1. Literatura Infantil:
narrativa oral e
autoral
Ana Paula Cecato de Oliveira
Mestranda em Letras, professora de Português e Literatura e Coordenadora de
Programas de Leitura na CRL
leitura@camaradolivro.com.br
3. Quando e como surgiu a
denominação “Literatura
Infantil”...
4. • O livro infantil alemão – assim como o autor nos
introduz em sua história – nasceu com o
Iluminismo. Com sua forma de educação, os
filantropos colocavam à prova o imenso
programa de formação humanista. Se o homem
era piedoso, bondoso e sociável por
natureza, então deveria ser possível fazer da
criança, ser natural por excelência, o homem
mais piedoso, mais bondoso e sociável.
(BENJAMIN, 2002, p. 54-55)
5. • O surgimento das primeiras obras destinadas à
infância é concomitante ao estabelecimento da
família nuclear burguesa, bem como à
consolidação da instituição escolar, por volta do
séc. XVIII.
• Não havia grandes preocupações
estéticas, atrelavam-se ao sentido didático-
moralizante destinado ao público escolar.
Muitas questões, ainda, são tabus no espaço
escolar, quando tratados em uma obra literária.
6. Quais seriam, então, as origens
“mais puras” da Literatura Infantil?
• A LI iniciou muito antes do que sua formalização
conceitual, através da aproximação do mundo infantil
com o mundo mítico. Nelly Novaes Coelho afirma que a
aproximação se estabelece pela identificação entre o
popular e o infantil, pois ambos são definidos por uma
“consciência primária na apreensão do eu interior ou
da realidade exterior”, mediados pelas
“emoções, sentidos e sensibilidade” (COELHO, 2000, p.
36).
• Dessa maneira, orientam-se pelo pensamento
mágico, onde prevalecem textos como mitos e lendas.
Vale lembrar, também, de um elo que se complementa
à relação estabelecida previamente: a oralidade. A
maioria das crianças começa sua história de leitor como
ouvinte de histórias, cantigas de ninar e demais
7. • Sendo assim, a última definição parece-nos
mais oportuna, uma vez que parte de uma
concepção de literatura como forma de
expressão artística, que não precisa
comprometer-se com ensinamentos e vincular-
se ao espaço escolar.
• Há autores que lançam dúvida à denominação
“Literatura Infantil”, atribuindo “Literatura
para a infância”, defendendo que, dessa
maneira, a produção não se restringe a uma
fase da vida ou classificação etária, e abre
caminhos para unir, pelo poder da
palavra, adultos e crianças num mesmo
universo estético.
9. • A criança exige do adulto uma representação
clara e compreensível, mas não “infantil” (no
sentido de infantilizada). Muito menos aquilo
que o adulto costuma considerar como tal. E já
que a criança possui senso aguçado mesmo
para uma seriedade distante e grave, contanto
que esta venha sincera e diretamente do
coração, muita coisa se poderia dizer a
respeito daqueles textos antigos e fora de
moda.” (BENJAMIN, 2002, p.55)
10. A Literatura Infantil é, antes de
tudo, literatura; ou melhor, é arte:
fenômeno de criatividade que
representa o mundo, o homem, a
vida, através da palavra. Funde os
sonhos e a vida prática, o imaginário e
o real, os ideais e sua
possível/impossível realização...
(COELHO, 2000, p. 27)
11. De acordo com SORIANO apud COELHO
(2000), a Literatura Infantil tem uma
vocação pedagógica, uma vez que se
destina a uma idade que é a da
aprendizagem (especialmente a
linguística). Também, é pedagógica mesmo
quando se define como puro
divertimento, pois “ensina” sem estar
comprometida em preencher falhas de
conhecimento.
12. Acreditamos que a literatura (para crianças ou
para adultos) precisa ser urgentemente
descoberta, muito menos como mero
entretenimento (pois deste se encarregam com
mais facilidade os meios de comunicação de
massa), e muito mais como uma aventura
espiritual que engaje o eu em uma
experiência rica de vida, inteligência e
emoções. (COELHO, 2000, p.32)
13. Produção (literária) que com rara
felicidade conseguiu equacionar os dois
termos do problema: literatura para
divertir, dar prazer, emocionar... e que, ao
mesmo tempo, ensina modos novos de ver
o mundo, de viver, pensar, reagir, criar... E
principalmente se mostra consciente de
que é pela invenção da linguagem que essa
intencionalidade básica é atingida...
(COELHO, 2000, p.48-49)
14. O que é um bom livro infantil?
• Antes de tudo, deve considerar o repertório, o interesse e o
propósito do leitor;
• Como mediadores, o texto deve aproximar o leitor do prazer
estético e propor “uma educação do olhar”;
• Deve permitir ao leitor a construção de sentidos a partir da
leitura;
• O essencial é que as produções cativem com o recurso à
fantasia, por seu caráter mágico, pela valorização das
sensações e emoções que os transporta para o mundo da
imaginação, edificado pelas imagens e símbolos do texto
literário. (MARTHA, 2011, p.50)
• O livro inserir-se num campo de produção cultural para a
criança.
18. • As narrativas constituem uma das formas de
pensar o mundo.
• Todos nós nascemos imersos numa trama de
narrativas. Algumas delas, dada sua influência
sobre nosso imaginário, parecem que nos
possuem. Elas condicionam nosso modo de ver a
vida, de tomar decisões, de resolver os
problemas afetivos...
19. • Essas narrativas formam o repertório que
as crianças trazem à escola e deve ser
considerado pelo mediador de leitura.
• As histórias são materiais de grande carga
afetiva. Por exemplo, todos nós nos
tornamos mediadores de leitura
porque, de alguma forma, o espaço da
biblioteca é presente em nossa memória
afetiva.
20.
21. • Quando alguém conta uma história, desperta a
memória do outro, e assim começa uma roda de
histórias.
• O homem faz uma pergunta ao mundo. Deseja
compreender o universo como um todo, mas
também quer conhecer os pormenores da vida.
O homem coloca-se diante do mundo e o
interroga, pedindo que lhe revele seus
fenômenos. Recebe então uma resposta:
palavras que vêm ao encontro das suas. Por
pergunta e resposta, temos a formação da
narrativa mitológica.
22. • A relação de significação com a
linguagem na infância acontece por e
com imagens, que remetem a um mundo
sensível e mítico.
• A criança percebe o mundo através de
suas imagens e de sua ludicidade.
23. FALCÃO, Adriana. Ilust. MASSARANI,
Mariana. Mania de explicação. São
Paulo: Salamandra, 2001.
26. • Não se trata de somente conhecer a realidade
social da comunidade onde trabalhamos, mas
também conhecermos o modo como nossos
leitores se relacionam com a linguagem.
• Em algumas comunidades, por exemplo, onde a
leitura e de escrita pouco integram suas
práticas cotidianas, gêneros que envolvam a
oralidade, a imagem e a poesia podem ser a
“porta de entrada” para a constituição dos
acervos de seus leitores.
27. Narrativas orais
• Recuperam o saber arcaico e as formas primitivas de
conhecimento, através da figura do narrador oral, cuja experiência
e técnica qualificam as narrativas transcritas para o papel: “entre
as narrativas escritas, as melhores são as que menos se distinguem
das histórias orais contadas pelos inúmeros narradores anônimos”
(BENJAMIN, 2012, p.214).
• Benjamin defende a ideia de que essas narrativas foram os
primeiros conselheiros da humanidade e perduram como as
primeiras narrativas oferecidas às crianças, por recuperarem o
tempo da “poesia ingênua”, época na qual “o homem podia sentir-
se em harmonia com a natureza” (BENJAMIN, 2012, p.227), como a
coexistência e a atuação de personagens humanas e animais, em
contos como A Gata Borralheira, quando duas pombinhas brancas e
uma árvore ajudam a protagonista a ir ao baile oferecido pelo rei
para encontrar uma pretendente para seu filho.
28. • Os Irmãos Grimm afirmam, no prefácio de seus contos
completos, que os contos populares são “um testemunho do
nosso coração. As crianças apontam sem medo para as
estrelas; outros, seguindo a crença popular, veem nisso uma
ofensa contra os anjos” (GRIMM, 2012, p.13).
Matéria Literária das narrativas orais:
• Mitos – Narrativa compartilhada por determinado grupo
cultural que se propõe a explicar a origem de fenômenos
naturais e de aspectos da natureza humana.
• Lendas – são semelhantes aos mitos, porém, seu argumento é
tirado da tradição de um certo lugar.
• Fábulas – narrativas curtas, com tom moralizante, que utiliza
animais e a natureza como personagens que representam o
comportamento humano.
• Contos maravilhosos – narrativas que apresentam situações
existenciais humanas com a presença de seres fantásticos
(bruxas, fadas, magos).
29. Narrativas autorais
Com a modernidade, marcada principalmente pelo horror
da guerra, e pela incomunicabilidade desta experiência, a
arte de narrar sofre modificações. As transformações do
mundo viram matéria literária para a construção das
narrativas, que se apresentam através de:
• Adaptações de textos clássicos
• Romance, conto e novela.
30. O livro infantil como objeto cultural*
• Elementos externos ao texto verbal
(capa, contracapa, orelhas, paratextos, informações
contextualizantes dos
autores, fonte, papel, ilustrações, projeto gráfico);
• Elementos internos (estruturais como foco
narrativo, verossimilhança, linguagem, caráter de
experimentação, intertextualidade, relação com outras
lggs, rompimento de clichês e modelos, ambiguidade e
pluralidade de significação da lggm
literária, adequação do discurso das personagens a
variáveis como tempo e espaço no mundo narrado).
• Jogo de sentidos – diálogo entre palavras e imagens –
Literatura Infantil é um gênero híbrido.
*De acordo com MARTHA, 2011, p.49-53)
31. Referências teóricas:
BENJAMIN, Walter. Reflexões sobre a criança, o brinquedo e a
educação. São Paulo: Editora 34, 2002.
_______________. Magia e técnica, arte e política. São Paulo:
Brasiliense, 2012.
COELHO, Nelly Novaes. Literatura Infantil: teoria, análise, didática.
São Paulo: Moderna, 2000.
GRIMM, Irmãos. Contos maravilhosos infantis e domésticos (1812-
1815). São Paulo: Cosac Naify, 2012.
OLIVEIRA, Ieda de. (Org.) O que é qualidade em Literatura Infantil e
Juvenil – com a palavra, o educador. São Paulo: DCL, 2011.