O documento apresenta informações sobre a obra "A Balada da Praia dos Cães" e seu autor José Cardoso Pires. O romance investiga um assassinato ocorrido durante o regime ditatorial de Salazar em Portugal, retratando a vida triste e rotineira da polícia responsável pela investigação e como os problemas individuais dos personagens refletem a realidade coletiva da nação portuguesa à época.
1. OBRA: A BALADA DA PRAIA DOS CÃES
AUTOR: JOSÉ CARDOSO PIRES
2. José Augusto Neves Cardoso Pires nasce a 2 de outubro de
1925, na aldeia de Peso, no distrito de Castelo Branco, Nasceu
em São João do Peso, Castelo Branco, filho do oficial de
Marinha José António Neves e de Maria Sofia Cardoso Pires
Neves. Pela parte materna descende da média burguesia
rural e pelo lado paterno de emigrantes fixados nos Estados
Unidos, vem para Lisboa com poucos meses de idade. Fixa
residência nesta cidade, onde morre a 26 de outubro de
1998. É reconhecido como um dos mais importantes
escritores portugueses da segunda metade de século XX.
CABRAL, Eunice.José Cardoso Pires – Representações do mundo social na ficção
.
(1958-1982). Lisboa: Ed. Cosmos, 1999
3. José Cardoso Pires mencionou em entrevista, assim como
seu personagem Elias, que seu romance é “uma valsa de
conspiradores”, os quais espelham a necessidade de mentir
sempre, numa pátria em que se precisa manter uma fachada
de normalidade. Um olhar atento sobre
esses valsantes permite-nos perceber corpos fragmentados
e solitários, que estabelecem para si uma precária
identidade. A partir disso, podemos nos perguntar: que
identidade dão à Pátria portuguesa esses corpos dilacerados
pelo medo? Entendendo que os problemas individuais
refletem o coletivo, passamos a analisar as identidades
construídas para si mesmos por tais personagens, a fim de
pensar sobre a discussão que o texto propõe a respeito da
identidade nacional portuguesa.
6. A escrita deste romance revela-se
politizada, isto é, como os problemas
individuais vividos por tais
personagens refletem o coletivo.
Nesse caso, o coletivo é a própria
Pátria portuguesa, que vive um
tempo datadamente marcado pelo
regime salazarista.
9. Indivíduo de fraca compleição física, palidez acentuada, 1
metro e 73 de altura; olhos salientes, denotando um
avançado estado de miopia, cor de pele e outros sinais
reveladores de perturbações digestivas, provavelmente
gastrite crónica. No aspecto exterior nada de particular a
registrar como circulante do mundo em geral a não ser talvez
a unha do dedo mínimo que é crescida e envernizada, unha
de guitarrista ou de mágico vidente, e que faz realçar o anel
de brasão exposto no mesmo dedo. Veste habitualmente
casaco de xadrez, calça lisa e gravata de luto (para os
devidos efeitos) com alfinete de pérola adormecida;
caranguejo de ponteiros fluorescentes, marca Longines, que
usa no bolso superior do casaco com amarra de ouro presa à
lapela, carece de capilares no couro cabeludo, o crânio é
pautado por cabelinhos poucos mas poupados, e distribuídos
de orelha a orelha.
10. O chefe da brigada, Elias Santana, sob cuja visão
está centrada a maior parte do texto, é a figura
emblemática da desertificação da vida, da angústia e
da solidão. Já na abertura do romance, a descrição
física dessa personagem indicia a sua existência
desprovida de cor, de vida mesmo. A dispersão e a
fragmentação desse sujeito vêm expressas também
através dos vários nomes ou epítetos que lhe são
.
atribuídos no decorrer da narrativa
12. Filho de camponeses nordestinos, distrito de Vila Real, ingressou no
funcionalismo como amanuense do Tribunal Cível daquela cidade onde
passou à Polícia Judiciária na categoria de estagiário. Promovido com
distinção a agente de 2.a classe: idem a agente de 1ª classe com a
classificação de «Bom».
1) Iniciativa e imaginação satisfatórias, boas relações de trabalho.
2) Persistência e sentido promocional: Otero, enquanto agente da PJ
frequentou a Faculdade de Direito. Licenciatura difícil, prejudicada por
diligências na província e por romances com divorciadas, nenhuma das
quais com estatuto social apreciável.
3) Desajustamentos, complexos de afirmação: vestuário com
pretensiosismos de distinção; o cabelo, retintamente ruivo, que na
infância lhe causou algum isolamento. Otero revela frequentemente uma
certa passividade de rotina que pode atribuir-se à impossibilidade de
conciliar o trabalho na polícia com o estágio indispensável a um projeto
de exercer advocacia. Resíduos de um discreto e não confessado
anticlericalismo característico dos indivíduos que abandonaram o
Seminário.
15. Luís Dantas Castro (cadáver)
Ex-major do Exército que em
dezembro passado se tinha evadido
do Forte da Graça, em Elvas, onde
aguardava julgamento por
participação num abortado golpe
.
militar
17. 23 anos, solteira, que por autorização
superior visitou o major Dantas Castro
nas datas tais e tais e nas condições
de vigilância determinadas pelo
Regulamento. Um corpo sumptuoso; e
todo no concreto, cada coisa no seu
lugar, Coxas serenas e poderosas uma
jovem mulher com quem o major tinha
uma violenta e obsessiva relação antes
do seu encarceramento.
19. O arquiteto Fonte nova, outro havaiana
prisioneiro detido pelo seu envolvimento com a
revolta militar e membro do mesmo movimento
de resistência anti-salazarista.
20. Foco narrativo
A estrutura multifacetada de Balada da Praia dos
Cães é homóloga ainda à heterogeneidade de
vozes de personagens que se entrecruzam e
particularizam diferentes posicionamentos no
contexto narrativo, que se constitui, portanto, por
um mosaico de visões. Textos com uma
multiplicidade de narradores.
21. Espaço
Na narrativa permitir-nos á entender que o romance
se propõe a ouvir, ler, ver e verificar Portugal: a Casa
da Vereda como micro célula do espaço da Pátria; a
casa fechada e solitária de Elias, representativa da vida
desse personagem; as repartições públicas oprimidas
pela presença constante do retrato de Salazar; os
espaços de Lisboa referenciados com decrepitude.
Assim, não é gratuito que o texto do romance seja tão
marcadamente teatral, com inúmeras referências ao
espaço ocupado pelos personagens e a seus
movimentos.
22. Enredo
Escrito durante o período pós-revolucionário e publicado
em 1982, A balada da praia dos cães relata a
investigação de um assassinato.
.
23. A história começa com o relatório da descoberta de um
cadáver enterrado numa praia, graças a alguns cães que,
casualmente, dão com o morto sepultado na areia. Mais tarde
a polícia descobre tratar-se do major Luís Dantas Castro, um
militar preso por tentativa de sedição militar contra o regime
político vigente, e que escapara da prisão, indo recolher-se,
juntamente com três cúmplices: Mena, uma jovem mulher
com quem o major tinha uma violenta e obsessiva relação
antes do seu encarceramento, o arquiteto Fonte Nova, outro
prisioneiro detido pelo seu envolvimento com a revolta
militar e membro do mesmo movimento de resistência antisalazarista do Major, e o cabo Barroca, um guarda do campo a
cumprir o seu serviço militar.
24. O livro retrata a realidade e os métodos da polícia
em pleno regime do Estado Novo, bem como a
vida triste, rotineira e apagada de Elias Santana,
que é responsável pela investigação, chefe da
brigada da Polícia Judiciária, que vai reconstituindo
o crime graças sobre tudo aos interrogatórios feitos
a Mena, confirmados e completados mais tarde
pelos outros dois cúmplices, entretanto detidos.
Comprova-se que o major fora assassinado pelos
seus três companheiros de fuga.
25. Assim, ao elaborar uma ficção baseada em
um fato real, o texto de Cardoso Pires põe em
discussão as relações entre verdade e ficção,
com o objetivo não de consertar ou desvendar
a História, mas de recriar a realidade. Em
entrevista, o autor menciona: “No romance,
recria-se a realidade. Há numerosos
elementos que ali faço figurar, não porque
realmente constem do processo, mas porque
definem o ambiente, o tempo que se vivia.”
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