Unidade 1 a construção histórica do conceito de transversalidade
Monografia versão finalíssima
1. 1
UNIVERSIDADE DO ESTADO DA BAHIA – UNEB
DEPARTAMENTO DE EDUCAÇÃO – CAMPUS I
CURSO – PEDAGOGIA
Elvys Tierney Santos Marinho
A MEDIAÇÃO DE CONFLITOS NA ESCOLA PELO GESTOR
EDCUACIONAL COMO ALTERNATIVA DE COMBATE À VIOLENCIA
ESCOLAR
Salvador
2011
2. 2
ELVYS TIERNEY SANTOS MARINHO
A MEDIAÇÃO DE CONFLITOS NA ESCOLA PELO GESTOR
EDUCACIONAL COMO ALTERNATIVA DE COMBATE À VIOLENCIA
ESCOLAR
Monografia apresentada como
requisito parcial para avaliação da
disciplina Orientação de TCC II, da
Graduação em Pedagogia do
Departamento de Educação da
Universidade do Estado da Bahia,
sob a orientação do Prof. Dr.
Luciano Costa Santos.
Salvador
2011
3. 3
FICHA CATALOGRÁFICA : Sistema de Bibliotecas da UNEB
Marinho, Elvys Tierney Santos
A mediação de conflitos na escola pelo gestor educacional como alternativa de combate à
violência escolar / Elvys Tierney Santos Marinho . – Salvador, 2011.
52f.
Orientador: Prof. Luciano Costa Santos.
Trabalho de Conclusão de Curso (Graduação) – Universidade do Estado da Bahia.
Departamento Educação. Campus I. 2011.
Contém referências.
1. Violência escolar. 2. Violência na escola - Brasil. 3. Conflito - Administração. 4.
Mediação. I. Santos, Luciano Costa. II. Universidade do Estado da Bahia, Departamento de
Ciências Humanas.
CDD: 371.78
4. 4
ELVYS TIERNEY SANTOS MARINHO
A MEDIAÇÃO DE CONFLITOS NA ESCOLA PELO GESTOR
EDUCACIONAL COMO ALTERNATIVA DE COMBATE À VIOLENCIA
ESCOLAR
Monografia apresentada como requisito
parcial para avaliação da disciplina
Orientação de TCC II, da Graduação em
Pedagogia do Departamento de Educação
da Universidade do Estado da Bahia, sob
a orientação do Prof. Dr. Luciano Costa
Santos.
Salvador____ de________________de 2011
____________________________________________
Prof. Dr. Luciano Costa Santos (Orientador)
Universidade do Estado da Bahia - UNEB
__________________________________________________________
___________________________________________________________________
Salvador
2011
5. 5
AGRADECIMENTOS
A Deus, meu Senhor, que é soberano e somente por sua vontade estou concluindo
este curso.
Ao professor Luciano Costa Santos, pela orientação concedida, pelo compromisso e
dedicação, alguém que admiro e respeito.
Aos demais professores e professoras da Graduação, pelo compromisso com a
Universidade e com este curso.
Sou, também, muito grato a todos os meus colegas da Graduação, pela força e
companheirismo; com eles dividi êxitos e dificuldades e hoje os vejo como amigos.
À minha esposa, pelo companheirismo e por ter me apoiado e contribuído para a
construção desta pesquisa.
Aos meus pais e irmãos, pelo apoio, incentivo e subsidio fornecidos durante toda a
Graduação.
À Igreja de Cristo, pelas orações e incentivo.
Enfim, a todos aqueles que não citei o nome, mas que, de alguma forma, tiveram
alguma participação na concretização desta etapa da minha vida.
Muito obrigado a todos!
6. 6
“Os que forem sábios, pois, resplandecerão como o fulgor do firmamento; e os que a
muitos ensinam a justiça, como as estrelas sempre e eternamente.” Dn12:3.
7. 7
RESUMO
Um dos eventos mais problemáticos que ocorre nas escolas atualmente é o da
violência escolar. Uma das causas principais da ocorrência da violência escolar é a
má administração dos conflitos escolares, os quais não são necessariamente
negativos e prejudiciais aos componentes humanos da escola. Assim, esta pesquisa
bibliográfica busca mostrar quais as vantagens da mediação de conflitos escolares
pelo gestor educacional como alternativa de combate à violência escolar. A partir
desta análise, percebe-se a importância da mediação como instrumento de
administração de conflitos, uma vez que a mediação de conflitos possibilita
transformar os mesmos conflitos em possibilidades de aperfeiçoamento, afinamento,
crescimento, maturação, etc. das relações escolares, como também das próprias
práticas educativas propriamente ditas. Nesta pesquisa, foram utilizados teóricos
voltados ao estudo da mediação de conflitos escolares, tais como: Álvaro Chrispino
(2007); Maria Jose Lobato de Azevedo; Ortega (2002); e teóricos voltados ao campo
da Gestão Educacional, como por exemplo: José Carlos Libâneo (2004).
1. Mediação 2. Conflito 3. Violência 4. Escola.
8. 8
ABSTRACT
Of the events more problematic that occurs in schools currently is the school
violence. Among the main causes of the occurrence of school violence is the
mismanagement of conflicts schoolchildren, which are not necessarily negative and
harmful to human components of the school. Thus, this bibliographical research
seeks to show the advantages of mediation by school educational manager as an
alternative to combat school violence. From this analysis, perceives-if the importance
of mediation as an instrument for the administration of conflicts, since the mediation
of conflicts allows transform the same conflicts in possibilities of improvement,
afinamento, growth, maturation, etc. for school relations, as well as the own
educational practices themselves. In this study, were used theoretical directed to the
study of mediation schoolchildren, such as: Alvaro Chrispino (2007); Maria Jose
Lobato de Azevedo; Ortega (2002); and theoretical directed to the field of
Educational management, such as: Jose Carlos Libâneo (2004).
1. Mediation 2. Conflict 3. Violence 4. School.
9. 9
SUMÁRIO
1 INTRODUÇÃO ..........................................................................10
2 O QUE É CONFLITO? ..............................................................12
2.1 DIMENSÃO ANTROPOLÓGICA E POSITIVA DO CONFLITO ....12
2.2 O CONFLITO EM ÂMBITO EDUCACIONAL ......................................18
3 MEDIAÇÃO ...............................................................................23
3.1 MEDIAÇÃO EM ÂMBITO EDUCACIONAL ..................................23
3.2 MEDIAÇÃO DE CONFLITOS ..............................................................27
3.2.1 Imparcialidade .................................................................................27
3.2.2 Escuta Ativa ....................................................................................29
3.2.3 Diálogo ..............................................................................31
4 GESTÃO EDUCACIONAL .......................................................32
4.1 O QUE É A ESCOLA? .......................................................................32
4.2 QUAL O PAPEL DO GESTOR EDUCACIONAL? ............................36
5 A MEDIAÇÃO DE CONFLITOS NA ESCOLA E O COMBATE À
VIOLÊNCIA ESCOLAR ...............................................................41
5.1 VIOLÊNCIA ESCOLAR .....................................................................41
5.2 A MEDIAÇÃO DE CONFLITOS ESCOLARES .............................44
6 CONCLUSÃO ..........................................................................50
REFERÊNCIAS ........................................................................52
10. 10
1 INTRODUÇÃO
As escolas da atualidade têm se deparado com inúmeros casos de violência
ocorridos dentro de seu seio. São violências de diversos tipos e naturezas, tais
como: violência sexual, moral, psicológica, bullying (comportamento intencional e
repetido cujo objetivo é prejudicar e irritar o outro), física, praticadas principalmente
entre alunos e alunos e entre alunos e professores.
Diante desta grave situação em que se encontra a escola brasileira, torna-se
necessário estudar e descobrir quais ou qual o meio mais eficaz para solucionar ou,
no mínimo, amenizar os eventos violentos praticados dentro da escola, seja qual for
a natureza ou o tipo desta violência.
Neste estudo bibliográfico, discute-se qual a relevância da mediação de
conflitos na escola pelo gestor educacional como alternativa de combate à referida
violência escolar, tendo sido utilizados teóricos tais como: Álvaro Chrispino (2007);
Maria Jose Lobato de Azevedo; Ortega (2002), os quais são pesquisadores do tema
“Mediação de Conflitos Escolares”; e teóricos, outros, voltados ao campo da gestão
educacional, como por exemplo: José Carlos Libâneo (2004).
A visão e concepção de conflito da maioria das pessoas comuns, lideres e
instituições é reduzida a algo negativo e prejudicial ao ambiente de convívio e
trabalho, ou seja, os mesmos enxergam, na maioria das vezes, o conflito como algo
a ser evitado, uma vez que compreendem que o referido conflito é, unicamente, uma
situação de deterioração das relações e atividades de determinadas instituições.
Porém, esta concepção, segundo determinados autores e teóricos, não está correta.
O conflito, no entendimento de certos pesquisadores do assunto, é uma
possibilidade de aperfeiçoamento e amadurecimento das relações e atividades de
uma instituição. Assim, o entendimento de que toda relação conflituosa consiste em
uma relação de violência não é mais cabível, pois, na verdade, o conflito, quando
não corretamente administrado, pode desembocar em ações violentas, não sendo o
conflito, em si mesmo, uma situação de violência.
Diante deste cenário educacional brasileiro de má administração de conflito
que, desemboca em violência escolar, a mediação e a gestão dos embates
11. 11
conflituosos pode ser de suma importância. Assim, no decorrer do texto desta
monografia, será analisada qual a eficiência da mediação dos conflitos ocorrentes na
escola como instrumento de combate à violência escolar, a partir do estudo das
aparentes vantagens ou desvantagens que a ação de mediar tráz em seu
arcabouço.
No primeiro capitulo do desenvolvimento deste texto será estudado o que é
conflito, a partir de uma análise filosófica e antropológica e, ainda, será tratado, em
sentido mais restrito, quais os conflitos mais frequentes no seio escolar. No segundo
capitulo será analisado, à luz de uma pesquisa bibliográfica, o que é mediação,
principalmente em contexto escolar. No terceiro capitulo do texto que se segue,
estuda-se o que é escola e quais as funções centrais do gestor educacional, uma
vez que, nesta monografia, se discute como o gestor educacional pode se utilizar da
mediação para combater o advento da violência em sua escola. Por fim, no quarto
capitulo, estuda-se o que é violência, centrando-se principalmente na violência
escolar, e analisa-se como a mediação de conflito pode, então, combater esta
referida violência na escola.
12. 12
2 O QUE É CONFLITO?
2.1 DIMENSÃO ANTROPOLÓGICA E POSITIVA DO CONFLITO
O conflito é algo inerente ao ser humano. Assim, toda pessoa viva se
deparará com situações conflituosas. Segundo o Dicionário Brasileiro Globo, do qual
consultamos as definições de termos e conceitos relacionados ao tema desta
monografia, conflito é: “embate de pessoas que lutam; altercação, pendência;
choque: conflitos de interesses; briga; luta; disputa; antagonismo; conjuntura; pleito.
(Do latim conflictu). Assim, conflito é todo choque, antagonismo, disputa etc. entre
dois ou mais elementos. Relacionando o conflito ao ser humano, que é o foco deste
trabalho, pode-se defini-lo como toda e qualquer divergência evoluída em confronto
ou choque entre duas ou mais pessoas, ocorrido geralmente devido a modos
diferentes de enxergar, entender e interpretar a realidade e os acontecimentos.
“Conflito é toda opinião divergente ou maneira diferente de ver ou interpretar algum
acontecimento.” (CHRISPINO, Álvaro, 2007, p. 15).
Todo ser humano se deparará com o conflito, principalmente aquele que vive
em agrupamento e/ou família. Em seu artigo Gestão do conflito escolar: da
classificação dos conflitos aos modelos de mediação, Àlvaro Chrispino traz algumas
classificações de conflitos relacionados a pessoas. Dentre essas classificações,
podemos citar os conflitos intrapessoais (ocorridos no campo interno ou interior do
homem) e os conflitos interpessoais (ocorridos no campo externo ou exterior ao
homem). Os conflitos intrapessoais são aqueles que não são causados por outro
individuo, mas, são questões internas e pessoais do sujeito, por exemplo: ir/não ir,
fazer/não fazer, falar/não falar, comprar/não comprar, vender/não vender, casar/não
casar etc.; e os conflitos interpessoais são aqueles oriundos do relacionamento de
uma pessoa com outra. Os conflitos interpessoais se desdobram em vários campos,
tais como: relacionamento conjugal, familiar, amizade, relacionamentos entre
professores e alunos, coordenadores e professores e outros. Outra autora, cujo
nome é Maria José Lobato Azevedo, também nos traz, segundo sua concepção,
uma definição plausível de conflito. Ela diz:
No decorrer de sua obra, Álvaro Chrispino descreve mais precisamente o que é conflito a partir da descrição de sua origem:
“De outra forma, é dizer ao jovem e à criança que suas diferenças podem transformar-se em antagonismos e que, se
estes não forem entendidos, evoluem para o conflito, que deságua na violência.” (CHRISPINO, 2007, p. 23).
13. 13
Quando foi solicitada uma definição de conflito, defini conflito como
sendo uma situação que revela desentendimento, confronto de
opiniões, entre duas ou mais pessoas, situação essa que não tem de
ser necessariamente negativa. (AZEVEDO, Maria José Lobato, p. 3).
Desde os tempos antigos, a humanidade tem se deparado com conflitos.
Como já foi anteriormente afirmado, só o fato de o homem estar vivo e,
principalmente, viver em família e sociedade, o leva a enfrentar embates, confrontos,
divergências etc.. Ainda, inúmeras são as causas dos conflitos entre os indivíduos e,
dentre essas causas, poder-se-iam citar aquelas advindas da necessidade de
sobrevivência, autodefesa e domínio por parte do homem, assim como acontece
com os animais irracionais, segundo a perspectiva darwiniana. Porém, outro
determinante para o nascimento de conflitos entre as pessoas é a capacidade
pensante do homem, ou seja, a sua capacidade de pensar, refletir, questionar,
duvidar, negar, comparar, descobrir e construir conhecimento, e neste âmbito, o ser
humano se difere dos animais irracionais, pois só os seres humanos constroem
conhecimento. Desta maneira, a capacidade pensante do homem possibilita
naturalmente o surgimento de conflitos (uma vez que irá questionar, duvidar, refletir,
comparar, descobrir etc.) assim como a sua necessidade de sobrevivência,
autodefesa e domínio das coisas e seres, semelhantemente aos animais.
Karl Marx, teórico que tratou dos campos da economia, sociedade e politica
demonstra, através de suas reflexões e obras que, na vida em sociedade, luta,
embate e conflitos são inevitáveis. Estes conflitos ocorridos na sociedade, em
especial, na sociedade capitalista, ele chama de luta de classes. Em sua obra
Manifesto Comunista, Karl Marx assinala que a luta e o confronto fazem parte
inerente do sistema social. Segundo Karl Marx, viver em sociedade é viver
cotidianamente uma luta de classes.
A história de toda sociedade até nossos dias é a historia da luta de
classes. Homem livre e escravo, patrício e plebeu, barão e servo,
mestre de oficio e companheiro, numa palavra, opressores e
oprimidos, se encontram sempre em constante oposição, travando
uma luta sem trégua, ora disfarçada, ora aberta, que terminava por
uma transformação revolucionária de toda a sociedade, ou então,
pela ruína das diversas classes em luta. (MARX, karl, p. 26).
E são essas lutas de classes que possibilitaram revoluções, como por exemplo a
Revolução Francesa em 1789, que trouxeram benefícios para todo o mundo a
despeito de todo sofrimento e dor causados pelas guerras e violências ocorridas
nestas revoluções. Assim, Karl Marx é mais um pensador que assinala a presença
14. 14
inerente do conflito na vida do homem e, em especial, na vida do homem em
sociedade.
Fazendo uma adaptação de Redorta (2004, p. 33), Àlvaro Chrispino nos
fornece, mediante uma tabela, um panorama histórico rico no que concerne à
presença do conflito na vida do ser humano. Nesta tabela, Chrispino descreve
quatro áreas do homem que, no decorrer de sua história e áreas da vida, têm
enfrentado conflitos. Essas áreas são: a sexual, biológica, sociológica e psicológica.
Analisemos a tabela abaixo:
AUTOR TIPO DO CONLFITO PROCESSO SÍNTESE
RESULTANTE
Freud Conflito entre o desejo e a proibição Repressão e defesa Luta pelo dever
Darwin Conflito entre o sujeito e o meio Diferenciação e Luta por existir
adaptação
Marx Conflito entre classes sociais Estratificação social e Luta pela
hierarquia
igualdade
Piaget Conflito nas decisões e experiências Aprendizagem Luta por ser
Resolução de
problemas
Portanto, essas são as áreas em que o ser humano tem enfrentado conflitos.
Conflitos são confrontos que se originam a partir das diferenças de interesses,
ideologias e valores. Contudo, não se deve confundi-los sumariamente com violência,
seja ela qual for. A esse respeito, Ortega (2002:143) afirma que:
O conflito emerge em toda situação social em que se
compartilham espaços, atividades, normas e sistemas de poder
e a escola obrigatória é um deles. Um conflito não é
necessariamente um fenômeno da violência, embora, em
muitas ocasiões, quando não abordado de forma adequada,
pode chegar a deteriorar o clima de convivência pacífica e gerar
uma violência multiforme na qual é difícil reconhecer a origem e
a natureza do problema.
Desta maneira, percebe-se que é possível existir o conflito sem que haja
violência. Para que isto aconteça, é necessário que as partes que conflitam tenham
maturidade para dialogar entre si e aprender a entender ou, no mínimo, aceitar o
ponto de vista alheio. Contudo, sabe-se que isto é difícil. É nesta conjuntura que se
torna imprescindível a presença de um mediador de conflitos. Percebe-se, então,
que uma das razões para a não resolução dos conflitos e/ou transformação dos
15. 15
mesmos em violência é a falta de comunicação e diálogo entre os agentes
conflitantes. Álvaro Chrispino escreve sobre a diferenciação de conflito e violência,
relatando que, em muitos casos, os conflitos só são percebidos quando os mesmos
geram ou se transformam em violência.
Em geral, nas escolas e na vida, só percebemos o conflito quando
este produz suas manifestações violentas. Daí podemos tirar, pelo
menos, duas conclusões: a primeira é que, se ele se manifestou de
forma violenta, é porque já existia antes na forma de divergência ou
antagonismo, e nós não soubemos ou não fomos preparados para
identificá-lo; a segunda é que, toda a vez que o conflito se manifesta,
nós agimos para resolvê-lo, coibindo a manifestação violenta. (2007,
p.16)
Sabendo-se que conflito não constitui necessariamente violência, pode-se
então chegar à conclusão de que o conflito também não é algo necessariamente
negativo. Assim, não se pode afirmar que todo conflito existente, inclusive na escola,
seja de cunho negativo e prejudicial para os seus envolvidos. A construção da
aprendizagem, da formação e da excelência do trabalho se dá com conflitos, e isto é
inegável. Não há crescimento sem conflitos, não há aprendizagens sem confrontos.
Quando o tão renomado Sócrates introduz o seu método da ironia e maiêutica, o
mesmo demonstra que, para que aconteça uma verdadeira aprendizagem, é
necessário haver um conflito cognitivo no aprendiz. O método da maiêutica e da
ironia ensina que é através do confronto que se chega ao conhecimento e à
verdade. De modo semelhante, o filósofo grego Heráclito foi o primeiro pensador a
conceber a realidade como uma síntese de contrários, ou seja, a afirmar que o
conhecimento só é alcançado quando há a junção de elementos opostos. Segundo
Ericsson Venâncio Coriolano, Heráclito confirma a visão positiva do conflito no
fragmento 53, em que escreve: “O combate (pólemos) é de todas a coisas o pai, de todas
rei (...)” (Sobre a Natureza (DK 22 b 1-126) Apud HERÁCLITO de Éfeso, p. 30).
Assim, Heráclito afirma que a realidade procede e processa-se mediante uma
luta (polemos), o que resulta posteriormente em harmonia. Ainda Ericsson Venâncio
diz que Heráclito mostra que nenhum ser é (em sua essência) sem o seu elemento
contrário, e que das diferenças vem a universalidade e a harmonia.
Heráclito pensa o Logos a partir dos contrários, ou seja, a partir de
uma negação determinada. Dessa forma, o ser não tem fundamento
apenas em si mesmo, mas no seu contrário, ou seja, no não-ser. O
não-ser aqui é uma posição determinante e ser não pode ser
compreendido isoladamente. A unidade é o acolhimento da
multiplicidade enquanto harmonia dos desarmônicos. Isso fica claro
no fragmento 8: “Heráclito (dizendo que) o contrário é convergente e
16. 16
dos divergentes nasce a mais bela harmonia, e tudo segundo a
discórdia”; e no 10: “Conjunções o todo e o não todo, o convergente
e o divergente, o consoante e o dissonante, e de todas as coisas um
e de um todas as coisas”. Aqui reside sua obscuridade, admitir o
absoluto como devir. O universal dá-se a partir dos opostos, ou seja,
das diferenças. (CORIOLANO, Ericsson Venâncio, p. 34).
Diante das reflexões do filósofo Heráclito, percebe-se que o conflito é algo integrante
do ser, e mais: nada é ou existe sem a presença do outro, da oposição, da negação,
do embate, do conflito. Outrossim, conflitar é ser, permanecer, crescer e aperfeiçoar-
se. O próprio ato do pensar, inquirir e refletir é fruto do embate e do confronto. O
conflito e a contradição são o que levam o homem a pensar e a descobrir, gerando
aprendizagem, construindo conhecimento e produzindo o que se chama de ciência.
Segundo Venâncio, em Heráclito:
A oposição, enquanto devir, é colocada como catalisadora do pensar
e é ela – a oposição, a unidade dos opostos – que impulsiona o
homem para o Logos. (CORIOLANO, Ericsson Venâncio, p. 34).
O conflito é uma situação que desvela pontos de vista, ideologias, valores e
interesses diferentes, sendo uma circunstância que conduz ao verdadeiro
conhecimento, até mesmo dos axiomas de situações problemáticas.
Deutsch (1990), um conceituado teórico alemão, entende o conflito como um
fator positivo contra a estagnação. Ele defende que o conflito é uma oportunidade de
descoberta das causas dos problemas e, consequentemente, de possiblidade de
resolução dos mesmos. Ele afirmou:
O conflito pode assumir-se como um poderoso antídoto contra a
estagnação na medida em que estimula o interesse, a curiosidade,
tornando-se talvez no meio mais credível para que os problemas
possam ser esclarecidos, debatidos e discutidos, ou seja, para que
seja possível encontrar soluções na medida em que se o assume
como a raiz das mudanças pessoais e sociais.
Outrossim, no artigo “Gestão do conflito escolar: da classificação dos conflitos
aos modelos de mediação”, Álvaro Chrispino (2007, p.17) afirma sobre o conflito
que:
• Ajuda a regular as relações sociais;
• ensina a ver o mundo pela perspectiva do outro;
•permite o reconhecimento das diferenças, que não são ameaça, (...);
• ajuda a definir as identidades das partes que defendem suas
posições;
• permite perceber que o outro possui uma percepção diferente;
• racionaliza as estratégias de competência e de cooperação;
• ensina que a controvérsia é uma oportunidade de crescimento e de
amadurecimento social.
17. 17
Assim, é preciso entender que é através dos conflitos, quando corretamente
administrados, que serão amadurecidos os diversos tipos de relacionamentos e
solucionadas as situações de complexidade. Maria José Lobato Azevedo, em seu
texto “Mediação de Conflitos”, confirma que a existência do conflito não determina
por si só uma situação de negatividade:
Entendo que o conflito é um fenómeno normal, que existe onde
existem pessoas (1), e continuo, desta forma a entender, que o
conflito não tem de ser necessariamente negativo, pois, pode
representar a oportunidade de crescimento e coesão entre as
pessoas, permite o desenvolvimento de capacidades sociais, uma
maior capacidade de comunicação e mesmo de autonomia. O
conflito, porque se constitui e se forma a partir de pontos de vista
diferentes, se bem gerido, proporciona a percepção de diferentes
modos de pensar, diferentes modos de abordar a realidade, que se
partilha com os outros. Todas estas possibilidades são uma mais
valia para a formação da nossa própria pessoa, do nosso modo de
ser e estar no Mundo. (AZEVEDO, Maria José Lobato p. 3).
As autoras Eunice Maria Nascimento e Kassem Mohamed El Sayed
também compreendem o conflito numa visão positiva. Elas esclarecem, na sua obra
“Administração de Conflitos”, que o mesmo possibilita a ampliação da visão sobre
determinado assunto, permitindo enxergá-lo sob ângulos diferentes, o que ajuda na
compreensão e conhecimento de determinada realidade.
O conflito é fonte de idéias novas, podendo levar a discussões
abertas sobre determinados assuntos, o que se revela positivo, pois
permite a expressão e exploração de diferentes pontos de vista,
interesses e valores. (p. 47).
Essas autoras também explicitam que a ocorrência do conflito dissolve a existência
da monotomia, inércia e estagnação, gerando um processo de renovação e
inovação no que concerne ao campo da relação e do trabalho.
Em alguns momentos, e em determinados níveis, o conflito pode ser
considerado necessário se não se quiser entrar num processo de
estagnação. Assim, os conflitos não são necessariamente negativos;
a maneira como lidamos com eles é que pode gerar algumas
reações. (p. 48).
18. 18
2.2 O CONFLITO EM ÂMBITO EDUCACIONAL
Como já foi explanado no capitulo anterior desta monografia, o conflito é algo
que se faz presente onde há vida, principalmente vida humana; em qualquer relação
do homem para consigo mesmo ou para com o seu semelhante, o conflito será o
necessário instrumento de aperfeiçoamento, descoberta, crescimento, renovação e
inovação, etc.. No ambiente escolar não é diferente, pois, da mesma maneira como
acontece nos demais setores da sociedade e da vida humana, o conflito nele
ocorrerá, uma vez que o meio escolar é um lugar de ressonância das
potencialidades e fragilidades deste ser denominado humano. Luís Marques e Pedro
Cunha escrevem em seu artigo “Estilos de gestão de conflito em contexto escolar:
Análise de algumas variáveis relevantes” que:
A Escola constitui um espaço de socialização por excelência. Tida
como elo de ligação com a família, assume-se como um mecanismo
de ressonância das dificuldades, dos conflitos e das potencialidades
que o adolescente experimenta. (...) O conflito, nomeadamente o
conflito em contexto escolar, é uma realidade incontornável e
intrínseca do nosso quotidiano que, em nosso entender, assume uma
inegável pertinência e actualidade no contexto educativo português.
(p. 97).
Ademais, não se pode entender que todo conflito existente na escola seja de
cunho negativo e prejudicial para os alunos, funcionários, professores,
coordenadores e gestores.
Concernente à origem dos conflitos no ambiente educativo, Àlvaro Chrispino
(2007) escreve, segundo sua perspectiva, que uma das primeiras causas de
conflitos na escola é a junção de alunos de perfis diferentes dentro do espaço
educativo, ou seja, alunos de vivências e realidades diferentes, de valores
diferentes, de interesses e objetivos diferentes e assim por diante. A aglomeração de
diferenças, segundo Àlvaro Chrispino (2007), além de proporcionar uma maior
variedade, quantidade e dimensão de conflitos na escola, causa, quando os conflitos
não são correta e competentemente administrados, o surgimento da violência
escolar. Ele assinala que, em um passado remoto, os alunos que estudavam em
uma mesma escola apresentavam perfis semelhantes, aproximados, e isso reduzia
a quantidade, variedade e dimensão dos conflitos existentes dentro da instituição
escolar. Na concepção deste autor, no decorrer da história os perfis dos alunos da
19. 19
escola se multiplicaram e a escola continuou a mesma, sem se preparar para esta
nova demanda.
Antes, em passado remoto, a escola era procurada por um tipo
padrão de aluno, com expectativas padrões, com passados
semelhantes, com sonhos e limites aproximados. Os grupos eram
formados por estudantes de perfis muito próximos. Com a
massificação, trouxemos para o mesmo espaço alunos com
diferentes vivências, com diferentes expectativas, com diferentes
sonhos, com diferentes valores, com diferentes culturas e com
diferentes hábitos [...], mas a escola permaneceu a mesma! Parece
óbvio que este conjunto de diferenças é causador de conflitos que,
quando não trabalhados, provocam uma manifestação violenta. Eis,
na nossa avaliação, a causa primordial da violência escolar.
(CHRISPINO, Àlvaro, p.16).
Essa variedade de perfis dos alunos que compõe a escola pública ou privada leva,
consequentemente, ao acontecimento de inúmeros conflitos nas mesmas, uma vez
que, devido a essa miscigenação ocorrente no seio educativo da escola, os embates
serão sem dúvida alguma uma realidade cotidiana.
Como a escola está acostumada historicamente a lidar com um tipo
padrão de aluno, ela apresenta a regra e requer dos alunos
enquadramento automático. Quanto mais diversificado for o perfil dos
alunos (e dos professores), maior será a possibilidade de conflito ou
de diferença de opinião. (CHRISPINO, Àlvaro, p. 17).
As diferenças de opiniões entre professores e coordenadores, professores e
alunos, coordenadores e alunos sobre atos e acontecimentos que ocorrem dentro da
escola são inevitáveis. Essas divergências de opiniões e de modos de visualizar
uma situação-problema dentro da escola são fatores primordiais que levam ao
surgimento do conflito. Em outras palavras, o embate, o confronto e o choque
dessas diferentes ideias e modos de interpretar uma determinada realidade são
ocasiões do conflito propriamente dito. No entanto, como já foi explicitado, o conflito
não é algo necessariamente negativo, nem tampouco atenta contra a ordem vigente.
Na verdade, o conflito possibilita a ordem, a ordem democrática que deve ser
difundida e mantida, pois é mediante o conflito que a democracia se faz real. Diante
de uma visão positiva do conflito, deve-se também ter em mente que o
amadurecimento, aperfeiçoamento e inovação de ideias e projetos educativos no
seio da escola se darão mediante o confronto de pontos de vista diferentes.
A respeito das diferenças de opiniões, ideias e pontos de vista dentro da
escola sobre determinadas realidades e que levam ao conflito, Álvaro Chrispino
(2007) escreve:
20. 20
Ao definirmos conflito como o resultado da diferença de opinião ou
interesse de pelo menos duas pessoas ou conjunto de pessoas,
devemos esperar que, no universo da escola, a divergência de
opinião entre alunos e professores, entre alunos e entre os
professores seja uma causa objetiva de conflitos.
(...) Podemos esperar que, pela diferença entre as opiniões, haja
conflito no espaço escolar. Um conflito criado pela diferença de
conceito ou pelo valor diferente que se dá ao mesmo ato.
Professores e alunos dão valores diferentes à mesma ação e reagem
diferentemente ao mesmo ato: isso é conflito. (p. 16,17).
Sabe-se também que os campos de ocorrência de conflitos escolares são
diversos, tais como: conflitos interpessoais entre coordenadores e gestores, entre
funcionários e docentes, entre docentes e docentes, entre docentes e discentes,
entre discentes e discentes etc.. Desta maneira, percebe-se a dimensão do conflito
escolar, uma vez que a escola é um lugar onde as relações entre pessoas se fazem
de modo muito intenso e diversificado, ou seja, entre os vários componentes
humanos presentes na instituição escolar, os quais têm funções diversas dentro da
mesma, tais como: docência, discência, coordenação, direção, limpeza etc., como
foi relatado.
Álvaro Chrispino (2007) cita, em seu texto que trata sobre a gestão de
conflitos na escola, Martinez Zampa (2005, p. 30-31), o qual divide os conflitos
educacionais em quatro tipos:
• Conflito em torno da pluralidade de pertencimento: surge quando o
docente faz parte de diferentes estabelecimentos de ensino ou
mesmo de níveis diferentes de ensino.
• Conflitos para definir o projeto institucional: surge porque a
construção do projeto educacional favorece a manifestação de
diferentes posições quanto a objetivos, procedimentos e exigências
no estabelecimento escolar.
• Conflito para operacionalizar o projeto educativo: surge porque, no
momento de executar o projeto institucional, surgem divergências
nos âmbitos de planejamento, execução e avaliação, levando a
direção a lançar mão de processos de coalizão, adesões, etc.
• Conflito entre as autoridades formal e funcional: surge quando não
há coincidência entre a figura da autoridade formal (diretor) e da
autoridade funcional (líder situacional). (p. 20).
Assim, conclui-se que estes se dão em quatro âmbitos, os quais são:
• Por questões de interesses pessoais (profissionais) por parte
dos docentes.
• Por questões de ordens administrativas da escola.
• Por questões de ordens de ações pedagógicas na escola.
• E por questões de relações de poder dentro da instituição.
21. 21
Já Nebot (2000, p. 81-82) categoriza os conflitos escolares, segundo Álvaro
Chrispino (2007, p. 22), em organizacionais, culturais, pedagógicos e de atores. Os
conflitos na escola de cunho organizacional, segundo os referidos autores, são
aqueles que acontecem no campo administrativo e financeiro da escola, por
exemplo: respectivamente, divisão de trabalhos e pagamentos de salários. Os
conflitos na escola de cunho cultural são aqueles que acontecem oriundos
principalmente da interferência e influência da comunidade na escola nela inserida:
(...) por exemplo, os bairros e suas características, as organizações sociais do
bairro, as condições econômicas de seus habitantes, etc. (p. 22); e também a
identidade dos habitantes do bairro, como por exemplo, a predominância racial e
étnica dos moradores da comunidade, a qual, dependendo da raça ou etnia
majoritária, carrega em seu bojo costumes, hábitus e rituais locais que interferem e
influenciam na comunidade escolar do bairro. Os conflitos de âmbito pedagógico
para Nebot (2000), segundo Chrispino, são aqueles causados por divergências em
questões curriculares, de avaliação e de metodologias de ensino da escola. Por fim,
os conflitos categorizados por Nebot (2000) em “de atores”, segundo Chrispino, são
aqueles que envolvem diretamente pessoas, por exemplo, nas seguintes situações:
grupos e subgrupos formados dentro da instituição escolar; a relação dos
funcionários da educação com os familiares dos alunos e o surgimento de patologias
ou doenças quaisquer e algum membro da comunidade escolar, os quais podem
gerar conflitos de variadas espécies dentro da escola. Com relação ao último caso
citado (o surgimento de patologias ou de doenças quaisquer em algum membro da
comunidade escolar) este pode gerar estigmatização e repulsa do membro da
comunidade escolar pelos colegas.
Àlvaro Chrispino (2007, p. 21)) faz em seu texto, ainda, uma adaptação da
concepção do autor Martinez Zampa (2005, p. 31-32) concernente à outra
classificação de conflitos educacionais e sobre quais os conflitos mais frequentes na
escola segundo o entendimento deste autor. Chrispino, citando Martinez Zampa
(2005, p. 31-32), classifica os conflitos educacionais mais freqüentes em outros
quatro tipos, a saber: entre docentes; entre alunos e docentes; entre alunos e entre
pais; e entre docentes e gestores. As causas dos conflitos entre docentes, segundo
Chrispino e Zampa, se dão pela deficiência de comunicação; pela luta de poder; por
questões de interesses; e por terem, muitas vezes, valores e ideologias diferentes.
Já os conflitos educacionais entre docentes e alunos se dão, segundo a perspectiva
22. 22
de Chrispino (2007) e Martinez Zampa (2005), por questões tais como: os alunos
não entenderem o que os professores explicam; notas arbitrárias; divergência sobre
critério de avaliação; discriminação; falta de material didático; não serem ouvidos
(tanto alunos quanto docentes); desinteresse pela matéria de estudo. Os conflitos
entre discentes são explicados pelas respectivas causas: mal entendidos; rivalidade
entre grupos; discriminação; bullying (comportamento intencional e repetido cujo
objetivo é prejudicar e irritar o outro); namoro; assédio sexual; perda ou dano de
bens escolares; eleições (de variadas espécies); dentre outras. Por fim, os conflitos
entre pais, docentes e gestores são originados, segundo Chrispino e Zampa, pelas
seguintes razões: agressões ocorridas entre alunos e entre os professores; perda de
material de trabalho; falta ao serviço pelos professores; falta de assistência
pedagógica pelos professores; critérios de avaliação, aprovação e reprovação; uso
de uniforme escolar; não-atendimento a requisitos “burocráticos” e administrativos
da gestão; etc..
Diante das reflexões destes autores sobre as causas e a natureza dos
conflitos educacionais, nota-se, então, a sua amplitude e diversidade, e consolida-se
o entendimento, mediante a análise dos dados bibliográficos aqui levantados
concernente aos conflitos escolares, que estes são inevitáveis e não
necessariamente prejudiciais aos agentes conflitantes, ou seja, estes variados
conflitos escolares podem ser oportunidades de aperfeiçoamento, crescimento,
renovação, inovação, correção, etc., no processo de ensino-aprendizado e no
processo de educação em si. Portanto, o gestor educacional e os demais agentes da
educação que atuam na escola, devem ter esta concepção do conflito educacional,
buscando, essencialmente, evitar que o mesmo se transforme em violência, o que
seria, então, um fator negativo para o processo de educar, tornando-se necessário
também, diante de toda esta conjuntura, a presença de um coordenador pedagógico
e de um mediador de conflitos para que se exerça a mediação destes referidos
conflitos.
.
23. 23
3 MEDIAÇÃO
3.1 MEDIAÇÃO EM ÂMBITO EDUCACIONAL
Diante do tema abordado, a saber, “A Mediação de conflitos na escola pelo
Gestor Educacional como alternativa de combate à violência escolar”, depara-se,
nesta pesquisa, com uma variedade de conceitos, os quais precisam ser definidos,
esmiuçados e esclarecidos de modo competente para que haja uma maior
compreensão do que este texto defende.
Começar-se-á este processo de definição dos conceitos contidos neste tema
analisando primeiramente o que é “mediação”. O Dicionário Brasileiro Globo,
elaborado por Francisco Fernandes, Celso Pedro Luft e F. Marques Guimarães
(2001), define os termos mediar, mediação e mediador como: Mediar – repartir em
duas partes iguais; dividir ao meio; tratar como medianeiro; estar no meio; ser
medianeiro ou mediador (...). Mediação – ato de mediar; intervenção (...); (do latim
mediatione). Mediador – diz-se do que intervém; medianeiro; árbitro. (do latim
mediatore). Desta maneira, pode-se notar que mediar é estar entre os sujeitos
conflitantes, buscando atender, em sentido genérico, as reivindicações de ambas as
partes, mediante o desenvolvimento de estratégias de consenso. As autoras Isabel
Oliveira e Catarina Morgado, em seu artigo Mediação em contexto escolar:
transformar o conflito em oportunidade, definem mediação da seguinte maneira:
A Mediação é uma negociação com a intervenção de um terceiro
neutral, baseada nos princípios da voluntariedade das partes, da
neutralidade e imparcialidade do terceiro (mediador) e na
confidencialidade do processo, a fim de que as partes em litígio
encontrem soluções que sejam mutuamente satisfatórias. (2009, p.
48)
Pode-se perceber, então, a partir desta citação acima, a profundidade e
responsabilidade do que é mediar, pois, mediar é, antes de tudo, uma negociação
pela intervenção de um ser terceiro ao conflito. No entanto, este ser terceiro deve
ser neutro, ou seja, deve ser imparcial em relação às partes envolvidas no conflito.
Isto significa que o mesmo não deve buscar solucionar a situação conflitante
preocupando-se unicamente em atender os interesses de uma das partes
conflitantes que lhe for conveniente. A esta característica de neutralidade por parte
24. 24
do mediador dá-se o nome de imparcialidade. A autora Maria José Lobato Azevedo
fala sobre a imparcialidade na mediação de conflitos:
Na mediação a resolução do problema implica sempre a existência
de uma pessoa imparcial ao conflito que terá por função facilitar a
identificação e a construção da solução para o conflito. Este
procedimento é por natureza mais formal, pois implica todo um
conjunto de actuações que têm que ser organizadas à partida.
(AZEVEDO, Maria José Lobato, p. 6)
O ato de mediação é definido pelo Instituto Mediare do Rio de Janeiro
(1998:06) como “um processo não adversarial, confidencial e voluntário, no qual um
terceiro imparcial facilita a negociação entre duas ou mais partes, onde um acordo
mutuamente aceitável poderá ser um dos desenlaces possíveis”.
Ortega (2002:147) aponta que:
A mediação é a intervenção, profissional ou profissionalizada,
de um terceiro – um especialista – no conflito travado entre
duas partes que não alcançam, por si mesmas, um acordo nos
aspectos mínimos necessários para restaurarem uma
comunicação, um diálogo que é necessário para ambas (...)
com o reconhecimento da responsabilidade individual de cada
um no conflito e o acordo sobre como agir para eliminar a
situação de crise com o menor custo de prejuízo psicológico,
social ou moral para ambos os protagonistas e suas
repercussões em relação a terceiros envolvidos.
Assim, Ortega ensina que “mediação” é, antes de tudo, uma ação
intervencionista, profissionalizada e especialista que visa solucionar ou no mínimo
amenizar as tensões causadas pelo conflito, buscando alternativas para a realização
dos interesses de ambas as partes conflitantes. Ao usar a expressão “intervenção
profissional e especializada”, Ortega assinala que esta intervenção denominada
“mediação” precisa ter intencionalidade, imparcialidade, estratégias e metodologias
de ação.
Contudo, o processo de mediar não é algo fácil, ele requer recursos e
competências essenciais para a eficácia da mediação. Um dos recursos
indispensáveis para essa eficácia do processo de mediação de conflitos é o diálogo
e a comunicação, e estes só são possíveis através da linguagem. Não é possível um
ser terceiro, neutro, imparcial e independente à relação conflituosa conseguir gerar e
recriar uma relação de negociação e acordo entre as partes conflitantes sem se
25. 25
utilizar da linguagem, do diálogo e da comunicação. Porém, o processo de
comunicação não deve única e simplesmente partir do mediador para as partes que
conflitam; o mediador precisa ter a habilidade e competência para criar e recriar a
relação entre os seres que conflitam, ou seja, fazer com que os mesmos dialoguem.
Lilia Maia de Morais Sales, Professora titular da Universidade de Fortaleza –
UNIFOR, doutora em Direito e Emanuela Cardoso Onofre de Alencar, advogada
(2004: 91) explicitam que, de fato, o mediador de conflitos precisa não somente criar
relações e diálogos de si mesmo para com os protagonistas do conflito, mas
também entre estes. Elas afirmam que “a mediação também facilita a comunicação
entre as partes. Muitas vezes o conflito se desenvolve e as pessoas envolvidas já
não têm a capacidade de juntas conversarem e tentarem descobrir a melhor forma
de resolvê-lo. Na sessão de mediação, o mediador atua para auxiliar as partes a
dialogarem, de forma pacífica e respeitando o outro, propiciando que as querelas
venham à tona e possam ser trabalhadas pelos próprios envolvidos.” Assim, a
mediação permite o embate das diferenças através de uma terceira parte
facilitadora. Para que ocorra na escola uma boa mediação de conflitos, são
necessárias, portanto, por parte do mediador, determinadas práticas fundamentais,
dentre as quais se destaca o diálogo. Um provérbio português diz: “da discussão
nasce a luz.” Portanto, é por intermédio do diálogo que se poderá chegar a um
denominador comum para os sujeitos conflitantes. Maria José Lobato Azevedo diz:
(...) a comunicação eficaz, o diálogo que se estabelece entre as
partes será revelador de toda intenção e disponibilidade na esolução
do conflito, o que aliado, e neste caso particular na mediação, às
habilidades cognitivas, facilitará todo o processo. (AZEVEDO, Maria
José Lobato, p. 6).
Segundo esta autora, é através do diálogo conduzido pelo mediador entre as partes
envolvidas num conflito, que será descoberta a disposição para se resolvê-lo. Álvaro
Chrispino (2007) também escreve sobre a importância do diálogo para a resolução
de conflitos, e afirma que é através do mesmo que se descobrem novas e melhores
opções para melhor decidir numa situação conflitante:
As escolas que valorizam o conflito e aprendem a trabalhar com essa
realidade, são aquelas onde o diálogo é permanente, objetivando
ouvir as diferenças para melhor decidirem; são aquelas onde o
exercício da explicitação do pensamento é incentivado, objetivando o
aprendizado da exposição madura das idéias por meio da
assertividade e da comunicação eficaz; onde o currículo considera as
oportunidades para discutir soluções alternativas para os diversos
26. 26
exemplos de conflito no campo das idéias, das ideologias, do poder,
da posse, das diferenças de toda ordem; onde as regras e aquilo que
é exigido do aluno nunca estão no campo do subjetivo ou do
entendimento tácito: estão explícitos, falados e discutidos. Em
síntese, devemos ser explícitos naquilo que esperamos dos
estudantes e naquilo que nos propomos a fazer. (CHRISPINO,
Álvaro, 2007, p. 23)
Assim, este autor também defende a validez do diálogo para resolução de conflitos,
descrevendo que o diálogo ajuda a decidir de modo mais eficaz e preciso nas horas
conflituosas.
Foi elaborado um gráfico que permite compreender melhor o percurso e a
função da comunicação e do diálogo (os quais se dão mediante a linguagem) entre
mediador e partes conflitantes e entre as partes conflitantes.
Legenda: M: Mediador C1: Conflitante 1 C2: Conflitante 2
27. 27
C3: Conflitante 3 D: Diálogo
Foram elaborados dois gráficos; o primeiro, representando a mediação de conflitos
entre pares de pessoas; e o segundo, representando a mediação de conflitos entre
mais de duas pessoas.
3.2 MEDIAÇÃO DE CONFLITOS
Diante de toda esta abordagem teórico-filosófica a respeito da conceituação
dos termos mediação e conflito, torna-se necessário, também, estudar e aprofundar
quais os pressupostos necessários e fundamentais para que haja uma eficaz
mediação de conflitos. Cabe ressaltar que, no decorrer desta pesquisa bibliográfica,
será tratado ainda quais são os conflitos ocorrentes na escola e como o gestor
educacional pode mediá-los.
Mediar conflitos não é fácil. É necessária, antes de tudo, uma maturidade por
parte do mediador para esta mediação, como também a percepção da origem e da
natureza do conflito.
Mediar conflitos é uma ação de pacificação, colaborativa e de facilitação para
o alcance de soluções do conflito ocorrente entre duas ou mais pessoas, ação esta
feita por um ser neutro ao conflito e aos agentes conflitantes, ou seja, imparcial (...).
(SALES, Lilia Maia de Morais e ALENCAR, Emanuela Cardoso Onofre 2004, p. 92).
Alguns pressupostos são imprescindíveis para a mediação de conflitos, os
quais devem fazer parte integrante do comportamento e das atitudes do mediador.
Dentre esses pressupostos, destacam-se a imparcialidade, escuta ativa e a
comunicabilidade em forma de diálogo.
3.2.1 Imparcialidade
A imparcialidade é uma característica que de maneira alguma deve faltar a um
mediador de conflitos, uma vez que o mesmo, no processo de mediar, deve buscar
atingir, na medida do possível, os interesses de ambos os protagonistas conflitantes
e não unicamente os de uma das partes que conflitam, ou seja, deve “gerar opções
de ganhos mútuos e estabelecer acordos de benefícios mútuos” (NASCIMENTO,
Eunice Maria/ SAYED, Kassem Mohamed El, p. 54). No tocante a isto (a
imparcialidade por parte do mediador de conflitos, cujo objetivo é, na medida do
28. 28
possível, o atendimento de interesses mútuos dos agentes conflitantes), Álvaro
Chrispino (2007: 22,23) explicita, em uma descrição do que é mediação, o seguinte:
Chamaremos de mediação de conflito o procedimento no qual os
participantes com a assistência de uma pessoa imparcial – o
mediador –, colocam as questões em disputa com o objetivo de
desenvolver opções, considerar alternativas e chegar a um acordo
que seja mutuamente aceitável.
A palavra imparcialidade significa literalmente “não parcial”, não tomar parte
ou não tomar partido. Assim, para que o mediador de conflitos seja imparcial em sua
mediação e gestão de conflitos, o mesmo precisa ser um agente “neutro” no que
concerne ao envolvimento pessoal com os protagonistas do conflito e/ou com os
interesses desses protagonistas.
Assim, entende-se que a imparcialidade é fator determinante para que um
indivíduo possa atuar como mediador de conflitos. O mesmo esclarece Maria José
Lobato Azevedo, a qual afirma que, para a resolução de um problema que envolve
mais de uma pessoa, é imprescindível a presença de uma pessoa imparcial, para
assim ocorrer facilitação e pacificação das e nas relações entre os agentes que
colidem.
Na mediação a resolução do problema implica sempre a existência
de uma pessoa imparcial ao conflito que terá por função facilitar a
identificação e a construção da solução para o conflito. Este
procedimento é por natureza mais formal, pois implica todo um
conjunto de actuações que têm que ser organizadas à partida.
(AZEVEDO, Maria José Lobato, p. 6).
Ser imparcial na mediação de conflitos é ser neutro, íntegro e justo na avaliação e
nas decisões a serem tomadas no que se refere ao conflito e aos protagonistas dele.
Lilia Maia de Morais Sale e Emanuela Cardoso Onofre de Alencar (2004, p.
89,90), também descrevem em seu artigo algumas características que devem fazer
parte da mediação de conflitos, destacando, entre elas, a imparcialidade e a
capacitação, por parte do mediador, como características indispensáveis para o
exercício da tarefa de mediar. Elas afirmam que:
A mediação de conflitos é um meio pacífico, amigável e colaborativo
de resolução de controvérsias que busca a melhor solução pelas
próprias partes. É um procedimento por meio do qual uma terceira
pessoa imparcial e capacitada age no sentido de encorajar e facilitar
a resolução de uma disputa, evitando antagonismos, porém sem
prescrever uma solução.
29. 29
3.2.2 Escuta ativa
A escuta ativa por parte do mediador é algo fundamental para uma eficiente
mediação de conflitos. A escuta ativa consiste na prática de ouvir, escutar
atenciosamente os pareceres dos elementos que conflitam, para, assim, o mediador
de conflitos perceber e compreender os interesses que envolvem os agentes
conflitantes, a causa do conflito, as possíveis soluções para o alcance dos
determinados interesses e, a partir disto, poder mediar. É uma forma de diagnóstico
que se faz para tal: “ouvir ativamente, pois metas e intenções não compreendidas
levam sempre a uma resolução sem sucesso” (NASCIMENTO, Eunice Maria/
SAYED, Kassem Mohamed El, p. 54).
Àlvaro Chrispino (2007, p. 23) escreve sobre a importância do ouvir para a
mediação de conflitos na escola, afirmando que é preciso ouvir as diferenças para
melhor decidir e, ainda, que é preciso incentivar a exposição e explicitação madura
das ideias por parte dos protagonistas do conflito para que se possa administrar
melhor os conflitos escolares.
Maria José Lobato Azevedo também assinala que, dentre os muitos
importantes requisitos para a mediação de conflitos, a escuta ativa se encontra
presente. Segundo ela, para que aconteça uma excelente mediação e negociação,
três elementos devem fazer parte deste processo, a saber; a escuta ativa,
habilidades cognitivas e assertividade. Assim, é possível perceber que a prática do
ouvir é de extrema importância para uma justa e certeira intervenção em uma
situação de desacordo:
A resolução dos conflitos obriga a análise de técnicas de resolução
desses mesmos conflitos, pelo que se realiza uma análise
comparativa entre negociação e mediação. Tal análise conduz ao
determinar da importância destes procedimentos, aliados a técnicas
de escuta activa, habilidades cognitivas e assertividade. (AZEVEDO,
Maria José Lobato, p. 2).
Maria José ainda descreve que, em uma mediação de conflitos, é necessário o
controle das emoções, para que assim seja possível ao mediador, através da
escuta, conhecer de modo imparcial e acertado a causa verdadeira do conflito:
É fundamental, antes de mais nada, perceber que o conflito é um
processo co-construído, é preciso conhecer e controlar as emoções,
perceber realmente do que se está a tratar. Muito importante, para
ambas as situações, é a atitude assertiva, a escuta activa e empatia.
(AZEVEDO, Maria José Lobato, p. 6)
30. 30
A escuta Ativa é uma técnica de comunicação essencial para a captação de
toda mensagem e/ou informação que é passada pelos atores conflitantes. Em um
processo de comunicação, especialmente em uma situação de conflito, além das
verbalizações (aquilo que é expresso através da voz, oralmente) ocorridas no ato da
comunicação entre os protagonistas do diálogo, muitas outras mensagens e
informações circulam, complementam, desmentem, acrescentam etc., aquilo que é
dito oralmente. Essas outras mensagens e informações não são conhecidas através
da verbalização, elas se encontram nos seguintes planos: nas emoções e
sentimentos emitidos durante a verbalização, no contexto em que as verbalizações
são proferidas, nos valores dos verbalizadores e nas expressões faciais e gestuais
dos mesmos. Desta maneira, o mediador de conflitos, mediante o uso desta técnica
de comunicação chamada escuta ativa, observará e ouvirá não somente o que os
protagonistas do conflito dizem com suas palavras, mas também todas as demais
mensagens e informações passadas e que estão além da oralização dos sujeitos.
Maria José Lobato Azevedo separa, em seu artigo intitulado “Mediação de Conflitos”,
um capítulo inteiro para tratar da importância da escuta na resolução de conflitos e
das mensagens e informações que estão além da verbalização. Ela cita M.ª Odete
Fachada, a qual escreve:
A escuta activa implica que prestemos atenção não só ao conteúdo
da mensagem de cada uma das partes, mas também aos
sentimentos e emoções nelas implicados, aos índices não verbais e
ao contexto em que a mensagem é proferida. (p, 8 apud 1991, p. 323).
Ainda, Maria José Lobato de Azevedo diz que a escuta, na mediação de conflitos,
cria empatia, e esta mesma empatia, criada mediante a escuta ativa, “facilita e
permite a obtenção de um ambiente mais propicio ao encontro de soluções
satisfatórias para o conflito.” (p, 8).
As autoras Lilia Maia de Morais Sales e Emanuela Cardoso Onofre de Alencar
(2004:92) também esclarecem em seu texto a importância da escuta ativa e também
do diálogo como uma das técnicas fundamentais para a mediação de conflitos. Elas
afirmam assim:
A mediação, por meio do diálogo e da escuta ativa, possibilita que as
partes exponham o problema e este seja trabalhado de uma forma
positiva, possibilitando que os envolvidos consigam encontrar a
melhor solução para as divergências.
31. 31
Assim, a escuta ativa é uma técnica e ação indispensável a ser usada pelo
mediador na gestão de conflitos.
3.2.3 Comunicabilidade e diálogo
O papel da comunicação na gestão de conflitos também é fator determinante
para o sucesso da mesma. É impossível gestar e mediar conflitos sem utilizar-se da
comunicabilidade e do diálogo. Comunicabilidade é a qualidade daquilo que é
comunicável e diálogo é uma conversação entre pessoas. Assim, esta terceira
característica (comunicabilidade e diálogo) deve estar presente na pratica de
mediação de conflitos.
Sem diálogo não há comunicação nem solução possível para os
problemas; a maioria dos erros, omissões, irritações, atrasos e
conflitos são causados por uma comunicação inadequada.
(NASCIMENTO, Eunice Maria/ SAYED, Kassem Mohamed El, p. 54).
Já foi tratado no capítulo 1.1- MEDIAÇÃO, de modo mais detalhado, a função e importância da comunicação e
do diálogo para a mediação de conflitos.
32. 32
4 GESTÃO EDUCACIONAL
Falar de gestão não é algo simples, principalmente quando se fala em gestão
educacional.
Existe uma pergunta que tem sido feita frequentemente nos cursos de
graduação em educação, a saber: por que atualmente se usa o termo gestão
educacional e não administração educacional? Para responder esta pergunta, é
necessário, antes de tudo, definir e conceituar o que é gestão. O dicionário Brasileiro
Globo (2001) define gestão como o ato de administrar, gerir, gerenciar, dirigir. Ainda,
na família desta palavra (gestão), encontra-se a palavra gerar. Isto significa que
gestar é muito mais do que simplesmente administrar algo, mas é viver e dar vida a
este algo.
Um fator importante a se destacar nesta discussão é que a escola, em si, é
uma das instituições mais complexas e importantes que existem. A comunidade
escolar, depois da família, é considerada como o mecanismo de maior influência na
formação da personalidade de um indivíduo. Diante disto, se gestar já é uma ação
complexa em si mesma, gestar uma escola, muito mais. Desta maneira, será
tratado, neste capitulo, em que consiste o campo educacional e qual o papel do
gestor nesta conjuntura.
4.1 O QUE É A ESCOLA?
A escola é um espaço educativo. Em outros termos, é o lugar que faz
parceria, em especial à família, na tarefa de educar. Antônio Nóvoa (1999) em seu
texto intitulado: Para uma análise das instituições escolares, descreve tecnicamente
escola da seguinte maneira:
A escola é encarada como uma instituição dotada de uma autonomia
relativa, como um território intermédio de decisão no domínio
educativo, que não se limita a reproduzir as normas e os valores do
macro-sistema, mas que também não pode ser exclusivamente
investida como um micro-universo independente do jogo dos actores
sociais em presença. (p.2).
Assim, Nóvoa (1999) compreende a escola como um lugar no qual se faz educação,
tendo ela certa autonomia para tal, mas não soberania, uma vez que, sendo uma
instituição social, sofre influência do meio em que está inserida, e mais: deve prestar
satisfação de suas ações ao mesmo, em um processo de constante diálogo com ele.
33. 33
Por outro lado, como qualquer outra instituição, principalmente social, a
escola é provida de uma estrutura organizacional. Antônio Nóvoa (1999, p.3) divide
esta macro estrutura organizacional da escola em três áreas, as quais são:
A estrutura física da escola: Dimensão da escola, recursos
materiais, número de turmas, edifício escolar, organização dos
espaços, etc.
A estrutura administrativa da escola: Gestão, direcção, controle,
inspecção, tomada de decisão, pessoal docente, pessoal auxiliar,
participação das comunidades, relação com as autoridades centrais
e locais, etc.
A estrutura social da escola: Relação entre alunos, professores e
funcionários, responsabilização e participação dos pais, democracia
interna, cultura organizacional da escola, clima social, etc.
Estas três estruturas da escola são interdependentes e não pode estar
debilitada/deteriorada, nenhuma delas, pois isto prejudicaria determinadas funções
da instituição educativa e, consequentemente, o seu andamento.
O entendimento do que é a escola varia de acordo com o ângulo em que se
está analisando-a; se do ponto de vista social, educativo, físico, técnico, etc.. No
livro: Trabalhando com Educação de Jovens e Adultos, Elisabete Costa, Sônia
Carbonell Álvares e Vera Barreto (2006: 23) trazem uma descrição coerente do que
é escola. Elas dizem que, partindo do que mostra a realidade, pode-se pensar a
escola sob diferentes perspectivas: a escola como espaço de sociabilidade, de
transformação social e como espaço de construção do conhecimento. Nesta
perspectiva, nota-se que a escola tem, em sentido generalizado, duas funções
básicas: 1- criar possibilidades de construção de conhecimentos; e 2- criar
possibilidades de relações sociais. Assim, a escola é uma instituição de ensino, uma
instituição educativa e uma instituição social. E, como instituição social, ela tem a
incumbência de não só criar relações sociais entre os seus membros internos, mas
também, entre estes e a comunidade em que a escola está inserida.
José Carlos Libâneo (2004), em seu livro: Organização e Gestão da Escola:
Teoria e Prática, também propõe importantes interpretações do que é a escola e
qual o seu papel fundamental para com seus alunos e para com a sociedade. Ele diz
que a escola é uma instituição singular presente na sociedade, pois, apesar de
muitas outras instituições sociais terem e efetuarem também, de certa maneira, a
tarefa sublime de educar, tais como a família, os sindicatos, as igrejas, as ONGs, os
clubes e outras, nenhuma delas, na concepção de Libâneo, sintetiza diversas
34. 34
funções e responsabilidades a serem exercidas e assumidas no que se refere às
múltiplas áreas de desenvolvimento do ser humano. Ele afirma que:
Ela cumpre funções que não são providas por nenhuma outra
instância, como a de prover formação geral básica -capacidade de
ler, escrever, formação científica, estética e ética, desenvolvimento
de capacidades cognitivas e operativas. (p. 47).
Ainda neste mesmo livro (Organização e gestão da escola; Teoria e Prática),
Libâneo (2004), citando outros teóricos que embasaram sua pesquisa e seu livro,
concebe a escola como um “espaço de síntese”. Esta concepção da escola como
um espaço de síntese consiste, do ponto de vista de Libâneo, na visão do espaço
educativo como o lugar onde se juntam e se mesclam duas formas básicas,
essenciais e ricas de construção e produção de conhecimento e saberes: a empírica
e a científica. A aprendizagem, tanto pelo senso-comum como pelo rigor técnico e
científico, faz parte da educação escolar dos alunos, mais notadamente em sala de
aula. Por este prisma, o entendimento da escola como uma agência de educação
conteudista ou bancária (Paulo Freire) deixa de existir no pensamento de Libâneo
(2004, p. 47).
Por isso, gradativamente, a escola vai se convertendo num "espaço
de síntese" (Colom Cañellas, 1994). A escola de hoje não pode
limitar-se a passar informação sobre as matérias, a
transmitir o conhecimento do livro didático. Ela é urna síntese entre a
cultura experienciada que acontece na cidade, na rua, nas praças,
nos pontos de encontro, nos meios de comunicação, na família, no
trabalho etc., e a cultura formal que é o domínio dos conhecimentos,
das habilidades de pensamento.
Fica notório, então, que o centro educativo chamado escola, não se resume
meramente a um centro de cursos disciplinares, ou seja, que tenha unicamente a
tarefa de ministrar conteúdos específicos de determinadas disciplinas escolares. A
escola é, na verdade, além de um centro de produção e construção de
conhecimentos lógicos e disciplinares, é, antes de tudo, um centro cultural; um lugar
onde se faz cultura, onde se troca cultura, onde se transforma a cultura e onde se é
transformado por esta mesma cultura.
Cultura é algo que transcende a disciplinaridade. Sendo assim, os assuntos
culturais consistem em temas transdisciplinares (que transcendem a
disciplinaridade).
35. 35
A cultura, seja na educação ou nas ciências sociais, é mais do que
um conceito acadêmico. Ela diz respeito às vivências concretas dos
sujeitos, à variabilidade de formas de conceber o mundo, às
particularidades e semelhanças construídas pelos seres humanos ao
longo do processo histórico e social.
Os homens e as mulheres, por meio da cultura, estipulam
regras, convencionam valores e significações que possibilitam a
comunicação dos indivíduos e dos grupos. Por meio da cultura eles
podem se adaptar ao meio, mas também o adaptam a si mesmos e,
mais do que isso, podem transformá-lo. (GOMES, Nilma Lino, p. 75,
76).
Segundo Rodrigues (1986, p.11), a cultura é como um mapa que orienta o
comportamento dos indivíduos em sua vida social.
De modo semelhante, com relação à cultura e a escola, Brunet (1988) afirma
que “As organizações escolares, ainda que estejam integradas num contexto cultural
mais amplo, produzem uma cultura interna que lhes é própria e que exprime os
valores e as crenças que os membros da organização partilham”. Assim, existem
dois tipos de cultura escolar: a cultura interna e a cultura externa à escola. A interna
diz respeito ao conjunto de significados e referências partilhados por membros de
uma comunidade ou organização escolar em particular e a externa diz respeito às
variáveis culturais que circundam a instituição e que interferem e influenciam nela
(NÓVOA, Antônio, 1999, p. 4).
Para Nóvoa (1999, p. 4), a escola também é organizada a partir de bases
conceituais e de pressupostos invisíveis, os quais são: as crenças, os valores e as
ideologias; e também de manifestações, as quais podem ser: verbais e conceituais
(objetivas, metafóricas, etc.); visuais e simbólicas (arquitetura, lemas, divisas, etc.); e
comportamentais (cerimônias, regulamentos, etc.). Essas bases conceituais,
pressupostos invisíveis e manifestações, Nóvoa (1999) chama de elementos da
cultura organizacional da escola ou também, segundo Libâneo (2004, p. 107),
currículo oculto da escola.
No capitulo XVI do livro: Organização e Gestão da Escola; Teoria e Prática,
José Carlos Libâneo (2004, p. 120, 121) explica que existem, em sentido
generalizado, duas concepções básicas, porém divergentes, sobre a função social e
política da educação escolar: “a concepção científico-racial e a concepção
sociocrítica” (p. 120). A escola, sob uma concepção científico-racial, é aquela que
tem uma visão de trabalho tecnicista, burocrática, fundamentada na hierarquização e
no autoritarismo de seus dirigentes. Baseia-se (a escola sob uma concepção
36. 36
científico-racial) em um estilo de gestão centralizada e foca-se mais nas tarefas do
que as relações entre as pessoas do trabalho. A escola, sob uma concepção
sociocrítica, é aquela que trabalha em uma perspectiva descentralizada de gestão.
Nela, o foco maior da atenção de seus líderes são as pessoas e as suas relações, e
não prioritariamente as tarefas. Os projetos e ações ocorridos numa escola sob esta
concepção (sociocrítica) são elaborados por todos de forma democrática e
colaborativa.
Pode-se olhar a escola sob ângulos diversos; sob os pontos de vista técnico,
social, politico, educativo, físico e institucional. Contudo, o papel educacional e
educativo da escola é a sua incumbência e responsabilidade maior, pois nisto
consiste a sua existência.
4.2 QUAL O PAPEL DO GESTOR EDUCACIONAL?
Na introdução deste capitulo foi falado sobre a diferença entre gestão
educacional e administração educacional e, a partir disto, é possível diferenciar a
função de um administrador escolar com relação à de um gestor educacional.
A diferença de um administrador para um gestor é que o administrador só
administrará o que se tem com o que se tem, enquanto que o gestor, além de
administrar o que se tem com o que se tem, ainda vai criar novas possibilidades e
situações, gerando recursos, soluções, etc. para a instituição que dirige. Entende-se,
então, neste sentido, que o gestor deve trazer situações novas e resultados e
conquistas novos à sua instituição. Portanto, gestar, além de administrar e gerenciar,
é também gerir, gerar e criar novos projetos, idéias, soluções, resultados e
conquistas. Ainda, ser gestor não é ser meramente um patrão, mas sim um líder no
campo em que trabalha.
Utilizamos, pois, a expressão organização e gestão da escola,
considerando que esses termos, colocados juntos, são mais
abrangentes que administração (LIBÂNEO, José Carlos, p. 100).
Esta reflexão sobre gestão serve também para o gestor educacional ou gestor
de uma escola, o qual não deve ser meramente um patrão em seu ambiente de
gestão, mas sim, como foi dito, um líder, ou seja, alguém disposto a e capaz de não
se limitar às barreiras e dificuldades encontradas em seu campo de gestão e
trabalho, buscando soluções e superações para as mesmas.
37. 37
Desta maneira, percebe-se que o conceito de alguns termos relacionados à
gestão e administração, quando referidos à escola, são diferentes do conceito dos
outros tipos de gestão e administração, por exemplo, da gestão e administração de
empresas convencionais. O termo dirigir/direção é um exemplo disto.
O significado do termo direção, tratando-se da escola, difere
de outros processos de direção, especialmente os empresariais. Ele
vai além daquele sentido de mobilização das pessoas para a
realização eficaz das atividades, pois implica intencionalidade,
definição de um rumo, uma tomada de posição perante os objetivos
sociais e políticos da escola, em uma sociedade concreta.
(LIBÂNEO, José Carlos, 2004, p. 140).
Porém, segundo José Carlos Libâneo (2004, p. 97-100), muitos teóricos que
estudam o campo da administração, organização, direção, gestão e tomada de
decisões, reúnem todas essas tarefas no conceito de administração, configurando
assim uma ciência ou teoria da administração, a qual pode ser aplicada à escola,
formando o conceito de administração escolar ou educacional. Concernente a esta
concepção de administração escolar ou educacional, a qual reúne em seu bojo as
demais tarefas de organizar, dirigir, planejar, etc., Santos (1966, p. 19) esclarece o
seguinte:
A administração escolar tem como objetivos essenciais
planejar, organizar, dirigir e controlar os serviços necessários à
educação. Ela inclui, portanto, no seu âmbito de ação, a organização
escolar.
No entanto, outros autores, segundo o mesmo Libâneo (2004, p. 98,99),
reconhecem as particularidades e especificidades das instituições escolares, as
quais se diferenciam, em muitas características, de empresas outras
(convencionais), tais como: de fabricação de papel, carro, lojas, mercados, etc..
Assim, esses autores defendem que, na escola, o conceito de administração é
subalterno ao conceito de organização. Dentre esses autores, pode-se citar
Lourenço Filho (1976):
Em uma de suas obras mais difundidas Lourenço Filho também
destaca o caráter grupal e cooperativo das instituições, definindo a
organização como ação congregada entre duas ou mais pessoas, à
qual a administração é subordinada. (LIBÂNEO, 2004, p. 100).
Gestar é algo complexo e requer entrega e dedicação. Augusto Cury
escreveu que um bom professor se utiliza de boas metodologias, porém, um
professor fascinante se utiliza de sensibilidade. Esta mesma sentença é valida para
o gestor de uma instituição escolar, pois tanto o professor como o gestor de uma
38. 38
escola têm como instrumento de trabalho a educação, e trabalhar com educação
significa trabalhar com vidas e com formação de personalidade. É devido a isto que
um gestor deve ter uma formação especifica em gestão, para que o mesmo
compreenda, antes de exercer a função, a realidade de gestar. Josemary Morastony
(2005), mestre em educação pela universidade Tuiuti do Paraná, escreveu que é
necessária uma formação específica para o exercício da função de gestor
educacional, dada a complexidade e especificidade da atuação deste profissional
dentro do contexto escolar (p.13). Quando uma escola tem um bom gestor, um bom
percentual dos problemas da mesma está resolvido.
Muitas pesquisas sobre a eficácia escolar indicam que a forma de gestão e
organização das escolas é responsável por 32% das variáveis de desempenho dos
alunos entre as escolas (ROSENHOLTZ, 1985). Isto mostra que mais de um terço
do desempenho dos alunos, positivo ou negativo, é reflexo da organização da escola
como um todo.
Para uma eficiente gestão escolar, é preciso conhecer os muitos elementos
que compõem o ambiente educativo. Antônio Nóvoa (1999, p.1), em seu artigo Para
uma análise das instituições escolares, propõe uma análise mezzo das escolas, e
não unicamente uma visão macro ou micro das mesmas. Entende-se que, ao se
referir à visão macro das escolas, trata-se da observação e intervenção no sistema
educacional vigente na escola, enquanto que, na visão micro, trata-se da
observação e intervenção nos processos educativos das mesmas, especialmente
em sala de aula. Visão mezzo, segundo Antônio Nóvoa (1999), nada mais é que a
focalização simultânea dos elementos macro e micro da instituição escolar. Assim, o
gestor educacional fará uma gestão (observação e intervenção) em nível micro e em
nível macro na escola que dirige, ou seja, fará uma gestão “educativa” e uma gestão
“educacional” na instituição escolar na qual é gestor. Quando se usa o termo “gestão
educativa”, refere-se à gestão da prática pedagógica da escola, como também, em
especial, à pedagogia usada em sala de aula. Esta é a gestão dos elementos “micro”
da escola e educação. O termo “educativo” denota a prática e vivência da educação
dentro da própria escola, sala de aula, comunidade e família em sentido mais
especifico e direto. Portanto, entende-se por gestão educativa, a gestão dos
seguintes elementos relacionados à escola: currículo, projeto político pedagógico, a
relação professor-aluno e a relação aluno-família e comunidade. Quanto à
expressão “gestão educacional”, refere-se à gestão dos elementos “macro” da
39. 39
escola e educação, por exemplo: gestão dos projetos, ações e programas
municipais, estaduais e federais a serem usados dentro dos estabelecimentos de
ensino, a gestão financeira da escola, contratação de funcionários e assim por
diante.
Portanto, educativo é um termo usado para as práticas diretas de ensino e
aprendizagem ocorridas em seus diversos níveis e setores, e educacional, termo
usado para órgãos, instituições, programas, sistemas e outros, voltados e
relacionados à educação, que proporcionarão que essas práticas educativas
ocorram com mais eficiência.
O papel do gestor educacional é multifuncional. Ele tem diversas
incumbências e responsabilidades para com a escola que dirige. Entretanto, a
principal função do gestor educacional é a tomada de decisão. Todas as demais
atividades e funções do gestor educacional convergem nesta principal tarefa do
gestor: tomar decisão. Libâneo (2004, p. 101) escreveu que:
Os processos intencionais e sistemáticos de se chegar a uma
decisão e de fazer a decisão funcionar caracterizam a ação que
denominamos gestão.
Ainda, esta função essencial do gestor educacional, a saber, tomar decisões,
pode ser feita basicamente sob duas concepções de administração: a técnico-
cientifica ou a democrático-participativa. A concepção de administração técnico-
cientifica é centralizadora, ou seja, o gestor concentra em seu poder toda tomada de
decisão a ser executada dentro da escola. É uma forma de gestão da escola a partir
da hierarquização, ou seja, de decisões tomadas em sentido vertical, de cima para
baixo, partindo do gestor para os seus liderados, sem coparticipação da comunidade
escolar nos processos decisórios. Já a gestão democrático-participativa, é aquela
que acontece com a participação da comunidade escolar nos processos decisórios
da escola (LUCK, 1996).
Além de decidir, o gestor educacional tem a função de supervisionar, avaliar e
integrar os funcionários da educação que trabalham em sua escola. Libâneo (2004,
p. 269) escreve em seu livro Organização e Gestão da Escola: Teoria e Prática, que
a atuação do gestor educacional na escola se dá em dois campos: no técnico-
administrativo e no pedagógico-curricular. O campo técnico administrativo refere-se
à gestão dos recursos físicos, materiais, financeiros e tecnológicos da escola. O
campo pedagógico-curricular refere-se à gestão dos seguintes elementos da escola:
40. 40
currículo, ensino, avaliação e semelhantes. Ainda, Libâneo (2004, p. 132) explica
que a função da gestão escolar consiste básica e principalmente em planejamento,
organização, direção e avaliação.
41. 41
5 MEDIAÇÃO DE CONFLITOS NA ESCOLA E O COMBATE À
VIOLÊNCIA ESCOLAR
5.1 VIOLÊNCIA ESCOLAR
A palavra “violência” é derivada da palavra “violentar” ou “violar”. Isto significa
que violência é todo ato/ação de violentar ou de violação do direito, individualidade
ou liberdade alheia.
Trata-se da negação de direitos básicos, um ataque à cidadania. Há
violência em toda ação consciente ou voluntária de um indivíduo,
grupo ou classe, com o propósito de impedir a outro indivíduo, grupo
ou classe, o pleno exercício de um direito. Tal ação pode ser direta
ou indireta, ou explícita, e comporta sempre a negação do outro.
Inclui atos paroxísticos que provocam danos físicos, morais e
psicológicos, mas não se esgota nos mesmos, podendo se
manifestar também em ações como o descaso, o desrespeito, a falta
de reconhecimento do valor social do outro. (LOPES, Claudivan
Sanches e GASPARIN, João Luiz 2003, p. 297).
No entanto, a expressão “violência”, na concepção de alguns autores,
também pode denotar intensidade, impetuosidade, etc. e não necessariamente um
ato de violação. Um determinado teórico define violência como:
Qualidade do que atua com força ou grande impulso; força, ímpeto,
impetuosidade (...) // intensidade (...) // irascibilidade // força que
abusivamente se emprega com o direito // opressão, tirania // ação
violenta // (jur.) constrangimento exercido sobre alguma pessoa para
obrigá-la a fazer ou a deixar de fazer um ato qualquer; coação
(CALDAS, Aulete, 1964, p. 4231-4232).
Assim, a expressão “violência” pode ou não anunciar uma ação negativa. Os
teóricos Claudivan Sanches Lopes e João Luiz Gasparin (2003, p. 296), em seu
artigo “Violência e conflitos na escola: desafios à prática docente”, também
esclarecem sobre a ambiguidade do sentido do termo “violência”. Eles dizem que:
Não pode passar despercebida a ambiguidade revelada. Como diz
Aquino (1998: 13), “o termo não implica exclusivamente uma
conotação negativa. Ou melhor, ele comporta uma ambivalência
semântica digna de interesse”. Por comportar significados tais como:
“força”, “vigor” ou “potência”, tal termo carrega, ao mesmo tempo,
conotações que podem ser positivas ou negativas. (p. 296).
Ainda, muitos teóricos fazem uma diferenciação entre a expressão “violência”
e a expressão “agressividade”. Segundo Claudivan Sanches Lopes e João Luiz
Gasparin (2003, p. 296), teóricos como Costa (1984), Fukui (1992), Candau, (2000)
e Laterman (2000) diferenciam “violência” de “agressividade”, ressaltando que a
42. 42
violência é uma ação intencional, voluntária e racional, cujo objetivo é destruir,
prejudicar o outro. Já a agressividade é uma ação instintiva (instintual), biológica,
natural dos animais, cujo objetivo é a sobrevivência (ou a auto-afirmação). Assim, a
partir do momento que uma ação agressiva na escola, praticada por um aluno ou
professor para com outro aluno ou professor (ou para com quem quer que seja),
imbuir-se de intencionalidade, voluntariedade e de desejo de destruição do outro,
esta ação agressiva transfigurou-se em uma ação violenta, segundo Claudivan
Sanches Lopes e João Luiz Gasparin (2003). Diante desta perspectiva, torna-se
necessário distinguir, na escola, uma ação de rebeldia/agressividade (a qual nem
sempre é de cunho negativo) de uma ação de delinquência (a qual é sempre de
cunho prejudicial).
A violência pode ser exercida em diversos campos da vida humana, tais
como: psicológico, moral, físico e sexual.
É notória também, a ocorrência acentuada da violência na escola,
principalmente na escola pública, e muitos e variados são os casos ocorridos.
Dentre estes, poder-se-iam citar a violência entre discentes e entre discentes e
docentes, sendo estes os casos mais frequentes de violência escolar detectados e
debatidos.
Diante desta situação (violência escolar), o medo tornou-se um sentimento
essencialmente presente no seio da escola: medo por parte dos professores, medo
por parte dos pais e medo por parte dos alunos. Lilia Maia de Morais Sales e
Emanuela Cardoso Onofre de Alencar (2004, p. 89,90), em seu artigo: Mediação de
conflitos escolares – uma proposta para a construção de uma nova mentalidade nas
escolas, dizem que, devido à propagação da violência nas escolas, medidas de
cunho policial tiveram que ser tomadas nas mesmas, como aconteceu nos Estados
Unidos. Segundo Lilia Emanuela (2004), muitas escolas dos E.U.A. de 1° e 2° graus
tiveram que implantar detectores de metal e outros tipos de monitoramentos para
evitar tragédias causadas por atos de violência praticados por alunos, como foi o
caso ocorrido em 20 de abril de 1999, na Columbine High School, escola norte-
americana, onde 2 alunos entraram armados nesta referida escola e atiraram contra
várias pessoas que estavam neste local, matando 12 colegas, uma professora e
depois suicidando-se.
43. 43
No Brasil, situações semelhantes já foram detectadas, tais como alunos
armados dentro da sala de aula, agressões morais e físicas de alunos contra
professoras e professores, por motivos banais ou não, dentre inúmeras outras.
As causas da propagação da violência escolar são diversas. Lilia Maia e
Emanuela Cardoso (2004, p. 90) trazem alguns dados coletados por pesquisadores
do tema, sobre as causas da violência praticada por jovens e adolescentes e que
acabam por se refletir na escola. Elas dizem que:
Os pesquisadores e estudiosos apresentam diversas justificativas
para as crescentes violências praticadas por crianças e jovens.
Apontam a perda de valores de solidariedade na sociedade, o
individualismo exacerbado, a deterioração das relações
interpessoais, problemas familiares e a pouca convivência dos jovens
com a família, uma vez que os pais passam o dia fora, trabalhando, e
os filhos ficam na convivência de terceiros.
Júlio Groppa Aquino (1998, p. 7,8), mestre e doutor em Psicologia Escolar
pelo Instituto de Psicologia da USP, tenta explicar as causas da violência escolar
sob duas perspectivas: uma, de cunho sociologizante, e outra de matiz mais clínico-
psicologizante. A perspectiva de cunho sociologizante consiste na influência que o
meio (politica, economia, cultura, família, mídia, etc.) exerce no individuo,
positivamente ou negativamente. A perspectiva de cunho clínico-psicologizante
consiste nas características da personalidade e temperamento dos indivíduos, como
também, se for o caso, em patologias nos mesmos. Assim, segundo Júlio Groppa
Aquino (1998), fatores macro (de cunho sociologizante) e fatores micro (de cunho
clínico-psicologizante) são conjuntamente responsáveis pelas reações e ações
violentas dentro da escola.
Todavia, a violência escolar não consiste unicamente em casos de
delinquência, de policia, de agressões físicas ou explícitas/visíveis. Violência escolar
é, na verdade, toda ação de recusa do direito escolar de outrem, restringindo o
desenvolvimento e a vivência de que esse precisa e que lhe é de direito.
Assim, podemos caracterizar a violência escolar como todo ato que
impede, em sentido amplo, o pleno desenvolvimento dos atores
sociais aí presentes. Trata-se da negação de direitos básicos, um
ataque à cidadania. (LOPES e GASPARIN, 2003, p. 297).
Ainda, os tipos de violência escolar são múltiplos. Podemos citar alguns, tais
como: a violência física, a violência moral, a violência intelectual, a violência
psicológica e a violência sexual. As causas dessas violências também são diversas.