3. Pesquisar — O que e?
1. Desmitificando o conceito
#O processo de pesquisa está quase sempre cercado de ritos especiais, cujo
acesso é reservado a poucos iluminados.
#Por fim, isso permite associar-se a pequeno grupo acima da média, que,
além de perfazer a nata acadêmica, também tende a
exclusivizar acesso a recursos.
#É preciso reconhecer que a formação sofisticada do Pesquisador não é mal
em si.
#Em meio ás ciências sociais muito teorizantes, fazem bem exigências
específicas de tratamento empírico da realidade, tomando-se como aceitável
aquilo que tem comprovação factual.
#Facilmente
acontece que investimentos em pesquisa desse teor não conseguem ir além
de acumular alguns perfis estatísticos, irrelevantes no contexto histórico, o
que tem contribuído para dissociar sempre mais o processo de saber do
processo de mudar.
#A desmitifícação mais fundamental, porém, está na crítica à separação
artificial entre ensino e pesquisa.
#Tomada como marca definitiva da nossa realidade educativa e científica,
4. • #Todavia, libertar a pesquisa do exclusivismo sofisticado não pode levá-la ao exclusivismo oposto da
banalização cotidiana mágica.
• A desmitifícação mais fundamental, porém, está na crítica à separação artificial entre ensino e
pesquisa.
• a grande maioria dos professores só ensina, seja porque não domina sofisticações técnicas da
pesquisa, mas sobretudo porque admite a cisão como algo dado. #Fez “opção” pelo ensino, e passa
a vida contando aos alunos o que aprendeu de outrem, imitando e reproduzindo subsidiariamente.
• De si, as ciências sociais tratam da práxis histórica, do seu presente, passado e futuro.
• Como ator social, o pesquisador é fenômeno político, que, na pesquisa, o traduz sobretudo pelos
interesses que mobilizam os confrontos e pelos interesses aos quais serve.
• Assim, desmitificar a pesquisa há de significar também o reconhecimento da sua imisção natural na
prática, para além de todas as possíveis virtudes teóricas, em particular da sua conexão necessária
com a socialização do conhecimento.
• Professor é quem, tendo conquistado espaço acadêmico próprio através da produção, tem
condições e bagagem para transmitir via ensino.
• Quando a prática se reduz a “estágio”, extensão é necessária. Se, porém, prática fosse curricular, já
é extensão.
• Dito isso, cabe explicitar que o nosso posicionamento compreende a pesquisa não só como busca
de conhecimento, mas igualmente como atitude política, sem reducionismo e embaralhamento,
num todo só dialético.
# Pesquisa é processo que deve aparecer em todo
trajeto educativo, como princípio educativo que é, na
base de qualquer proposta emancipatória.
5. 2. Horizontes múltiplos da pesquisa
# A acumulação da pesquisa também passa quase exclusivamente pela montagem de
conhecimento empírico validado.
*O primeiro reconhecimento é que não se pode fazer levantamento empírico sem o
concurso dos outros horizontes, aqui subsumidos em teoria, método e prática.
*Mesmo quando colocamos o desafio correto de que a pesquisa é descoberta da
realidade, trata-se de um conceito estreito de realidade, se a restringirmos à sua
manifestação empírica.
E tanto mais tratável cientificamente, aquilo que é mensurável, experimentável,
observável.
*Neste sentido, ciência vive do desafio imorredouro de descobrir realidade que,
sempre de novo, ao mesmo tempo se descobre e se esconde.
*Se isto for correto, a pesquisa coloca outro desafio: desfazer a aparência visível,
observável, para surpreender a realidade por trás disso.
*E fundamental que a ciência os capte, principalmente é essencial que não reduza a
realidade ao tamanho do que consegue captar.
*De partida, é mister ressaltar que ao lado da preocupação empírica deve haver
preocupação teórica.
*Se numa teoria nunca está inclusa a realidade toda, mas tão-somente a maneira de
a conceber, muito menos seria pensável encerrar em manifestações empíricas.
6. Domínio teórico significa a construção, via pesquisa, da capacidade de relacionar
alternativas explicativas, de conhecer seus vazios e virtudes, sua história, sua
consistência, sua potencialidade, de cultivar a polêmica dialogai construtiva, de
especular chances possíveis de caminhos outros ainda não devassados.
A importância da hermenêutica está precisamente no reconhecimento de que a
interpretação é inevitável. A hermenêutica é a arte de descobrir a entrelinha para
além das linhas, o contexto para além do texto, a significação para além da palavra.
# O bom teórico é sobretudo aquele que sabe bem perguntar, colocando a teoria no
devido lugar: instrumentação criativa diante de realidade sempre furtiva.
“é importante ressaltar a preocupação metodológica.“Pesquisa metodológica” pode
parecer algo ainda mais estranho, porque predomina a expectativa de que método se
aprende, não se cria. Sobretudo em estatística, a atitude típica é a de estar diante de
“pacote” que temos de engolir.”
# É preciso lembrar que a distinção entre ciência e outros saberes está no método,
sobretudo.
Por fim, outro horizonte da pesquisa é a prática, por mais que as ciências sociais,
contraditoriamente, possam estranhar tal postura.
Teoria e prática detêm a mesma relevância científica e constituem no fundo um todo
só. Uma não substitui a outra e cada qual tem sua lógica própria.
7. 3. A pesquisa como descoberta e criação
Em metodologia científica, descobrir e criar não são a mesma coisa.
#Na descoberta criou-se conhecimento novo, não realidade nova, embora a partir
daí se possa inventar usos novos do conhecimento.
#A revolução do modo de produção se dá objetiva e necessariamente, como
resultado inexorável do desenvolvimento das forças produtivas.
# Nunca se cria do nada, porque a história tem sempre antecedentes e
conseqüentes, mas na fase nova pode predominar o novo, ao que se dá o nome de
revolução.
A história vem concebida como, de um lado, condicionada por estruturas dadas,
naturais e sociais, que jamais podem ser ignoradas, e, de outro lado, condicionada
pela possível intervenção humana, que não precisa submeter-se passivamente às
circunstâncias dadas ou encontradas.
8. 4. A pesquisa como diálogo
Ao mesmo tempo, questionar inclui comunicar criticamente o próprio ponto de vista e
receber criticamente o ponto de vista do outro.
#Como diálogo, é necessária comunicação e a socialização do saber faz parte integrante
da sua produção, sem falar na ligação estrutural e histórica entre teoria e prática.
# Pesquisar, assim, é sempre também dialogar, no sentido específico de produzir
conhecimento do outro para si, e de si para o outro, dentro de contexto comunicativo
nunca de todo devassável e que sempre pode ir a pique.
#No fundo, pesquisa passa a ser a maneira primeira de o ator político se colocar, se
lançar, seja no tatear cuidadoso em ambiente desconhecido ou hostil, seja no medir as
próprias forças diante de forças contrárias, seja na instrumentação estratégica da
ocupação de espaço.
•Quem sabe dialogar com a realidade de modo crítico e criativo faz da pesquisa condição
de vida, progresso e cidadania.
*Educação criativa começa na e vive da pesquisa, desde o primeiro dia de vida da
criança.
De certa maneira, pesquisa se confunde com a filosofia, em seu sentido original: apreço
pela sabedoria, tanto em sua modéstia que sabe antes de mais nada que pouco sabe,
como em sua exuberância que a tudo questiona, inclusive a si mesma (Abbagnano, 1989).
9. A pesquisa
como principio cientifico
*Não se trata de imitar padrões externos de universidade, mas é possível deles
aprender, desde que não se faça cópia subalterna.
*Cremos que visão alternativa de pesquisa seria fermento apto a recolocar a
universidade no caminho das esperanças sociais nela depositadas, o que exige
criatividade, intenso diálogo com a realidade, disciplina e compromisso histórico
produtivo.
1. A questão curricular
Tomemos aqui, de partida, currículo na noção corrente de proposta de
ensino/aprendizagem, na qual se define, grosso modo, o que e como estudar.
Sem ressaltar no momento o lado da pesquisa como princípio educativo, bastaria
trazer à cena a pesquisa como princípio científico, para demarcar o absurdo que é o
mero ensinar e o mero aprender.
A noção de professor precisa ser totalmente revista, sem recair em preciosismos
importados de fora.
10. a) em primeiro lugar, é pesquisador, nos sentidos
relevados: capacidade de diálogo com a realidade,
orientado a descobrir e a criar, elaborador da ciência,
firme em teoria, método, empiria e prática;
b) é, a seguir, socializador de conhecimentos, desde que
tenha bagagem própria, despertando no aluno a mesma
noção de pesquisa;
c) é, por fim, quem, a partir de proposta de
emancipação
que concebe e realiza em si mesmo, torna-se capaz de
motivar o novo pesquisador no aluno, evitando de todos
os modos reduzi-lo a discípulo subalterno.
11. Por exemplo, quem dá aula de introdução à educação faz isso porque é capaz de
escrever — pelo menos de reescrever à sua maneira — o que seria introdução à
educação.
#Esta postura permite afirmar que somente tem algo a ensinar quem pesquisa.
Em termos muito simplificados, pode-se dizer que, no plano da teoria, é mister exigir
capacidade própria de elaboração, e, no plano da prática, capacidade de recriar teoria
e de unir saber & mudar.
-Ainda é importante repisar a necessidade de atualização constante, que faz parte da
pesquisa como questionamento cotidiano, com vistas a evitar o instrutor que passa
uma vida toda dizendo sempre a mesma coisa, à revelia do progresso científico, o que
significa precariedade dupla: apenas copiar, e surrar a cópia.
12. 2. A questão da teoria & pratica
Nem a teoria é maior, nem a prática.
-é comum que um educador versado em teoria crítica da educação construa
questionamentos brilhantes da prática educativa na escola.
Prática, como teoria, perfaz um todo, e como tal está na teoria, antes e depois.
Sobretudo, prática não aparece apenas como demonstração técnica do domínio
conceituai, mas como modo de vida em sociedade a partir do cientista.
* Na formação de educador, caberia, de partida, colocar que, em seu currículo, deve
aparecer tempo inicial de preparação propedêutica, de carga mais teórica, digamos,
forte dose de estudo da metodologia científica e da teoria referencial, como
fundamentos da formação geral todo educador e como ferramenta para elaboração
Própria. A seguir aparece o sentido da especialização, com dose crescente de prática.
No final das contas, esse planejador educacional não se restringe a discussões, mas
constrói seus próprios métodos de avaliar.
13. 3. “Dar conta de um tema”
O trabalho pessoal de pesquisa encontra expressão própria no desafio de
assumir um tema para elaborar e defender, ainda que possa restringir-se à
produção teórica.
Mas a organização curricular aponta para outra direção. O primeiro passo é
aprender a aprender, que significa não imitar, copiar, reproduzir. A verdadeira
aprendizagem é aquela construída com esforço próprio através de elaboração
pessoal.
O professor tem seu lugar, como pesquisador e orientador, para motivar no
aluno o surgimento do novo mestre. Faz parte do conceito de criatividade,
“saber se virar”, inventar saídas, sobretudo “aprender a aprender”, e isto é
profundamente pesquisa.
14. 4. A questão da avaliação
A avaliação pode não respeitar o ritmo de cada um em seu desenvolvimento
intelectual e social, partindo para comparações externas e de cima para baixo.
Todavia, como não adianta mascarar a desigualdade social, a avaliação acaba
tornando-se inevitável e tem o seu protótipo mais duro na “mercadoria”, que tem
custo.
Exemplo disso é a comparação forçada de identidades culturais, que não são
superiores ou inferiores, a não ser que as sujeitemos a parâmetros externos prévios de
comparação.
Avaliar é pesquisar, se bem compreendido. Fugir em princípio da avaliação já é
compadrio com a mediocridade e a esperteza, que passam a substituir competência
acadêmica.
15. A pesquisa como principio educativo
1. Educação, pesquisa e emancipação
Emancipação é o processo histórico de conquista e exercício da qualidade de
ator consciente e produtivo.
Conceber e executar projeto emancipatório supõe de modo geral dois suportes
mais visíveis, que são a busca de auto-sustentação e de autogestão, algo
econômico e político.
2. Limitacoes do apenas ensinar
No “ensinar” cabe menos o desafio da emancipação com base em pesquisa do
que a imposição domesticadora que leva a reproduzir discípulos.
A sala de aulas, lugar em si privilegiado para processos emancipatórios através da
formação educativa, toma-se prisão da criatividade.
16. 3. Limitações do apenas aprender
A escola continua curral formal, onde o gado é tratado. Aluno, como discípulo, é
gado. Numa analogia forte, é como penico, que tudo aceita sem reclamar, e acha
que não passa disso.
o único recurso é colar. Não se sabe deduzir, induzir, inferir, estabelecer relações,
reconstruir contextos. Resta copiar.
Tal condição reduz o aluno ao “mero aprender”, obstruindo passos da
criatividade própria.
A própria proposta informativa deve estar voltada para a formação, não apenas
sob o ângulo da aplicabilidade concreta do saber, mas igualmente da
instrumentação científica da cidadania.
17. 4. Vazios da escola formal
A influência da escola sobre a criança é cada vez mais “formal” e, neste sentido, vazia,
pela artificialidade da sua organização distanciada da sociedade diária ou pela
concorrência avassaladora com os meios de comunicação.
A miséria da escola é o retrato da miséria da
cidadania.
É essencial que, mesmo sendo espaço formal,
assuma posição mais visível e decisiva na
sociedade, na linha do conceito de pesquisa
aqui veiculado.
18. Espera-se um “profissional recriado”,
muito diferente dos
vigentes, capaz de construir um
projeto próprio educativo
e assistencial, ao mesmo tempo
competente cientificamente
e participativo politicamente.