do século XIII. Trata-se de um estudo
onde podemos vislumbrar o ambiente intelectual, no qual
Tomás de Aquino produziu grande parte de sua obra. E
Lucas Kattah Macedo apresenta um estudo sobre a relação
entre a metafísica e a epistemologia.
      Por fim, é preciso realizar um agradecimento especial
ao renomado filósofo Mauricio Beuchot, pesquisador do
Centro de Estudos Filosóficos da Universidade Autônoma
do México (UNAM), o qual gentilmente realizou a
apresentação do livro.
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O ‘De Natura Verbi Intellectus’ como texto
  gênese para a compreensão das teorias do
 conhecimento e da linguagem em Tomás de
   Aquino: introdução, tradução e notas1
                                                                            Paulo Faitanin


          Introdução

       A Filosofia da Linguagem tomasiana é fundamental para
entender a sua doutrina acerca do significado analógico dos
conceitos. A comunicação da verdade resulta da ordem que a
razão estabelece internamente nos seus conceitos e expressa
pela linguagem. Por isso, a linguagem que procede da dialé-
tica é instrumento para a comunicação da verdade. O conhe-

1 Nossa intenção, neste artigo, é, primeiramente, apresentar algo da
filosofia da linguagem de Tomás de Aquino, em alguns parágrafos
e, secundariamente, apresentar uma tradução não crítica e analítica
do De natura verbi intellectus. Justifica-se esta tradução pelo fato de
que, neste texto, Tomás explica como o conceito – o verbum
entendido como verbo mental, palavra mental – é gerado pelo
intelecto. A assertividade do conceito pautada em sua adequação
com a realidade assegura uma teoria do conhecimento que rela-
ciona o intelecto com o real e estabelece uma teoria da linguagem
que exige uma análise1 apurada das palavras que forem usadas
para expressar o real. Desta maneira, trabalharemos um texto
‘gênese’ da teoria do conhecimento, extremamente importante
para compreender sua teoria da linguagem e o modo como esta
deve ser utilizada para fazer ciência, na medida em que se observa
a conveniência e a proporcionalidade dos nomes usados para
darem conta de um conceito que expressa a verdade de uma
realidade.
12 | I   v a n a l d o   S a n t o s   ( O r g . )




cimento intelectual do homem traduz-se, exteriormente,
num conjunto de sinais sensíveis, falados ou escritos, que
compõem a linguagem humana. Sinal é aquilo que serve
para o conhecimento de outra realidade2. A fala é a mani-
festação, pela voz, da palavra interior que se concebe com a
mente3. A palavra é uma voz convencional significativa de
um conceito, que por sua vez é uma similitude da coisa4,
produzida pelo intelecto, ao abstrair da realidade sua simi-
litude inteligível5. A voz é um sinal material, sensível da
palavra, que permite a sua comunicação aos demais homens6
e consiste na emissão oral dos sons como efeito orgânico das
cordas vocais7, dando sentido ao que se emite.
      A palavra significa, pois, a coisa mediante o conceito,
pois segundo o modo como se lhe entende, assim se lhe
nomeia8. O nome é uma voz significativa, isto é, uma voz que
tem significado9. Em síntese, o nome é um sinal inteligível do
conceito10 manifesto numa palavra falada ou escrita. A signi-
ficação do nome se dá segundo aquilo a que é imposto ao
nome significar11. O verbo é uma voz significativa declinável
com o tempo, presente, passado e futuro, utilizado, às vezes,
como substantivo ou considerado em si mesmo, em seu ato
abstrato, no infinitivo12. As palavras e os nomes, que com-
põem a linguagem e que expressam os conceitos elaborados
pelo intelecto, podem ser utilizados para significar outras

2 TOMÁS DE AQUINO, S. STh. III, q60, a4,c.
3 TOMÁS DE AQUINO, S. De veritate, q9, a4.
4 TOMÁS DE AQUINO, S. In I Perih. Lec. 10; STh. I, q13, a1, c.
5 TOMÁS DE AQUINO, S. De natura verbi intellectus.
6 TOMÁS DE AQUINO, S. In I Perih. Lec. 4.
7 TOMÁS DE AQUINO, S. STh. I, q51, a3, obj4.
8 TOMÁS DE AQUINO, S. STh. I, q13, a1, c.
9 TOMÁS DE AQUINO, S. In I Perih. Lec. 4.
10 TOMÁS DE AQUINO, S. In IX Met. Lec. 3.
11 TOMÁS DE AQUINO, S. STh. II-II, q92, a1, ad2; I, q31, a1, ad1.
12 TOMÁS DE AQUINO, S. In I Perih. Lec. 5.
L i n g u a g e m   e   e p i s t e m o l o g i a   e m   T o m á s   d e   A q u i n o   | 13


coisas. E isso ocorre porque se distingue o significado de
uma palavra, do modo como é utilizado para significar13.
Neste sentido, evidencia-se que os termos da linguagem,
como as palavras e os nomes, nem sempre conservam o
mesmo significado.
      Por este motivo, cabe considerar com muita atenção se
um nome é aplicado a uma realidade enquanto significa a
essência ou não da realidade nomeada. Por meio de um
nome, os conceitos podem ser utilizados para significar
outras coisas. E isso ocorre porque se distingue o significado
de uma palavra, do modo como é utilizado para significar14.
Diz-se, por exemplo, que um nome é unívoco quando signi-
fica uma mesma essência, que se diz de uma única natureza,
ou seja, a conveniência do nome com a natureza15, como
quando se toma o nome coelho para designar uma espécie de
animal e que conserva sempre este mesmo sentido ou como
no caso do nome Deus16. Por outro lado, diz-se equívoco,
quando um nome tomado significa várias coisas distintas17,
como ocorre na ambiguidade, onde não se toma a similitude
entre as realidades, mas a unidade do nome18. Neste caso,
não há proporcionalidade entre o nome e a essência, ou seja,
o nome é comum, mas as substâncias diversas19, como
quando se toma o nome quarto para significar um número
ordinal ou um cômodo da casa ou com o nome cão, dito



13 TOMÁS DE AQUINO, S. CG. I, c. 30.
14 TOMÁS DE AQUINO, S. CG. IV, c. 49.
15 TOMÁS DE AQUINO, S. STh. I, q5, a6, ad3/ q13, a10, c; In II Sent. d.

22, q.1, a.3, ad2.
16 TOMÁS DE AQUINO, S. STh.I, q5, a6, ad3/ q13, a10, c; In II Sent. 22,

1, 3, ad2.
17 TOMÁS DE AQUINO, S. CG. IV, c.49.
18 TOMÁS DE AQUINO, S. CG. I, c.33.
19 TOMÁS DE AQUINO, S. STh. I, q4, a2, c.
14 | I   v a n a l d o   S a n t o s   ( O r g . )




univocamente do animal, para referir-se à constelação ou ao
temperamento irascível de algum homem20.
      Mas é dito análogo, quando um mesmo nome é atri-
buído comumente a muitas realidades distintas entre si, mas
de algum modo relacionadas21, na medida em que esta
correlação segue uma comparação por proporção22 do que há
de comum e semelhante entre as distintas realidades referi-
das por aquele mesmo nome. Assim, pois, o nome saudável,
tomado analogamente, pode ser dito do alimento e do corpo
que dele se alimenta, porque há uma correlação entre o
alimento saudável e o corpo saudável, enquanto um é causa
do outro. Deste modo, a analogia supõe a aplicação dos
primeiros princípios, como o da causalidade, neste exemplo
dado.
      A analogia é, pois, uma comparação que pode ser por
proporcionalidade23, quando os sujeitos possuem semelhante
perfeição, mas significada de modos diversos24 como, por
exemplo, ser dito do homem, do anjo e de Deus. A analogia
também pode ser uma comparação por atribuição, quando
um dos sujeitos possui a perfeição em sua plenitude e os
demais por participação ou de modo derivado, como, por
exemplo, intelecto dito de Deus e por atribuição do homem e
do anjo. Assim, diz-se que um nome é análogo, se ele é
aplicado comumente a muitos indivíduos25, respeitando a
comparação por proporção ou por atribuição.
      O Aquinate concebe o ente analogamente, porque ente
não é um nome genérico, uma vez que, enquanto tal, não



20 TOMÁS DE AQUINO, S. STh. I, q4, a2, c.
21 TOMÁS DE AQUINO, S. In I Sent. d.22, q.1, a.3, ad2.
22 TOMÁS DE AQUINO, S. STh. I, 13, a5, c.
23 TOMÁS DE AQUINO, S. STh. I, q.13, a5, c.
24 TOMÁS DE AQUINO, S. STh. I, q.13,a 10, c.
25 TOMÁS DE AQUINO, S. In I Sent. d.22, q1, a3, ad2.
L i n g u a g e m   e   e p i s t e m o l o g i a   e m   T o m á s   d e   A q u i n o   | 15


inclui todas as diferenças26 predicáveis do ente que fazem
parte da definição do gênero, como, por exemplo, o conceito
de animal, que inclui as diferenças racional e irracional27. E,
dado que o nome atribuído a uma realidade deve indicar o
que significa o conceito desta realidade, para uma melhor
análise do nome, parece proeminente entender o que é o
conceito e como ele é gerado. Assim, mediante esta apuração
analítica, poder-se-á melhor usar os nomes e as palavras
para referirem às diversas realidades.

                                         Texto e Tradução


           THOMAS DE AQUINO                                    TOMÁS DE AQUINO
          De natura verbi                              A natureza da palavra no
          intellectus28.                                     intelecto.
            Prooemium                                        Introdução
    Quoniam circa naturam                            Porque a consideração da
verbi intellectus, sine quo                       palavra no intelecto, sem a qual
imago Trinitatis non invenitur                    não se encontra expressa no
in homine expressa, multiplex                     homem a imagem da Trindade,
difficultas et prolixitas nimia                   traz consigo inúmeras dificul-
animum        involvit;    ideo                   dades e um sem número de

26 TOMÁS DE AQUINO, S. In I Met. Lec.9, n.139.
27 TOMÁS DE AQUINO, S. STh. I, q3, a5, c.
28 Este opúsculo filosófico atribuído a Tomás tem a autenticidade

controvertida. Sobre sua autenticidade: FAITANIN, P.S. “A
controvérsia acerca da autenticidade de sete opúsculos atribuídos a
Tomás de Aquino”, Aquinate, n.1 [2005], 9-20. Quanto ao título, há
certa uniformidade nas edições pesquisadas: De natura verbi
intellectus. Quanto ao tempo de composição, não há certeza, mas
pensamos ter sido escrito no período entre 1268-1272, durante a
Segunda Regência, em Paris. O texto, que se divide em dois
capítulos, procura responder a duas questões: o que é a palavra e
como se gera a palavra no intelecto. O texto latino encontra-se em:
http://www.corpusthomisticum.org/xti.html
16 | I   v a n a l d o   S a n t o s   ( O r g . )




summatim       eius   naturam                        questões para o entendimento,
tradere intendimus, insuper et                       tentaremos, por essa razão, con-
difficultates ipsum tangentes                        siderar, brevemente, sua nature-
simul manifestare.                                   za e demonstrar, ao mesmo
                                                     tempo, aquelas dificuldades que
                                                     recaem sobre ela.

             Caput 1                                             Capítulo 1
         Quid sit verbum                                      O que é a palavra?
   Sciendum est igitur primo,                           Em primeiro lugar, deve
quod verbum cum re dicta per                         saber-se, pois, que a palavra, no
verbum convenientiam habet                           que se refere à sua natureza, ela
maiorem in natura sua quam                           tem maior conformidade com a
cum dicente, licet in dicente sit                    realidade que se expressa pela
ut in subiecto. Unumquodque                          palavra, do que com a natureza
enim ab illo naturam sortitur a                      de quem a profere, ainda que
quo speciem accipit et nomen                         ela exista em quem a diz, como
sortitur, cum species sit tota                       em seu sujeito. Na verdade,
natura rei. Verbum autem                             cada coisa recebe um nome
speciem accipit a re dicta, et                       daquilo que recebe da natureza,
non a dicente, nisi forte                            do que pertence à espécie,
quando dicit se: sicut verbum                        sendo a espécie toda a natureza
lapidis differt specie a verbo                       da coisa. Ora, a palavra toma a
asini; verbum etiam dictum a                         espécie da realidade que ex-
diversis de eadem re, idem                           pressa e não de quem a profere,
specie est. Et huius ratio est,                      exceto no caso de que alguém
quia effectus quilibet magis                         expresse pela palavra algo de si
convenit cum principio quo                           mesmo: desta maneira, a pala-
agens agit, quam cum agente,                         vra ‘pedra’ difere da palavra
cui solum assimilatur ratione                        ‘asno’; uma mesma palavra
ipsius principii: hoc enim est                       pode, também, ser dita de
quod communicatur effectui                           muitos da mesma realidade, e a
per actionem agentis.                                mesma realidade é a espécie. E a
                                                     razão disso é que qualquer
                                                     efeito tem mais relação com o
                                                     princípio, pelo qual o agente
                                                     age, do que com a ação mesma
                                                     do agente, com o qual somente
L i n g u a g e m   e   e p i s t e m o l o g i a   e m   T o m á s   d e   A q u i n o   | 17


                                                  se assemelha em razão do
                                                  princípio mesmo: e isso é o que
                                                  realmente é comunicado, pelo
                                                  agente, ao efeito.
    Similitudo autem rei dictae                      Ora, a semelhança da reali-
est principium quo verbum rei                     dade que é expressa pela pala-
efficitur, quae etiam in verbo                    vra é o princípio pelo qual se
reperitur a dicente sibi                          produziu a palavra, semelhança
communicata: et ideo ipsum                        que, também, se encontra comu-
verbum quandoque dicitur                          nicada na palavra que o falante
similitudo rei, quandoque                         profere para si mesmo: e é por
vero verbum rei, ubicumque                        essa razão que a própria palavra
illa similitudo exprimitur, sive                  é denominada semelhança da
in parte imaginativa, sicut                       realidade, seja na imaginação,
phantasma Chartaginis est                         quando verdadeiramente se ex-
verbum              Chartaginis,                  pressa pela palavra da realidade
secundum Augustinum29; sive                       aquela semelhança, tal como
in intellectu nostro, ubi                         ensina Santo Agostinho, quando
perfecta ratio verbi invenitur                    disse que a palavra ‘Catargo’ é a
quod, ad imaginem pertinet.                       imagem de Catargo; seja em
                                                  nosso intelecto, onde se encon-
                                                  tra a natureza perfeita da pala-
                                                  vra a que se atribui a imagem.
    In verbis enim quae in                           Na verdade, a natureza da
imaginativa fiunt, non est                        palavra não é expressa naquelas
ratio verbi expressa. Aliud                       palavras que se produzem na
namque est in ea unde                             imaginação. O fato é que um é o
similitudo exprimitur, et aliud                   lugar onde se expressa a seme-
in quo terminatur. Exprimitur                     lhança e outro onde termina. Na
enim a sensu, et terminatur in                    verdade, a semelhança é expres-
ipsa phantasia, cum phantasia                     sa pelo sentido e termina na
sit motus factus a sensu                          própria fantasia, sendo a fanta-
secundum actum, secundum                          sia o movimento causado pelo
philosophum in tertio De                          sentido, segundo o ato, tal como




29   SANTO AGOSTINHO, De Trinitate, VIII, c. 6 [PL 42, 954-955].
18 | I   v a n a l d o   S a n t o s   ( O r g . )




anima30. Sed supra intellectum                       ensina o Filósofo, no terceiro
nihil est in quo ab ipso aliquid                     livro do De anima. Mas, não
exprimatur; et ideo non est                          existe nada além do intelecto
aliud quod exprimit ab eo in                         em que algo possa ser expresso,
quo exprimitur, sicut nec in                         tal como no intelecto mesmo o
Deo aliud est pater exprimens,                       é; e isto porque não é outro que
et aliud in quo recipitur                            a expressa por ele o que nele se
expressum.                                           expressa, como nem em Deus
                                                     um é o que o Pai expressa e
                                                     outro em que se recebe o
                                                     expresso.
    Sed adhuc in intellectu                             Mas, até nisso há defeito em
nostro est defectus, quia aliud                      nosso intelecto, porque algo é o
est quod exprimit, aliud                             que a expressa e outro é a pró-
ipsum verbum expressum;                              pria palavra expressa, o que não
quod in Deo non invenitur: et                        ocorre em Deus; e isto porque a
ideo verbum Dei est Deus,                            Palavra de Deus é Deus; no
intellectus    autem     noster                      entanto, em nosso intelecto, a
verbum suum non est, neque                           palavra não é sua, nem mesmo é
etiam est suum dicere, quod                          o seu dizer, que é a causa pró-
est proxima causa verbi.                             xima da palavra.
    Nascitur enim verbum                                Na verdade, a nossa palavra
nostrum ex notitia alicuius                          origina-se a partir do conhe-
habiti     apud     memoriam                         cimento de alguma natureza
nostram, quae nihil aliud est                        que há em nossa memória, que
in hoc loco quam ipsa                                não é outra coisa senão o lugar
receptibilitas animae nostrae,                       em que há a própria receptibi-
in qua etiam tenet se,                               lidade de nossa alma, na qual
secundum        Augustinum31,                        ela existe e que, segundo Santo
etiam cum se non discernit,                          Agostinho, também não se dis-
sed alia quae ab extra acquirit.                     tingue dela, mas daquelas coisas
                                                     que ela percebe e que vêm de
                                                     fora.
     Primus ergo processus in                           Portanto, o primeiro processo


30 ARISTÓTELES, De anima, III, c. 3, 428b 10-17 [Comentário de Santo
Tomás, lectio 6].
31 SANTO AGOSTINHO, De libero arbitrio, II, c. 19 [PL 32, 1268].
L i n g u a g e m   e   e p i s t e m o l o g i a   e m   T o m á s   d e   A q u i n o   | 19


gignitione verbi est cum                      de formação da palavra ocorre
intellectus accipit a memoria                 quando o intelecto recebe da
quod ab ea sibi offertur, non                 memória o que dela lhe é
eam spolians quasi in ea nihil                oferecido, não a privando, como
relinquens, sed similitudinem                 se nada deixasse nela, mas
habiti in se assumens; et hoc                 tomando para si a semelhança
est simile illi quod in memoria               da natureza; e isso é semelhante
habetur, et ideo vocatur                      ao que havia na memória e, por
aliquando illud quod ab                       esse motivo, denominou-se,
intellectu accipitur verbum                   algumas vezes, de palavra da
memoriae; sed adhuc non                       memória, àquilo que é recebido
habet perfectam rationem                      pelo intelecto; mas isso ainda
verbi; haberet tamen, si                      não é suficiente para que tenha
intellectus solum reciperet a                 a perfeita natureza de palavra;
memoria exprimente. Sed cum                   seria, todavia, suficiente, se o
memoria non habeat actum                      intelecto somente recebesse
aliquem, sed in loco actus                    para a formação da palavra o
solum tenet libere quasi parata               que lhe exprime a memória.
capienti a se, intellectus vero               Mas, não tendo a memória al-
in lumine suo capit ea; adhuc                 gum ato, exceto aquele ato livre
perfectam rationem verbi non                  local pelo qual está preparada
habet.                                        para compreender-se, o inte-
                                              lecto, em sua luz, a compreende
                                              perfeitamente; mas, mesmo
                                              assim, ainda não se estabelece a
                                              perfeita natureza de palavra.
    In divinis vero pater, cui                   Mas, nas Pessoas divinas, o
respondet memoria in ratione                  Pai, a quem corresponde a me-
ordinis, vel originis, complete               mória, em razão de ordem, ou
generat, quia pater id quod                   origem, gera perfeitamente a
habet, non solum tenet ut                     Palavra, porque isso que tem o
memoria apud nos, sed quia                    Pai não é somente o que é a
est suppositum completum                      memória para nós, porque Ele é
cuius est agere, ideo generat                 o suposto completo a que per-
filium.    Non      enim     in               tence o operar e, por isso, Ele
generatione                ista               gera o Filho. Com efeito, não se
praesupponitur aliquid quasi                  pressupõe isto na geração da
a patre accipiens, et aliud                   Palavra divina, como se algo
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quasi acceptum: sic apud nos                         fosse recebido do Pai e algo
intellectus accipit a memoria,                       fosse recebido de outro: tal
et praesupponitur generationi;                       como ocorre conosco, em que o
ibi vero filius generatur a                          intelecto recebe algo da me-
patre, sicut si totus intellectus                    mória e o pressupõe para a ge-
noster esset a nostra memoria,                       ração de sua palavra; naquele
et non similitudo ista vel illa.                     outro caso, o Filho é efetiva-
                                                     mente gerado pelo Pai, como se
                                                     o mesmo intelecto fosse total-
                                                     mente a nossa memória e não
                                                     apenas esta ou aquela seme-
                                                     lhança.
   Cum       ergo     intellectus                       Estando, pois, o intelecto
informatus specie natus sit                          informado pela espécie, ele está
agere;     terminus       autem                      apto por natureza para operar;
cuiuslibet actionis est eius                         ora, o término de qualquer ope-
obiectum, nititur agere circa                        ração é o seu objeto, por isso, o
obiectum; obiectum autem                             intelecto inclina-se a operar
suum est quidditas aliqua                            sobre o objeto; mas, o seu objeto
cuius specie informatur, quae                        é alguma quididade, que é
non       est        principium                      informada pela espécie, que não
operationis vel actionis nisi ex                     é o princípio da operação ou da
propria ratione illius cuius est                     ação, senão da prórpia natureza
species. Obiectum autem non                          daquilo de que é espécie. Mas, o
adest ipsi animae illa specie                        objeto, que foi informado à alma
informatae, cum obiectum sit                         por aquela espécie, não se en-
extra in sua natura; actio                           contra na própria alma, do mes-
autem animae non est ab                              mo modo que existe em sua
extra, quia intelligere est                          natureza, fora dela; ora, a ação
motus ad animam, tum ex                              da alma não se dá fora dela,
natura speciei quae in talem                         porque o inteligir é um movi-
quidditatem ducit, tum ex                            mento intrínseco para a alma,
natura intellectus, cuius actio                      tanto quando ela considera a
non est ad extra. Prima autem                        natureza da espécie, que resulta
actio eius per speciem est                           na apreensão de tal quididade,
formatio sui obiecti, quo                            como quando atua por parte da
formato intelligit; simul tamen                      natureza do intelecto, cuja ação
tempore ipse format, et                              não se dá fora dela. Ora, a sua
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formatum est, et simul                        primera ação é a formação do
intelligit, quia ista non sunt                seu objeto pela espécie, que o
motus de potentia ad actum,                   entende quando formado; con-
quia iam factus est intellectus               tudo, no mesmo instante que o
in actu per speciem, sed est                  forma, é formado e entende,
processus perfectus de actu in                porque isso não é um movi-
actum, ubi non requiritur                     mento de potência ao ato, por-
aliqua species motus.                         que já é feito pelo intelecto em
                                              ato, mediante a espécie, mas é
                                              um processo perfeito de ato em
                                              ato, onde não se requer alguma
                                              espécie de movimento.
    Et quia, ut dictum est,                      E porque, tal como foi dito,
huiusmodi obiectum in ipsa                    que o objeto desta maneira é
anima formatur, et non extra,                 formado na própria alma, e não
ideo erit in anima ut in                      fora dela, por isso, existirá na
subiecto; est enim similitudo                 alma como em seu sujeito; com
rei extra. Quod autem est in                  efeito, é similitude da realidade
anima ut in subiecto, efficitur               externa. Ora, o que existe na
in ea ut habitus. De perfecta                 alma como num sujeito, se pro-
autem ratione habitus est,                    duz nela por hábito. Mas a
quando actui coniungitur: in                  perfeita natureza do hábito se
hoc enim natura perficitur.                   dá quando se une ao ato: com
Perficitur autem per lumen                    efeito, a natureza se aperfeiçoa
naturale intellectus, involvens               mediante isso. Ora, se aper-
speciem intelligibilem in quo                 feiçoa pela luz natural do inte-
et sub quo intelligatur.                      lecto, envolvendo a espécie inte-
                                              ligível na qual e sob a qual se
                                              entende.
    Idem enim lumen quod                         Ora, a mesma luz que o inte-
intellectus recipit cum specie                lecto recebe com a espécie, pelo
ab agente, per actionem                       agente, é difundida pela ação do
intellectus possibilis informati              intelecto possível que informa
tali specie diffunditur, cum                  tal espécie, que se forma com o
obiectum formatur, et manet                   objeto, e permanece com o obje-
cum obiecto formato; et hoc                   to formado; e isso tem a plena
habet plenam rationem verbi,                  natureza de palavra, pois nela a
cum in eo quidditas rei                       quididade da coisa é entendida.
22 | I   v a n a l d o   S a n t o s   ( O r g . )




intelligatur. Sicut in principio                     Assim como no princípio da
actionis intellectus et species                      ação não são duas coisas o
non sunt duo, sed unum est                           intelecto e a espécie, porque um
ipse intellectus et species                          é o próprio intelecto e a espécie
illustrata; ita unum in fine                         ilustrada; do mesmo modo é
relinquitur, similitudo scilicet                     uma mesma realidade lograda
perfecta, genita et expressa ab                      no fim, ou seja, a perfeita simi-
intellectu: et hoc totum                             litude, gerada e expressa pelo
expressum est verbum, et est                         intelecto: e esse todo expresso é
totum rei dictae expressivum,                        a palavra, na medida em que é
et    totum     in    quo    res                     toda a realidade dita de modo
exprimitur;      et   hoc    est                     expressivo e tudo no qual a
intellectum principale, quia                         coisa é expressa; mas isso é o
res non intelligitur nisi in eo.                     intelecto principal, pois a coisa
Est enim tanquam speculum                            não é entendida senão nele.
in quo res cernitur, sed non                         Com efeito, ele é como um espe-
excedens id quod in eo                               lho no qual a coisa se reflete,
cernitur. Efficitur enim opere                       mas não excedendo o que nele
naturae ut in eo aliquid                             se reflete. Na verdade, se pro-
cernatur: natura autem non                           duz a obra da natureza quando
agit aliquid superflue, et ideo                      nele se reflete algo: ora, a natu-
non excedit speculum hoc,                            reza não opera algo inutilmente
idest id quod in eo videtur.                         e, por isso, não excede a esta
                                                     imagem, isto é, àquilo que nela
                                                     se vê.
    Verbum igitur cordis est                            Portanto, a palavra interna é
ultimum       quod        potest                     a última coisa que o intelecto
intellectus in se operari. Ad                        pode em si mesmo produzir.
ipsum enim, ut est in quo                            Com efeito, o inteligir é finali-
quidditas rei recipitur, immo                        zado nele mesmo, na medida
quia ipsemet est quidditatis                         em que ele recebe a quididade
similitudo,         terminatur                       da coisa, pois que isso mesmo é
intelligere. Sic enim habet                          similitude da quididade. Com
rationem obiecti intellectus. Ut                     efeito, é assim que se tem a na-
vero est per intellectum                             tureza do objeto pelo intelecto.
expressum, ei coniungitur                            Como, de fato, [a palavra] é
dicere; et sic ipsum idem                            expressa pelo intelecto, diz-se
verbum est effectus actus                            que ela se une a ele; e, assim,
L i n g u a g e m   e   e p i s t e m o l o g i a   e m   T o m á s   d e   A q u i n o   | 23


intellectus, qui est formativus               esta mesma palavra é efeito do
obiecti, et ipsius dicere.                    ato do intelecto, que forma o
                                              objeto e é sua própria expressão.
    Sed in hoc reperitur                         Mas nisso se encontra alguma
differentia quaedam: quod                     diferença: com efeito, o que se
enim intelligitur, potest esse in             intelige pode existir no intelecto
intellectu     et   manere      in            e permanecer no intelecto, mas
intellectu non intellectum                    não em ato no intelecto; ora, o
actu; quod autem dicitur,                     que se diz, pode ser dito, mas
potest esse dictum, sed non                   não pode permanecer dito, a
potest manere dictum, nisi                    não ser se dito em ato: daí que,
cum actu dicitur: unde in                     no intelecto, as espécies do
intellectu      potest    manere              objeto podem permanecer em
species obiecti in habitu. Illud              hábito. De fato, digo que aquilo
enim dico quod formatum est,                  é formado, mas não permanece
sed non manet id in quo                       naquilo em que é formado, sem
formatum est sine lumine in                   a luz pela qual algo é inteligido
quo actu aliquid intelligitur.                em ato. Daí que a palavra não
Inde est quod verbum non est                  existe sem o inteligir em ato,
sine intelligere in actu, licet               ainda que a mesma possa per-
ipsum intellectum nudum in                    manecer privada em hábito, no
habitu manere possit. Habitus                 intelecto. Hábito aqui não se
hic dicitur non ipsa potentia                 refere somente à própria potên-
memorativa tantum, quae                       cia da memória, que precede ao
praecedit intellectum: immo                   intelecto: mas, também, ao pró-
ipse intellectus est natus                    prio intelecto que é apto natu-
retinere     suum       obiectum,             ralmente a reter o seu objeto,
propter       tamen      naturam              por causa, também, da natureza
memoriae, quae prior est.                     da memória, que lhe é anterior.
Unumquodque enim prius                        Ora, qualquer coisa que é prévia
salvatur in suo posteriori; et                se encontra salvo em seu pos-
ideo ipsa perfectio obiecti                   terior; e, por isso, se tem a per-
habetur      in    ipso    habitu             feição mesma do objeto no pró-
intellectus, ut dictum est, et ibi            prio hábito do intelecto, como
posita est perfectio verbi                    foi dito, e aí se encontra a per-
superius.                                     feição mais superior da palavra.
    Ex his manifestum est                        Do anterior fica claro de que
qualiter apud nos deficit a                   modo nos falta para representar
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repraesentatione     filii   in                      a Filiação divina; pois a nossa
divinis; quia scilicet ipsa                          própria inteligência não é pro-
intelligentia nostra non est                         duzida a partir de nossa memó-
educta de memoria nostra, a                          ria, de onde ela tira, portanto, o
qua tamen principium et                              seu princípio e a natureza de
rationem agendi habet. Quae,                         sua ação. A qual, se fosse pro-
si esset de memoria totaliter                        duzida totalmente da memória,
educta, ipsa esset verbum                            a mesma seria palavra de sua
memoriae suae: unde non                              memória: donde não poderia
diceret se, nec exprimeret nisi                      dizer-se senão de si mesma,
dictatum et expressum a                              nem expressaria senão o que é
memoria sua, quia aliter falso                       dito e expresso por sua memó-
diceret et exprimeret se: sicut                      ria, porque, de outro modo, se
verbum in divinis non dicit                          diria e expressaria algo falso de
seipsum       gignendo       et                      si mesmo: tal como a Palavra
exprimendo, sed dicit seipsum                        nas Pessoas divinas não se
genitum et expressum.                                refere a si mesmo gerando e
                                                     exprimindo, mas refere-se a si
                                                     mesmo como gerado e expresso.
    Rursum manifestum est                               Além do mais, fica claro por
quare verbum proprie dicitur                         que a palavra, propriamente, se
personaliter tantum. Verbum                          diz somente de um modo pes-
enim nostrum semper est in                           soal. De fato, a nossa palavra
continuo fieri, quia semper                          sempre está num contínuo
perfectum esse suum est in                           fazer-se, porque o seu ser per-
fieri; sed hoc non est                               feito sempre está por fazer-se;
imperfectum, quasi totum                             mas isso não é uma imperfeição,
simul non existens, sicut est de                     como se o todo não existisse
aliis quae sunt in fieri, quae                       simultaneamente, tal como
etiam semper sunt imperfecta;                        aquelas coisas que estão por
immo verbum in principio sui                         serem feitas e, que, também,
est perfectum, quia conceptio                        sempre são imperfeitas; a pala-
perfecte formata est, et                             vra, ao contrário, é perfeita em
nihilominus      esse       eius                     seu princípio, porque sua con-
perfectum servatur eodem                             cepção foi formada perfeita-
modo quo gignebatur. Non                             mente e o seu ser perfeito
enim transit formatio verbi                          conserva-se, do mesmo modo
ipso formato, sed cum actu                           que foi gerado. De fato, a
L i n g u a g e m   e   e p i s t e m o l o g i a   e m   T o m á s   d e   A q u i n o   | 25


intelligitur continue formatur                formação da palavra não passa
verbum, quia semper est ut in                 ao próprio formado, mas, inte-
fieri et ut in egrediendo ab                  ligindo em ato, se forma conti-
aliquo, scilicet a dicente. Et                nuamente a palavra, porque
hoc       cum      personarum                 sempre está como num fazer-se
processionibus        convenit.               e como num elevar-se por algo,
Intelligere vero, ut in quiete                ou seja, por quem a expressa. E
accipitur, et essentiale est in               isso convém à processão das
divinis, dicere vero, sicut et                Pessoas. Na verdade, o inteligir,
verbum, personaliter dicitur.                 enquanto se encontra em re-
                                              pouso e de modo essencial está
                                              nas Pessoas divinas, é verda-
                                              deiro, como a Palavra, que é
                                              dita pessoalmente.

               Caput 2                                     Capítulo 2
        Quomodo generetur                             Como se gera a palavra?
             verbum
    Nunc restat videre, utrum                    Resta considerar, agora, se a
verbum         gignatur       per             palavra foi gerada por um ato
reflexionem actus intellectus                 de reflexão do intelecto ou se foi
vel per actum rectum.                         por um ato direto.
    Ad     cuius      evidentiam                 Deve-se considerar, para o
considerandum         est  quod               esclarecimento desta questão,
verbum quod est expressivum                   que a palavra, que é uma ex-
rei quae intelligitur, non est                pressão da coisa que é inteli-
reflexum; nec actio qua                       gida, não é uma reflexão, nem
formatur verbum, quod est                     uma ação pela qual se forma a
expressivum quidditatis rei                   palavra, expressiva da quidi-
quae concipitur, non est                      dade da coisa que se concebe,
reflexa;      alioquin     omne               não é uma [ação] reflexa; se
intelligere esset reflexum, quia              fosse assim, todo inteligir seria
semper cum actu intelligitur                  [um ato] reflexo, porque sempre
aliquid, verbum formatur.                     que algo fosse inteligido em ato,
Unde manifestum est quod                      se formaria a palavra. Daí ser
intellectus infra se ipsum                    manifesto que o intelecto infe-
actionem rectam exercere                      rior pode exercer ação direta
potest, et haec semper est actio              sobre si mesmo e esta é sempre
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sua propria, quae terminatur                         sua própria ação, que tem o seu
ad obiectum factum in se et a                        término no objeto produzido
se.                                                  nele e por ele.
    Unum enim constituitur ex                           Com efeito, a unidade se
intellectu et specie, quae est                       constitui de intelecto e espécie,
principium actionis suae, et                         que é o princípio de sua ope-
huius est agere; unde species                        ração e do seu agir; daí que esta
haec est prima qua agitur, non                       espécie é a primeira pela qual se
autem ad quam: non enim                              opera, mas não para qual se
intellectus noster inspiciens                        opera: de fato, o nosso intelecto
hanc      speciem      tanquam                       não considera esta espécie como
exemplar sibi simile, aliquid                        um exemplar semelhante a si
facit quasi verbum eius. Sic                         mesmo, mas o considera como
enim non fieret unum ex                              uma palavra sua. Assim, pois,
intellectu et specie, cum                            não haveria unidade de inte-
intellectus non intelligat nisi                      lecto e espécie, se o intelecto não
factus unum aliquid cum                              inteligisse algo produzido em
specie, sed in ipsa specie                           unidade com a espécie, mas
formatus agit tanquam aliquo                         opera na própria espécie forma-
sui,    ipsam     tamen    non                       da como em algo seu, mas que
excedens.                                            não a excede.
    Species autem sic accepta                           Mas a espécie assim consi-
semper ducit in obiectum                             derada sempre se dirige ao seu
primum. Unde manifestum                              primeiro objeto. Daí ser mani-
est quod ipsum verbum                                festo que a própria palavra do
intellectus    perficitur   per                      intelecto se aperfeiçoa pelo ato
actum rectum; tamen, quia                            direto; mas, porque não aban-
non mittit ad aliquid aliud                          dona alguma outra de suas
conceptiones suas, sicut facit                       concepções, como faz o sentido,
sensus, hinc est quod potest                         é assim que ele pode, quando
super actus suos reflecti cum                        quer, refletir sobre os seus atos
vult, quod non potest sensus:                        com as imagens que não aban-
non enim utitur medio                                donou, o que não pode fazer o
corpore     cuius     non   est                      sentido: ora, o intelecto não faz
percipere quod in eo fit.                            isso mediante o corpo, que não
                                                     percebe o que nele se produz.
  Sed cum sit unum agens,                               Mas porque é um agente,
cum quo et species ipsa                              com o qual a própria espécie se
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efficitur unum spiritualiter in               torna     una    espiritualmente,
participando      vitam     eius,             participando de sua vida, o seu
percipit actum suum cum                       ato percebe, mediante imagens,
vult, complete, quod non                      de um modo completo, o que
potest sensus. Non enim                       não pode fazer os sentidos. Ora,
indiget anima, ad hoc quod a                  a alma não necessita desta
se intelligatur specie illa, sed              imagem para entender-se, mas
ad hoc ut intelligat: de se                   somente para compreender esta
namque habet ut intelligatur,                 espécie: a tem, pois, em si, para
sed non quod intelligat.                      entender, não para que se
Intelligit enim se sicut alia,                entenda. Ora, [ela] se entende a
secundum philosophum: hoc                     si e as demais coisas, segundo o
autem est per speciem, quia                   Filósofo: mas isto é pela espécie,
alia sic intelliguntur. Sensus                porque assim são entendidas as
autem indiget organo ad hoc                   outras coisas. Mas o sentido
ut agat; organum autem non                    necessita do órgão para sentir,
redit supra se, unde non est                  enquanto opera; mas o órgão
reflexio in sensu.                            não se volta sobre si, daí que
                                              não há reflexão no sentido.
    Considerandum tamen est,                     Deve-se considerar, também,
quod generatio verbi videtur                  que parece que a geração da
propinquissima       cognitioni               palavra está muito mais próxi-
reflexae:      unde      multi                ma do conhecimento reflexo:
putaverunt eam reflexam.                      por isso, muitos consideraram-
Cum enim anima informata                      na um [ato de] reflexão. Na
specie format verbum in se,                   verdade, quando a espécie é
non format ipsum in aliquo                    informada na alma, forma nela
sui non informato specie,                     mesma a palavra, mas, não
quasi aliquid sui extendat a se               formaria nela mesma, se não
non informatum specie prima,                  fosse informada pela espécie,
ut in eo verbum primum                        como se desdobrasse de si algo
formetur, et ipsum esset                      que não fora informado primei-
informatum verbo in eo                        ro pela espécie, como se for-
formato: sic enim videretur                   masse nela primeiro a palavra e
extendi quasi in rectum, et sic               a própria [alma] seria informa-
per actum rectum formaretur                   da pela palavra que nela se
verbum; sed in se specie                      formou: assim, pois, pareceria
prima formata, eo quod                        desdobrar-se como em operação
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formata est, actu gignitur                           direta, e assim, pelo ato direto,
verbum, et non in aliquo sui                         se formaria a palavra; mas, a
nudo. Unde videtur haec                              partir da primeira espécie, nela
gignitio simillima reflexae.                         formada, que nela é formada, e
Sed sciendum est, quod cum                           a palavra é gerada em ato, e não
reflexio fiat redeundo super                         a partir de alguma coisa sua
idem, hic autem non sit reditio                      desprovida [de espécie]. Daí
super speciem, nec super                             que esta geração parece asse-
intellectum formatum specie,                         melhar-se à reflexão. Mas deve-
quia non percipiuntur quando                         se saber que, com a reflexão, o
verbum formatur; gignitio                            intelecto volta-se sobre si
verbi non est reflexa.                               mesmo, mas não se trata aqui
                                                     de um voltar-se sobre a espécie,
                                                     nem sobre a espécie formada
                                                     pelo intelecto, porque não se
                                                     perceberia quando a palavra se
                                                     formaria; a geração da palavra
                                                     não é um [ato de] reflexão.
    Non       enim       generatur                      Ora, a palavra mesma não é
verbum ipsum per actum                               gerada pelo ato do intelecto,
intellectus,         nec        eius                 nem sua similitude, nem mesmo
similitudo,         nec       etiam                  a similitude daquela espécie
similitudo illius speciei qua                        pela qual o intelecto foi infor-
intellectus informatur, quasi                        mado, como se a palavra fosse a
verbum           esset          eius                 sua expressão, mas [a palavra é
expressivum, sed similitudo                          uma] similitude da coisa. Na
rei. Illius enim similitudo                          verdade, a sua similitude é ge-
generatur      quod       in     sua                 rada na medida em que em sua
similitudine cognoscitur. Est                        semelhança é conhecida. Não
tamen        ipsum         verbum                    obstante, a própria palavra é
similitudo       illius      speciei                 similitude daquela espécie, na
tanquam eius quo factum est                          medida em que é produzida [na
et    est    sibi     simillimum.                    alma] e [isso] lhe resulta seme-
Similitudo vero rei est ut ad                        lhante. De fato, diz-se que é
quod formatur, et tanquam ad                         similitude da coisa enquanto é
eius exemplar.                                       formada por ela e é seu exem-
                                                     plar.
    Nec propter hoc oportet                             Não é necessário, por causa
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ipsum formantem prius rem                     disso, que a palavra fosse
intueri, et post ad eam verbum                formada previamente à intuição
seu imaginem ipsam in se                      da coisa, e depois se formasse
formare: quia habere speciem                  nela a palavra ou a prórpia
rei apud se, est sibi loco                    imagem: pois, possuir a espécie
aspectus exemplaris. Artifices                da coisa em si, é para si a posse
namque,        intuentes     sua              de um modelo e de um exem-
exemplaria,       nihil    aliud              plar. Assim, pois, os artistas,
acquirunt nisi ipsas species                  intuindo os seus exemplares,
exemplarium. Haec autem                       não fazem outra coisa senão
species        quam       habet               adquirirem as próprias espécies
intellectus, advenit sibi a re                dos exemplares. Mas esta
quam ipse non est intuitus,                   espécie que o intelecto tem lhe
sed sensus. Et quia est rei                   advém da coisa, que ela mesma
similitudo, est principium                    não intuiu, mas sentiu. E
generationis huius. Unde in                   porque é similitude da coisa, é o
intellectu potest esse generatio              seu princípio de geração. Daí
per rectum, cum nihil eius                    que no intelecto pode haver
generetur.                                    geração por ato direto, enquan-
                                              to nada é gerado dela mesma.
    Directe igitur a specie ipsa                 Portanto, se passa direta-
itur in ipsum verbum, cum                     mente da própria espécie para a
non percipitur eius subiectum,                própria palavra, já que não se
sed res cuius est prima                       conhece o seu sujeito, mas a
similitudo.      Huic     etiam               coisa que é a primeira simili-
similitudini tanto intimius est               tude. Contudo, tanto mais ínti-
verbum, quanto perfectius                     ma é a palavra desta similitude,
genitum est. Ideo verbum                      quanto mais perfeitamente será
intelligentis    intimum      est             gerada. Por isso, a palavra intel-
principio intellecto, ex quo et               igida é princípio íntimo ao
specie fit unum; nec tamen                    intelecto, pelo que a espécie e o
informatur subiectum simul                    [intelecto] se tornam um; nem
diversis accidentibus eiusdem                 mesmo quando o sujeito é infor-
speciei, quia impossibile est                 mado, ao mesmo tempo, por
eamdem superficiem simul                      diversos acidentes, da mesma
duabus albedinibus informari:                 espécie, porque é impossível
hoc enim est impossibile,                     que na mesma superfície fossem
quando utrumque accidens est                  informadas, ao mesmo tempo,
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in ratione eius quo aliquid                          duas brancuras: com efeito, isso
fieri habet.                                         é impossível, quando há ambos
                                                     acidentes na sua natureza para
                                                     que algo tenha de ser feito.
    Verbum autem est in quo                             Mas a palavra é aquilo pelo
aliquid intelligitur, sicut lux in                   qual algo é entendido, como a
qua videtur aliquid; species                         luz é aquilo pelo qual algo é
autem est qua perficitur                             visto; mas a espécie é aquilo
cognitio, sicut species coloris                      pelo qual o conhecimento é
in visu exteriori; et foret                          aperfeiçoado, como as espécies
simillimum si lux ex specie                          de cor são aquilo pelo qual as
coloris generaretur, sicut ibi fit                   coisas exteriores são vistas; e
verbum ex specie: exteriora                          seria mais semelhante, se a luz
enim          deficiunt          a                   fosse gerada pela espécie, como
repraesentatione interiorum.                         aí ocorre quando se produz a
                                                     palavra pela espécie: ora, as
                                                     representações exteriores fazem
                                                     falta para as interiores.
    Et    propter     hoc    licet                      E por causa disso, embora
utrumque sit accidens, species                       ambos sejam acidentes, a espé-
scilicet et verbum ex specie                         cie, isto é, a palavra, é gerada da
genitum, quia utrumque est in                        espécie, porque ambas existem
anima ut in subiecto; verbum                         na alma como em seu sujeito;
tamen      magis     transit    in                   não obstante, a palavra se torna
similitudinem         substantiae                    mais semelhante à substância
quam species ipsa. Quia enim                         do que a própria espécie. Ora,
intellectus       nititur       in                   porque o intelecto vem a
quidditatem rei venire, ideo in                      inclinar-se à quididade da coisa,
specie praedicta est virtus                          há, por isso, na referida espécie,
quidditatis         substantialis                    a capacidade da quididade
spiritualiter     per      quam                      substancial tomada de modo
quidditas spiritualiter intus                        espiritual, pela qual a quididade
formatur, sicut in calore est                        é formada espiritualmente lá
virtus formae ignis per quam                         dentro do intelecto, como no
attingitur in generatione ad                         calor há a virtude da forma do
formam substantialem ignis,                          fogo, pela qual se chega, pela
ad quam accidens per se non                          geração, à forma substancial do
attingeret: unde verbum, quod                        fogo, à qual o acidente, por si
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est ultimum quod potest fieri                 mesmo, não alcançaria: daí que
intra per speciem, magis                      a palavra, que é o último que se
accedit     ad ipsam    rem                   pode produzir no interior [do
repraesentandam quam nuda                     intelecto] pela espécie, se apro-
species rei.                                  xima mais da própria realidade
                                              representada, do que a espécie
                                              abstraída da coisa.
    Quia igitur res intelligibilis               Por isso, porque a coisa inte-
eo ipso intelligitur quo                      ligível ela mesma é inteligida na
intellectus formatur sua specie               medida em que sua espécie é
actu;     prius     natura    est             formada em ato pelo intelecto;
informari quam intelligere,                   [o próprio da] natureza é
sed non tempore: ideo videtur                 primeiro informar, que inteligir,
verbum,        quod     sequitur              mas isso não no tempo: por isso,
speciem rei, similiter sequi                  parece que, do mesmo modo
intelligere eius. Hoc autem                   que a palavra é obtida a partir
non esset, si per speciem rei                 da espécie da coisa, simul-
tenderet intellectus in ipsam                 taneamente é obtido o seu inte-
rem ut in se, sicut visus videt               ligir. Porém, isso não ocorreria
colorem extra se existentem, et               se o intelecto tendesse pela
tunc formaret verbum in se de                 espécie da coisa à própria coisa
re prius intellecta. Sed quia                 considerada em si mesma, como
intellectus accipiens speciem a               a visão vê a cor que existe fora
re per sensus, non ducitur per                de si, e, então, se formaria a
ipsam in rem ut est in sui                    palavra nele antes que a coisa
natura, sed ut in se est, quia                fosse inteligida. Mas porque o
ipse facit in se obiectum quod                intelecto apreende a espécie da
est in eo intellectum; obiectum               coisa pelos sentidos, [o inte-
autem naturaliter prius est                   lecto] não é conduzido pela
actione       potentiae     circa             própria [espécie] à coisa, como
obiectum: ideo verbum quod                    existe na natureza [do objeto
est intra ipsum intellectum,                  sensível], mas como ela existe
prius est ipso intelligere ad                 nele mesmo, porque é o próprio
ipsum terminato. Aliud enim                   intelecto que representa em si
est hoc a quo accipitur species,              mesmo o objeto que nele é inte-
scilicet res ipsa, et aliud ad                ligido; mas o objeto existe natu-
quod        terminatur      actio             ralmente antes da capacidade
intellectus, scilicet similitudo              do [intelecto] considerá-lo: por
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rei formata ab intellectu.                           isso, a palavra que é formada
                                                     internamente no próprio inte-
                                                     lecto, é anterior ao próprio inte-
                                                     ligir e ao próprio término. Com
                                                     efeito, uma coisa é aquilo pelo
                                                     qual é tomada a espécie, ou seja,
                                                     a coisa mesma, e outra é aquilo
                                                     em que se finaliza a ação do
                                                     intelecto, ou seja, a similitude
                                                     da coisa formada pelo intelecto.
    Ex dictis manifestum est                            Do exposto, fica claro o modo
quomodo attenditur prioritas                         como se entende a prioridade
unius eorum ad alterum.                              de um deles sobre os outros.
    Prius enim natura est                               Com efeito, primeiro a natu-
intellectus informatus specie,                       reza do intelecto é informada
quae est primum sufficiens                           pela espécie, que é princípio
intelligendi, quam gignatur                          suficiente do inteligir, pelo qual
verbum: et ideo intelligere in                       se gera a palavra: e, por isso, o
radice prius est verbo, et                           inteligir no início é prévio à
verbum est terminus actionis                         palavra, e a palavra é o término
intellectus. Sed quia obiectum                       da ação do intelecto. Mas não se
non habetur nisi in verbo, ut                        possui o objeto, senão na pala-
dictum est; obiectum autem                           vra, como foi dito; porém, o
prius est quam quaelibet actio                       objeto é prévio à qualquer ação
ad eum terminata, ideo                               por ele determinada, por isso, a
verbum prius est quam                                palavra é anterior ao inteligir. E
intelligere. Et hoc totum ideo                       isso tudo acontece por isso, a
contingit, quia non terminatur                       saber, a ação do intelecto não
actio intellectus ad rem extra,                      termina na coisa externa, da
a qua acquirit speciem ut in se                      qual adquire a espécie tal como
est. Si enim species nata esset                      ela é em si. Ora, se a espécie
ducere intellectum ad rem ut                         tivesse por natureza a capa-
in se est, ut species coloris                        cidade de conduzir o intelecto à
ducit in colorem, omnibus                            coisa, tal como é em si, como a
modis praecederet intelligere                        espécie da cor conduz à cor, de
verbum.                                              qualquer modo, o inteligir pre-
                                                     cederia à palavra.
    Unde manifestum est quod                            Disso se evidencia que a
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verbum non est quod sequitur                  palavra não é o que se segue
intellectum immediate post                    imediatamente ao intelecto de-
rationem intellectus: sic enim                pois da consideração do inte-
simpliciter         praecederet               lecto: ora, [se fosse] assim, a
verbum actum intellectus, qui                 palavra precederia, de modo
est intelligere; sed verbum                   absoluto, ao ato do intelecto,
sequitur              immediate               que é o inteligir; mas, a palavra
intellectum in actu per                       imediatamente segue o intelecto
speciem, a qua procedit                       em ato, pela espécie, da qual
verbum ut actus ex actu, et                   procede a palavra enquanto em
non ut actus ex potentia. Unde                ato pelo ato, e não enquanto em
verbum posterius est actu                     ato pela potência. Daí que a
intelligendi a parte intellectus;             palavra é posterior ao ato de
et sic verbum sequitur ad                     inteligir por parte do intelecto;
intelligere non in se, sed in sua             e, assim, segue-se à palavra o
radice, ut dictum est.                        inteligir, não em si, mas em sua
                                              raiz, como foi dito.
   Si vero intellectus a verbo                   Na verdade, se o intelecto
acciperet speciem prius quam                  tomasse a palavra da espécie
intelligeret ipsum verbum, et                 antes de inteligir a própria
rem in verbo, impossibile foret               palavra e a coisa na palavra,
per illud intelligere, vel                    seria impossível inteligir deste
verbum formare per eius                       modo, e a palavra seria formada
principium, sicut impossibile                 por seu princípio, como tam-
est intellectum facere rem                    bém seria impossível que o inte-
extra, a qua speciem trahit.                  lecto produzisse a coisa externa,
                                              da qual toma a espécie.
   Ex dictis facile est scire                    Do exposto é fácil saber como
quare intellectus non dicit se,               o intelecto não diz a si, quando
quando      format    verbum                  forma a palavra conforme a
secundum rem.                                 coisa.
   Anima       enim      quasi                   Ora, a alma é como que
transformata est in rem per                   transformada na natureza pela
speciem, qua agit quidquid                    espécie, enquanto faz o que faz;
agit; unde cum ea informatus                  donde, sendo ela informada em
est actu, verbum producit, in                 ato, produz a palavra, pela qual
quo rem illam dicit cuius                     significa aquela coisa da qual se
speciem habet, et non se. Cum                 teve a espécie, e não a si mesma.
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vero nititur se apprehendere,                        [A alma] inclina-se efetivamente
quia non est cognoscibilis, nisi                     para entender-se, porque ela
sicut alia per speciem aliorum,                      não é cognoscível somente tal
quia non indiget specie ut                           como os outros são pela espécie
intelligat (hoc enim potest de                       de outros, pois não necessita de
se), non habet in se, ut                             espécie para conhecer (de fato,
intelligens est, speciem qua                         isso ela o tem em si), não tendo
formetur verbum sui, sed                             em si mesma, para inteligir, a
accipit a se intelligibilem                          espécie pela qual se formaria a
speciem non sui, sed rei qua                         sua palavra, mas toma para si a
necessario      informatur    ut                     espécie inteligível, não dela
intelligatur, ut dictum est.                         mesma, mas da coisa pela qual,
Cum       igitur    illa  specie                     necessariamente, é informada
informatur, statim se intelligit;                    para inteligir, como foi dito.
et hoc est per reflexionem,                          Quando, pois, se informa aquela
quia haec species prius est                          espécie, imediatamente compre-
accepta a re quam a se                               ende-se; e isso é por reflexão,
informata et intellecta.                             porque esta espécie é previa-
                                                     mente tomada da coisa do que
                                                     informada e inteligida em si.
   Nec oportet prius formare                            Nem é necessário que primei-
verbum quam intelligere; sed                         ramente se formasse a palavra
cum       intellexerit,  format                      que o inteligir; mas, quando
verbum sui; et ideo intelligere                      intelige, forma a sua palavra; e,
non tempore, sed natura                              por isso, não intelige no tempo,
praecedere necesse est, cum se                       mas é necessário que seja prévia
ipsum intelligit. Non enim                           à natureza, quando se intelige a
cum se intelligit, facit totum                       si mesm. Ora, quando se inte-
obiectum, sed aliquid circa                          lige, não produz todo o objeto,
ipsum: induit enim se, et hoc                        mas algo acerca do mesmo:
est verbum sui, cum se                               pois, volta-se sobre si mesma, e
intelligit; non enim est aliud a                     isso é a sua palavra, quando se
quo accipitur species, ab eo ad                      intelige; pois não é de outro que
quod terminatur, sed idem.                           se toma a espécie, mediante a
                                                     qual se determina [a palavra],
                                                     mas dela mesma.
   Sed quia ista est species rei,                       Mas porque esta espécie é da
et non genita de essentia                            coisa e não é gerada somente da
L i n g u a g e m   e   e p i s t e m o l o g i a   e m   T o m á s   d e   A q u i n o   | 35


nuda, formatum verbum de                      essência abstraída, se forma a
anima per speciem rei non est                 palavra da alma pela espécie da
purum verbum animae, sed                      coisa, não sendo [neste caso]
rei dictae. Si vero nudatam ab                pura palavra da alma, mas
omni re se apprehenderet, et                  [palavra] dita da coisa. Com
similitudinem sui in se                       efeito, se [a alma] se compren-
gigneret, hoc eius verbum                     desse abstraindo-se de toda
esset purum, nihil extraneum                  realidade, a sua similitude seria
habens admixtum.                              gerada em si mesma; e, neste
                                              caso, a sua palavra seria pura,
                                              por não ter nada de exterior que
                                              se lhe mesclasse.
   Tale est verbum Dei, quod                     Tal é a Palavra de Deus, que é
idem est in natura cum patre                  idêntica em natureza com a do
dicente     ipsum       verbum.               Pai, que diz a própria Palavra.
Verbum tamen animae tali                      Contudo, se a palavra da alma
modo     se    dicentis     foret             fosse expressa de tal modo,
accidens, et pro tanto diversae               seria um acidente e, portanto,
naturae foret ab anima, cum                   seria de natureza diversa à da
accidens sui foret, et a se et de             alma, seria, pois um acidente
se    factum:     ipsa      enim              seu, por si e em si produzido:
substantiam facere non potest.                ora, a alma não poderia pro-
Deus autem nihil diversitatis                 duzir a substância. Mas não há
in sua natura habet; ideo                     nenhuma diversidade na natu-
verbum suum Deus, virtus et                   reza de Deus; por isso, Sua Pa-
substantia vera est.                          lavra é verdadeiramente, Virtu-
                                              de e Substância de Deus.
   Deus autem quia omnia                         Mas porque Deus por uma
unico intuitu videt, uno verbo                única intuição vê todas as coi-
omnia dicit; nos vero multa                   sas, uma única palavra Sua diz
verba      habemus     propter                todas as coisas; mas nós neces-
impotentiam intellectus nostri                sitamos ter muitas palavras, por
in intelligendo. Et horum                     causa da impotência do nosso
quaedam oriuntur ex aliis,                    intelecto ao inteligir. E algumas
sicut verbum conclusionis ex                  destas [palavras] originam-se de
principiis; quaedam vero non,                 outras [palavras], como a
sicut in rebus quae non habent                palavra conclusiva extraída de
connexionem ad invicem, ut                    princípios; outras [palavras]
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patet de lapide et ligno;                            efetivamente não, como nas
quaedam statim offeruntur                            coisas que não têm conexões
intelligenti, quaedam non;                           umas com as outras, como se
quaedam etiam cum maiori,                            evidenciam nas [palavras] para
quaedam        cum      breviori                     pedra e para madeira; algumas
discursu. Ideo verba nostra                          são imediatamente apresen-
quaedam       plus,    quaedam                       tadas ao intelecto, outras não;
minus habent de cognitione, et                       algumas também são oferecidas
quaedam citius et quaedam                            mediante um discurso um tanto
tardius formantur, sicut scire                       longo, outras, mediante um
quarumdam        conclusionum                        discurso um tanto breve. E, por
tardius       et      difficilius,                   isso, algumas de nossas pala-
quarumdam vero facilius et                           vras oferecem mais e outras
citius acquiritur. Et haec de                        menos conhecimentos e, al-
verbo dicta sufficiant.                              gumas, são formadas mais ime-
                                                     diatamente e, outras, menos
                                                     imediatamente, como entender
                                                     algumas conclusões nos são
                                                     menos imediatas e mais difíceis
                                                     e outras nos são efetivamente
                                                     mais fáceis e mais imediatas. E
                                                     são suficientes dizer estas coisas
                                                     sobre a palavra.
L i n g u a g e m   e   e p i s t e m o l o g i a   e m   T o m á s   d e   A q u i n o   | 37




           O negativo na epistemologia de
                Tomás de Aquino e as
          rationes necessariae de Anselmo
                                                                             Jean Lauand


       Introdução

       Neste estudo, examinaremos alguns aspectos da
proposta de Teologia como ciência, em Tomás de Aquino
(1225-1274) em contraste com as “rationes necessariae” ansel-
mianas, particularmente no caso da Teologia da Redenção.
Esse confronto será contextualizado pelo quadro geral do
pensamento de Tomás, particularmente no que se refere ao
conhecimento e à theologia negativa.
       Uma questão fundamental - que cedo ou tarde acaba
surgindo – para as grandes religiões é como lidar com a
reflexão racional: definir o papel que se estabelece para a
razão face à fé. Essa questão é uma das constantes, na Idade
Média, e encontra ampla gama de respostas, aliás, muito se-
melhantes, no cristianismo, no judaísmo e no Islã: da rejeição
da pura razão ao acolhimento; da suspeita à confiança. Claro
que o papel dado à filosofia e à razão, numa determinada
concepção de religião, depende da particular visão que se
tenha do papel que o próprio Deus desempenha nessa
concepção e também do papel reservado ao homem e à
inteligência deste.

       A escolástica

    Para além da semelhança dessa gama de posicio-
namentos para com as religiões monoteístas, o problemático
38 | I   v a n a l d o   S a n t o s   ( O r g . )




conteúdo da fé do cristianismo (pense-se, por exemplo, na
Trindade, na Encarnação ou na Redenção) exigirá aprofun-
damentos para que se estabeleçam as diversas posições de
relacionamento entre fé e razão.
       Entre os significados contidos na multidimensional
palavra “Escolástica” (PIEPER, 1973, p. 42-43), destaca-se um,
que faz Boécio ser considerado, por um Grabmann, “o primeiro
escolástico” e seus escritos, “as primícias do método escolas-
tico”: um radicalismo sem precedentes na afirmação da razão,
que - a seu modo - estará presente também em Anselmo, 500
anos depois1.
       O De Trinitate de Boécio traz esse “racionalismo”. Já o
título desse seu opúsculo (Como a Trindade é um único Deus e
não três deuses) expressa o propósito de esclarecer racional-
mente a verdade de fé. Certamente, isso não é algo de novo;
Agostinho e outros tinham escrito textos com o mesmo
intuito. Aliás, Agostinho (1994) havia afirmado a necessi-
dade de cooperação entre fé e razão (Sermones, CCL 0284,
sermo 43, Sl 41, 182): intellige ut credas, crede ut intelligas,
"entende a fim de que creias", "crê a fim de que entendas"2.
Para Boécio, o lema era: fidem, si poteris, rationemque cojunge,
"conjuga a fé e a razão"!, conselho com que encerra a carta ao
Papa João I.
       À primeira vista, nada de novo. A novidade, porém,
está em que esse propósito tenha sido assumido explicita-
mente, programaticamente: aquilo que antes podia ser


1A  audiência de Bento XVI (2009), de 23-09, foi dedicada a
Anselmo e o Papa o qualificou de “fundador da teologia
escolástica”. Não é de estranhar que, sendo a Escolástica uma
tarefa racional, os que acentuam extremadamente a razão – Boécio
ou Anselmo – sejam considerados seus fundadores.
2Já Bento XVI (2009) recorda a versão anselmiana dessa fórmula

“não procuro compreender para crer, mas creio para
compreender".
L i n g u a g e m   e   e p i s t e m o l o g i a   e m   T o m á s   d e   A q u i n o   | 39


unicamente uma atitude fática tornava-se agora um princí-
pio. Nova é também a radicalidade do projeto. No seu De
Trinitate, encontram-se várias concepções platônicas e neo-
platônicas; as dez categorias, os gêneros, as espécies e
diversos outros conceitos de Aristóteles; todo tipo de análi-
ses filosóficas e de linguagem. Mas não há sequer uma única
citação ou referência à Bíblia, e isso num tratado teológico
sobre a Santíssima Trindade!
       Como diz Pieper (1973) (e este trabalho apoia-se em
boa medida no “Scholastik”), a Escolástica traz consigo o
perigo – “fundacional” de Boécio – da supervalorização da
razão, que vai encontrar em Anselmo um expoente original,
ao pretender, com suas “rationes necessariae”, deduzir todas
as razões da redenção. Se um Tomás de Aquino e os grandes
teólogos medievais conseguiram superar essa ameaça e fazer
uma teologia equilibrada (o que talvez requeresse o prece-
dente radical anselmiano...) foi graças a um notável corre-
tivo desse racionalismo.

       O corretivo do racionalismo: Pseudo-Dionísio
       Areopagita

      Na mesma época em que Boécio escreve seu De
Trinitate, surgem no Oriente uns livros – Sobre os nomes de
Deus; Sobre a hierarquia celeste; Sobre a hierarquia eclesiástica;
Sobre a teologia mística – cujo autor declara ser Dionísio do
Areópago (cf. At. 17, 34), discípulo de São Paulo, o apóstolo.
Por mais inverossímil que fosse essa declaração, o fato é que
enganou a Idade Média, que julgou Dionísio um grande
santo, inspirado pelo Espírito Santo. Pseudo-Dionísio exer-
ceu enorme influência nos teólogos medievais: Tomás de
Aquino deve a ele sua philosophia negativa e sua theologia
negativa:
40 | I   v a n a l d o   S a n t o s   ( O r g . )




                                    Tomás de Aquino formulou os princípios
                             de uma philosophia negativa e também de uma
                             theologia negativa. […] o fato de a discussão
                             sobre Deus da Summa Theologica começar com a
                             sentença: "Não podemos saber o que Deus é,
                             mas sim, o que Ele não é". (...) e o pensamento,
                             expresso por Tomás em seu comentário ao De
                             Trinitate de Boécio: o de que há três graus do
                             conhecimento humano de Deus. Deles, o mais
                             fraco é o que reconhece Deus na obra da cria-
                             ção; o segundo é o que O reconhece refletido
                             nos seres espirituais e o estágio superior
                             reconhece-O como o Desconhecido: tamquam
                             ignotum! E aquela sentença das Quaestiones
                             disputatae: "Este é o máximo grau de conheci-
                             mento humano de Deus: saber que não O
                             conhecemos". (PIEPER, 2000).

      A theologia negativa está bem consciente de que, quando
nosso discurso se volta para Deus, nossa linguagem mostra-
se ainda mais inadequada. Sim, por analogia com as
criaturas, diremos que Deus é justo, que Ele é bom, eterno
etc. Mas, há diversos problemas de insuficiência de língua-
gem quando predicamos de Deus. Por exemplo, qualidades,
que são separadamente nas criaturas, teriam que ser unifica-
das na “essência” de Deus. E é unicamente sobre nosso
âmbito de experiências, sobre nosso conceito de tempo que
falamos em “justo”, “eterno” ou “bom”.

                                    Sim, não é descabido dizer que Deus é
                             justo. Mas nosso conceito de justiça procede do
                             único mundo de experiências que nos é
                             acessível; e nele “o justo” manifesta seu dever
                             para com o outro, com o qual tem uma pen-
                             dência: precisamente nisto consiste a justiça.
                             Mas, pertence à essência de Deus não ser
                             devedor de ninguém. Então tem sentido dizer
L i n g u a g e m   e   e p i s t e m o l o g i a   e m   T o m á s   d e   A q u i n o   | 41


                             que “a justiça” de Deus é necessariamente tão
                             diferente, que não pode se chamar “justiça” em
                             sentido estrito. (PIEPER, 1973, p. 62).

      Certamente, estes aspectos “negativos” não são os que
os epígonos de Tomás destacam; na verdade, os “tomistas”
costumam ocultá-los; mas são essencialíssimos e o tributo
fundamental de Tomás a Pseudo-Dionísio. O caráter nega-
tivo da filosofia de Tomás é o que torna problemático a
própria ideia de um “tomismo”, em sentido estrito: como
enfiar em um “ismo”, em uma filosofia de manuais com
resposta para tudo...? Diz Pieper sobre a negatividade e a
impossibilidade de um tomismo3:

                                    E, quanto ao elemento negativo da
                             philosophia de Tomás, encontramos aquela
                             sentença sobre o filósofo, cuja aplicação ao
                             conhecimento não é capaz sequer de esgotar a
                             essência de uma única mosca. Sentença que,
                             embora esteja escrita em tom quase coloquial,
                             num comentário ao Symbolum Apostolicum,
                             guarda uma relação muito íntima com diversas
                             outras afirmações semelhantes. Algumas delas


3 Junto com a negatividade, Pieper vê a impossibilidade de um
“tomismo” por conta também da extraordinária abertura de
pensamento de Tomás: "Não pode haver um 'tomismo' porque a
grandiosa afirmação que representa a obra de S. Tomás é grande
demais para isso [...]. S. Tomás nega-se a escolher algo; empreende
o imponente projeto de 'escolher' tudo [...]. A grandeza e a
atualidade de Tomás consistem precisamente em que não se lhe
pode aplicar um 'ismo', isto é, não pode haver propriamente um
'tomismo' ('propriamente', isto é: não pode haver enquanto se
entenda por 'tomismo' uma especial direção doutrinária
caracterizada por asserções e determinações polêmicas, um sistema
escolar transmissível de princípios doutrinais)" (PIEPER, 1981, p.
27).
42 | I   v a n a l d o   S a n t o s   ( O r g . )




                             são espantosamente "negativas" como, por
                             exemplo a seguinte: Rerum essentiae sunt nobis
                             ignotae; "as essências das coisas nos são des-
                             conhecidas". E esta formulação não é, de modo
                             algum, tão incomum e extraordinária, quanto
                             poderia parecer à primeira vista. Seria facil-
                             mente possível equipará-la (a partir da Summa
                             Theologica, da Summa contra Gentes, dos
                             Comentários a Aristóteles, das Quaestiones
                             disputatae) a uma dúzia de frases semelhantes:
                             Principia essentialia rerum sunt nobis ignota;
                             formae substantiales per se ipsas sunt ignotae;
                             differentiae essentiales sunt nobis ignotae. Todas
                             elas afirmam que os "princípios da essência", as
                             "formas substanciais", as "diferenças essenciais"
                             das coisas, não são conhecidas. (PIEPER, 2000).

      Tomás cita cerca de 2.000 vezes Dionísio; Anselmo o
ignora (menciona-o uma única vez e não para endossar seu
pensamento). Esses dados guardam profunda relação com as
concepções de Teologia: Anselmo carece do corretivo dioni-
siano e se aproxima de um racionalismo, embora, técnica-
mente, não se possa aplicar sem mais esse qualificativo a seu
pensamento, marcado pela fé, que pressupõe o “dado” da fé.
Dois ilustres medievalistas assim ressalvam:

                                   Naturalmente, um teólogo como
                             Anselmo não pode jamais cair na aceitação
                             formal da tese de que não há nada que
                             supere a capacidade cognoscitiva da ratio
                             humana. Não obstante, não causa a mínima
                             estranheza que seu pensamento se aproxime
                             continuamente de um tal racionalismo.
                             (PIEPER, 1973, p. 68).

                                   Anselmo trata ex professo das relações
                             entre fé e razão, resumindo-as na fórmula:
L i n g u a g e m   e   e p i s t e m o l o g i a   e m   T o m á s   d e   A q u i n o   | 43


                          Credo ut intelligam, de inspiração nitidamente
                          augustiniana. Segundo ele, devemos come-
                          çar por acreditar na existência de Deus, na
                          Trindade e em todas as verdades da revela-
                          ção cristã. Depois, a nossa razão poderá justi-
                          ficar todas essas verdades "rationibus necessa-
                          riis", por motivos decisivos e necessários e
                          não - como diria Tomás de Aquino - por
                          motivos apenas prováveis e sem valor de-
                          monstrativo. Segundo Anselmo, a fé ensina
                          que assim é; a razão confirma mostrando
                          porque assim deve ser. A racionalização da fé,
                          proposta por Anselmo, não podia degenerar
                          logicamente em racionalismo, pois, a razão,
                          neste sistema, não pode discrepar da fé, uma
                          vez que o conhecimento racional é concebido
                          - conforme Plotino e Agostinho - como fruto
                          da iluminação natural por parte de Deus e
                          este naturalmente não pode contrariar a fé,
                          que é resultado da revelação, sobrenatural,
                          divina. Mas [...] a posição anselmiana levava
                          a tolher o mérito da fé e a justificar de
                          antemão as recriminações de Gregório IX
                          contra o uso da demonstração em teologia.
                          (VAN ACKER, 1983, p. 13).

     “Atenuantes” à parte, Pieper (1973, p. 78) também
observa:

                                [Há em Anselmo] uma observação
                          suspeita que diz que à argumentação que se
                          segue não se deve exigir mais certeza “de
                          que a que possa minha opinião supor provi-
                          soriamente [interim] enquanto Deus não me
                          revele coisa melhor”. Esta observação é enga-
                          nosa porque só aparentemente constitui um
                          abrandamento; o que, na realidade, se diz é
                          que a ratio não capitula perante o mistério,
Linguagem e Epistemologia em Tomás de Aquino
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Linguagem e Epistemologia em Tomás de Aquino

  • 1. L i n g u a g e m e e p i s t e m o l o g i a e m T o m á s d e A q u i n o |1 Linguagem e epistemologia em Tomás de Aquino
  • 2. 2|I v a n a l d o S a n t o s ( O r g . )
  • 3. L i n g u a g e m e e p i s t e m o l o g i a e m T o m á s d e A q u i n o |3 Linguagem e epistemologia em Tomás de Aquino Ivanaldo Santos (Org.) Ideia João Pessoa 2011
  • 4. 4|I v a n a l d o S a n t o s ( O r g . ) Todos os direitos reservados. Diagramação / Capa Magno Nicolau (www.ideiaeditora.com.br) S485h Linguagem e epistemologia em Tomás de Aquino. Ivanaldo Santos (Orgs.). - João Pessoa: Ideia, 2011. 180 p. 1. Literatura Brasileira CDU: 869 Os textos são de inteira responsabilidade dos respectivos autores. EDITORA ideiaeditora@uol.com.br Foi feito o Depósito Legal
  • 5. L i n g u a g e m e e p i s t e m o l o g i a e m T o m á s d e A q u i n o |5 SUMÁRIO Apresentação Mauricio Beuchot Introdução O “De Natura Verbi Intellectus” como texto gênese para a compreensão das teorias do conhecimento e da linguagem em Tomás de Aquino: introdução, tradução e notas Paulo Faitanin O negativo na epistemologia de Tomás de Aquino e as rationes necessariae de Anselmo Jean Lauand O problema da linguagem em Tomás de Aquino Ivanaldo Santos A linguagem da alteridade em Tomás de Aquino Sergio de Souza Salles Gêneros literários e formas do saber na Universidade de Paris do século XIII Sávio Laet de Barros Campos Da metafísica à epistemologia: a filosofia primeira Lucas Kattah Macedo Sobre os autores
  • 6. 6|I v a n a l d o S a n t o s ( O r g . ) Apresentação O livro organizado pelo professor Ivanaldo Santos sobre a filosofia da linguagem e a epistemologia de Tomás de Aquino é de grande atualidade. Com efeito, é um livro que promove o diálogo filosófico, neste caso, principalmente, com a atual filosofia analítica, a qual teve grande desen- volvimento no século XX e que tem centrado suas invés- tigações em estudar os problemas da linguagem e do conhecimento. O presente volume é uma aproximação com esse diálogo, o qual tem dado muitos frutos, tanto para o tomismo como para a filosofia analítica. Com justiça, deve-se considerar o professor Ivanaldo Santos como um dos representantes do tomismo analítico, o qual é uma expressão do tomismo que tem ganhado grande respeitabilidade dentro da filosofia contemporânea. Com efeito, a filosofia analítica é uma das correntes mais influen- tes dentro do cenário filosófico atual. Por sua vez, o tomismo, que está em constante diálogo com a filosofia produzida em cada século, não podia deixar de se interessar por essa corrente. Por esse motivo, tem havido notáveis autores que fazem uso do método de análises para trabalhar com a tradição tomista. Entre esses autores cita-se: Anthony Kenny, Peter Thomas Geach e John Haldane. Nessa linha se coloca o professor Ivanaldo Santos, da UERN, no Brasil. Ele tem apresentado o diálogo entre a tradição tomista e a analítica em diversos artigos e agora nos brinda com a organização do presente livro. Algo muito importante para a filosofia da linguagem em Tomás de Aquino é a mediação que existe entre o verbo exterior, a coisa significada e o verbo interior. Por isso, é
  • 7. L i n g u a g e m e e p i s t e m o l o g i a e m T o m á s d e A q u i n o |7 fundamental o trabalho de Paulo Faitanin sobre o De natura verbi intellectus do Aquinate, o qual é o texto onde se encontra o núcleo da sua teoria do significado e, ao mesmo tempo, é o que distingue sua teoria de muitas que foram desenvolvidas contemporaneamente. Uma comparação muito interessante realiza Jean Lauand entre a epistemologia de Tomás de Aquino e as rationes necessariae de Anselmo. É conhecido o fato do filó- sofo de Cantorbery desejar essas razões para demostrar, sola ratione, os conteúdos da fé, fundamentado pela existência de Deus, porém o Aquinate buscou um caminho mais a posteriori, com uma epistemologia mais atenta ao empírico. Mostra-se como fundamental o trabalho de Ivanaldo Santos sobre o problema da linguagem em Tomás de Aqui- no. É a exposição da intercessão e a articulação da discussão realizada com a filosofia analítica. É precisamente o tipo de trabalho que esperam os cultivadores das análises filosóficas, às quais se pode associar Tomás de Aquino. O ensaio de Sergio de Souza Salles sobre a linguagem da alteridade em Tomás de Aquino é muito pertinente. Essa discussão foi algo que o Aquinate desenvolveu constante- mente, pois sempre falou, de diversas formas, acerca do outro. Parodiando Wittgenstein, poderíamos dizer que Tomás se esforçou para dizer o que só se podia mostrar e que, por isso, terminou juntando o dizer e o mostrar. E uma das formas dele fazer essa junção é por meio da alteridade. Sávio Laet de Barros Campos fala-nos dos gêneros literários e formas do saber na Universidade de Paris, no século XIII, o qual é o âmbito onde Tomás de Aquino desen- volveu grande parte de sua importante obra filosófica. Esses gêneros literários influenciaram o Aquinate a compor seu discurso. Ademais, uma questão muito importante é abordada por Lucas Kattah Macedo, o qual discute a transposição da metafísica à epistemologia, no âmbito da filosofia primeira.
  • 8. 8|I v a n a l d o S a n t o s ( O r g . ) Com efeito, Tomás de Aquino, o qual foi muito cuidadoso ao construir seu pensamento ontológico, com as condições de possibilidade do mesmo a partir da dimensão epistemo- lógica, a partir do ponto de vista semântico da mesma forma como procedeu Aristóteles. Todos esses assuntos estão presentes no volume que temos em mãos. Por esse motivo, trata-se de um instrumento de estudo muito útil para continuar o diálogo, a partir do tomismo, com as correntes que na atualidade fazem uso da filosofia da linguagem e da epistemologia. Por tudo isso, temos que agradecer o esforço de Ivanaldo Santos, que nos entrega esse volume, produto de sua organização, e aos demais pesquisadores que contribuíram para sua realização. Mauricio Beuchot, UNAM, México, 2011.
  • 9. L i n g u a g e m e e p i s t e m o l o g i a e m T o m á s d e A q u i n o |9 Introdução Tomás de Aquino (1225-1274) foi o grande filósofo da escolástica medieval. Todavia, sua contribuição ao pensamento universal não está preso à Idade Média. Pelo contrário, ao longo da modernidade, um grande número de pensadores, tomistas e não tomistas, recorreram as suas ideias para dar continuidade a suas investigações. No século XX e no início do XXI, a realidade não é diferente. Tomás de Aquino é convocado, por meio de sua vasta obra, a contribuir com os debates intelectuais. Sem Tomás é difícil pensar na história das ideias no Ocidente. Ao longo do século XX e na primeira década do XXI, houve um esforço para se estudar uma dimensão diferente dos tradicionais estudos em torno da obra do aquinate. Estudos que o apresentam como um estudioso da metafísica e a ética. É claro que Tomás de Aquino é um grande estudioso dessas duas dimensões, mas sua obra atinge outros níveis, como, por exemplo, a lógica, a linguagem, a epistemologia e a hermenêutica. Foi com esse propósito que, no final do século XX, surgiu o chamado tomismo analítico, o qual propõe um diálogo entre Tomás de Aquino e uma das correntes filosóficas mais influentes do século XX, ou seja, a filosofia analítica. Esse diálogo versa sobre temas importantes para a tradição filosófica e para o tomismo, como, por exemplo, a linguagem, o conhecimento e o método. O presente livro não se enquadra diretamente na categoria de tomismo analítico. Pelo contrário, sua pretensão é bem mais simples, qual seja: apresentar uma pequena coletânea de artigos produzidos por estudiosos da obra do Aquinate sobre dois temas caros à tradição filosófica e aos estudos realizados no século XX, que são, a linguagem e a
  • 10. 10 | I v a n a l d o S a n t o s ( O r g . ) epistemologia. E por isso o título do livro é Linguagem e epistemologia em Tomás de Aquino. Nesse livro, o leitor encontrará uma grande variedade de problemas que o Aquinate abordou, ao debater os temas da linguagem e da epistemologia. Ficará espantado ao ver que, em pleno século XIII, Tomás de Aquino tinha um profundo conhecimento da tradição filosófica e dos pro- blemas que realmente angustiam a filosofia. Problemas que, de uma forma ou de outra, atravessaram a modernidade e chegaram até o século XXI. Paulo Faitanin apresenta uma ótima tradução, com um estudo introdutório, do De Natura Verbi Intellectus de Tomás de Aquino. Um texto necessário para a compreensão das teses desenvolvidas pelo Aquinate sobre a linguagem e a epistemologia. Por sua vez, Jean Lauand apresenta um estudo sobre o papel do negativo na epistemologia de Tomás de Aquino, em comparação com as rationes necessariae de Anselmo. Ivanaldo Santos apresenta a linguagem enquanto problema filosófico na obra de Tomás de Aquino e Sergio de Souza Salles expõe um brilhante estudo sobre a linguagem da alteridade no Aquinate. Já Sávio Laet de Barros Campos apresenta um estudo sobre os gêneros literários e formas do saber na Universidade de Paris do século XIII. Trata-se de um estudo onde podemos vislumbrar o ambiente intelectual, no qual Tomás de Aquino produziu grande parte de sua obra. E Lucas Kattah Macedo apresenta um estudo sobre a relação entre a metafísica e a epistemologia. Por fim, é preciso realizar um agradecimento especial ao renomado filósofo Mauricio Beuchot, pesquisador do Centro de Estudos Filosóficos da Universidade Autônoma do México (UNAM), o qual gentilmente realizou a apresentação do livro.
  • 11. L i n g u a g e m e e p i s t e m o l o g i a e m T o m á s d e A q u i n o | 11 O ‘De Natura Verbi Intellectus’ como texto gênese para a compreensão das teorias do conhecimento e da linguagem em Tomás de Aquino: introdução, tradução e notas1 Paulo Faitanin Introdução A Filosofia da Linguagem tomasiana é fundamental para entender a sua doutrina acerca do significado analógico dos conceitos. A comunicação da verdade resulta da ordem que a razão estabelece internamente nos seus conceitos e expressa pela linguagem. Por isso, a linguagem que procede da dialé- tica é instrumento para a comunicação da verdade. O conhe- 1 Nossa intenção, neste artigo, é, primeiramente, apresentar algo da filosofia da linguagem de Tomás de Aquino, em alguns parágrafos e, secundariamente, apresentar uma tradução não crítica e analítica do De natura verbi intellectus. Justifica-se esta tradução pelo fato de que, neste texto, Tomás explica como o conceito – o verbum entendido como verbo mental, palavra mental – é gerado pelo intelecto. A assertividade do conceito pautada em sua adequação com a realidade assegura uma teoria do conhecimento que rela- ciona o intelecto com o real e estabelece uma teoria da linguagem que exige uma análise1 apurada das palavras que forem usadas para expressar o real. Desta maneira, trabalharemos um texto ‘gênese’ da teoria do conhecimento, extremamente importante para compreender sua teoria da linguagem e o modo como esta deve ser utilizada para fazer ciência, na medida em que se observa a conveniência e a proporcionalidade dos nomes usados para darem conta de um conceito que expressa a verdade de uma realidade.
  • 12. 12 | I v a n a l d o S a n t o s ( O r g . ) cimento intelectual do homem traduz-se, exteriormente, num conjunto de sinais sensíveis, falados ou escritos, que compõem a linguagem humana. Sinal é aquilo que serve para o conhecimento de outra realidade2. A fala é a mani- festação, pela voz, da palavra interior que se concebe com a mente3. A palavra é uma voz convencional significativa de um conceito, que por sua vez é uma similitude da coisa4, produzida pelo intelecto, ao abstrair da realidade sua simi- litude inteligível5. A voz é um sinal material, sensível da palavra, que permite a sua comunicação aos demais homens6 e consiste na emissão oral dos sons como efeito orgânico das cordas vocais7, dando sentido ao que se emite. A palavra significa, pois, a coisa mediante o conceito, pois segundo o modo como se lhe entende, assim se lhe nomeia8. O nome é uma voz significativa, isto é, uma voz que tem significado9. Em síntese, o nome é um sinal inteligível do conceito10 manifesto numa palavra falada ou escrita. A signi- ficação do nome se dá segundo aquilo a que é imposto ao nome significar11. O verbo é uma voz significativa declinável com o tempo, presente, passado e futuro, utilizado, às vezes, como substantivo ou considerado em si mesmo, em seu ato abstrato, no infinitivo12. As palavras e os nomes, que com- põem a linguagem e que expressam os conceitos elaborados pelo intelecto, podem ser utilizados para significar outras 2 TOMÁS DE AQUINO, S. STh. III, q60, a4,c. 3 TOMÁS DE AQUINO, S. De veritate, q9, a4. 4 TOMÁS DE AQUINO, S. In I Perih. Lec. 10; STh. I, q13, a1, c. 5 TOMÁS DE AQUINO, S. De natura verbi intellectus. 6 TOMÁS DE AQUINO, S. In I Perih. Lec. 4. 7 TOMÁS DE AQUINO, S. STh. I, q51, a3, obj4. 8 TOMÁS DE AQUINO, S. STh. I, q13, a1, c. 9 TOMÁS DE AQUINO, S. In I Perih. Lec. 4. 10 TOMÁS DE AQUINO, S. In IX Met. Lec. 3. 11 TOMÁS DE AQUINO, S. STh. II-II, q92, a1, ad2; I, q31, a1, ad1. 12 TOMÁS DE AQUINO, S. In I Perih. Lec. 5.
  • 13. L i n g u a g e m e e p i s t e m o l o g i a e m T o m á s d e A q u i n o | 13 coisas. E isso ocorre porque se distingue o significado de uma palavra, do modo como é utilizado para significar13. Neste sentido, evidencia-se que os termos da linguagem, como as palavras e os nomes, nem sempre conservam o mesmo significado. Por este motivo, cabe considerar com muita atenção se um nome é aplicado a uma realidade enquanto significa a essência ou não da realidade nomeada. Por meio de um nome, os conceitos podem ser utilizados para significar outras coisas. E isso ocorre porque se distingue o significado de uma palavra, do modo como é utilizado para significar14. Diz-se, por exemplo, que um nome é unívoco quando signi- fica uma mesma essência, que se diz de uma única natureza, ou seja, a conveniência do nome com a natureza15, como quando se toma o nome coelho para designar uma espécie de animal e que conserva sempre este mesmo sentido ou como no caso do nome Deus16. Por outro lado, diz-se equívoco, quando um nome tomado significa várias coisas distintas17, como ocorre na ambiguidade, onde não se toma a similitude entre as realidades, mas a unidade do nome18. Neste caso, não há proporcionalidade entre o nome e a essência, ou seja, o nome é comum, mas as substâncias diversas19, como quando se toma o nome quarto para significar um número ordinal ou um cômodo da casa ou com o nome cão, dito 13 TOMÁS DE AQUINO, S. CG. I, c. 30. 14 TOMÁS DE AQUINO, S. CG. IV, c. 49. 15 TOMÁS DE AQUINO, S. STh. I, q5, a6, ad3/ q13, a10, c; In II Sent. d. 22, q.1, a.3, ad2. 16 TOMÁS DE AQUINO, S. STh.I, q5, a6, ad3/ q13, a10, c; In II Sent. 22, 1, 3, ad2. 17 TOMÁS DE AQUINO, S. CG. IV, c.49. 18 TOMÁS DE AQUINO, S. CG. I, c.33. 19 TOMÁS DE AQUINO, S. STh. I, q4, a2, c.
  • 14. 14 | I v a n a l d o S a n t o s ( O r g . ) univocamente do animal, para referir-se à constelação ou ao temperamento irascível de algum homem20. Mas é dito análogo, quando um mesmo nome é atri- buído comumente a muitas realidades distintas entre si, mas de algum modo relacionadas21, na medida em que esta correlação segue uma comparação por proporção22 do que há de comum e semelhante entre as distintas realidades referi- das por aquele mesmo nome. Assim, pois, o nome saudável, tomado analogamente, pode ser dito do alimento e do corpo que dele se alimenta, porque há uma correlação entre o alimento saudável e o corpo saudável, enquanto um é causa do outro. Deste modo, a analogia supõe a aplicação dos primeiros princípios, como o da causalidade, neste exemplo dado. A analogia é, pois, uma comparação que pode ser por proporcionalidade23, quando os sujeitos possuem semelhante perfeição, mas significada de modos diversos24 como, por exemplo, ser dito do homem, do anjo e de Deus. A analogia também pode ser uma comparação por atribuição, quando um dos sujeitos possui a perfeição em sua plenitude e os demais por participação ou de modo derivado, como, por exemplo, intelecto dito de Deus e por atribuição do homem e do anjo. Assim, diz-se que um nome é análogo, se ele é aplicado comumente a muitos indivíduos25, respeitando a comparação por proporção ou por atribuição. O Aquinate concebe o ente analogamente, porque ente não é um nome genérico, uma vez que, enquanto tal, não 20 TOMÁS DE AQUINO, S. STh. I, q4, a2, c. 21 TOMÁS DE AQUINO, S. In I Sent. d.22, q.1, a.3, ad2. 22 TOMÁS DE AQUINO, S. STh. I, 13, a5, c. 23 TOMÁS DE AQUINO, S. STh. I, q.13, a5, c. 24 TOMÁS DE AQUINO, S. STh. I, q.13,a 10, c. 25 TOMÁS DE AQUINO, S. In I Sent. d.22, q1, a3, ad2.
  • 15. L i n g u a g e m e e p i s t e m o l o g i a e m T o m á s d e A q u i n o | 15 inclui todas as diferenças26 predicáveis do ente que fazem parte da definição do gênero, como, por exemplo, o conceito de animal, que inclui as diferenças racional e irracional27. E, dado que o nome atribuído a uma realidade deve indicar o que significa o conceito desta realidade, para uma melhor análise do nome, parece proeminente entender o que é o conceito e como ele é gerado. Assim, mediante esta apuração analítica, poder-se-á melhor usar os nomes e as palavras para referirem às diversas realidades. Texto e Tradução THOMAS DE AQUINO TOMÁS DE AQUINO De natura verbi A natureza da palavra no intellectus28. intelecto. Prooemium Introdução Quoniam circa naturam Porque a consideração da verbi intellectus, sine quo palavra no intelecto, sem a qual imago Trinitatis non invenitur não se encontra expressa no in homine expressa, multiplex homem a imagem da Trindade, difficultas et prolixitas nimia traz consigo inúmeras dificul- animum involvit; ideo dades e um sem número de 26 TOMÁS DE AQUINO, S. In I Met. Lec.9, n.139. 27 TOMÁS DE AQUINO, S. STh. I, q3, a5, c. 28 Este opúsculo filosófico atribuído a Tomás tem a autenticidade controvertida. Sobre sua autenticidade: FAITANIN, P.S. “A controvérsia acerca da autenticidade de sete opúsculos atribuídos a Tomás de Aquino”, Aquinate, n.1 [2005], 9-20. Quanto ao título, há certa uniformidade nas edições pesquisadas: De natura verbi intellectus. Quanto ao tempo de composição, não há certeza, mas pensamos ter sido escrito no período entre 1268-1272, durante a Segunda Regência, em Paris. O texto, que se divide em dois capítulos, procura responder a duas questões: o que é a palavra e como se gera a palavra no intelecto. O texto latino encontra-se em: http://www.corpusthomisticum.org/xti.html
  • 16. 16 | I v a n a l d o S a n t o s ( O r g . ) summatim eius naturam questões para o entendimento, tradere intendimus, insuper et tentaremos, por essa razão, con- difficultates ipsum tangentes siderar, brevemente, sua nature- simul manifestare. za e demonstrar, ao mesmo tempo, aquelas dificuldades que recaem sobre ela. Caput 1 Capítulo 1 Quid sit verbum O que é a palavra? Sciendum est igitur primo, Em primeiro lugar, deve quod verbum cum re dicta per saber-se, pois, que a palavra, no verbum convenientiam habet que se refere à sua natureza, ela maiorem in natura sua quam tem maior conformidade com a cum dicente, licet in dicente sit realidade que se expressa pela ut in subiecto. Unumquodque palavra, do que com a natureza enim ab illo naturam sortitur a de quem a profere, ainda que quo speciem accipit et nomen ela exista em quem a diz, como sortitur, cum species sit tota em seu sujeito. Na verdade, natura rei. Verbum autem cada coisa recebe um nome speciem accipit a re dicta, et daquilo que recebe da natureza, non a dicente, nisi forte do que pertence à espécie, quando dicit se: sicut verbum sendo a espécie toda a natureza lapidis differt specie a verbo da coisa. Ora, a palavra toma a asini; verbum etiam dictum a espécie da realidade que ex- diversis de eadem re, idem pressa e não de quem a profere, specie est. Et huius ratio est, exceto no caso de que alguém quia effectus quilibet magis expresse pela palavra algo de si convenit cum principio quo mesmo: desta maneira, a pala- agens agit, quam cum agente, vra ‘pedra’ difere da palavra cui solum assimilatur ratione ‘asno’; uma mesma palavra ipsius principii: hoc enim est pode, também, ser dita de quod communicatur effectui muitos da mesma realidade, e a per actionem agentis. mesma realidade é a espécie. E a razão disso é que qualquer efeito tem mais relação com o princípio, pelo qual o agente age, do que com a ação mesma do agente, com o qual somente
  • 17. L i n g u a g e m e e p i s t e m o l o g i a e m T o m á s d e A q u i n o | 17 se assemelha em razão do princípio mesmo: e isso é o que realmente é comunicado, pelo agente, ao efeito. Similitudo autem rei dictae Ora, a semelhança da reali- est principium quo verbum rei dade que é expressa pela pala- efficitur, quae etiam in verbo vra é o princípio pelo qual se reperitur a dicente sibi produziu a palavra, semelhança communicata: et ideo ipsum que, também, se encontra comu- verbum quandoque dicitur nicada na palavra que o falante similitudo rei, quandoque profere para si mesmo: e é por vero verbum rei, ubicumque essa razão que a própria palavra illa similitudo exprimitur, sive é denominada semelhança da in parte imaginativa, sicut realidade, seja na imaginação, phantasma Chartaginis est quando verdadeiramente se ex- verbum Chartaginis, pressa pela palavra da realidade secundum Augustinum29; sive aquela semelhança, tal como in intellectu nostro, ubi ensina Santo Agostinho, quando perfecta ratio verbi invenitur disse que a palavra ‘Catargo’ é a quod, ad imaginem pertinet. imagem de Catargo; seja em nosso intelecto, onde se encon- tra a natureza perfeita da pala- vra a que se atribui a imagem. In verbis enim quae in Na verdade, a natureza da imaginativa fiunt, non est palavra não é expressa naquelas ratio verbi expressa. Aliud palavras que se produzem na namque est in ea unde imaginação. O fato é que um é o similitudo exprimitur, et aliud lugar onde se expressa a seme- in quo terminatur. Exprimitur lhança e outro onde termina. Na enim a sensu, et terminatur in verdade, a semelhança é expres- ipsa phantasia, cum phantasia sa pelo sentido e termina na sit motus factus a sensu própria fantasia, sendo a fanta- secundum actum, secundum sia o movimento causado pelo philosophum in tertio De sentido, segundo o ato, tal como 29 SANTO AGOSTINHO, De Trinitate, VIII, c. 6 [PL 42, 954-955].
  • 18. 18 | I v a n a l d o S a n t o s ( O r g . ) anima30. Sed supra intellectum ensina o Filósofo, no terceiro nihil est in quo ab ipso aliquid livro do De anima. Mas, não exprimatur; et ideo non est existe nada além do intelecto aliud quod exprimit ab eo in em que algo possa ser expresso, quo exprimitur, sicut nec in tal como no intelecto mesmo o Deo aliud est pater exprimens, é; e isto porque não é outro que et aliud in quo recipitur a expressa por ele o que nele se expressum. expressa, como nem em Deus um é o que o Pai expressa e outro em que se recebe o expresso. Sed adhuc in intellectu Mas, até nisso há defeito em nostro est defectus, quia aliud nosso intelecto, porque algo é o est quod exprimit, aliud que a expressa e outro é a pró- ipsum verbum expressum; pria palavra expressa, o que não quod in Deo non invenitur: et ocorre em Deus; e isto porque a ideo verbum Dei est Deus, Palavra de Deus é Deus; no intellectus autem noster entanto, em nosso intelecto, a verbum suum non est, neque palavra não é sua, nem mesmo é etiam est suum dicere, quod o seu dizer, que é a causa pró- est proxima causa verbi. xima da palavra. Nascitur enim verbum Na verdade, a nossa palavra nostrum ex notitia alicuius origina-se a partir do conhe- habiti apud memoriam cimento de alguma natureza nostram, quae nihil aliud est que há em nossa memória, que in hoc loco quam ipsa não é outra coisa senão o lugar receptibilitas animae nostrae, em que há a própria receptibi- in qua etiam tenet se, lidade de nossa alma, na qual secundum Augustinum31, ela existe e que, segundo Santo etiam cum se non discernit, Agostinho, também não se dis- sed alia quae ab extra acquirit. tingue dela, mas daquelas coisas que ela percebe e que vêm de fora. Primus ergo processus in Portanto, o primeiro processo 30 ARISTÓTELES, De anima, III, c. 3, 428b 10-17 [Comentário de Santo Tomás, lectio 6]. 31 SANTO AGOSTINHO, De libero arbitrio, II, c. 19 [PL 32, 1268].
  • 19. L i n g u a g e m e e p i s t e m o l o g i a e m T o m á s d e A q u i n o | 19 gignitione verbi est cum de formação da palavra ocorre intellectus accipit a memoria quando o intelecto recebe da quod ab ea sibi offertur, non memória o que dela lhe é eam spolians quasi in ea nihil oferecido, não a privando, como relinquens, sed similitudinem se nada deixasse nela, mas habiti in se assumens; et hoc tomando para si a semelhança est simile illi quod in memoria da natureza; e isso é semelhante habetur, et ideo vocatur ao que havia na memória e, por aliquando illud quod ab esse motivo, denominou-se, intellectu accipitur verbum algumas vezes, de palavra da memoriae; sed adhuc non memória, àquilo que é recebido habet perfectam rationem pelo intelecto; mas isso ainda verbi; haberet tamen, si não é suficiente para que tenha intellectus solum reciperet a a perfeita natureza de palavra; memoria exprimente. Sed cum seria, todavia, suficiente, se o memoria non habeat actum intelecto somente recebesse aliquem, sed in loco actus para a formação da palavra o solum tenet libere quasi parata que lhe exprime a memória. capienti a se, intellectus vero Mas, não tendo a memória al- in lumine suo capit ea; adhuc gum ato, exceto aquele ato livre perfectam rationem verbi non local pelo qual está preparada habet. para compreender-se, o inte- lecto, em sua luz, a compreende perfeitamente; mas, mesmo assim, ainda não se estabelece a perfeita natureza de palavra. In divinis vero pater, cui Mas, nas Pessoas divinas, o respondet memoria in ratione Pai, a quem corresponde a me- ordinis, vel originis, complete mória, em razão de ordem, ou generat, quia pater id quod origem, gera perfeitamente a habet, non solum tenet ut Palavra, porque isso que tem o memoria apud nos, sed quia Pai não é somente o que é a est suppositum completum memória para nós, porque Ele é cuius est agere, ideo generat o suposto completo a que per- filium. Non enim in tence o operar e, por isso, Ele generatione ista gera o Filho. Com efeito, não se praesupponitur aliquid quasi pressupõe isto na geração da a patre accipiens, et aliud Palavra divina, como se algo
  • 20. 20 | I v a n a l d o S a n t o s ( O r g . ) quasi acceptum: sic apud nos fosse recebido do Pai e algo intellectus accipit a memoria, fosse recebido de outro: tal et praesupponitur generationi; como ocorre conosco, em que o ibi vero filius generatur a intelecto recebe algo da me- patre, sicut si totus intellectus mória e o pressupõe para a ge- noster esset a nostra memoria, ração de sua palavra; naquele et non similitudo ista vel illa. outro caso, o Filho é efetiva- mente gerado pelo Pai, como se o mesmo intelecto fosse total- mente a nossa memória e não apenas esta ou aquela seme- lhança. Cum ergo intellectus Estando, pois, o intelecto informatus specie natus sit informado pela espécie, ele está agere; terminus autem apto por natureza para operar; cuiuslibet actionis est eius ora, o término de qualquer ope- obiectum, nititur agere circa ração é o seu objeto, por isso, o obiectum; obiectum autem intelecto inclina-se a operar suum est quidditas aliqua sobre o objeto; mas, o seu objeto cuius specie informatur, quae é alguma quididade, que é non est principium informada pela espécie, que não operationis vel actionis nisi ex é o princípio da operação ou da propria ratione illius cuius est ação, senão da prórpia natureza species. Obiectum autem non daquilo de que é espécie. Mas, o adest ipsi animae illa specie objeto, que foi informado à alma informatae, cum obiectum sit por aquela espécie, não se en- extra in sua natura; actio contra na própria alma, do mes- autem animae non est ab mo modo que existe em sua extra, quia intelligere est natureza, fora dela; ora, a ação motus ad animam, tum ex da alma não se dá fora dela, natura speciei quae in talem porque o inteligir é um movi- quidditatem ducit, tum ex mento intrínseco para a alma, natura intellectus, cuius actio tanto quando ela considera a non est ad extra. Prima autem natureza da espécie, que resulta actio eius per speciem est na apreensão de tal quididade, formatio sui obiecti, quo como quando atua por parte da formato intelligit; simul tamen natureza do intelecto, cuja ação tempore ipse format, et não se dá fora dela. Ora, a sua
  • 21. L i n g u a g e m e e p i s t e m o l o g i a e m T o m á s d e A q u i n o | 21 formatum est, et simul primera ação é a formação do intelligit, quia ista non sunt seu objeto pela espécie, que o motus de potentia ad actum, entende quando formado; con- quia iam factus est intellectus tudo, no mesmo instante que o in actu per speciem, sed est forma, é formado e entende, processus perfectus de actu in porque isso não é um movi- actum, ubi non requiritur mento de potência ao ato, por- aliqua species motus. que já é feito pelo intelecto em ato, mediante a espécie, mas é um processo perfeito de ato em ato, onde não se requer alguma espécie de movimento. Et quia, ut dictum est, E porque, tal como foi dito, huiusmodi obiectum in ipsa que o objeto desta maneira é anima formatur, et non extra, formado na própria alma, e não ideo erit in anima ut in fora dela, por isso, existirá na subiecto; est enim similitudo alma como em seu sujeito; com rei extra. Quod autem est in efeito, é similitude da realidade anima ut in subiecto, efficitur externa. Ora, o que existe na in ea ut habitus. De perfecta alma como num sujeito, se pro- autem ratione habitus est, duz nela por hábito. Mas a quando actui coniungitur: in perfeita natureza do hábito se hoc enim natura perficitur. dá quando se une ao ato: com Perficitur autem per lumen efeito, a natureza se aperfeiçoa naturale intellectus, involvens mediante isso. Ora, se aper- speciem intelligibilem in quo feiçoa pela luz natural do inte- et sub quo intelligatur. lecto, envolvendo a espécie inte- ligível na qual e sob a qual se entende. Idem enim lumen quod Ora, a mesma luz que o inte- intellectus recipit cum specie lecto recebe com a espécie, pelo ab agente, per actionem agente, é difundida pela ação do intellectus possibilis informati intelecto possível que informa tali specie diffunditur, cum tal espécie, que se forma com o obiectum formatur, et manet objeto, e permanece com o obje- cum obiecto formato; et hoc to formado; e isso tem a plena habet plenam rationem verbi, natureza de palavra, pois nela a cum in eo quidditas rei quididade da coisa é entendida.
  • 22. 22 | I v a n a l d o S a n t o s ( O r g . ) intelligatur. Sicut in principio Assim como no princípio da actionis intellectus et species ação não são duas coisas o non sunt duo, sed unum est intelecto e a espécie, porque um ipse intellectus et species é o próprio intelecto e a espécie illustrata; ita unum in fine ilustrada; do mesmo modo é relinquitur, similitudo scilicet uma mesma realidade lograda perfecta, genita et expressa ab no fim, ou seja, a perfeita simi- intellectu: et hoc totum litude, gerada e expressa pelo expressum est verbum, et est intelecto: e esse todo expresso é totum rei dictae expressivum, a palavra, na medida em que é et totum in quo res toda a realidade dita de modo exprimitur; et hoc est expressivo e tudo no qual a intellectum principale, quia coisa é expressa; mas isso é o res non intelligitur nisi in eo. intelecto principal, pois a coisa Est enim tanquam speculum não é entendida senão nele. in quo res cernitur, sed non Com efeito, ele é como um espe- excedens id quod in eo lho no qual a coisa se reflete, cernitur. Efficitur enim opere mas não excedendo o que nele naturae ut in eo aliquid se reflete. Na verdade, se pro- cernatur: natura autem non duz a obra da natureza quando agit aliquid superflue, et ideo nele se reflete algo: ora, a natu- non excedit speculum hoc, reza não opera algo inutilmente idest id quod in eo videtur. e, por isso, não excede a esta imagem, isto é, àquilo que nela se vê. Verbum igitur cordis est Portanto, a palavra interna é ultimum quod potest a última coisa que o intelecto intellectus in se operari. Ad pode em si mesmo produzir. ipsum enim, ut est in quo Com efeito, o inteligir é finali- quidditas rei recipitur, immo zado nele mesmo, na medida quia ipsemet est quidditatis em que ele recebe a quididade similitudo, terminatur da coisa, pois que isso mesmo é intelligere. Sic enim habet similitude da quididade. Com rationem obiecti intellectus. Ut efeito, é assim que se tem a na- vero est per intellectum tureza do objeto pelo intelecto. expressum, ei coniungitur Como, de fato, [a palavra] é dicere; et sic ipsum idem expressa pelo intelecto, diz-se verbum est effectus actus que ela se une a ele; e, assim,
  • 23. L i n g u a g e m e e p i s t e m o l o g i a e m T o m á s d e A q u i n o | 23 intellectus, qui est formativus esta mesma palavra é efeito do obiecti, et ipsius dicere. ato do intelecto, que forma o objeto e é sua própria expressão. Sed in hoc reperitur Mas nisso se encontra alguma differentia quaedam: quod diferença: com efeito, o que se enim intelligitur, potest esse in intelige pode existir no intelecto intellectu et manere in e permanecer no intelecto, mas intellectu non intellectum não em ato no intelecto; ora, o actu; quod autem dicitur, que se diz, pode ser dito, mas potest esse dictum, sed non não pode permanecer dito, a potest manere dictum, nisi não ser se dito em ato: daí que, cum actu dicitur: unde in no intelecto, as espécies do intellectu potest manere objeto podem permanecer em species obiecti in habitu. Illud hábito. De fato, digo que aquilo enim dico quod formatum est, é formado, mas não permanece sed non manet id in quo naquilo em que é formado, sem formatum est sine lumine in a luz pela qual algo é inteligido quo actu aliquid intelligitur. em ato. Daí que a palavra não Inde est quod verbum non est existe sem o inteligir em ato, sine intelligere in actu, licet ainda que a mesma possa per- ipsum intellectum nudum in manecer privada em hábito, no habitu manere possit. Habitus intelecto. Hábito aqui não se hic dicitur non ipsa potentia refere somente à própria potên- memorativa tantum, quae cia da memória, que precede ao praecedit intellectum: immo intelecto: mas, também, ao pró- ipse intellectus est natus prio intelecto que é apto natu- retinere suum obiectum, ralmente a reter o seu objeto, propter tamen naturam por causa, também, da natureza memoriae, quae prior est. da memória, que lhe é anterior. Unumquodque enim prius Ora, qualquer coisa que é prévia salvatur in suo posteriori; et se encontra salvo em seu pos- ideo ipsa perfectio obiecti terior; e, por isso, se tem a per- habetur in ipso habitu feição mesma do objeto no pró- intellectus, ut dictum est, et ibi prio hábito do intelecto, como posita est perfectio verbi foi dito, e aí se encontra a per- superius. feição mais superior da palavra. Ex his manifestum est Do anterior fica claro de que qualiter apud nos deficit a modo nos falta para representar
  • 24. 24 | I v a n a l d o S a n t o s ( O r g . ) repraesentatione filii in a Filiação divina; pois a nossa divinis; quia scilicet ipsa própria inteligência não é pro- intelligentia nostra non est duzida a partir de nossa memó- educta de memoria nostra, a ria, de onde ela tira, portanto, o qua tamen principium et seu princípio e a natureza de rationem agendi habet. Quae, sua ação. A qual, se fosse pro- si esset de memoria totaliter duzida totalmente da memória, educta, ipsa esset verbum a mesma seria palavra de sua memoriae suae: unde non memória: donde não poderia diceret se, nec exprimeret nisi dizer-se senão de si mesma, dictatum et expressum a nem expressaria senão o que é memoria sua, quia aliter falso dito e expresso por sua memó- diceret et exprimeret se: sicut ria, porque, de outro modo, se verbum in divinis non dicit diria e expressaria algo falso de seipsum gignendo et si mesmo: tal como a Palavra exprimendo, sed dicit seipsum nas Pessoas divinas não se genitum et expressum. refere a si mesmo gerando e exprimindo, mas refere-se a si mesmo como gerado e expresso. Rursum manifestum est Além do mais, fica claro por quare verbum proprie dicitur que a palavra, propriamente, se personaliter tantum. Verbum diz somente de um modo pes- enim nostrum semper est in soal. De fato, a nossa palavra continuo fieri, quia semper sempre está num contínuo perfectum esse suum est in fazer-se, porque o seu ser per- fieri; sed hoc non est feito sempre está por fazer-se; imperfectum, quasi totum mas isso não é uma imperfeição, simul non existens, sicut est de como se o todo não existisse aliis quae sunt in fieri, quae simultaneamente, tal como etiam semper sunt imperfecta; aquelas coisas que estão por immo verbum in principio sui serem feitas e, que, também, est perfectum, quia conceptio sempre são imperfeitas; a pala- perfecte formata est, et vra, ao contrário, é perfeita em nihilominus esse eius seu princípio, porque sua con- perfectum servatur eodem cepção foi formada perfeita- modo quo gignebatur. Non mente e o seu ser perfeito enim transit formatio verbi conserva-se, do mesmo modo ipso formato, sed cum actu que foi gerado. De fato, a
  • 25. L i n g u a g e m e e p i s t e m o l o g i a e m T o m á s d e A q u i n o | 25 intelligitur continue formatur formação da palavra não passa verbum, quia semper est ut in ao próprio formado, mas, inte- fieri et ut in egrediendo ab ligindo em ato, se forma conti- aliquo, scilicet a dicente. Et nuamente a palavra, porque hoc cum personarum sempre está como num fazer-se processionibus convenit. e como num elevar-se por algo, Intelligere vero, ut in quiete ou seja, por quem a expressa. E accipitur, et essentiale est in isso convém à processão das divinis, dicere vero, sicut et Pessoas. Na verdade, o inteligir, verbum, personaliter dicitur. enquanto se encontra em re- pouso e de modo essencial está nas Pessoas divinas, é verda- deiro, como a Palavra, que é dita pessoalmente. Caput 2 Capítulo 2 Quomodo generetur Como se gera a palavra? verbum Nunc restat videre, utrum Resta considerar, agora, se a verbum gignatur per palavra foi gerada por um ato reflexionem actus intellectus de reflexão do intelecto ou se foi vel per actum rectum. por um ato direto. Ad cuius evidentiam Deve-se considerar, para o considerandum est quod esclarecimento desta questão, verbum quod est expressivum que a palavra, que é uma ex- rei quae intelligitur, non est pressão da coisa que é inteli- reflexum; nec actio qua gida, não é uma reflexão, nem formatur verbum, quod est uma ação pela qual se forma a expressivum quidditatis rei palavra, expressiva da quidi- quae concipitur, non est dade da coisa que se concebe, reflexa; alioquin omne não é uma [ação] reflexa; se intelligere esset reflexum, quia fosse assim, todo inteligir seria semper cum actu intelligitur [um ato] reflexo, porque sempre aliquid, verbum formatur. que algo fosse inteligido em ato, Unde manifestum est quod se formaria a palavra. Daí ser intellectus infra se ipsum manifesto que o intelecto infe- actionem rectam exercere rior pode exercer ação direta potest, et haec semper est actio sobre si mesmo e esta é sempre
  • 26. 26 | I v a n a l d o S a n t o s ( O r g . ) sua propria, quae terminatur sua própria ação, que tem o seu ad obiectum factum in se et a término no objeto produzido se. nele e por ele. Unum enim constituitur ex Com efeito, a unidade se intellectu et specie, quae est constitui de intelecto e espécie, principium actionis suae, et que é o princípio de sua ope- huius est agere; unde species ração e do seu agir; daí que esta haec est prima qua agitur, non espécie é a primeira pela qual se autem ad quam: non enim opera, mas não para qual se intellectus noster inspiciens opera: de fato, o nosso intelecto hanc speciem tanquam não considera esta espécie como exemplar sibi simile, aliquid um exemplar semelhante a si facit quasi verbum eius. Sic mesmo, mas o considera como enim non fieret unum ex uma palavra sua. Assim, pois, intellectu et specie, cum não haveria unidade de inte- intellectus non intelligat nisi lecto e espécie, se o intelecto não factus unum aliquid cum inteligisse algo produzido em specie, sed in ipsa specie unidade com a espécie, mas formatus agit tanquam aliquo opera na própria espécie forma- sui, ipsam tamen non da como em algo seu, mas que excedens. não a excede. Species autem sic accepta Mas a espécie assim consi- semper ducit in obiectum derada sempre se dirige ao seu primum. Unde manifestum primeiro objeto. Daí ser mani- est quod ipsum verbum festo que a própria palavra do intellectus perficitur per intelecto se aperfeiçoa pelo ato actum rectum; tamen, quia direto; mas, porque não aban- non mittit ad aliquid aliud dona alguma outra de suas conceptiones suas, sicut facit concepções, como faz o sentido, sensus, hinc est quod potest é assim que ele pode, quando super actus suos reflecti cum quer, refletir sobre os seus atos vult, quod non potest sensus: com as imagens que não aban- non enim utitur medio donou, o que não pode fazer o corpore cuius non est sentido: ora, o intelecto não faz percipere quod in eo fit. isso mediante o corpo, que não percebe o que nele se produz. Sed cum sit unum agens, Mas porque é um agente, cum quo et species ipsa com o qual a própria espécie se
  • 27. L i n g u a g e m e e p i s t e m o l o g i a e m T o m á s d e A q u i n o | 27 efficitur unum spiritualiter in torna una espiritualmente, participando vitam eius, participando de sua vida, o seu percipit actum suum cum ato percebe, mediante imagens, vult, complete, quod non de um modo completo, o que potest sensus. Non enim não pode fazer os sentidos. Ora, indiget anima, ad hoc quod a a alma não necessita desta se intelligatur specie illa, sed imagem para entender-se, mas ad hoc ut intelligat: de se somente para compreender esta namque habet ut intelligatur, espécie: a tem, pois, em si, para sed non quod intelligat. entender, não para que se Intelligit enim se sicut alia, entenda. Ora, [ela] se entende a secundum philosophum: hoc si e as demais coisas, segundo o autem est per speciem, quia Filósofo: mas isto é pela espécie, alia sic intelliguntur. Sensus porque assim são entendidas as autem indiget organo ad hoc outras coisas. Mas o sentido ut agat; organum autem non necessita do órgão para sentir, redit supra se, unde non est enquanto opera; mas o órgão reflexio in sensu. não se volta sobre si, daí que não há reflexão no sentido. Considerandum tamen est, Deve-se considerar, também, quod generatio verbi videtur que parece que a geração da propinquissima cognitioni palavra está muito mais próxi- reflexae: unde multi ma do conhecimento reflexo: putaverunt eam reflexam. por isso, muitos consideraram- Cum enim anima informata na um [ato de] reflexão. Na specie format verbum in se, verdade, quando a espécie é non format ipsum in aliquo informada na alma, forma nela sui non informato specie, mesma a palavra, mas, não quasi aliquid sui extendat a se formaria nela mesma, se não non informatum specie prima, fosse informada pela espécie, ut in eo verbum primum como se desdobrasse de si algo formetur, et ipsum esset que não fora informado primei- informatum verbo in eo ro pela espécie, como se for- formato: sic enim videretur masse nela primeiro a palavra e extendi quasi in rectum, et sic a própria [alma] seria informa- per actum rectum formaretur da pela palavra que nela se verbum; sed in se specie formou: assim, pois, pareceria prima formata, eo quod desdobrar-se como em operação
  • 28. 28 | I v a n a l d o S a n t o s ( O r g . ) formata est, actu gignitur direta, e assim, pelo ato direto, verbum, et non in aliquo sui se formaria a palavra; mas, a nudo. Unde videtur haec partir da primeira espécie, nela gignitio simillima reflexae. formada, que nela é formada, e Sed sciendum est, quod cum a palavra é gerada em ato, e não reflexio fiat redeundo super a partir de alguma coisa sua idem, hic autem non sit reditio desprovida [de espécie]. Daí super speciem, nec super que esta geração parece asse- intellectum formatum specie, melhar-se à reflexão. Mas deve- quia non percipiuntur quando se saber que, com a reflexão, o verbum formatur; gignitio intelecto volta-se sobre si verbi non est reflexa. mesmo, mas não se trata aqui de um voltar-se sobre a espécie, nem sobre a espécie formada pelo intelecto, porque não se perceberia quando a palavra se formaria; a geração da palavra não é um [ato de] reflexão. Non enim generatur Ora, a palavra mesma não é verbum ipsum per actum gerada pelo ato do intelecto, intellectus, nec eius nem sua similitude, nem mesmo similitudo, nec etiam a similitude daquela espécie similitudo illius speciei qua pela qual o intelecto foi infor- intellectus informatur, quasi mado, como se a palavra fosse a verbum esset eius sua expressão, mas [a palavra é expressivum, sed similitudo uma] similitude da coisa. Na rei. Illius enim similitudo verdade, a sua similitude é ge- generatur quod in sua rada na medida em que em sua similitudine cognoscitur. Est semelhança é conhecida. Não tamen ipsum verbum obstante, a própria palavra é similitudo illius speciei similitude daquela espécie, na tanquam eius quo factum est medida em que é produzida [na et est sibi simillimum. alma] e [isso] lhe resulta seme- Similitudo vero rei est ut ad lhante. De fato, diz-se que é quod formatur, et tanquam ad similitude da coisa enquanto é eius exemplar. formada por ela e é seu exem- plar. Nec propter hoc oportet Não é necessário, por causa
  • 29. L i n g u a g e m e e p i s t e m o l o g i a e m T o m á s d e A q u i n o | 29 ipsum formantem prius rem disso, que a palavra fosse intueri, et post ad eam verbum formada previamente à intuição seu imaginem ipsam in se da coisa, e depois se formasse formare: quia habere speciem nela a palavra ou a prórpia rei apud se, est sibi loco imagem: pois, possuir a espécie aspectus exemplaris. Artifices da coisa em si, é para si a posse namque, intuentes sua de um modelo e de um exem- exemplaria, nihil aliud plar. Assim, pois, os artistas, acquirunt nisi ipsas species intuindo os seus exemplares, exemplarium. Haec autem não fazem outra coisa senão species quam habet adquirirem as próprias espécies intellectus, advenit sibi a re dos exemplares. Mas esta quam ipse non est intuitus, espécie que o intelecto tem lhe sed sensus. Et quia est rei advém da coisa, que ela mesma similitudo, est principium não intuiu, mas sentiu. E generationis huius. Unde in porque é similitude da coisa, é o intellectu potest esse generatio seu princípio de geração. Daí per rectum, cum nihil eius que no intelecto pode haver generetur. geração por ato direto, enquan- to nada é gerado dela mesma. Directe igitur a specie ipsa Portanto, se passa direta- itur in ipsum verbum, cum mente da própria espécie para a non percipitur eius subiectum, própria palavra, já que não se sed res cuius est prima conhece o seu sujeito, mas a similitudo. Huic etiam coisa que é a primeira simili- similitudini tanto intimius est tude. Contudo, tanto mais ínti- verbum, quanto perfectius ma é a palavra desta similitude, genitum est. Ideo verbum quanto mais perfeitamente será intelligentis intimum est gerada. Por isso, a palavra intel- principio intellecto, ex quo et igida é princípio íntimo ao specie fit unum; nec tamen intelecto, pelo que a espécie e o informatur subiectum simul [intelecto] se tornam um; nem diversis accidentibus eiusdem mesmo quando o sujeito é infor- speciei, quia impossibile est mado, ao mesmo tempo, por eamdem superficiem simul diversos acidentes, da mesma duabus albedinibus informari: espécie, porque é impossível hoc enim est impossibile, que na mesma superfície fossem quando utrumque accidens est informadas, ao mesmo tempo,
  • 30. 30 | I v a n a l d o S a n t o s ( O r g . ) in ratione eius quo aliquid duas brancuras: com efeito, isso fieri habet. é impossível, quando há ambos acidentes na sua natureza para que algo tenha de ser feito. Verbum autem est in quo Mas a palavra é aquilo pelo aliquid intelligitur, sicut lux in qual algo é entendido, como a qua videtur aliquid; species luz é aquilo pelo qual algo é autem est qua perficitur visto; mas a espécie é aquilo cognitio, sicut species coloris pelo qual o conhecimento é in visu exteriori; et foret aperfeiçoado, como as espécies simillimum si lux ex specie de cor são aquilo pelo qual as coloris generaretur, sicut ibi fit coisas exteriores são vistas; e verbum ex specie: exteriora seria mais semelhante, se a luz enim deficiunt a fosse gerada pela espécie, como repraesentatione interiorum. aí ocorre quando se produz a palavra pela espécie: ora, as representações exteriores fazem falta para as interiores. Et propter hoc licet E por causa disso, embora utrumque sit accidens, species ambos sejam acidentes, a espé- scilicet et verbum ex specie cie, isto é, a palavra, é gerada da genitum, quia utrumque est in espécie, porque ambas existem anima ut in subiecto; verbum na alma como em seu sujeito; tamen magis transit in não obstante, a palavra se torna similitudinem substantiae mais semelhante à substância quam species ipsa. Quia enim do que a própria espécie. Ora, intellectus nititur in porque o intelecto vem a quidditatem rei venire, ideo in inclinar-se à quididade da coisa, specie praedicta est virtus há, por isso, na referida espécie, quidditatis substantialis a capacidade da quididade spiritualiter per quam substancial tomada de modo quidditas spiritualiter intus espiritual, pela qual a quididade formatur, sicut in calore est é formada espiritualmente lá virtus formae ignis per quam dentro do intelecto, como no attingitur in generatione ad calor há a virtude da forma do formam substantialem ignis, fogo, pela qual se chega, pela ad quam accidens per se non geração, à forma substancial do attingeret: unde verbum, quod fogo, à qual o acidente, por si
  • 31. L i n g u a g e m e e p i s t e m o l o g i a e m T o m á s d e A q u i n o | 31 est ultimum quod potest fieri mesmo, não alcançaria: daí que intra per speciem, magis a palavra, que é o último que se accedit ad ipsam rem pode produzir no interior [do repraesentandam quam nuda intelecto] pela espécie, se apro- species rei. xima mais da própria realidade representada, do que a espécie abstraída da coisa. Quia igitur res intelligibilis Por isso, porque a coisa inte- eo ipso intelligitur quo ligível ela mesma é inteligida na intellectus formatur sua specie medida em que sua espécie é actu; prius natura est formada em ato pelo intelecto; informari quam intelligere, [o próprio da] natureza é sed non tempore: ideo videtur primeiro informar, que inteligir, verbum, quod sequitur mas isso não no tempo: por isso, speciem rei, similiter sequi parece que, do mesmo modo intelligere eius. Hoc autem que a palavra é obtida a partir non esset, si per speciem rei da espécie da coisa, simul- tenderet intellectus in ipsam taneamente é obtido o seu inte- rem ut in se, sicut visus videt ligir. Porém, isso não ocorreria colorem extra se existentem, et se o intelecto tendesse pela tunc formaret verbum in se de espécie da coisa à própria coisa re prius intellecta. Sed quia considerada em si mesma, como intellectus accipiens speciem a a visão vê a cor que existe fora re per sensus, non ducitur per de si, e, então, se formaria a ipsam in rem ut est in sui palavra nele antes que a coisa natura, sed ut in se est, quia fosse inteligida. Mas porque o ipse facit in se obiectum quod intelecto apreende a espécie da est in eo intellectum; obiectum coisa pelos sentidos, [o inte- autem naturaliter prius est lecto] não é conduzido pela actione potentiae circa própria [espécie] à coisa, como obiectum: ideo verbum quod existe na natureza [do objeto est intra ipsum intellectum, sensível], mas como ela existe prius est ipso intelligere ad nele mesmo, porque é o próprio ipsum terminato. Aliud enim intelecto que representa em si est hoc a quo accipitur species, mesmo o objeto que nele é inte- scilicet res ipsa, et aliud ad ligido; mas o objeto existe natu- quod terminatur actio ralmente antes da capacidade intellectus, scilicet similitudo do [intelecto] considerá-lo: por
  • 32. 32 | I v a n a l d o S a n t o s ( O r g . ) rei formata ab intellectu. isso, a palavra que é formada internamente no próprio inte- lecto, é anterior ao próprio inte- ligir e ao próprio término. Com efeito, uma coisa é aquilo pelo qual é tomada a espécie, ou seja, a coisa mesma, e outra é aquilo em que se finaliza a ação do intelecto, ou seja, a similitude da coisa formada pelo intelecto. Ex dictis manifestum est Do exposto, fica claro o modo quomodo attenditur prioritas como se entende a prioridade unius eorum ad alterum. de um deles sobre os outros. Prius enim natura est Com efeito, primeiro a natu- intellectus informatus specie, reza do intelecto é informada quae est primum sufficiens pela espécie, que é princípio intelligendi, quam gignatur suficiente do inteligir, pelo qual verbum: et ideo intelligere in se gera a palavra: e, por isso, o radice prius est verbo, et inteligir no início é prévio à verbum est terminus actionis palavra, e a palavra é o término intellectus. Sed quia obiectum da ação do intelecto. Mas não se non habetur nisi in verbo, ut possui o objeto, senão na pala- dictum est; obiectum autem vra, como foi dito; porém, o prius est quam quaelibet actio objeto é prévio à qualquer ação ad eum terminata, ideo por ele determinada, por isso, a verbum prius est quam palavra é anterior ao inteligir. E intelligere. Et hoc totum ideo isso tudo acontece por isso, a contingit, quia non terminatur saber, a ação do intelecto não actio intellectus ad rem extra, termina na coisa externa, da a qua acquirit speciem ut in se qual adquire a espécie tal como est. Si enim species nata esset ela é em si. Ora, se a espécie ducere intellectum ad rem ut tivesse por natureza a capa- in se est, ut species coloris cidade de conduzir o intelecto à ducit in colorem, omnibus coisa, tal como é em si, como a modis praecederet intelligere espécie da cor conduz à cor, de verbum. qualquer modo, o inteligir pre- cederia à palavra. Unde manifestum est quod Disso se evidencia que a
  • 33. L i n g u a g e m e e p i s t e m o l o g i a e m T o m á s d e A q u i n o | 33 verbum non est quod sequitur palavra não é o que se segue intellectum immediate post imediatamente ao intelecto de- rationem intellectus: sic enim pois da consideração do inte- simpliciter praecederet lecto: ora, [se fosse] assim, a verbum actum intellectus, qui palavra precederia, de modo est intelligere; sed verbum absoluto, ao ato do intelecto, sequitur immediate que é o inteligir; mas, a palavra intellectum in actu per imediatamente segue o intelecto speciem, a qua procedit em ato, pela espécie, da qual verbum ut actus ex actu, et procede a palavra enquanto em non ut actus ex potentia. Unde ato pelo ato, e não enquanto em verbum posterius est actu ato pela potência. Daí que a intelligendi a parte intellectus; palavra é posterior ao ato de et sic verbum sequitur ad inteligir por parte do intelecto; intelligere non in se, sed in sua e, assim, segue-se à palavra o radice, ut dictum est. inteligir, não em si, mas em sua raiz, como foi dito. Si vero intellectus a verbo Na verdade, se o intelecto acciperet speciem prius quam tomasse a palavra da espécie intelligeret ipsum verbum, et antes de inteligir a própria rem in verbo, impossibile foret palavra e a coisa na palavra, per illud intelligere, vel seria impossível inteligir deste verbum formare per eius modo, e a palavra seria formada principium, sicut impossibile por seu princípio, como tam- est intellectum facere rem bém seria impossível que o inte- extra, a qua speciem trahit. lecto produzisse a coisa externa, da qual toma a espécie. Ex dictis facile est scire Do exposto é fácil saber como quare intellectus non dicit se, o intelecto não diz a si, quando quando format verbum forma a palavra conforme a secundum rem. coisa. Anima enim quasi Ora, a alma é como que transformata est in rem per transformada na natureza pela speciem, qua agit quidquid espécie, enquanto faz o que faz; agit; unde cum ea informatus donde, sendo ela informada em est actu, verbum producit, in ato, produz a palavra, pela qual quo rem illam dicit cuius significa aquela coisa da qual se speciem habet, et non se. Cum teve a espécie, e não a si mesma.
  • 34. 34 | I v a n a l d o S a n t o s ( O r g . ) vero nititur se apprehendere, [A alma] inclina-se efetivamente quia non est cognoscibilis, nisi para entender-se, porque ela sicut alia per speciem aliorum, não é cognoscível somente tal quia non indiget specie ut como os outros são pela espécie intelligat (hoc enim potest de de outros, pois não necessita de se), non habet in se, ut espécie para conhecer (de fato, intelligens est, speciem qua isso ela o tem em si), não tendo formetur verbum sui, sed em si mesma, para inteligir, a accipit a se intelligibilem espécie pela qual se formaria a speciem non sui, sed rei qua sua palavra, mas toma para si a necessario informatur ut espécie inteligível, não dela intelligatur, ut dictum est. mesma, mas da coisa pela qual, Cum igitur illa specie necessariamente, é informada informatur, statim se intelligit; para inteligir, como foi dito. et hoc est per reflexionem, Quando, pois, se informa aquela quia haec species prius est espécie, imediatamente compre- accepta a re quam a se ende-se; e isso é por reflexão, informata et intellecta. porque esta espécie é previa- mente tomada da coisa do que informada e inteligida em si. Nec oportet prius formare Nem é necessário que primei- verbum quam intelligere; sed ramente se formasse a palavra cum intellexerit, format que o inteligir; mas, quando verbum sui; et ideo intelligere intelige, forma a sua palavra; e, non tempore, sed natura por isso, não intelige no tempo, praecedere necesse est, cum se mas é necessário que seja prévia ipsum intelligit. Non enim à natureza, quando se intelige a cum se intelligit, facit totum si mesm. Ora, quando se inte- obiectum, sed aliquid circa lige, não produz todo o objeto, ipsum: induit enim se, et hoc mas algo acerca do mesmo: est verbum sui, cum se pois, volta-se sobre si mesma, e intelligit; non enim est aliud a isso é a sua palavra, quando se quo accipitur species, ab eo ad intelige; pois não é de outro que quod terminatur, sed idem. se toma a espécie, mediante a qual se determina [a palavra], mas dela mesma. Sed quia ista est species rei, Mas porque esta espécie é da et non genita de essentia coisa e não é gerada somente da
  • 35. L i n g u a g e m e e p i s t e m o l o g i a e m T o m á s d e A q u i n o | 35 nuda, formatum verbum de essência abstraída, se forma a anima per speciem rei non est palavra da alma pela espécie da purum verbum animae, sed coisa, não sendo [neste caso] rei dictae. Si vero nudatam ab pura palavra da alma, mas omni re se apprehenderet, et [palavra] dita da coisa. Com similitudinem sui in se efeito, se [a alma] se compren- gigneret, hoc eius verbum desse abstraindo-se de toda esset purum, nihil extraneum realidade, a sua similitude seria habens admixtum. gerada em si mesma; e, neste caso, a sua palavra seria pura, por não ter nada de exterior que se lhe mesclasse. Tale est verbum Dei, quod Tal é a Palavra de Deus, que é idem est in natura cum patre idêntica em natureza com a do dicente ipsum verbum. Pai, que diz a própria Palavra. Verbum tamen animae tali Contudo, se a palavra da alma modo se dicentis foret fosse expressa de tal modo, accidens, et pro tanto diversae seria um acidente e, portanto, naturae foret ab anima, cum seria de natureza diversa à da accidens sui foret, et a se et de alma, seria, pois um acidente se factum: ipsa enim seu, por si e em si produzido: substantiam facere non potest. ora, a alma não poderia pro- Deus autem nihil diversitatis duzir a substância. Mas não há in sua natura habet; ideo nenhuma diversidade na natu- verbum suum Deus, virtus et reza de Deus; por isso, Sua Pa- substantia vera est. lavra é verdadeiramente, Virtu- de e Substância de Deus. Deus autem quia omnia Mas porque Deus por uma unico intuitu videt, uno verbo única intuição vê todas as coi- omnia dicit; nos vero multa sas, uma única palavra Sua diz verba habemus propter todas as coisas; mas nós neces- impotentiam intellectus nostri sitamos ter muitas palavras, por in intelligendo. Et horum causa da impotência do nosso quaedam oriuntur ex aliis, intelecto ao inteligir. E algumas sicut verbum conclusionis ex destas [palavras] originam-se de principiis; quaedam vero non, outras [palavras], como a sicut in rebus quae non habent palavra conclusiva extraída de connexionem ad invicem, ut princípios; outras [palavras]
  • 36. 36 | I v a n a l d o S a n t o s ( O r g . ) patet de lapide et ligno; efetivamente não, como nas quaedam statim offeruntur coisas que não têm conexões intelligenti, quaedam non; umas com as outras, como se quaedam etiam cum maiori, evidenciam nas [palavras] para quaedam cum breviori pedra e para madeira; algumas discursu. Ideo verba nostra são imediatamente apresen- quaedam plus, quaedam tadas ao intelecto, outras não; minus habent de cognitione, et algumas também são oferecidas quaedam citius et quaedam mediante um discurso um tanto tardius formantur, sicut scire longo, outras, mediante um quarumdam conclusionum discurso um tanto breve. E, por tardius et difficilius, isso, algumas de nossas pala- quarumdam vero facilius et vras oferecem mais e outras citius acquiritur. Et haec de menos conhecimentos e, al- verbo dicta sufficiant. gumas, são formadas mais ime- diatamente e, outras, menos imediatamente, como entender algumas conclusões nos são menos imediatas e mais difíceis e outras nos são efetivamente mais fáceis e mais imediatas. E são suficientes dizer estas coisas sobre a palavra.
  • 37. L i n g u a g e m e e p i s t e m o l o g i a e m T o m á s d e A q u i n o | 37 O negativo na epistemologia de Tomás de Aquino e as rationes necessariae de Anselmo Jean Lauand Introdução Neste estudo, examinaremos alguns aspectos da proposta de Teologia como ciência, em Tomás de Aquino (1225-1274) em contraste com as “rationes necessariae” ansel- mianas, particularmente no caso da Teologia da Redenção. Esse confronto será contextualizado pelo quadro geral do pensamento de Tomás, particularmente no que se refere ao conhecimento e à theologia negativa. Uma questão fundamental - que cedo ou tarde acaba surgindo – para as grandes religiões é como lidar com a reflexão racional: definir o papel que se estabelece para a razão face à fé. Essa questão é uma das constantes, na Idade Média, e encontra ampla gama de respostas, aliás, muito se- melhantes, no cristianismo, no judaísmo e no Islã: da rejeição da pura razão ao acolhimento; da suspeita à confiança. Claro que o papel dado à filosofia e à razão, numa determinada concepção de religião, depende da particular visão que se tenha do papel que o próprio Deus desempenha nessa concepção e também do papel reservado ao homem e à inteligência deste. A escolástica Para além da semelhança dessa gama de posicio- namentos para com as religiões monoteístas, o problemático
  • 38. 38 | I v a n a l d o S a n t o s ( O r g . ) conteúdo da fé do cristianismo (pense-se, por exemplo, na Trindade, na Encarnação ou na Redenção) exigirá aprofun- damentos para que se estabeleçam as diversas posições de relacionamento entre fé e razão. Entre os significados contidos na multidimensional palavra “Escolástica” (PIEPER, 1973, p. 42-43), destaca-se um, que faz Boécio ser considerado, por um Grabmann, “o primeiro escolástico” e seus escritos, “as primícias do método escolas- tico”: um radicalismo sem precedentes na afirmação da razão, que - a seu modo - estará presente também em Anselmo, 500 anos depois1. O De Trinitate de Boécio traz esse “racionalismo”. Já o título desse seu opúsculo (Como a Trindade é um único Deus e não três deuses) expressa o propósito de esclarecer racional- mente a verdade de fé. Certamente, isso não é algo de novo; Agostinho e outros tinham escrito textos com o mesmo intuito. Aliás, Agostinho (1994) havia afirmado a necessi- dade de cooperação entre fé e razão (Sermones, CCL 0284, sermo 43, Sl 41, 182): intellige ut credas, crede ut intelligas, "entende a fim de que creias", "crê a fim de que entendas"2. Para Boécio, o lema era: fidem, si poteris, rationemque cojunge, "conjuga a fé e a razão"!, conselho com que encerra a carta ao Papa João I. À primeira vista, nada de novo. A novidade, porém, está em que esse propósito tenha sido assumido explicita- mente, programaticamente: aquilo que antes podia ser 1A audiência de Bento XVI (2009), de 23-09, foi dedicada a Anselmo e o Papa o qualificou de “fundador da teologia escolástica”. Não é de estranhar que, sendo a Escolástica uma tarefa racional, os que acentuam extremadamente a razão – Boécio ou Anselmo – sejam considerados seus fundadores. 2Já Bento XVI (2009) recorda a versão anselmiana dessa fórmula “não procuro compreender para crer, mas creio para compreender".
  • 39. L i n g u a g e m e e p i s t e m o l o g i a e m T o m á s d e A q u i n o | 39 unicamente uma atitude fática tornava-se agora um princí- pio. Nova é também a radicalidade do projeto. No seu De Trinitate, encontram-se várias concepções platônicas e neo- platônicas; as dez categorias, os gêneros, as espécies e diversos outros conceitos de Aristóteles; todo tipo de análi- ses filosóficas e de linguagem. Mas não há sequer uma única citação ou referência à Bíblia, e isso num tratado teológico sobre a Santíssima Trindade! Como diz Pieper (1973) (e este trabalho apoia-se em boa medida no “Scholastik”), a Escolástica traz consigo o perigo – “fundacional” de Boécio – da supervalorização da razão, que vai encontrar em Anselmo um expoente original, ao pretender, com suas “rationes necessariae”, deduzir todas as razões da redenção. Se um Tomás de Aquino e os grandes teólogos medievais conseguiram superar essa ameaça e fazer uma teologia equilibrada (o que talvez requeresse o prece- dente radical anselmiano...) foi graças a um notável corre- tivo desse racionalismo. O corretivo do racionalismo: Pseudo-Dionísio Areopagita Na mesma época em que Boécio escreve seu De Trinitate, surgem no Oriente uns livros – Sobre os nomes de Deus; Sobre a hierarquia celeste; Sobre a hierarquia eclesiástica; Sobre a teologia mística – cujo autor declara ser Dionísio do Areópago (cf. At. 17, 34), discípulo de São Paulo, o apóstolo. Por mais inverossímil que fosse essa declaração, o fato é que enganou a Idade Média, que julgou Dionísio um grande santo, inspirado pelo Espírito Santo. Pseudo-Dionísio exer- ceu enorme influência nos teólogos medievais: Tomás de Aquino deve a ele sua philosophia negativa e sua theologia negativa:
  • 40. 40 | I v a n a l d o S a n t o s ( O r g . ) Tomás de Aquino formulou os princípios de uma philosophia negativa e também de uma theologia negativa. […] o fato de a discussão sobre Deus da Summa Theologica começar com a sentença: "Não podemos saber o que Deus é, mas sim, o que Ele não é". (...) e o pensamento, expresso por Tomás em seu comentário ao De Trinitate de Boécio: o de que há três graus do conhecimento humano de Deus. Deles, o mais fraco é o que reconhece Deus na obra da cria- ção; o segundo é o que O reconhece refletido nos seres espirituais e o estágio superior reconhece-O como o Desconhecido: tamquam ignotum! E aquela sentença das Quaestiones disputatae: "Este é o máximo grau de conheci- mento humano de Deus: saber que não O conhecemos". (PIEPER, 2000). A theologia negativa está bem consciente de que, quando nosso discurso se volta para Deus, nossa linguagem mostra- se ainda mais inadequada. Sim, por analogia com as criaturas, diremos que Deus é justo, que Ele é bom, eterno etc. Mas, há diversos problemas de insuficiência de língua- gem quando predicamos de Deus. Por exemplo, qualidades, que são separadamente nas criaturas, teriam que ser unifica- das na “essência” de Deus. E é unicamente sobre nosso âmbito de experiências, sobre nosso conceito de tempo que falamos em “justo”, “eterno” ou “bom”. Sim, não é descabido dizer que Deus é justo. Mas nosso conceito de justiça procede do único mundo de experiências que nos é acessível; e nele “o justo” manifesta seu dever para com o outro, com o qual tem uma pen- dência: precisamente nisto consiste a justiça. Mas, pertence à essência de Deus não ser devedor de ninguém. Então tem sentido dizer
  • 41. L i n g u a g e m e e p i s t e m o l o g i a e m T o m á s d e A q u i n o | 41 que “a justiça” de Deus é necessariamente tão diferente, que não pode se chamar “justiça” em sentido estrito. (PIEPER, 1973, p. 62). Certamente, estes aspectos “negativos” não são os que os epígonos de Tomás destacam; na verdade, os “tomistas” costumam ocultá-los; mas são essencialíssimos e o tributo fundamental de Tomás a Pseudo-Dionísio. O caráter nega- tivo da filosofia de Tomás é o que torna problemático a própria ideia de um “tomismo”, em sentido estrito: como enfiar em um “ismo”, em uma filosofia de manuais com resposta para tudo...? Diz Pieper sobre a negatividade e a impossibilidade de um tomismo3: E, quanto ao elemento negativo da philosophia de Tomás, encontramos aquela sentença sobre o filósofo, cuja aplicação ao conhecimento não é capaz sequer de esgotar a essência de uma única mosca. Sentença que, embora esteja escrita em tom quase coloquial, num comentário ao Symbolum Apostolicum, guarda uma relação muito íntima com diversas outras afirmações semelhantes. Algumas delas 3 Junto com a negatividade, Pieper vê a impossibilidade de um “tomismo” por conta também da extraordinária abertura de pensamento de Tomás: "Não pode haver um 'tomismo' porque a grandiosa afirmação que representa a obra de S. Tomás é grande demais para isso [...]. S. Tomás nega-se a escolher algo; empreende o imponente projeto de 'escolher' tudo [...]. A grandeza e a atualidade de Tomás consistem precisamente em que não se lhe pode aplicar um 'ismo', isto é, não pode haver propriamente um 'tomismo' ('propriamente', isto é: não pode haver enquanto se entenda por 'tomismo' uma especial direção doutrinária caracterizada por asserções e determinações polêmicas, um sistema escolar transmissível de princípios doutrinais)" (PIEPER, 1981, p. 27).
  • 42. 42 | I v a n a l d o S a n t o s ( O r g . ) são espantosamente "negativas" como, por exemplo a seguinte: Rerum essentiae sunt nobis ignotae; "as essências das coisas nos são des- conhecidas". E esta formulação não é, de modo algum, tão incomum e extraordinária, quanto poderia parecer à primeira vista. Seria facil- mente possível equipará-la (a partir da Summa Theologica, da Summa contra Gentes, dos Comentários a Aristóteles, das Quaestiones disputatae) a uma dúzia de frases semelhantes: Principia essentialia rerum sunt nobis ignota; formae substantiales per se ipsas sunt ignotae; differentiae essentiales sunt nobis ignotae. Todas elas afirmam que os "princípios da essência", as "formas substanciais", as "diferenças essenciais" das coisas, não são conhecidas. (PIEPER, 2000). Tomás cita cerca de 2.000 vezes Dionísio; Anselmo o ignora (menciona-o uma única vez e não para endossar seu pensamento). Esses dados guardam profunda relação com as concepções de Teologia: Anselmo carece do corretivo dioni- siano e se aproxima de um racionalismo, embora, técnica- mente, não se possa aplicar sem mais esse qualificativo a seu pensamento, marcado pela fé, que pressupõe o “dado” da fé. Dois ilustres medievalistas assim ressalvam: Naturalmente, um teólogo como Anselmo não pode jamais cair na aceitação formal da tese de que não há nada que supere a capacidade cognoscitiva da ratio humana. Não obstante, não causa a mínima estranheza que seu pensamento se aproxime continuamente de um tal racionalismo. (PIEPER, 1973, p. 68). Anselmo trata ex professo das relações entre fé e razão, resumindo-as na fórmula:
  • 43. L i n g u a g e m e e p i s t e m o l o g i a e m T o m á s d e A q u i n o | 43 Credo ut intelligam, de inspiração nitidamente augustiniana. Segundo ele, devemos come- çar por acreditar na existência de Deus, na Trindade e em todas as verdades da revela- ção cristã. Depois, a nossa razão poderá justi- ficar todas essas verdades "rationibus necessa- riis", por motivos decisivos e necessários e não - como diria Tomás de Aquino - por motivos apenas prováveis e sem valor de- monstrativo. Segundo Anselmo, a fé ensina que assim é; a razão confirma mostrando porque assim deve ser. A racionalização da fé, proposta por Anselmo, não podia degenerar logicamente em racionalismo, pois, a razão, neste sistema, não pode discrepar da fé, uma vez que o conhecimento racional é concebido - conforme Plotino e Agostinho - como fruto da iluminação natural por parte de Deus e este naturalmente não pode contrariar a fé, que é resultado da revelação, sobrenatural, divina. Mas [...] a posição anselmiana levava a tolher o mérito da fé e a justificar de antemão as recriminações de Gregório IX contra o uso da demonstração em teologia. (VAN ACKER, 1983, p. 13). “Atenuantes” à parte, Pieper (1973, p. 78) também observa: [Há em Anselmo] uma observação suspeita que diz que à argumentação que se segue não se deve exigir mais certeza “de que a que possa minha opinião supor provi- soriamente [interim] enquanto Deus não me revele coisa melhor”. Esta observação é enga- nosa porque só aparentemente constitui um abrandamento; o que, na realidade, se diz é que a ratio não capitula perante o mistério,