SlideShare una empresa de Scribd logo
1 de 12
ASPECTOS REGULATÓRIOS DO MERCADO DE PLANOS DE SAÚDE NO BRASIL: UMA
             ÓTICA A PARTIR DA PERDA DE BEM-ESTAR DO CONSUMIDOR
                                                Alexandre Gustavo Teixeira Moraes1
                                                      André Luís Melo de Oliveira2

1. INTRODUÇÃO

O estudo sobre o mercado de planos de saúde vem despertando grande interesse por parte da
comunidade acadêmica devido à grande e crescente participação dos gastos em saúde em relação à
renda do consumidor. Estas preocupações tem deixado um espaço aberto para a atuação e expansão
dos planos de saúde que abrange um universo de 40,7 milhões de pessoas, representando 21,5% da
população brasileira (ANS 2008, p 28-63), um percentual bastante representativo. Esta abrangência
é um fator de grande preocupação para o governo. A ineficiência (não viabilidade) ou o colapso
deste setor geraria um caos social, visto que, o SUS (Sistema Único de Saúde), ou sistema público
de saúde, não tem capacidade para absorver as demandas de serviços de saúde desse contingente
assistido pelos planos.

Além dessa preocupação deve-se considerar que se trata de um setor com uma estrutura bastante
complexa com características que o distanciam do modelo de concorrência perfeita, conhecido na
teoria microeconômica clássica como sinônimo de bem-estar social. Os pressupostos do modelo de
concorrência perfeita são aplicáveis quando se trata de transações com mercadorias (commodities),
mas considerando que os serviços de saúde em função da sua essencialidade, são vitais para a
manutenção da vida humana que se traduz na inelasticidade da demanda, este modelo não é
suficiente para explicar a dinâmica deste mercado. Com estas características, o papel do Estado
regulador é crucial para que a oferta destes serviços ocorra sem prejuízos à sociedade.

O conceito de eficiência econômica aqui utilizado neste artigo é o de Pareto (ou Ótimo de Pareto)
quando, em uma economia, todas as transações que poderiam ser realizadas para a melhoria dos
agentes já foram feitas, sendo impossível realizar alguma nova transação sem que piore a situação
de um dos agentes envolvidos na transação. Este conceito servirá como base para a análise do
estado de bem-estar social, desenvolvido por Pigou (1920) e adaptado por Arrow (1963) para o
mercado de saúde que, em artigo seminal relacionou questões de bem-estar econômico com o
mercado de saúde3


1
     O autor é mestre em economia pela UFBA e atualmente exerce o cargo de Secretário Executivo do Fundo Estadual
     de Proteção ao Consumidor (FEPC), do PROCON (BA)
2
     O autor é mestre em economia pela UFBA e atualmente trabalha como economista na Diretoria de Assuntos
     Especiais (DAE), no PROCON (BA).
3
     O artigo a que os autores se referem é Uncertainty and the Welfare Economics of the Medical Care, de Kenneth
     Arrow (1963), que inaugurou uma série de estudos na área de saúde e Economia , relacionando-a ao bem-estar
     econômico.
Apesar do grande número de artigos publicados sobre economia da saúde ultimamente, poucos tem
se dedicado a estudar de forma mais detalhada e efetiva as relações entre os planos de saúde e a
regulação do mercado de saúde suplementar. O argumento central deste artigo é compreender o
desempenho do mercado de planos/seguros de saúde no Brasil e suas implicações no âmbito do
Direito do Consumidor, tendo em vista que este este é um mercado regulado pela ANS (Agência
Nacional de Saúde Suplementar) e esta deveria, baseado no princípio da vulnerabilidade do
consumidor, proteger o mesmo em relação aos outros agentes de maior poder econômico. De forma
mais específica,   pretende-se realizar um estudo minucioso sobre as falhas de        mercado que
resultam em assimetrias informacionais, prejudicando o processo concorrencial, causando perda de
bem-estar ao consumidor. Esse desequilíbrio concorrencial passa a ser identificado pelas negativas
de procedimentos, pelos preços abusivos cobrados pelos planos/seguros de saúde e pelos
profissionais de medicina e pelas distorções contratuais que quase sempre lesam os consumidores
finais dos planos/seguros de saúde. Ademais, pretende-se ainda, estudar o papel desempenhado pela
ANS e as falhas regulatórias às quais esta agência está exposta e suas consequencias diretas e
indiretas sobre o consumidor, inclusive tecendo algumas considerações sobre a recente
regulamentação da portabilidade para o mercado de planos/seguros de saúde no Brasil.

As operadoras de planos de saúde foram eleitas como objeto de estudo devido às características de
supplier-induced demand (demanda orientada pela oferta) deste mercado específico. O alto custo
dos procedimentos médicos e a tendência crescente de incorporação de alta tecnologia no
atendimento à saúde tem sido controverso. Por um lado, alguns teóricos afirmam que este fato daria
origem a elevadas despesas na produção de materiais e medicamentos, concentrando o mercado nas
mãos de poucas multinacionais, fazendo com que a saúde suplementar no mundo tivesse
elevadíssimos custos. Diante destas dificuldades, surgiriam os planos e operadoras de saúde, com o
intuito de viabilizar o ingresso da população que ficou alijada deste processo. Por outro, de acordo
com Normand (1998, p. 1), seria o oposto: avanços na tecnologia poderiam fazer produzir a custos
menores. O argumento é simples. Se uma nova droga ou procedimento fazem o mesmo efeito a um
custo menor, então deve ser escolhida. Se produzem o mesmo efeito a um custo maior, deve ser
rejeitada. Então, o único efeito possível de um avanço tecnológico é em direção do menor custo.

Este artigo procurou resposta para duas perguntas de pesquisa: Quais são os fatores limitantes, dos
pontos de vista econômico e regulatório, para o efetivo aproveitamento da eficiência econômica e
regulatória no mercado de saúde no Brasil? Se existem ineficiências tanto econômicas quanto
regulatórias, como fazer para obter o máximo aproveitamento de suas possibilidades econômicas,
sem haver perda de bem-estar econômico para o consumidor? Para tanto, admite-se como hipótese
que a adoção de um marco regulatório que amplie a concorrência no setor de forma que se reduzam
as falhas de mercado e determine ganhos de bem-estar social para a sociedade seria proveitoso para
o interesse público e para as relações entre operadoras, prestadores de serviços medico-hospitalares
e consumidores.

Para proceder à investigação, realizou-se um estudo de caso dos 10 principais planos de saúde do
mercado brasileiro através do Cadastro Nacional de Estabelecimentos de Saúde (CNES), do
Ministério da Saúde (MS), pesquisa direta no site da Agência Nacional de Saúde (ANS), pesquisa e
extração de dados da OCDE, bem como pesquisas em sites especializados em economia da saúde e
na defesa do consumidor.

O artigo está estruturado como segue: no primeiro capítulo, esta introdução inicial. No segundo
capítulo, realizou-se uma revisão da literatura sobre economia da saúde, onde discutiu-se sobre as
características econômicas específicas do mercado de planos/seguros de saúde que irão determinar
que a forma de organização das operadoras de planos de saúde no mercado seja como é,
determinando a elas posições dominantes de mercado e auferir lucros de monopólio. No capítulo 3,
procedeu-se a fazer um levantamento histórico sobre o papel do Estado no Sistema de Saúde
Brasileiro, desde o modelo livre até o modelo atual, híbrido, onde co-existem os planos de saúde
privados, regulados pela Agência Nacional de Saúde e o Sistema Único de Saúde, estatal. No quarto
capítulo, procurou-se falar das experiências internacionais na área de planos de saúde. Desta forma,
apresenta-se os modelos canadense, inglês e americano. O quinto capítulo foi dedicado a discutir os
aspectos regulatórios mais contestados pertinente ao mercado de planos de saúde no Brasil. Por fim,
um último capítulo dedicado às considerações finais, deixando questões e sugestões para serem
respondidas em uma próxima pesquisa.

2. CARACTERÍSTICAS ESPECÍFICAS DO MERCADO DE PLANOS DE SAÚDE

De acordo com Ocké-Reis et al. (2006) As características econômicas do mercado de planos de
saúde são as seguintes:
A inelasticidade da demanda em relação ao preço, ou pouca sensibilidade a aumentos de preço,
que se traduz pelo fato de os indivíduos perceberem a ausência de serviços públicos de saúde neste
mercado e serem obrigadas a pagar uma quantia predeterminada aos planos de saúde pela proteção
dos custos associados ao risco de adoecimento. A partir de uma ótica microeconômica, estaria assim
justificada a possibilidade de o mercado arbitrar preços não competitivos, configurando um cenário
de concorrência imperfeita, no qual os preços seriam considerados como 'preços de monopólio'. No
entanto, fatores extras que afetam a demanda deste mercado específico determinam que estes preços
de monopólio não se sustentem no longo prazo e, logicamente, abstraindo-se o padrão de
competição e o papel regulador do Estado. São eles: a) restrição orçamentária das famílias, que
arrefece a pressão sobre os preços de monopólio; b) fenômeno da medicalização da sociedade, que,
baseado na ideologia do corpo perfeito (higiomania) (Nogueira, 2001, APUD Ocké-Reis et al.,
2006) reduzira bastante a procura por serviços de saúde; c) diversificação de produtos no mercado
apresentando variadas elasticidades da demanda em relação ao preço, fazendo com que o grau de
inelasticidade seja apreciado individualmente.

A incerteza na incidência de doenças e na eficácia de tratamentos leva mercados competitivos a
gerarem uma alocação ineficiente de recursos, ou seja, a não distribuírem os recursos de forma com
que pelo menos alguém não esteja em situação melhor sem piorar o bem-estar de outrem (OCKÉ-
REIS, 2006; VARIAN, 1993, p.15). Desta forma, a presença de incerteza contribui para a
emergência de instituições, tais como confiança e normas regulatórias, pois compensa as falhas de
mercado (SAVEDOFF, 2004). O papel do Estado regulador é imprescindível para compensar a
situação de bem-estar social que o mercado por si só não é capaz de prover ao consumidor.

A característica da Informação Assimétrica advém do fato de os consumidores não possuírem
conhecimento suficiente para identificar e solucionar seus problemas de saúde. Assim, eles são
obrigados a recorrer aos serviços de saúde, já que quem possui as habilidades específicas para fazer
o diagnóstico e realizar as ações terapêuticas é o profissional de saúde.

As relações contratuais entre as partes interessadas (Operadoras ou Planos de Saúde, Prestadores de
Serviços Médicos-Hospitalares e Consumidores-Beneficiários) na presença destas características
podem desencadear desequilíbrios chamados de problemas de agência. Este tipo de problema
contratual surge a partir do relacionamento entre duas ou mais partes quando uma, designada como
agente (no caso, os Planos de Saúde), atuam representando os interesses de outrem, designado como
principal (neste caso, o paciente) em um universo particular de tomadas de decisão (ROSS, S.,
1973, p. 134). Como consumidor dos serviços de saúde, os pacientes criam laços de confiança com
seus serviços de saúde, mais especificamente com seus médicos, para ajudá-los na busca pelo seu
melhor interesse com respeito à sua saúde. Desta forma, de acordo com Scobie (2003), o médico
atua como um 'agente perfeito', cujos objetivos são:
1) Maximizar o status de saúde do paciente, i.e., fazer tudo o que o paciente necessitar para deixá-
    lo em perfeita saúde;
2) Maximizar a utilidade do paciente, i.e., informar ao paciente de tudo que ele precise saber que
    permita a ele tomar suas melhores decisões;

3) Maximizar o status de saúde ou utilidade de toda a sociedade, i.e., fornecer um serviço para um
    paciente que o requer em tempo real, com o conhecimento que esta ação pode negar a um outro
    paciente mais necessitado daquele serviço.
A supplier-induced demand (demanda orientada pela oferta) é uma forma de 'imperfeição de
agência'. Para maximizar seus lucros, os médicos recomendam serviços que ele não prescreve se ele
estivesse atuando como um agente perfeito. Vale ressaltar que, se um médico reduz o preço da
consulta de forma a aumentar o fornecimento dos seus serviços ao cliente, isso não pode ser
classificada como supplier-induced demand, ainda que o médico possa efetuar lucro, por que ele
está apenas produzindo uma movimento longo da curva demanda.

A complexidade e as especificidades envolvidas na cadeia de produção dos serviços de saúde
mostram que dificilmente vai haver um grande número de agentes ofertantes destes serviços,
constituindo uma barreira à entrada de novos agentes a exemplo do que acontece em doenças como
o câncer, cujos medicamentos para para o tratamento são oferecidos, na maioria dos casos por
poucos laboratórios.

3. CARACTERÍSTICAS ECONÔMICAS DO MERCADO DE PLANOS DE SAÚDE NO
BRASIL

De acordo com Leão (2008), as falhas de mercado são responsáveis por afetar a eficiência do
sistema econômico e o bem-estar geral da sociedade. A solução deste problema é controversa: a
intervenção governamental, que para muitos representa a ineficiência As quatro grande falhas de
mercado são reconhecidas como bens públicos, externalidades, informação imperfeita e mercados
CONCENTRADOS. A presença de uma destas falhas de mercado no sistema econômico já é
justificativa suficiente para a utilização de mecanismos de regulação pública que possam atenuar
seus efeitos sobre a eficiência do mercado (SILVA, 2003, p. 16).

Duas falhas de mercado se encontram em bastante evidência no mercado de planos de saúde: a
presença de externalidades e de informação imperfeita. As Externalidades ocorrem quando as
possibilidades de consumo de um agente são afetadas por causa da utilização do recurso ou
procedimento por outro agente, podendo ser positivas – caso a atividade de um indivíduo beneficie
o outro – ou negativas – caso resulte em custos para terceiros (VARIAN, 2003, 546). No caso deste
artigo aplicou-se o conceito de externalidade negativa para os serviços de saúde. Um exemplo típico
para o setor de saúde pode ser observado quando verifica-se um aumento do consumo do cigarro em
determinado local. Isto irá motivar os investidores a aumentarem a capacidade de produção das
fábricas de cigarro. No entanto, é fato notório que o cigarro provoca danos à saúde da população,
aumentando as despesas públicas e privadas com o tratamento de doenças decorrentes do fumo,
reduzindo, para toda a coletividade, o montante de recursos disponível para outros serviços. Outra
externalidade negativa observada é o crescente aumento da produção dos serviços médicos com
decorrentes incrementos de custos e a contrapartida por parte dos pacientes assegurados pelos
planos de saúde, tendo em vista que os planos de saúde cobririam quaisquer despesas que
surgissem. Desta forma, havia uma nítida tendência à elevação estrutural das despesas do sistema
como um todo.

Outra falha de mercado são os mercados incompletos, cujo conceito está associado ao fato de que
quando um bem ou serviço não é ofertado, ainda que seu custo de produção esteja abaixo do preço
que os consumidores estariam dispostos a pagar, pelos riscos que estariam envolvidos naquela
atividade produtiva e que nem sempre o setor privado estaria disposto a cobrir. Esta falha de
mercado gera problemas relacionados a financiamento e necessidade de coordenação de mercados
em alta escala.

Pelo fato de estar compreendido no setor de serviços da economia, o mercado de planos de saúde é
intensivo no fator trabalho. Devido à não estocabilidade dos serviços de saúde, a assistência médica
não pode ser transferida no tempo e no espaço, pois não se materializa em um produto físico,
mesmo com a revolução da telemedicina. Esse perfil não-comercializável (non-tradable) poderia
ser minimizado caso houvesse condições de concorrência de produtos com ampla cobertura
geográfica, a ponto de superar a rigidez da oferta de prestadores. Entretanto, além de esse
deslocamento ser de efeito duvidoso para o bem-estar do consumidor, isso implicaria reajuste nos
prêmios, dada a magnitude da abrangência da rede (OCKÉ-REIS et al., 2006, p. 167). Esta
imobilidade territorial dos prestadores força as operadoras de planos de saúde a atuar em
determinadas regiões de maior renda per capita familiar (Ibidem). Todas essas características acima
descritas do setor resultam com que o aparecimento de inovações não implique em aumento
automático e generalizado da produtividade média, tampouco permite que seu crescimento se dê no
mesmo ritmo da atividade industrial, podendo alimentar uma tendência altista dos custos dos
serviços médicos, fenômeno conhecido como “Doença de Baumol” (OCKÉ-REIS e CARDOSO,
2006).

De acordo com Silva (2003), percebe-se no mercado de saúde a presença de barreiras à entrada e de
economias de escala, refletindo-se em um cenário de poucos agentes ofertantes atuando no mercado
com taxas de lucro positivas e concorrência envolvendo diferentes tipos de estratégias, inclusive no
que se refere aos preços dos produtos, representando imperfeições características de oligopólios.
Além do mais, as empresas deste mercado apresentam capacidade ociosa, ou seja, não utilizam toda
a capacidade instalada, de modo codo com que o nível ótimo de produção é menor do que o nível
capaz de minimizar o custo médio (SILVA, 2003, p. 15).

Desta forma, uma estrutura de mercado oligopolizada como o mercado de planos de saúde
desenvolve-se na direção de um padrão de competição diferenciado e concentrado. Seguindo a
tipologia proposta por Possas (1985), que, grosso modo, refere-se à indústria, o mercado de planos
de saúde vai se afastando do padrão de concorrência em preços para se consolidar na competição
por diferenciação de produtos e serviços, marca das grandes empresas de planos de saúde.

Assim, pode-se inferir que essas ineficiências econômicas são produto de falhas do mercado de
saúde em geral, e em particular, do mercado de planos de saúde que, do ponto de vista
microeconômico, representam perda de bem-estar para os consumidores, determinando que este
mercado não seja operado livremente, necessitando de regras para preservar o interesse público e
para garantir a relação entre as operadoras de planos/seguros de saúde, prestadores de serviços
medico/hospitalares e consumidores em geral.

3. REGULAÇÃO ECONÔMICA DE PLANOS/SEGUROS DE SAÚDE NO BRASIL

A regulação econômica nasce a partir do surgimento da análise tradicional do bem estar, quando se
vislumbrou a possibilidade de intervenção do Estado na economia. De acordo com Possas (1997, p.
4), o objetivo central da regulação econômica não é promover a concorrência como um fim em si
mesmo, mas aumentar o nível de eficiência econômica dos mercados correspondentes.

Pela tipologia de Possas (Ibidem), Existem dois padrões de regulação que rezam sobre a mesma
problemática: a regulação ativa e a regulação reativa. A regulação ativa tem como objetivo a
substituição da concorrência por instrumentos e metas administrados publicamente nas atividades
econômicas econômicas onde predominem as falhas de mercado (concentração de mercado,
externalidades, etc.), justificando a ação reguladora, mantendo monitoramento contínuo de
desempenho das empresas, geralmente nos serviços de infraestrutura.

A regulação reativa está destinada à prevenção e repressão de condutas anticompetitivas (antitruste)
e segue as leis de defesa da concorrência e autoridades antitruste. Nesse tipo de regulação,
considera-se adequado tanto estimular a concorrência quanto – mesmo em estruturas oligopolísticas
– quanto prevenir prejuízos potenciais a ela.




4. EXPERIÊNCIAS INTERNACIONAIS
4.1 Financiamento Público e Financiamento Privado
4.2 O Sistema de Saúde Canadense
4.2.1Caracterização Geral
De acordo com Andrade (2000, p. 8), o Sistema de Saúde Canadense é constituído por dois seguros
de saúde, proveniente da parceria entre o governo federal e governo das províncias, sendo que um
deles é direcionado para serviços médicos, enquanto que o outro é para serviços médicos e
hospitalares que devem ser garantidos em todos os planos ofertados nas províncias. Os princípios
gerais que norteiam o Sistema Nacional de Saúde Canadense são os seguintes:
1) Administração Pública: O plano de saúde deve ser administrado por uma autoridade pública sem
fins lucrativos.
2) Desenho de benefícios compreensivo: O plano de saúde deve garantir acesso a todos os serviços
médicos e hospitalares clinicamente necessários.
3) Universalidade: Todos os indivíduos residentes nas províncias deverão ter acesso aos serviços de
saúde disponibilizados pelo plano de saúde.
4) Portabilidade: Todos os residentes que se mudarem de uma província para outra devem continuar
a ter cobertura dos serviços de saúde pela província de origem durante um período máximo de 03
(três) meses.

5) Acesso: Os planos devem oferecer as condições necessárias e termos padronizados de acesso aos
serviços médicos e hospitalares sem a imposição de barreiras. É proibida a cobrança de tarifas dos
usuários. Nenhum indivíduo pode ser discriminado por critérios de status de saúde, renda, etc.

No Sistema de Saúde Canadense, todo cidadão canadense tem direito a usufruir dos serviços
fornecidos pelos planos públicos de saúde, desde que esteja inscrito nos programas governamentais.
Esse sistema é especializado no cuidado primário, composto por 46% de médicos generalistas (ou
clínicos gerais). Os médicos generalistas são responsáveis PELO CUIDADO PRIMÁRIO, ALÉM
DE    ENCAMINAR        O   PACIENTE       PARA O       MÉDICO      ESPECIALISTA,       REALIZAR
PRESCRIÇÃO DE MEDICAMENTOS E EXAMES LABORATORIAIS. A ESCOLHA DO
MÉDICO É LIVRE POR PARTE DO CONSUMIDOR, ASSIM COMO O MÉDICO TEM PLENA
AUTONOMIA PARA DETERMINAR O TIPO DE TRATAMENTO AO QUAL O PACIENTE
DEVERÁ SE SUBMETER.

A remuneração dos médicos é realizada pelo sistema de reembolso por tarefa, facultando ao médico
a possibilidade associado ao plano de saúde público ou não. Caso o médico não deseje se associar
ao plano de saúde público, os pagamentos podem ser realizados diretamente pelo usuário, seguindo
os preços negociados com o governo federal.

Somente existe espaço para o plano de saúde privado no mercado de serviços suplementares como
prescrição de medicamentos, serviços odontológicos e oftalmológicos, serviços de transporte
(ambulância), serviços de enfermagem qualificada, entre outros.

O problema, neste caso específico, é que o Sistema de Saúde Canadense, baseado em reembolso
para os médicos por tarefa realizada, não apresenta nenhum incentivo para que o provedor reduza o
volume de procedimentos realizados (ANDRADE, 2000, p. 07).

4.3 O Sistema de Saúde Inglês: National Health Service
4.3.1Caracterização Geral
Segundo Andrade (2000, p.12), o sistema de saúde inglês foi nacionalizado em 1946, quando o
acesso a todos os serviços de saúde foi universalizado, dando origem ao National Health Service
(NHS). O financiamento dos serviços de saúde é realizada totalmente através de impostos federais –
82% através de impostos diretos, 13% de impostos sobre folha de pagamentos e 4% de taxas
impostas aos usuários, sendo que a participação dos pacientes nos financiamento diretos são
insignificantes.

Os profissionais de saúde são empregados assalariados do Estado (médicos, enfermeiras e staff dos
hospitais). O direito de atendimento por médicos especialistas a pacientes privados é garantido nas
instituições do sistema nacional. Os médicos generalistas permaneceram como autônomos,
recebendo seus rendimentos através de um sistema misto de captação e reembolso por consulta.

O mercado interno passa a ser substituído por um sistema de “atenção integral”, baseado na
parceria e impulsionado por desempenho. A transformação no setor de saúde inglês tem um caráter
evolutivo, ao invés de se constituir como uma revolução organizacional. Nesse modelo, as
necessidades dos pacientes são cruciais para o sistema.

A governança clínica faz parte de uma estratégia do sistema de saúde. Ela é caracterizada como um
quadro através do qual as organizações prestadoras de serviços de saúde são responsáveis pela
melhoria contínua da qualidade dos seus serviços e pela garantia de elevados padrões de cuidados,
criando um ambiente que estimule a excelência dos cuidados clínicos.

Esse sistema de saúde emprega 1.3 milhão de pessoas, atendendo um universo de 1 milhão de
pacientes a cada 36 horas e é considerado a maior estrutura de saúde pública do mundo.

Há seis princípios fundamentais que direcionam as mudanças no NHS :

    • Renovar o SNS como um serviço de saúde verdadeiramente nacional (conjunto de normas
      nacionais);
    • Delegar a responsabilidade pelo cumprimento destas novas normas nacionais a um nível
      local;
    • Obter o NHS para trabalhar em parceria (por exemplo, estabelecer laços mais fortes com as
      autoridades locais);
    • Melhorar a eficiência de modo que todo o dinheiro é gasto para maximizar o atendimento ao
      paciente;
    • Deslocar o foco sobre a qualidade dos cuidados para que a excelência é garantida para todos
      os pacientes;
    • Tornar SNS mais aberto e responsável para o público.

4.4 O Sistema de Saúde Americano: O Managed Care
4.4.1 Caracterização Geral


5. INSTRUMENTOS REGULATÓRIOS E O BEM-ESTAR DO CONSUMIDOR


6. CONSIDERAÇÕES FINAIS
REFERÊNCIAS
ANDRADE, M. V. Ensaios em Economia da Saúde. Tese de Doutorado. Escola de Pós-Graduação
em Economia. Fundação Getúlio Vargas (EPGE/FGV). ENSAIO 2. Rio de Janeiro, 2000.

ANDRADE, M. V e LISBOA, M. de B. A Regulação dos Contratos de Seguro-Saúde no Brasil:
Gerando Seleção Adversa. Programa de Seminários Acadêmicos. Universidade de Brasília
Instituto de Ciências Humanas. Departamento de Economia. Seminário 05/01. Brasília, 2001.

ANDRADE, M. V; MAIA, A. C. e NORONHA, K. V. M. S. Financiamento do Setor de Saúde
Suplementar no Brasil: Uma Investigação Empírica a Partir dos Dados da PNAD/98.

ARROW, K. J. Uncertainty and the Welfare Economics of Medical Care. The American Economic
Review, Volume 53, Issue 5 (Dec., 1963), 941-973. Disponível em: http://sws.bu.edu/ellisrp/EC387/
Papers/1963Arrow_AER.pdf. Acesso em 19 de agosto de 2010.

FIANI, R. Teoria da Regulação Econômica: Estado Atual e Perspectivas Futuras. Disponível em
http://www.ie.ufrj.br/grc/pdfs/teoria_da_regulacao_economica.pdf . Acesso em 14 de agosto de
2010.

LEÃO, C. J. S. Regulação Econômica do Setor Farmacêutico: Podemos Acreditar Nesse Mercado?
Instituto de Saúde Coletiva (ISC). Universidade Federal da Bahia (UFBA). Salvador, 2008.

NORMAND, C. Ten Popular Health Economic Fallacies. Journal of Public Health Medicine.
Volume 20, Nº 2, OXFORD UNIVERSITY PRESS, pp. 129-132. Disponível em:
http://jpubhealth.oxfordjournals.org . Acesso em 17 de agosto de 2010.

OCKÉ-REIS, C. O. ; ANDREAZZI, M. F. S. de.; SILVEIRA, F. G. O Mercado de Planos de saúde
no Brasil: Uma Criação do Estado? Revista de Economia Contemporânea. Rio de Janeiro, 10
(1): 157-185, jan./abr. 2006.

OCKÉ-REIS, C. O. CARDOSO. S. De S. Uma Descrição do Comportamento dos Preços dos
Planos de Assistência à Saúde – 2001-2005. Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada.

POSSAS, M. L. Estruturas de Mercado em Oligopólio. São Paulo: Editora Hucitec, 1985.

ROSS, S. The Economic Theory of Agency: the principal's problem. American Economic Review,
20 (2), 22-32, May 1973.

SAVEDOF, W. Bulletin of the World Health Organization, February, 2004, 82 (2).

SCOBIE, N; AZAM, T. OKUTO, N. Explain Under What Circumstances Suplier-induced Demand
Is Most Likely to Occur. Health Economics Essay, Feb 2003.

VARIAN, H. Intermediate Microeconomics: A Modern Approach. Third Edition. W.W. Norton &
Company, New York, EUA, 2003.

UNITED KINGDOM. Health Care Systems in Transition. European Observatory on Health Care
Systems. London School of Economics and Political Science, London, 1999.

UNITED KINGDOM. The New NHS: Modern, Dependable. Health Department. The Stationery
Office. December, 1997.
O Sistema de Saúde na Inglaterra. Disponível em http://brasilcomz.wordpress.com/2009/07/27/o-
sistema-de-saude-na-inglaterra/. Acesso em 25 de agosto de 2010.

Más contenido relacionado

Destacado

mercado de saúde suplementar
mercado de saúde suplementarmercado de saúde suplementar
mercado de saúde suplementarJoaquim Wilmar
 
Presentación asamblea
Presentación asambleaPresentación asamblea
Presentación asambleaChiquisubirana
 
La llegenda de sant jordi p4 B
La llegenda de sant jordi p4 B La llegenda de sant jordi p4 B
La llegenda de sant jordi p4 B m monta
 
Konferensbilder från Avstamp
Konferensbilder från AvstampKonferensbilder från Avstamp
Konferensbilder från Avstampsusannajarlund
 
Construyendo nubes: simples, interoperablesy accesibles- Sebastián Cao
Construyendo nubes: simples, interoperablesy accesibles- Sebastián CaoConstruyendo nubes: simples, interoperablesy accesibles- Sebastián Cao
Construyendo nubes: simples, interoperablesy accesibles- Sebastián CaoEventos_PrinceCooke
 
Parapentismo extremo
Parapentismo extremoParapentismo extremo
Parapentismo extremocris-neira
 
Próximo concierto fin de curso 2011
Próximo concierto fin de curso 2011Próximo concierto fin de curso 2011
Próximo concierto fin de curso 2011ceipsanta
 
Ação boneco cidadão
Ação boneco cidadãoAção boneco cidadão
Ação boneco cidadãoCarlos França
 
Presentacion
PresentacionPresentacion
Presentacionarlibraes
 
Hiphop presentacion
Hiphop presentacionHiphop presentacion
Hiphop presentacionpatricita3
 
Processo forncimento medicamentos diabeticos
Processo forncimento  medicamentos diabeticosProcesso forncimento  medicamentos diabeticos
Processo forncimento medicamentos diabeticosCarlos França
 
Nativos vs. inmigrantes digitales
Nativos vs. inmigrantes digitalesNativos vs. inmigrantes digitales
Nativos vs. inmigrantes digitalesCLAUDIA GERALDINO
 
Ppt grupo pea prestic
Ppt grupo pea presticPpt grupo pea prestic
Ppt grupo pea presticAna Escobedo
 

Destacado (20)

mercado de saúde suplementar
mercado de saúde suplementarmercado de saúde suplementar
mercado de saúde suplementar
 
Fuglen
FuglenFuglen
Fuglen
 
Presentación asamblea
Presentación asambleaPresentación asamblea
Presentación asamblea
 
La llegenda de sant jordi p4 B
La llegenda de sant jordi p4 B La llegenda de sant jordi p4 B
La llegenda de sant jordi p4 B
 
Konferensbilder från Avstamp
Konferensbilder från AvstampKonferensbilder från Avstamp
Konferensbilder från Avstamp
 
Construyendo nubes: simples, interoperablesy accesibles- Sebastián Cao
Construyendo nubes: simples, interoperablesy accesibles- Sebastián CaoConstruyendo nubes: simples, interoperablesy accesibles- Sebastián Cao
Construyendo nubes: simples, interoperablesy accesibles- Sebastián Cao
 
Parapentismo extremo
Parapentismo extremoParapentismo extremo
Parapentismo extremo
 
Il corpo delle dolls
Il corpo delle dollsIl corpo delle dolls
Il corpo delle dolls
 
Próximo concierto fin de curso 2011
Próximo concierto fin de curso 2011Próximo concierto fin de curso 2011
Próximo concierto fin de curso 2011
 
1
11
1
 
Seller disclosure
Seller disclosureSeller disclosure
Seller disclosure
 
Coach側背包
Coach側背包Coach側背包
Coach側背包
 
Ação boneco cidadão
Ação boneco cidadãoAção boneco cidadão
Ação boneco cidadão
 
Presentacion
PresentacionPresentacion
Presentacion
 
Desporto PTL edição 6
Desporto PTL   edição 6Desporto PTL   edição 6
Desporto PTL edição 6
 
Hiphop presentacion
Hiphop presentacionHiphop presentacion
Hiphop presentacion
 
Ikt2
Ikt2Ikt2
Ikt2
 
Processo forncimento medicamentos diabeticos
Processo forncimento  medicamentos diabeticosProcesso forncimento  medicamentos diabeticos
Processo forncimento medicamentos diabeticos
 
Nativos vs. inmigrantes digitales
Nativos vs. inmigrantes digitalesNativos vs. inmigrantes digitales
Nativos vs. inmigrantes digitales
 
Ppt grupo pea prestic
Ppt grupo pea presticPpt grupo pea prestic
Ppt grupo pea prestic
 

Similar a Mercado de planos de saúde 31.08.10

A Regulação pública da saúde no Estado brasileiro
A Regulação pública da saúde no Estado brasileiroA Regulação pública da saúde no Estado brasileiro
A Regulação pública da saúde no Estado brasileiroRodrigo Zardo
 
Regulação e saúde
Regulação e saúdeRegulação e saúde
Regulação e saúdenilsonpazjr
 
Integração do setor de saúde suplementar ao sus
Integração do setor de saúde suplementar ao susIntegração do setor de saúde suplementar ao sus
Integração do setor de saúde suplementar ao susnilsonpazjr
 
Integração do setor de saúde suplementar ao sus
Integração do setor de saúde suplementar ao susIntegração do setor de saúde suplementar ao sus
Integração do setor de saúde suplementar ao susnilsonpazjr
 
A influencia do banco mundial na politica saude brasileira
A influencia do banco mundial na politica saude brasileiraA influencia do banco mundial na politica saude brasileira
A influencia do banco mundial na politica saude brasileiraBruna Ortiz
 
Evolução plano de saúde no brasil
Evolução plano de saúde no brasilEvolução plano de saúde no brasil
Evolução plano de saúde no brasilnilsonpazjr
 
Reflexões sobre a ANS: regulação e ordem econômica - nicholas maciel merlone
Reflexões sobre a ANS: regulação e ordem econômica - nicholas maciel merloneReflexões sobre a ANS: regulação e ordem econômica - nicholas maciel merlone
Reflexões sobre a ANS: regulação e ordem econômica - nicholas maciel merloneNicholas Merlone
 
O acesso aos serviços públicos de saúde - Elementos para a realização de uma ...
O acesso aos serviços públicos de saúde - Elementos para a realização de uma ...O acesso aos serviços públicos de saúde - Elementos para a realização de uma ...
O acesso aos serviços públicos de saúde - Elementos para a realização de uma ...José Pinto da Costa
 
A assistência farmacêutica no sus cff
A assistência farmacêutica no sus cffA assistência farmacêutica no sus cff
A assistência farmacêutica no sus cffMárcio Batista
 
Texto1 leit previa_reg_ativ18set2013
Texto1 leit previa_reg_ativ18set2013Texto1 leit previa_reg_ativ18set2013
Texto1 leit previa_reg_ativ18set2013Rodrigo Zardo
 
Política nacional de álcool e outras drogas
Política nacional de álcool e outras drogasPolítica nacional de álcool e outras drogas
Política nacional de álcool e outras drogasmulticentrica
 
Política nacional de álcool e outras drogas
Política nacional de álcool e outras drogasPolítica nacional de álcool e outras drogas
Política nacional de álcool e outras drogasmulticentrica
 

Similar a Mercado de planos de saúde 31.08.10 (20)

A Regulação pública da saúde no Estado brasileiro
A Regulação pública da saúde no Estado brasileiroA Regulação pública da saúde no Estado brasileiro
A Regulação pública da saúde no Estado brasileiro
 
Regulação e saúde
Regulação e saúdeRegulação e saúde
Regulação e saúde
 
Integração do setor de saúde suplementar ao sus
Integração do setor de saúde suplementar ao susIntegração do setor de saúde suplementar ao sus
Integração do setor de saúde suplementar ao sus
 
Integração do setor de saúde suplementar ao sus
Integração do setor de saúde suplementar ao susIntegração do setor de saúde suplementar ao sus
Integração do setor de saúde suplementar ao sus
 
A influencia do banco mundial na politica saude brasileira
A influencia do banco mundial na politica saude brasileiraA influencia do banco mundial na politica saude brasileira
A influencia do banco mundial na politica saude brasileira
 
Evolução plano de saúde no brasil
Evolução plano de saúde no brasilEvolução plano de saúde no brasil
Evolução plano de saúde no brasil
 
Reflexões sobre a ANS: regulação e ordem econômica - nicholas maciel merlone
Reflexões sobre a ANS: regulação e ordem econômica - nicholas maciel merloneReflexões sobre a ANS: regulação e ordem econômica - nicholas maciel merlone
Reflexões sobre a ANS: regulação e ordem econômica - nicholas maciel merlone
 
Educação profição saúde
Educação profição   saúdeEducação profição   saúde
Educação profição saúde
 
Educação profição saúde
Educação profição   saúdeEducação profição   saúde
Educação profição saúde
 
Educação profição saúde
Educação profição   saúdeEducação profição   saúde
Educação profição saúde
 
Artigo bioterra v20_n1_06
Artigo bioterra v20_n1_06Artigo bioterra v20_n1_06
Artigo bioterra v20_n1_06
 
Cenários e tendências - Dr. Mozart de Oliveira Júnior
Cenários e tendências - Dr. Mozart de Oliveira JúniorCenários e tendências - Dr. Mozart de Oliveira Júnior
Cenários e tendências - Dr. Mozart de Oliveira Júnior
 
O acesso aos serviços públicos de saúde - Elementos para a realização de uma ...
O acesso aos serviços públicos de saúde - Elementos para a realização de uma ...O acesso aos serviços públicos de saúde - Elementos para a realização de uma ...
O acesso aos serviços públicos de saúde - Elementos para a realização de uma ...
 
A assistência farmacêutica no sus cff
A assistência farmacêutica no sus cffA assistência farmacêutica no sus cff
A assistência farmacêutica no sus cff
 
A assistência farmacêutica no sus cff e crf pr 2010
A assistência farmacêutica no sus cff e crf pr 2010A assistência farmacêutica no sus cff e crf pr 2010
A assistência farmacêutica no sus cff e crf pr 2010
 
Os desafios da gestão estratégica na saúde
Os desafios da gestão estratégica na saúde Os desafios da gestão estratégica na saúde
Os desafios da gestão estratégica na saúde
 
Texto1 leit previa_reg_ativ18set2013
Texto1 leit previa_reg_ativ18set2013Texto1 leit previa_reg_ativ18set2013
Texto1 leit previa_reg_ativ18set2013
 
Pns alcool drogas
Pns alcool drogasPns alcool drogas
Pns alcool drogas
 
Política nacional de álcool e outras drogas
Política nacional de álcool e outras drogasPolítica nacional de álcool e outras drogas
Política nacional de álcool e outras drogas
 
Política nacional de álcool e outras drogas
Política nacional de álcool e outras drogasPolítica nacional de álcool e outras drogas
Política nacional de álcool e outras drogas
 

Mercado de planos de saúde 31.08.10

  • 1. ASPECTOS REGULATÓRIOS DO MERCADO DE PLANOS DE SAÚDE NO BRASIL: UMA ÓTICA A PARTIR DA PERDA DE BEM-ESTAR DO CONSUMIDOR Alexandre Gustavo Teixeira Moraes1 André Luís Melo de Oliveira2 1. INTRODUÇÃO O estudo sobre o mercado de planos de saúde vem despertando grande interesse por parte da comunidade acadêmica devido à grande e crescente participação dos gastos em saúde em relação à renda do consumidor. Estas preocupações tem deixado um espaço aberto para a atuação e expansão dos planos de saúde que abrange um universo de 40,7 milhões de pessoas, representando 21,5% da população brasileira (ANS 2008, p 28-63), um percentual bastante representativo. Esta abrangência é um fator de grande preocupação para o governo. A ineficiência (não viabilidade) ou o colapso deste setor geraria um caos social, visto que, o SUS (Sistema Único de Saúde), ou sistema público de saúde, não tem capacidade para absorver as demandas de serviços de saúde desse contingente assistido pelos planos. Além dessa preocupação deve-se considerar que se trata de um setor com uma estrutura bastante complexa com características que o distanciam do modelo de concorrência perfeita, conhecido na teoria microeconômica clássica como sinônimo de bem-estar social. Os pressupostos do modelo de concorrência perfeita são aplicáveis quando se trata de transações com mercadorias (commodities), mas considerando que os serviços de saúde em função da sua essencialidade, são vitais para a manutenção da vida humana que se traduz na inelasticidade da demanda, este modelo não é suficiente para explicar a dinâmica deste mercado. Com estas características, o papel do Estado regulador é crucial para que a oferta destes serviços ocorra sem prejuízos à sociedade. O conceito de eficiência econômica aqui utilizado neste artigo é o de Pareto (ou Ótimo de Pareto) quando, em uma economia, todas as transações que poderiam ser realizadas para a melhoria dos agentes já foram feitas, sendo impossível realizar alguma nova transação sem que piore a situação de um dos agentes envolvidos na transação. Este conceito servirá como base para a análise do estado de bem-estar social, desenvolvido por Pigou (1920) e adaptado por Arrow (1963) para o mercado de saúde que, em artigo seminal relacionou questões de bem-estar econômico com o mercado de saúde3 1 O autor é mestre em economia pela UFBA e atualmente exerce o cargo de Secretário Executivo do Fundo Estadual de Proteção ao Consumidor (FEPC), do PROCON (BA) 2 O autor é mestre em economia pela UFBA e atualmente trabalha como economista na Diretoria de Assuntos Especiais (DAE), no PROCON (BA). 3 O artigo a que os autores se referem é Uncertainty and the Welfare Economics of the Medical Care, de Kenneth Arrow (1963), que inaugurou uma série de estudos na área de saúde e Economia , relacionando-a ao bem-estar econômico.
  • 2. Apesar do grande número de artigos publicados sobre economia da saúde ultimamente, poucos tem se dedicado a estudar de forma mais detalhada e efetiva as relações entre os planos de saúde e a regulação do mercado de saúde suplementar. O argumento central deste artigo é compreender o desempenho do mercado de planos/seguros de saúde no Brasil e suas implicações no âmbito do Direito do Consumidor, tendo em vista que este este é um mercado regulado pela ANS (Agência Nacional de Saúde Suplementar) e esta deveria, baseado no princípio da vulnerabilidade do consumidor, proteger o mesmo em relação aos outros agentes de maior poder econômico. De forma mais específica, pretende-se realizar um estudo minucioso sobre as falhas de mercado que resultam em assimetrias informacionais, prejudicando o processo concorrencial, causando perda de bem-estar ao consumidor. Esse desequilíbrio concorrencial passa a ser identificado pelas negativas de procedimentos, pelos preços abusivos cobrados pelos planos/seguros de saúde e pelos profissionais de medicina e pelas distorções contratuais que quase sempre lesam os consumidores finais dos planos/seguros de saúde. Ademais, pretende-se ainda, estudar o papel desempenhado pela ANS e as falhas regulatórias às quais esta agência está exposta e suas consequencias diretas e indiretas sobre o consumidor, inclusive tecendo algumas considerações sobre a recente regulamentação da portabilidade para o mercado de planos/seguros de saúde no Brasil. As operadoras de planos de saúde foram eleitas como objeto de estudo devido às características de supplier-induced demand (demanda orientada pela oferta) deste mercado específico. O alto custo dos procedimentos médicos e a tendência crescente de incorporação de alta tecnologia no atendimento à saúde tem sido controverso. Por um lado, alguns teóricos afirmam que este fato daria origem a elevadas despesas na produção de materiais e medicamentos, concentrando o mercado nas mãos de poucas multinacionais, fazendo com que a saúde suplementar no mundo tivesse elevadíssimos custos. Diante destas dificuldades, surgiriam os planos e operadoras de saúde, com o intuito de viabilizar o ingresso da população que ficou alijada deste processo. Por outro, de acordo com Normand (1998, p. 1), seria o oposto: avanços na tecnologia poderiam fazer produzir a custos menores. O argumento é simples. Se uma nova droga ou procedimento fazem o mesmo efeito a um custo menor, então deve ser escolhida. Se produzem o mesmo efeito a um custo maior, deve ser rejeitada. Então, o único efeito possível de um avanço tecnológico é em direção do menor custo. Este artigo procurou resposta para duas perguntas de pesquisa: Quais são os fatores limitantes, dos pontos de vista econômico e regulatório, para o efetivo aproveitamento da eficiência econômica e regulatória no mercado de saúde no Brasil? Se existem ineficiências tanto econômicas quanto regulatórias, como fazer para obter o máximo aproveitamento de suas possibilidades econômicas, sem haver perda de bem-estar econômico para o consumidor? Para tanto, admite-se como hipótese que a adoção de um marco regulatório que amplie a concorrência no setor de forma que se reduzam
  • 3. as falhas de mercado e determine ganhos de bem-estar social para a sociedade seria proveitoso para o interesse público e para as relações entre operadoras, prestadores de serviços medico-hospitalares e consumidores. Para proceder à investigação, realizou-se um estudo de caso dos 10 principais planos de saúde do mercado brasileiro através do Cadastro Nacional de Estabelecimentos de Saúde (CNES), do Ministério da Saúde (MS), pesquisa direta no site da Agência Nacional de Saúde (ANS), pesquisa e extração de dados da OCDE, bem como pesquisas em sites especializados em economia da saúde e na defesa do consumidor. O artigo está estruturado como segue: no primeiro capítulo, esta introdução inicial. No segundo capítulo, realizou-se uma revisão da literatura sobre economia da saúde, onde discutiu-se sobre as características econômicas específicas do mercado de planos/seguros de saúde que irão determinar que a forma de organização das operadoras de planos de saúde no mercado seja como é, determinando a elas posições dominantes de mercado e auferir lucros de monopólio. No capítulo 3, procedeu-se a fazer um levantamento histórico sobre o papel do Estado no Sistema de Saúde Brasileiro, desde o modelo livre até o modelo atual, híbrido, onde co-existem os planos de saúde privados, regulados pela Agência Nacional de Saúde e o Sistema Único de Saúde, estatal. No quarto capítulo, procurou-se falar das experiências internacionais na área de planos de saúde. Desta forma, apresenta-se os modelos canadense, inglês e americano. O quinto capítulo foi dedicado a discutir os aspectos regulatórios mais contestados pertinente ao mercado de planos de saúde no Brasil. Por fim, um último capítulo dedicado às considerações finais, deixando questões e sugestões para serem respondidas em uma próxima pesquisa. 2. CARACTERÍSTICAS ESPECÍFICAS DO MERCADO DE PLANOS DE SAÚDE De acordo com Ocké-Reis et al. (2006) As características econômicas do mercado de planos de saúde são as seguintes: A inelasticidade da demanda em relação ao preço, ou pouca sensibilidade a aumentos de preço, que se traduz pelo fato de os indivíduos perceberem a ausência de serviços públicos de saúde neste mercado e serem obrigadas a pagar uma quantia predeterminada aos planos de saúde pela proteção dos custos associados ao risco de adoecimento. A partir de uma ótica microeconômica, estaria assim justificada a possibilidade de o mercado arbitrar preços não competitivos, configurando um cenário de concorrência imperfeita, no qual os preços seriam considerados como 'preços de monopólio'. No entanto, fatores extras que afetam a demanda deste mercado específico determinam que estes preços de monopólio não se sustentem no longo prazo e, logicamente, abstraindo-se o padrão de competição e o papel regulador do Estado. São eles: a) restrição orçamentária das famílias, que
  • 4. arrefece a pressão sobre os preços de monopólio; b) fenômeno da medicalização da sociedade, que, baseado na ideologia do corpo perfeito (higiomania) (Nogueira, 2001, APUD Ocké-Reis et al., 2006) reduzira bastante a procura por serviços de saúde; c) diversificação de produtos no mercado apresentando variadas elasticidades da demanda em relação ao preço, fazendo com que o grau de inelasticidade seja apreciado individualmente. A incerteza na incidência de doenças e na eficácia de tratamentos leva mercados competitivos a gerarem uma alocação ineficiente de recursos, ou seja, a não distribuírem os recursos de forma com que pelo menos alguém não esteja em situação melhor sem piorar o bem-estar de outrem (OCKÉ- REIS, 2006; VARIAN, 1993, p.15). Desta forma, a presença de incerteza contribui para a emergência de instituições, tais como confiança e normas regulatórias, pois compensa as falhas de mercado (SAVEDOFF, 2004). O papel do Estado regulador é imprescindível para compensar a situação de bem-estar social que o mercado por si só não é capaz de prover ao consumidor. A característica da Informação Assimétrica advém do fato de os consumidores não possuírem conhecimento suficiente para identificar e solucionar seus problemas de saúde. Assim, eles são obrigados a recorrer aos serviços de saúde, já que quem possui as habilidades específicas para fazer o diagnóstico e realizar as ações terapêuticas é o profissional de saúde. As relações contratuais entre as partes interessadas (Operadoras ou Planos de Saúde, Prestadores de Serviços Médicos-Hospitalares e Consumidores-Beneficiários) na presença destas características podem desencadear desequilíbrios chamados de problemas de agência. Este tipo de problema contratual surge a partir do relacionamento entre duas ou mais partes quando uma, designada como agente (no caso, os Planos de Saúde), atuam representando os interesses de outrem, designado como principal (neste caso, o paciente) em um universo particular de tomadas de decisão (ROSS, S., 1973, p. 134). Como consumidor dos serviços de saúde, os pacientes criam laços de confiança com seus serviços de saúde, mais especificamente com seus médicos, para ajudá-los na busca pelo seu melhor interesse com respeito à sua saúde. Desta forma, de acordo com Scobie (2003), o médico atua como um 'agente perfeito', cujos objetivos são: 1) Maximizar o status de saúde do paciente, i.e., fazer tudo o que o paciente necessitar para deixá- lo em perfeita saúde; 2) Maximizar a utilidade do paciente, i.e., informar ao paciente de tudo que ele precise saber que permita a ele tomar suas melhores decisões; 3) Maximizar o status de saúde ou utilidade de toda a sociedade, i.e., fornecer um serviço para um paciente que o requer em tempo real, com o conhecimento que esta ação pode negar a um outro paciente mais necessitado daquele serviço.
  • 5. A supplier-induced demand (demanda orientada pela oferta) é uma forma de 'imperfeição de agência'. Para maximizar seus lucros, os médicos recomendam serviços que ele não prescreve se ele estivesse atuando como um agente perfeito. Vale ressaltar que, se um médico reduz o preço da consulta de forma a aumentar o fornecimento dos seus serviços ao cliente, isso não pode ser classificada como supplier-induced demand, ainda que o médico possa efetuar lucro, por que ele está apenas produzindo uma movimento longo da curva demanda. A complexidade e as especificidades envolvidas na cadeia de produção dos serviços de saúde mostram que dificilmente vai haver um grande número de agentes ofertantes destes serviços, constituindo uma barreira à entrada de novos agentes a exemplo do que acontece em doenças como o câncer, cujos medicamentos para para o tratamento são oferecidos, na maioria dos casos por poucos laboratórios. 3. CARACTERÍSTICAS ECONÔMICAS DO MERCADO DE PLANOS DE SAÚDE NO BRASIL De acordo com Leão (2008), as falhas de mercado são responsáveis por afetar a eficiência do sistema econômico e o bem-estar geral da sociedade. A solução deste problema é controversa: a intervenção governamental, que para muitos representa a ineficiência As quatro grande falhas de mercado são reconhecidas como bens públicos, externalidades, informação imperfeita e mercados CONCENTRADOS. A presença de uma destas falhas de mercado no sistema econômico já é justificativa suficiente para a utilização de mecanismos de regulação pública que possam atenuar seus efeitos sobre a eficiência do mercado (SILVA, 2003, p. 16). Duas falhas de mercado se encontram em bastante evidência no mercado de planos de saúde: a presença de externalidades e de informação imperfeita. As Externalidades ocorrem quando as possibilidades de consumo de um agente são afetadas por causa da utilização do recurso ou procedimento por outro agente, podendo ser positivas – caso a atividade de um indivíduo beneficie o outro – ou negativas – caso resulte em custos para terceiros (VARIAN, 2003, 546). No caso deste artigo aplicou-se o conceito de externalidade negativa para os serviços de saúde. Um exemplo típico para o setor de saúde pode ser observado quando verifica-se um aumento do consumo do cigarro em determinado local. Isto irá motivar os investidores a aumentarem a capacidade de produção das fábricas de cigarro. No entanto, é fato notório que o cigarro provoca danos à saúde da população, aumentando as despesas públicas e privadas com o tratamento de doenças decorrentes do fumo, reduzindo, para toda a coletividade, o montante de recursos disponível para outros serviços. Outra externalidade negativa observada é o crescente aumento da produção dos serviços médicos com decorrentes incrementos de custos e a contrapartida por parte dos pacientes assegurados pelos
  • 6. planos de saúde, tendo em vista que os planos de saúde cobririam quaisquer despesas que surgissem. Desta forma, havia uma nítida tendência à elevação estrutural das despesas do sistema como um todo. Outra falha de mercado são os mercados incompletos, cujo conceito está associado ao fato de que quando um bem ou serviço não é ofertado, ainda que seu custo de produção esteja abaixo do preço que os consumidores estariam dispostos a pagar, pelos riscos que estariam envolvidos naquela atividade produtiva e que nem sempre o setor privado estaria disposto a cobrir. Esta falha de mercado gera problemas relacionados a financiamento e necessidade de coordenação de mercados em alta escala. Pelo fato de estar compreendido no setor de serviços da economia, o mercado de planos de saúde é intensivo no fator trabalho. Devido à não estocabilidade dos serviços de saúde, a assistência médica não pode ser transferida no tempo e no espaço, pois não se materializa em um produto físico, mesmo com a revolução da telemedicina. Esse perfil não-comercializável (non-tradable) poderia ser minimizado caso houvesse condições de concorrência de produtos com ampla cobertura geográfica, a ponto de superar a rigidez da oferta de prestadores. Entretanto, além de esse deslocamento ser de efeito duvidoso para o bem-estar do consumidor, isso implicaria reajuste nos prêmios, dada a magnitude da abrangência da rede (OCKÉ-REIS et al., 2006, p. 167). Esta imobilidade territorial dos prestadores força as operadoras de planos de saúde a atuar em determinadas regiões de maior renda per capita familiar (Ibidem). Todas essas características acima descritas do setor resultam com que o aparecimento de inovações não implique em aumento automático e generalizado da produtividade média, tampouco permite que seu crescimento se dê no mesmo ritmo da atividade industrial, podendo alimentar uma tendência altista dos custos dos serviços médicos, fenômeno conhecido como “Doença de Baumol” (OCKÉ-REIS e CARDOSO, 2006). De acordo com Silva (2003), percebe-se no mercado de saúde a presença de barreiras à entrada e de economias de escala, refletindo-se em um cenário de poucos agentes ofertantes atuando no mercado com taxas de lucro positivas e concorrência envolvendo diferentes tipos de estratégias, inclusive no que se refere aos preços dos produtos, representando imperfeições características de oligopólios. Além do mais, as empresas deste mercado apresentam capacidade ociosa, ou seja, não utilizam toda a capacidade instalada, de modo codo com que o nível ótimo de produção é menor do que o nível capaz de minimizar o custo médio (SILVA, 2003, p. 15). Desta forma, uma estrutura de mercado oligopolizada como o mercado de planos de saúde desenvolve-se na direção de um padrão de competição diferenciado e concentrado. Seguindo a
  • 7. tipologia proposta por Possas (1985), que, grosso modo, refere-se à indústria, o mercado de planos de saúde vai se afastando do padrão de concorrência em preços para se consolidar na competição por diferenciação de produtos e serviços, marca das grandes empresas de planos de saúde. Assim, pode-se inferir que essas ineficiências econômicas são produto de falhas do mercado de saúde em geral, e em particular, do mercado de planos de saúde que, do ponto de vista microeconômico, representam perda de bem-estar para os consumidores, determinando que este mercado não seja operado livremente, necessitando de regras para preservar o interesse público e para garantir a relação entre as operadoras de planos/seguros de saúde, prestadores de serviços medico/hospitalares e consumidores em geral. 3. REGULAÇÃO ECONÔMICA DE PLANOS/SEGUROS DE SAÚDE NO BRASIL A regulação econômica nasce a partir do surgimento da análise tradicional do bem estar, quando se vislumbrou a possibilidade de intervenção do Estado na economia. De acordo com Possas (1997, p. 4), o objetivo central da regulação econômica não é promover a concorrência como um fim em si mesmo, mas aumentar o nível de eficiência econômica dos mercados correspondentes. Pela tipologia de Possas (Ibidem), Existem dois padrões de regulação que rezam sobre a mesma problemática: a regulação ativa e a regulação reativa. A regulação ativa tem como objetivo a substituição da concorrência por instrumentos e metas administrados publicamente nas atividades econômicas econômicas onde predominem as falhas de mercado (concentração de mercado, externalidades, etc.), justificando a ação reguladora, mantendo monitoramento contínuo de desempenho das empresas, geralmente nos serviços de infraestrutura. A regulação reativa está destinada à prevenção e repressão de condutas anticompetitivas (antitruste) e segue as leis de defesa da concorrência e autoridades antitruste. Nesse tipo de regulação, considera-se adequado tanto estimular a concorrência quanto – mesmo em estruturas oligopolísticas – quanto prevenir prejuízos potenciais a ela. 4. EXPERIÊNCIAS INTERNACIONAIS 4.1 Financiamento Público e Financiamento Privado 4.2 O Sistema de Saúde Canadense 4.2.1Caracterização Geral De acordo com Andrade (2000, p. 8), o Sistema de Saúde Canadense é constituído por dois seguros de saúde, proveniente da parceria entre o governo federal e governo das províncias, sendo que um
  • 8. deles é direcionado para serviços médicos, enquanto que o outro é para serviços médicos e hospitalares que devem ser garantidos em todos os planos ofertados nas províncias. Os princípios gerais que norteiam o Sistema Nacional de Saúde Canadense são os seguintes: 1) Administração Pública: O plano de saúde deve ser administrado por uma autoridade pública sem fins lucrativos. 2) Desenho de benefícios compreensivo: O plano de saúde deve garantir acesso a todos os serviços médicos e hospitalares clinicamente necessários. 3) Universalidade: Todos os indivíduos residentes nas províncias deverão ter acesso aos serviços de saúde disponibilizados pelo plano de saúde. 4) Portabilidade: Todos os residentes que se mudarem de uma província para outra devem continuar a ter cobertura dos serviços de saúde pela província de origem durante um período máximo de 03 (três) meses. 5) Acesso: Os planos devem oferecer as condições necessárias e termos padronizados de acesso aos serviços médicos e hospitalares sem a imposição de barreiras. É proibida a cobrança de tarifas dos usuários. Nenhum indivíduo pode ser discriminado por critérios de status de saúde, renda, etc. No Sistema de Saúde Canadense, todo cidadão canadense tem direito a usufruir dos serviços fornecidos pelos planos públicos de saúde, desde que esteja inscrito nos programas governamentais. Esse sistema é especializado no cuidado primário, composto por 46% de médicos generalistas (ou clínicos gerais). Os médicos generalistas são responsáveis PELO CUIDADO PRIMÁRIO, ALÉM DE ENCAMINAR O PACIENTE PARA O MÉDICO ESPECIALISTA, REALIZAR PRESCRIÇÃO DE MEDICAMENTOS E EXAMES LABORATORIAIS. A ESCOLHA DO MÉDICO É LIVRE POR PARTE DO CONSUMIDOR, ASSIM COMO O MÉDICO TEM PLENA AUTONOMIA PARA DETERMINAR O TIPO DE TRATAMENTO AO QUAL O PACIENTE DEVERÁ SE SUBMETER. A remuneração dos médicos é realizada pelo sistema de reembolso por tarefa, facultando ao médico a possibilidade associado ao plano de saúde público ou não. Caso o médico não deseje se associar ao plano de saúde público, os pagamentos podem ser realizados diretamente pelo usuário, seguindo os preços negociados com o governo federal. Somente existe espaço para o plano de saúde privado no mercado de serviços suplementares como prescrição de medicamentos, serviços odontológicos e oftalmológicos, serviços de transporte (ambulância), serviços de enfermagem qualificada, entre outros. O problema, neste caso específico, é que o Sistema de Saúde Canadense, baseado em reembolso para os médicos por tarefa realizada, não apresenta nenhum incentivo para que o provedor reduza o
  • 9. volume de procedimentos realizados (ANDRADE, 2000, p. 07). 4.3 O Sistema de Saúde Inglês: National Health Service 4.3.1Caracterização Geral Segundo Andrade (2000, p.12), o sistema de saúde inglês foi nacionalizado em 1946, quando o acesso a todos os serviços de saúde foi universalizado, dando origem ao National Health Service (NHS). O financiamento dos serviços de saúde é realizada totalmente através de impostos federais – 82% através de impostos diretos, 13% de impostos sobre folha de pagamentos e 4% de taxas impostas aos usuários, sendo que a participação dos pacientes nos financiamento diretos são insignificantes. Os profissionais de saúde são empregados assalariados do Estado (médicos, enfermeiras e staff dos hospitais). O direito de atendimento por médicos especialistas a pacientes privados é garantido nas instituições do sistema nacional. Os médicos generalistas permaneceram como autônomos, recebendo seus rendimentos através de um sistema misto de captação e reembolso por consulta. O mercado interno passa a ser substituído por um sistema de “atenção integral”, baseado na parceria e impulsionado por desempenho. A transformação no setor de saúde inglês tem um caráter evolutivo, ao invés de se constituir como uma revolução organizacional. Nesse modelo, as necessidades dos pacientes são cruciais para o sistema. A governança clínica faz parte de uma estratégia do sistema de saúde. Ela é caracterizada como um quadro através do qual as organizações prestadoras de serviços de saúde são responsáveis pela melhoria contínua da qualidade dos seus serviços e pela garantia de elevados padrões de cuidados, criando um ambiente que estimule a excelência dos cuidados clínicos. Esse sistema de saúde emprega 1.3 milhão de pessoas, atendendo um universo de 1 milhão de pacientes a cada 36 horas e é considerado a maior estrutura de saúde pública do mundo. Há seis princípios fundamentais que direcionam as mudanças no NHS : • Renovar o SNS como um serviço de saúde verdadeiramente nacional (conjunto de normas nacionais); • Delegar a responsabilidade pelo cumprimento destas novas normas nacionais a um nível local; • Obter o NHS para trabalhar em parceria (por exemplo, estabelecer laços mais fortes com as autoridades locais); • Melhorar a eficiência de modo que todo o dinheiro é gasto para maximizar o atendimento ao paciente; • Deslocar o foco sobre a qualidade dos cuidados para que a excelência é garantida para todos os pacientes; • Tornar SNS mais aberto e responsável para o público. 4.4 O Sistema de Saúde Americano: O Managed Care
  • 10. 4.4.1 Caracterização Geral 5. INSTRUMENTOS REGULATÓRIOS E O BEM-ESTAR DO CONSUMIDOR 6. CONSIDERAÇÕES FINAIS
  • 11. REFERÊNCIAS ANDRADE, M. V. Ensaios em Economia da Saúde. Tese de Doutorado. Escola de Pós-Graduação em Economia. Fundação Getúlio Vargas (EPGE/FGV). ENSAIO 2. Rio de Janeiro, 2000. ANDRADE, M. V e LISBOA, M. de B. A Regulação dos Contratos de Seguro-Saúde no Brasil: Gerando Seleção Adversa. Programa de Seminários Acadêmicos. Universidade de Brasília Instituto de Ciências Humanas. Departamento de Economia. Seminário 05/01. Brasília, 2001. ANDRADE, M. V; MAIA, A. C. e NORONHA, K. V. M. S. Financiamento do Setor de Saúde Suplementar no Brasil: Uma Investigação Empírica a Partir dos Dados da PNAD/98. ARROW, K. J. Uncertainty and the Welfare Economics of Medical Care. The American Economic Review, Volume 53, Issue 5 (Dec., 1963), 941-973. Disponível em: http://sws.bu.edu/ellisrp/EC387/ Papers/1963Arrow_AER.pdf. Acesso em 19 de agosto de 2010. FIANI, R. Teoria da Regulação Econômica: Estado Atual e Perspectivas Futuras. Disponível em http://www.ie.ufrj.br/grc/pdfs/teoria_da_regulacao_economica.pdf . Acesso em 14 de agosto de 2010. LEÃO, C. J. S. Regulação Econômica do Setor Farmacêutico: Podemos Acreditar Nesse Mercado? Instituto de Saúde Coletiva (ISC). Universidade Federal da Bahia (UFBA). Salvador, 2008. NORMAND, C. Ten Popular Health Economic Fallacies. Journal of Public Health Medicine. Volume 20, Nº 2, OXFORD UNIVERSITY PRESS, pp. 129-132. Disponível em: http://jpubhealth.oxfordjournals.org . Acesso em 17 de agosto de 2010. OCKÉ-REIS, C. O. ; ANDREAZZI, M. F. S. de.; SILVEIRA, F. G. O Mercado de Planos de saúde no Brasil: Uma Criação do Estado? Revista de Economia Contemporânea. Rio de Janeiro, 10 (1): 157-185, jan./abr. 2006. OCKÉ-REIS, C. O. CARDOSO. S. De S. Uma Descrição do Comportamento dos Preços dos Planos de Assistência à Saúde – 2001-2005. Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada. POSSAS, M. L. Estruturas de Mercado em Oligopólio. São Paulo: Editora Hucitec, 1985. ROSS, S. The Economic Theory of Agency: the principal's problem. American Economic Review, 20 (2), 22-32, May 1973. SAVEDOF, W. Bulletin of the World Health Organization, February, 2004, 82 (2). SCOBIE, N; AZAM, T. OKUTO, N. Explain Under What Circumstances Suplier-induced Demand Is Most Likely to Occur. Health Economics Essay, Feb 2003. VARIAN, H. Intermediate Microeconomics: A Modern Approach. Third Edition. W.W. Norton & Company, New York, EUA, 2003. UNITED KINGDOM. Health Care Systems in Transition. European Observatory on Health Care Systems. London School of Economics and Political Science, London, 1999. UNITED KINGDOM. The New NHS: Modern, Dependable. Health Department. The Stationery Office. December, 1997.
  • 12. O Sistema de Saúde na Inglaterra. Disponível em http://brasilcomz.wordpress.com/2009/07/27/o- sistema-de-saude-na-inglaterra/. Acesso em 25 de agosto de 2010.