1. ATENÇÃO À SAÚDE DO ADULTO
TUBERCULOSE
1ª Edição
SECRETARIA DE ESTADO DE SAÚDE DE MINAS GERAIS
Belo Horizonte, 2006
2. GOVERNO DO ESTADO DE MINAS GERAIS
Governador
Aécio Neves da Cunha
SECRETARIA DE ESTADO DE SAÚDE DE MINAS GERAIS
Secretário
Marcelo Gouvêa Teixeira
SUPERINTENDÊNCIA DE ATENÇÃO À SAÚDE
Superintendente
Benedito Scaranci Fernandes
GERÊNCIA DE ATENÇÃO BÁSICA
Gerente
Maria Rizoneide Negreiros de Araújo
GERÊNCIA DE NORMALIZAÇÃO DE ATENÇÃO À SAÚDE
Gerente
Marco Antônio Bragança de Matos
COORDENADORIA DO PROGRAMA DE PNEUMOLOGIA SANITÁRIA
Coordenador
Edílson Corrêa de Moura
Aporte financeiro
Este material foi produzido com recursos do Projeto de Expansão e Consolidação da Saúde da
Família - PROESF
Projeto gráfico e editoração eletrônica
Casa de Editoração e Arte Ltda.
Ilustração
Mirella Spinelli
Produção, distribuição e informações Secretaria de Estado de Saúde de Minas Gerais
Rua Sapucaí, 429 – Floresta – Belo Horizonrte – MG – CEP 30150 050
Telefone (31) 3273.5100 –
E-mail: secr.ses@saude.mg.gov.br
Site: www.saude.mg.gov.br
1ª Edição. 2006Aut
MINAS GERAIS. Secretaria de Estado de Saúde. Atenção à
WF
Saúde do Adulto: Tuberculose.Belo Horizonte, 2006.
250
144 p.
MI
1. Saúde do adulto - Tuberculose. 2. Tuberculose - Atenção à Saúde
AT
do Adulto.I.Titulo.
3. AUTORES
Ailton Cezário Alves Júnior
Cláudia Hermínia Lima e Silva
Edílson Corrêa de Moura
4.
5. APRESENTAÇÃO
A situação da saúde, hoje, no Brasil e em Minas Gerais, é determinada por dois
fatores importantes. A cada ano acrescentam-se 200 mil pessoas maiores de 60 anos à
população brasileira, gerando uma demanda importante para o sistema de saúde (MS,
2005). Somando-se a isso, o cenário epidemiológico brasileiro mostra uma transição:
as doenças infecciosas que respondiam por 46% das mortes em 1930, em 2003 foram
responsáveis por apenas 5% da mortalidade, dando lugar às doenças cardiovasculares,
aos cânceres e aos acidentes e à violência. À frente do grupo das dez principais causas da
carga de doença no Brasil já estavam, em 1998, o diabete, a doença isquêmica do coração,
a doença cérebro-vascular e o transtorno depressivo recorrente. Segundo a Organização
Mundial de Saúde, até o ano de 2020, as condições crônicas serão responsáveis por 60%
da carga global de doença nos países em desenvolvimento (OMS, 2002).
Este cenário preocupante impõe a necessidade de medidas inovadoras, que mudem
a lógica atual de uma rede de serviços voltada ao atendimento do agudo para uma rede de
atenção às condições crônicas.
Para responder a essa situação, a Secretaria de Estado de Saúde de Minas Gerais
estabeleceu como estratégia principal a implantação de redes de atenção à saúde em cada
uma das 75 microrregiões do estado que permitam prestar uma assistência contínua à
população. E a pré-condição para a eficácia e a eqüidade dessa rede é que o seu centro de
coordenação seja a atenção primária.
O programa Saúde em Casa, em ato desde 2003, tendo como objetivo a melhoria da
atenção primária, está construindo os alicerces para a rede de atenção à saúde: recuperação
e ampliação das unidades básicas de saúde, distribuição de equipamentos, monitoramento
através da certificação das equipes e avaliação da qualidade da assistência, da educação
permanente para os profissionais e repasse de recursos mensais para cada equipe de saúde
da família, além da ampliação da lista básica de medicamentos, dentro do programa
Farmácia de Minas.
Como base para o desenvolvimento dessa estratégia, foram publicadas anteriormente
as linhas-guias Atenção ao Pré-natal, Parto e Puerpério, Atenção à Saúde da Criança e
Atenção Hospitalar ao Neonato, e, agora, apresentamos as linhas-guias Atenção à Saúde do
Adolescente, Atenção à Saúde do Adulto (Hipertensão e Diabete, Tuberculose, Hanseníase
e Hiv/aids), Atenção à Saúde do Idoso, Atenção em Saúde Mental e Atenção em Saúde
Bucal e os manuais da Atenção Primária à Saúde e Prontuário da Família. Esse conjunto
de diretrizes indicará a direção para a reorganização dos serviços e da construção da rede
integrada.
Esperamos, assim, dar mais um passo na consolidação do SUS em Minas Gerais,
melhorando as condições de saúde e de vida da nossa população.
Dr. Marcelo Gouvêa Teixeira
Secretário de Saúde do Estado de Minas Gerais
6.
7. AGRADECIMENTOS
Agradecemos a todos os profissionais
da Secretaria de Estado de Saúde de Minas
Gerais que se empenharam na elaboração
desta linha-guia e de maneira especial ao Dr.
Edílson Corrêa de Moura pela sua dedicação
ao combate à tuberculose no Estado de Minas
Gerais.
Agradecemos ao Ministério da Saúde/
Fundação Nacional de Saúde, à Sociedade
Brasileira de Pneumologia e Tisiologia e
ao Centro de Referência Professor Hélio
Fraga, através de sua equipe brilhantemente
coordenada pelo Dr. Miguel Aiub Hijjar,
cujas publicações têm norteado o controle da
tuberculose no Brasil, sendo a base bibliográfica
para a redação desta linha-guia.
8.
9. COMENTÁRIOS DE VALIDAÇÃO
Graças aos esforços da Coordenação Estadual de Pneumologia Sanitária, o estado
de Minas Gerais conta com um Plano de Ação do Programa de Controle de Tuberculose,
desde 2005, que prevê atividades de aumento da cobertura do tratamento supervisionado
e humanizado e melhoria da rede pública de laboratórios para baciloscopia e cultura.
Destaca-se também a maior integração da Secretaria Estadual de Saúde com os municípios
e importantes ações educativas e de promoção da saúde.
Temos a certeza que a implantação deste Plano muito contribuirá para levar o flagelo
da tuberculosa aos níveis aceitáveis diante dos recursos tecnológicos disponíveis, há anos,
e que nem sempre vêm sendo disponibilizados de forma eficiente para a população.
No âmbito federal a tuberculose foi definida como um problema prioritário de saúde
cabendo às Secretarias Estaduais e Municipais a coordenação e execução das atividades
de controle que integram os diferentes componentes do Programa.
A construção do importante instrumento LINHA-GUIA PARA O CONTROLE DA
TUBERCULOSE NA ATENÇÃO BÁSICA, graças aos esforços da competente equipe
técnica do estado vem levar uma proposta de organização a todos municípios mineiros,
com clara definição das atribuições das equipes de saúde e responsabilidades gerenciais
definidas para cada nível da estrutura. Aqui, segundo as diferentes realidades locais,
são detalhados exaustivamente normas e procedimentos para as atividades de controle;
definição da logística, papel e atribuições de cada categoria profissional tanto para
assistência propriamente dita, quanto para as atividades de Vigilância Epidemiologia. As
atividades de avaliação representam uma busca contínua de maior qualidade.
Enfim, este instrumento, linha e guia, vem auxiliar de forma consistente e clara o
exercício diário dos profissionais que lutam para melhorar a saúde de nosso povo e que
sempre respondem a investimentos desta natureza.
Saudamos esta importante iniciativa no combate a tuberculose no Brasil que
contribuirá para maior qualificação e expansão de cobertura do controle e o alcance de
nossos principais objetivos que são o de reduzir, de modo significativo, a incidência
e mortalidade causadas pela tuberculose e como consequência diminuindo o sofrimento
humano e melhorando a qualidade de vida.
Miguel Aiub Hijjar
Diretor do Centro de Referência Prof. Hélio Fraga
Secretaria de Vigilância em Saúde
Ministério da Saúde
10.
11. SUMÁRIO
Introdução .................................................................... 13
Uma visão humanizada sobre o paciente com tuberculose ... 14
I. As diretrizes para o atendimento .............................. 17
1.1 O acolhimento do usuário ................................. 19
1.2 Sinais de risco ................................................... 20
1.3 Sinais de alerta ................................................. 20
1.4 A população de risco ........................................ 23
II. As ações de promoção à saúde e prevenção
da doença ...................................................................27
2.1 Ações de promoção à saúde ............................... 29
2.2 Ações de prevenção da doença .......................... 29
III. Abordagem clínica ................................................... 41
3.1 A tuberculose .................................................... 43
3.2 O atendimento na unidade básica de saúde ...... 84
3.3 Especialidade: qual e quando será necessária.... 91
3.4 Patologias associadas a serem consideradas ...... 91
3.5 Apoio diagnóstico: qual exame e quando fazer .. 95
IV A organização da assistência .................................... 97
.
4.1 As competências das unidades de saúde ........... 99
4.2 A definição dos profissionais envolvidos .......... 102
4.3 As atribuições dos profissionais ....................... 102
4.4 O tratamento supervisionado .......................... 107
V. A vigilância epidemiológica e o
sistema de informação............................................ 111
5.1 Os sistemas de informação do
Ministério da Saúde ........................................ 113
5.2 A vigilância epidemiológica da tuberculose .......... 119
5.3 Sites interessantes ........................................... 120
5.4. Indicadores, parâmetros e fontes para
monitoramento ............................................... 121
Anexos ...................................................................... 127
Referências Bibliográficas............................................ 142
12.
13. INTRODUÇÃO
INTRODUÇÃO
O que mais falar sobre uma doença que através dos milênios vem fazendo adoecer
e sucumbir milhões de pessoas? O que dizer sobre uma enfermidade que apesar de ter
sua etiopatogenia reconhecida, tratamento e cura disponível foi atualmente considerada
uma emergência mundial pela Organização Mundial de Saúde (OMS) levando ao óbito
anualmente quase 3 milhões de pessoas no planeta?
A tuberculose é a doença infecto-contagiosa que mais mata jovens e adultos no
mundo. Com o advento do HIV e da multidrogarresistência, essa morbidade colore
novamente um cenário preocupante.
No nosso país, a tuberculose ainda mata aproximadamente 6 mil brasileiros por ano e
adoece cerca de 100 mil pessoas. É sabido que contribuem para a grave situação o aumento
da pobreza, a má distribuição de renda e a urbanização acelerada. Tais fatores encontram-
se particularmente presentes em determinadas regiões de nosso país, especialmente na
sudeste, resultando em coeficientes de incidência da doença superiores aos nacionais.
Minas Gerais, com 18 milhões de habitantes e 84% da população urbanizada,
apresentava em 2002 a maior taxa de analfabetismo, o menor PIB per capita e a maior
proporção de pobres da região sudeste. Contabilizaram-se, portanto, no Estado, 6.323
casos novos notificados da doença, no ano de 2004, concentrados em sua grande maioria
nas cidades com maior aglomeração urbana de Minas Gerais.
A tuberculose tem deixado seu registro nas gerações e hoje se constitui,
inexoravelmente, um excelente marcador epidemiológico da qualidade de vida dos povos.
Mais que isso, essa enfermidade marca a necessidade de uma grande reflexão para uma
articulação melhor e mais harmônica entre a prática clínica e a prática sanitária a fim de
que possamos não somente ousar em dizer que curamos a doença, mas, que possibilitamos
a reinclusão social dos nossos pacientes que, em sua maioria, estão vivendo em um estado
de orfandade cidadã, sendo, em última análise, esse o principal fator desencadeante da
doença no indivíduo.
Pela magnitude de nosso Estado, melhorar os indicadores epidemiológicos da doença
em Minas Gerais significa melhorar os indicadores nacionais, de modo a atingirmos os
preconizados 85% de cura e 5% de abandono.
Para isso acontecer é necessário um Programa de Controle da Tuberculose que
permita a melhoria do acesso ao serviço e da informação à população, em geral, aliada à
rapidez do diagnóstico, garantia de medicamentos, sistema de informação eficiente e uma
abordagem personalizada e humanizada do indivíduo.
Coordenadoria Estadual da Pneumologia Sanitária/SES/MG
13
14. ATENÇÃO À SAÚDE DO ADULTO – TUBERCULOSE
UMA VISÃO HUMANIZADA SOBRE O
PACIENTE COM TUBERCULOSE
“O ser humano não sobrevive à indiferença. Todos nós necessitamos de ser
reconhecidos, que as pessoas nos identifiquem e nos valorizem”.
LERCH
A OMS declarou ser a tuberculose uma emergência mundial por estar fora de controle
em muitas partes do mundo.
A desestruturação familiar, as carências pessoais, as drogadições (particularmente
o alcoolismo), a falta de assistência social e a miséria concorrem para a baixa adesão ao
tratamento.
Frente ao agravamento da situação pela epidemia da Aids e ao aumento da tuberculose
multidrogarresistente, o Brasil desenvolveu um Plano Emergencial que descentralizou
recursos, dirigindo-os para os municípios com maior incidência.
Os profissionais de saúde passam a ter um papel diferenciado na assistência ao
paciente, ajudando-o a concluir o tratamento com êxito.
Em respeito a essa “emergência”, a OMS tem adotado para o controle eficaz da
tuberculose a estratégia DOTS (Tratamento de curta duração diretamente supervisionado)
que tem por princípios:
Disponibilidade de uma rede descentralizada de diagnóstico e de tratamento.
Boa gestão de programas baseados na gestão responsável e supervisão de
trabalhadores da atenção à saúde.
Um sistema de busca de casos novos e recaídas;
Garantia da baciloscopia para detecção de casos;
Observação direta do paciente durante todo o tratamento;
Sistema de notificação e de acompanhamento de casos que permita verificar o
resultado do tratamento e do programa de controle da tuberculose.
14
15. INTRODUÇÃO
A educação em saúde é também estratégia fundamental, pois alia a aquisição de
informações e aptidões básicas com o senso de identidade, autonomia, solidariedade e
responsabilidade do indivíduo com a sua própria saúde e a da comunidade. Combina
conhecimento, aptidões e atitudes.
A maneira de tratar o usuário assegura o sucesso do tratamento.
Como fatores para o sucesso de qualquer tratamento, podemos apontar a adesão
ao tratamento, regularidade do uso da medicação, a completude do regime prescrito
e o comparecimento às consultas com regularidade. O bom desempenho da equipe
multidisciplinar de saúde é estratégico para a adesão do paciente ao tratamento, a fim de
identificar fatores que poderiam incorrer em risco de abandono, quer por razões ligadas ao
próprio paciente ou às condições ambientais ou sociais em que esse vive.
A identificação de uma ou mais dessas condições, e outras eventualmente detectadas
em cada realidade, exige uma modalidade de tratamento diferenciado que assegura a
adesão e a completude do tratamento. Apontamos a alteridade e o acolhimento como
fatores essenciais numa abordagem humanizada, pois o “ser humano” é um ser que existe,
pensa, envolve-se, emociona-se e que necessita de interagir, receber atenção, orientação e
respeito.
Coordenadoria Estadual
de Pneumologia Sanitária/SES/MG
15
19. AS DIRETRIZES PARA O ATENDIMENTO
1.1 O ACOLHIMENTO DO USUÁRIO
“O Acolhimento vem se constituindo numa das ferramentas utilizadas para iniciar
mudanças no processo de trabalho em saúde com vistas a garantir o acesso a serviços
de saúde humanizados, resolutivos, de qualidade, e com responsabilização coletiva dos
trabalhadores com as necessidades de saúde dos usuários”. (Mishima, 1995).
A assistência ao usuário sintomático respiratório suspeito de portar o bacilo
da tuberculose ou sabidamente enfermo se baseia na promoção da saúde, prevenção,
diagnóstico precoce e recuperação da doença. O adequado acompanhamento desse
indivíduo é fundamental para o êxito esperado, que é o controle da tuberculose.
Assim sendo, o usuário deve idealmente encontrar ou mesmo ser um colaborador
na construção de uma assistência organizada que garanta, com uma avaliação de risco
adequada, um ágil acesso ao serviço de saúde.
A captação precoce de casos compreende tanto os métodos de diagnóstico como as
ações organizadas para operacionalizá-los, envolvendo os serviços e a comunidade. Essas
ações estão voltadas para os grupos com maior probabilidade de apresentar tuberculose,
quais sejam: sintomáticos respiratórios (pessoas com tosse e expectoração por três semanas
ou mais); contatos de casos de tuberculose; suspeitos radiológicos; pessoas com doenças e/
ou em condição social que predisponham à tuberculose. Os contatos, definidos como toda
pessoa, parente ou não, que coabita com um doente de tuberculose, constituem-se em um
grupo para o qual se recomenda uma atitude de busca ativa, para a captação precoce.
Os locais ideais para se organizar a procura de casos são os serviços de saúde,
públicos ou privados. Nessas instituições – Unidades Programas da Saúde de Famíla
(PSF), centros de saúde, ambulatórios e hospitais – realizar busca ativa de sintomáticos
respiratórios deve ser uma atitude permanente e incorporada à rotina de atividades de todos
os membros das equipes de saúde. Nas áreas onde as ações já estão organizadas, a visita
domiciliar periódica do agente de saúde deve incluir a detecção de casos entre sintomáticos
respiratórios e contatos, principalmente de casos bacilíferos e crianças. Quando necessário,
deve-se referenciá-los ao serviço de saúde.
Atenção especial deve ser dada a populações de maior risco de adoecimento,
representadas sobretudo por residentes em comunidades fechadas, como presídios,
manicômios, abrigos e asilos. Nessas comunidades, justifica-se a busca ativa periódica de
casos. Indivíduos das categorias alcoólicos, usuários de drogas, mendigos, trabalhadores
de saúde e outros em situações especiais em que haja contato próximo com paciente
portador de tuberculose pulmonar bacilífera são também prioritários para essa ação.
Também incluem-se nessa categoria os imunodeprimidos por uso de medicamentos ou por
doenças imunossupressoras.
A responsabilidade coletiva dos trabalhadores com as necessidades de saúde dos
usuários passa também por um atendimento embasado em procedimentos técnicos
programados que visam proteger os pacientes e a própria equipe profissional.
No acolhimento, os pacientes devem ser informados sobre a transmissão do
M. tuberculosis e orientados a cobrir a boca e o nariz quando tossir ou espirrar, utilizando-se
19
20. ATENÇÃO À SAÚDE DO ADULTO – TUBERCULOSE
preferencialmente de um lenço, para reduzir a geração de partículas infectantes no ambiente.
Caso o paciente não tenha meios para isso, deverão ser providenciados lenços de papel
ou máscaras cirúrgicas (comuns) para fornecer aos pacientes suspeitos ou confirmados de
tuberculose. Cartazes enfatizando essas medidas devem ser colocados nas salas de espera
ou locais de fácil visibilidade. Aborde o paciente com respeito e profissionalismo sempre.
1.2 SINAIS DE RISCO
Os profissionais de saúde devem ser treinados para identificar as evidências de
sinais e sintomas clínicos de risco para a tuberculose (TB) e analisar seus comportamentos
evolutivos. A partir das evidências, organiza-se a investigação para chegar a conclusões
válidas. As principais evidências a serem consideradas estão listadas no quadro 1.
Quadro 1 – Evidências importantes a considerar no diagnóstico da tuberculose
1. A tuberculose se manifesta por uma síndrome infecciosa de curso crônico, com febre baixa, geralmente
vespertina.
2. É uma doença que consome, debilitando e emagrecendo as pessoas.
3. Sudorese noturna, adinamia e hiporexia podem ser encontradas.
4. A mais freqüente localização é pulmonar e a tosse com expectoração por mais de 3 semanas é um
sintoma importante, que pode evoluir para escarros sangüíneos e hemoptise.
5. Nas formas extrapulmonares, o quadro clínico varia conforme a localização e a gravidade do caso.
6. A forma extrapulmonar mais prevalente, a pleural, pode se apresentar com quadro agudo de dor
torácica e febre, que freqüentemente é confundido com quadro pneumônico.
7. As formas primárias atingem as crianças, sendo uma doença muito comum na faixa de 15 aos 50
anos.
8. Contatos com pessoas recém-tratadas para tuberculose ou que tiveram a doença nos últimos dois anos
são significativos.
9. Idosos, diabéticos e pessoas infectadas pelo vírus HIV têm maior probabilidade de adoecer por
tuberculose. (Afirmação válida para regiões com alta prevalência de tuberculose).
1.3 SINAIS DE ALERTA
O Conselho Federal de Medicina, através da resolução 1451/95 definiu como
URGÊNCIA a “ocorrência imprevista de agravo à saúde com ou sem risco potencial de
vida, cujo portador necessita de assistência médica imediata” e como EMERGÊNCIA a
“constatação médica de agravo à saúde que implique risco iminente de vida , ou sofrimento
intenso, exigindo, portanto, o tratamento médico imediato”.
Conforme classificação de risco estabelecida pela Secretaria Estadual de Saúde de
Minas Gerais, os sinais de alerta podem ser distribuídos quanto à conduta de urgência x
emergência de acordo com o designado no Quadro 2 a seguir:
20
21. AS DIRETRIZES PARA O ATENDIMENTO
Quadro 2: Classificação de risco para os sinais de alerta
Nível 1 – Emergência: será identificada pela cor VERMELHA.
Nível 2 – Urgência: será identificada pela cor AMARELA.
Nível 3 – Encaminhamentos rápidos: será identificada pela cor VERDE.
Nível 4 – Não Urgência: será identificada pela cor AZUL.
A tuberculose pulmonar é a forma clínica mais comum. As formas extrapulmonares
mais freqüentes são pleural, ganglionares e meníngea. Essas duas últimas formas tiveram
aumento gradual de incidência provavelmente devido à coinfecção por HIV. Em relação à
tuberculose, a classificação de risco para os sinais de alerta, isoladamente, está explicitada
a seguir:
SINAL CONJUNTO
SINAIS DE ALERTA AVALIADO DE SINAIS
ISOLADAMENTE COMPATÍVEL COM
Escarros sanguíneos, hemoptises e sinais de dificuldade
respiratória, tais como dispnéia e utilização de
NÍVEL 2
musculatura acessória (por atelectasia, hiperinsuflação
(Amarelo)
obstrutiva, síndrome do lobo médio e broncopneumonia Tuberculose pulmonar
tuberculosa)
Choque hipovolêmico e parada cardio-respiratória (por NÍVEL 1
hemoptise maciça) (Vermelho)
Dor torácica tipo pleurítica, febre e tosse seca de
NÍVEL 2
instalação súbita ou insidiosa, com cansaço de
(Amarelo)
intensidade variável pelo derrame pleural Tuberculose pleural
NÍVEL 3
Dor torácica tipo pleurítica isolada
(Verde)
Sinais e sintomas de toxemia ocasional (calafrios,
sudorese, etc), taquipnéia, descoramento e febre de
NÍVEL 2
intensidade variável, com diminuição da expansibilidade
(Amarelo)
pulmonar sem ruídos adventícios no comprometimento Tuberculose miliar
pulmonar
Hepatomegalia freqüente (35%) e linfadenomegalia
NÍVEL 4 (Azul)
periférica (em até 30% dos pacientes)
Febre persistente com irritabilidade, cefaléia,
comprometimento e paralisia de pares cranianos
(principalmente 4º, 2º, 3º, 6º, e 8º pares), alterações
NÍVEL 1
sensoriais, déficits focais e/ou movimentos anormais
(Vermelho)
(convulsão) evoluindo com sinais clínicos de
Tuberculose
hipertensão craniana, como edema de papila na retina,
meningoencefálica
vômitos, letargia, estupor e rigidez de nuca
Tubérculos coróides na retina (sinal muito sugestivo
de tuberculose e presente em até 80% dos casos de NÍVEL 1
meningoencefalite por essa etiologia) (Vermelho)
21
22. ATENÇÃO À SAÚDE DO ADULTO – TUBERCULOSE
Irritabilidade, cefaléia, comprometimento e paralisia de
pares cranianos, alterações sensoriais, déficits focais e/ NÍVEL 1
ou movimentos anormais (convulsão) devido a infartos (Vermelho)
por dano vascular com trombose Tuberculoma
Sinais clínicos de hipertensão craniana, como edema de intracraniano
papila na retina, vômitos, letargia, estupor e rigidez de NÍVEL 1
nuca pela obstrução à livre circulação do líquor, muitas (Vermelho)
vezes com hidrocefalia
Dor e aumento do volume articular no segmento ósseo
atingido, com posição antálgica nas lesões cervicais e NÍVEL 3 Tuberculose
torácicas, paraplegias e gibosidade quando na forma (Verde) osteoarticular
mais encontrada, situada na coluna vertebral
Dor lombar (na hidronefrose), urgência urinária e NÍVEL 2
Tuberculose renal
hematúria, observada nas fases mais avançadas (Amarelo)
Debilidade física por emagrecimento NÍVEL 3
(Verde)
Sinais de desnutrição severa NÍVEL 2
Tuberculose em geral
(Amarelo)
Outros, de acordo com o local e o grau de NÍVEL 2
acometimento da tuberculose. (Amarelo)
Sinais e sintomas de toxicidade hepática (vômitos,
alteração das provas de função hepática, hepatite),
hematológica (trombocitopenia, leucopenia, eosinofilia,
NÍVEL 2
anemia hemolítica, agranulocitose e vasculite graves) Efeitos adversos
(Amarelo)
ou renal (nefrite intersticial, rabdomiólise com maiores das
mioglobinúria e insuficiência renal) por efeitos adversos medicações
maiores das medicações tuberculostáticas
Sinais e sintomas de toxicidade neurológica (psicose,
NÍVEL 1
crise convulsiva, encefalopatia tóxica e coma) por
(Vermelho)
efeitos adversos maiores das medicações
1.3.1 Indicações de internação do paciente com tuberculose
com sinais de alerta
A. Presença ao exame clínico de:
sinais de dificuldade respiratória importantes: tiragens intercostais, batimentos de
aletas nasais e balanço tóraco-abdominal nas crianças;
cianose, hipoxemia;
irregularidade respiratória, apnéia;
dificuldade para se alimentar com vômitos e desidratação;
alteração do sensório (confusão mental, irritabilidade);
22
23. AS DIRETRIZES PARA O ATENDIMENTO
instabilidade hemodinâmica (pulsos finos, perfusão capilar lenta, hipotensão),
taquicardia importante;
sinais radiológicos de maior gravidade: pneumonia extensa associada,
pneumatoceles, pneumotórax, derrame pleural extenso;
sinais e sintomas de meningoencefalite tuberculosa, tuberculoma intra-craniano e
tuberculose miliar;
sinais e sintomas de toxicidade hepática, neurológica, hematológica ou renal por
efeitos adversos graves das medicações.
B. Outras condições associadas como a desnutrição grave e Aids.
C. Situação social seriamente comprometida.
D. Falha do tratamento ambulatorial de urgência.
E. Indicações cirúrgicas.
(Fonte: Adaptado de VIANA, Maria Regina Et al. Atenção à saúde
da criança.Belo Horizonte: SAS/DNAS, 2004. p. 112 e 143).
Na presença de sinais e sintomas de alerta (toxicidade) por efeitos adversos maiores
das medicações tuberculostáticas deve-se orientar o paciente, suspender o tratamento até
a resolução clínica e laboratorial e referenciar o paciente à atenção secundária ou terciária,
após a avaliação adequada.(Controle da tuberculose: uma proposta de integração ensino-
serviço. 5 ed. Rio de Janeiro: FUNASA/CRPHF/SBPT, 2002. p. 32.)
Em praticamente todos os outros sinais e sintomas de alerta o paciente deve receber
terapia sintomática, com suporte especializado quando necessário e disponível, e iniciar,
o mais precocemente possível o tratamento específico com os tuberculostáticos caso ainda
não o tenha realizado, na unidade básica de saúde.
1.4 A POPULAÇÃO DE RISCO
Por ser a tuberculose uma doença infecciosa e contagiosa que se propaga pelo ar por
meio de gotículas, contendo os bacilos de Koch expelidos por um doente ao tossir, espirrar
ou falar em voz alta, e que, ao serem inalados por pessoas sadias provocam a infecção
tuberculosa e o risco de desenvolver a doença, a população de risco deve ser identificada
e a procura de casos obrigatória.
1.4.1 Os fatores de risco
Entre outras características, destacamos as seguintes que o profissional necessariamente
tem de computar no seu raciocínio: idade, estado imunológico e nutricional e doenças
intercorrentes. A tuberculose é uma doença que atinge principalmente as pessoas na idade
23
24. ATENÇÃO À SAÚDE DO ADULTO – TUBERCULOSE
produtiva entre 15 e 59 anos (70%), tendo características distintas segundo as faixas de
idade. Entre 15 e 29 anos, ela reflete a tuberculose primária de pessoas recém-infectadas e,
portanto, quando ela tem elevados índices, há uma grande possibilidade de haver muitas
fontes de infecção na região. Os estados imunológico e nutricional (desnutrição em criança)
guardam íntima relação e toda avaliação, mesmo que não aprofundada do ponto de vista
laboratorial, deve ser feita pelo médico como elemento de raciocínio. Várias doenças,
principalmente por interferência nas defesas imunológicas, podem afetar a evolução da
tuberculose como o caso do sarampo e mais recentemente, como veremos a seguir a
epidemia de Aids. O alcoolismo crônico em razão do seu cortejo, envolvendo queda da
imunidade, desnutrição, fragilidade social, exposições a situações de risco, entre outros é um
importante problema associado à tuberculose, tanto por aumentar sua incidência quanto
por retardar a sua recuperação, devendo inclusive analisar os aspectos comportamentais
associados a tratamentos prolongados, como é o caso. O uso de drogas imunossupressoras
se constitui um elevado risco em pessoas já infectadas, que passam a estar mais sujeitas ao
adoecimento.
Acrescenta-se, entre os fatores de risco para a população, os seguintes:
Desigualdade social (e suas implicações);
Grandes movimentos migratórios;
Envelhecimento da população;
Confinamentos populacionais.
Os homens apresentaram uma incidência de TB maior que a das mulheres, em uma
razão de 1.8/1, de acordo com dados do SINAN/2000. Isso significa que aproximadamente
65% dos casos eram homens e 35% mulheres (dados Brasil – Ministério da Saúde, 2002).
As faixas etárias com maiores incidências, por 100.000 habitantes, no ano de 2000
foram:
40 – 49 anos (91.7);
50- 59 anos (85.4);
30- 39 anos (85.1).
TUBERCULOSE E AIDS
A associação da Tuberculose/Aids representa um novo desafio em escala mundial.
O aparecimento do vírus da imunodeficiência humana (HIV) modifica a epidemiologia da
tuberculose e dificulta seu controle. A Organização Mundial da Saúde (OMS) calcula cerca
de 5 a 10 milhões de indivíduos infectados atualmente no mundo pelo HIV. Destes, de 2 a
8 % vão desenvolver a síndrome completa (Aids), estimando-se a ocorrência de 500.000 a
3.000.000 de casos novos de Aids nos próximos 5 anos.
A infecção por HIV é o maior fator de risco para se adoecer por tuberculose em
indivíduos previamente infectados pelo bacilo. Por outro lado, é uma das primeiras
complicações entre os infectados pelo HIV, surgindo antes de outras infecções freqüentes,
24
25. AS DIRETRIZES PARA O ATENDIMENTO
devido à maior virulência do bacilo da tuberculose, independente do comprometimento
significativo do sistema imunológico.
Os números dessa associação são preocupantes, pois a evolução do estado de
infecção para o adoecimento é muito diferente entre pessoas imunocompetentes e aquelas
infectadas pelo HIV. Enquanto na primeira as chances de que a infecção tuberculosa evolua
para a doença tuberculosa são de 10% ao longo de sua vida, no indivíduo infectado pelo
HIV essa chance passa a ser de 8 a 10% ao ano. Em 1999, a OMS estimava a existência de
33,6 milhões de pessoas vivendo com HIV/Aids e de 637 mil casos de TB associada com
HIV, no mundo.
A tuberculose tem sido um dos principais complicadores dos infectados pelo HIV. Nos
países da África, da América Latina e em algumas populações de países desenvolvidos,
30% a 60% dos infectados com HIV estão coinfectados pelo bacilo da tuberculose.
Segundo o Ministério da Saúde (MS), no Brasil, entre 1980 e junho de 2000,
ocorreram 190.523 casos de Aids. Estima-se que 20% a 40% desenvolveram tuberculose,
o que poderia mudar a tendência da doença no grupo etário de 15 a 49 anos, e em regiões
de grande prevalência da infecção pelo HIV. É importante destacar que a tuberculose é a
única doença contagiosa associada a infecção por HIV, que também é infectante e que pode
ser transmitida a indivíduos não infectados pelo HIV. A tuberculose é a mais prevenível,
curável e transmissível de todas as infecções que acompanham a infecção por HIV.
Estimativas do MS, em 2002, mostram que no Brasil havia 43.600.000 pessoas
infectadas com o bacilo da tuberculose e aproximadamente 130.000 novos casos da doença
por ano, dos quais 57.000 infectantes e 10.000 coinfectados com HIV.
Com relação à coinfecção TB-HIV, estimaram-se que 8,0% dos casos de tuberculose
seriam também soropositivos para HIV, o que corresponderia, em todo o mundo, a 640.000
casos de TB-HIV, entre os pacientes soropositivos.
Considerando que a maioria dos casos de infecção por HIV ocorrerá em adultos
sexualmente ativos (15-49 anos) e assumindo que o risco de infecção com HIV e tuberculose
são independentes, a OMS estimou que 10 milhões de pessoas no mundo estariam co-
infectadas (0,18% da população mundial). Em 1990, 4,25% de casos de tuberculose foram
atribuídos à interação com HIV e, para 2000, esperava-se 13,8%.
1.4.2 As áreas de risco
O problema da tuberculose, no Brasil, reflete o estágio de desenvolvimento social
do país, em que os determinantes do estado de pobreza, principalmente nos bolsões de
miséria da periferia das grandes cidades, e as fraquezas da organização do sistema de
saúde inibem a queda sustentada dessa doença.
Observando o comportamento da transmissão da doença e as características
individuais associadas à tuberculose, é possível entender porque a tuberculose é um
problema social. Os principais elementos que contribuem para isso são:
25
26. ATENÇÃO À SAÚDE DO ADULTO – TUBERCULOSE
Renda familiar baixa
Educação precária
Habitação ruim/inexistente
Famílias numerosas
Adensamentos comunitários
Desnutrição alimentar
Alcoolismo
Doenças infecciosas associadas
Dificuldade de acesso aos serviços de saúde
Fragilidade da assistência social
Assim, pode-se inferir quais os locais no espaço urbano que têm alto potencial de
reprodução da endemia de tuberculose que seriam favelas, mocambos, alagados, invasões,
populações agrupadas em calamidades públicas, populações que vivem em ambientes
socialmente fechados (escolas, creches, presídios, casas correcionais, abrigos sociais ou idosos,
etc.) e população com elevado percentual de pessoas infectadas pelo HIV. No espaço periurbano
e rural, as populações indígenas possuem elevado risco de evolução da endemia.
Entretanto, embora a tuberculose encontre-se habitualmente localizada prefe-
rencialmente nos locais de grande aglomeração urbana, verifica-se atualmente o processo
de ruralização da doença, resultado entre outros do fluxo migratório de pessoas campo-
cidade e vice-versa e das precárias condições socioeconômicas que acometem também as
zonas rurais.
1.4.3 A definição de população-alvo
Os grupos com maior probabilidade de apresentar tuberculose são:
Sintomáticos respiratórios (pessoas com tosse e expectoração por 03 semanas ou
mais);
Contatos de casos de tuberculose;
Suspeitas radiológicas;
Pessoas com doenças e/ou condições sociais que predisponham à tuberculose.
Nesses grupos a atitude permanente de BUSCA ATIVA (serviços de UBS, visitas
domiciliares, saúde, postos, centros de saúde, ambulatórios e hospitais) é fundamental.
Atenção deve ser dada a populações de maior risco do adoecimento:
Residentes em ambientes fechados (escolas, presídios, manicômios, creches,
abrigos e asilos);
Alcoólatras, usuários de drogas, população de rua e trabalhadores de saúde;
População indígena;
Imunodeprimidos (por uso de medicamentos ou por doenças como a Aids).
26
27. II. AS AÇÕES DE PROMOÇÃO À
SAÚDE E PREVENÇÃO DA DOENÇA
28.
29. AS AÇÕES DE PROMOÇÃO À SAÚDE E PREVENÇÃO DA DOENÇA
2.1 AÇÕES DE PROMOÇÃO À SAÚDE
Considerando que a única forma de reduzir a incidência e a mortalidade pela tuberculose
é detectar pelo menos 70% dos casos e curar pelo menos 85% dos pacientes, é necessário
reforçar as ações de conscientização da população, buscando parcerias na comunidade e nas
várias esferas de governo de forma a garantir, também melhores condições de vida, como
uma boa alimentação e moradia adequada. As principais ações são:
Promover comportamento saudável – tal comportamento pode ser valorizado
por ocasião do tratamento supervisionado, capaz de identificar e trabalhar os
condicionantes do processo saúde-doença, da busca ativa de contatos, de incentivos
financeiros, etc. (Ex: vale-transporte, vale-alimentação, cesta básica.) Ações e
materiais educativos como panfletos e folders podem divulgar os cuidados com a
saúde.
Treinamento de profissionais de saúde envolvidos em técnicas preventivas,
diagnósticas e de tratamento.
Integração dos sistemas de serviços de saúde com outros sistemas sociais e
econômicos através de uma ação intersetorial para o desenvolvimento de melhores
condições de saúde individual e coletiva.
2.2 AÇÕES DE PREVENÇÃO DA DOENÇA
O pilar estratégico para a prevenção da tuberculose é a atenção primária à saúde.
Nesse contexto, salientamos que a prevenção visa à realização de intervenções de
modo a alcançar indivíduos, grupos sociais em risco de adoecer ou a sociedade em geral,
como a melhoria das condições de vida e maiores investimentos em saúde pública.
No caso da tuberculose, temos dois tipos de intervenções – no nível individual e
social:
Descoberta de casos e tratamento (medida mais eficaz);
Vacinação com BCG;
Quimioprofilaxia.
Entre as intervenções preventivas gerais, temos:
Ações educativas visando à divulgação das condicionantes da doença (processo
de informações, educação e comunicação social);
Medidas de biossegurança que são medidas de controle da transmissão da
tuberculose, em unidades de saúde, preconizados pela OMS.
2.2.1 Controle de contatos
Todos os contatos dos doentes de tuberculose, prioritariamente dos pacientes
pulmonares positivos, devem comparecer à unidade de saúde para exame. No diagrama
29
30. ATENÇÃO À SAÚDE DO ADULTO – TUBERCULOSE
a seguir, apresenta-se a conduta para exame dos contatos. Quando diagnosticada a
tuberculose em crianças, a equipe de saúde deverá examinar os contatos adultos para
busca do possível caso-fonte. Após serem examinados e não sendo constatada tuberculose-
doença, deve-se orientá-los a procurarem a unidade de saúde, em caso de aparecimento
de sintomatologia respiratória.
Avaliação dos contatos domiciliares de casos de
tuberculose pulmonar baciloscopia positiva
Adulto
Assintomático** Sintomático
Orientação Exame de escarro (baciloscopia)
Positivo Negativo
Tratamento
Cultura Rx de tórax
Positiva Negativa S/alterações Sugestivo
+
Cultura positiva
Tratamento
Avaliar diagnóstico na Referência Tratamento
Crianças até 15 anos
Não vacinado Vacinado
Assintomático Sintomático*
PPD
Não-reator Reator Orientação Raio x tórax
BCG Raio X tórax Sugestivo de Normal
TB + sintomas e sem
clínicos sintomas clínicos
Sugestivo de Normal
TB + sintomas e sem
clínicos sintomas clínicos Tratamento Orientação medicação
sintomática
acompanhamento
Tratamento Quimioprofilaxia
* Quando houver escarro, realizar baciloscopia
** Quando disponível, realizar Raio X
Fonte: Tuberculose – Guia de Vigilância Epidemiológica. FUNASA/MS. 2002. p.37.
30
31. AS AÇÕES DE PROMOÇÃO À SAÚDE E PREVENÇÃO DA DOENÇA
2.2.2 Vacinação BCG
A vacina BCG exerce notável poder protetor contra as manifestações graves da
primo-infecção, como as disseminações hematogênicas e a meningoencefalite, mas não
evita a infecção tuberculosa. A proteção se mantém por 10 a 15 anos. A vacina BCG não
protege os indivíduos já infectados pelo M. tuberculosis. Por isso, nos países com elevada
prevalência de infecção tuberculosa, como o nosso, as crianças devem ser vacinadas o
quanto antes possível, após o nascimento. Nas áreas geográficas com alta prevalência de
infecção por micobactérias não-tuberculosas, a margem de proteção do BCG contra a
tuberculose é reduzida, razão por que nessas regiões o seu rendimento é baixo em termos
de saúde pública.
VACINAÇÃO E CICATRIZ DA VACINA BCG
A vacinação BCG deve ser realizada segundo orientações
do Programa Nacional de Imunização do Ministério da Saúde
Dose e administração da vacina
No Brasil, a vacina BCG é prioritariamente indicada para as crianças de zero a quatro
anos de idade, sendo obrigatória para menores de um ano, como dispõe a Portaria nº 452,
de 6/12/1976, do Ministério da Saúde.
A aplicação da vacina é rigorosamente intradérmica, no braço direito, na altura da
inserção inferior do músculo deltóide, em caso de primo-vacinação, e 1cm a 2cm acima, na
revacinação. Essa localização permite a fácil verificação da existência de cicatriz para efeito
de avaliação do programa e limita as reações ganglionares à região axilar. A vacina BCG
pode ser simultaneamente aplicada com outras vacinas, mesmo com as de vírus vivos.
Outros aspectos relacionados com a aplicação da vacina BCG, como conservação,
material utilizado, técnicas e procedimentos, constam do Manual do Programa Nacional de
Imunizações.
31
32. ATENÇÃO À SAÚDE DO ADULTO – TUBERCULOSE
Recomenda-se vacinar
Os recém-nascidos, sempre que possível na maternidade, desde que tenham peso
igual ou superior a 2kg e sem interferências clínicas.
Observação: Os recém-nascidos contatos de tuberculosos bacilíferos farão
previamente a quimioprofilaxia, conforme exposto no item que trata desse
procedimento preventivo.
Os recém-nascidos, filhos de mães com Aids.
Crianças soropositivas para HIV ou filhos de mães com Aids, desde que sejam
tuberculino-negativas e que não apresentem os sintomas dessa síndrome.
Os vacinados nessas condições deverão ser acompanhados pela vigilância
epidemiológica, nas unidades de referência para Aids.
Contatos de doentes com hanseníase. Nesses casos, deve-se seguir as normas
estabelecidas pelo Programa de Controle da Hanseníase.
A aplicação de duas doses da vacina BCG deve ser feita a todos os contatos
intradomiciliares dos casos de hanseníase independentemente da forma clínica; o
intervalo recomendado para a 2ª dose da vacina BCG é a partir de seis meses após a
1ª dose (considerada a cicatriz por BCG prévia como 1ª dose, independentemente
do tempo de aplicação). Na dúvida, aplicar as duas doses recomendadas;
a aplicação da 1ª dose da vacina está condicionada à realização do exame
dermatoneurológico; na ocasião do exame dermatoneurológico o contato deve ser
bem orientado quanto ao período de incubação, transmissão, sinais e sintomas da
hanseníase e retorno ao serviço, se necessário; todo contato deve também receber
orientação no sentido de que não se trata de vacina específica para a hanseníase
e que prioritariamente está destinada ao grupo de risco, contatos intradomiciliares.
Em alguns casos, o aparecimento de sinais clínicos de hanseníase, logo após a
vacinação, pode estar relacionado com o aumento da resposta imunológica em
indivíduo anteriormente infectado.
Profissionais de Serviços de Saúde e novos profissionais admitidos nesses serviços
serão vacinados desde que sejam negativos à tuberculina. Para os profissionais
lotados nos serviços de saúde de hansenianos, o procedimento da vacinação
obedecerá às normas mencionadas no item anterior.
Observação: Sempre que houver indicação de vacinação BCG em adultos,
recomenda-se o aconselhamento para a realização do teste de detecção do HIV.
32
33. AS AÇÕES DE PROMOÇÃO À SAÚDE E PREVENÇÃO DA DOENÇA
Contra-indicações da vacinação BCG
Relativas
Recém-nascidos com peso inferior a dois quilos.
Afecções dermatológicas no local da vacinação ou generalizada.
Uso de imunodepressores.
Observação: Nesses casos, a vacinação será adiada até a resolução das situações
apontadas.
Absolutas
HIV positivos-adultos (independentemente dos sintomas) e crianças sintomáticas.
Imunodeficiência congênita.
Evolução da lesão vacinal, eventos adversos e conduta
A vacina BCG não provoca reações gerais, tais como febre ou mal-estar. Normalmente,
nos menores de um ano, grupo prioritário, a reação local da vacina é de evolução lenta
e benigna, variando de indivíduo para indivíduo. Desde que a injeção intradérmica seja
corretamente aplicada, a lesão vacinal evolui da seguinte forma:
em torno da segunda semana, palpa-se uma zona endurecida cujas dimensões
variam de 3mm a 9mm;
da quinta a sexta semana, o centro dessa lesão amolece, formando uma crosta;
quando essa crosta cai, deixa em seu local uma úlcera de cerca de 2mm a 6mm de
diâmetro, que desaparece lentamente, entre a oitava e a décima-terceira semanas,
deixando como resultado uma cicatriz plana, com diâmetro de 3mm a 7mm. Em
alguns casos, essa cicatrização é mais demorada, podendo prolongar-se até o
quarto mês e, raramente, além do sexto mês.
Não se deve, no entanto, colocar qualquer medicamento nem cobrir a úlcera resultante
da lesão de evolução normal; apenas mantê-la limpa, usando água e sabão.
O enfartamento ganglionar axilar, não supurado, pode ocorrer durante a evolução
normal da lesão vacinal, desaparecendo, espontaneamente, sem necessidade de tratamento
medicamentoso e/ou cirúrgico (drenagem).
As complicações da vacina BCG, aplicada por via intradérmica, são pouco freqüentes.
A maior parte resulta de técnica imperfeita, como aplicação profunda (subcutânea),
inoculação de dose excessiva ou contaminação. As complicações mais comuns são abcessos
no local da aplicação, úlcera de tamanho exagerado e gânglios flutuantes e fistulados. Em
caso de eventos adversos para notificação, devem-se observar as orientações contidas nos
quadros 2.1, 2.2, 2.3 e 2.4 do manual de Vigilância Epidemiológica dos Eventos Adversos
Pós-vacinação, das páginas 13 a 16.
33
34. ATENÇÃO À SAÚDE DO ADULTO – TUBERCULOSE
O tratamento dessas complicações é feito com a administração de isoniazida, na
dosagem de 10mg/kg de peso (até, no máximo, 300mg), diariamente, até a regressão
da lesão, o que ocorre, em geral, em torno de 45 dias. Os abcessos frios e os gânglios
enfartados podem ser puncionados quando flutuantes, mas não devem ser incisados. Na
prática de Saúde Pública, têm sido raras as complicações decorrentes da aplicação de
BCG. Quando se notar, na rotina dos serviços de saúde, um aumento considerável do
número de casos, convém rever o treinamento dos vacinadores.
A cicatriz quelóide pode ocorrer em indivíduos com propensão genética,
independentemente da técnica de aplicação. Seu aparecimento é mais freqüente em
pessoas já infectadas ou naquelas revacinadas.
Outras complicações, como lupus vulgaris e osteomielite são raras, não havendo
registro de ocorrência no Brasil. Lesões generalizadas são ainda mais raras e, em geral,
associadas à deficiência imunológica.
2.2.3 Revacinação BCG
Em 1995, baseando-se em estudos do exterior e recomendações da Organização
Mundial da Saúde (posteriormente retirada), o Ministério da Saúde do Brasil passou a
recomendar uma dose de reforço da vacina BCG ID a partir dos seis anos de idade. A
Secretaria de Saúde do Estado de Minas Gerais acatou inicialmente a orientação e criou um
grupo de estudo sobre o problema, com participação de sociedades e faculdades médicas.
Esse grupo acabou por recomendar à SES-MG a manutenção da dose, estabelecendo a
idade de 10 anos como recomendada.
Recentemente foram concluídos dois importantes estudos brasileiros (um prospectivo
realizado em Manaus e Salvador, outro retrospectivo realizado em Recife) que não
demonstraram benefício do uso da dose de reforço, e sim ressaltam a importância da
primeira dose. Diante disso o Comitê Técnico Assessor em Imunização do Programa
Nacional de Imunizações (CTAI-PNI), tomou as seguintes decisões:
recomendar a suspensão da dose de reforço da BCG ID;
reafirmar a grande importância do uso da primeira dose;
recomendar ao PNI a elaboração de um documento técnico pormenorizado a ser
distribuído para as Unidades Federadas e municípios brasileiros;
manter a programação de estudos sobre BCG ID e a continuidade do estudo
prospectivo anteriormente citado (em andamento)
Diante do exposto, a SES-MG, através de sua Coordenadoria de Imunização,
recomenda aos municípios do Estado a suspensão da aplicação da dose de reforço da
BCG ID, informando a população sobre as razões desta decisão.
34
35. AS AÇÕES DE PROMOÇÃO À SAÚDE E PREVENÇÃO DA DOENÇA
2.2.4 Quimioprofilaxia
A quimioprofilaxia deve ser administrada em pessoas infectadas pelo M. tuberculosis,
com o uso da isoniazida na dosagem de 10 mg/kg de peso, com total máximo de 300 mg
diariamente, durante seis meses.
Na atualidade, há consenso de que a quimioprofilaxia deve ser dirigida aos grupos
de alto risco de tuberculose, entre estes, especialmente os coinfectados pelo HIV e pelo M.
tuberculosis.
2.2.4.1 Indicações de quimioprofilaxia
Recém-nascidos coabitantes de foco tuberculoso ativo. A isoniazida é administrada
por três meses e, após esse período, faz-se à prova tuberculínica. Se a criança
for reatora, a quimioprofilaxia deve ser mantida por mais três meses; senão,
interrompe-se o uso da isoniazida e vacina-se com BCG.
Crianças menores de 15 anos, não vacinadas com BCG, que tiveram contato com
um caso de tuberculose pulmonar bacilífera, sem sinais compatíveis de tuberculose
doença, reatores à tuberculina de 10mm ou mais; crianças vacinadas com BCG,
mas com resposta à tuberculina igual ou superior a 15 mm.
Observação: Na eventualidade de contágio recente, a sensibilidade à tuberculina
pode não estar exteriorizada, sendo negativa a resposta tuberculina. Deve-se, portanto,
nesse caso, repetir a prova tuberculínica entre 40 e 60 dias. Se a resposta for positiva,
indica-se a quimioprofilaxia; se negativa, vacina-se com BCG.
Indivíduos com viragem tuberculínica recente (até 12 meses), isto é, que tiveram
um aumento na resposta tuberculínica de, no mínimo, 10mm.
População indígena. Neste grupo, a quimioprofilaxia está indicada em todo o
contato de tuberculoso bacilífero, reator forte ao PPD, independentemente da
idade e do estado vacinal, após avaliação clínica e afastada a possibilidade de
tuberculose-doença, por baciloscopia e pelo exame radiológico.
Imunodeprimidos por uso de drogas ou por doenças imunodepressoras e contatos
intradomiciliares de tuberculosos, sob criteriosa decisão médica.
Reatores fortes à tuberculina, sem sinais de tuberculose ativa, mas com condições
clínicas associadas a alto risco de desenvolvê-la, como:
• Alcoolismo.
• Diabetes mellitus insulinodependente.
• Silicose.
• Nefropatias graves.
• Sarcoidose.
• Linfomas.
35
36. ATENÇÃO À SAÚDE DO ADULTO – TUBERCULOSE
• Pacientes com uso prolongado de corticoesteróides em dose de
imunodepressão.
• Pacientes submetidos à quimioterapia antineoplásica.
• Pacientes submetidos a tratamento com imunodepressores.
• Portadores de imagens radiográficas compatível com tuberculose inativa sem
história de quimioterapia prévia.
Coinfectados HIV e M. tuberculosis. Este grupo deve ser submetido à prova
tuberculínica, sendo de 5 mm em vez de 10mm o limite da reação ao PPD para
considerar-se uma pessoa infectada pelo M.tuberculosis.
A quimioprofilaxia em pacientes com HIV será aplicada segundo as indicações do
quadro 3 a seguir.
Quadro 3: Quimioprofilaxia para tuberculose em pacientes com HIV
Indivíduo sem sinais ou sintomas sugestivos de tuberculose:
A. Com radiografia de tórax normal e
1. reação ao PPD maior ou igual a 5mm(3),
2. contatos intradomiciliares ou institucionais de tuberculose bacilífera, ou
3. PPD não-reator ou com enduração entre 0-4 mm, com registro documental
Indicações(1)(2) de ter sido reator ao teste tuberculino e não submetido a tratamento ou
quimioprofilaxia na ocasião.
B. Com radiografia de tórax anormal: presença de cicatriz radiológica de TB sem
tratamento anterior (afastada a possibilidade de TB ativa através de exames de
escarro e radigrafias anteriores), independente do resultado do teste tuberculino
(PPD).
Isoniazida, VO, 5-10 mg/kg/dia (dose máxima: 300 mg/dia) por seis meses
Esquema(3)(4)
consecutivos.
Fonte: Tuberculose – Guia de Vigilância Epidemiológica. FUNASA/MS. 2002. p.41.
(1)
O teste tuberculínico (PPD) deve ser sempre realizado na avaliação inicial do paciente HIV+,
independentemente do seu estado clínico ou laboratorial (contagem de células CD4+ e carga
viral), devendo ser repetido, anualmente, nos indivíduos não-reatores. Nos pacientes não-
reatores e em uso de terapia antiretroviral, recomenda-se fazer o teste a cada seis meses no
primeiro ano de tratamento, devido à possibilidade de restauração da resposta tuberculínica.
(2)
A quimioprofilaxia com isoniazida (INH) reduz o risco de adoecimento a partir da reativação
endógena do bacilo, mas não protege contra exposição exógena após a sua suspensão. Portanto,
em situações de possível re-exposição ao bacilo da tuberculose, o paciente deverá ser reavaliado
quanto à necessidade de prolongamento da quimioprofilaxia (caso esteja em uso de INH) ou de
instauração de nova quimioprofilaxia (caso esta já tenha sido suspensa).
(3)
Em pacientes com imunodeficiência moderada/grave e reação ao PPD >10mm, sugere-se
investigar cuidadosamente a tuberculose ativa (pulmonar ou extrapulmonar) antes de se iniciar
a quimioprofilaxia.
(4)
Indivíduos HIV+ contatos de pacientes bacilíferos com tuberculose INH-resistente documentada
e que não estão em uso de inibidores da proteases (IP) ou ITRNN incompatíveis com uso de RMP ,
poderão fazer uso de quimioprofilaxia com esquema alternativo de Rifampicina (600mg/dia) +
Pirazinamida (2 g/dia) por dois meses, preferencialmente sob a supervisão de um especialista.
36
37. AS AÇÕES DE PROMOÇÃO À SAÚDE E PREVENÇÃO DA DOENÇA
Observações:
a) Não se recomenda a utilização da quimioprofilaxia nos HIV positivos e negativos à tuberculina,
com ou sem evidências de imunodeficiência avançada. Deve-se repetir a prova tuberculínica
entre 40 e 60 dias; mantendo-se negativa, repetir a cada seis meses.
b) Em pacientes com RX normal, devem-se investigar outras patologias ligadas à infecção pelo
HIV, antes de se iniciar a quimioprofilaxia, devido à concomitância de agentes oportunistas/
manifestações atípicas de tuberculose mais freqüentes nessas coortes.
c) Nos indivíduos HIV positivos e tuberculino-positivos com RX normal, sem sinais e sem sintomas
de tuberculose, devem-se destacar os contatos institucionais (casas de apoio, presídios, abrigos,
asilos, etc.).
d) Recomenda-se suspender imediatamente a quimioprofilaxia no surgimento de qualquer sinal de
tuberculose ativa, monitorá-la nos casos de hepatotoxicidade e administrá-la com cautela nos
alcoólicos.
2.2.5 Biossegurança
2.2.5.1. Medidas de controle ocupacional e controle respiratório
Atualmente, a OMS propõe que, mesmo em países em desenvolvimento, medidas
de controle da transmissão da tuberculose sejam adotadas em unidades de saúde, cujo
ambiente proporcione elevado risco de infecção pelo bacilo da tuberculose de paciente
para paciente ou de paciente para profissionais de saúde.
Medidas de controle
Quaisquer medidas que visem ao combate da transmissão da tuberculose devem
levar em conta toda a unidade de saúde. As medidas de controle de transmissão dividem-
se em três grupos:
a) Administrativas.
b) Ambientais (ou de engenharia).
c) De proteção respiratória.
As medidas administrativas são as mais importantes, eficazes, de relativa facilidade
de implantação e de baixo custo.
Em unidades de saúde do tipo 1 e tipo 2 (definidas na item 4.1)
Inicialmente, deve ser elaborado um plano com a definição de metas a serem atingidas
na referida unidade. Este plano consiste em:
a) Identificar as áreas de risco.
b) Avaliar as necessidades de treinar os profissionais de saúde.
c) Proceder à identificação precoce do sintomático respiratório na triagem.
d) Agilizar o diagnóstico bacteriológico.
e) Criar rotinas para reduzir a permanência dos bacilíferos nas unidades de saúde.
37
38. ATENÇÃO À SAÚDE DO ADULTO – TUBERCULOSE
f) Educar o paciente e seus familiares, se possível, quanto à necessidade de aderir ao
tratamento medicamentoso.
g) Identificar local específico, arejado e com luz solar para os pacientes coletarem o
escarro (de preferência fora da unidade de saúde e nunca em ambiente pequeno e
fechado) e, quando disponível, identificar ambiente apropriado para a realização
de escarro induzido (na unidade de saúde tipo 2 e 3, de alta complexidade).
Para o atendimento ambulatorial de pacientes com TB pulmonar, confirmada ou sob
suspeita, sugere-se que:
os profissionais de saúde orientem os sintomáticos respiratórios sobre a necessidade
do uso de máscaras cirúrgicas (máscaras comuns) quando disponíveis, ao entrarem
na unidade de saúde e durante o tempo em que nela permanecerem;
os profissionais de saúde que estejam na mesma sala de tais pacientes usem
máscaras especiais (respiradores N95), desde que não haja ventilação adequada
no local;
na medida do possível, seja evitado o acúmulo de pacientes nas salas de espera, que
devem ser amplas e bem ventiladas. Isso pode ser obtido pelo escalonamento das
consultas ao longo do turno, ou mesmo pela consulta com hora marcada. Deve-se
evitar a marcação de atendimentos em salas contíguas de pacientes sob suspeita
de tuberculose com outros pacientes portadores de imunossupressão ou mesmo
crianças com menos de cinco anos de idade. Caso esta conduta seja impossível,
deve-se propor ao paciente imunodeprimido o uso de máscara especial enquanto
estiver no recinto.
Em unidades de saúde do tipo 3 (elevado grau de complexidade)
Nestas unidades, com atendimento anual elevado de pacientes com tuberculose
pulmonar, devem-se adotar, se possível, todas as medidas de controle de infecção pelo M.
tuberculosis delineadas anteriormente. A unidade de saúde deve constituir uma comissão
para coordenar as atividades multiprofissionais de controle da TB, seja na área assistencial,
ou na de biossegurança.
Além das atividades citadas para as unidades tipo 1 e 2, outras medidas devem ser
implantadas quando o paciente é atendido num hospital-dia ou é admitido nas enfermarias
ou quartos:
no setor de atividades de hospital-dia, os pacientes com tosse há mais de três
semanas devem permanecer no local, usando máscara comum o tempo todo;
quando as medidas de engenharia não estiverem funcionando no recinto em que
o paciente se encontra, este deve ser orientado a usar máscara especial (N95);
38
39. AS AÇÕES DE PROMOÇÃO À SAÚDE E PREVENÇÃO DA DOENÇA
devem ser definidas regras de isolamento para pacientes com TB bacilíferos, ou
suspeitos, que necessitem internação, como tempo mínimo de permanência e
condições de alta do isolamento;
os locais de isolamento devem ser implementados no intuito de se obter pressão
negativa no ambiente, em número suficiente para atender à demanda da unidade
e deve ser evitada a internação conjunta.
Entre as medidas de controle ambiental, a mais simples e menos cara é a que utiliza
a ventilação natural aumentando ao máximo o fluxo do ar livre no recinto, direcionando-o
com partículas infectantes para fora (áreas afastadas), através de janelas abertas situadas
em extremidades opostas. Nas situações em que não é possível o uso da ventilação natural,
empregam-se outras medidas um pouco mais complexas e dispendiosas que envolvem o
uso de ventilação mecânica (ex: ventiladores, exaustores) e as medidas especiais que são as
de filtração do ar para remoção de partículas infectantes (filtros HEPA) e as de inativação
do M.tuberculosis através da ação germicida da irradiação ultravioleta, somente disponível
em situações de maior complexidade e recursos.
A proteção respiratória consiste no uso de máscaras especiais (respiradores) e é
considerada como uma medida complementar às demais (administrativas e ambientais).
Essas máscaras especiais devem ter a capacidade de filtrar partículas de 0,3 de diâmetro com
eficiência de 95% e de se adaptar adequadamente a diferentes tipos de formato de rosto.
As máscaras especiais devem ser utilizadas por profissionais de saúde em determinadas
áreas de alto risco como salas de broncoscopia, de escarro induzido ou de espirometria;
locais onde possam estar pacientes com tuberculose confirmada ou suspeita (sala de
espera, enfermarias, áreas de isolamento com pacientes com tuberculose) ou em locais
onde medidas administrativas e ambientais não são suficientes para impedir a inalação de
partículas infectantes.
“Essas máscaras especiais podem ser reutilizadas pelo mesmo profissional por
períodos longos, desde que se mantenham íntegras, secas e limpas (sem serem rasgadas,
puídas ou amassadas)” (Kritsky, 2000). Devem ser guardadas em locais limpos e secos,
evitando assim o seu armazenamento em sacos plásticos após o uso, pois estes retêm
umidade.
2.2.5.2 Recomendações para a manipulação de secreção respiratória (escarro
espontâneo ou não) no laboratório de microbiologia ou em outro setor
1. Nas unidades tipo 1, será realizada apenas a baciloscopia do escarro. Portanto,
seguindo a recomendação da OMS e da UICTER, não é necessária a manipulação
dos materiais clínicos em cabines (fluxos laminares), pois o risco de transmissão
do M. tuberculosis é baixo.
2. Nas unidades tipo 2, onde serão realizadas a baciloscopia e a cultura para
micobactéria, o escarro e os demais materiais biológicos devem ser manipulados
em cabines de segurança biológica, de padrão mínimo Classe II.
39
40. ATENÇÃO À SAÚDE DO ADULTO – TUBERCULOSE
3. Os profissionais do laboratório ou aqueles que, em ambientes fechados, realizam
procedimentos que promovam a formação de partículas infectantes (escarro induzido,
nebulização com pentamidina) devem usar máscaras especiais (respiradores N95)
por ocasião da manipulação dos materiais e/ou realização de exames.
O acesso ao laboratório e aos locais onde se realizam tais procedimentos deve ser
restrito aos funcionários responsáveis.
2.2.5.3 Controle dos profissionais de saúde
Todos os profissionais de saúde devem ser submetidos a exames pré-admissionais e
periódicos que incluam o teste tuberculínico. “Os grupos não-reatores submetidos a risco de
infecção ocupacional devem ser incluídos nos programas de realização de prova tuberculínica
periódica ou vacinação BCG” (I CONSENSO BRASILEIRO DE TUBERCULOSE, 1997)
(contra-indicada em adultos HIV positivos). “Estas medidas, como rotina, ainda carecem
de validação em nosso meio. Os casos de conversão recente devem ser avaliados no
sentido de detectar tuberculose em atividade. Não se confirmando a doença, está indicada
a quimioprofilaxia” (I Consenso Brasileiro de Tuberculose, 1997).
“Todo profissional de saúde com sinais ou sintomas compatíveis com tuberculose deve
ser prontamente avaliado, submetido a exame de baciloscopia e outros e não deverá retornar
às suas atividades até que o diagnóstico seja excluído ou até que esteja sob tratamento e
não seja mais infectante” (I Consenso Brasileiro de Tuberculose, 1997).
Finalmente, recomenda-se aos profissionais de saúde com imunodeficiências como
Aids, ou em uso de drogas imunossupressoras, que desenvolvam suas atividades em locais
com menor risco possível de exposição ao M.tuberculosis.
40
43. ABORDAGEM CLÍNICA
3.1 A TUBERCULOSE
3.1.1 Etiopatogenia
3.1.1.1 Etiologia – O Agente Infeccioso: Mycobacterium tuberculosis
O Mycobacterium tuberculosis, agente etiológico identificado por Robert Koch em
1882, é uma bactéria espécie-tipo do gênero Mycobacterium, e se compõe de um complexo
constituído das seguintes espécies: M.tuberculosis, M. bovis e M. africanum. O M. microti
também faz parte do complexo, sendo um patógeno animal. Os estudos realizados sobre
o agente da tuberculose identificam várias características comportamentais que explicam
muitas questões da história natural da doença. As principais são resumidas abaixo:
Estrutura bacilar – imóvel, não esporulado, não encapsulado;
Álcool-ácido resistência – característica para identificação em laboratório que
o permite ser denominado de BAAR (bacilo álccol-ácido resistente);
Conteúdo lipídico em sua parede celular – formação do granuloma;
Aeróbio – necessita oxigênio para crescer e multiplicar-se multiplica bem no
pulmão;
Parasito intracelular facultativo – sobrevive e se multiplica no interior de
células fagocitárias;
Podem ficar em estado de dormência por longos períodos – responsável
pela reativação;
Tempo de geração longo – 14 a 20 horas, dependendo do meio de cultura
empregado para o seu crescimento;
Resistente a agentes químicos;
Resistente à dessecação e ao ambiente escuro – podem sobreviver anos no
ambiente externo;
Sensível ao calor e à radiação ultravioleta – sensível à luz solar.
As micobactérias são bacilos retos ou ligeiramente curvos, dificilmente podem
ser corados pelo método de Gram, mas são considerados como Gram positivos pelas
características da sua parede celular. As bactérias do complexo M. tuberculosis são
classificadas como micobactérias não pigmentadas de crescimento lento. Além destas
características, uma peculiaridade importante é o agrupamento dos bacilos formando ramos
alongados e tortuosos, conhecidos como cordas. A observação de cordas à baciloscopia
é uma indicação de que se trata de bactéria do complexo M. tuberculosis. São álcool-
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44. ATENÇÃO À SAÚDE DO ADULTO – TUBERCULOSE
ácido resistentes e, quando coradas a quente com fucsina fenicada de Ziehl ou a frio com
auramina, retêm os corantes após lavagens com soluções de álcool e ácido (propriedade
utilizada na coloração de Ziehl-Neelsen). Sua parede é constituída principalmente por
ácidos micólicos, formando uma barreira hidrofóbica que confere resistência à dessecação,
à descoloração por álcool e ácido e a diversos agentes químicos e antibióticos. Por exemplo,
soluções de hidróxido de sódio, fosfato trissódico ou cloreto de cetilpiridinium não afetam as
micobactérias da mesma maneira como afetam microorganismos contaminantes e podem
ser usadas em procedimentos de descontaminação de espécimes antes da realização do
cultivo para diagnóstico. Apresentam um alto conteúdo lipídico em sua parede celular,
sendo este responsável por importantes efeitos biológicos como a indução da formação
do granuloma. É, de modo geral, resistente à ação de agentes químicos e sensível à ação
de agentes físicos como o calor e a radiação ultravioleta. Micobactérias podem entrar em
um estado de dormência, no qual sobrevivem sem se dividir. Esta propriedade tem um
importante significado clínico, já que a tuberculose freqüentemente representa a reativação
de uma infecção antiga, subclínica, ocorrida vários anos antes. A dormência permite que as
bactérias permaneçam em pequenos grupos populacionais, dificultando de uma maneira
geral a erradicação da doença.
3.1.1.2 A fonte de infecção e a pessoa susceptível: o contágio
A fonte de infecção habitual é o indivíduo com forma pulmonar da tuberculose,
eliminando bacilos para o exterior. A capacidade do bacilo se transmitir para uma outra
pessoa a partir de um doente é conseqüência do estado bacteriológico deste:
doentes bacilíferos (B+) – a baciloscopia do escarro é positiva e o doente
elimina uma quantidade de bacilos superior a 5.000 por m de escarro;
doentes não-bacilíferos – a baciloscopia do escarro é negativa e a cultura pode
ser positiva (C+) ou negativa (C-).
Calcula-se que, durante um ano, numa comunidade, uma fonte de infecção poderá
infectar, em média, de 10 a 15 pessoas que com ela tenham tido contato. Veja a seguir
quais as principais características da pessoa doente que infecta uma outra susceptível e
como deve ser esta relação:
Doente com a forma pulmonar da doença – o mais importante é o
bacilífero;
Intensidade do contato – proximidade, continuidade, ambiente desfavorável;
Bacilos depositados em roupas, copos, etc. não têm importância na
transmissão.
A intensidade do contato é uma das condições que fazem com que a tuberculose
esteja associada à população de baixa renda. Nessa camada social, famílias numerosas
convivem muito proximamente em casas pequenas, mal ventiladas e úmidas.
44
45. ABORDAGEM CLÍNICA
A fala, o espirro e, principalmente, a tosse de um doente com tuberculose pulmonar,
lançam no ar gotículas contaminadas de tamanhos variados. As gotículas mais pesadas se
depositam rapidamente e as mais leves permanecem em suspensão no ar, ou porque são
pequenas ou porque sofrem evaporação. Somente os núcleos secos das gotículas (núcleo
de Wells) com diâmetros de até 5 µ e com 1 a 2 bacilos em suspensão podem atingir
os bronquíolos e alvéolos e iniciarem a multiplicação. As gotículas médias são, na sua
maioria, retidas pela mucosa do trato respiratório superior e removidas dos brônquios por
meio do mecanismo mucociliar. Os bacilos assim removidos são deglutidos, inativados
pelo suco gástrico e eliminados nas fezes. Os que se depositam nas roupas, lençóis, copos
e outros objetos dificilmente se dispersarão em aerossóis e, por isto, não desempenham
papel importante na transmissão.
3.1.1.3 Patogenia e imunidade
A patogenia da doença revela muitos elementos que compõem o raciocínio clínico,
os métodos preventivos e terapêuticos e o elemento central é a integridade do sistema
imunológico, pela cooperação entre macrófagos e linfócitos T na contenção da infecção pelo
bacilo da tuberculose. Outros elementos como a virulência da cepa infectante e o tamanho
da dose inalada têm, também, papel importante na patogenia. Mas a questão central
continua sendo: por que a tuberculose se desenvolve no homem? A resposta seria que os
mecanismos de defesa contra a micobactéria são afetados quando do desenvolvimento da
tuberculose ativa, por predisposição genética do hospedeiro ou por influência de fenômenos
induzidos pela própria micobactéria, que funcionariam como mecanismos de escape. Tais
mecanismos têm sido estudados por várias décadas, sem que todos os elementos estejam
ainda hoje claramente delineados. Algumas destas contribuições resistiram ao teste do tempo
e permanecem válidas, como a contribuição de Rich na década de quarenta e as de Lurie
e Dannenberg nos anos sessenta. Rich propôs que o estabelecimento da lesão tuberculosa
depende do balanço de fatores ligados ao bacilo e de fatores ligados ao hospedeiro, como
se observa na fórmula abaixo.
FATORES CONDICIONANTES DA LESÃO TUBERCULOSA
L = lesão
(FÓRMULA DE RICH) N = número de bacilos
V = virulência
N . V . Hy
L= Hy = hipersensibilidade
In . Ia
In = imunidade natural
Ia = imunidade adquirida
A fórmula indica que o desenvolvimento da lesão tuberculosa é diretamente
proporcional ao número de bacilos, à virulência da cepa inalada e ao desenvolvimento
da hipersensibilidade pelo hospedeiro, e inversamente proporcional à imunidade natural
e à imunidade adquirida. Fatores genéticos representam um papel importante conforme
demonstraram Lurie & Dannenberg (1965), usando como modelo famílias de coelhos
híbridos.
45
46. ATENÇÃO À SAÚDE DO ADULTO – TUBERCULOSE
PATOGENIA DA TUBERCULOSE
(Lurie & Dannenberg)
Estágio 1 – Destruição do bacilo por macrófagos alveolares residentes maduros
Depende de
capacidade inibitória do macrófago (ativação inespecífica, predisposição genética).
virulência do bacilo.
carga infectante.
Estágio 2 – Multiplicação logarítmica do M. tuberculosis dentro de macrófagos imaturos
Mecanismo
Monócitos/macrófagos recrutados da circulação não detêm crescimento.
Formação da lesão inicial.
Estágio 3 – Número estacionário de bacilos
Mecanismo
Multiplicação de Mtb inibida pela resposta imunológica mediada por células.
Forma o foco tuberculoso: centro caseoso sólido impede multiplicação extracelular de Mtb.
Em torno do centro necrótico, células epitelióides inibem multiplicação e destroem Mtb.
Macrófagos imaturos ainda permitem multiplicação.
Evolução da doença depende do número de macrófagos maturos e/ou imaturos.
Estágio 4 – Liquefação do cáseo e evasão do bacilo
Mecanismo
Multiplicação extracelular em larga escala.
Expectoração e preservação da espécie pela transmissão para outro hospedeiro.
Mecanismos de defesa incapazes de controlar a infecção.
A imunidade natural – defesas mecânicas e naturais
Após a inalação, ocorre uma resistência inespecífica do homem contra a instalação
dos bacilos, devido, inicialmente, às barreiras físicas como os pelos nasais, a angulação das
vias aéreas, o turbilhonamento aéreo, a secreção traqueobrônquica e, o mais importante, o
cleareance mucociliar. Apesar da relativa eficiência desse sistema de defesa, e dependendo
do número de bacilos inalados, alguns atingem os alvéolos pulmonares e a infecção
tuberculosa tem início. Na prática, a resistência natural parece estar relacionada com a
maior ou menor velocidade com que o hospedeiro infectado é capaz de desenvolver sua
resistência ou imunidade adquirida específica.
A imunidade adquirida
Os macrófagos pulmonares residentes são uma das primeiras células a interagir
com os bacilos por meio da fagocitose, que caracteriza a etapa inicial da resposta imune
inespecífica antimicobacteriana. Vários mecanismos de escape foram desenvolvidos pelas
micobactérias para sobreviverem no interior dessas células. Contudo, os mecanismos que
garantem a sobrevivência dos bacilos no compartimento endossomal ou no citoplasma
46
47. ABORDAGEM CLÍNICA
não impedem que parte dos macrófagos sejam ativados pelos próprios bacilos. Além da
produção de interleucinas, como a IL-12, os macrófagos ativados e infectados por Mtb
processam e apresentam antígenos, resultantes da degradação do bacilo ou de antígenos
fagocitados (exógenos) ou liberados no citoplasma celular (endógenos). A apresentação
de antígenos estabelece o início da ativação da resposta imune específica, que pode ser
mediada por anticorpos ou por células. Esta última é de grande importância, uma vez que
linfócitos T CD4 e T CD8 são estimulados e participam ativamente da resposta imunológica
contra os bacilos infectantes.
Os linfócitos T CD4+ com atividade anti-M. tuberculosis são facilmente detectados
em indivíduos expostos às micobactérias, pela demonstração da hipersensibilidade cutânea
ao PPD in vivo, e pela elevada resposta linfoproliferativa aos antígenos micobacterianos in
vitro. A resposta de células T está inversamente correlacionada com a progressão da doença,
verificando-se baixa resposta linfoproliferativa e inexistência de reação cutânea ao PPD
em pacientes com tuberculose pulmonar avançada. No homem, o exemplo mais claro do
papel fundamental dessas células é a infecção pelo HIV-1, nos quais existe uma diminuição
dos linfócitos T CD4+, provocando uma grande susceptibilidade à primoinfecção ou à
reativação de uma tuberculose prévia (Jones e cols., 1993). Estas evidências demonstram
que células T CD4+ desempenham papel central na resistência contra a tuberculose
humana, principalmente pela produção de IFN-.
Os linfócitos T CD8+ fazem parte igualmente dos mecanismos efetores celulares
que intervêm na resposta imune à infecção por Mtb. Essas células produzem citocinas com
perfil similar ao descrito para Th1 e funcionam como células citotóxicas efetoras, restritas
às moléculas de classe I do HLA ou MHC. O principal papel atribuído a essa população é a
lise das células infectadas nas lesões que ainda contêm algumas bactérias e a esterilização
dos granulomas.
Tanto os linfócitos T CD4 como os T CD8 humanos apresentam dicotomia quanto
à produção de citocinas, similar ao modelo murino. Assim, as citocinas produzidas por
linfócitos T CD4+/CD8+ do tipo Th1/Tc1 secretam IFN-, IL-2, IL-3, e TGF-, enquanto que
linfócitos T CD4+/CD8+ do tipo Th2/Tc2 secretam IL-4, IL-5, IL-6, IL-10 e TNF- / IL-4,
respectivamente. A atuação de cada um desses hormônios celulares resulta em diferentes
espectros de ativação ou desativação celular. Foi demonstrado que o IFN-, único mediador
da ativação de macrófagos produzidos inicialmente por células NK ou células T, as quais são
estimuladas por IL-12 proveniente de macrófagos infectados, é capaz de induzir atividade
micobactericida em macrófagos humanos. Citocinas do tipo Th2, como a IL-10, atuam como
um potente inibidor da atividade celular inflamatória, inibindo a produção de óxido nítrico,
a produção de citocinas pró-inflamatórias (IL-1, TNF-), burst respiratório e a expressão de
receptores para IL-1 e MHC de classe II. A tuberculose humana ainda está sendo alvo de
estudo para a determinação do padrão de citocinas que predomina durante a evolução da
doença. O balanço entre citocinas do tipo Th1/Tc1, ditas como inibitórias (IFN-, TNF-), ou
do tipo Th2, ditas como aceleradoras (IL-4, IL-10), do crescimento micobacteriano pode ser
importante na regulação da atividade micobactericida em macrófagos infectados por Mtb.
47
48. ATENÇÃO À SAÚDE DO ADULTO – TUBERCULOSE
Tem sido demonstrado que IFN- é uma das principais interleucinas associadas à
resposta protetora durante a infecção por micobactérias. A presença de linfócitos T CD4+
auxiliares (Th) com fenótipo Th1 e de linfócitos T CD8+ citotóxicos produtores de IFN-
promove a melhor ativação dos macrófagos e, conseqüentemente, o controle da infecção.
Estudos com animais que não possuem o gene para IFN- mostram que estes, quando
infectados com M. tuberculosis por via intravenosa ou por aerosol, apresentam destruição
e necrose tecidual progressiva, não produzem intermediários reativos do nitrogênio e são
incapazes de restringir o crescimento dos bacilos.
Mais recentemente, vários modelos de infecção ou de prevenção (vacinação) da
tuberculose experimental foram desenvolvidos em diversos laboratórios, sendo úteis
para identificar as características essenciais das células que conferem proteção contra
a infecção por M. tuberculosis. O estudo detalhado das duas principais subpopulações
de linfócitos T mostrou que existem vários fatores relacionados com a proteção contra o
bacilo da tuberculose. Assim, os linfócitos T CD8+ estimulados por antígenos endógenos
micobacterianos (antígenos citoplasmáticos liberados na infecção ou por vacinação com
BCG ou vacina gênica) são preferencialmente do tipo citotóxicos, isto é, têm a capacidade
de destruir células que contêm o bacilo da tuberculose em seu interior, permitindo a
eliminação dos mesmos. Tanto os linfócitos T CD8+ como os T CD4+ secretam grande
quantidade de IFN-, que ajuda a manter ativados os vários sistemas responsáveis pela
eliminação dos microrganismos da célula hospedeira. A transferência de linfócitos T CD8+
de animais infectados ou vacinados para animais normais (irradiados) protege estes últimos
da infecção pelos bacilos virulentos, mostrando que essas células são fundamentais para os
processos de defesa.
A imunidade humoral é mediada por moléculas capazes de efetuar o reconhecimento
específico e a eliminação de antígenos, podendo ser transferida a indivíduos não-
imunizados por frações de sangue que não contenham células, como o plasma ou o soro. Ao
reconhecerem o bacilo da tuberculose ou os seus antígenos, os linfócitos B se transformam
em plasmócitos secretantes de anticorpos anti-Mtb. Esses anticorpos, no entanto, não têm
capacidade de penetrar nos macrófagos infectados e destruir o bacilo. Embora anticorpos
específicos possam desempenhar um papel na resposta dos neutrófilos à infecção por
micobactéria, a participação dessas células na defesa contra a tuberculose ainda não está
bem estabelecida. Conseqüentemente, a imunidade humoral parece ter pouco valor no
combate à essa doença.
Uma vez que imunocomplexos são encontrados no soro de pacientes com tuberculose,
vários métodos para detecção de anticorpos antituberculose têm sido desenvolvidos no
sentido de se tentar o diagnóstico sorológico da tuberculose. Embora testes detectando
imunocomplexos compostos de IgG ou IgM ou IgA e antígenos micobacterianos já tenham
sido desenvolvidos, a sorologia para TB ainda não está incorporada à prática clínica.
48
49. ABORDAGEM CLÍNICA
Nos últimos dez anos, muitos conhecimentos novos sobre os mecanismos imunológicos
associados à infecção por Mtb permitiram que se compreendesse melhor por que algumas
pessoas adoecem e a maioria nunca desenvolve a forma ativa da doença. Alguns desses
novos conhecimentos estão resumidos abaixo.
Mecanismos de escape à proteção imunológica do hospedeiro –
imunossupressão – o modelo da infecção pelo HIV
Os casos mais comuns de imunossupressão associados com a tuberculose são os
indivíduos com Aids, os estressados, os que fazem uso de drogas imunossupressoras,
os alcoólatras e os desnutridos. O mecanismo de aparecimento da TB em um indivíduo
pode se dar tanto pela reativação de uma infecção tuberculosa pregressa, como de uma
reinfecção ou de uma infecção recente (primária). Estudos em pessoas infectadas pelo HIV,
a partir de dados epidemiológicos, clínico e laboratoriais, demonstram uma forte relação
com a disfunção e a depleção dos elementos envolvidos na imunidade celular do indivíduo,
levando ao desenvolvimento da tuberculose primária, da disseminação hematogênica do
bacilo e aumentando a possibilidade de reativação.
Foi observado que além da diminuição de linfócitos CD4 circulantes provocada pelo
HIV, ocorre também uma disfunção qualitativa dessas células. Essa disfunção se evidencia,
in vivo, pela perda de resposta do tipo hipersensibilidade retardada, que pode se manifestar
mesmo com um número relativamente elevado de células CD4. Com a progressiva depleção
e disfunção desses linfócitos CD4 e conseqüente deterioração da imunidade celular do
indivíduo, infecções oportunistas, que seriam normalmente controladas por um mecanismo
de defesa intacto, tornam-se freqüentes. Tal é o caso da tuberculose, cujo mecanismo de
defesa se baseia justamente na imunidade celular.
A coexistência, portanto, de uma infecção pelo HIV constitui-se no mais potente
ativador da tuberculose até hoje conhecido. Por outro lado, a tuberculose também influi no
curso da infecção pelo HIV por meio da ativação de macrófagos e de células T infectadas
pelo vírus, levando a um desenvolvimento mais precoce da Aids.
Adaptação do bacilo ao homem – seus mecanismos
Um dos grandes problemas da tuberculose correlaciona-se com o alto grau de
adaptação dos bacilos ao homem. Os principais eventos são descritos a seguir.
Latência no granuloma
Dentro dos macrófagos, células com alto potencial microbicida, os bacilos têm a
habilidade de desativar os sistemas de defesa dessas células e conseguem sobreviver e se
multiplicar no seu interior. O sistema de defesa imunitário do homem toma conhecimento
da presença dos bacilos e estabelece uma resposta contra os mesmos, caracterizada por uma
reação inflamatória crônica denominada granuloma, que tem a finalidade de circunscrever
e delimitar a infecção. Nessas condições, os bacilos podem sobreviver por anos em estado
de latência ou de dormência e o indivíduo infectado pode não manifestar a doença.
49
50. ATENÇÃO À SAÚDE DO ADULTO – TUBERCULOSE
Sobrevivência no interior de macrófagos
Na infecção inicial, os bacilos sofrem a ação dos macrófagos alveolares que os
fagocitam. Apesar do macrófago ser uma célula com alta capacidade bactericida, o bacilo
da tuberculose desenvolveu meios apropriados para sobreviver a esse sistema de defesa
do hospedeiro. Assim, durante a evolução, foram desenvolvidos sistemas que facilitam a
fagocitose de Mtb pelos macrófagos, utilizando receptores de complemento CR1, CR2 e
CR3, bem como receptores de manose, e outras moléculas receptoras de superfície celular
como fibronectina. A interação entre os receptores de manose na célula fagocitária e o bacilo
é feita por uma glicoproteína de superfície da micobactéria chamada lipoarabinomanana
(LAM). A LAM inibe a ação de compostos intermediários de formas reativas do oxigênio
e diminui a produção de citocinas inflamatórias. Além disso, as micobactérias podem
induzir a liberação de fatores supressores da resposta imune pelos macrófagos, como o
TGF- e a IL-10. Nos macrófagos infectados, sob condições variadas de estresse, também
são produzidas altas concentrações da proteína hsp65 pelos bacilos, que podem induzir: a
liberação de TNF- e de TGF-, o aumento da transcrição de RNAm para IL-1, IL-10 e TNF-, e
a diminuição da transcrição de RNAm para a enzima óxido nítrico sintase induzível (iNOS).
Esse mecanismo de entrada de Mtb nos macrófagos permite uma desativação inicial do
sistema microbicida dessas células, principalmente a diminuição de radicais tóxicos do
oxigênio, dando um tempo suficiente para os bacilos se adaptarem no interior celular e
começarem a se multiplicar.
Embora a fagocitose aconteça sem maiores problemas e parte dos bacilos sejam
destruídos, um maior contingente permanece vivo e se multiplica dentro dos fagossomas
do macrófago, no seu citoplasma ou, eventualmente, livres na cavidade alveolar. Por razões
ainda não totalmente esclarecidas, os lisossomas do macrófago, que contêm enzimas
capazes de destruir o bacilo, não conseguem se fundir com os fagossomas nos quais eles
estão contidos. Uma primeira tentativa de combater a micobactéria pelo macrófago se faz
com a produção de ácidos praticamente inócuos para um bacilo ácido-álcool resistente.
A multiplicação bacilar provoca a morte do macrófago com liberação de lisossomas e
destruição tecidual. Forma-se, então, uma reação inflamatória inespecífica, com acúmulo
de neutrófilos na região do parênquima pulmonar em que os bacilos se instalaram.
Outros sistemas da imunidade inata também são ativados nessa fase, como o
sistema complemento, que libera substâncias quimiotáticas para neutrófilos e monócitos.
Além disso, a presença de Mtb no interior de fagócitos estimula a liberação de citocinas
e quimiocinas inflamatórias, como IL-1, IL-6, IL-8 e TNF- que também são responsáveis
pelo recrutamento celular para o foco inflamatório. Outra citocina também liberada dos
macrófagos logo após a fagocitose dos bacilos, a IL-12, atua em conjunto com o TNF-,
induzindo as células Natural Killer (NK) a secretarem IFN- nos períodos ainda iniciais da
infecção. O IFN- é o principal responsável pela ativação dos macrófagos recém-migrados da
corrente sangüínea e, conseqüentemente, pelo controle dos processos iniciais da infecção.
A ativação dos mecanismos da imunidade inata leva a um intenso recrutamento de células
para o foco inflamatório, que, uma vez organizado em granuloma, constitui a lesão inicial da
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