O documento discute a conferência Rio+20 de 2012 e os desafios ambientais globais. A crise econômica enfraqueceu os compromissos com o desenvolvimento sustentável e aumentou o modelo extrativista. Os movimentos sociais se mobilizam para a Rio+20 e defendem soluções alternativas ao atual modelo insustentável.
Rio+20 Boletim analisa contexto político e seminário da sociedade civil
1. Boletim Rio+20
Edição número 2
Outubro 2011
O contexto político da Rio+20 com clareza, não pode mais guiar a atividade huma-
na. A civilização baseada no modelo da energia do
Em 2007, por iniciativa do então Presidente
petróleo está chegando ao seu fim, e a transição para
Lula, foi lançada a proposta de realização da Rio+20
outro modelo tem se tornado inadiá-vel.
em um momento de particular interesse e preocupa-
Entretanto, o poder das corporações, cujos in-
ção com as causas ambientais. De fato, nesse ano foi
teresses são representados fundamentalmente pelos
publicado o IV e último relatório do IPCC ― Painel In-
países do Norte e alguns países do Sul, tem impedido
ternacional sobre Mudanças Climáticas ―, e em Bali os
inclusive os acordos no âmbito das Nações Unidas.
países membro da Conferência das Nações Unidas que
Ao mesmo tempo, a crise tem visibilizado de
vêm discutindo a mudança de clima do planeta ― as
forma mais aguda as contradições entre os países
chamadas COPs ou Conferências das Partes ― apro-
mais ricos e as chamadas economias “emergentes”
varam o “Mapa do Caminho” para ir elaborando um
e suas próprias necessidades de crescimento. Assim,
acordo vinculante entre os países e dar seguimento ao
a falta de acordo global tem prevalecido, ao mesmo
Protocolo de Quioto.
tempo em que cresce a voracidade das empresas e
Desde então, muita água passou debaixo da
corporações, o que na América Latina tem significado
ponte e sobretudo, a crise econômica mundial mudou
o acirramento do modelo extrativista, exportador de
radicalmente a agenda política dos países, enfraque-
minérios e matérias primas.
cendo muito a sua vontade em comprometer-se finan-
No Brasil, a tendência ao aprofundamento
ceiramente para o desenvolvimento sustentável e fo-
desse modelo econômico traz como consequência,
cando, ao contrário, seus interesses no crescimento
entre outros, a flexibilização do Código Florestal, a
econômico. De fato, nos últimos anos temos assistido
redução das limitações para aprovação do licencia-
a um sério retrocesso das políticas a favor do meio am-
mento ambiental e o autoritarismo demonstrado na
biente ao nível internacional, começando pelo fracasso
condução do projeto de construção da barragem de
da reunião de Copenhague (COP15) e da subseqüente,
Belo Monte no Estado do Pará.
em Cancum (COP16), onde foram desvinculados os
As forças que estarão em conflito na Rio +20
compromissos dos países no combate ao aquecimento
já são visíveis e estão claramente posicionadas: go-
global tornando-os voluntários. O Protocolo de Quioto,
vernos com pouco interesse em limitar o crescimento
compromisso que prevê metas de redução de emis-
econômico com acordos de sustentabilidade, setores
sões de gases contaminantes pelos países, vencerá
empresariais e corporações com fortes interesses em
no próximo ano sem que tenha sido ainda negociado
empurrar a agenda de negócios ambientais ou da
um substituto. Isso nos dá uma mostra da gravidade
“economia verde” para permitir um novo ciclo de acu-
da crise com que nos deparamos e da falta de com-
mulação de capital e, fazendo frente a tudo isso, os
promisso de muitos governos, movimentos sociais globais, dispostos a se mobilizar
especialmente dos países in- “A civilização para dar um basta a esse paradigma socioeconômico
dustrializados ― os grandes injusto e insustentável.
contaminadores e depreda- baseada no
dores da natureza e impor- modelo da
tantes responsáveis o empo- energia do
brecimento global ― com a I Seminário Internacional em prepara-
agenda negociada em 1992. petróleo está ção à Cúpula dos Povos
O que se aprofundou chegando ao
desde a ECO92, apesar das Entre os dias 30 de Junho e 2 de Julho de 2011,
seu fim, e a
grandes lutas e avanços pro- no Rio de Janeiro, o Comitê Facilitador da Sociedade
movidos pelos movimentos transição para Civil para a Rio+20 (CFSC) organizou o Seminário In-
sociais globais, foi a expansão outro modelo
do livre comércio e dos fluxos tem se torna-
de investimento que têm le-
vado o mundo a uma extrema do inadiável.”
concentração do poder econômico, e promovido a
mercantilização da vida e da natureza. São exemplos
o chamado Mercado de Carbono e a Economia dos
Ecossistemas e da Biodiversidade (TEEB). E é nessa
linha de pensamento que as soluções à múltipla crise
que o mundo vive atualmente estão sendo procura-
das na lógica do crescimento econômico ili-mitado.
Este princípio, que tem guiado a lógica da expansão e Intervenção de Bernardete Ferreira (AMB) em mesa
aproveitamento sem limites da natureza, vê-se agora do Seminário Internacional do CFSC
Realização Apoio
2. ternacional e a Plenária em preparação à Cúpula dos Po- organizações nacionais com o objetivo de fortalecer a
vos da Rio+20 por Justiça Social e Ambiental, um even- participação das mulheres no processo preparatório da
to da sociedade civil que será rea-lizado em paralelo à Rio+20.
Conferência das Nações Unidas sobre Desenvolvimento Partindo do contexto da crise econômica fi-
Sustentável em Junho 2012. No marco do Seminário, nanceira global, aprofundamos a discussão sobre sus-
integrantes da AMB e ou-tras companheiras convidadas tentabilidade, mudanças climáticas e negociações de
realizaram um encontro para definição de estratégias clima no âmbito da ONU, bem como ampliamos o de-
no processo da Rio+20 (ver informe mais detalhado na bate sobre o processo da Rio+20. Também realizamos
matéria seguinte). Também no dia 29 de Junho aconte- um debate em torno aos conceitos de economia verde
ceu um seminário de formação sobre a conferência e e governança global para o desenvolvimento susten-
seus temas, promovido pelo GT Rio de Janeiro do CFSC. tável, temas oficiais da conferência da ONU em 2012.
Esses eventos juntaram mais de 300 participantes de Ao refletirmos juntas sobre o formato e a es-
distintas áreas de atuação, incluindo ambientalistas, tratégia da nossa participação na Rio+20, não pode-
trabalhadores/as rurais e urbanos, mulheres, juven- ria faltar um momento de memória e homenagem ao
tude, movimentos populares, povos originários, etnias Planeta Fêmea, espaço que marcou a presença exitosa
discriminadas, empreendedores da economia solidária dos movimentos feminista e de mulheres mundiais na
etc. com uma significativa presença de organizações e ECO 92. E é a partir daí que queremos construir, rumo
movimentos sociais internacionais. a junho de 2012, um evento inclusivo e de convergên-
As atividades em grupo e em plenárias desses cia das lutas feministas globais e das críticas ao atual
dias contribuíram para delinear o posicionamento da ar- modelo de desenvolvimento desigual e insustentável,
ticulação e a estratégia de incidência e participação da que conta para o seu funcionamento com o trabalho
sociedade civil brasileira e mundial na Rio+20. Assim, não remunerado e invisibilizado das mulheres.
a Cúpula dos Povos será construída como espaço plural Nesse sentido, nossa agenda para a Rio+20
de articulação e convergência dos movimentos sociais, insistirá nos aspectos da “crise dos cuidados”, como
organizações e redes globais que buscarão amplificar também da “crise climática” e seus impactos sobre
sua mensagem. as mulheres, a justiça sócioambiental e o racismo am-
O rechaço à mercantilização da vida e da na- biental.
tureza, às soluções de mercado, a defesa dos bens co-
muns, a visibilização das iniciativas existentes de práti-
cas sustentáveis e comércio justo são, entre outras, as
propostas que serão questões de debate rumo a 2012.
“Do jeito que o mundo vai, não haverá uma Rio + 40”,
declarou Fátima Mello, membro do CFSC, em entrevista
à imprensa. “O nosso planeta não agüentaria. O nosso
recado para a sociedade e para os governos é que es-
tamos cansados de conferências sem capacidade de
implementação e de compromissos que não são condi-
zentes com a crise do planeta”. Nesse sentido, o CFSC
pretende fazer uma avaliação sobre as lacunas, efetivi-
dade e cumprimento dos tratados e convenções assina-
dos durante os últimos vinte anos e também denunciar
os retrocessos nas políticas sócio-ambientais no Brasil e
Para isso, definimos no Seminário estratégias
no mundo.
de formação e também o fortalecimento da FJSA ―
De fato, a Rio+20 representa uma etapa num
Fente de Justiça Sócioambiental ― no âmbito da AMB e
processo histórico de luta por justiça social e ambiental
do GT Gênero da REBRIP como espaços de articulação
que começou com a ECO92 e que inclui as mobilizações
para levar adiante o processo organizativo até junho
durante o “ciclo social” das Nações Unidas durante a
de 2012. Outra importante tarefa que assumimos foi
década de 90, o enfrentamento aos tratados de livre
a de realizar contato com redes nacionais, regionais,
comércio na ALCA e na OMC, as lutas nas negociações
e globais, ampliando ao máximo a convocação das
climáticas nas diversas COPs, e em dezembro próximo,
mulheres do campo e da cidade, mulheres indígenas,
em Durban (COP17), as atuais mobilizações contra o
negras, quilombolas, da economia solidária, lésbicas e
G20, e em momentos de construção de agendas alter-
outras.
nativas como as várias edições do FSM, a Conferência
Chamamos, assim, todas as organizações fe-
de Cochabamba etc.
ministas, organizações de mulheres, do campo e da ci-
A procura por um novo paradigma de vida e or-
dade, a participar na construção deste espaço amplo e
ganização social, econômica e política está em pauta
que buscará ser o âmbito de visibilização das lutas das
rumo a 2012.
mulheres.
Seminário das Mulheres em prepara-
Matérias: Érika Masinara e Lucía Santalices
ção para a Rio+20 Revisão e diagramação: Lucía Santalices
Edição: Graciela Rodriguez
Entre 1 e 3 de Julho de 2011, a AMB, em par-
Para assinatura ou cancelamento: erika@equit.org.br
ceria com o GT Gênero da REBRIP (Rede Brasileira pela Para ler os boletins anteriores acesse:
Integração dos Povos) realizou um Seminário Nacional www.articulacaodemulheres.org.br ou www.equit.org.br
com a participação de 22 mulheres de diversas redes e