SlideShare una empresa de Scribd logo
1 de 19
Descargar para leer sin conexión
Luiz Sérgio Marcelino Gomes
- Mestre e Doutor em Ortopedia pela Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto da U.S.P.
- Chefe do Serviço de Cirurgia e Reabilitação Ortopédico-Traumatológica de Batatais (SECROT-SP)
- Chefe do Grupo de Quadril do Hospital e Maternidade Celso Pierro – PUC-Campinas (SP)
I. INTRODUÇÃO
II. BIOMATERIAIS UTILIZADOS EM SUBSTITUIÇÕES ARTICULARES PROTÉTICAS
A. Propriedades Mecânicas
1. Conceitos Gerais 2. Propriedades Mecânicas e Modelo Protético
3. Avaliação Experimental dos Esforços Periprotéticos.
B. Estrutura e Composição
1. Materiais Metálicos : a) Aço Inoxidável b) Ligas de Cromo-Cobalto c) Ligas de Titânio
d) Tântalo e outros materiais Metálicos
2. Materiais Poliméricos: a) Polietileno de Peso Molecular Ultra-alto b) Polimetacrilato de
Metila (PMMA)
3. Materiais Cerâmicos
4. Compósitos
C. Propriedades Tribológicas dos Implantes Protéticos
II. RESPOSTA ORGÂNICA AOS BIOMATERIAIS
I. INTRODUÇÃO
Considera-se como Biomaterial toda substância
(à exceção de drogas) ou combinação de substâncias,
de origem sintética ou natural, que durante um período
de tempo indeterminado é empregada como um todo,
ou parte integrante de um sistema para tratamento,
ampliação ou substituição de quaisquer tecidos, órgãos
ou funções corporais
1
. De uma forma mais ampla,
como a sugerida por Park
2
, os biomateriais podem ser
entendidos como tudo aquilo que de modo contínuo ou
intermitente, entra em contato com fluidos corpóreos,
mesmo que esteja localizado fora do organismo.
Quanto à sua interação com os tecidos adja-
centes, podemos distinguir os materiais biotoleráveis
como os que provocam uma reação orgânica de
encapsulamento fibroso, onde pode se notar a
presença de numerosos macrófagos e células
fagocitárias, que dominam o quadro histológico; os
bioinertes que têm uma interação biológica mínima
com os tecidos adjacentes e assim a presença do
encapsulamento fibroso é, muitas vezes, bastante
reduzida; os materiais bioativos que interagem
ativamente com o organismo incorporando-se aos
tecidos adjacentes sem a formação de membrana de
interface, através de verdadeiras ligações químicas; e
os materiais bioabsorvíveis ou reabsorvíveis que, após
um tempo variável em serviço, são degradados,
solubilizados ou fagocitados pelo organismo.
Especificamente na área ortopédica, os
biomateriais foram responsáveis pelo grande avanço na
cirurgia reconstrutora das articulações. Se considerar-
mos a substituição articular protética do quadril, os
implantes utilizados neste procedimento devem supor-
tar os esforços oriundos da contração muscular, de
forças inerciais, do suporte de carga estática e cíclica e
ainda resistir ao desgaste das diversas interfaces,
assim como não devem provocar reações adversas ao
organismo
3-5
. Porém não há até o momento um
material que atenda, simultaneamente, a todas as
exigências mecânicas, metalúrgicas, funcionais e
biológicas necessárias para um implante protético
perfeito.
Cada biomaterial apresenta uma combinação
de propriedades particulares, determinadas por sua
estrutura, composição e processamento, benéficas em
algumas situações, porém com possíveis limitações em
outras condições específicas. Estas limitações torna-
ram-se patentes com a realização da artroplastia em
pacientes mais jovens, nos quais as situações de maior
solicitação funcional e maior tempo em serviço dos
implantes são requeridas.
A evolução tecnológica, desde a década de 60,
permitiu a introdução de novos materiais e modelos
protéticos, que aliados aos refinamentos da técnica
cirúrgica buscavam maior longevidade da reconstrução
articular protética. Embora grandes progressos tenham
sido observados, como os conceitos de fixação bioló-
gica e de superfícies articulares alternativas, muitas
inovações, longe de representar avanços, resultaram
em falhas precoces e resultados desalentadores. Tais
insucessos foram ocasionados, em grande parte, pela
não compreensão da cinemática e da biomecânica
articular, assim como pelo restrito conhecimento dos
mecanismos de falhas in vivo dos implantes e de suas
implicações na concepção e utilização racional de
novos modelos protéticos e biomateriais.
Biomateriais em Artroplastia de Quadril:
Propriedades, Estrutura e Composição
CAPÍTULO 13
II. BIOMATERIAIS UTILIZADOS EM
SUBSTITUIÇÕES ARTICULARES PROTÉTICAS
A utilização de novos biomateriais permitiu a
introdução de novos conceitos e designs em subs-
tituições articulares protéticas, procurando adequar as
propriedades dos materiais às solicitações in vivo. Os
biomateriais mais frequentemente utilizados em recons-
truções osteoarticulares podem ser agrupados em:
metálicos, poliméricos, cerâmicos e compósitos.
A opção por um determinado tipo de material é
feita de acordo com sua resistência à corrosão e bio-
compatibilidade, propriedades mecânicas e metalúr-
gicas assim como pelo comportamento do material
durante o processamento e uso, custo e disponibili-
dade. De grande importância são as propriedades me-
cânicas, representadas principalmente pela resistência
(Tensão de Escoamento, Tensão Máxima, Tensão de
Ruptura), ductilidade, rigidez, tenacidade, dureza,
fluência e fadiga
6
. Embora estes termos da ciência dos
materiais sejam de uso diário dos engenheiros, sua
aplicação cada vez mais freqüente no design e na
avaliação de falhas dos implantes, resultou na neces-
sidade de compreensão de alguns conceitos mecâ-
nicos básicos por parte dos médicos e outros profis-
sionais que se dedicam a esta área do conhecimento.
A. PROPRIEDADES MECÂNICAS
A1. Conceitos Gerais
As forças externas, que agem sobre os
implantes e tecidos adjacentes, podem ser aplicadas
perpendicularmente à estrutura (forças normais)
ocasionando seu alongamento (força de tração) ou sua
compactação (força de compressão). Essas duas
forças tendem a alterar o volume do corpo, enquanto a
força que age tangencialmente à superfície (força de
cisalhamento ou força cortante) tende a alterar sua
forma. Observe-se que quando um determinado esforço
é aplicado a um corpo, os três componentes estão
presentes simultaneamente e, em qualquer ponto deste
corpo, a tração e compressão são máximas em planos
perpendiculares ou ortogonais (esforços principais).
No mesmo ponto, a força cortante ou de cisalhamento é
nula na direção dos esforços principais e máxima em
um plano situado a 45
º
destes planos ortogonais
(Fig.13.1A-E).
À alteração de volume gerada pelo movimento
molecular em resposta às forças normais (tração e
compressão) e pelo deslizamento molecular que altera
a forma (cisalhamento), chamamos de deformação.
A deformação (ε ou strain) é o deslocamento relativo de
um ponto no material, por unidade de comprimento,
e pode ser expressa em partes por milhão (micro-
deformação, microstrain ou µε), ou valores percentuais,
em que ε = Δℓ/ℓ .100 , onde ℓ é o comprimento inicial
do corpo e Δℓ sua variação após a aplicação do
esforço
6,7
.
Para um corpo submetido a uma força normal,
o quociente entre a deformação em direção per-
pendicular à deformação longitudinal é chamado
Coeficiente de Poisson que pode, para diferentes
materiais, apresentar valores entre 0 (material
totalmente compressível) e 0.5 (material não com-
pressível, que apresenta volume constante durante a
deformação). Valores maiores que 0.5 implicam na
expansão de volume durante a deformação
8
.
Para se comparar corpos de diferentes áreas
de secção, introduz-se a grandeza Tensão (δ) como
sendo a força aplicada (F) por unidade de área (A), ou
seja, δ= F/A. A tensão (δ) é dada em Pascal (Pa=
1N/m
2
), ou seus múltiplos, kPa (kilo Pascal: 10
3
Pa),
MPa (Mega Pascal:10
6
Pa) ou GPa (Giga Pascal:
10
9
Pa).
Um erro comum é a tradução de tension da
língua inglesa por tensão, quando o correto seria
tração. O termo tensão (equivalente a Stress na língua
Inglesa e representado por δ) se refere à força aplicada
em uma determinada área.
As propriedades mecânicas dos materiais
podem ser entendidas a partir do diagrama tensão-
deformação como o observado na figura 13.2, que
apresenta em abscissa a deformação relativa ε sofrida
por um material (hipotético) quando submetido a uma
determinada tensão δ. Do ponto de origem do gráfico
(0) até o ponto A existe proporcionalidade entre a
tensão e a deformação relativa, de modo que ao
retirarmos a força aplicada o corpo retorna ao seu
estado inicial indicando uma deformação reversível, na
qual os átomos constituintes do material mantêm sua
posição relativa (deformação elástica). Nesta região,
chamada região elástica, a proporcionalidade entre
tensão e deformação, permite a aplicação da equação
da reta e assim teremos δ = K. ε, ou seja, a tensão é
proporcional à deformação. Conhecida como Lei de
Hooke, K representa uma constante de proporcio-
nalidade denominada Módulo de Elasticidade (E) ou
Módulo de Young.Atente que K=E=δ/ε, ou seja, o mó-
dulo de elasticidade é numericamente igual ao
quociente entre a tensão aplicada e a deformação
Fig.13.1- Alterações na estrutura de um corpo (A) quando
submetido à força de compressão (B), de tração (C) e cisalhamento
(D). As forças normais (tração e compressão) são máximas em
planos ortogonais (esforços principais), enquanto a força cortante é
nula nestes planos, e máxima em um plano situado a 45º
dos
esforços principais (E). T:tração, C:compressão e Ci: Cisalhamento
resultante e assim, quanto menos um material se
deforma quando submetido a uma determinada tensão
na zona elástica, maior será seu módulo de elasti-
cidade. O ângulo Ө representa o grau de inclinação
da reta na zona elástica e assim a sua tangente será
numericamente igual ao Módulo de Elasticidade, ou
seja TgӨ = E=δ/ε.
É possível fazer um paralelo entre módulo de
elasticidade e rigidez do material, observando, porém
que este último conceito é definido em relação à
deformação absoluta frente a uma força F e, portanto
varia com o design do material. Considerada esta
observação podemos dizer que, para corpos de mesma
geometria, quanto mais rígido o material (menor
deformação), maior será seu módulo de elasticidade.
Observe que o módulo de elasticidade não interfere na
resistência à ruptura do material, e assim o baixo
módulo de elasticidade de um material pode coexistir
com uma elevada tensão de ruptura (ex. titânio) ou o
inverso, como o aço inoxidável.
O valor do módulo de elasticidade pode variar
dentro de um mesmo material em função de sua
estrutura, como nos materiais Anisotrópicos em que
as propriedades são diferentes em todas as direções,
em qualquer ponto. Porém alguns materiais podem
apresentar simetria em relação a planos ortogonais e,
de acordo com o número de planos necessários para o
estabelecimento desta simetria podem-se reconhecer
os materiais ortotrópicos ou ainda transversalmente
isotrópicos. Este artifício é bastante conveniente, pois
permite matematicamente uma diminuição no número
de constantes independentes em simulações mecâ-
nicas por elementos finitos, uma vez que a maioria das
estruturas biológicas tem um comportamento ortotró-
pico ou isotrópico transversal
6
.
Os materiais metálicos geralmente apre-
sentam módulo de elasticidade constante mediante a
aplicação de tensões crescentes. Contudo muitos
materiais podem apresentar uma relação não linear
com a tensão, como os materiais biológicos (tendões e
ligamentos) que se tornam mais rígidos à medida que
são progressivamente deformados.
Na zona elástica, a área sob a curva corres-
ponde numericamente à energia absorvida pelo mate-
rial durante o carregamento, e é chamada Resiliência.
Desta forma, para materiais submetidos à mesma
deformação, quanto maior seu módulo de elasticidade
(maior inclinação da reta ou o ângulo Ө), maior será a
energia absorvida pelo material. A relação entre
Módulo de Elasticidade e energia absorvida pelo
material é importante, pois influencia a transmissão dos
esforços até os tecidos adjacentes ao implante
6
.
Para implantes de mesmo design, aquele
constituído por um material de maior módulo de
elasticidade será mais resiliente e assim irá restringir a
magnitude das tensões transmitidas ao osso adjacente.
Este fenômeno de diminuição dos esforços transmitidos
ao tecido ósseo, como a decorrente da presença de um
implante, denomina-se blindagem (stress shielding na
língua inglesa), e assim pode resultar na reabsorção
óssea adaptativa.
Ainda na Figura 13.2 observamos que a partir
do ponto A, se a tensão é removida, o material não
retorna ao seu estado original, indicando assim que
houve deformação definitiva (ou plástica), resultado de
um deslocamento permanente dos átomos que
constituem o material
7
. O ponto B delimita, portanto, a
região na qual o material sofre deformação permanente
e é chamado de ponto de escoamento. A tensão
associada a este ponto, chamada tensão de escoa-
mento,representa a capacidade do material resistir à
deformação permanente. Observe que nesta região o
material sofre uma grande deformação sem acréscimo
significativo da tensão. Contudo nos Biomateriais não
ocorre um escoamento típico sendo necessário definir-
se um limite convencional de escoamento como, por
exemplo, a tensão necessária para provocar uma defor-
mação permanente de 0.2 por cento. A figura 13.3 nos
apresenta um desenho da curva tensão-deformação
aproximada para os principais biomateriais utilizados
em cirurgia ortopédica (materiais cerâmicos, metálicos,
compósitos e poliméricos). Observe a diferença de
comportamento mecânico entre os diferentes materiais.
De volta à figura 13.2, após o escoamento (B),
observa-se um aumento progressivo da resistência do
material (por encruamento), até que a tensão atinja um
ponto máximo (ponto C) chamado limite de resis-
tência, após o que a ruptura pode ocorrer sem aumen-
to expressivo da tensão (limite de ruptura). A tensão
associada a este ponto é chamada de tensão de
ruptura (ponto D).
Fig. 13.2. Diagrama Tensão/Deformação. A zona elástica se
estende da origem (0) ao ponto A. Nesta região a energia absorvida
pelo material, chamada resiliência, é numericamente igual a área
da região sob esta curva. No ponto B o material se deforma
permanentemente (região de escoamento), onde se inicia a zona
plástica. O ponto C representa a tensão e deformação máximas
suportadas pelo material, enquanto o ponto D representa o ponto
de ruptura do material. A tenacidade representa a energia
absorvida pelo material desde a origem até a ruptura e é
numericamente igual à área sob toda a extensão da curva..
Observe que no material em questão, no ponto B
(escoamento), pequena variação da tensão provoca
grande deformação do material, característica esta dos
materiais dúcteis (ex. biomateriais metálicos, polietile-
no). A ductilidade se refere, portanto à deformação
plástica total até o ponto de ruptura. A energia total
absorvida pelo material até sua ruptura é chamada de
tenacidade. Representada pela área sob a curva do
diagrama tensão-deformação até a tensão de ruptura,
indica a energia necessária para romper o material. De
modo mais simples e prático podemos entender a
tenacidade como a capacidade do material em resistir
ao impacto.
Por outro lado, materiais que sofrem ruptura,
sem deformação prévia significativa, são chamados de
materiais frágeis (como os materiais cerâmicos e o
cimento ósseo). Os materiais podem ser, portanto
tenazes (dúcteis quando se refere aos metais) ou
frágeis ou ainda alguma combinação dos dois, depen-
dendo da deformação que podem suportar previamente
à ruptura (Fig.13.4).
Algumas resinas, como o cimento ósseo,
quando aquecidas podem alterar seu comportamento
frágil para um comportamento mais tenaz, passando a
apresentar uma região plástica definida, desde que
ultrapassada uma determinada temperatura crítica
chamada Temperatura de Transição Vítrea (Tgs).
A dureza é uma propriedade que indica a
resistência do material à penetração. Os materiais de
maior dureza são mais difíceis de serem riscados e
mantém por tempo mais longo o polimento que lhes é
aplicado, sendo por isto mais frequentemente indica-
dos para o uso em superfícies articulares (cromo-
cobalto, materiais cerâmicos).
Materiais biológicos (como o tecido ósteo-
ligamentar) e alguns biomateriais (polietileno e cimento
acrílico) têm suas propriedades mecânicas governadas
pela sua característica viscoelástica, que lhes
conferem uma curva tensão-deformação particular, e
que se altera com a velocidade de aplicação do
esforço.
Esta característica se deve ao fato que estes
materiais não se comportam como uma mola simples,
mas sim continuam a se deformar mesmo quando
submetidos à tensão constante (Fig.13.5 A1 e A2).
Esta deformação plástica e progressiva dos
materiais em condições de tensão constante é
denominada fluência (creep ou cold-flow na língua
inglesa). O entendimento desta propriedade é
importante, por exemplo, para se avaliar o desgaste do
polietileno em substituições articulares protéticas.
Quando calculamos o desgaste da superfície
articular protética através de medidas radiográficas, na
verdade estamos considerando não só o desgaste real
do polietileno assim como sua deformação por fluência
(maior no primeiro ano após a artroplastia).
A fluência é grandemente influenciada pela
temperatura de modo que o cimento acrílico, por
exemplo, pode fluir em meio líquido à temperatura de
37ºC. Os metais, por sua vez somente apresentam
fluência importante a elevadas temperaturas.
Fig. 13.4. Diagrama Tensão/Deformação. O material frágil (1)
não apresenta deformação plástica significativa e apresenta
baixa tenacidade ou resistência ao impacto. O material dúctil (2)
se deforma plasticamente antes de se romper e, principalmente
nos metais, apresenta maior tenacidade.
Fig. 13.5. Em relação ao material elástico (A-1), o material
viscoelástico continua a se deformar mesmo sem aumento da
tensão (A-2). Para estes materiais, ao se remover a tensão, parte
da energia é perdida (histerese- B).
Fig. 13.3. Diagrama Tensão/Deformação esquemático compa-
rando o comportamento mecânico aproximado dos diferentes
biomateriais utilizados em cirurgia ortopédica (materiais cerâ-
micos, metálicos, compósitos e poliméricos).
A viscoelasticidade origina também a
propriedade de Relaxação de Tensão que se refere à
diminuição do esforço necessário para manter um
determinado estado de deformação em um corpo. A
curva tensão-deformação de materiais visco-elásticos
evidencia que ao se remover a tensão nem toda a
energia que foi aplicada ao corpo é recuperada. Esta
perda de energia quando da remoção da tensão é
denominada histerese (Fig.13.5B).
O diagrama tensão-deformação avalia o
comportamento mecânico de um material quando
submetido ao carregamento estático, condição esta que
difere do carregamento funcional cíclico em que a
resistência do material é freqüentemente muito menor.
Esta propriedade, de grande interesse para os
implantes protéticos, em que ocorre a diminuição na
carga máxima possível sob aplicação cíclica é
denominada fadiga, e é atribuída ao fato do material
não ser um sólido idealmente homogêneo.
A fadiga pode ser entendida a partir do
Diagrama S-N (Tensão/N
o
ciclos ou diagrama de
Whöler) que relaciona a tensão com o número de ciclos
aplicados, em escala logarítmica (Fig.13.6). Neste
diagrama a tensão abaixo da qual o material não se
rompe por fadiga é chamada de limite de resistência à
fadiga. Implantes submetidos a tensões cíclicas abaixo
deste valor podem suportar um número infinitos de
ciclos.
A2. Propriedades Mecânicas e Modelo
Protético
Se por um lado a composição e estrutura de
um material determinam suas propriedades mecânicas
e podem habilitá-lo para a utilização como implante
protético, é preciso considerar que a rigidez de um
implante depende não somente dos esforços a que
está submetido (ambiente mecânico) como também de
suas propriedades geométricas (modelo protético).
Como exemplo, o ambiente mecânico a que está
sujeita uma haste femoral, promove deformações de
translação (linear), como também origina esforços
angulares e torcionais e, portanto deformações
transversais. A força que origina o movimento ao redor
de um centro de rotação é denominada Momento, e
atua através do braço de momento que é determinado
pela distância perpendicular do ponto onde a força é
aplicada, até o centro de rotação.
Desta forma o carregamento da haste gera um
momento fletor que ocasiona tensões de tração na
superfície convexa e tensões compressivas na
superfície côncava. A resistência de um corpo ao
momento fletor pode ser avaliada numericamente pela
equação Rf = E . I onde E representa o Módulo de
Elasticidade e I o Momento de Inércia que,
conceitualmente, é uma medida de como o material
está distribuído na seção transversa de um corpo, em
relação à força aplicada.
Seja uma haste femoral como a representada
na figura 13.7. Observe que sua resistência ao momen-
to fletor será diferente nas duas circunstâncias de car-
regamento apresentadas (Fig.13.7A e B).
Para uma estrutura de área de seção
transversa retangular o momento de inércia é dado por
I = base . altura
3
/12. Note-se que a altura tem uma
relação cúbica com o momento de inércia e assim na
situação A (flexão no plano frontal) o momento de
inércia é maior e associado à maior resistência à flexão
que na situação B (plano sagital). Portanto a região de
um implante com menor momento inércia (I) está
sujeita a maiores deformações. Para hastes cilíndricas,
e portanto área de seção transversa circular, I = π.r
4
/4,
onde r representa o raio do círculo.
Fig.13.6. Diagrama S-N típico para ligas de titânio, molibdênio e
metais ferrosos em geral.. Observe que para elevadas tensões (δ)
um pequeno número de ciclos (N) é suportado pelo material.
Para tensões menores um maior número de ciclos é possível, até
que, para uma tensão crítica (tensão de fadiga- δf) define-se o
limite de fadiga como a tensão abaixo da qual o material suporta
um numero infinito de ciclos.
Fig.13.7. (A) o momento de inércia no plano frontal é maior que
no plano sagital (B), uma vez que tem relação cúbica com a altura
em áreas de seção retangulares. h= altura, b= base, I= momento
de inércia.
O carregamento fisiológico impõe ainda um
momento torsional na haste, que resulta em tensões de
cisalhamento em toda a área de seção transversa do
implante. A resistência de um corpo ao momento de
torção pode ser avaliada pelo Momento Polar de
Inércia (J, Fig.13.8).
Para uma haste cilíndrica o momento polar de
Inércia será J = π.r
4
/2 e assim uma haste cujo raio é o
dobro de outra do mesmo material, terá um momento
de Inércia 16 vezes maior. Caso as hastes tenham o
mesmo comprimento, a mais grossa será 16 vezes
mais resistente à torção que a haste mais fina.
O conceito clássico de Tensão se fundamenta na
condição em que o esforço é aplicado em uma ampla
área da estrutura (e não em um ponto localizado), e que
a área de seção transversa seja constante em toda a
estrutura, de modo que a distribuição das tensões seja
uniforme. Caso a área de seção transversa seja
perturbada pela presença de orifícios, trincas, sulcos,
riscos, ou ainda o esforço seja aplicado sobre uma área
restrita da estrutura, a distribuição da tensão não será
uniforme, concentrando-se no local onde a descon-
tinuidade esteja presente, ou na região ao redor do
ponto de aplicação da força. Esta situação caracteriza o
fenômeno de concentração de tensões, e explica o
fato de que uma estrutura, ainda que submetida a
tensões em níveis abaixo da resistência à fratura, na
condição de área de seção uniforme, possa falhar de
modo inesperado. Este efeito tem grande importância
no tecido ósseo e nos implantes osteoarticulares uma
vez que detalhes do design e do acabamento da
superfície podem determinar o aparecimento de regiões
em que a concentração de tensões seja responsável
pela falência da estrutura.
A avaliação das tensões em uma determinada
estrutura (ossos ou implantes) é bastante complexa,
pois envolve o conhecimento dos esforços principais e
de cisalhamento em um determinado ponto.
Na prática frequentemente se utiliza o método de von
Mises que descreve o estado de tensões em um ponto
com um único valor (tensão equivalente ou tensão de
von Mises), cuja magnitude pode indicar a possibilidade
de escoamento, quando comparado aos valores de
testes simples de tração uniaxial
9
.
A3. Avaliação Experimental dos Esforços
Periprotéticos
A longevidade da reconstrução protética está
associada à sobrevivência dos implantes e suas
interfaces. Durante a substituição articular protética, o
osso é transformado em um compósito constituído por
metal, osso e eventualmente por cimento acrílico,
materiais estes que do ponto de vista mecânico
apresentam propriedades bastante distintas. A
diferença de rigidez e ductilidade destes materiais faz
com que a micromovimentação entre as diferentes
interfaces seja inevitável uma vez que o carregamento
irá ocasionar deformações diferentes em cada um
destes elementos. A alteração do padrão de transmis-
são de carga promove a remodelação óssea, já reco-
nhecida por Wolff
10
, que descreveu a adaptação
funcional do osso às solicitações mecânicas. A intromis-
são de um elemento com maior rigidez no interior do
osso pode causar a blindagem (stress shielding), e
assim ocasionar a remodelação óssea adaptativa.
Desta forma a estabilidade e sobrevivência dos
implantes irão depender, em grande parte, da
resistência destes materiais e como os esforços serão
transferidos da haste ao manto de cimento e/ou ao
tecido ósseo adjacente. A avaliação da mudança do
padrão de carregamento ósseo, estabilidade e
comportamento dos implantes protéticos e suas
interfaces pode ser feito por diferentes métodos.
Fig. 13.8. (A): momento de inércia, (B):momento polar de inércia.
(C e D): distribuição das tensões de cisalhamento em corpos de
área de seção transversa circular quando submetido ao momento
torsor.
Fig.13.9.(A):Haste femoral submetida à análise laboratorial.
Observa-se a fratura na altura na transição dos 2/3 proximais com
1/3 distal. (B): Plano de fratura coincidente com a marcação de
identificação. (C): Aspecto geral da fratura apresentando um intenso
amassamento (seta). (D): Estrias de fadiga observadas em MEV. (E):
Micro trinca cuja origem coincide com a alteração micro-estrutural
devida à marcação a laser. A marcação a laser impôs transformação
da microestrutura austenítica em alta temperatura, ocasionando a
concentração de tensões neste local.
Diagrama de Corpo Livre: As forças que atuam em
uma determinada articulação podem ser represen-
tadas matematicamente pela força resultante (R), cuja
intensidade pode ser calculada indiretamente através
dos diagramas de corpo livre, em que se isola mate-
maticamente uma articulação e a avaliamos como se
estivesse em condições de equilíbrio estático. Nesta
condição a somatória dos momentos que estão atuan-
do deve ser igual a zero e assim podemos calcular a
magnitude das forças envolvidas. No exemplo da
articulação do quadril quando avaliada no plano frontal
em condições de apoio monopodal, as forças atuantes
são a força peso que considera a massa acima do
centro de rotação do quadril, (Fp, de módulo cerca de
5/6 do peso corporal) a qual impõe um momento
adutor ao quadril mediante um braço de momento dp.
Este momento (Mp) deve ser contra-balanceado pelo
momento abdutor (Ma) gerado pela força abdutora
(Fa) atuando através do braço de momento da. Em
condições de equilíbrio os momentos são iguais e,
nestas condições, a força abdutora deve ser aproxi-
madamente 2.5 vezes o peso corporal
11
(Fig. 13.9).
Durante a artroplastia a relação entre os braços de
momento pode ser alterada. Caso ocorra diminuição
do braço de momento abdutor (offset femoral), o
equilíbrio irá requerer maior força da musculatura
abdutora e assim aumentar a resultante e a força de
contato articular, predispondo, desta forma, ao maior
desgaste dos componentes articulares protéticos.
Embora os valores obtidos pelo diagrama de corpo
livre sejam aproximados e desconsiderem algumas
variáveis inerciais, seu valor é muito próximo do obtido
por métodos clínicos por telemetria que utiliza
implantes instrumentados com sensores específicos,
e, portanto de utilização restrita
3
.
Elemento Finito: Utiliza-se de uma técnica computa-
dorizada de análise de tensões em que, a partir da
definição geométrica (design do implante), o modelo é
dividido em várias seções (elementos), conectadas
entre si através de nós que estarão sujeitos a
aplicação de forças (Fig 13.10 A e B).
Uma vez definida a rigidez do material na
direção avaliada, o programa soluciona automática-
mente um grande numero de equações que governam
o deslocamento nodal no modelo, a partir do que se
podem calcular as tensões e deformações associadas.
Estas informações podem ser utilizadas, por exemplo,
para a predição do remodelamento ósseo, falha nas
interfaces, trincas no manto de cimento e falha
mecânica do implante (Fig 13.10C-F).
Nas Simulações Mecânicas são realizados implantes
experimentais em ossos sintéticos (plásticos) ou
cadavéricos que são submetidos ao carregamento
cíclico em máquinas de ensaios mecânicos. Objetivam
avaliar deformações e calcular tensões nas diferentes
regiões do osso e implante assim como nas interfaces,
através de sensores mecânicos de resistência elétrica
(strain gauges).
A migração e micromovimentação também
podem ser avaliadas através de extensômetros já
acoplados diretamente à maquina de ensaios
mecânicos, ou ainda através de sensores mecânicos
tipo LVDTs ( Linear Variable Differential Transformer),
que não utilizam sensores mecânicos de resistência
elétrica, mas sim se baseiam no efeito de indução
metálica cuja excitação é feita por corrente alternada.
Embora sejam bastante precisos (décimos de
micrômetros), os LVDTs são bem mais onerosos que
os dispositivos que se utilizam de sensores mecânicos
de resistência elétrica (Fig 13.11 A-F)
12
.
Fig 13.9 Diagrama de corpo livre para o quadril, no plano frontal, em
condições de apoio monopodal. Ver descrição detalhada no texto.
Fig 13.10. (A,B e C) Modelagem computacional por elementos
finitos do fêmur proximal (comparado à radiografia no plano
frontal). Cortesia DallaCosta D. U.F. Santa Catarina.( D,E,F):
Modelagem de bandeja tibial mostrando a região de concentração
de tensões (seta), que promoviam a ruptura deste dispositivo
metálico em artroplastia total de joelho.
Um tipo especial de ensaio é feito através de
simuladores articulares, com o objetivo de se avaliar o
desgaste dos componentes protéticos, mediante a
simulação dos movimentos articulares principais
(Fig.13.12). Estes simuladores substituíram testes
mais simples como o pino em disco em protocolos
para estudos de desgaste.
B. ESTRUTURA E COMPOSIÇÃO DOS
BIOMATERIAIS
B1. Materiais Metálicos
Os metais e algumas ligas metálicas são
materiais adequados à utilização como implantes
protéticos graças à sua resistência ao carregamento
cíclico e grande ductilidade. As propriedades como
biocompatibilidade, resistência à corrosão, resistência
mecânica e ao desgaste são, contudo bastante de-
pendentes da estrutura, composição e processa-
mento da liga, do design protético e do ambiente
mecânico a que o implante está sujeito. Estrutural-
mente são materiais cristalinos, em que cada cristal
individual, denominado grão, contém no seu interior
átomos arranjados segundo um único modelo e
orientação.Contudo, o fato de grãos adjacentes apre-
sentarem orientação cristalina distinta, resulta na
formação de uma zona de transição entre eles,
chamada contorno de grão, onde existe o empaco-
tamento de átomos com energia mais elevada que
em seu interior. O tamanho dos grãos tem grande
influência nas propriedades dos metais e pode ser
alterado por vários processos químicos e
metalúrgicos. Com raras exceções, podemos dizer
que maiores grãos implicam em menor resistência à
tração e à fadiga da liga metálica. Algumas
propriedades mecânicas das principais ligas
metálicas comparadas ao osso cortical e esponjoso
são mostradas na Tabela 13.1.
A composição química e a presença de
inclusões podem alterar não só as propriedades
mecânicas como a resistência à corrosão e assim a
biocompatibilidade das ligas metálicas. A resistência
à corrosão depende em grande parte da presença de
uma camada natural de óxido estável e bem aderente
ao substrato, chamada camada de passivação, que
protege a superfície do implante da ação dos fluidos
biológicos adjacentes. Durante o processo de
fabricação, os implantes são ainda submetidos à
deposição adicional de óxidos em sua superfície. A
camada de passivação pode ser removida por ação
biológica ou mecânica como a micro-movimentação
in vivo do implante (denominada fretagem, por
contaminação do termo na língua inglesa fretting).
A composição da liga pode incluir elementos
que quando do rompimento desta camada, auxiliam
na formação de uma nova camada protetora (auto-
passivação). O teor adequado de Cromo, Níquel e
Molibdênio, aumenta a resistência à corrosão,
enquanto o Manganês e o Nitrogênio dão estabilida-
de à estrutura austenítica do aço Inox, e o Enxofre e
Selênio facilitam o processo de fabricação (usinabili-
dade). A presença de maior teor de carbono pode
aumentar a dureza e resistência do material em
prejuízo da ductilidade e, em caso de precipitação de
carbonetos, pode predispor à sensitização (ou
corrosão intergranular). Os materiais metálicos mais
utilizados como implantes protéticos são as ligas de
Aço Inoxidável, ligas a base de Cobalto, Titânio e
suas ligas, e o Tântalo.
Fig.13.11. Simulação mecânica em ossos sintéticos (A) de
Artroplastia de quadril (B) , avaliada em máquina de testes
materiais (C) quanto as tensões no manto de cimento e na
superfície do modelo através de extensômetros (D) e LVDTs (E).
Detalhe do sensor mecânico de resistência elétrica (F)12
Fig.13.12. Desenho esquemático de um simulador de quadril
desenvolvido no Laboratório de Engenharia Biomecânica da
Universidade Federal de Santa Catarina. Cortesia Engenheira
Daniela Águida Bento, M.Sc.
a) Aço Inoxidável:
As ligas de aço inoxidável (metais ferrosos),
introduzidas para uso como implantes ortopédicos
(Grupo III ou série austenítica – 316), sofreram
adequações em sua composição para melhor
desempenho em meio biológico. Utiliza-se baixo teor
de carbono (316L: L referente à Low carbon) uma vez
que os átomos de carbono podem segregar-se dos
cristais reagindo com o cromo formando assim preci-
pitados de carboneto de cromo, que se acumulam
nos contornos de grãos. Este fato resulta na dimi-
nuição da concentração de cromo nesta região
predispondo à corrosão intergranular, que pode
promover a falha dramática do metal quando exposto
ao meio corrosivo.
No sentido de diminuir as inclusões que
podem predispor à falência mecânica por fadiga, o
processamento de fusão à vácuo deu origem ao aço
316LVM (Low carbon, Vacuum Melting). Esta liga
apresenta maior resistência à fadiga por produzir um
material com menor teor e menor tamanho de
inclusões. Alterações em sua constituição objetivando
maior resistência à corrosão resultaram em norma-
lizações específicas para sua composição química
principalmente no que diz respeito à relação entre os
teores de Cromo e Molibdênio (ISO 5832-1 ou ASTM
F138-92), no maior conteúdo de Nitrogênio e Nióbio
(ISO 5832-9 ou ASTM 1586-95) ou menor conteúdo
de Níquel (F2229). Embora as ligas de aço Inox
tenham sido bastante utilizadas como implantes
protéticos até uma década atrás nos EUA, e ainda o
são na Europa e no Brasil, a ocorrência de diferentes
processos corrosivos, e a introdução de novas ligas
metálicas não ferrosas, limitaram seu uso como
implante permanente. O baixo custo de produção, as
propriedades mecânicas e a resistência à corrosão
galvânica, contudo habilitam certas ligas (ASTM
F138-92, F1586-95) para utilização como implantes
osteoarticulares. O papel de novas ligas de Inox com
diferentes teores de nitrogênio, nióbio e Níquel na
confecção de implantes protéticos, como as descritas
acima, ainda não está determinado.
b) Ligas de Cromo-Cobalto:
Nas ligas de Cromo-Cobalto (ASTM F75, F90,
F562, F563 e outras) o maior teor de Cromo promove
maior resistência à corrosão, e o Molibdênio produz
grãos mais finos. Diferentemente das ligas de aço
Inox, sua microestrutura permite maior concentração
de carbono cujos carbonetos resultantes encontram-se
dispersos no interior dos grãos e em seus contornos, e
assim sua precipitação pode resulta em maior
resistência e maior dureza da liga. Desta forma estas
ligas são caracterizadas por elevada resistência
mecânica e à corrosão, o que as credenciam para o
uso em implantes protéticos. Sua elevada dureza
permite seu uso como superfície articular constituindo
assim o par tribológico com o polietileno ou com a
própria liga metálica (articulação metal-metal).
Apresentam como desvantagem a grande
dificuldade para serem usinados. Sua elevada rigidez
e portanto maior resiliência pode produzir grande
remodelação óssea adaptativa por blindagem, de
conseqüências mais observadas em implantes não
cimentados.
c) Ligas de Titânio:
Os grandes atrativos das ligas de titânio como
implante protético, são sua alta resistência e seu baixo
módulo de elasticidade (E= 110 GPa) que resultam em
flexibilidade 2 vezes maior e resistência à fadiga no
mínimo 30% maior que as ligas de aço Inox. A grande
afinidade do titânio pelo oxigênio permite a auto-
passivação e assim grande resistência à corrosão.
Contudo altos teores de oxigênio, como constituinte da
liga, comprometem a resistência à fadiga e sua
ductilidade tornando-a mais frágil.
Estas características habilitam as ligas de
titânio (Ti-6Al-4V, ou Ti-6Al-7Nb) para utilização em
implantes destinados a fixação biológica (não
cimentados). Eventualmente em uma determinada
região do implante se aplicam superfícies micro-
porosas constituídas por titânio comercialmente puro
(ASTM F67) com o objetivo de facilitar o processo de
osteointegração.
Sua utilização como hastes cimentadas está
associada a um elevado grau de corrosão, pelo baixo
teor de oxigênio na interface haste/cimento, o que
ocasiona uma pilha de aeração diferencial, e
consequentemente a corrosão em frestas
13
.
Novas ligas e novos processamentos estão
sendo recentemente introduzidos, como o caso das
Ligas de Titânio β que apresentam módulo de
elasticidade ainda mais baixo (cerca de 80 GPa) como
a liga Ti-13Nb-13Zr.
Uma grande desvantagem das ligas de titânio
é sua baixa resistência ao desgaste, inviabilizando sua
utilização como superfície articular. Mesmo a
micromovimentação em caso de instabilidade do
implante é suficiente para ocasionar desgaste por
fretagem (fretting) e assim produzir e depositar óxido
de titânio que ao impregnar os tecidos adjacentes
denomina-se metalose. Esta baixa resistência ao
desgaste tem levado alguns cirurgiões a proscreverem
sua utilização como implantes cimentados, nas
situações em que um ambiente pobre em oxigênio
pode ocasionar uma pilha de aeração diferencial
(corrosão em frestas ou crevice corrosion)
13
.
Novos processamentos do titânio como a
expansão a vácuo, pode produzir uma estrutura
metálica com grande porosidade que se assemelha ao
osso esponjoso (Fig.13.13) e por isto denominada
metal trabecular (termo descrito inicialmente em
relação ao tântalo – ver seção abaixo)
8
.
Ao contrário do tântalo, de utilização clínica já
estabelecida, o metal trabecular de titânio ainda está
restrito à produção experimental.
d) Tântalo e outros Materiais Metálicos.
O tântalo processado de maneira a constituir
uma estrutura trabecular (por isto denominado metal
trabecular) semelhante à observada na figura 13.13,
vem ganhando utilização crescente devido ao seu
módulo de elasticidade que se situa entre o do osso
esponjoso e do osso cortical (1-16 GPa). Sua bio-
compatibilidade manifesta através do crescimento
osteoblástico, que chega a preencher 40-50% das
cavidades porosas em cerca de 4 semanas, habilita
sua aplicação em inúmeras circunstâncias osteo-
articulares em que se necessita de preenchimento
ósseo. Mais freqüentemente é utilizado em cirurgias
reconstrutoras do quadril e joelho e notadamente em
deficiências acetabulares em artroplastia de revisão de
quadril.
O processamento deste metal trabecular en-
volve a produção de um esqueleto poroso de carbono
(cerca de 75-80% de poros em volume) sobre o qual é
depositado o tântalo comercialmente puro. O elevado
coeficiente de atrito sobre a superfície do implante de
tântalo agrega estabilidade inicial e melhor fixação
mecânica ao osso adjacente. Seu uso em revisão
acetabular, muito embora os resultados iniciais sejam
adequados, necessita maior tempo de seguimento,
uma vez que é conhecida a deterioração dos resulta-
dos com os métodos usuais, quando avaliados com
mais de 10 anos de acompanhamento. É também
motivo de preocupação a indicação de cimentação do
inserto de polietileno, uma vez que o baixo módulo de
elasticidade do tântalo pode gerar maior deformação
do manto de cimento, que é muito sensível às defor-
mações. O elevado custo constitui também limitação
adicional de sua utilização.
Cabe mencionar ainda outras ligas que
utilizam Zircônio (Zr-Nb) e apresentam propriedades
mecânicas muito próximas às ligas de titânio. Sua
passivação quando do aquecimento controlado, é feita
pela formação de óxido de zircônio que é altamente
resistente ao desgaste e à corrosão.
B2. Materiais Poliméricos
a. Polietileno de Ultra Alto Peso Molecular
(PEUAPM).
Na artroplastia de quadril, este polímero surgiu
como superfície articular protética em substituição ao
politetrafluoretileno ou fluon (Teflon®) o qual, inicial-
mente utilizado por apresentar baixo coeficiente de
atrito, mostrou-se muito pouco resistente ao desgaste.
Esta característica se manifestou por inúmeras e preco-
ces lesões osteolíticas, resultado da reação orgânica ao
grande número de partículas produzidas
14
. Por outro
lado o polietileno constituído por longas cadeias carbô-
nicas saturadas de ultra alto peso molecular
(PEUAPM), quando comparado ao flúon, apresenta
maior resistência ao desgaste (cerca de 1000 vezes). É
preciso diferenciar o PEUAPM utilizado como super-
fície articular (PM maior que 1 milhão) do polietileno de
alta densidade (PEAD - PM entre 50 a 100 mil daltons),
por vezes erroneamente usados como sinônimos, uma
vez que este último apresenta menor resistência ao
impacto, ou seja, menor tenacidade, assim como menor
resistência à fadiga e, portanto inapropriado para o uso
biológico em superfícies protéticas.
Este polímero termoplástico é obtido pela poli-
merização do etileno, que resulta na formação de um
pó com partículas entre 100 e 200 m, sendo que cada
partícula é formada por esferas menores que 1 m, ou
seja, partículas submicrômicas (Fig.13.14). Estas esfe-
ras têm a mesma dimensão e morfologia dos debris
detectados nos tecidos como resultado do desgaste do
polietileno.
A partir deste pó de polietileno o processo de
conformação em uma estrutura sólida, seja na forma de
tarugos (por extrusão), placas (por moldagem) ou até
mesmo no implante diretamente (moldagem por com-
pressão), é chamado de fusão ou consolidação.
Fig.13.14. Obtenção do polietileno (PE) a partir da
polimerização do etileno.
Fig. 13.13. Aspecto trabecular do titânio expandido a vácuo.
Cortesia Dr Carlos S. Lambert. Departamento de Física da
Universidade Estadual de Campinas –Unicamp, SP
Mesmo com toda a técnica atual de processamento, a
consolidação pode ser difícil devido ao seu elevado PM,
o que pode ocasionar a fusão incompleta ou defeitos de
consolidação. Estes defeitos agem como concentrado-
res de tensões enfraquecendo assim o PE, o que pre-
dispõe ao aparecimento de trincas que ao se propa-
garem podem causar sua delaminação e falência em
serviço. Os defeitos de fusão são mais comuns no
processo de moldagem em placas e menos freqüentes
na extrusão e na moldagem por compressão.
Do ponto de vista estrutural o PE apresenta
uma morfologia semicristalina e, portanto duas fases
distintas (Fig.13.15). A fase cristalina esta constituída
por cadeias dobradas que estão dispersas ao acaso em
uma fase amorfa constituída por cadeias não ramifica-
das de polietileno.
Assim como as propriedades mecânicas, o
percentual de região cristalina depende fundamental-
mente do PM e do processamento para a obtenção do
pó (polimerização, consolidação e esterilização), porém
o grau cirúrgico utilizado apresenta cristalinidade
frequentemente na faixa entre 58-75 por cento. Após o
processo de consolidação, dependendo da técnica
empregada, a cristalinidade flutua entre 50-55 por
cento. Consideradas estas variações pode-se dizer,
contudo que o PE é um material dúctil, tenaz e que
apresenta uma grande fluência.
O aumento da resistência ao desgaste do
polietileno tem sido obtido pela elevação do seu peso
molecular, decorrente da formação de ligações
cruzadas (cross-linking) entre as cadeias, resultantes
da formação de radicais livres produzidos, mais
freqüentemente, por irradiação Gama
15
.
b) Polimetacrilato de Metila (PMMA)
O cimento ósseo (PMMA), utilizado desde há
cerca de 50 anos com o objetivo de acoplar implantes
artroplásticos ao tecido ósseo adjacente, é uma resina
acrílica resultante da polimerização do metacrilato de
metila (MMA)
14.
Embora este monômero (MMA) possa sofrer
autopolimerização, o processo é muito lento, produz
substancial elevação da temperatura e grande com-
tração volumétrica (ao redor de 27%) devido à dife-
rença de densidade entre monômero e polímero. As
formulações comerciais atuais, pouco modificadas
desde a década de 60, constam basicamente de um
pré-polimerizado (pó) que misturado ao monômero
(líquido) resulta na polimerização em poucos minutos,
na dependência de sua composição química. A
utilização do pré-polimerizado reduz a quantidade de
monômero necessária à polimerização e assim diminui
a contração para cerca de 7%, além de auxiliar na
dissipação do calor produzido. Este processo
acelerado de polimerização necessita da atuação de
iniciadores de reação acrescentados ao pó (Peróxido
de dibenzoilo) e ao líquido (N, N Dimetil paratoluidina).
A presença de estabilizadores (Hidro-quinona ou Ácido
Ascórbico) adicionados ao monômero é necessária
para que não haja auto-polimerização durante o
período de armazenamento e transporte. Para uma
adequada visualização radiográfica do manto de
cimento, acrescenta-se ao pó substâncias radiopacas
como o Sulfato de Bário ou o Óxido de Zircônio
(Fig.13.16).
O processo químico da polimerização se inicia
pela mistura do monômero (líquido) ao pré-polimerizado
(pó), ocasião em que a decomposição do peróxido de
dibenzoilo pela N,N dimetil paratoluidina produz radicais
(benzoílos), que atacam a insaturação carbônica do
metacrilato de metila, gerando assim radicais livres na
molécula do monômero. A ligação entre átomos de
carbonos de moléculas adjacentes, por meio dos
radicais livres, promove a formação de longas cadeias
cujos pesos moleculares variam entre 250 mil a
800.000 daltons. Com o progresso da polimerização as
cadeias crescem e originam um material duro de
Fig.13.16 Obtenção do cimento acrílico (PMMA) a partir do
metacrilato de metila na presença de aditivos. A formulação
dos cimentos disponíveis comercialmente é bastante variada
e assim nem todos os cimentos de PMMA são iguais.
Fig.13.15. Estrutura semi-cristalina do polietileno. As ligações
cruzadas obtidas por irradiação gama ocorrem na fase amorfa
que apresenta maior mobilidade das cadeias carbônicas.
características vítreas o que dificulta a difusão
subseqüente do monômero e a propagação da cadeia.
Assim o processo de polimerização apresenta
uma fase inicial de contração de volume (ao redor de
7%), seguida por uma fase de expansão térmica pelo
aumento da temperatura (cerca de 80ºC) e finalmente
uma fase de contração volumétrica e térmica
ocasionada pelo resfriamento
16
.
Do ponto de vista mecânico o PMMA é um
sólido com característica viscoelástica, de baixa rigidez
(E= 2.3 GPa, comparado ao Eosso cortical:16 GPa, ECr-Co:
250 GPa). Porém quando comparado a outros
polímeros (como por exemplo, o polietileno) apresenta
grande rigidez e baixa ductilidade, e, portanto um
comportamento frágil
17
. Estas propriedades devem ser
consideradas perante sua utilização em artroplastias
que requer uma atuação como transmissor de esforços
do implante aos tecidos adjacentes
18,19.
Com características viscoelásticas o cimento
pode fluir, e assim permitir a migração de implantes,
muito embora a fluência no manto de cimento seja de
pequena magnitude frente ao que se observa em
situações clinicas
20
. Em artroplastias experimentais in
vitro o cimento ósseo esta sujeito a tensões muito
próximas do seu limite de resistência quando em
carregamento cíclico, circunstância em que a fluência,
após um período de aumento rápido, tende a
permanecer constante nos ciclos subseqüentes
12,16
.
Saliente-se, contudo que a resistência mecânica do
cimento é dependente de vários fatores como o peso
molecular, proporção e constituição do monômero,
características e concentração dos aditivos, tempe-
ratura, métodos de esterilização e técnica de manejo.
Desta forma a utilização do cimento ósseo requer uma
técnica adequada e racional dentro dos preceitos
recomendados pelo fabricante, assim como do
conhecimento dos fatores que possam alterar seu
comportamento mecânico
18,21.
B3. Materiais Cerâmicos
Os biomateriais cerâmicos se referem a um
grupo de materiais quimicamente compostos pela
ligação iônica de um ou mais íons metálicos com um
íon não metálico, frequentemente o oxigênio. Sua
estrutura molecular é bastante variável podendo se
apresentar sob a forma policristalina ou amorfa. A
potente ligação iônica confere aos materiais cerâmicos
grande estabilidade, elevado ponto de fusão, grande
dureza e resistência às alterações químicas sendo,
portanto inerte nos fluidos biológicos uma vez que
liberam quantidade desprezível de produtos de
degradação. Representam uma variada classe de
biomateriais cujos principais representantes são a
alumina (Al2O3), zircônia (ZrO2),e a hidroxiapatita
(Ca10(PO4)6(OH)2,
A utilização da alumina cerâmica (Al2O3) há
cerca de 30 anos como superfície articular confirmam
suas excelentes propriedades tribólogicas
22
oriundas de
sua elevada dureza (Dureza Vickers >2000 HV), baixo
ângulo de contato (maior molhamento – Ver seção de
propriedades tribológicas).
A zircônia (ZrO2) introduzida como opção de
superfície articular com o polietileno na década de 80, é
um composto cerâmico que pode se apresentar sob
diferentes fases de acordo com a temperatura. Por este
motivo, estabilizadores de fase devem ser adicionados
durante a fabricação
23
. Ainda que apresente maior
resistência mecânica que a alumina, a possibilidade de
transformação de fase limita sua produção a fornos
específicos e impede sua esterilização em vapor úmido
(autoclave), uma vez que nestas condições a incidência
de fratura de cabeças cerâmicas podem se aproximar
de 9 por cento. A adição de zircônia estabilizada em
ítria ao substrato de alumina tem obtido excelentes
resultados quanto a sua resistência à fratura em
cabeças femorais protéticas
22
.
A Hidroxiapatita inclui um grupo de cerâmicas
policristalinas de fosfato de cálcio, com estrutura
semelhante à apatita óssea, seja de origem mineral
(fosfato de cálcio tribásico) ou sintética (fosfato
tricálcico).Tem função predominantemente osteocon-
dutiva e por isto na sua forma granular ou maciça é
usado em enxertia óssea de defeitos ósseos
cavitários. Sua resistência à fadiga é baixa e, portanto
não adequada à ambientes de grande solicitação
mecânica.
Muito embora, a biocerâmica de hidroxiapatita
e fosfato tricálcico maciça tenha sua comercialização
liberada, consideramos que seu uso como substituto
ósseo, sob a forma de enxerto estrutural, em defeitos
segmentares deva ser avaliado clinicamente em
seguimentos mais tardios, antes de sua incorporação
rotineira à prática médica (Fig.13.17).
Fig.13.17. Radiografia de pelve no plano frontal (A) e fêmur
esquerdo no plano sagital (B) de uma paciente com 38 anos em que
se observa extensa perda óssea femoral e acetabular. Foi feita a cor-
reção com enxerto femoral maciço de biocerâmica no acetábulo (C –
superior) e no fêmur proximal (C-inferior e D). Dezoito meses após o
ato cirúrgico observa-se o posicionamento adequado dos implantes,
e uma nuvem de calo ósseo adjacente à porção medial e posterior da
transição entre o enxerto e o osso femoral (E e F – setas), sem contu-
do observarmos o fechamento da fenda entre os dois elementos.
A hidroxiapatita pode ser utilizada também
como um pré-revestimento em implantes permanentes
ou até temporários, no sentido de agregar ao efeito
osteocondutor uma real ligação química entre esta
camada e o substrato ósseo adjacente favorecendo
assim a osteointegração.
B4. Compósitos
Referem-se à combinação de materiais de
modo que as propriedades mecânicas resultantes
sejam superiores a dos componentes isoladamente.
Frequentemente agregam um elemento constituído por
fibras a um elemento matricial, como as fibras de
carbono adicionadas a uma matriz polimérica. Sob este
prisma o osso é per se um material compósito que
apresenta fibras colágenas imersas em uma matriz
inorgânica.
Várias tentativas de aumentar a tenacidade do
cimento ósseo foram feitas através da produção de um
compósito que incorporava outros elementos como a
fibra de carbono, polietileno, titânio, grafite e aço entre
outras substâncias. Contudo, a biocompatibilidade e
complicações do processamento destes materiais
comprometeram a implementação do processo de
manufatura.
Dentre os compósitos utilizados em cirurgia
ortopédica, destacam-se a polissulfona, a fibra de
carbono (ambos por sua importância histórica), os
compósitos cerâmicos e o poliéter-éter-cetona (ou
PEEK), este de utilização mais ampla. Nova superfície
articular a base PEEK tem sido testada experimen-
talmente e clinicamente, porém os resultados em longo
prazo devem ser aguardados.
C. PROPRIEDADES TRIBOLÓGICAS DOS
IMPLANTES PROTÉTICOS.
O termo tribologia se refere à ciência que
estuda a interação de superfícies em movimento
relativo e, portanto considera suas determinantes
principais que são o atrito, a lubrificação e o desgaste.
Atrito: O conceito de atrito diz respeito à obstrução
(atrito estático) ou à restrição (atrito cinético) ao movi-
mento relativo entre as superfícies de corpos em
contato, quando sujeitos a uma força externa. A força
de atrito é gerada pela deformação na superfície de
contato entre os materiais, e pela adesão entre os
átomos e moléculas das superfícies opostas. Age
tangencialmente à superfície e seu módulo independe
da área de contato aparente entre os corpos, porem é
função direta do valor da força normal
24
.
Desta forma define-se coeficiente de atrito (µ),
como a relação entre a força de atrito (Fa) e a força
normal (Fn), que por este fato é uma grandeza
adimensional (Fig.13.18A).
Fig.13.18. (A): O coeficiente de atrito é uma grandeza adimensional,
resultado da relação entre a força de atrito e força normal. (B):
Superfície de cabeça metálica polida e aparentemente lisa a olho nu
apresenta (C): à microsocopia, irregularidades ou asperezas em sua
superfície cujo (D): perfil pode ser determinado e mensurado (em
Ra- rugosidade media) por aparelhos como o rugosímetro.Fonte
Gomes LSM25
Mesmo em implantes polidos e aparentemente
lisos, o atrito pode ocorrer pelas irregularidades
superficiais (rugosidade) em nível microscópico, cujo
perfil pode ser avaliado por aparelhos como o
rugosímetro
25
(Fig.13.18B,C e D).
Diferentemente das propriedades mecânicas
como o módulo de elasticidade e tenacidade, o coefi-
ciente de atrito não é uma propriedade do material e,
assim pode ter diferentes valores em função do par
tribológico (Fig. 13.19A), da configuração de contato
(Fig. 13.19B) e do ambiente e regime de lubrificação
(Fig.13.19C)
26
.
Os biomateriais constituintes do par tribológico,
o design e a tecnologia de fabricação influenciam
grandemente na intensidade do atrito, uma vez que sua
origem está ligada à deformação na superfície de
contato entre os materiais, e pela adesão entre os
átomos e moléculas das superfícies opostas. Assim, a
rugosidade e a deformação das superfícies em contato
impõem certa restrição ao movimento.
Fig.13.19. Fatores que interferem no coeficiente de atrito. (A) Os
biomateriais que constituem o par tribológico, (B) e sua confi-
guração de contato, (C) assim como o ambiente adjacente e o re-
gime de lubrificação (Fonte Gomes, LSM25
Modificado de Mischler 26
)
É evidente que quanto maior a dureza dos
materiais que compõe o par tribológico, mais fácil a
manutenção do polimento e mais difícil riscar a cabeça,
restringindo assim as asperezas de superfície. Por este
motivo as superfícies mais duras (Cerâmica/Cerâmica,
Metal/ Metal e Cerâmica/Metal) apresentam melhor
desempenho tribológico
27-29
. Outro mecanismo de atrito
dependente do par tribológico ocorre pela adesão
(ligações químicas) entre as superfícies protéticas, em
muito semelhante ao mecanismo de fusão a frio.
O atrito gerado pela força de atração entre as
moléculas das superfícies opostas, chamadas forças
de adesão, ocorre em regiões de contatos localizados,
como alterações de esfericidade da cabeça ou
imperfeições decorrentes da usinagem. Desta forma,
as ligações químicas entre as moléculas de superfícies
opostas, podem se opor ao início do movimento (atrito
estático), e assim o movimento ulterior só será possível
pela ruptura destas ligações, resultando na remoção de
material da superfície articular. Este mecanismo ocorre
mais intensamente quanto maior for a força de atração
entre as superfícies e é bastante evidente na articula-
ção metal/metal durante o período inicial de atividade
(run-in), pela intensidade da atração decorrente da
ligação metálica. Com a perda progressiva de material
ocorre o polimento nas zonas de contato e assim o
atrito adesivo diminui com o tempo em serviço do
implante. O atrito que ocorre entre os pares tribológicos
mais utilizados pode ser observado na Tabela 2.
Como resultado do atrito entre as superfícies, o
movimento irá gerar um torque (de atrito) na interface
entre o componente acetabular e o osso, que é tanto
maior quanto maior o diâmetro da cabeça, porém em
módulo sempre muito inferior ao torque experimental
necessário para soltar o componente. Desta forma,
embora o atrito tenha grande contribuição no desgaste
articular, seu papel para a soltura dos implantes parece
não ser tão significativo.
Tabela 2. Coeficiente de Atrito (µ) para Diferen-
tes Pares Tribológicos e Articulação Sinovial.
Par Tribológico Coeficiente de Atrito (µ)
Metal/Metal* 0.40
Art. Sinovial s/ Lubrificação 0.20
Metal/PE Convencional 0.10
Cerâmica/Metal 0.05
Cerâmica/Cerâmica** 0.04
Art. Sinovial c/ Lubrificação 0.005- 0.02
*Liga de Cromo-Cobalto. PE: Polietileno
** Alumina (Al2O3)
Lubrificação: Para que o atrito seja diminuído é impor-
tante que não haja contato direto entre as superfícies
articulares durante o movimento e o suporte de carga,
papel este que pode ser exercido pela interposição de
um filme líquido.
Na superfície articular natural do quadril, a
grande congruência articular, distribui as tensões em
uma área extensa, dentro de uma cavidade estanque e
preenchida pelo líquido sinovial, permitindo assim que
a flutuação de pressão do liquido, neste compar-
timento, contrabalance os esforços externos. Desta
forma a pressão hidrostática do filme fluido separa as
duas superfícies e impede o seu contato direto durante
o carregamento, através da manutenção de uma fenda
(clearance) articular (Fig.13.20A).
Este mecanismo hidrostático é auxiliado pelo aumento
da velocidade de deslocamento entre as superfícies
(efeito hidrodinâmico, Fig.13.20B) e, durante o
carregamento pelo aumento de volume de liquido na
articulação, oriundo da expulsão de substâncias
adsorvidas na cartilagem (Wheeping) que, por este
motivo, não depende de movimento entre as
superfícies, mas sim da carga aplicada.
Durante a movimentação, a lubrificação é
dependente da velocidade entre as superfícies
articulares que origina a lubrificação hidrodinâmica .
Quanto maior a velocidade relativa (que chega a atingir
40 mm/s) mais se aumenta a pressão do fluido que
mantém as superfícies afastadas e garantindo um
coeficiente de atrito da ordem de 10
-3.
Caso uma
espessura adequada do filme não seja possível, em
algumas circunstâncias a pressão do filme pode ser
capaz de deformar as irregularidades das superfícies,
dificultando o contato direto, e originando assim um
regime de lubrificação chamado elastohidro-dinamico.
26
Por outro lado no caso de baixa velocidade entre as
superfícies, o menor volume fluido permite que
esforços de alta magnitude (cerca de 8 vezes o peso
corporal) tendam a promover o contato direto entre as
superfícies articulares, aumentando assim o atrito.
Nesta circunstância é importante a presença de
moléculas de tribonectinas, que se ligam às superfícies
opostas atuando como um sabão e diminuindo portanto
o atrito. Este mecanismo de lubrificação é chamado de
marginal, de contorno ou de superfície (Fig.14.20C).
Fig.13.20. Regimes de lubrificação da articulação sinovial. (A) O
regime hidrostático ocorre durante o suporte de carga sem
movimento significativo, enquanto o hidrodinâmico (B) aumenta
com a velocidade entre as superfícies. (C) Quando o carregamento
tende a aproximar as superfícies articulares, as tribonectinas tem um
papel importante na lubrificação marginal ou de superfície.
Quando substituímos a articulação natural pela
articulação protética, devemos reconhecer algumas
desvantagens principalmente no que diz respeito à
lubrificação. Primeiramente a fenda articular
(clearance) deve ser o suficiente para permitir a
formação de um filme fluido que impeça o contato
direto entre as superfícies, e assim possa proporcionar
uma lubrificação hidrodinâmica
25
.
Neste caso a espessura do filme fluido deve
ser maior que a rugosidade das superfícies. Contudo,
quando a espessura do filme é menor que a altura da
rugosidade e o contato direto é inevitável, a presença
das tribonectinas adsorvidas pelas superfícies protéti-
cas pode diminuir o atrito, pela baixa resistência destas
proteínas ao cisalhamento
Entre as superfícies protéticas o regime de
lubrificação pode ser hidrodinâmico, marginal ou misto
(intermediário entre os 2 regimes citados), na depen-
dência da espessura do filme fluido. Esta espessura,
que depende não só das propriedades dos biomateriais
constituintes do par tribológico, mas também de seu
design e tecnologia de fabricação, pode ser expressa
em função da viscosidade do liquido, da velocidade
relativa entre as superfícies e de sua rugosidade.
O simples fato de umedecer a superfície protética
pode diminuir o atrito, e assim materiais que permitam
um maior molhamento (medido pelo ângulo de contato)
de sua superfície têm melhor desempenho tribológico,
como a cerâmica, pois a maior dispersão do liquido
promove melhor lubrificação (Fig.13.21A,B)
28,29
.
Fig.13.21. A propriedade do líquido se distribuir sobre a superfície de
um material, chamada de molhamento, é medida pelo ângulo de
contato (A). Quanto menor o ângulo de contato, melhor a
distribuição do líquido na superfície e, portanto melhor a
lubrificação. (B) Dentre os materiais utilizados em superfícies
protéticas, a cerâmica apresenta o menor ângulo de contato.
Para que a espessura de um filme fluido seja
mantida é necessária uma dimensão de fenda articular
adequada para garantir um equilíbrio entre o contato
polar e equatorial, que em condições ideais promove
um regime hidrodinâmico de lubrificação. Nos casos
em que se utiliza o Polietileno, ainda que uma fenda
articular adequada seja obtida inicialmente, a
possibilidade de deformação do polímero tende a
produzir um contato equatorial (Fig.13.22A,B), de maior
atrito, e assim o principal regime de lubrificação passa
a ser o marginal ou de superfície. Materiais mais
rígidos como as ligas de cromo-cobalto e a cerâmica
deformam-se muito pouco e permitem a manutenção
da fenda articular e o contato polar, favorecendo o
regime de lubrificação hidrodinâmico ou misto.
Desgaste: A conseqüência inevitável do movimento
entre duas superfícies opostas é a remoção de material
devido à ação mecânica (desgaste), que pode gerar
milhares de partículas nos tecidos adjacentes a cada
ciclo de marcha
5
.
Na articulação protética o desgaste é
determinado por diferentes mecanismos, em função do
atrito, da lubrificação e do meio adjacente.
Fig.13.22. Regimes de lubrificação de superfícies articulares
protéticas. (A) Materiais mais rígidos não se deformam com o
carregamento, permitindo o contato polar, e assim que se man-
tenha uma fenda articular adequada (setas brancas) à lubrificação
hidrodinâmica. (B): Materiais mais dúcteis e elásticos (como o
polietileno) permitem a deformação que ocasiona um contato
equatorial, sem fenda articular. (Fonte Gomes, LSM25
Modificado de
Mischler26
)
O mecanismo mais freqüente de desgaste é a
abrasão, em que as asperezas superficiais funcionam
como uma lixa ao contato com o elemento oposto. A
abrasão, ocasionada pela rugosidade das superfícies
do par tribológico, pode ser agravada pela presença de
contaminantes no interior da articulação como
fragmentos metálicos, ósseos ou de cimento ósseo
(chamados de terceiro corpo), que irão promover
maiores danos à superfície articular e assim ocasionar
um desgaste rápido e progressivo. Este mecanismo
(abrasão por terceiro corpo) é constatado em explantes
pela presença de ranhuras e riscos na superfície
articular protética (Fig.13.23A e B)
25
.
A abrasão é grandemente influenciada pelos
biomateriais constituintes do par tribológico, uma vez
que materiais mais duros, e com menor ductilidade
mostram-se mais resistentes à abrasão por apresen-
tarem menor desgaste e maior resistência ao dano
superficial, como a articulação cerâmica/ cerâmica.
No desgaste por adesão as ligações entre as
superfícies opostas em pontos localizados, são rompi-
das pela ação mecânica do movimento, gerando
fragmentos que são transferidos para a superfície
oposta ou diretamente liberados para o interior da
articulação.
Fig. 13.23. (A) Explante de cabeça femoral protética mostrando
inúmeros sulcos e riscos oriundos da abrasão por terceiro corpo, com
profundas repercussões sobre a (B) estrutura do componente
acetabular de polietileno que apresenta sinais de falência
catastrófica. Fonte Gomes, LSM25
.
Neste mecanismo, a intensidade da força de
ligação entre átomos e moléculas das superfícies
opostas tem grande influência, e pode ser uma
importante fonte de partículas, como na articulação
metal/metal, quando a alta ductilidade promove maior
adesão. A medida que o material é progressivamente
removido dos pontos de maior contato, o conseqüente
auto-polimento da superfície diminui a intensidade do
desgaste adesivo.
A movimentação e o carregamento cíclicos
entre as superfícies articulares podem iniciar a fadiga
do material através de microtrincas que ao se
propagarem promovem a delaminação de fragmentos
para o interior do espaço articular. Este desgaste por
fadiga gera, portanto partículas maiores que podem
atuar como terceiro corpo ou mesmo ocasionar
bloqueio articular. O polietileno é particularmente
susceptível a este mecanismo quando da sua
oxidação, uma vez que a conseqüente alteração de
suas propriedades mecânicas diminui sua resistência à
fadiga
30
.
O desgaste pode ocorrer ainda por fenômenos
triboquímicos conseqüentes a reações químicas entre o
meio adjacente às superfícies em contato. Na
articulação Metal/Metal a remoção e formação
alternadas da camada de óxido sobre as superfícies
articulares (camada de passivação), liberam partículas
no interior da articulação resultantes do desgaste
oxidativo ou triboquímico.
27,28,29
As partículas ou debris formados pelos
diferentes mecanismos de desgaste podem, por
mecanismos mecânicos e /ou biológicos, levar à soltura
e destruição óssea progressiva e assim não só
comprometer a longevidade da artroplastia, como
dificultar os procedimentos reconstrutivos futuros.
O impacto do desgaste na gênese da osteólise e/
ou soltura é dependente não só do número de
partículas como também de sua morfologia,
dimensões, atividade biológica e citotoxicidade
5
.
Embora cabeças protéticas de maior diâmetro
possam apresentar o mesmo desgaste linear, o des-
gaste volumétrico e, portanto o número de partículas é
também significativamente maior
4,31
(Tabela 3).
Observe que para um mesmo desgaste linear,
o desgaste volumétrico de uma cabeça de 32 mm é
cerca de 2 vezes maior que o da cabeça de
22 milímetros
31
. Assim, pelo maior número de
partículas geradas, dá-se preferência ao desgaste
volumétrico como parâmetro a ser comparado com
o desfecho clínico das artroplastias totais. Desta forma
há que se considerar a relação risco/benefício para a
prática mais recente de se utilizar cabeças protéticas
de maior diâmetro, com o objetivo de aumentar a
estabilidade e diminuir a possibilidade de impacto com
a borda acetabular protética.
Vários ensaios experimentais em simuladores
de quadril demonstram um desgaste volumétrico muito
próximo do obtido em condições clínicas para o par
tribológico Metal/PE. Contudo uma vez que o número
de ciclos anuais pode apresentar grande variabilidade
entre diferentes pacientes, em avaliações experimen-
tais o parâmetro de desgaste anual é substituído por
milhão de ciclos.
Tabela 3. Relação entre o Desgaste Linear (0.1 mm/
ano) e o Desgaste Volumétrico em Função do Diâme-
tro da Cabeça de Cromo-Cobalto em Polietileno
Convencional.
Diâmetro Cefálico Desgaste Volumétrico
22 mm 38 mm3
28 mm 60 mm3
32 mm 80 mm3
A Tabela 4 compara o desgaste volumétrico
experimental de diferentes pares tribológicos utilizados
em reconstruções protéticas do quadril.
Observe que em relação ao par Cro-Co/PE
convencional, o polietileno altamente irradiado reduz,
em cerca de 90% o desgaste volumétrico, enquanto o
polietileno tri-irradiado, reduz o desgaste para níveis
semelhantes aos da articulação Metal/Metal, e o par
Cerâmica/Metal e Cerâmica/Cerâmica não apresentam
diferenças significativas entre si, em relação ao
desgaste volumétrico experimental.
32
É importante ressaltar, que para um mesmo
desgaste volumétrico, o número de partículas
dependerá também de seu tamanho, e assim as
partículas nanométricas resultantes do desgaste da
articulação M/M são em numero muito superior (em até
500 vezes) às partículas pouco menores que 1
micrômetro, resultantes do desgaste da articulação
Metal/PE
33
.
Tabela 4. Desgaste Volumétrico em Milímetros Cúbicos
(mm
3
) de Diferentes Pares Tribológicos por Milhão de
Ciclos (mc), em Simuladores de Quadril.
Par Tribológico Desgaste (mm3
/mc)
Cr/Co- PE Convencional 35
Cerâmica- PE Convencional 25
Cr/Co- PE X Linked 5
Cerâmica- PE X Linked 3
Cr/Co- Cr/Co 1.6
Cr/Co- PE X3 1.3
Cerâmica- Cr/Co <0.1
Cerâmica- Cerâmica <0.1
II. Resposta Orgânica aos Biomateriais
Os Biomateriais podem ocasionar efeitos locais
(tecidos adjacentes), remotos (órgãos a distância) ou
sistêmicos, na dependência do tipo, quantidade,
tamanho e toxicidade das partículas e substâncias
liberadas, de sua resistência à corrosão e da resposta
orgânica aos seus produtos
O organismo é bastante tolerante aos
biomateriais, sobretudo em condições de estabilidade
do implante. O PMMA enquanto um manto íntegro ao
redor do implante promove uma interface com o osso
sem a interposição de membrana e sem sinais de
reação inflamatória (osteointegração do cimento). A
reação às partículas oriundas do desgaste do
polietileno, quando menor que 0.9mm/ano, pode
permitir uma sobrevivência da reconstrução protética
em até 90% aos 10 anos de seguimento. Esta
tolerância às partículas ocorre porque, algumas
semanas após a artroplastia, forma-se uma
pseudocápsula constituída na sua porção mais
superficial por tecido fibroso onde se nota a presença
de alguns macrófagos.
Em condições habituais, as partículas
formadas pelo desgaste são absorvidas pela pseudo-
cápsula e em seu interior são fagocitadas pelos
macrófagos. A fagocitose de partículas maiores requer
a fusão de vários macrófagos (células gigantes
multinucleadas) que resulta em verdadeiros
granulomas de corpo estranho. Outro destino das
partículas é o espaço perivascular linfático a partir do
qual as partículas alcançam os vasos linfáticos,
linfonodos regionais e, eventualmente os órgãos do
sistema reticulo-endotelial, constituindo assim um
mecanismo de limpeza, porém de disseminação das
partículas (Fig.13.24).
Na dependência das características e toxici-
dade das partículas, ocorre a liberação de quimocinas
(M-CSF e MCP-1) que recrutam células inflamatórias,
prostaglandinas (principalmente E2) e citocinas (Inter-
leucina 1β e 6, fator de necrose tumoral α entre outros)
que podem não só determinar a necrose dos macro-
fagos, como também iniciar a atividade osteoclástica,
ou ainda levar à hapoptose do osteoblasto, com
conseqüente necrose e osteólise. A disseminação de
partículas ocorre também através do chamado espaço
articular efetivo, tendo como meio de transporte o fluido
articular e assim as partículas podem alcançar o tecido
ósseo adjacente, a interface cimento-osso e a interface
cimento metal
34
. Aspenberg e van der Vis
35
postularam
que a flutuação da pressão do liquido articular dentro do
espaço articular efetivo ocasionada pelo carregamento
cíclico, pode desencadear a reabsorção óssea pelo
mecanismo da hapoptose do osteócito, processo este
muito semelhante às erosões ósseas de vértebras
ocasionadas por um aneurisma contíguo.
O titânio é bem tolerado pelo organismo exceto
em condições de instabilidade protética ou de contato
direto com outros metais, ocasião em que sua baixa
resistência ao desgaste leva a produção de um grande
aumento do número de partículas de óxido de titânio
(TiO2)
.Estas partículas ao se depositarem nos tecidos
adjacentes produzem uma coloração escura
denominada metalose e intensa atividade inflamatória
que resulta em soltura do implante e/ou intensa
osteólise (Fig.13.25).
Partículas metálicas sobretudo os íons cromo,
cobalto e níquel podem agir como haptenos e eliciar
uma reação de hipersensibilidade tipo IV em indivíduos
previamente sensibilizados
33
.
Fig 13.24. Desenho esquemático do processo de reação orgânica às
partículas de biomateriais. As partículas (pt) absorvidas pela
pseudo cápsula (pc) sofrem a ação de macrófagos (M) recrutados
a partir de células progenitoras (P) pela ação de quimocinas (MCP:
monocyte chemoattractant proteins , M-CSF: Macrophage colony
stimulating factor).
Cr/Co = Liga de Cromo-Cobalto PE X3= Polietileno triir-
radiado. Valores aproximados, para cabeças de 28 mm em condi-
ções semelhantes de ensaio.
A toxicidade do Cobalto e Cromo tem sido
motivo de preocupação, sobretudo em articulações
metal/metal,onde uma grande quantidade destes íons
é liberada e pode ser detectada no sangue (entre 5 a 10
vezes a concentração pré-operatória) e na urina em
pacientes submetidos a este procedimento
36
.
Ainda para a articulação metal-metal tem sido
descrita uma reação de hipersensibilidade, do tipo IV ou
tardia, mediada por linfócitos tipo T, fazendo com que o
quadro histológico das falhas em relação aos outros
biomateriais, mude de um infiltrado macrofágico para
um quadro histológico linfocitário, que pode se
estender, através do espaço articular efetivo, para os
tecidos periarticulares, e também à distância, através
da corrente vascular e linfática.
Esta reação linfocitária pode ocasionar na
membrana sinovial, um quadro de sinovite proliferativa
descamante que está freqüentemente associado à dor
de origem desconhecida nas superfícies protéticas
metal/metal. Por outro lado, o infiltrado linfocitário pode
se alojar no interior do tecido ósseo e predispor à
soltura e mesmo à osteólise. A ocorrência de infiltrado
nas partes moles periarticulares está associada à
formação de granulomas e dos chamados pseudo-
linfomas
37
.
Embora vários estudos epidemiológicos não
demonstrassem incidência aumentada de neoplasia ou
outras lesões em órgãos do sistema reticulo-endotelial
38
, e malformações fetais em pacientes submetidos ao
implante de articulações metal/ metal, alguns cirurgiões
preferem contra-indicá-la em pacientes com insuficiên-
cia renal e mulheres em fase reprodutiva.
Partículas cerâmicas, por sua estabilidade química
(baixa reatividade), e, portanto grande resistência à
corrosão, são muito bem toleradas pelo organismo.
Bibliografia e Referências Bibliográficas
1. Williams, D.F.: Definitions in Biocompatibility.
Amsterdam: Elsevier, CRC Press, Vol.l , 1987.
2. Park, J. B. “Biomaterials, Introduction” Plenum Press,
New York, 1979.
3. Bergmann G,Graichen F, Rohlman A. Hip joint forces
during walking and standing-measured in a patient with
bilateral prostheses. J Biomech. 1993; 26:969-90
4. Sochard DH. Relationship of Acetabular Wear to
Osteolysis and Loosening in Total Hip Arthroplasty. Clin
Orthop Rel Res.1999; 363:135-150
5. Buchhorn GH,Willert HG. Wear and Osteolyses. In:
Bone cements and cemeting technique,Springer-Verlag
Berlin Heidelberg: 163-182,2001
6. Cowin SC. Mechanics of Materials. 2:15-42. In: Bone
Mechanics. CRC Press Boca Raton, Florida, 1989.
7.Van Vlack LH. Características exigidas nos materiais
usados em engenharia 1:1-17. In: Princípios de Ciências
dos Materiais. Ed. Edgard Blucher, São Paulo, 1970.
8.Popov EP. Tensão e Cargas Axiais 3:57-85. In:
Introdução à Mecânica dos Sólidos. Ed. Edgard Blucher,
São Paulo, 1978.
9. Ozkaya N, Nordin M. Multiaxial Deformations and
Stress Analysis. 8:153-194. In Fundamentals of
Biomechanics. Equilibrium, Motion and Deformition.2nd
Ed.1999 Springer, NY.
10. Wolff J: Das Gesetz der Transformation der Knochen.
Berlin Hirschwald, 1982.
11. Ramamurti C. In Finker R, editor: Orthopaedics in
primary care, Baltimore,1979, Wiliams & Wilkins.
12. Gomes LSM, Griza S, Cervieri A, Strohaecker T.
Different designs of polished, collarless tapered stems
influence the in vitro behaviour of cemented femoral hip
implants. 2009; 10th EFFORT: Congress of the European
Federation of National Associations of Orthopaedics and
Traumatology, 3-6 Junho, Viena, Austria. Disponível em:
http://www.efort.org/cdrom2009/PosterContent.asp?pid=P
345 (20 ag.2009)
13. Willert HG, Broback LG, Buckhorn GH. et. al. Crevice
corrosion of cemented titanium alloy stems in total hip
replacements. Clin Orthop Rel Res. 1996;333:51-75.
14. Charnley J (1979) Low friction arthroplasty of the
hip:theory and practice. Springer, Berlin Heidelberg
New York Tokyo
15. Faris PM, Ritter MA, Pierce AL, Davies KE, Faris GW.
Polyethylene sterilization and production affects wear in
total hip arthroplasties. Clin Orthop Rel Res 2006; 453:
305-308.
16. Griza S. Estudo comparativo da influência dos ân-
gulos protéticos nos padrões de transmissão de carga e
estabilidade in vitro de hastes femorais cimentadas, cô-
nicas e polidas. Tese de Doutoramento. Programa de
pós-graduação em engenharia de minas,metalúrgica e
materiais. Universidade Federal do Rio Grande do Sul,
2006.
17. James SP, Jasty M, Davies JP. Fractographic inves-
tigation of PMMA bone cement focusing on the relation-
ship between porosity reduction and increased fatigue
Fig.13.25 (A) Radiografia pré-operatória mostrando intenso
desgaste na porção superior do componente acetabular. (B e C):
Intensa metalose nos tecidos adjacentes ao implante. (D):Explantes
mostrando a destruição do componente acetabular (seta).
life. J Biomed Mater Res 26: 651-662, 1992
18. Havelin L I, Espehaug B, Vollset S E, Engesaeter L
B. The effect of the type of cement on early revision of
Charnley total hip prostheses. A review of eight thousand
five hundred and seventy-nine primary arthroplasties from
the Norwegian Arthroplasty Register. J Bone Joint Surg
Am. 1995; (77): 1543-1550.
19. Jasty M, Maloney WJ, Bragdon CR, O’Connor DO,
Haire T, Harris WH.: The initiation of failure in
cemented femoral components of hip arthroplasties. J
Bone Joint Surg 1991;73-B:551-558
20. Verdonschot N, Huiskes R. Acrylic cement creeps but
does not allow much subsidence of femoral stems. J Bone
Joint Surg [Br]. 1997; 79:665–669
21. Verdonschot N, Huiskes R. Cement Debonding
process of Total Hip Arthroplasty Stems. Clin Orthop
Rel Res 1997; 336: 297-307
22. Willman G. Bioceramics: State-of-the-art and future
Options. Berichte Deutsche Keramische Gesselschaft
2002; 79:27-31
23. Allain J, Le Mouel S, Goutallier D et al. Poor eight-
year survival of cemented zirconia-polyethylene total hip
replacements. J Bone Joint Surg. 1999;81B:835-842.
24. Walker PS, Bullough PG. The effects of friction and
wear in artificial joints. Orthop Clin North Am 1973; 4: 275-
293.
25. Gomes LSM. Tribologia de Superfícies Articulares
Protéticas. In: Artroplastia Total do Quadril. Clinica
Ortopédica da SBOT, Rio de Janeiro, Guanabara Koogan.
2009:25-40
26. Mischler D. Tribology and Implants. Cours Biomateriaux
2006. Disponível em: http://ltp2.epfl.ch/ Cours/Biomat/
BioMat-03.pdf.
27. Campbell P, Shen FW, McKellop R. Biologic and
Tribologic Considerations of Alternative Bearing
Surfaces. Clin Orthop 418:98-108,2004.
28. Fisher J, Jin Z, Tipper J, Stone M, Ingham E.
Tribology of alternative bearings. Clin Orthop Rel Res
2006; 453: 25-34.
29. Konttinen YT, Zhao D, Beklen A et al. The
microenviroment around total hip replacement
prostheses. Clin Orthop Rel Res 2005; 430: 28-38.
30. Kurtz SM, Hozack WJ, Purtill JJ et al. Significance of
In vivo degradation for polyethylene in total hip
arthroplasty. Clin Orthop Rel Res 2006; 453: 47-57.
31. Tipper JL, Ingham E, Hailey JL, et al. Quantitative
analysis of polyethylene wear debris, wear rate and head
damage in retrieved Charnley hip prostheses. J Mater Sci
Mater Med. 2000; 11: 117-124.
32. 19.Dumbleton JH, D’Antonio JA, Manley MT, Capello
WN, Wang A. The Basis for a Second-generation Highly
Cross-linked UHMWPE. Clin Orthop 453:265-271, 2006.
33. Willert HG, Buchhorn GH, Fayyazi A, et al. Metal-on-
metal bearings and hypersensitivity in patients with
artificial hip joints. A clinical and histomorphological study.
J bone Joint Surg 87(A):28-36, 2005
34. Schmalzried TP, Jasty M, Harris WH. Periprosthetic
bone loss in total hip arthroplasty: polyethylene wear
debris and the concept of effective joint space. J Bone
Joint Surg Am 1992;74:849-863
35. Aspenberg P, Van der Vis HM. Fluid Pressure may
Cause periprosthetic osteolysis- particles are not the
only thing. Acta Orthop Scand.1998;69:1-4
36. MacDonald SJ. Metal-on-Metal Total Hip Arthroplasty.
The Concerns. Clin Orthop Rel Res.2004;429: 86-93.
37. Zustin J, Amling M, Krause M et al. Intraosseous
lymphocytic infiltrates after hip resurfacing
arthroplasty .A histopathological study on 181
retrieved femoral remnants. Virchows Arch. 2009;
454:581-588
38. Visuri T, Pukkala E, Paavolainen P, Pulkinnen P,
Riska EB: Cancer risk after metal on metal and
polyethylene on metal total hip arthroplasty. Clin
Orthop Rel Res. 1996;329(Suppl):S280-S289.

Más contenido relacionado

Similar a Biomateriais em Artroplastia de Quadril:

A introducao e
A   introducao eA   introducao e
A introducao eJosé Mota
 
Aula 2 ensaios mecânicos e end - ensaio de tração
Aula 2   ensaios mecânicos e end - ensaio de traçãoAula 2   ensaios mecânicos e end - ensaio de tração
Aula 2 ensaios mecânicos e end - ensaio de traçãoAlex Leal
 
9 ensaios mecanicos_dos_materiais
9 ensaios mecanicos_dos_materiais9 ensaios mecanicos_dos_materiais
9 ensaios mecanicos_dos_materiaisdjoaoalberto
 
Análise dinâmico mecânica
Análise dinâmico mecânicaAnálise dinâmico mecânica
Análise dinâmico mecânicaA X.S
 
Analysis of biomechanics femur behavior based on Huiskes model of bone adapta...
Analysis of biomechanics femur behavior based on Huiskes model of bone adapta...Analysis of biomechanics femur behavior based on Huiskes model of bone adapta...
Analysis of biomechanics femur behavior based on Huiskes model of bone adapta...Paula Antunes
 
Civ pedro caruso restum perez de faria
Civ pedro caruso restum perez de fariaCiv pedro caruso restum perez de faria
Civ pedro caruso restum perez de fariaAleArauale
 
Apostila resistencia dos_materiais_parte_1
Apostila resistencia dos_materiais_parte_1Apostila resistencia dos_materiais_parte_1
Apostila resistencia dos_materiais_parte_1Hudson Luiz Pissini
 
Aula 02 conceitos básicos de resistência dos materiais
Aula 02   conceitos básicos de resistência dos materiaisAula 02   conceitos básicos de resistência dos materiais
Aula 02 conceitos básicos de resistência dos materiaisJuliano Aparecido de Oliveira
 
Noções de resistências dos materiais: esforços axiais e transversais
Noções de resistências dos materiais: esforços axiais e transversaisNoções de resistências dos materiais: esforços axiais e transversais
Noções de resistências dos materiais: esforços axiais e transversaisSamanta Lacerda
 

Similar a Biomateriais em Artroplastia de Quadril: (17)

A introducao e
A   introducao eA   introducao e
A introducao e
 
Aula 9 Biomec Ossos e Articulação
Aula 9   Biomec Ossos e ArticulaçãoAula 9   Biomec Ossos e Articulação
Aula 9 Biomec Ossos e Articulação
 
Aula 2 ensaios mecânicos e end - ensaio de tração
Aula 2   ensaios mecânicos e end - ensaio de traçãoAula 2   ensaios mecânicos e end - ensaio de tração
Aula 2 ensaios mecânicos e end - ensaio de tração
 
9 ensaios mecanicos_dos_materiais
9 ensaios mecanicos_dos_materiais9 ensaios mecanicos_dos_materiais
9 ensaios mecanicos_dos_materiais
 
Ensaio de Tração
 Ensaio de Tração  Ensaio de Tração
Ensaio de Tração
 
Análise dinâmico mecânica
Análise dinâmico mecânicaAnálise dinâmico mecânica
Análise dinâmico mecânica
 
Capítulo-3.pdf
Capítulo-3.pdfCapítulo-3.pdf
Capítulo-3.pdf
 
Analysis of biomechanics femur behavior based on Huiskes model of bone adapta...
Analysis of biomechanics femur behavior based on Huiskes model of bone adapta...Analysis of biomechanics femur behavior based on Huiskes model of bone adapta...
Analysis of biomechanics femur behavior based on Huiskes model of bone adapta...
 
Relatorio
RelatorioRelatorio
Relatorio
 
Sobre as leis fundamentais que regem as forças de atrito
Sobre as leis fundamentais que regem as forças de atritoSobre as leis fundamentais que regem as forças de atrito
Sobre as leis fundamentais que regem as forças de atrito
 
Civ pedro caruso restum perez de faria
Civ pedro caruso restum perez de fariaCiv pedro caruso restum perez de faria
Civ pedro caruso restum perez de faria
 
Apostila resistencia dos_materiais_parte_1
Apostila resistencia dos_materiais_parte_1Apostila resistencia dos_materiais_parte_1
Apostila resistencia dos_materiais_parte_1
 
VERSÃO-FINAL_PROJETO-1
VERSÃO-FINAL_PROJETO-1VERSÃO-FINAL_PROJETO-1
VERSÃO-FINAL_PROJETO-1
 
Aula 02 conceitos básicos de resistência dos materiais
Aula 02   conceitos básicos de resistência dos materiaisAula 02   conceitos básicos de resistência dos materiais
Aula 02 conceitos básicos de resistência dos materiais
 
Noções de resistências dos materiais: esforços axiais e transversais
Noções de resistências dos materiais: esforços axiais e transversaisNoções de resistências dos materiais: esforços axiais e transversais
Noções de resistências dos materiais: esforços axiais e transversais
 
236
236236
236
 
236
236236
236
 

Último

LEAN SIX SIGMA - Garantia da qualidade e segurança
LEAN SIX SIGMA - Garantia da qualidade e segurançaLEAN SIX SIGMA - Garantia da qualidade e segurança
LEAN SIX SIGMA - Garantia da qualidade e segurançaGuilhermeLucio9
 
Treinamento de NR06 Equipamento de Proteção Individual
Treinamento de NR06 Equipamento de Proteção IndividualTreinamento de NR06 Equipamento de Proteção Individual
Treinamento de NR06 Equipamento de Proteção Individualpablocastilho3
 
Tecnólogo em Mecatrônica - Universidade Anhanguera
Tecnólogo em Mecatrônica - Universidade AnhangueraTecnólogo em Mecatrônica - Universidade Anhanguera
Tecnólogo em Mecatrônica - Universidade AnhangueraGuilhermeLucio9
 
Livro Vibrações Mecânicas - Rao Singiresu - 4ª Ed.pdf
Livro Vibrações Mecânicas - Rao Singiresu - 4ª Ed.pdfLivro Vibrações Mecânicas - Rao Singiresu - 4ª Ed.pdf
Livro Vibrações Mecânicas - Rao Singiresu - 4ª Ed.pdfSamuel Ramos
 
A Importância dos EPI's no trabalho e no dia a dia laboral
A Importância dos EPI's no trabalho e no dia a dia laboralA Importância dos EPI's no trabalho e no dia a dia laboral
A Importância dos EPI's no trabalho e no dia a dia laboralFranciscaArrudadaSil
 
DESTRAVANDO O NOVO EDITAL DA CAIXA ECONOMICA
DESTRAVANDO O NOVO EDITAL DA CAIXA ECONOMICADESTRAVANDO O NOVO EDITAL DA CAIXA ECONOMICA
DESTRAVANDO O NOVO EDITAL DA CAIXA ECONOMICAPabloVinicius40
 
Eletricista instalador - Senai Almirante Tamandaré
Eletricista instalador - Senai Almirante TamandaréEletricista instalador - Senai Almirante Tamandaré
Eletricista instalador - Senai Almirante TamandaréGuilhermeLucio9
 

Último (7)

LEAN SIX SIGMA - Garantia da qualidade e segurança
LEAN SIX SIGMA - Garantia da qualidade e segurançaLEAN SIX SIGMA - Garantia da qualidade e segurança
LEAN SIX SIGMA - Garantia da qualidade e segurança
 
Treinamento de NR06 Equipamento de Proteção Individual
Treinamento de NR06 Equipamento de Proteção IndividualTreinamento de NR06 Equipamento de Proteção Individual
Treinamento de NR06 Equipamento de Proteção Individual
 
Tecnólogo em Mecatrônica - Universidade Anhanguera
Tecnólogo em Mecatrônica - Universidade AnhangueraTecnólogo em Mecatrônica - Universidade Anhanguera
Tecnólogo em Mecatrônica - Universidade Anhanguera
 
Livro Vibrações Mecânicas - Rao Singiresu - 4ª Ed.pdf
Livro Vibrações Mecânicas - Rao Singiresu - 4ª Ed.pdfLivro Vibrações Mecânicas - Rao Singiresu - 4ª Ed.pdf
Livro Vibrações Mecânicas - Rao Singiresu - 4ª Ed.pdf
 
A Importância dos EPI's no trabalho e no dia a dia laboral
A Importância dos EPI's no trabalho e no dia a dia laboralA Importância dos EPI's no trabalho e no dia a dia laboral
A Importância dos EPI's no trabalho e no dia a dia laboral
 
DESTRAVANDO O NOVO EDITAL DA CAIXA ECONOMICA
DESTRAVANDO O NOVO EDITAL DA CAIXA ECONOMICADESTRAVANDO O NOVO EDITAL DA CAIXA ECONOMICA
DESTRAVANDO O NOVO EDITAL DA CAIXA ECONOMICA
 
Eletricista instalador - Senai Almirante Tamandaré
Eletricista instalador - Senai Almirante TamandaréEletricista instalador - Senai Almirante Tamandaré
Eletricista instalador - Senai Almirante Tamandaré
 

Biomateriais em Artroplastia de Quadril:

  • 1. Luiz Sérgio Marcelino Gomes - Mestre e Doutor em Ortopedia pela Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto da U.S.P. - Chefe do Serviço de Cirurgia e Reabilitação Ortopédico-Traumatológica de Batatais (SECROT-SP) - Chefe do Grupo de Quadril do Hospital e Maternidade Celso Pierro – PUC-Campinas (SP) I. INTRODUÇÃO II. BIOMATERIAIS UTILIZADOS EM SUBSTITUIÇÕES ARTICULARES PROTÉTICAS A. Propriedades Mecânicas 1. Conceitos Gerais 2. Propriedades Mecânicas e Modelo Protético 3. Avaliação Experimental dos Esforços Periprotéticos. B. Estrutura e Composição 1. Materiais Metálicos : a) Aço Inoxidável b) Ligas de Cromo-Cobalto c) Ligas de Titânio d) Tântalo e outros materiais Metálicos 2. Materiais Poliméricos: a) Polietileno de Peso Molecular Ultra-alto b) Polimetacrilato de Metila (PMMA) 3. Materiais Cerâmicos 4. Compósitos C. Propriedades Tribológicas dos Implantes Protéticos II. RESPOSTA ORGÂNICA AOS BIOMATERIAIS I. INTRODUÇÃO Considera-se como Biomaterial toda substância (à exceção de drogas) ou combinação de substâncias, de origem sintética ou natural, que durante um período de tempo indeterminado é empregada como um todo, ou parte integrante de um sistema para tratamento, ampliação ou substituição de quaisquer tecidos, órgãos ou funções corporais 1 . De uma forma mais ampla, como a sugerida por Park 2 , os biomateriais podem ser entendidos como tudo aquilo que de modo contínuo ou intermitente, entra em contato com fluidos corpóreos, mesmo que esteja localizado fora do organismo. Quanto à sua interação com os tecidos adja- centes, podemos distinguir os materiais biotoleráveis como os que provocam uma reação orgânica de encapsulamento fibroso, onde pode se notar a presença de numerosos macrófagos e células fagocitárias, que dominam o quadro histológico; os bioinertes que têm uma interação biológica mínima com os tecidos adjacentes e assim a presença do encapsulamento fibroso é, muitas vezes, bastante reduzida; os materiais bioativos que interagem ativamente com o organismo incorporando-se aos tecidos adjacentes sem a formação de membrana de interface, através de verdadeiras ligações químicas; e os materiais bioabsorvíveis ou reabsorvíveis que, após um tempo variável em serviço, são degradados, solubilizados ou fagocitados pelo organismo. Especificamente na área ortopédica, os biomateriais foram responsáveis pelo grande avanço na cirurgia reconstrutora das articulações. Se considerar- mos a substituição articular protética do quadril, os implantes utilizados neste procedimento devem supor- tar os esforços oriundos da contração muscular, de forças inerciais, do suporte de carga estática e cíclica e ainda resistir ao desgaste das diversas interfaces, assim como não devem provocar reações adversas ao organismo 3-5 . Porém não há até o momento um material que atenda, simultaneamente, a todas as exigências mecânicas, metalúrgicas, funcionais e biológicas necessárias para um implante protético perfeito. Cada biomaterial apresenta uma combinação de propriedades particulares, determinadas por sua estrutura, composição e processamento, benéficas em algumas situações, porém com possíveis limitações em outras condições específicas. Estas limitações torna- ram-se patentes com a realização da artroplastia em pacientes mais jovens, nos quais as situações de maior solicitação funcional e maior tempo em serviço dos implantes são requeridas. A evolução tecnológica, desde a década de 60, permitiu a introdução de novos materiais e modelos protéticos, que aliados aos refinamentos da técnica cirúrgica buscavam maior longevidade da reconstrução articular protética. Embora grandes progressos tenham sido observados, como os conceitos de fixação bioló- gica e de superfícies articulares alternativas, muitas inovações, longe de representar avanços, resultaram em falhas precoces e resultados desalentadores. Tais insucessos foram ocasionados, em grande parte, pela não compreensão da cinemática e da biomecânica articular, assim como pelo restrito conhecimento dos mecanismos de falhas in vivo dos implantes e de suas implicações na concepção e utilização racional de novos modelos protéticos e biomateriais. Biomateriais em Artroplastia de Quadril: Propriedades, Estrutura e Composição CAPÍTULO 13
  • 2. II. BIOMATERIAIS UTILIZADOS EM SUBSTITUIÇÕES ARTICULARES PROTÉTICAS A utilização de novos biomateriais permitiu a introdução de novos conceitos e designs em subs- tituições articulares protéticas, procurando adequar as propriedades dos materiais às solicitações in vivo. Os biomateriais mais frequentemente utilizados em recons- truções osteoarticulares podem ser agrupados em: metálicos, poliméricos, cerâmicos e compósitos. A opção por um determinado tipo de material é feita de acordo com sua resistência à corrosão e bio- compatibilidade, propriedades mecânicas e metalúr- gicas assim como pelo comportamento do material durante o processamento e uso, custo e disponibili- dade. De grande importância são as propriedades me- cânicas, representadas principalmente pela resistência (Tensão de Escoamento, Tensão Máxima, Tensão de Ruptura), ductilidade, rigidez, tenacidade, dureza, fluência e fadiga 6 . Embora estes termos da ciência dos materiais sejam de uso diário dos engenheiros, sua aplicação cada vez mais freqüente no design e na avaliação de falhas dos implantes, resultou na neces- sidade de compreensão de alguns conceitos mecâ- nicos básicos por parte dos médicos e outros profis- sionais que se dedicam a esta área do conhecimento. A. PROPRIEDADES MECÂNICAS A1. Conceitos Gerais As forças externas, que agem sobre os implantes e tecidos adjacentes, podem ser aplicadas perpendicularmente à estrutura (forças normais) ocasionando seu alongamento (força de tração) ou sua compactação (força de compressão). Essas duas forças tendem a alterar o volume do corpo, enquanto a força que age tangencialmente à superfície (força de cisalhamento ou força cortante) tende a alterar sua forma. Observe-se que quando um determinado esforço é aplicado a um corpo, os três componentes estão presentes simultaneamente e, em qualquer ponto deste corpo, a tração e compressão são máximas em planos perpendiculares ou ortogonais (esforços principais). No mesmo ponto, a força cortante ou de cisalhamento é nula na direção dos esforços principais e máxima em um plano situado a 45 º destes planos ortogonais (Fig.13.1A-E). À alteração de volume gerada pelo movimento molecular em resposta às forças normais (tração e compressão) e pelo deslizamento molecular que altera a forma (cisalhamento), chamamos de deformação. A deformação (ε ou strain) é o deslocamento relativo de um ponto no material, por unidade de comprimento, e pode ser expressa em partes por milhão (micro- deformação, microstrain ou µε), ou valores percentuais, em que ε = Δℓ/ℓ .100 , onde ℓ é o comprimento inicial do corpo e Δℓ sua variação após a aplicação do esforço 6,7 . Para um corpo submetido a uma força normal, o quociente entre a deformação em direção per- pendicular à deformação longitudinal é chamado Coeficiente de Poisson que pode, para diferentes materiais, apresentar valores entre 0 (material totalmente compressível) e 0.5 (material não com- pressível, que apresenta volume constante durante a deformação). Valores maiores que 0.5 implicam na expansão de volume durante a deformação 8 . Para se comparar corpos de diferentes áreas de secção, introduz-se a grandeza Tensão (δ) como sendo a força aplicada (F) por unidade de área (A), ou seja, δ= F/A. A tensão (δ) é dada em Pascal (Pa= 1N/m 2 ), ou seus múltiplos, kPa (kilo Pascal: 10 3 Pa), MPa (Mega Pascal:10 6 Pa) ou GPa (Giga Pascal: 10 9 Pa). Um erro comum é a tradução de tension da língua inglesa por tensão, quando o correto seria tração. O termo tensão (equivalente a Stress na língua Inglesa e representado por δ) se refere à força aplicada em uma determinada área. As propriedades mecânicas dos materiais podem ser entendidas a partir do diagrama tensão- deformação como o observado na figura 13.2, que apresenta em abscissa a deformação relativa ε sofrida por um material (hipotético) quando submetido a uma determinada tensão δ. Do ponto de origem do gráfico (0) até o ponto A existe proporcionalidade entre a tensão e a deformação relativa, de modo que ao retirarmos a força aplicada o corpo retorna ao seu estado inicial indicando uma deformação reversível, na qual os átomos constituintes do material mantêm sua posição relativa (deformação elástica). Nesta região, chamada região elástica, a proporcionalidade entre tensão e deformação, permite a aplicação da equação da reta e assim teremos δ = K. ε, ou seja, a tensão é proporcional à deformação. Conhecida como Lei de Hooke, K representa uma constante de proporcio- nalidade denominada Módulo de Elasticidade (E) ou Módulo de Young.Atente que K=E=δ/ε, ou seja, o mó- dulo de elasticidade é numericamente igual ao quociente entre a tensão aplicada e a deformação Fig.13.1- Alterações na estrutura de um corpo (A) quando submetido à força de compressão (B), de tração (C) e cisalhamento (D). As forças normais (tração e compressão) são máximas em planos ortogonais (esforços principais), enquanto a força cortante é nula nestes planos, e máxima em um plano situado a 45º dos esforços principais (E). T:tração, C:compressão e Ci: Cisalhamento
  • 3. resultante e assim, quanto menos um material se deforma quando submetido a uma determinada tensão na zona elástica, maior será seu módulo de elasti- cidade. O ângulo Ө representa o grau de inclinação da reta na zona elástica e assim a sua tangente será numericamente igual ao Módulo de Elasticidade, ou seja TgӨ = E=δ/ε. É possível fazer um paralelo entre módulo de elasticidade e rigidez do material, observando, porém que este último conceito é definido em relação à deformação absoluta frente a uma força F e, portanto varia com o design do material. Considerada esta observação podemos dizer que, para corpos de mesma geometria, quanto mais rígido o material (menor deformação), maior será seu módulo de elasticidade. Observe que o módulo de elasticidade não interfere na resistência à ruptura do material, e assim o baixo módulo de elasticidade de um material pode coexistir com uma elevada tensão de ruptura (ex. titânio) ou o inverso, como o aço inoxidável. O valor do módulo de elasticidade pode variar dentro de um mesmo material em função de sua estrutura, como nos materiais Anisotrópicos em que as propriedades são diferentes em todas as direções, em qualquer ponto. Porém alguns materiais podem apresentar simetria em relação a planos ortogonais e, de acordo com o número de planos necessários para o estabelecimento desta simetria podem-se reconhecer os materiais ortotrópicos ou ainda transversalmente isotrópicos. Este artifício é bastante conveniente, pois permite matematicamente uma diminuição no número de constantes independentes em simulações mecâ- nicas por elementos finitos, uma vez que a maioria das estruturas biológicas tem um comportamento ortotró- pico ou isotrópico transversal 6 . Os materiais metálicos geralmente apre- sentam módulo de elasticidade constante mediante a aplicação de tensões crescentes. Contudo muitos materiais podem apresentar uma relação não linear com a tensão, como os materiais biológicos (tendões e ligamentos) que se tornam mais rígidos à medida que são progressivamente deformados. Na zona elástica, a área sob a curva corres- ponde numericamente à energia absorvida pelo mate- rial durante o carregamento, e é chamada Resiliência. Desta forma, para materiais submetidos à mesma deformação, quanto maior seu módulo de elasticidade (maior inclinação da reta ou o ângulo Ө), maior será a energia absorvida pelo material. A relação entre Módulo de Elasticidade e energia absorvida pelo material é importante, pois influencia a transmissão dos esforços até os tecidos adjacentes ao implante 6 . Para implantes de mesmo design, aquele constituído por um material de maior módulo de elasticidade será mais resiliente e assim irá restringir a magnitude das tensões transmitidas ao osso adjacente. Este fenômeno de diminuição dos esforços transmitidos ao tecido ósseo, como a decorrente da presença de um implante, denomina-se blindagem (stress shielding na língua inglesa), e assim pode resultar na reabsorção óssea adaptativa. Ainda na Figura 13.2 observamos que a partir do ponto A, se a tensão é removida, o material não retorna ao seu estado original, indicando assim que houve deformação definitiva (ou plástica), resultado de um deslocamento permanente dos átomos que constituem o material 7 . O ponto B delimita, portanto, a região na qual o material sofre deformação permanente e é chamado de ponto de escoamento. A tensão associada a este ponto, chamada tensão de escoa- mento,representa a capacidade do material resistir à deformação permanente. Observe que nesta região o material sofre uma grande deformação sem acréscimo significativo da tensão. Contudo nos Biomateriais não ocorre um escoamento típico sendo necessário definir- se um limite convencional de escoamento como, por exemplo, a tensão necessária para provocar uma defor- mação permanente de 0.2 por cento. A figura 13.3 nos apresenta um desenho da curva tensão-deformação aproximada para os principais biomateriais utilizados em cirurgia ortopédica (materiais cerâmicos, metálicos, compósitos e poliméricos). Observe a diferença de comportamento mecânico entre os diferentes materiais. De volta à figura 13.2, após o escoamento (B), observa-se um aumento progressivo da resistência do material (por encruamento), até que a tensão atinja um ponto máximo (ponto C) chamado limite de resis- tência, após o que a ruptura pode ocorrer sem aumen- to expressivo da tensão (limite de ruptura). A tensão associada a este ponto é chamada de tensão de ruptura (ponto D). Fig. 13.2. Diagrama Tensão/Deformação. A zona elástica se estende da origem (0) ao ponto A. Nesta região a energia absorvida pelo material, chamada resiliência, é numericamente igual a área da região sob esta curva. No ponto B o material se deforma permanentemente (região de escoamento), onde se inicia a zona plástica. O ponto C representa a tensão e deformação máximas suportadas pelo material, enquanto o ponto D representa o ponto de ruptura do material. A tenacidade representa a energia absorvida pelo material desde a origem até a ruptura e é numericamente igual à área sob toda a extensão da curva..
  • 4. Observe que no material em questão, no ponto B (escoamento), pequena variação da tensão provoca grande deformação do material, característica esta dos materiais dúcteis (ex. biomateriais metálicos, polietile- no). A ductilidade se refere, portanto à deformação plástica total até o ponto de ruptura. A energia total absorvida pelo material até sua ruptura é chamada de tenacidade. Representada pela área sob a curva do diagrama tensão-deformação até a tensão de ruptura, indica a energia necessária para romper o material. De modo mais simples e prático podemos entender a tenacidade como a capacidade do material em resistir ao impacto. Por outro lado, materiais que sofrem ruptura, sem deformação prévia significativa, são chamados de materiais frágeis (como os materiais cerâmicos e o cimento ósseo). Os materiais podem ser, portanto tenazes (dúcteis quando se refere aos metais) ou frágeis ou ainda alguma combinação dos dois, depen- dendo da deformação que podem suportar previamente à ruptura (Fig.13.4). Algumas resinas, como o cimento ósseo, quando aquecidas podem alterar seu comportamento frágil para um comportamento mais tenaz, passando a apresentar uma região plástica definida, desde que ultrapassada uma determinada temperatura crítica chamada Temperatura de Transição Vítrea (Tgs). A dureza é uma propriedade que indica a resistência do material à penetração. Os materiais de maior dureza são mais difíceis de serem riscados e mantém por tempo mais longo o polimento que lhes é aplicado, sendo por isto mais frequentemente indica- dos para o uso em superfícies articulares (cromo- cobalto, materiais cerâmicos). Materiais biológicos (como o tecido ósteo- ligamentar) e alguns biomateriais (polietileno e cimento acrílico) têm suas propriedades mecânicas governadas pela sua característica viscoelástica, que lhes conferem uma curva tensão-deformação particular, e que se altera com a velocidade de aplicação do esforço. Esta característica se deve ao fato que estes materiais não se comportam como uma mola simples, mas sim continuam a se deformar mesmo quando submetidos à tensão constante (Fig.13.5 A1 e A2). Esta deformação plástica e progressiva dos materiais em condições de tensão constante é denominada fluência (creep ou cold-flow na língua inglesa). O entendimento desta propriedade é importante, por exemplo, para se avaliar o desgaste do polietileno em substituições articulares protéticas. Quando calculamos o desgaste da superfície articular protética através de medidas radiográficas, na verdade estamos considerando não só o desgaste real do polietileno assim como sua deformação por fluência (maior no primeiro ano após a artroplastia). A fluência é grandemente influenciada pela temperatura de modo que o cimento acrílico, por exemplo, pode fluir em meio líquido à temperatura de 37ºC. Os metais, por sua vez somente apresentam fluência importante a elevadas temperaturas. Fig. 13.4. Diagrama Tensão/Deformação. O material frágil (1) não apresenta deformação plástica significativa e apresenta baixa tenacidade ou resistência ao impacto. O material dúctil (2) se deforma plasticamente antes de se romper e, principalmente nos metais, apresenta maior tenacidade. Fig. 13.5. Em relação ao material elástico (A-1), o material viscoelástico continua a se deformar mesmo sem aumento da tensão (A-2). Para estes materiais, ao se remover a tensão, parte da energia é perdida (histerese- B). Fig. 13.3. Diagrama Tensão/Deformação esquemático compa- rando o comportamento mecânico aproximado dos diferentes biomateriais utilizados em cirurgia ortopédica (materiais cerâ- micos, metálicos, compósitos e poliméricos).
  • 5. A viscoelasticidade origina também a propriedade de Relaxação de Tensão que se refere à diminuição do esforço necessário para manter um determinado estado de deformação em um corpo. A curva tensão-deformação de materiais visco-elásticos evidencia que ao se remover a tensão nem toda a energia que foi aplicada ao corpo é recuperada. Esta perda de energia quando da remoção da tensão é denominada histerese (Fig.13.5B). O diagrama tensão-deformação avalia o comportamento mecânico de um material quando submetido ao carregamento estático, condição esta que difere do carregamento funcional cíclico em que a resistência do material é freqüentemente muito menor. Esta propriedade, de grande interesse para os implantes protéticos, em que ocorre a diminuição na carga máxima possível sob aplicação cíclica é denominada fadiga, e é atribuída ao fato do material não ser um sólido idealmente homogêneo. A fadiga pode ser entendida a partir do Diagrama S-N (Tensão/N o ciclos ou diagrama de Whöler) que relaciona a tensão com o número de ciclos aplicados, em escala logarítmica (Fig.13.6). Neste diagrama a tensão abaixo da qual o material não se rompe por fadiga é chamada de limite de resistência à fadiga. Implantes submetidos a tensões cíclicas abaixo deste valor podem suportar um número infinitos de ciclos. A2. Propriedades Mecânicas e Modelo Protético Se por um lado a composição e estrutura de um material determinam suas propriedades mecânicas e podem habilitá-lo para a utilização como implante protético, é preciso considerar que a rigidez de um implante depende não somente dos esforços a que está submetido (ambiente mecânico) como também de suas propriedades geométricas (modelo protético). Como exemplo, o ambiente mecânico a que está sujeita uma haste femoral, promove deformações de translação (linear), como também origina esforços angulares e torcionais e, portanto deformações transversais. A força que origina o movimento ao redor de um centro de rotação é denominada Momento, e atua através do braço de momento que é determinado pela distância perpendicular do ponto onde a força é aplicada, até o centro de rotação. Desta forma o carregamento da haste gera um momento fletor que ocasiona tensões de tração na superfície convexa e tensões compressivas na superfície côncava. A resistência de um corpo ao momento fletor pode ser avaliada numericamente pela equação Rf = E . I onde E representa o Módulo de Elasticidade e I o Momento de Inércia que, conceitualmente, é uma medida de como o material está distribuído na seção transversa de um corpo, em relação à força aplicada. Seja uma haste femoral como a representada na figura 13.7. Observe que sua resistência ao momen- to fletor será diferente nas duas circunstâncias de car- regamento apresentadas (Fig.13.7A e B). Para uma estrutura de área de seção transversa retangular o momento de inércia é dado por I = base . altura 3 /12. Note-se que a altura tem uma relação cúbica com o momento de inércia e assim na situação A (flexão no plano frontal) o momento de inércia é maior e associado à maior resistência à flexão que na situação B (plano sagital). Portanto a região de um implante com menor momento inércia (I) está sujeita a maiores deformações. Para hastes cilíndricas, e portanto área de seção transversa circular, I = π.r 4 /4, onde r representa o raio do círculo. Fig.13.6. Diagrama S-N típico para ligas de titânio, molibdênio e metais ferrosos em geral.. Observe que para elevadas tensões (δ) um pequeno número de ciclos (N) é suportado pelo material. Para tensões menores um maior número de ciclos é possível, até que, para uma tensão crítica (tensão de fadiga- δf) define-se o limite de fadiga como a tensão abaixo da qual o material suporta um numero infinito de ciclos. Fig.13.7. (A) o momento de inércia no plano frontal é maior que no plano sagital (B), uma vez que tem relação cúbica com a altura em áreas de seção retangulares. h= altura, b= base, I= momento de inércia.
  • 6. O carregamento fisiológico impõe ainda um momento torsional na haste, que resulta em tensões de cisalhamento em toda a área de seção transversa do implante. A resistência de um corpo ao momento de torção pode ser avaliada pelo Momento Polar de Inércia (J, Fig.13.8). Para uma haste cilíndrica o momento polar de Inércia será J = π.r 4 /2 e assim uma haste cujo raio é o dobro de outra do mesmo material, terá um momento de Inércia 16 vezes maior. Caso as hastes tenham o mesmo comprimento, a mais grossa será 16 vezes mais resistente à torção que a haste mais fina. O conceito clássico de Tensão se fundamenta na condição em que o esforço é aplicado em uma ampla área da estrutura (e não em um ponto localizado), e que a área de seção transversa seja constante em toda a estrutura, de modo que a distribuição das tensões seja uniforme. Caso a área de seção transversa seja perturbada pela presença de orifícios, trincas, sulcos, riscos, ou ainda o esforço seja aplicado sobre uma área restrita da estrutura, a distribuição da tensão não será uniforme, concentrando-se no local onde a descon- tinuidade esteja presente, ou na região ao redor do ponto de aplicação da força. Esta situação caracteriza o fenômeno de concentração de tensões, e explica o fato de que uma estrutura, ainda que submetida a tensões em níveis abaixo da resistência à fratura, na condição de área de seção uniforme, possa falhar de modo inesperado. Este efeito tem grande importância no tecido ósseo e nos implantes osteoarticulares uma vez que detalhes do design e do acabamento da superfície podem determinar o aparecimento de regiões em que a concentração de tensões seja responsável pela falência da estrutura. A avaliação das tensões em uma determinada estrutura (ossos ou implantes) é bastante complexa, pois envolve o conhecimento dos esforços principais e de cisalhamento em um determinado ponto. Na prática frequentemente se utiliza o método de von Mises que descreve o estado de tensões em um ponto com um único valor (tensão equivalente ou tensão de von Mises), cuja magnitude pode indicar a possibilidade de escoamento, quando comparado aos valores de testes simples de tração uniaxial 9 . A3. Avaliação Experimental dos Esforços Periprotéticos A longevidade da reconstrução protética está associada à sobrevivência dos implantes e suas interfaces. Durante a substituição articular protética, o osso é transformado em um compósito constituído por metal, osso e eventualmente por cimento acrílico, materiais estes que do ponto de vista mecânico apresentam propriedades bastante distintas. A diferença de rigidez e ductilidade destes materiais faz com que a micromovimentação entre as diferentes interfaces seja inevitável uma vez que o carregamento irá ocasionar deformações diferentes em cada um destes elementos. A alteração do padrão de transmis- são de carga promove a remodelação óssea, já reco- nhecida por Wolff 10 , que descreveu a adaptação funcional do osso às solicitações mecânicas. A intromis- são de um elemento com maior rigidez no interior do osso pode causar a blindagem (stress shielding), e assim ocasionar a remodelação óssea adaptativa. Desta forma a estabilidade e sobrevivência dos implantes irão depender, em grande parte, da resistência destes materiais e como os esforços serão transferidos da haste ao manto de cimento e/ou ao tecido ósseo adjacente. A avaliação da mudança do padrão de carregamento ósseo, estabilidade e comportamento dos implantes protéticos e suas interfaces pode ser feito por diferentes métodos. Fig. 13.8. (A): momento de inércia, (B):momento polar de inércia. (C e D): distribuição das tensões de cisalhamento em corpos de área de seção transversa circular quando submetido ao momento torsor. Fig.13.9.(A):Haste femoral submetida à análise laboratorial. Observa-se a fratura na altura na transição dos 2/3 proximais com 1/3 distal. (B): Plano de fratura coincidente com a marcação de identificação. (C): Aspecto geral da fratura apresentando um intenso amassamento (seta). (D): Estrias de fadiga observadas em MEV. (E): Micro trinca cuja origem coincide com a alteração micro-estrutural devida à marcação a laser. A marcação a laser impôs transformação da microestrutura austenítica em alta temperatura, ocasionando a concentração de tensões neste local.
  • 7. Diagrama de Corpo Livre: As forças que atuam em uma determinada articulação podem ser represen- tadas matematicamente pela força resultante (R), cuja intensidade pode ser calculada indiretamente através dos diagramas de corpo livre, em que se isola mate- maticamente uma articulação e a avaliamos como se estivesse em condições de equilíbrio estático. Nesta condição a somatória dos momentos que estão atuan- do deve ser igual a zero e assim podemos calcular a magnitude das forças envolvidas. No exemplo da articulação do quadril quando avaliada no plano frontal em condições de apoio monopodal, as forças atuantes são a força peso que considera a massa acima do centro de rotação do quadril, (Fp, de módulo cerca de 5/6 do peso corporal) a qual impõe um momento adutor ao quadril mediante um braço de momento dp. Este momento (Mp) deve ser contra-balanceado pelo momento abdutor (Ma) gerado pela força abdutora (Fa) atuando através do braço de momento da. Em condições de equilíbrio os momentos são iguais e, nestas condições, a força abdutora deve ser aproxi- madamente 2.5 vezes o peso corporal 11 (Fig. 13.9). Durante a artroplastia a relação entre os braços de momento pode ser alterada. Caso ocorra diminuição do braço de momento abdutor (offset femoral), o equilíbrio irá requerer maior força da musculatura abdutora e assim aumentar a resultante e a força de contato articular, predispondo, desta forma, ao maior desgaste dos componentes articulares protéticos. Embora os valores obtidos pelo diagrama de corpo livre sejam aproximados e desconsiderem algumas variáveis inerciais, seu valor é muito próximo do obtido por métodos clínicos por telemetria que utiliza implantes instrumentados com sensores específicos, e, portanto de utilização restrita 3 . Elemento Finito: Utiliza-se de uma técnica computa- dorizada de análise de tensões em que, a partir da definição geométrica (design do implante), o modelo é dividido em várias seções (elementos), conectadas entre si através de nós que estarão sujeitos a aplicação de forças (Fig 13.10 A e B). Uma vez definida a rigidez do material na direção avaliada, o programa soluciona automática- mente um grande numero de equações que governam o deslocamento nodal no modelo, a partir do que se podem calcular as tensões e deformações associadas. Estas informações podem ser utilizadas, por exemplo, para a predição do remodelamento ósseo, falha nas interfaces, trincas no manto de cimento e falha mecânica do implante (Fig 13.10C-F). Nas Simulações Mecânicas são realizados implantes experimentais em ossos sintéticos (plásticos) ou cadavéricos que são submetidos ao carregamento cíclico em máquinas de ensaios mecânicos. Objetivam avaliar deformações e calcular tensões nas diferentes regiões do osso e implante assim como nas interfaces, através de sensores mecânicos de resistência elétrica (strain gauges). A migração e micromovimentação também podem ser avaliadas através de extensômetros já acoplados diretamente à maquina de ensaios mecânicos, ou ainda através de sensores mecânicos tipo LVDTs ( Linear Variable Differential Transformer), que não utilizam sensores mecânicos de resistência elétrica, mas sim se baseiam no efeito de indução metálica cuja excitação é feita por corrente alternada. Embora sejam bastante precisos (décimos de micrômetros), os LVDTs são bem mais onerosos que os dispositivos que se utilizam de sensores mecânicos de resistência elétrica (Fig 13.11 A-F) 12 . Fig 13.9 Diagrama de corpo livre para o quadril, no plano frontal, em condições de apoio monopodal. Ver descrição detalhada no texto. Fig 13.10. (A,B e C) Modelagem computacional por elementos finitos do fêmur proximal (comparado à radiografia no plano frontal). Cortesia DallaCosta D. U.F. Santa Catarina.( D,E,F): Modelagem de bandeja tibial mostrando a região de concentração de tensões (seta), que promoviam a ruptura deste dispositivo metálico em artroplastia total de joelho.
  • 8. Um tipo especial de ensaio é feito através de simuladores articulares, com o objetivo de se avaliar o desgaste dos componentes protéticos, mediante a simulação dos movimentos articulares principais (Fig.13.12). Estes simuladores substituíram testes mais simples como o pino em disco em protocolos para estudos de desgaste. B. ESTRUTURA E COMPOSIÇÃO DOS BIOMATERIAIS B1. Materiais Metálicos Os metais e algumas ligas metálicas são materiais adequados à utilização como implantes protéticos graças à sua resistência ao carregamento cíclico e grande ductilidade. As propriedades como biocompatibilidade, resistência à corrosão, resistência mecânica e ao desgaste são, contudo bastante de- pendentes da estrutura, composição e processa- mento da liga, do design protético e do ambiente mecânico a que o implante está sujeito. Estrutural- mente são materiais cristalinos, em que cada cristal individual, denominado grão, contém no seu interior átomos arranjados segundo um único modelo e orientação.Contudo, o fato de grãos adjacentes apre- sentarem orientação cristalina distinta, resulta na formação de uma zona de transição entre eles, chamada contorno de grão, onde existe o empaco- tamento de átomos com energia mais elevada que em seu interior. O tamanho dos grãos tem grande influência nas propriedades dos metais e pode ser alterado por vários processos químicos e metalúrgicos. Com raras exceções, podemos dizer que maiores grãos implicam em menor resistência à tração e à fadiga da liga metálica. Algumas propriedades mecânicas das principais ligas metálicas comparadas ao osso cortical e esponjoso são mostradas na Tabela 13.1. A composição química e a presença de inclusões podem alterar não só as propriedades mecânicas como a resistência à corrosão e assim a biocompatibilidade das ligas metálicas. A resistência à corrosão depende em grande parte da presença de uma camada natural de óxido estável e bem aderente ao substrato, chamada camada de passivação, que protege a superfície do implante da ação dos fluidos biológicos adjacentes. Durante o processo de fabricação, os implantes são ainda submetidos à deposição adicional de óxidos em sua superfície. A camada de passivação pode ser removida por ação biológica ou mecânica como a micro-movimentação in vivo do implante (denominada fretagem, por contaminação do termo na língua inglesa fretting). A composição da liga pode incluir elementos que quando do rompimento desta camada, auxiliam na formação de uma nova camada protetora (auto- passivação). O teor adequado de Cromo, Níquel e Molibdênio, aumenta a resistência à corrosão, enquanto o Manganês e o Nitrogênio dão estabilida- de à estrutura austenítica do aço Inox, e o Enxofre e Selênio facilitam o processo de fabricação (usinabili- dade). A presença de maior teor de carbono pode aumentar a dureza e resistência do material em prejuízo da ductilidade e, em caso de precipitação de carbonetos, pode predispor à sensitização (ou corrosão intergranular). Os materiais metálicos mais utilizados como implantes protéticos são as ligas de Aço Inoxidável, ligas a base de Cobalto, Titânio e suas ligas, e o Tântalo. Fig.13.11. Simulação mecânica em ossos sintéticos (A) de Artroplastia de quadril (B) , avaliada em máquina de testes materiais (C) quanto as tensões no manto de cimento e na superfície do modelo através de extensômetros (D) e LVDTs (E). Detalhe do sensor mecânico de resistência elétrica (F)12 Fig.13.12. Desenho esquemático de um simulador de quadril desenvolvido no Laboratório de Engenharia Biomecânica da Universidade Federal de Santa Catarina. Cortesia Engenheira Daniela Águida Bento, M.Sc.
  • 9. a) Aço Inoxidável: As ligas de aço inoxidável (metais ferrosos), introduzidas para uso como implantes ortopédicos (Grupo III ou série austenítica – 316), sofreram adequações em sua composição para melhor desempenho em meio biológico. Utiliza-se baixo teor de carbono (316L: L referente à Low carbon) uma vez que os átomos de carbono podem segregar-se dos cristais reagindo com o cromo formando assim preci- pitados de carboneto de cromo, que se acumulam nos contornos de grãos. Este fato resulta na dimi- nuição da concentração de cromo nesta região predispondo à corrosão intergranular, que pode promover a falha dramática do metal quando exposto ao meio corrosivo. No sentido de diminuir as inclusões que podem predispor à falência mecânica por fadiga, o processamento de fusão à vácuo deu origem ao aço 316LVM (Low carbon, Vacuum Melting). Esta liga apresenta maior resistência à fadiga por produzir um material com menor teor e menor tamanho de inclusões. Alterações em sua constituição objetivando maior resistência à corrosão resultaram em norma- lizações específicas para sua composição química principalmente no que diz respeito à relação entre os teores de Cromo e Molibdênio (ISO 5832-1 ou ASTM F138-92), no maior conteúdo de Nitrogênio e Nióbio (ISO 5832-9 ou ASTM 1586-95) ou menor conteúdo de Níquel (F2229). Embora as ligas de aço Inox tenham sido bastante utilizadas como implantes protéticos até uma década atrás nos EUA, e ainda o são na Europa e no Brasil, a ocorrência de diferentes processos corrosivos, e a introdução de novas ligas metálicas não ferrosas, limitaram seu uso como implante permanente. O baixo custo de produção, as propriedades mecânicas e a resistência à corrosão galvânica, contudo habilitam certas ligas (ASTM F138-92, F1586-95) para utilização como implantes osteoarticulares. O papel de novas ligas de Inox com diferentes teores de nitrogênio, nióbio e Níquel na confecção de implantes protéticos, como as descritas acima, ainda não está determinado. b) Ligas de Cromo-Cobalto: Nas ligas de Cromo-Cobalto (ASTM F75, F90, F562, F563 e outras) o maior teor de Cromo promove maior resistência à corrosão, e o Molibdênio produz grãos mais finos. Diferentemente das ligas de aço Inox, sua microestrutura permite maior concentração de carbono cujos carbonetos resultantes encontram-se dispersos no interior dos grãos e em seus contornos, e assim sua precipitação pode resulta em maior resistência e maior dureza da liga. Desta forma estas ligas são caracterizadas por elevada resistência mecânica e à corrosão, o que as credenciam para o uso em implantes protéticos. Sua elevada dureza permite seu uso como superfície articular constituindo assim o par tribológico com o polietileno ou com a própria liga metálica (articulação metal-metal). Apresentam como desvantagem a grande dificuldade para serem usinados. Sua elevada rigidez e portanto maior resiliência pode produzir grande remodelação óssea adaptativa por blindagem, de conseqüências mais observadas em implantes não cimentados. c) Ligas de Titânio: Os grandes atrativos das ligas de titânio como implante protético, são sua alta resistência e seu baixo módulo de elasticidade (E= 110 GPa) que resultam em flexibilidade 2 vezes maior e resistência à fadiga no mínimo 30% maior que as ligas de aço Inox. A grande afinidade do titânio pelo oxigênio permite a auto- passivação e assim grande resistência à corrosão. Contudo altos teores de oxigênio, como constituinte da liga, comprometem a resistência à fadiga e sua ductilidade tornando-a mais frágil. Estas características habilitam as ligas de titânio (Ti-6Al-4V, ou Ti-6Al-7Nb) para utilização em implantes destinados a fixação biológica (não cimentados). Eventualmente em uma determinada região do implante se aplicam superfícies micro- porosas constituídas por titânio comercialmente puro (ASTM F67) com o objetivo de facilitar o processo de osteointegração. Sua utilização como hastes cimentadas está associada a um elevado grau de corrosão, pelo baixo teor de oxigênio na interface haste/cimento, o que ocasiona uma pilha de aeração diferencial, e consequentemente a corrosão em frestas 13 . Novas ligas e novos processamentos estão sendo recentemente introduzidos, como o caso das Ligas de Titânio β que apresentam módulo de elasticidade ainda mais baixo (cerca de 80 GPa) como a liga Ti-13Nb-13Zr. Uma grande desvantagem das ligas de titânio é sua baixa resistência ao desgaste, inviabilizando sua utilização como superfície articular. Mesmo a micromovimentação em caso de instabilidade do implante é suficiente para ocasionar desgaste por fretagem (fretting) e assim produzir e depositar óxido de titânio que ao impregnar os tecidos adjacentes denomina-se metalose. Esta baixa resistência ao desgaste tem levado alguns cirurgiões a proscreverem sua utilização como implantes cimentados, nas situações em que um ambiente pobre em oxigênio pode ocasionar uma pilha de aeração diferencial (corrosão em frestas ou crevice corrosion) 13 . Novos processamentos do titânio como a expansão a vácuo, pode produzir uma estrutura metálica com grande porosidade que se assemelha ao osso esponjoso (Fig.13.13) e por isto denominada metal trabecular (termo descrito inicialmente em relação ao tântalo – ver seção abaixo) 8 .
  • 10. Ao contrário do tântalo, de utilização clínica já estabelecida, o metal trabecular de titânio ainda está restrito à produção experimental. d) Tântalo e outros Materiais Metálicos. O tântalo processado de maneira a constituir uma estrutura trabecular (por isto denominado metal trabecular) semelhante à observada na figura 13.13, vem ganhando utilização crescente devido ao seu módulo de elasticidade que se situa entre o do osso esponjoso e do osso cortical (1-16 GPa). Sua bio- compatibilidade manifesta através do crescimento osteoblástico, que chega a preencher 40-50% das cavidades porosas em cerca de 4 semanas, habilita sua aplicação em inúmeras circunstâncias osteo- articulares em que se necessita de preenchimento ósseo. Mais freqüentemente é utilizado em cirurgias reconstrutoras do quadril e joelho e notadamente em deficiências acetabulares em artroplastia de revisão de quadril. O processamento deste metal trabecular en- volve a produção de um esqueleto poroso de carbono (cerca de 75-80% de poros em volume) sobre o qual é depositado o tântalo comercialmente puro. O elevado coeficiente de atrito sobre a superfície do implante de tântalo agrega estabilidade inicial e melhor fixação mecânica ao osso adjacente. Seu uso em revisão acetabular, muito embora os resultados iniciais sejam adequados, necessita maior tempo de seguimento, uma vez que é conhecida a deterioração dos resulta- dos com os métodos usuais, quando avaliados com mais de 10 anos de acompanhamento. É também motivo de preocupação a indicação de cimentação do inserto de polietileno, uma vez que o baixo módulo de elasticidade do tântalo pode gerar maior deformação do manto de cimento, que é muito sensível às defor- mações. O elevado custo constitui também limitação adicional de sua utilização. Cabe mencionar ainda outras ligas que utilizam Zircônio (Zr-Nb) e apresentam propriedades mecânicas muito próximas às ligas de titânio. Sua passivação quando do aquecimento controlado, é feita pela formação de óxido de zircônio que é altamente resistente ao desgaste e à corrosão. B2. Materiais Poliméricos a. Polietileno de Ultra Alto Peso Molecular (PEUAPM). Na artroplastia de quadril, este polímero surgiu como superfície articular protética em substituição ao politetrafluoretileno ou fluon (Teflon®) o qual, inicial- mente utilizado por apresentar baixo coeficiente de atrito, mostrou-se muito pouco resistente ao desgaste. Esta característica se manifestou por inúmeras e preco- ces lesões osteolíticas, resultado da reação orgânica ao grande número de partículas produzidas 14 . Por outro lado o polietileno constituído por longas cadeias carbô- nicas saturadas de ultra alto peso molecular (PEUAPM), quando comparado ao flúon, apresenta maior resistência ao desgaste (cerca de 1000 vezes). É preciso diferenciar o PEUAPM utilizado como super- fície articular (PM maior que 1 milhão) do polietileno de alta densidade (PEAD - PM entre 50 a 100 mil daltons), por vezes erroneamente usados como sinônimos, uma vez que este último apresenta menor resistência ao impacto, ou seja, menor tenacidade, assim como menor resistência à fadiga e, portanto inapropriado para o uso biológico em superfícies protéticas. Este polímero termoplástico é obtido pela poli- merização do etileno, que resulta na formação de um pó com partículas entre 100 e 200 m, sendo que cada partícula é formada por esferas menores que 1 m, ou seja, partículas submicrômicas (Fig.13.14). Estas esfe- ras têm a mesma dimensão e morfologia dos debris detectados nos tecidos como resultado do desgaste do polietileno. A partir deste pó de polietileno o processo de conformação em uma estrutura sólida, seja na forma de tarugos (por extrusão), placas (por moldagem) ou até mesmo no implante diretamente (moldagem por com- pressão), é chamado de fusão ou consolidação. Fig.13.14. Obtenção do polietileno (PE) a partir da polimerização do etileno. Fig. 13.13. Aspecto trabecular do titânio expandido a vácuo. Cortesia Dr Carlos S. Lambert. Departamento de Física da Universidade Estadual de Campinas –Unicamp, SP
  • 11. Mesmo com toda a técnica atual de processamento, a consolidação pode ser difícil devido ao seu elevado PM, o que pode ocasionar a fusão incompleta ou defeitos de consolidação. Estes defeitos agem como concentrado- res de tensões enfraquecendo assim o PE, o que pre- dispõe ao aparecimento de trincas que ao se propa- garem podem causar sua delaminação e falência em serviço. Os defeitos de fusão são mais comuns no processo de moldagem em placas e menos freqüentes na extrusão e na moldagem por compressão. Do ponto de vista estrutural o PE apresenta uma morfologia semicristalina e, portanto duas fases distintas (Fig.13.15). A fase cristalina esta constituída por cadeias dobradas que estão dispersas ao acaso em uma fase amorfa constituída por cadeias não ramifica- das de polietileno. Assim como as propriedades mecânicas, o percentual de região cristalina depende fundamental- mente do PM e do processamento para a obtenção do pó (polimerização, consolidação e esterilização), porém o grau cirúrgico utilizado apresenta cristalinidade frequentemente na faixa entre 58-75 por cento. Após o processo de consolidação, dependendo da técnica empregada, a cristalinidade flutua entre 50-55 por cento. Consideradas estas variações pode-se dizer, contudo que o PE é um material dúctil, tenaz e que apresenta uma grande fluência. O aumento da resistência ao desgaste do polietileno tem sido obtido pela elevação do seu peso molecular, decorrente da formação de ligações cruzadas (cross-linking) entre as cadeias, resultantes da formação de radicais livres produzidos, mais freqüentemente, por irradiação Gama 15 . b) Polimetacrilato de Metila (PMMA) O cimento ósseo (PMMA), utilizado desde há cerca de 50 anos com o objetivo de acoplar implantes artroplásticos ao tecido ósseo adjacente, é uma resina acrílica resultante da polimerização do metacrilato de metila (MMA) 14. Embora este monômero (MMA) possa sofrer autopolimerização, o processo é muito lento, produz substancial elevação da temperatura e grande com- tração volumétrica (ao redor de 27%) devido à dife- rença de densidade entre monômero e polímero. As formulações comerciais atuais, pouco modificadas desde a década de 60, constam basicamente de um pré-polimerizado (pó) que misturado ao monômero (líquido) resulta na polimerização em poucos minutos, na dependência de sua composição química. A utilização do pré-polimerizado reduz a quantidade de monômero necessária à polimerização e assim diminui a contração para cerca de 7%, além de auxiliar na dissipação do calor produzido. Este processo acelerado de polimerização necessita da atuação de iniciadores de reação acrescentados ao pó (Peróxido de dibenzoilo) e ao líquido (N, N Dimetil paratoluidina). A presença de estabilizadores (Hidro-quinona ou Ácido Ascórbico) adicionados ao monômero é necessária para que não haja auto-polimerização durante o período de armazenamento e transporte. Para uma adequada visualização radiográfica do manto de cimento, acrescenta-se ao pó substâncias radiopacas como o Sulfato de Bário ou o Óxido de Zircônio (Fig.13.16). O processo químico da polimerização se inicia pela mistura do monômero (líquido) ao pré-polimerizado (pó), ocasião em que a decomposição do peróxido de dibenzoilo pela N,N dimetil paratoluidina produz radicais (benzoílos), que atacam a insaturação carbônica do metacrilato de metila, gerando assim radicais livres na molécula do monômero. A ligação entre átomos de carbonos de moléculas adjacentes, por meio dos radicais livres, promove a formação de longas cadeias cujos pesos moleculares variam entre 250 mil a 800.000 daltons. Com o progresso da polimerização as cadeias crescem e originam um material duro de Fig.13.16 Obtenção do cimento acrílico (PMMA) a partir do metacrilato de metila na presença de aditivos. A formulação dos cimentos disponíveis comercialmente é bastante variada e assim nem todos os cimentos de PMMA são iguais. Fig.13.15. Estrutura semi-cristalina do polietileno. As ligações cruzadas obtidas por irradiação gama ocorrem na fase amorfa que apresenta maior mobilidade das cadeias carbônicas.
  • 12. características vítreas o que dificulta a difusão subseqüente do monômero e a propagação da cadeia. Assim o processo de polimerização apresenta uma fase inicial de contração de volume (ao redor de 7%), seguida por uma fase de expansão térmica pelo aumento da temperatura (cerca de 80ºC) e finalmente uma fase de contração volumétrica e térmica ocasionada pelo resfriamento 16 . Do ponto de vista mecânico o PMMA é um sólido com característica viscoelástica, de baixa rigidez (E= 2.3 GPa, comparado ao Eosso cortical:16 GPa, ECr-Co: 250 GPa). Porém quando comparado a outros polímeros (como por exemplo, o polietileno) apresenta grande rigidez e baixa ductilidade, e, portanto um comportamento frágil 17 . Estas propriedades devem ser consideradas perante sua utilização em artroplastias que requer uma atuação como transmissor de esforços do implante aos tecidos adjacentes 18,19. Com características viscoelásticas o cimento pode fluir, e assim permitir a migração de implantes, muito embora a fluência no manto de cimento seja de pequena magnitude frente ao que se observa em situações clinicas 20 . Em artroplastias experimentais in vitro o cimento ósseo esta sujeito a tensões muito próximas do seu limite de resistência quando em carregamento cíclico, circunstância em que a fluência, após um período de aumento rápido, tende a permanecer constante nos ciclos subseqüentes 12,16 . Saliente-se, contudo que a resistência mecânica do cimento é dependente de vários fatores como o peso molecular, proporção e constituição do monômero, características e concentração dos aditivos, tempe- ratura, métodos de esterilização e técnica de manejo. Desta forma a utilização do cimento ósseo requer uma técnica adequada e racional dentro dos preceitos recomendados pelo fabricante, assim como do conhecimento dos fatores que possam alterar seu comportamento mecânico 18,21. B3. Materiais Cerâmicos Os biomateriais cerâmicos se referem a um grupo de materiais quimicamente compostos pela ligação iônica de um ou mais íons metálicos com um íon não metálico, frequentemente o oxigênio. Sua estrutura molecular é bastante variável podendo se apresentar sob a forma policristalina ou amorfa. A potente ligação iônica confere aos materiais cerâmicos grande estabilidade, elevado ponto de fusão, grande dureza e resistência às alterações químicas sendo, portanto inerte nos fluidos biológicos uma vez que liberam quantidade desprezível de produtos de degradação. Representam uma variada classe de biomateriais cujos principais representantes são a alumina (Al2O3), zircônia (ZrO2),e a hidroxiapatita (Ca10(PO4)6(OH)2, A utilização da alumina cerâmica (Al2O3) há cerca de 30 anos como superfície articular confirmam suas excelentes propriedades tribólogicas 22 oriundas de sua elevada dureza (Dureza Vickers >2000 HV), baixo ângulo de contato (maior molhamento – Ver seção de propriedades tribológicas). A zircônia (ZrO2) introduzida como opção de superfície articular com o polietileno na década de 80, é um composto cerâmico que pode se apresentar sob diferentes fases de acordo com a temperatura. Por este motivo, estabilizadores de fase devem ser adicionados durante a fabricação 23 . Ainda que apresente maior resistência mecânica que a alumina, a possibilidade de transformação de fase limita sua produção a fornos específicos e impede sua esterilização em vapor úmido (autoclave), uma vez que nestas condições a incidência de fratura de cabeças cerâmicas podem se aproximar de 9 por cento. A adição de zircônia estabilizada em ítria ao substrato de alumina tem obtido excelentes resultados quanto a sua resistência à fratura em cabeças femorais protéticas 22 . A Hidroxiapatita inclui um grupo de cerâmicas policristalinas de fosfato de cálcio, com estrutura semelhante à apatita óssea, seja de origem mineral (fosfato de cálcio tribásico) ou sintética (fosfato tricálcico).Tem função predominantemente osteocon- dutiva e por isto na sua forma granular ou maciça é usado em enxertia óssea de defeitos ósseos cavitários. Sua resistência à fadiga é baixa e, portanto não adequada à ambientes de grande solicitação mecânica. Muito embora, a biocerâmica de hidroxiapatita e fosfato tricálcico maciça tenha sua comercialização liberada, consideramos que seu uso como substituto ósseo, sob a forma de enxerto estrutural, em defeitos segmentares deva ser avaliado clinicamente em seguimentos mais tardios, antes de sua incorporação rotineira à prática médica (Fig.13.17). Fig.13.17. Radiografia de pelve no plano frontal (A) e fêmur esquerdo no plano sagital (B) de uma paciente com 38 anos em que se observa extensa perda óssea femoral e acetabular. Foi feita a cor- reção com enxerto femoral maciço de biocerâmica no acetábulo (C – superior) e no fêmur proximal (C-inferior e D). Dezoito meses após o ato cirúrgico observa-se o posicionamento adequado dos implantes, e uma nuvem de calo ósseo adjacente à porção medial e posterior da transição entre o enxerto e o osso femoral (E e F – setas), sem contu- do observarmos o fechamento da fenda entre os dois elementos.
  • 13. A hidroxiapatita pode ser utilizada também como um pré-revestimento em implantes permanentes ou até temporários, no sentido de agregar ao efeito osteocondutor uma real ligação química entre esta camada e o substrato ósseo adjacente favorecendo assim a osteointegração. B4. Compósitos Referem-se à combinação de materiais de modo que as propriedades mecânicas resultantes sejam superiores a dos componentes isoladamente. Frequentemente agregam um elemento constituído por fibras a um elemento matricial, como as fibras de carbono adicionadas a uma matriz polimérica. Sob este prisma o osso é per se um material compósito que apresenta fibras colágenas imersas em uma matriz inorgânica. Várias tentativas de aumentar a tenacidade do cimento ósseo foram feitas através da produção de um compósito que incorporava outros elementos como a fibra de carbono, polietileno, titânio, grafite e aço entre outras substâncias. Contudo, a biocompatibilidade e complicações do processamento destes materiais comprometeram a implementação do processo de manufatura. Dentre os compósitos utilizados em cirurgia ortopédica, destacam-se a polissulfona, a fibra de carbono (ambos por sua importância histórica), os compósitos cerâmicos e o poliéter-éter-cetona (ou PEEK), este de utilização mais ampla. Nova superfície articular a base PEEK tem sido testada experimen- talmente e clinicamente, porém os resultados em longo prazo devem ser aguardados. C. PROPRIEDADES TRIBOLÓGICAS DOS IMPLANTES PROTÉTICOS. O termo tribologia se refere à ciência que estuda a interação de superfícies em movimento relativo e, portanto considera suas determinantes principais que são o atrito, a lubrificação e o desgaste. Atrito: O conceito de atrito diz respeito à obstrução (atrito estático) ou à restrição (atrito cinético) ao movi- mento relativo entre as superfícies de corpos em contato, quando sujeitos a uma força externa. A força de atrito é gerada pela deformação na superfície de contato entre os materiais, e pela adesão entre os átomos e moléculas das superfícies opostas. Age tangencialmente à superfície e seu módulo independe da área de contato aparente entre os corpos, porem é função direta do valor da força normal 24 . Desta forma define-se coeficiente de atrito (µ), como a relação entre a força de atrito (Fa) e a força normal (Fn), que por este fato é uma grandeza adimensional (Fig.13.18A). Fig.13.18. (A): O coeficiente de atrito é uma grandeza adimensional, resultado da relação entre a força de atrito e força normal. (B): Superfície de cabeça metálica polida e aparentemente lisa a olho nu apresenta (C): à microsocopia, irregularidades ou asperezas em sua superfície cujo (D): perfil pode ser determinado e mensurado (em Ra- rugosidade media) por aparelhos como o rugosímetro.Fonte Gomes LSM25 Mesmo em implantes polidos e aparentemente lisos, o atrito pode ocorrer pelas irregularidades superficiais (rugosidade) em nível microscópico, cujo perfil pode ser avaliado por aparelhos como o rugosímetro 25 (Fig.13.18B,C e D). Diferentemente das propriedades mecânicas como o módulo de elasticidade e tenacidade, o coefi- ciente de atrito não é uma propriedade do material e, assim pode ter diferentes valores em função do par tribológico (Fig. 13.19A), da configuração de contato (Fig. 13.19B) e do ambiente e regime de lubrificação (Fig.13.19C) 26 . Os biomateriais constituintes do par tribológico, o design e a tecnologia de fabricação influenciam grandemente na intensidade do atrito, uma vez que sua origem está ligada à deformação na superfície de contato entre os materiais, e pela adesão entre os átomos e moléculas das superfícies opostas. Assim, a rugosidade e a deformação das superfícies em contato impõem certa restrição ao movimento. Fig.13.19. Fatores que interferem no coeficiente de atrito. (A) Os biomateriais que constituem o par tribológico, (B) e sua confi- guração de contato, (C) assim como o ambiente adjacente e o re- gime de lubrificação (Fonte Gomes, LSM25 Modificado de Mischler 26 )
  • 14. É evidente que quanto maior a dureza dos materiais que compõe o par tribológico, mais fácil a manutenção do polimento e mais difícil riscar a cabeça, restringindo assim as asperezas de superfície. Por este motivo as superfícies mais duras (Cerâmica/Cerâmica, Metal/ Metal e Cerâmica/Metal) apresentam melhor desempenho tribológico 27-29 . Outro mecanismo de atrito dependente do par tribológico ocorre pela adesão (ligações químicas) entre as superfícies protéticas, em muito semelhante ao mecanismo de fusão a frio. O atrito gerado pela força de atração entre as moléculas das superfícies opostas, chamadas forças de adesão, ocorre em regiões de contatos localizados, como alterações de esfericidade da cabeça ou imperfeições decorrentes da usinagem. Desta forma, as ligações químicas entre as moléculas de superfícies opostas, podem se opor ao início do movimento (atrito estático), e assim o movimento ulterior só será possível pela ruptura destas ligações, resultando na remoção de material da superfície articular. Este mecanismo ocorre mais intensamente quanto maior for a força de atração entre as superfícies e é bastante evidente na articula- ção metal/metal durante o período inicial de atividade (run-in), pela intensidade da atração decorrente da ligação metálica. Com a perda progressiva de material ocorre o polimento nas zonas de contato e assim o atrito adesivo diminui com o tempo em serviço do implante. O atrito que ocorre entre os pares tribológicos mais utilizados pode ser observado na Tabela 2. Como resultado do atrito entre as superfícies, o movimento irá gerar um torque (de atrito) na interface entre o componente acetabular e o osso, que é tanto maior quanto maior o diâmetro da cabeça, porém em módulo sempre muito inferior ao torque experimental necessário para soltar o componente. Desta forma, embora o atrito tenha grande contribuição no desgaste articular, seu papel para a soltura dos implantes parece não ser tão significativo. Tabela 2. Coeficiente de Atrito (µ) para Diferen- tes Pares Tribológicos e Articulação Sinovial. Par Tribológico Coeficiente de Atrito (µ) Metal/Metal* 0.40 Art. Sinovial s/ Lubrificação 0.20 Metal/PE Convencional 0.10 Cerâmica/Metal 0.05 Cerâmica/Cerâmica** 0.04 Art. Sinovial c/ Lubrificação 0.005- 0.02 *Liga de Cromo-Cobalto. PE: Polietileno ** Alumina (Al2O3) Lubrificação: Para que o atrito seja diminuído é impor- tante que não haja contato direto entre as superfícies articulares durante o movimento e o suporte de carga, papel este que pode ser exercido pela interposição de um filme líquido. Na superfície articular natural do quadril, a grande congruência articular, distribui as tensões em uma área extensa, dentro de uma cavidade estanque e preenchida pelo líquido sinovial, permitindo assim que a flutuação de pressão do liquido, neste compar- timento, contrabalance os esforços externos. Desta forma a pressão hidrostática do filme fluido separa as duas superfícies e impede o seu contato direto durante o carregamento, através da manutenção de uma fenda (clearance) articular (Fig.13.20A). Este mecanismo hidrostático é auxiliado pelo aumento da velocidade de deslocamento entre as superfícies (efeito hidrodinâmico, Fig.13.20B) e, durante o carregamento pelo aumento de volume de liquido na articulação, oriundo da expulsão de substâncias adsorvidas na cartilagem (Wheeping) que, por este motivo, não depende de movimento entre as superfícies, mas sim da carga aplicada. Durante a movimentação, a lubrificação é dependente da velocidade entre as superfícies articulares que origina a lubrificação hidrodinâmica . Quanto maior a velocidade relativa (que chega a atingir 40 mm/s) mais se aumenta a pressão do fluido que mantém as superfícies afastadas e garantindo um coeficiente de atrito da ordem de 10 -3. Caso uma espessura adequada do filme não seja possível, em algumas circunstâncias a pressão do filme pode ser capaz de deformar as irregularidades das superfícies, dificultando o contato direto, e originando assim um regime de lubrificação chamado elastohidro-dinamico. 26 Por outro lado no caso de baixa velocidade entre as superfícies, o menor volume fluido permite que esforços de alta magnitude (cerca de 8 vezes o peso corporal) tendam a promover o contato direto entre as superfícies articulares, aumentando assim o atrito. Nesta circunstância é importante a presença de moléculas de tribonectinas, que se ligam às superfícies opostas atuando como um sabão e diminuindo portanto o atrito. Este mecanismo de lubrificação é chamado de marginal, de contorno ou de superfície (Fig.14.20C). Fig.13.20. Regimes de lubrificação da articulação sinovial. (A) O regime hidrostático ocorre durante o suporte de carga sem movimento significativo, enquanto o hidrodinâmico (B) aumenta com a velocidade entre as superfícies. (C) Quando o carregamento tende a aproximar as superfícies articulares, as tribonectinas tem um papel importante na lubrificação marginal ou de superfície. Quando substituímos a articulação natural pela articulação protética, devemos reconhecer algumas desvantagens principalmente no que diz respeito à lubrificação. Primeiramente a fenda articular
  • 15. (clearance) deve ser o suficiente para permitir a formação de um filme fluido que impeça o contato direto entre as superfícies, e assim possa proporcionar uma lubrificação hidrodinâmica 25 . Neste caso a espessura do filme fluido deve ser maior que a rugosidade das superfícies. Contudo, quando a espessura do filme é menor que a altura da rugosidade e o contato direto é inevitável, a presença das tribonectinas adsorvidas pelas superfícies protéti- cas pode diminuir o atrito, pela baixa resistência destas proteínas ao cisalhamento Entre as superfícies protéticas o regime de lubrificação pode ser hidrodinâmico, marginal ou misto (intermediário entre os 2 regimes citados), na depen- dência da espessura do filme fluido. Esta espessura, que depende não só das propriedades dos biomateriais constituintes do par tribológico, mas também de seu design e tecnologia de fabricação, pode ser expressa em função da viscosidade do liquido, da velocidade relativa entre as superfícies e de sua rugosidade. O simples fato de umedecer a superfície protética pode diminuir o atrito, e assim materiais que permitam um maior molhamento (medido pelo ângulo de contato) de sua superfície têm melhor desempenho tribológico, como a cerâmica, pois a maior dispersão do liquido promove melhor lubrificação (Fig.13.21A,B) 28,29 . Fig.13.21. A propriedade do líquido se distribuir sobre a superfície de um material, chamada de molhamento, é medida pelo ângulo de contato (A). Quanto menor o ângulo de contato, melhor a distribuição do líquido na superfície e, portanto melhor a lubrificação. (B) Dentre os materiais utilizados em superfícies protéticas, a cerâmica apresenta o menor ângulo de contato. Para que a espessura de um filme fluido seja mantida é necessária uma dimensão de fenda articular adequada para garantir um equilíbrio entre o contato polar e equatorial, que em condições ideais promove um regime hidrodinâmico de lubrificação. Nos casos em que se utiliza o Polietileno, ainda que uma fenda articular adequada seja obtida inicialmente, a possibilidade de deformação do polímero tende a produzir um contato equatorial (Fig.13.22A,B), de maior atrito, e assim o principal regime de lubrificação passa a ser o marginal ou de superfície. Materiais mais rígidos como as ligas de cromo-cobalto e a cerâmica deformam-se muito pouco e permitem a manutenção da fenda articular e o contato polar, favorecendo o regime de lubrificação hidrodinâmico ou misto. Desgaste: A conseqüência inevitável do movimento entre duas superfícies opostas é a remoção de material devido à ação mecânica (desgaste), que pode gerar milhares de partículas nos tecidos adjacentes a cada ciclo de marcha 5 . Na articulação protética o desgaste é determinado por diferentes mecanismos, em função do atrito, da lubrificação e do meio adjacente. Fig.13.22. Regimes de lubrificação de superfícies articulares protéticas. (A) Materiais mais rígidos não se deformam com o carregamento, permitindo o contato polar, e assim que se man- tenha uma fenda articular adequada (setas brancas) à lubrificação hidrodinâmica. (B): Materiais mais dúcteis e elásticos (como o polietileno) permitem a deformação que ocasiona um contato equatorial, sem fenda articular. (Fonte Gomes, LSM25 Modificado de Mischler26 ) O mecanismo mais freqüente de desgaste é a abrasão, em que as asperezas superficiais funcionam como uma lixa ao contato com o elemento oposto. A abrasão, ocasionada pela rugosidade das superfícies do par tribológico, pode ser agravada pela presença de contaminantes no interior da articulação como fragmentos metálicos, ósseos ou de cimento ósseo (chamados de terceiro corpo), que irão promover maiores danos à superfície articular e assim ocasionar um desgaste rápido e progressivo. Este mecanismo (abrasão por terceiro corpo) é constatado em explantes pela presença de ranhuras e riscos na superfície articular protética (Fig.13.23A e B) 25 . A abrasão é grandemente influenciada pelos biomateriais constituintes do par tribológico, uma vez que materiais mais duros, e com menor ductilidade mostram-se mais resistentes à abrasão por apresen- tarem menor desgaste e maior resistência ao dano superficial, como a articulação cerâmica/ cerâmica. No desgaste por adesão as ligações entre as superfícies opostas em pontos localizados, são rompi- das pela ação mecânica do movimento, gerando fragmentos que são transferidos para a superfície oposta ou diretamente liberados para o interior da articulação.
  • 16. Fig. 13.23. (A) Explante de cabeça femoral protética mostrando inúmeros sulcos e riscos oriundos da abrasão por terceiro corpo, com profundas repercussões sobre a (B) estrutura do componente acetabular de polietileno que apresenta sinais de falência catastrófica. Fonte Gomes, LSM25 . Neste mecanismo, a intensidade da força de ligação entre átomos e moléculas das superfícies opostas tem grande influência, e pode ser uma importante fonte de partículas, como na articulação metal/metal, quando a alta ductilidade promove maior adesão. A medida que o material é progressivamente removido dos pontos de maior contato, o conseqüente auto-polimento da superfície diminui a intensidade do desgaste adesivo. A movimentação e o carregamento cíclicos entre as superfícies articulares podem iniciar a fadiga do material através de microtrincas que ao se propagarem promovem a delaminação de fragmentos para o interior do espaço articular. Este desgaste por fadiga gera, portanto partículas maiores que podem atuar como terceiro corpo ou mesmo ocasionar bloqueio articular. O polietileno é particularmente susceptível a este mecanismo quando da sua oxidação, uma vez que a conseqüente alteração de suas propriedades mecânicas diminui sua resistência à fadiga 30 . O desgaste pode ocorrer ainda por fenômenos triboquímicos conseqüentes a reações químicas entre o meio adjacente às superfícies em contato. Na articulação Metal/Metal a remoção e formação alternadas da camada de óxido sobre as superfícies articulares (camada de passivação), liberam partículas no interior da articulação resultantes do desgaste oxidativo ou triboquímico. 27,28,29 As partículas ou debris formados pelos diferentes mecanismos de desgaste podem, por mecanismos mecânicos e /ou biológicos, levar à soltura e destruição óssea progressiva e assim não só comprometer a longevidade da artroplastia, como dificultar os procedimentos reconstrutivos futuros. O impacto do desgaste na gênese da osteólise e/ ou soltura é dependente não só do número de partículas como também de sua morfologia, dimensões, atividade biológica e citotoxicidade 5 . Embora cabeças protéticas de maior diâmetro possam apresentar o mesmo desgaste linear, o des- gaste volumétrico e, portanto o número de partículas é também significativamente maior 4,31 (Tabela 3). Observe que para um mesmo desgaste linear, o desgaste volumétrico de uma cabeça de 32 mm é cerca de 2 vezes maior que o da cabeça de 22 milímetros 31 . Assim, pelo maior número de partículas geradas, dá-se preferência ao desgaste volumétrico como parâmetro a ser comparado com o desfecho clínico das artroplastias totais. Desta forma há que se considerar a relação risco/benefício para a prática mais recente de se utilizar cabeças protéticas de maior diâmetro, com o objetivo de aumentar a estabilidade e diminuir a possibilidade de impacto com a borda acetabular protética. Vários ensaios experimentais em simuladores de quadril demonstram um desgaste volumétrico muito próximo do obtido em condições clínicas para o par tribológico Metal/PE. Contudo uma vez que o número de ciclos anuais pode apresentar grande variabilidade entre diferentes pacientes, em avaliações experimen- tais o parâmetro de desgaste anual é substituído por milhão de ciclos. Tabela 3. Relação entre o Desgaste Linear (0.1 mm/ ano) e o Desgaste Volumétrico em Função do Diâme- tro da Cabeça de Cromo-Cobalto em Polietileno Convencional. Diâmetro Cefálico Desgaste Volumétrico 22 mm 38 mm3 28 mm 60 mm3 32 mm 80 mm3 A Tabela 4 compara o desgaste volumétrico experimental de diferentes pares tribológicos utilizados em reconstruções protéticas do quadril. Observe que em relação ao par Cro-Co/PE convencional, o polietileno altamente irradiado reduz, em cerca de 90% o desgaste volumétrico, enquanto o polietileno tri-irradiado, reduz o desgaste para níveis semelhantes aos da articulação Metal/Metal, e o par Cerâmica/Metal e Cerâmica/Cerâmica não apresentam diferenças significativas entre si, em relação ao desgaste volumétrico experimental. 32 É importante ressaltar, que para um mesmo desgaste volumétrico, o número de partículas dependerá também de seu tamanho, e assim as partículas nanométricas resultantes do desgaste da articulação M/M são em numero muito superior (em até 500 vezes) às partículas pouco menores que 1 micrômetro, resultantes do desgaste da articulação Metal/PE 33 .
  • 17. Tabela 4. Desgaste Volumétrico em Milímetros Cúbicos (mm 3 ) de Diferentes Pares Tribológicos por Milhão de Ciclos (mc), em Simuladores de Quadril. Par Tribológico Desgaste (mm3 /mc) Cr/Co- PE Convencional 35 Cerâmica- PE Convencional 25 Cr/Co- PE X Linked 5 Cerâmica- PE X Linked 3 Cr/Co- Cr/Co 1.6 Cr/Co- PE X3 1.3 Cerâmica- Cr/Co <0.1 Cerâmica- Cerâmica <0.1 II. Resposta Orgânica aos Biomateriais Os Biomateriais podem ocasionar efeitos locais (tecidos adjacentes), remotos (órgãos a distância) ou sistêmicos, na dependência do tipo, quantidade, tamanho e toxicidade das partículas e substâncias liberadas, de sua resistência à corrosão e da resposta orgânica aos seus produtos O organismo é bastante tolerante aos biomateriais, sobretudo em condições de estabilidade do implante. O PMMA enquanto um manto íntegro ao redor do implante promove uma interface com o osso sem a interposição de membrana e sem sinais de reação inflamatória (osteointegração do cimento). A reação às partículas oriundas do desgaste do polietileno, quando menor que 0.9mm/ano, pode permitir uma sobrevivência da reconstrução protética em até 90% aos 10 anos de seguimento. Esta tolerância às partículas ocorre porque, algumas semanas após a artroplastia, forma-se uma pseudocápsula constituída na sua porção mais superficial por tecido fibroso onde se nota a presença de alguns macrófagos. Em condições habituais, as partículas formadas pelo desgaste são absorvidas pela pseudo- cápsula e em seu interior são fagocitadas pelos macrófagos. A fagocitose de partículas maiores requer a fusão de vários macrófagos (células gigantes multinucleadas) que resulta em verdadeiros granulomas de corpo estranho. Outro destino das partículas é o espaço perivascular linfático a partir do qual as partículas alcançam os vasos linfáticos, linfonodos regionais e, eventualmente os órgãos do sistema reticulo-endotelial, constituindo assim um mecanismo de limpeza, porém de disseminação das partículas (Fig.13.24). Na dependência das características e toxici- dade das partículas, ocorre a liberação de quimocinas (M-CSF e MCP-1) que recrutam células inflamatórias, prostaglandinas (principalmente E2) e citocinas (Inter- leucina 1β e 6, fator de necrose tumoral α entre outros) que podem não só determinar a necrose dos macro- fagos, como também iniciar a atividade osteoclástica, ou ainda levar à hapoptose do osteoblasto, com conseqüente necrose e osteólise. A disseminação de partículas ocorre também através do chamado espaço articular efetivo, tendo como meio de transporte o fluido articular e assim as partículas podem alcançar o tecido ósseo adjacente, a interface cimento-osso e a interface cimento metal 34 . Aspenberg e van der Vis 35 postularam que a flutuação da pressão do liquido articular dentro do espaço articular efetivo ocasionada pelo carregamento cíclico, pode desencadear a reabsorção óssea pelo mecanismo da hapoptose do osteócito, processo este muito semelhante às erosões ósseas de vértebras ocasionadas por um aneurisma contíguo. O titânio é bem tolerado pelo organismo exceto em condições de instabilidade protética ou de contato direto com outros metais, ocasião em que sua baixa resistência ao desgaste leva a produção de um grande aumento do número de partículas de óxido de titânio (TiO2) .Estas partículas ao se depositarem nos tecidos adjacentes produzem uma coloração escura denominada metalose e intensa atividade inflamatória que resulta em soltura do implante e/ou intensa osteólise (Fig.13.25). Partículas metálicas sobretudo os íons cromo, cobalto e níquel podem agir como haptenos e eliciar uma reação de hipersensibilidade tipo IV em indivíduos previamente sensibilizados 33 . Fig 13.24. Desenho esquemático do processo de reação orgânica às partículas de biomateriais. As partículas (pt) absorvidas pela pseudo cápsula (pc) sofrem a ação de macrófagos (M) recrutados a partir de células progenitoras (P) pela ação de quimocinas (MCP: monocyte chemoattractant proteins , M-CSF: Macrophage colony stimulating factor). Cr/Co = Liga de Cromo-Cobalto PE X3= Polietileno triir- radiado. Valores aproximados, para cabeças de 28 mm em condi- ções semelhantes de ensaio.
  • 18. A toxicidade do Cobalto e Cromo tem sido motivo de preocupação, sobretudo em articulações metal/metal,onde uma grande quantidade destes íons é liberada e pode ser detectada no sangue (entre 5 a 10 vezes a concentração pré-operatória) e na urina em pacientes submetidos a este procedimento 36 . Ainda para a articulação metal-metal tem sido descrita uma reação de hipersensibilidade, do tipo IV ou tardia, mediada por linfócitos tipo T, fazendo com que o quadro histológico das falhas em relação aos outros biomateriais, mude de um infiltrado macrofágico para um quadro histológico linfocitário, que pode se estender, através do espaço articular efetivo, para os tecidos periarticulares, e também à distância, através da corrente vascular e linfática. Esta reação linfocitária pode ocasionar na membrana sinovial, um quadro de sinovite proliferativa descamante que está freqüentemente associado à dor de origem desconhecida nas superfícies protéticas metal/metal. Por outro lado, o infiltrado linfocitário pode se alojar no interior do tecido ósseo e predispor à soltura e mesmo à osteólise. A ocorrência de infiltrado nas partes moles periarticulares está associada à formação de granulomas e dos chamados pseudo- linfomas 37 . Embora vários estudos epidemiológicos não demonstrassem incidência aumentada de neoplasia ou outras lesões em órgãos do sistema reticulo-endotelial 38 , e malformações fetais em pacientes submetidos ao implante de articulações metal/ metal, alguns cirurgiões preferem contra-indicá-la em pacientes com insuficiên- cia renal e mulheres em fase reprodutiva. Partículas cerâmicas, por sua estabilidade química (baixa reatividade), e, portanto grande resistência à corrosão, são muito bem toleradas pelo organismo. Bibliografia e Referências Bibliográficas 1. Williams, D.F.: Definitions in Biocompatibility. Amsterdam: Elsevier, CRC Press, Vol.l , 1987. 2. Park, J. B. “Biomaterials, Introduction” Plenum Press, New York, 1979. 3. Bergmann G,Graichen F, Rohlman A. Hip joint forces during walking and standing-measured in a patient with bilateral prostheses. J Biomech. 1993; 26:969-90 4. Sochard DH. Relationship of Acetabular Wear to Osteolysis and Loosening in Total Hip Arthroplasty. Clin Orthop Rel Res.1999; 363:135-150 5. Buchhorn GH,Willert HG. Wear and Osteolyses. In: Bone cements and cemeting technique,Springer-Verlag Berlin Heidelberg: 163-182,2001 6. Cowin SC. Mechanics of Materials. 2:15-42. In: Bone Mechanics. CRC Press Boca Raton, Florida, 1989. 7.Van Vlack LH. Características exigidas nos materiais usados em engenharia 1:1-17. In: Princípios de Ciências dos Materiais. Ed. Edgard Blucher, São Paulo, 1970. 8.Popov EP. Tensão e Cargas Axiais 3:57-85. In: Introdução à Mecânica dos Sólidos. Ed. Edgard Blucher, São Paulo, 1978. 9. Ozkaya N, Nordin M. Multiaxial Deformations and Stress Analysis. 8:153-194. In Fundamentals of Biomechanics. Equilibrium, Motion and Deformition.2nd Ed.1999 Springer, NY. 10. Wolff J: Das Gesetz der Transformation der Knochen. Berlin Hirschwald, 1982. 11. Ramamurti C. In Finker R, editor: Orthopaedics in primary care, Baltimore,1979, Wiliams & Wilkins. 12. Gomes LSM, Griza S, Cervieri A, Strohaecker T. Different designs of polished, collarless tapered stems influence the in vitro behaviour of cemented femoral hip implants. 2009; 10th EFFORT: Congress of the European Federation of National Associations of Orthopaedics and Traumatology, 3-6 Junho, Viena, Austria. Disponível em: http://www.efort.org/cdrom2009/PosterContent.asp?pid=P 345 (20 ag.2009) 13. Willert HG, Broback LG, Buckhorn GH. et. al. Crevice corrosion of cemented titanium alloy stems in total hip replacements. Clin Orthop Rel Res. 1996;333:51-75. 14. Charnley J (1979) Low friction arthroplasty of the hip:theory and practice. Springer, Berlin Heidelberg New York Tokyo 15. Faris PM, Ritter MA, Pierce AL, Davies KE, Faris GW. Polyethylene sterilization and production affects wear in total hip arthroplasties. Clin Orthop Rel Res 2006; 453: 305-308. 16. Griza S. Estudo comparativo da influência dos ân- gulos protéticos nos padrões de transmissão de carga e estabilidade in vitro de hastes femorais cimentadas, cô- nicas e polidas. Tese de Doutoramento. Programa de pós-graduação em engenharia de minas,metalúrgica e materiais. Universidade Federal do Rio Grande do Sul, 2006. 17. James SP, Jasty M, Davies JP. Fractographic inves- tigation of PMMA bone cement focusing on the relation- ship between porosity reduction and increased fatigue Fig.13.25 (A) Radiografia pré-operatória mostrando intenso desgaste na porção superior do componente acetabular. (B e C): Intensa metalose nos tecidos adjacentes ao implante. (D):Explantes mostrando a destruição do componente acetabular (seta).
  • 19. life. J Biomed Mater Res 26: 651-662, 1992 18. Havelin L I, Espehaug B, Vollset S E, Engesaeter L B. The effect of the type of cement on early revision of Charnley total hip prostheses. A review of eight thousand five hundred and seventy-nine primary arthroplasties from the Norwegian Arthroplasty Register. J Bone Joint Surg Am. 1995; (77): 1543-1550. 19. Jasty M, Maloney WJ, Bragdon CR, O’Connor DO, Haire T, Harris WH.: The initiation of failure in cemented femoral components of hip arthroplasties. J Bone Joint Surg 1991;73-B:551-558 20. Verdonschot N, Huiskes R. Acrylic cement creeps but does not allow much subsidence of femoral stems. J Bone Joint Surg [Br]. 1997; 79:665–669 21. Verdonschot N, Huiskes R. Cement Debonding process of Total Hip Arthroplasty Stems. Clin Orthop Rel Res 1997; 336: 297-307 22. Willman G. Bioceramics: State-of-the-art and future Options. Berichte Deutsche Keramische Gesselschaft 2002; 79:27-31 23. Allain J, Le Mouel S, Goutallier D et al. Poor eight- year survival of cemented zirconia-polyethylene total hip replacements. J Bone Joint Surg. 1999;81B:835-842. 24. Walker PS, Bullough PG. The effects of friction and wear in artificial joints. Orthop Clin North Am 1973; 4: 275- 293. 25. Gomes LSM. Tribologia de Superfícies Articulares Protéticas. In: Artroplastia Total do Quadril. Clinica Ortopédica da SBOT, Rio de Janeiro, Guanabara Koogan. 2009:25-40 26. Mischler D. Tribology and Implants. Cours Biomateriaux 2006. Disponível em: http://ltp2.epfl.ch/ Cours/Biomat/ BioMat-03.pdf. 27. Campbell P, Shen FW, McKellop R. Biologic and Tribologic Considerations of Alternative Bearing Surfaces. Clin Orthop 418:98-108,2004. 28. Fisher J, Jin Z, Tipper J, Stone M, Ingham E. Tribology of alternative bearings. Clin Orthop Rel Res 2006; 453: 25-34. 29. Konttinen YT, Zhao D, Beklen A et al. The microenviroment around total hip replacement prostheses. Clin Orthop Rel Res 2005; 430: 28-38. 30. Kurtz SM, Hozack WJ, Purtill JJ et al. Significance of In vivo degradation for polyethylene in total hip arthroplasty. Clin Orthop Rel Res 2006; 453: 47-57. 31. Tipper JL, Ingham E, Hailey JL, et al. Quantitative analysis of polyethylene wear debris, wear rate and head damage in retrieved Charnley hip prostheses. J Mater Sci Mater Med. 2000; 11: 117-124. 32. 19.Dumbleton JH, D’Antonio JA, Manley MT, Capello WN, Wang A. The Basis for a Second-generation Highly Cross-linked UHMWPE. Clin Orthop 453:265-271, 2006. 33. Willert HG, Buchhorn GH, Fayyazi A, et al. Metal-on- metal bearings and hypersensitivity in patients with artificial hip joints. A clinical and histomorphological study. J bone Joint Surg 87(A):28-36, 2005 34. Schmalzried TP, Jasty M, Harris WH. Periprosthetic bone loss in total hip arthroplasty: polyethylene wear debris and the concept of effective joint space. J Bone Joint Surg Am 1992;74:849-863 35. Aspenberg P, Van der Vis HM. Fluid Pressure may Cause periprosthetic osteolysis- particles are not the only thing. Acta Orthop Scand.1998;69:1-4 36. MacDonald SJ. Metal-on-Metal Total Hip Arthroplasty. The Concerns. Clin Orthop Rel Res.2004;429: 86-93. 37. Zustin J, Amling M, Krause M et al. Intraosseous lymphocytic infiltrates after hip resurfacing arthroplasty .A histopathological study on 181 retrieved femoral remnants. Virchows Arch. 2009; 454:581-588 38. Visuri T, Pukkala E, Paavolainen P, Pulkinnen P, Riska EB: Cancer risk after metal on metal and polyethylene on metal total hip arthroplasty. Clin Orthop Rel Res. 1996;329(Suppl):S280-S289.