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do professor de educação infantil
entrevista: matéria especial: artigo:
Revista
Maria do Pilar
Lacerda Almeida
e Silva
Programa apóia a construção
de creches e pré-escolas e dá
assessoria a municípios
Pelo direito à educação infantil:
Movimento Interfóruns de
Educação Infantil do Brasil
Educação
da Criança de
0 a 3 anos em
espaço coletivo
Programa apóia a construção
de creches e pré-escolas
2 • revista criança
expediente
Presidência
Ministério da Educação
Secretaria Executiva
Secretaria de Educação Básica
Diretoria de Concepções e Orientações Curri-
culares para a Educação Básica
Coordenação Geral de Educação Infantil
Jornalista Responsável
César Augusto Pinheiro de Oliveira
Editor
Alex Criado
Reportagem
Adriana Maricato e Heloisa d`Arcanchy.
Colaboradores
Adrianne Ogêda Guedes, Ângela Maria F. Rabe-
lo Barreto, Magda P. Muller Lopes, Maria Carmem
Silveira Barbosa, Maria Clotilde Rossetti Ferreira e
Rodrigo Faleiro.
Direção de Arte e Produção
Tech Gráfica
Criação e Projeto Gráfico
Daniel Ribeiro
Diagramação e Editoração
Daniel Ribeiro
Fotografias
André Dusek, Júlio Cesar Paes de Oliveira, Edu-
cadoras do Berçário/Maternal da Creche Carochi-
nha/Coseas/USP
Revisão
Margaret de Palermo Silva
Foto Capa
Educadoras do Berçário/Maternal da Creche Ca-
rochinha/Coseas/USP
Envie cartas para o endereço:
Ministério da Educação/SEB/DCOCEB –
Coordenação Geral de Educação Infantil
Esplanada dos Ministérios, Bloco L – Edifício Sede,
6º andar – Sala 623
70047-900 Brasília – DF. Tel: (61) 21048645
E-mail: revistacrianca@mec.gov.br
Tiragem dessa edição: 268.470 exemplares
Dezembro de 2008
revista criança • 3
5 9 24
4
5
9
28
24
20
27
34
39
41
42
carta ao professor
entrevista
Maria do Pilar Lacerda Almeida e Silva
caleidoscópio
Educação da Criança de 0 a 3 anos em espaço coletivo
professor faz literatura
Afinal, o que é ser professor?
matéria especial
Programa apóia a construção de creches e pré-escolas e dá as-
sessoria a municípios
artigo
Pelo direito à educação infantil: Movimento Interfóruns de
Educação Infantil do Brasil
relato
Professores premiados do Brasil
reportagem
notas
cartas
Bebês vão ao teatro
resenha
arte
A Última Ceia43
sumário
Prezada professora, prezado professor:
ste número da Revista Criança apresenta uma entrevista com a secretária de
educação básica do MEC, professora Maria do Pilar Lacerda Almeida e Silva,
na qual são discutidos os desafios atuais da educação infantil brasileira e as
propostas do governo federal.
A Matéria Especial aborda o Programa Nacional de Reestruturação e Apa-
relhagem da Rede Escolar Pública de Educação Infantil – Proinfância, uma das
ações que compõem o Plano de Desenvolvimento da Educação (PDE). O Proinfância
visa a contribuir com os municípios para garantir o direito das crianças de até 5 anos e
11 meses de idade à educação infantil de qualidade. Em 2008, o Fundo Nacional de De-
senvolvimento da Educação (FNDE) firma acordo com 955 municípios conveniados com
este objetivo.
Dentre os inúmeros desafios da educação infantil no país, destaca-se o atendimento
da faixa etária de 0 a 3 anos. Quais princípios devem orientar a educação de crianças tão
pequenas em espaços coletivos? Qual o papel da professora? Discutir diretrizes políticas,
orientações curriculares, práticas pedagógicas, entre outros, para a criança desta faixa
etária é um caminho na perspectiva de reafirmar o atendimento em creches como parte
da educação básica.
A seção Caleidoscópio apresenta a visão de conhecidos pesquisadores em relação
à educação da criança de 0 a 3 anos, a fim de contribuir com o professor, sobre as pos-
sibilidades de trabalho, a partir das características e especificidades desse período da
infância. A professora Maria Clotilde Rossetti Ferreira destaca a indissociabilidade entre
cuidar e educar na educação da criança pequena. A professora Maria Carmem Silveira
Barbosa incita à construção de projetos educacionais voltados para esta faixa etária. E a
professora Adrianne Ogêda Guedes ressalta a importância da comunicação com bebês
e com crianças pequenas na educação infantil.
A reportagem Bebês vão ao teatro relata o trabalho desenvolvido por uma companhia
de teatro da Espanha, denominada La Casa Incierta, que propõe a aproximação entre a
arte e a primeira infância, por meio da criação de um universo poético conjunto. A experi-
ência teatral evidencia a competência social dos bebês e abre possibilidades de trabalho
com teatro desde os primeiros meses de vida.
O artigo de Ângela Maria F. Rabelo Barreto mostra a importância dos movimentos so-
ciais na luta para garantir educação infantil de qualidade a todas as crianças de até 5 anos
e 11 meses de idade ao descrever o surgimento e atuação do Movimento Interfóruns de
Educação Infantil no Brasil (Mieib).
O relato dos trabalhos vencedores do último Prêmio Professores do Brasil evidencia
a importância de observar e estar conectado com a criança para o sucesso da ação pe-
dagógica na educação infantil. Já a seção Cartas procura esclarecer algumas dúvidas
acerca da Lei 11.274, que amplia o ensino fundamental para nove anos
Envie artigo, pergunta, relato de experiência, criação literária para a Coordenação Ge-
ral de Educação Infantil (Coedi). Não se esqueça de autorizar a publicação na Revista
Criança, caso sua contribuição seja selecionada. Nossa equipe está interessada no diá-
logo com as professoras e os professores.
Desejamos que este número contribua de forma efetiva com sua reflexão sobre o de-
senvolvimento e a educação da criança de até 5 anos e 11 meses de idade.
Boa leitura!
carta ao professor
E
4 • revista criança
revista criança • 5
entrevista
Qual é o quadro atual da
educação básica no Brasil?
Maria do Pilar - O quadro
é positivo, os índices dão si-
nal de melhora. Aumentamos
a inclusão das crianças, pra-
ticamente universalizando o
Maria do Pilar Lacerda Almeida e Silva
As duas demandas
da educação infantil:
quantidade e
qualidade
Adriana Maricato / Brasília/DF
os últimos meses, a educação brasileira ganhou um reno-
vado alento. Programas, projetos e um novo modelo de
financiamento levam o país a encarar outras perspectivas
no que diz respeito à qualidade do ensino público.
Como secretária de educação de Belo
Horizonte e presidente da União Nacional
dos Dirigentes Municipais de Educação
(Undime), Maria do Pilar Lacerda Almeida
e Silva participou de todo o processo de
discussão e aprovação do Fundeb. Ago-
ra, como secretária de educação básica
do Ministério de Educação, sua tarefa
é implantar o novo fundo e levar a cabo
programas que induzam mudanças qua-
litativas, sobretudo na educação infantil,
como o Proinfância.
Nesta entrevista, Maria do Pilar fala so-
bre o significado dessas inovações para a
qualidade da educação em nosso país.
N
6 • revista criança
ensino fundamental. Entretan-
to, ainda hoje, existem cerca
de 650 mil crianças entre 6 e
14 anos fora da escola, o que
para o Brasil como um todo é
muito pouco, mas para cada
uma dessas crianças é muito
grave. Estamos aumentando
o atendimento da educação
infantil e fazendo uma abran-
gente e profunda discussão
sobre o ensino médio.
As perspectivas são boas,
com a aprovação do piso na-
cional salarial para os profes-
sores, o fim da Desvinculação
de Recursos da União (DRU)
para a educação e o Índice de
Desenvolvimento da Educa-
ção Básica (IDEB), mostran-
do que as séries iniciais co-
meçam a reagir. Esperamos
que, nos próximos anos, isso
se reflita nas séries finais e no
ensino médio.
Quais são os principais de-
safios da educação infantil
atualmente?
Maria do Pilar - Preci-
samos aumentar expressi-
vamente o atendimento às
crianças de 0 a 3 anos, pois
somente 15% delas estão em
creches. Nós já dispomos de
um atendimento maior para
as de 4 e 5 anos, mas temos
também de aumentar a cons-
trução de prédios escolares
e discutirmos mais o projeto
pedagógico da pré-escola. O
primeiro ponto para viabilizar
isso é o financiamento para a
educação infantil.
O Fundeb incluiu o finan-
ciamento da educação infan-
til, inclusive o da creche. O
mais importante e inovador
é que está financiando tam-
bém a rede conveniada. O
Proinfância, programa do go-
verno federal, vai investir R$ 1
bilhão entre 2007 e 2008 na
construção de mil escolas de
educação infantil em 950 mu-
nicípios, além do esforço que
os próprios municípios fazem
na construção de creches.
Vamos repetir esse número
entre 2009 e 2010.
Como a senhora avalia as
demandas da educação in-
fantil?
Maria do Pilar - Existem
duas grandes demandas:
quantidade e qualidade. Ain-
da não há prédios suficientes
para atender todas as crian-
ças, que é uma demanda
primária. Depois há necessi-
dade de definir e aprofundar
melhor o nosso projeto peda-
gógico para a infância e pen-
sar em como realizar esse
atendimento, fazer com que
ele seja coerente com as ne-
cessidades das famílias, com
os orçamentos municipais
e que inove ao reconhecer
esse sujeito, que é a criança
de 0 a 5 anos de idade. Ele
demanda projeto pedagógi-
co diferenciado, espaço físi-
co adequado e profissionais
com formação muito especí-
fica. Temos clareza da prio-
ridade e da importância da
educação infantil, mas ain-
da há muito trabalho a ser
entrevista
Precisamos
aumentar
expressivamente
o atendimento
às crianças de
0 a 3 anos, pois
somente 15%
delas estão em
creches.
revista criança • 7
feito, tanto na questão do
financiamento quanto das
concepções.
Quais as perspectivas para
educação infantil com a im-
plantação do Fundeb?
Maria do Pilar - De cres-
cimento! Mas é importante
destacar que o Fundeb remu-
nera apenas a matrícula das
crianças. Para a prefeitura
receber recursos do Fundeb,
ela deve construir as escolas
e matricular as crianças. Por
isso o Proinfância destina re-
cursos para os municípios.
Portanto, a perspectiva é que
haja um crescimento grande
da educação infantil.
O Proinfância revelou enor-
me demanda dos municí-
pios em relação a investi-
mentos do governo federal.
A senhora considera que
a construção já assegura
uma educação infantil de
qualidade?
Maria do Pilar - A cons-
trução da obra é parte do pro-
cesso, mas ela isoladamente
garante pouca coisa além da
vaga. O prédio só vai asse-
gurar uma educação de qua-
lidade se vier acompanhado
de um projeto pedagógico
consistente e um grupo de
profissionais com formação
muito sólida. Eles têm que
saber quem é aquela crian-
ça, a diferença entre ela e a
criança mais velha, a impor-
tância das brincadeiras, da
contação de histórias, das ro-
tinas. Tudo isso é fundamental
para que a construção tenha
sentido. Não é suficiente um
prédio ser bonito, mas vazio
em termos de conteúdo. Deve
ter um objetivo educacional
a partir do entendimento de
quem é essa criança. Por isso
o equipamento da educação
infantil é estratégico. Uma
escola de educação infantil
que seja tratada igual a uma
escola de séries finais do en-
sino fundamental torna-se um
desastre. As cadeiras devem
ser adequadas, as cores di-
ferentes, os brinquedos muito
bem especificados para não
haver peças pequenas, por
exemplo. É uma fase que exi-
ge muito detalhamento, muito
critério e muita clareza da fun-
ção daquele espaço, que não
é um depósito de crianças.
Qual é o papel da educa-
ção infantil na formação do
leitor?
Maria do Pilar - Trata-se
de um equívoco achar que a
educação infantil não pode
trabalhar com leitura, pois
quanto mais cedo histórias
orais e escritas entrarem na
vida das crianças, maiores
as chances de elas gostarem
de ler. Primeiro, as crianças
escutam histórias lidas pelos
adultos, depois conhecem o
livro como um objeto. Mesmo
antes da alfabetização, folhe-
ando e olhando figuras, as
crianças estão lendo, do jeito
delas. Elas também apren-
entrevista
...quanto mais
cedo histórias
orais e escritas
entrarem na vida
das crianças,
maiores as
chances de elas
gostarem de ler.
8 • revista criança
a inovação do Proinfância ao
debater com equipes técni-
cas das secretarias munici-
pais. A contribuição do arqui-
teto, por exemplo, tem a ver
com o projeto pedagógico,
pois disso depende a pró-
pria concepção de sala. As
escolas infantis tendem a ter
salas maiores divididas em
vários ambientes; elas não
trabalham com a concepção
de sala de aula. Na educação
infantil, a sala pode ter qua-
tro cantos: um de brinquedo,
um de descanso, um de ativi-
dades pedagógicas e um de
leitura. Assim, a Secretaria de
Educação Básica tem desen-
volvido programas para que
as escolas tenham acesso a
essas possibilidades.
Quais as perspectivas para
que todos os municípios
brasileiros sejam contem-
plados pelo Proinfância?
Maria do Pilar - À medi-
da que o orçamento do MEC
possibilite, vamos atender
cada vez mais municípios.
Muitos já fazem o atendimen-
to da educação infantil com
recursos próprios. Vamos
priorizar cidades grandes
com orçamento pequeno,
como algumas capitais do
Nordeste, que têm grande
população, onde a demanda
é grande, mas o orçamento
insuficiente. E também, aque-
las cidades que ainda não re-
alizam atendimento.
dem observando o gesto de
leitura dos outros, as chama-
das “práticas de leitura e de
escrita”. Além de ter acesso
aos materiais de leitura, como
livros e revistas, as crianças
devem aprender a usá-los.
Por isso se recomendam as
práticas de roda de leitura,
contação de histórias, leitura
de livros, sistema de malas
de leitura, de cantinhos, brin-
cadeiras com livros. Então,
os professores também pre-
cisam se tornar leitores para
que sintam prazer no convívio
com o material escrito e pas-
sem isso para as crianças.
O MEC tem programas mui-
to importantes, como o livro
didático e bibliotecas nas
escolas. Como a senhora
entende a possibilidade de
um programa específico de
distribuição de brinquedos?
Maria do Pilar - Nós já dis-
pomos de algo semelhante, o
Programa de Equipamentos
para a Educação Infantil, que
inclui distribuição de brinque-
dos e de livros. Nós fizemos
uma cesta de livros para a
educação infantil e também
uma cesta de material espe-
cífico para esta faixa etária. A
escola de educação infantil
não pode ser vista como um
lugar de guardar crianças,
somente do “cuidar” e, nesse
sentido, o MEC tem ampliado
sua forma de trabalhar. Pen-
sar no projeto pedagógico,
no equipamento, na forma-
ção de professores, essa é
entrevista
Os professores
também
precisam se
tornar leitores
para que sintam
prazer no
convívio com o
material escrito e
passem isso para
as crianças.
revista criança • 9
caleidoscópio
estabelecimento educacional que atende crianças de até 3 anos
de idade enfrenta uma complexidade de demandas basicamen-
te vinculadas a três segmentos: as crianças, seus pais ou famí-
lia, professores e funcionários.
Entretanto, a instituição, embora responda à necessidade de
mães e pais trabalhadores urbanos e rurais e se configure como uma
área de trabalho e emprego, tem como objetivo principal assegurar o
direito da criança à educação.
Desta forma, o grande desafio é construir uma prática pedagógica
de qualidade e fundamentada em uma visão ampla de educação que
afirme a infância como um ciclo de vida pleno de possibilidade.
Isto implica em considerar educação e cuidado como indissociáveis e
a criança como ser ativo, competente e produtor de cultura.
Para participar deste Caleidoscópio convidamos Adrianne Ogêda
Guedes, professora do curso de especialização em educação infantil
da PUC-RJ, Maria Clotilde Rossetti Ferreira, professora da USP (Ribeirão
Preto) e Coordenadora de Investigações sobre o desenvolvimento Hu-
mano e Educação Infantil (CINDEDI) e Maria Carmen Silveira Barbosa,
professora da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS).
Educação da Criança
de 0 a 3 anos em
espaço coletivo
O
caleidoscópio
Foto:Arquivo/divulgação
caleidoscópio
10 • revista criança
caleidoscópio
estos, olhares, balbu-
cios, contato, imitação.
A comunicação com
bebês e crianças pequenas
nos convida a observar com
atenção as diferentes formas
de expressão que têm curso
nesse especial momento, os
primeiros anos da vida huma-
na. Dialogar com os bebês
requer interagir com suas
manifestações e com eles
construir sentidos, apoiando
a estruturação da linguagem
infantil e de suas formas de
comunicação com o mundo.
Portanto, conhecer os signifi-
cados das ações e interações
infantis é fundamental para
nossa atuação nas creches e
pré-escolas. Só assim é pos-
sível apoiar de fato a criança
quando necessário, incenti-
vando-a em suas conquistas
e aquisições.
Desde muito pequenas,
as crianças já possuem mo-
dos de se aproximarem umas
das outras, que variam indivi-
dualmente e de grupo para
grupo. Podemos ver crian-
ças bem pequenas, com até
1 ano de idade, que mesmo
sem articular a fala encon-
tram formas de estabelecer
parcerias pelo movimento,
pelos gestos, pela imitação
etc. Tomemos essas cenas
como exemplos:
No pátio de um espaço de
educação infantil, algumas
crianças com idade de até 2
anos estão juntas. Uma delas
resolve correr de uma ponta a
outra do pátio. Em seguida to-
das as outras correm, em meio
a gostosas gargalhadas.
Na sala de atividades des-
A comunicação com bebês
e com crianças pequenas:
a imitação como forma de
conhecer o mundo
Adrianne Ogêda Guedes
GDoutora em Educação pela Universi-
dade Federal Fluminense (UFF/RJ),
professora do curso de especializa-
ção em educação infantil da PUC-RJ.
Atua também em cursos de forma-
ção continuada promovidos pela
Secretaria Municipal de Educação
do Rio de Janeiro e foi consultora do
Proinfantil.
Foto: Arquivo/divulgação
10 • revista criança
revista criança • 11
caleidoscópio
se mesmo grupo, a profes-
sora traz uma novidade: uma
sacola cheia de bolsinhas e
bonés. Assim que apresenta o
material para as crianças, elas
se põem a manipulá-los. Uma
das crianças pega uma bolsa,
põe um boné e acena, como
que se despedindo. Na mes-
ma hora a professora pergun-
ta: “Aonde você vai?”. A crian-
ça sorri e responde: “Paia”
(praia). A partir daí, o grupo se
contagia com o movimento do
amigo e o professor vai insti-
gando a brincadeira: “Vocês
vão de carro? Quem vai diri-
gir? Não corre muito viu? Vão
tomar sorvete na praia? Etc”.
Os comentários da professora
vão provocando novas ações,
e em pouco tempo todos es-
tão dando tchau, agrupando-
se como se estivessem em
um carro. Nasceu uma nova
brincadeira!
Todos os dias, em um gru-
po com idade de até 1 ano,
as crianças se reúnem numa
sala para brincar. A porta da
sala só é fechada na parte in-
ferior. Sendo assim, todos os
que chegam por lá, seja para
dar um recado, seja para visi-
tar, são vistos pelas crianças.
Esse grupo já conhece bem
os espaços da creche e em
muitos momentos passeia
por eles. Um dos meninos do
grupo, bastante ativo e de-
senvolto em sua caminhada,
olha para os visitantes que
passam por ali e levanta os
braços em direção a eles.
Ele quer passear! Para en-
tendermos o significado do
movimento de braços deste
menino, é preciso levar em
conta outras informações
que possuímos sobre ele e
o grupo. Caso contrário, po-
deríamos atribuir outros sen-
tidos ao seu movimento (ele
poderia estar querendo colo,
ou mostrando algo em suas
mãos, ou pedindo para ir ao
banheiro).
Quem já não viu cenas
como essas? Tais exemplos
nos mostram que, a partir
do movimento vivido coleti-
vamente, o grupo criou um
modo próprio de relação, uma
brincadeira cujo disparador foi
o corpo e o movimento na ob-
servação do outro (e também
o objeto, no caso do passeio).
Mesmo bem pequenas, as
crianças se afetam umas as
outras e criam formas próprias
de brincarem juntas.
O aprendizado pela
imitação
Relacionar-se com o outro
se dá de muitas e diversas
formas. Uma criança que co-
meçou a freqüentar a creche
pode passar alguns dias ou
meses mais observadora.
Aparentemente poderíamos
dizer que ela não está se re-
lacionando, pois não faz ne-
nhum movimento em direção a
outras crianças. No entanto, se
observarmos o interesse com
que ela acompanha as ações
do grupo, os movimentos e
brincadeiras que passa a fazer
a partir dessa observação, po-
deremos perceber claramente
o quanto a presença do outro
influencia suas ações.
As experiências partilha-
das entre as crianças vão
constituindo a história, a cul-
tura do grupo. Essas experi-
ências permitem que as crian-
ças estabeleçam relações de
confiança, de intimidade, de
pertencimento. Nesse senti-
do a imitação tem papel im-
portante, o de integrar, criar
identificações, significados
partilhados coletivamente.
A imitação faz parte do de-
senvolvimento cognitivo e cul-
tural da criança. É pela imita-
ção que ela vai experimentar
comportamentos e ações
que talvez ainda não fizes-
se por conta própria. Nesse
sentido ela se coloca em si-
tuação de aprendizagem, de
ampliação de seus recursos
de ação. Impulsionada pelos
modelos que a cercam, vai
criando e incorporando no-
vas formas de ação.
As trocas com
o adulto
Com Vigotski (1987), com-
preendemos que a criança,
quando imita, apreende a
atividade do outro e realiza
aprendizagem. Não se trata
de mera cópia, uma vez que
para imitar alguém ela preci-
sa compreender o comporta-
mento do outro, envolver-se
intelectualmente na atividade,
o que implica representá-lo e
avaliar a adequação de sua
imitação. É também desse
autor o conceito de Zona de
Desenvolvimento Proximal,
que se refere à diferença en-
tre o desenvolvimento atual
12 • revista criança
da criança e aquilo que ela
consegue fazer com o auxílio
de outras pessoas. A presen-
ça e ajuda do outro permite
que a criança faça mais do
que conseguiria fazer sozi-
nha, atingindo novos níveis
de desenvolvimento. Aqui-
lo que a criança realiza hoje
com ajuda poderá amanhã
realizar sozinha.
Podemos assim, colocar
em destaque a importância
das interações das crianças
entre si e com os adultos no
cotidiano da educação infantil.
Partimos do princípio de que
o desenvolvimento humano
se dá por meio das interações
estabelecidas com outros se-
res humanos, em ambientes
físicos e sociais culturalmen-
te estruturados. Portanto, são
essas trocas que se consti-
tuem nas oportunidades de
crescimento e construção de
conhecimentos.
A linguagem
do choro
É nos primeiros anos de
vida que muitas crianças
freqüentam as creches e
pré-escolas. Nesse período
nossa dependência do outro
constitui uma peculiaridade
especial do desenvolvimen-
to (Wallon, 2007). Ela vai se
transformando gradualmen-
te, à medida que a criança
vai conquistando novas for-
mas de ação.
Desde bebês possuímos
certa organização comporta-
mental e algumas condições
para perceber e reagir às si-
tuações exteriores, principal-
mente aos parceiros diversos
que formam nosso meio hu-
mano. É na relação com os
outros que vamos compreen-
dendo o mundo, dando signi-
ficado para as ações, domi-
nando formas de agir, pensar
e sentir presentes em nosso
meio cultural, desenvolvendo
a capacidade de expressão e
de linguagem.
Tomemos como exemplo
o comportamento do bebê
em seus primeiros meses de
vida. Inicialmente ele chora
em reação a diferentes incô-
modos e ajustes orgânicos:
cólicas, sono, fome, neces-
sidades de higiene etc. Os
adultos responsáveis pelos
cuidados com o bebê reagem
ao choro e tomam atitudes
para ampará-lo, oferecendo-
lhe alimento, colo, trocando
suas fraldas etc.
Pouco a pouco, o bebê
percebe que sempre que
chora obtém a atenção de
seus objetos de afeição. Co-
meça então a chorar não mais
como ação reflexa: agora seu
choro se torna intencional, isto
é, ele chora para obter a aten-
ção desejada e a resolução
de seus desconfortos. Depois
de algum tempo, podemos
até diferenciar quando o cho-
ro indica fome, ou sono, ou
apenas necessidade de proxi-
midade física. Não apenas o
bebê vai controlando seu cho-
ro (mais intenso, mais alto),
como também os adultos que
se relacionam com ele vão
aprendendo, na interação, a
diferenciar suas formas de
expressão e construindo jun-
to com ele novos e diferentes
significados, tanto para o cho-
ro quanto para os demais ges-
tos expressivos que a criança
vai desenvolvendo.
caleidoscópio
Foto:Arquivo/divulgação
revista criança • 13
O espaço de
educação infantil
Vale destacar que a forma
como o adulto vai compre-
ender esse choro será fun-
damental para que a criança
vá também atribuindo sentido
os diferentes desafios que a
convivência põe em cena.
Vimos então que a imita-
ção é uma forma de conhe-
cer o outro, de compreender
formas de se relacionar e
expressar a partir da vivên-
cia com os parceiros, sejam
crianças ou adultos. Será a
partir da interação que as
crianças descobrirão formas
socialmente construídas de
estar juntas, comunicar-se,
elaborarem regras coletivas.
É o encontro com o outro
que dispara nosso desen-
volvimento.
Referências:
GUEDES, Adrianne Ogêda. A
comunicação com bebês e com
crianças pequenas (Unid. 5 – OTP
mód II). Programa de Formação
Inicial do Professor da Educação
Infantil em Exercício – PROINFAN-
TIL. Brasília: MEC/DPEIEF, 2004.
_____________. O corpo nosso de
cada dia. Programa Salto para o
futuro. TVE: abril de 2008. (dispo-
nível no site do programa).
OLIVEIRA, Marta Kohl. Vygotski -
Aprendizado e desenvolvimento.
Um processo sócio-histórico. São
Paulo: Scipione, 1993.
VYGOTSKI, L. S.. Pensamento e
linguagem. São Paulo: Martins
Fontes, 1987.
____________. A construção do
pensamento e da linguagem. São
Paulo: Martins Fontes, 2001.
WALLON, Henri. A evolução psi-
cológica da criança. São Paulo:
Martins Fontes, 2007
às suas sensações. Para ela,
embora reconheça o descon-
forto físico, a discriminação
entre o que exatamente “está
lhe incomodando” não é cla-
ra. Se por acaso o adulto rea-
ge ao choro do bebê, achan-
do que sempre que ele chora
é porque está com fome e
o alimenta, é provável que
o bebê comece a associar
suas sensações desconfortá-
veis àquela forma de conforto
apresentada pelo adulto (ao
alimento, nesse caso).
Por isso é importante inves-
tigarmos as expressões infan-
tis, tentando compreender os
diferentes significados que se
expressam em seus compor-
tamentos. Será por meio de
nossa ajuda que, desde muito
cedo, o bebê irá compreender
e dar sentido ao que sente e
vive. Podemos mesmo dizer
que nascemos disponíveis
para o contato com o outro e
dependemos dele para nosso
desenvolvimento.
O aprendizado da convi-
vência é potencializado nos
espaços de educação infan-
til. É nesses locais que pri-
vilegiadamente poderemos
aprender a negociar com o
outro, reconhecer os dife-
rentes pontos de vista, lidar
com conflitos de interesse,
promover situações coope-
rativas, internalizar regras,
trocar afeto etc. No ambien-
te das creches e pré-escolas
as crianças poderão ter múl-
tiplas oportunidades de se
relacionarem, desenvolvendo
formas de comunicação va-
riadas. E também de vivenciar
caleidoscópio
14 • revista criança
caleidoscópio
inserção das crianças
de 0 a 3 anos de idade
no sistema de ensino
impõe-nos um grande de-
safio. Como garantir tanto o
cuidado quanto a educação
nessa faixa etária? Embora a
relação entre cuidar e educar
seja necessária e indissociá-
vel em todo e qualquer pro-
cesso educativo, na educa-
ção da criança pequena ela
se torna imprescindível.
Para sobreviver, o filhote
humano necessita mais de
cuidados de um adulto do
que qualquer outro animal.
Ao nascer, ele enfrenta uma
imaturidade motora muito
grande, que o faz depender
por longos anos dos outros
que dele cuidam. Mas essa
longa dependência também
torna o ser humano capaz de
aprender com os outros e de
se adaptar aos mais variados
ambientes e situações.
Inicialmente se achava que,
ao nascer, o bebê era imatu-
ro e dependente em todos
os sentidos. Nas últimas dé-
cadas, foram desenvolvidos
vários estudos que mostra-
A educação coletiva
do pequeno cidadão
de 0 a 3 anos*
Maria Clotilde Rossetti Ferreira ram que o bebê humano tem
uma série de competências
auditivas, visuais e olfativas.
Ele também possui maior ex-
pressividade do que qualquer
outro animal; não apenas ex-
pressividade facial, mas tam-
bém vocalizações, gestos e
posturas que favorecem muito
sua interação e comunicação
com outras pessoas.
Na realidade, o bebê apre-
senta essa interessante con-
tradição: grande imaturidade
motora, mas competência
social única. Essa capacida-
de é que vai lhe possibilitar
interagir com outras pessoas,
que irão introduzi-lo na cultura
e interpretarão o mundo para
ele e ele para o mundo. Nas
condições materiais e sociais
em que os adultos vivem e de
acordo com sua cultura, seus
costumes e crenças, eles or-
ganizam o ambiente, permi-
tindo às crianças pequenas
agir nele e sobre ele. Possi-
bilitam, assim, que as coisas
desse mundo façam sentido
para a criança.
Essa realidade humana
bastante complexa encon-
*
Este artigo constitui versão modificada de outro publicado anteriormente na revista Pátio Educação Infantil,
Ano I, nº 1 (abril/julho 2003), pág. 10:12, ArtMed Editora, Porto Alegre/RS, com o título: A necessária asso-
ciação entre EDUCAR e CUIDAR. (Cindedi). A autora agradece auxílios da Fapesp e CNPq a suas pesquisas.
ADoutora em Psicologia pela Univer-
sity of London e professora da USP
(Ribeirão Preto), onde coordena o
Centro de Investigações sobre o
Desenvolvimento Humano e
Educação Infantil
revista criança • 15
caleidoscópio
lie Chaplin no filme Tempos
Modernos. Duas educadoras
compunham a situação, com
um grupo de 15 crianças de 2
a 3 anos. O ritmo de umas e de
outras era bem diferenciado.
Enquanto as educadoras,
automática e rapidamente,
desempenhavam as tarefas
de despir, lavar, secar e ves-
tir uma criança após a outra,
as crianças eram submetidas
a um contínuo e longo tempo
de espera. De início, permane-
ciam em pinicos, encostadas
à parede. Quando chegava
sua vez, eram pegas, esfrega-
das, enxaguadas e deixadas,
ainda pingando, no estrado
para esperar o momento de
serem vestidas e penteadas
pela outra educadora.
Terminado esse procedi-
mento, ficavam à espera da
rotina seguinte, sendo re-
preendidas se não ficassem
quietas e silenciosas. Pouca
ou nenhuma oportunidade
tra-se bem retratada em uma
expressão no ditado do povo
Xhosa, de Nelson Mandela:
Pessoas são pessoas através
de outras pessoas. Tal dita-
do contrapõe-se fortemente
à dissociação entre cuidar e
educar, tão freqüente em es-
colas, pré-escolas e creches.
Esquecemos que, ao cui-
dar ou descuidar da criança,
estamos colocando-a em
certa posição, dando-lhe cer-
tos sentidos, os quais contri-
buem para constituí-la como
pessoa. Certas experiências
observadas em algumas cre-
ches e pré-escolas podem
ajudar a evidenciar isso. As
situações de higiene são as
mais típicas.
O banho passivo
A rotina de banho observa-
da em uma creche lembrava
as linhas de montagem das
fábricas, ironizadas por Char-
lhes era propiciada para exer-
cer alguma autonomia na situ-
ação, curtir o prazer da água
no corpo, aprender, interagir e
brincar umas com as outras.
A organização dessa rotina
de cuidados estava claramen-
te prepando as crianças para
serem submissas e passivas,
sem iniciativa e autonomia.
A mesma situação do banho
pode ser trabalhada de for-
ma completamente diversa.
O ambiente e a rotina podem
ser organizados de maneira
a oferecer ocasião para as
crianças desenvolverem com
autonomia uma série de ha-
bilidades, como despir, lavar,
secar, vestir e calçar a si pró-
prias e às outros. Podem ter
oportunidade de experimen-
tar a temperatura e outras
qualidades da água, a textu-
ra do sabão e das esponjas.
Podem ensinar a cuidar dos
outros, ou serem cuidadas
por eles. Com isso, estare-
mos exercendo um cuida-
do/educação que as coloca
em uma posição mais ativa,
de alguém competente para
interagir, aprender e exercer
uma série de funções.
Discriminação cruel
A injusta estrutura social
brasileira se espelha sobre-
maneira nas instituições edu-
cacionais, onde as atividades
de cuidado são com freqüên-
cia empurradas para os de
menor salário e status. Isso
ocorre porque a essas ativi-
dades é atribuído um menor
valor simbólico que àquelas
Foto:carochinha/Coseas/USP
16 • revista criança
caleidoscópio
denominadas educativas.
Nas creches, nota-se fre-
qüente discriminação entre
“as professoras”, entendidas
como responsáveis pela par-
te mais nobre da educação,
e “as auxiliares, atendentes,
serventes ou pajens”, res-
ponsáveis pela parte menos
nobre, de cuidado das crian-
ças e do ambiente. Suposta-
mente, as primeiras formam a
cabeça da criança, responsa-
bilizando-se pelas atividades
ditas de aprendizagem cog-
nitiva, definidas no currículo
escolar. Já as outras cuidam
das atividades de alimenta-
ção, higiene, limpeza, des-
canso e recreação, as quais,
supostamente, requerem me-
nor qualificação. Como a dis-
criminação é grande, quem
educa não se propõe a cuidar
e quem cuida não se consi-
dera apto para educar, como
se essa cisão fosse possível.
Em estudo sobre a inclu-
são/exclusão de crianças
com paralisia cerebral na pré-
escola (Yazzle, Amorim & Ros-
setti-Ferreira, 2004), pudemos
observar os efeitos perversos
dessa dissociação. A pessoa
portadora de necessidades
especiais usualmente requer
maior cuidado, seja no que se
refere a apoio ambiental (ram-
pas, cadeiras adequadas etc),
seja no sentido de um auxílio
mais direto e efetivo em ativi-
dades nas quais não tem au-
tonomia, como ir ao banheiro,
por exemplo. As professoras
da pré-escola mostraram-
se despreparadas e atônitas
diante dessa situação. Para
elas, esse tipo de função não
lhes cabia, e sim às serventes,
que não estavam disponíveis
em vários momentos.
Na realidade, nossa inves-
tigação pôs em evidência o
fato de que todas as crian-
ças precisam, em vários mo-
mentos, de algum cuidado
especial, adequado a suas
necessidades individuais.
As professoras, porém, não
estão preparadas para isso,
pois acham que sua função
é apenas ensinar saberes es-
pecificados em um currículo
escolar predefinido. Quando
obrigadas a exercer ativida-
des de cuidado, geralmente o
fazem à revelia das crianças.
O ritual da
alimentação
Porém, tanto o processo
de cuidado quanto o de ensi-
no-aprendizagem tornam-se
muito mais efetivos e praze-
rosos quando há real sintonia
entre quem cuida e quem é
cuidado, entre quem ensina e
quem aprende. Um processo
no qual a educadora é capaz
de perceber o momento da
criança, de proporcionar con-
dições que a acolham e moti-
vem, envolvendo-a e compar-
tilhando com ela atividades
variadas, as quais podem ter
partido da iniciativa seja da
criança, seja do adulto.
Ao colocar a criança em
uma posição mais ativa, de
parceria e co-autoria do que
ocorre e de seu próprio pro-
cesso de cuidado e aprendi-
zagem, a professora estará
lhe dando oportunidade de
construir uma identidade po-
sitiva a respeito de si mesma,
de pessoa capaz de se cui-
dar e ser cuidada, de interagir
com outros e dominar diferen-
tes habilidades e conteúdos.
A identidade da criança
também está sendo formada
durante atividades de vida
diária, como a alimentação,
por exemplo. Muito da cultura
e dos saberes de um povo é
transmitido nessa prática so-
cial. Que o digam os italianos,
árabes, franceses e os brasi-
leiros do Norte ao Sul! O pre-
paro da comida e o momento
da refeição constituem ocasi-
ões extremamente ricas para
a aprendizagem e desenvol-
vimento de hábitos e costu-
mes individuais e culturais.
No entanto, essa situação é
freqüentemente tratada na
instituição como uma rotina
cansativa, da qual os adultos
desejam desvencilhar-se o
mais rapidamente possível.
As atividades de cuidado/
educação de crianças cujos
direitos são reconhecidos e
respeitados pela instituição e
por seus educadores devem
envolver o cultivo da identida-
de familiar, de gênero e raça.
Para isto, podem ser progra-
madassituaçõesnascrianças
possam explorar sua história
individual e familiar, descobrir
e ser acolhidas em sua indi-
vidualidade, aprendendo a
reconhecer e respeitar as di-
ferenças próprias e alheias.
Propiciar oportunidades
para as crianças aprende-
rem a gostar de si próprias,
revista criança • 17
caleidoscópio
desenvolvendo um autocon-
ceito positivo e aprendendo
a reconhecer e respeitar as
características pessoais de
cada um constitui tarefa edu-
cativa das mais importantes,
tanto na infância quanto na
adolescência.
Educar e cuidar:
inseparáveis
A indissociabilidade en-
tre cuidado e educação pre-
cisa permear todo projeto
pedagógico de uma creche
ou pré-escola. Trata-se, de
certa forma, de uma filosofia
de atuação que prevalece,
ou não, em todo o planeja-
mento. As famílias não pro-
curam a instituição apenas
para que proporcione a seus
filhos os aprendizados defini-
dos no currículo escolar. Elas
buscam compartilhar com
os educadores o cuidado e
a educação de seus filhos.
Esperam que suas crianças
sejam acolhidas em sua indi-
vidualidade, o que comporta
necessidades variadas.
Para finalizar, gostaria de
propor uma reflexão interes-
sante. Na época atual, em
que a maior ou menor oportu-
nidade de acesso ao conhe-
cimento define muitas vezes
o futuro de uma pessoa, as
atividades de cuidado as-
sumem cada vez mais uma
posição de destaque. As
máquinas e os robôs estão
substituindo o ser humano
em várias tarefas, mas não
nas de cuidado!
O setor de empregos que
mais cresce é o de serviços.
E a competência neles exigi-
da envolve também delicade-
za e cuidado no trato. Outros
segmentos que apresentam
acentuado crescimento di-
zem respeito diretamente ao
cuidado das pessoas e do
ambiente ecológico. Cabe
então a pergunta: será que
estaremos preparando um
futuro melhor para nossas
crianças, se deixarmos de
fora o cuidado das tarefas
educativas em nossas cre-
ches e pré-escolas?
Foto: Carochinha/Coseas/USP
Referências:
YAZZLE, C.H.D.; AMORIM,
K.S.; ROSSETTI-FERREIRA,
M. C. A rede de significações
na investigação do processo
de inclusão de crianças por-
tadoras de paralisia cerebral
em pré-escolas. In: Maria Clo-
tilde Rossetti-Ferreira; Kátia
de Souza Amorim; Ana Paula
Soares da Silva; Ana Maria
de Almeida Carvalho (Orgs.).
Rede de significações e o es-
tudo do desenvolvimento hu-
mano, Porto Alegre: Artmed
Editora, 2004, p. 189-206.
caleidoscópio
m dos grandes desafios para o campo da educação
infantil, neste início de século XXI, tem sido o de cons-
truir propostas pedagógicas para atender os bebês e as
crianças pequeninhas em instituições educacionais.
Educadores, professores, pais, crianças, gestores e
políticos necessitam participar da formulação de proje-
tos político-pedagógicos que ultrapassem a assistência
às necessidades biológicas e o adestramento das crian-
ças em hábitos e costumes. É preciso construir projetos
educacionais que possibilitem às crianças ampliar suas
potencialidades e suas capacidades, desenvolvendo
suas singularidades e constituindo-se pela participação
na vida coletiva.
Para educar crianças, necessitamos objetivos claros e
precisos que direcionem para a construção de seres hu-
manos capazes de viver na sociedade contemporânea.
Segundo Odena (1999), o objetivo geral para a escola de
0 a 3 anos deve ser o de “formar pessoas para a auto-
nomia pessoal e a solidariedade, capazes de experimen-
tar, expressar-se, comunicar-se, sentir segurança, amar,
ser feliz, ter autodomínio e compreender seu contexto”.
Para as crianças, ir para a escola de educação infantil é
uma oportunidade de viver com um grupo ampliado de
pessoas – adultos e crianças – num contexto pensado
especialmente para a sua educação.
A creche se caracteriza por ser um ambiente social de
aceitação, de confiança, de contato corporal, brincadei-
ras, conversas. Isto é, um lugar rico em possibili-
dades para adquirir novas e posi-
tivas experiências e linguagens:
corporais, cognitivas, afetivas
e emocionais. Talvez a carac-
terística mais importante da
creche seja o convívio, a cons-
trução de relacionamentos. Enfim,
Pensar a educação das crianças
de 0 a 3 anos em ambientes de
educação coletiva
Maria Carmem Silveira Barbosa
UDoutora em Ciências Sociais aplica-
da à Educação pela Universidade de
Campinas (Unicamp) e professora da
Universidade Federal do Rio Grande
do Sul (UFRGS)
18 • revista criança
revista criança • 19
caleidoscópio
adequadas? Existem discipli-
nas curriculares específicas?
Necessitamos acolher os
bebês e oferecer a eles tan-
to as tradições culturais do
seu grupo de pertença, como
abrir seus olhinhos para a
novidade do mundo, enrique-
cendo a vida cotidiana, dan-
do atenção aos detalhes, aos
sentimentos, sensações, ale-
grias que muitas vezes nos
passam despercebidos.
Na creche se educa não
apenas pelo que se fala, mas
por toda uma postura corpo-
ral, cultural, relacional, de va-
lores. Viver com intensidade
as experiências que se consti-
tuem diariamente nas escolas
infantis e estar atento ao que
acontece, realizando interven-
ções adequadas é base da
pedagogia com as crianças
bem pequeninas. É preciso
educar os sentidos, os movi-
mentos, as linguagens, o pen-
samento, a autonomia pesso-
al e a sociabilidade.
A escola não apenas sig-
nifica um espaço educador
para meninos e meninas,
mas representa uma institui-
ção com múltiplos participan-
tes, como os pais e a equipe
de trabalho. É um local onde
todos se educam de modo
colaborativo.
Por isso, para organizar
uma proposta pedagógica
para a educação infantil, é
preciso conhecer as caracte-
rísticas gerais do meio social
e cultural em que a escola se
situa e interagir com os pais.
É necessário saber que fins
perseguimos, como quere-
mos que nossas crianças se
desenvolvam, como quere-
mos que seja nossa escola
e qual seu papel na comuni-
dade. E assim, formular uma
identidade para a escola.
Referências:
ODENA, Pepa. Infancia y
escuela de 0 a 3 años. Barce-
lona: Associacion de Maes-
tros Rosa Sensat/MEC, 1995.
TONUCCI, Francesco.
Com olhos de criança. Porto
Alegre: Artes medicas, 1999.
a participação em um grupo
social e a busca de sentido
de pertencimento a um comu-
nidade. Afinal, nós humanos
somos seres sociais.
Na escola infantil as crian-
ças aprendem as combina-
ções para o convívio social,
aprendem a integrar-se com
outras crianças, a trabalhar
em grupos, a dividir os brin-
quedos e também a atenção
da professora, a cuidar das
suas coisas (organizar, em-
prestar e guardar) e das dos
demais. Também ali desen-
volvem o senso de respeito
público e de coletividade.
Como afirma Tonnucci (1999),
nos constituímos a partir das
“pequenas atividades cotidia-
nas”, pois estas, ao tornarem-
se hábitos, fundamentam a
autonomia das crianças.
Assim, trabalhar com be-
bês (0 a 3 anos) não é fazer
uma creche ou jardim de in-
fância simplificado, adaptado
e, muitas vezes, de baixa qua-
lidade. Ao contrário, trabalhar
com bebês vai exigir a cons-
trução de novas respostas,
de outras formas de exercitar
e pensar a pedagogia.
Educar bebês em espa-
ços de educação coletiva é
pensar em um desafio à edu-
cação escolar como ela tem
sido realizada até hoje. Os be-
bês causam-nos indagações,
como: o que deve constar em
um currículo para crianças de
1 e 2 anos? Qual o papel da
avaliação pedagógica numa
turma de 3 anos? Quais as
metodologias de trabalho
20 • revista criança
matéria de capa
educação de crianças pequenas em instituições de edu-
cação infantil é reconhecida como um investimento ne-
cessário para o seu desenvolvimento integral desde os
primeiros meses. Não há o que discutir, todos têm direito
à educação de qualidade. O acesso à creche e à pré-escola é
um direito constitucional de toda criança.
Entretanto, não é bem isso o que acontece. No Brasil, 67%
das crianças de 4 até 5 anos estão matriculadas em institui-
ções de educação infantil e na faixa etária de 0 até 3 anos o
atendimento é de apenas 15%. Estes dados comprovam que
a meta do Plano Nacional de Educação (PNE) de ampliar o
atendimento das crianças de 0 a 3 anos para 50% e das crian-
ças de 4 a 5 anos e 11 meses para 80%, até 2011, está muito
longe de ser alcançada. Portanto, um dos desafios da polí-
Programa apóia a construção
de creches e pré-escolas e dá
assessoria a municípios
A
Proinfância
matéria especial
revista criança • 21
matéria especial
tica educacional é ampliar a
oferta da educação infantil
pública para receber todas
as crianças que demandam
atendimento.
Este atendimento deve
ser oferecido em ambientes
adequados, preferencialmen-
te planejados para este fim,
Foto:ArquivoFNDE
Foto:ArquivoFNDE
Foto:ArquivoFNDE
pois o espaço físico é um dos
componentes educativos, e
este ambiente deve incenti-
var o desenvolvimento inte-
gral das crianças. Tendo em
vista que muitos municípios
brasileiros apresentam ne-
cessidades técnicas e finan-
ceiras para ampliar a oferta e
atender com qualidade esta
primeira etapa da educação
básica, o governo federal
criou o Programa Nacional
de Reestruturação e Apa-
relhagem da Rede Escolar
Pública de Educação Infantil
(Proinfância), com o objetivo
de possibilitar a construção,
a reestruturação e a aquisição
de equipamentos para a rede
física da educação infantil.
O programa, criado em
2007, é uma das ações do
Plano de Desenvolvimento da
Educação (PDE), que busca
garantir o direito das crianças
de até 5 anos e 11 meses à
educação infantil de qualida-
de na rede pública de ensino.
A elaboração do projeto
arquitetônico do Proinfância
considerouasorientaçõesdos
Parâmetros Básicos de Infra-
estrutura para Instituições de
Educação Infantil (MEC/SEB/
COEDI, 2006) e a legislação
correlata, garantindo a aces-
sibilidade, a segurança, a hi-
giene, além de espaços para
brincar e interagir com adultos
e outras crianças.
22 • revista criança
O Proinfância irá atender
municípios avaliados por um
conjunto de indicadores sociais,
demográficos populacionais e
educacionais com maior núme-
ro de crianças com idade até 5
matéria especial
Construção
adequada
O prédio financiado pelo
Proinfância poderá atender,
em período integral, até 112
crianças e contará com os se-
guintes ambientes:
Área de Serviços:
Lavanderia
Rouparia
Serviços gerais (área descoberta/
GLP/Lixo)
Depósito de material de limpeza
Sanitários/vestiário para
funcionários
Circulação
Área administrativa:
Recepção
Secretaria
Almoxarifado	
Sala de professores/reunião
Sala da diretoria/coordenação
Sanitários
Área de circulação
Área de Alimentação:
Refeitório
Cozinha
Preparo
Cocção
Distribuição
Lactário
Lavagem de utensílios
Lavagem de panelas
Recepção e Estocagem
Alimentos não perecíveis (despensa)
Alimentos perecíveis
(freezer/geladeira)
Área Pedagógica:
Creche I – 0 a 11 meses
Acesso/escaninhos
Sala de atividades
Sala de repouso
Brinquedos/alimentação
Banho/fraldário
Solário/varanda
Creche II - 1 ano a 2 anos
Acesso/escaninhos
Sala de atividades
Sala de repouso
Banho/banheiro
Solário/varanda
Creche III – 2 anos a 3 anos
Acesso/escaninhos
Sala de atividades
Sala de repouso
Solário/varanda
Pré-Escola - 4 anos a 5 anos
Sala de atividades
Solário/varanda
Sala Multiuso (TV, DVD, biblioteca)
Informática
revista criança • 23
Para iniciar o trabalho de
assessoramento técnico-peda-
gógico, os municípios contem-
plados com o programa foram
divididos em pólos. Nos meses
de abril e maio, foram realiza-
das reuniões em cada pólo
com representantes da área
pedagógica das secretarias
municipais de Educação bem
como representantes do setor
de obras destes municípios.
Além dos dirigentes e téc-
nicos municipais, participaram
destes encontros representan-
tes de conselhos municipais e
estaduais de Educação, fóruns
de educação infantil, universi-
dades, da União Nacional dos
Dirigentes Municipais de Edu-
cação (Undime) e outros parcei-
ros.Comisso,foiarticuladauma
rede de colaboração à política
de educação infantil, de modo
que os municípios e entidades
possam se apoiar mutuamente
na elaboração e implantação
das ações necessárias.
Nas reuniões, surgiram as
mais diversas demandas, a
partir das quais o Ministério da
Educação, por meio da Coor-
denação-Geral de Educação
Infantil (Coedi), irá definir uma
agenda de assessoramento
técnico aos municípios con-
templados com o Programa.
Ou seja, ao mesmo tempo em
que as obras serão realizadas,
os dirigentes municipais de
educação receberão assistên-
cia técnica pedagógica sobre
autorização de funcionamento,
critério de matrícula, quadro de
recursos humanos, rotinas de
atendimento, projeto arquitetô-
nico e relação com as famílias.
Para as professoras Sílvia
Degaraes e Adriana Librelot-
to, da Secretaria de Educação
de Campo Verde (MT), essas
reuniões promoveram o forta-
lecimento dos municípios, pois
trouxeram subsídios para a
construção de uma política de
educação infantil.
O Proinfância, portanto, não
se restringe à construção de
novas instalações, mas é um
programa de apoio e fortaleci-
mento à política de educação
infantil. Para a coordenadora-
geral de educação infantil da
Secretaria de Educação Bá-
sica do MEC, Rita Coelho, os
encontros foram importantes
para orientar os representan-
tes municipais de que a cons-
trução que estamos realizando
precisa estar a serviço de uma
proposta pedagógica consis-
tente, a fim de assegurar edu-
cação infantil de qualidade.
Para Cássia Vilanova, as-
sessora da Secretaria de
Educação de Itabuna (BA), o
ProInfância contribui para que
os municípios ofereçam edu-
cação de qualidade. Segun-
do a professora, “a educação
das nossas crianças também
passa pelo ambiente onde
elas participam e interagem. E
interagir em um ambiente pen-
sado, construído e organizado
para a infância, juntamente
com profissionais comprome-
tidos com a qualidade social
da educação, é um direito de
nossas crianças”.
anos e 11 meses, com índice de
vulnerabilidadesocialmaisaltoe
que disponham de educadores
com formação adequada para
atuar na educação infantil.
No dia 19 de maio de 2008,
para marcar o primeiro ano do
PDE, houve em Brasília um en-
contro com prefeitos de todo o
país. No evento, o MEC liberou
o pagamento dos 496 primei-
ros convênios celebrados com
municípios para construção de
515 instituições de educação
infantil. Posteriormente, foram
conveniados mais 500 muni-
cípios. Estão previstas cerca
de 1.000 novos convênios até
o fim de 2009. No encontro
com os prefeitos, o ministro da
Educação, Fernando Haddad,
destacou que é preciso eqüa-
lizar as oportunidades educa-
cionais: “Não importa onde a
criança nasça, seu direito de
aprender deve ser garantido”.
Apoio técnico
Para garantir a qualidade e
assessorar os municípios na for-
mulação da política de educa-
ção infantil, o MEC disponibiliza,
além do apoio técnico e finan-
ceiro para a realização da obra,
assessoramento pedagógico
para os municípios organizarem
ofuncionamentodasinstituições
de educação infantil.
Foto:ArquivoFNDE
matéria especial
24 • revista criança
artigo
Um pouco de história
A educação das crianças em creches e pré-escolas no Bra-
sil, direito reconhecido na Constituição de 1988, tem sua história
marcada por mobilizações sociais. Na década de 1970, foram os
movimentos de mulheres e os de luta por creche seus maiores pro-
tagonistas. Nos anos que precederam a Constituição, a defesa do
direito foi ampliada com o movimento Criança e Constituinte, que
incorporou diferentes segmentos da sociedade.
Garantiu-se, assim, na Carta Magna e, posteriormente, no Es-
tatuto da Criança e do Adolescente (ECA), o reconhecimento da
condição de sujeitos de direitos às crianças e adolescentes, atri-
buindo-lhes prioridade nas várias políticas públicas. Entre esses
direitos estava o de atendimento em creches e pré-escolas para as
crianças até 6 anos de idade.
O início dos anos 1990 caracteriza-se pela discussão das le-
Pelo direito à
educação infantil:
Movimento Interfóruns de
Educação Infantil do Brasil
Ângela Maria F. Rabelo Barreto
Doutora em psicologia pela
Universidade de Brasília (UnB)
e membro do Comitê Diretivo
do Movimento Interfóruns de
Educação Infantil do Brasil (Mieib).
Foto: Arquivo Coedi
revista criança • 25
gislações que irão
regulamentar vários
temas constitucio-
nais. Promulgam-
se o ECA (1990) e
a Lei Orgânica da
Assistência Social
(1993), ambos de
fundamental im-
portância para a
infância e a adoles-
cência. A área edu-
cacional vive um
debate mais longo
e difícil em torno
da Lei de Diretrizes
e Bases da Educa-
ção Nacional (LDB),
que transcorre mais
da metade da dé-
cada sem ser apro-
vada pelo Congres-
so Nacional, o que
ocorreria somente
em dezembro de
1995.
Nesse período, no vazio de-
corrente da inexistência da lei
maiordaeducação,oMinistério
da Educação toma a iniciativa
de definir, com os outros seg-
mentos educacionais, uma po-
lítica nacional para a educação
infantil, consoante com os pro-
jetos de LDB que tramitavam
no Congresso Nacional. Os
representantes de instituições
convidados a discutir a propos-
ta de política do Ministério, mui-
tos deles participantes do mo-
vimento Criança e Constituinte,
propõem a criação de uma Co-
missão Nacional de Educação
Infantil (CNEI), com o objetivo
de formular e implementar po-
líticas na área. A CNEI atuou de
1993 a 1996, e em alguns es-
tados foram criadas comissões
estaduais com formato e objeti-
vos semelhantes.
O ano de 1994 representou
momento de significado espe-
cial para a educação básica
com a realização da Conferên-
cia Nacional de Educação para
Todos. Um dos eventos pre-
paratórios à Conferência foi o I
Simpósio Nacional de Educa-
ção Infantil, no qual se discutiu
e aprovou a Política Nacional de
Educação Infantil, com o apoio
da CNEI.
Em 1996, no bojo da pre-
paração do II Simpósio Nacio-
nal de Educação Infantil e IV
Simpósio Latino-Americano de
Atenção à Criança, reuniões
estaduais e seminários regio-
nais estimularam a criação de
comissões ou fóruns de edu-
cação infantil em estados que
ainda não os possuíam.
Em 1999, percebendo a ne-
cessidade de articulação na-
cional em torno da defesa do
direito à educação infantil, in-
tegrantes dos fóruns de Minas
Gerais, Rio de Janeiro e São
Paulo convidaram outros fóruns
para discutir como fazê-la. Em
reuniões entre representantes
desses três estados e do Ce-
ará, Mato Grosso do Sul e de
Santa Catarina, constituiu-se o
Movimento Nacional de Edu-
cação Infantil do Brasil, com a
sigla Mieib.
O que é e pelo que
luta o Mieib
Constituído por fóruns esta-
duais, regionais e municipais
de educação infantil, que se
organizam de forma autônoma
em cada local e se integram na-
cionalmente por uma pauta de
lutacomum,oMieibéumespa-
ço de discussão e articulação
suprapartidário, comprometido
com a expansão e melhoria da
qualidade da educação infantil
no Brasil.
O Mieib é aberto à participa-
ção de todos os interessados
na educação infantil. De modo
geral, participam dos fóruns e
do Mieib órgãos governamen-
tais na área da educação, as-
sistência social, saúde, justiça
e outros; organizações não-go-
vernamentais; instituições de
ensino superior, ensino médio
e outras que atuam com a for-
mação de professores; con-
selhos estaduais e conselhos
municipais de educação, con-
selhos de direito da criança e
do adolescente, conselhos de
assistência social e outros; re-
presentantes de creches e pré-
escolas públicas e privadas,
famílias, comunidades e sindi-
catos; instituições de pesquisa;
professores e pesquisadores.
O Movimento possui um comitê
diretivo, eleito a cada dois anos
em encontros nacionais.
A atuação do Mieib é orien-
tada por princípios básicos,
como garantia do direito cons-
titucional das crianças de até
6 anos à educação infantil, in-
dependentemente de raça, gê-
nero, etnia, credo e condições
socioeconômicas; concepção
de criança como sujeito de di-
reitos, ativo e participativo no
seu contexto histórico-cultural;
indissociabilidade do cuidar e
do educar; respeito ao direito
artigoartigo
26 • revista criança
Executiva, atualmente sediada
no Centro de Cultura Luiz Frei-
re, em Pernambuco, e com o
site www.mieib.org.br.
OMieibtambémparticipade
diferentes instâncias e redes de
defesa dos direitos da criança
e da educação, para as quais
contribui com seus posiciona-
mentos e mobilizações. Desta-
cam-se entre elas a Campanha
Nacional pelo Direito à Educa-
ção, que coordenou o “Fundeb
pra Valer!”, a Rede de Monito-
ramento Presidente Amigo da
Criança e a Rede Nacional Pri-
meira Infância. Tem represen-
tação no Comitê Nacional de
Políticas de Educação Básica
do MEC, o que lhe possibilita
intervir nas discussões das po-
líticas e ações do Ministério na
área da educação infantil.
Em abril de 2008, o Mieib
participou da Conferência Na-
cional de Educação Básica,
contribuindo para assegurar
lugar de destaque à educação
das crianças até 6 anos na pau-
ta das políticas de educação.
da família de optar pelo aten-
dimento na educação infantil;
reconhecimento da educação
infantil como primeira etapa da
educação básica; garantia de
inclusão das crianças com defi-
ciência nas classes comuns de
educação infantil.
Sendo sua finalidade defen-
der coletivamente a garantia do
direito das crianças de até 6
anos ao atendimento na educa-
ção infantil, o Mieib tem como
bandeiras de luta a ampliação
de vagas em creches e pré-es-
colas; a destinação de recur-
sos públicos adequados para
a educação infantil; a melhoria
da qualidade do atendimento;
a formação e valorização dos
profissionais da educação in-
fantil; a implementação da pro-
posta pedagógica elaborada
de forma democrática e par-
ticipativa pelas instituições de
educação infantil.
Além dessas, que podem
ser consideradas de caráter
permanente, outras são de na-
tureza conjuntural e respondem
a problemas decorrentes de
momentos históricos vi-
vidos pela educação in-
fantil no país. Assim, são
pontos fundamentais da
luta do Mieib a integra-
ção das instituições de
educação infantil públi-
cas e privadas, aos sis-
temas de ensino; o esta-
belecimento de normas
para o funcionamento e
regularizaçãodasinstitui-
ções de educação infan-
til; e o controle social da
implantação do Fundeb
(Fundo de Manutenção e
Desenvolvimento da Educação
Básica e de Valorização dos
Profissionais da Educação).
No caso do Fundeb, deve
ser lembrado o papel que teve
o Mieib na luta vitoriosa pela in-
clusão das creches nesse im-
portante mecanismo de finan-
ciamento da educação básica
no Brasil. As carrinhatas e o mo-
vimento “Fraldas Pintadas”, que
contaram com a mobilização
e participação das instituições
comunitárias, engrossaram a
iniciativa “Fundeb pra Valer!”,
que tinha entre seus principais
pontos a inclusão da creche no
Fundo. Com essa vitória, muitas
crianças excluídas do atendi-
mento em creches e pré-esco-
las poderão ter a oportunidade
de freqüentá-las e se beneficia-
rem efetivamente da primeira
etapa da educação básica.
Nos últimos anos, o Mieib
participou de pesquisas e pu-
blicações sobre a qualidade da
educação infantil, o custo-alu-
no, entre outras. Para sua atua-
ção, conta com uma Secretaria
Foto: Arquivo Coedi
artigo
revista criança • 27
professor faz literatura
ara ser professor,
fizeram-me acreditar
que precisaria de muito pouco,
talvez quase nada.
Ser alguém esperto,
ter imaginação,
usar da criatividade,
ler alguns livros,
responder o que for preciso,
saber utilizar a palavra,
ouvir quando necessário,
calar em momentos determinados,
cantar só quando for convidado,
não sorrir de coisas bobas,
chamar a atenção para manter a
disciplina,
cumprir o conteúdo,
planejar o trivial.
Com o passar do tempo,
descobri que fui enganado pelo didático.
Na caminhada da profissão,
tudo o que pensei ter aprendido
não passou de ilusão.
Lidar com gente
não é fácil não.
Além de teorias e métodos revolucionários,
é preciso mais do que saber.
Ensinar não é passar instrução
para a criança aprender.
Professor tem que ser
ator, cantor, mágico,
palhaço, artista, malabarista,
um pouco de mãe
e às vezes ter jeito pai.
Tem que expor emoção,
pôr sentimento no que faz,
mexer com o coração,
ter paciência e compreensão.
Pois ser professor, na verdade,
é ser gente que constrói
não só personalidade.
Contribui na formação do caráter,
guia nos caminhos da aprendizagem,
auxilia na formação do cidadão.
Ser professor
é mais que uma profissão.
Afinal,
o que
é ser
professor?
Alessandra Regina Braga Veloso
P
revista criança • 27
Pedagoga, atuando como
professora de educação
infantil no Distrito Federal.
28 • revista criança
relato
bservar o aluno em sala
de aula é o primeiro
passo para o sucesso
do professor e o desenvolvi-
mento da criança. Foi o que
demonstraram os projetos se-
lecionados pelo Prêmio Pro-
fessores do Brasil – 2ª edição.
Dez professores da educação
infantil e nove das séries ini-
ciais (1ª a 4ª) do ensino fun-
damental da rede pública re-
ceberam, cada um, R$ 5 mil,
troféu e diploma, em cerimô-
nia realizada no dia 15 de ou-
Professores premiados do Brasil
Prêmio Professores do Brasil reconhece profissionais que
constroem o conhecimento a partir da realidade das crianças
Heloisa d’Arcanchy
Brasília/DF
tubro, em Brasília. O prêmio
é oferecido pelo Ministério da
Educação em parceria com
a Fundação Bunge, Funda-
ção Orsa, Conselho Nacional
de Secretários de Educação
(Consed) e União Nacional
dos Dirigentes Municipais de
Educação (Undime).
No dia seguinte à premia-
ção, os 19 educadores que
se destacaram entre os 1.564
inscritos no ano de 2007, par-
ticiparam de um seminário,
no qual puderam apresen-
O
revista criança • 29
relato
tar e discutir suas experiên-
cias. Para quem assistiu, fi-
cou claro que professores e
professoras deixaram de ser
meros repassadores de co-
nhecimento. Eles constroem
esse conhecimento com os
alunos, a partir da realidade
deles, do que eles gostam e
do que precisam trabalhar. O
resultado são crianças moti-
vadas com a escola. E tam-
bém familiares e comunidade
envolvidos com a educação
de suas crianças.
“O mérito principal do prê-
mio é incentivar o registro das
práticas realizadas em sala
de aula”, salienta a diretora de
Políticas de Formação, Mate-
riais Didáticos e Tecnologias
para a Educação Básica do
Ministério da Educação, Jea-
nete Beauchamp. “Entende-
mos que, quando o professor
registra a sua prática, ele faz
uma reflexão sobre o próprio
trabalho e também constrói
saberes pedagógicos”.
As experiências premiadas
serão reunidas em uma pu-
blicação e distribuídas para
as secretarias de Educação
de todo o país. “Mais do que
estabelecer uma competição,
pretendemos divulgar os tra-
balhos que vêm sendo reali-
“Quando o profes-
sor registra a sua
prática, ele faz uma
reflexão sobre o
próprio trabalho e
constrói saberes”.
zados nas escolas brasileiras
e que podem servir de mode-
lo para outros educadores,
evidentemente com as devi-
das adaptações às diferentes
realidades”, observa Jeanete.
Para Giovana Barbosa,
coordenadora de projetos da
Fundação Orsa, que investe
há mais de 13 anos em pro-
jetos e programas voltados
para a infância, o prêmio re-
vela o desenvolvimento da
prática do professor e reforça
a importância das parcerias
entre Estado e sociedade. “O
prêmio nos permite conhecer
o que está acontecendo em
cada cantinho deste Brasil,
como esse profissional se
destaca hoje, qual conheci-
mento teórico ele tem, como
ele une essa teoria à prática
olhando para as coisas espe-
cíficas de suas regiões”.
30 • revista criança
relato
Cultura
A professora Maria Aparecida Rodrigues
da Costa queria trabalhar a questão da vio-
lência em sala de aula, por causa da atitu-
de dos alunos diante de determinadas situ-
ações. Mas os caminhos que ela escolhia
não eram bem aceitos pelos estudantes de
6 anos. Quando percebeu o interesse deles
pelo caranguejo, muito comum na Ilha das
Caieiras, em Vitória (ES), onde fica o Centro
Municipal de Educação Infantil (CMEI) Padre
Giovanni Bartesaghi, decidiu aprofundar o
conhecimento da meninada sobre o ambien-
te em que viviam e realizou o projeto “A Cul-
tura de uma ilha no coração capixaba”.
Os alunos refletiram sobre a poluição do
meio ambiente, envolveram-se rapidamente
em atividades, conheceram como se fabrica
a panela de barro usada para fazer a mo-
queca de caranguejo e visitaram um restau-
rante típico da região. Além da parceria com
empresários locais, a escola contou com a
participação de estudantes da Universidade
Federal do Espírito Santo, que ensinaram
técnicas de grafismo, cerâmica e pintura em
negativos. Durante o processo, os alunos re-
Negros
O projeto começou quando os alunos de
3 anos da professora Geanne Duarte Polini
excluíram uma coleguinha negra das brinca-
deiras. A professora procurou a pedagoga
do CMEI Jacynta Ferreira de Souza Simões,
em Vitória (ES) e, juntas, trabalharam o tema
das diferenças a partir da literatura infantil. O
livro Menina Bonita do Laço de Fita, da es-
critora Ana Maria Machado, caiu como uma
luva: conta a história de uma linda menina
negra, que engana o coelho sobre o segredo
de ser tão pretinha: - “é só tomar café”, diz
a menina.
A partir do interesse pela história, a profes-
sora desenvolveu o projeto “Somos diferen-
tes. Ninguém é igual a ninguém” e montou
estratégias de trabalho para que as crianças
percebessem que no mundo há diferenças
e existe beleza nisso. “Nós fizemos a receita
do café na sala para que os alunos percebes-
sem que não adianta tomar café, cada um
nasce de um jeito; fize-
mos passeios pela ci-
dade para observar as
diferentes flores, cada
uma com sua beleza;
comparamos animais
e visitamos um viveiro
de coelhos de diversas
cores, todos belos”,
conta a professora.
Oficinas de trança afro,
teatro e compras no
supermercado para o
aniversário da boneca
ajudaram as crianças
a respeitar as diferen-
ças e ainda trabalhar a
matemática.
Índios
A cultura indígena foi trabalhada pela professora Fran-
cimaura Miranda de Souza, no projeto “Conhecer para
Respeitar”, da EMEI Balão Mágico, em Rolim de Moura
(RO). A professora usou material de leitura e fotografias
que tirou durante uma visita a duas aldeias para mostrar
que os indígenas são muito parecidos com os brancos.
“Antes eles eram vistos como seres mitológicos da flo-
resta”, explica.
vitalizaram o espaço do refeitório, aprenden-
do a gostar mais da escola e a respeitar os
colegas.
revista criança • 31
relato
Meio ambiente
Na Escola Municipal de Educação Infantil
Maria Rosa do Prado, em Montividiu (GO), a
professora Rosemeire Freitas Carvalho se in-
comodava com o desmatamento acelerado
da pequena cidade. Sentia falta da sombra
das árvores, dos animais, do canto dos pás-
saros. Mais do que falar sobre o meio am-
biente, ela queria que os próprios alunos – de
4 a 6 anos – percebessem a importância da
preservação da natureza.
Uma solução foi levar fotografias antigas
da cidade e perceber como esses lugares
estão atualmente. Com jornais e revistas,
observaram também paisagens de outros
municípios. Durante o projeto “Não quere-
mos ‘meio ambiente’, queremos o ‘ambiente
inteiro’”, a turma fez passeios para conhecer
os novos bairros que surgiam e observaram
o rio tomado pelo lixo das construções. “Foi
nesse momento que eles se integraram ao
trabalho. Não pudemos fazer o piquenique.
Não havia uma árvore para dar sombra”, re-
lata a educadora.
A professora Rosemeire conta que as crian-
ças passaram a cobrar ações nesse sentido.
“Um dos alunos não tinha árvore perto de casa
e o pai precisou arrumar um lugar pra plantá-
la. E quando eu falava em construir uma casa,
eles perguntavam: - “tem como plantar uma
árvore perto dessa casa?”
Cientistas mirins
Era uma vez uma libélula no pátio da esco-
la. E a professora atenta transformou o caso
em pesquisa científica. “Pequenos Pesquisa-
dores, Grandes Descobertas” é o projeto de
Rosimere Dobrowolski Oteka, que leciona no
CMEI Santa Isabel, em Ponta Grossa (PR). Ela
desenvolveu o que se chama “escuta sensí-
vel”. Quando o professor está atento àquilo
que os alunos falam ou fazem, ele consegue
perceber qual é realmente a necessidade
das crianças. E aproveita o interesse delas
para despertar o gosto pela aprendizagem.
Depois da libélula, encontraram abe-
lhas, joaninhas, grilos... “Os alunos ficaram
fascinados com os tamanhos, as cores, as
diferenças entre os insetos. Foi possível de-
senvolver e articular a curiosidade com as
outras áreas do conhecimento”. As crianças
registraram as descobertas com desenhos
e textos coletivos, experimentaram pintura
com tinta feita de terra, tinta guache, recorte
e colagem. Também houve um trabalho de
conscientização sobre a dengue. “Se nós
perguntarmos para elas sobre a dengue,
elas sabem os cuidados que devemos to-
mar”, observou Rosimere.
Figurinhas
Quem não gosta de montar um álbum e
trocar figurinhas? Melhor ainda se elas for-
marem a sua própria história! Foi o que pen-
sou a professora Luciene Silva de Sousa, da
Escola Estadual de Ensino Fundamental Re-
pública, no Rio de Janeiro, quando um aluno
levou um álbum desses para a aula. Surgiu o
projeto “Figurinhas da Infância”.
Os alunos entre 5 e 6 anos se divertiram
e aprenderam enquanto completavam o
álbum em que eles mesmos eram os per-
sonagens. Fotos de família e ilustrações
foram multiplicadas e ganharam números.
Até uma banca foi improvisada para simu-
lar a venda. Para completar o álbum, as
crianças trocavam as figurinhas repetidas
e conheciam a vida dos colegas.
A história da professora Luciene Sousa,
recém-chegada à Escola República, também
está no álbum. Isso permitiu que os alunos
a conhecessem melhor e facilitou o trabalho
em sala. “No fim do ano, eles levaram para
casa um álbum completo, com a história de
todos. E, durante a montagem, trabalhamos
a matemática, a linguagem, as diferenças, a
cooperação”, relata a professora, que pro-
meteu dividir o prêmio com os alunos, co-au-
tores da produção.
32 • revista criança
Final feliz
Os alunos de 5 e 6 anos da professora
Thelma Lílian Bighetti Sória, da EMEI 1, 2...
Feijão com Arroz, em Marília (SP), não mos-
travam interesse pelas histórias. Quando ela
levava os livros para a sala de aula, eles pe-
gavam vários ao mesmo tempo, mas logo os
largavam.
Motivada pela idéia de que a leitura é fun-
damental para a formação de um indivíduo,
a professora montou uma pequena bibliote-
ca na sala. Bastaram um tapete e uma cai-
xa de livros. Quando o aluno terminava uma
atividade, podia folhear os livros, e quando
todos terminavam, a professora contava his-
tórias. “Fizemos com que eles entendessem
que toda história tem início, meio e fim, e que
esse final nem sempre é o que eles queriam”,
conta Thelma.
Princesas diferentes
Três projetos trabalharam a literatura no
Prêmio Professores do Brasil. Um tapete má-
gico na sala de aula do Centro Educacional
Infantil Padre Réus, em Palhoça (SC), levou
os alunos de 3 e 4 anos da professora Mari
Stela Boschetto da Silva Silveira a muitas via-
gens. As crianças percorreram histórias nas
quais as bruxas e os lobos podiam ser bons
e príncipes e princesas tinham as mais va-
riadas aparências. A intenção da professora
Mari Silveira foi trabalhar com as crianças os
estereótipos, tais como “o feio é mau” ou “as
princesas são brancas e lindas”.
Para realizar o projeto “Reconstruindo His-
tórias”, a professora e os alunos construíram
grandes cenários com material reciclado,
como a baleia da história do Pinóquio e um
castelo em que as crianças podiam entrar e
brincar. Com o cenário pronto, eles recebe-
ram a visita de príncipes africanos e outros
personagens. O trabalho despertou a imagi-
Dentes
Uma reportagem num jornal local chamou a atenção das irmãs Luísa e Luciana Rita Bellin-
canta Salvi, professoras da Escola Básica Municipal Santa Cruz, em Concórdia (SC). A ma-
téria falava de problemas do município com a saúde bucal infantil. As professoras levaram o
jornal e outros textos sobre o assunto para a aula de leitura. Rapidamente, os alunos de 4 a
6 anos se identificaram com as fotos, apontando semelhanças em suas bocas.
A necessidade de promover ações educativas ficou clara. Luciana e Luísa pesquisaram
em livros, revistas, internet, usaram poesias que orientavam as crianças para os cuidados
com os dentes. O trabalho levou transformações para a escola. Não havia espelhos em
frente às pias, mas logo foram providenciados. “Não adiantava ensinar a escovar os den-
tes se a criança não pudesse visualizar a prática”, explica Luciana.
Mas era preciso conscientizar também a família. A Secretaria Municipal de Saúde man-
dou, então, uma dentista até a escola para orientar pais e filhos. “A criança passou a cobrar
dos pais que escovassem os dentes e ainda orientavam o modo correto. Cobravam o fio
dental e quiseram até ir à dentista. Perderam o medo”, conta a professora, feliz com os
resultados. O projeto “Mostrando os Dentes” trabalhou diversas áreas do conhecimento e
possibilitou mudanças na vida das crianças.
nação das crianças, que começaram a criar
as próprias versões para as histórias.
relato
revista criança • 33
Ótimas experiências podem se perder porque não foram registradas. Adotar um ca-
derno de anotações é uma boa sugestão. Quando o professor escreve a sua prática
diariamente e depois lê o que fez durante o ano, é capaz de perceber melhor o desen-
volvimento dos alunos, onde errou, onde acertou, e redirecionar o trabalho.
“Eu pego o caderno de planejamento e um outro caderno onde colocamos os pontos
trabalhados no dia, que depois vão servir de reflexão. Isso me dá uma visão clara da
prática e até daquilo que foi possível ou não foi possível executar”, ensina a professora
Maria Aparecida Santos.
Fotografias, ilustrações, tudo que puder contribuir para o registro é importante. Todos
os dias, ao final das atividades, a professora Geanne Polini e os alunos registram o que
fizeram naquele período. Ela escreve, eles desenham. A esse caderno ela dá o nome de
“Livro Vida”.
O registro da prática
Gibiteca
Único homem entre os professores pre-
miados, Marcelo Campos Pereira, da Escola
Municipal de Ensino Infantil Sonho de Crian-
ça, de Pompéia (SP), apresentou o projeto
“Semeando o prazer de ler com as histórias
em quadrinhos”. O professor iniciou com os
alunos uma campanha para montar a gibite-
ca da escola. Além da leitura, eles aprende-
ram sobre solidariedade. Com a ajuda dos
pais, foram à rádio, ao jornal local, montaram
cartazes e caixas de coleta e recolheram 300
revistinhas.
Uma das técnicas utilizadas para desen-
volver a leitura a partir dos quadrinhos foi
montar um cartaz com vários quadros e co-
brir as figuras uma a uma. Então, o professor
Marcelo mostrava uma por vez. “A criança
analisa as expressões dos personagens e
fica mais fácil identificar as situações. Com
isso trabalhamos três coisas: a inferência,
pela qual a criança pode inventar uma histó-
ria em cima daquele quadrinho; a questão da
antecipação: você pergunta o que vai acon-
tecer com o outro quadrinho coberto e ela
vai ter que criar também; e a conferência: ela
verifica se aquilo que ela criou realmente faz
parte da história.”
Com a ajuda da prefeitura, o projeto con-
seguiu um trenzinho, onde os alunos do pro-
fessor Marcelo, vestidos como os persona-
gens dos gibis, levam para outras escolas os
gibis e o gosto pela leitura. “Hoje eles têm
facilidade de ler a seqüência, a localização
(esquerda, direita) e desenvolveram também
a escrita, porque as crianças se interessam
em saber o que está dentro do balãozinho”,
diz o professor, emocionado.
Depois da leitura, a professora discutia
com os alunos: “vocês gostaram? Porque
será que ele quis fazer isso? Será que não
tinha outro jeito de ele conseguir o que que-
ria?” Assim, as crianças passaram a se inte-
ressar mais pela leitura e começaram a levar
livros para casa e recontar as histórias para
as mães e os pais. E estes foram convidados
a contar histórias na escola.
relato
34 • revista criança
reportagem
Bebês
vão
ao
teatro
Adriana Maricato │ Brasília/DF
Espetáculos criados a partir do olhar das crianças
pequenas ajudam bebês a superar seus medos e angústias
• revista criança
revista criança • 35
P
Pais e mães com filhos até 3 anos aguardam no sa-
guão do teatro, onde são recebidos por Carlos Lare-
da, diretor da companhia La Casa Incierta. Ele expli-
ca as regras do jogo: crianças autônomas sentam na
frente do palco e os bebês de colo ficam na segunda fileira,
com os adultos responsáveis. O ambiente é pequeno e inti-
mista, portanto requer silêncio – outra regra do jogo – e por
revista criança •
36 • revista criança
reportagem
isso os adultos não devem
explicar os acontecimentos
para as crianças. “Elas nas-
cem poetas, são capazes de
compreender a peça”, afirma
o diretor.
No ambiente escuro, elas
são conduzidas e acomoda-
das próximo ao palco, em
uma área iluminada. O que
se vê pela próxima meia hora
é fascinante: bebês em silên-
cio, atentos ao que se passa
no palco, eventualmente dan-
do gritinhos, falando, baten-
do palmas, pulando no colo
dos pais, imitando os gestos
e movimentos das atrizes.
Também olham curiosos uns
para os outros. Alguns deles
tentam alcançar o palco, mas
são impedidos de avançar –
permanecer na platéia é uma
das regras. Crianças que já
falam repetem os nomes dos
objetos em cena e palavras
ditas pelas atrizes: pé, sapa-
to, água, pedra, voar, peixe,
mamãe.
Para os adultos, o espe-
táculo parece non-sense.
Estímulos visuais, sonoros e
verbais são simultaneamente
explorados, intercalados por
frases poéticas, gestos e mo-
vimentos corporais das atri-
zes, compondo uma narrativa
não-linear. Se não faz muito
sentido para os pais e edu-
cadores presentes, a peça
atende à capacidade percep-
tiva dos bebês na platéia.
A iluminação, de várias
cores, é alternada com o es-
curo ao longo do espetáculo.
No início, os bebês sentem
medo do escuro, o que é
normal. O teatro os ajuda a
vivenciar esse tipo de senti-
mento e a superá-lo. “Pode
ser o medo de perder o pai
ou a mãe, uma experiência
associada à morte”, explica
Lareda. “A criança pequena é
muito corajosa, pois é capaz
de enfrentar suas emoções”.
Sons, luzes,
objetos, ruídos e
música
O diretor conta que os
espetáculos de La Casa In-
cierta nascem da observa-
ção, durante seis meses, de
crianças em creches. O con-
texto familiar também é uma
forte referência, já que Lare-
da é pai de dois filhos com a
atriz Clarice Cardell, também
da companhia. Eles constro-
em as peças a partir do olhar
de seus bebês.
Durante os espetáculos,
as atrizes desenvolvem jogos
de colocar-tirar, esconder-re-
velar, puxar-soltar, experimen-
tos com sons e luzes. Na trilha
sonora, reprodução de vozes
de outras crianças e música.
“Existe uma idéia de que as
crianças pequenas desenvol-
vem a compreensão pelo veí-
culo sensorial”, afirma o diretor.
Ou seja, bebês viveriam num
mundo sem sentido porque
ainda não desenvolveram a lin-
guagem verbal, compreensão
que Lareda rejeita. Para ele,
o sentido pode ser construí-
do também a partir de outras
linguagens, que os pequenos
percebem: musical, oral, plás-
tica, cênica e gestual.
De um emaranhado de
fios coloridos puxados de um
lado para outro sai um úni-
co fio, que é, então, cortado
por uma tesoura. Uma pedra
amarrada a uma corda re-
presenta o bebê com cordão
umbilical. Um objeto dourado
em formato de meia esfera
oca colocado sobre a barriga
de uma atriz significa a barri-
ga de uma mulher grávida.
Segundo Lareda, as per-
guntas mais profundas sobre
existência e identidade são
feitas pelos seres humanos
nos seus primeiros anos. É
assim que o nascimento, fato
mais importante da vida e
próximo da experiência dos
pequenos, torna-se o tema
das peças. Tudo o que se
relaciona a isso – gravidez,
aconchego, embalo, pre-
sença (ou ausência) da mãe
– acaba sendo representado.
O espetáculo baseia-se
numa estrutura de pensa-
mento complexo, no qual vá-
rias camadas são exploradas
simultaneamente: os planos
conceitual, emocional, narra-
tivo, sensitivo e perceptivo.
“O bebê tem uma percepção
cinestésica do acontecimen-
to”, explica o diretor. Em ou-
tras palavras, as crianças pe-
quenas percebem o ambiente
a partir de várias sensações e
sentimentos simultâneos, e
reagem a todos eles.
Durante a peça, as crian-
ças viram a cabeça em dire-
ção à origem de cada som
ouvido por elas – toque de
objeto metálico ou sino com
vareta, batimento de pedra
revista criança • 37
João Corbert, 2 anos e 2 meses, ao assistir “Pu-
pila D’Água” em companhia da mãe e da tia, saiu
do espetáculo perguntando “cadê o teatro?”. Nos
dias seguintes, pediu várias vezes para voltar lá e
apontava a foto da peça no “livro do teatro” (pro-
gramação do festival Cena Contemporânea), onde
tinha “a moça”.
Uma semana após sua primeira experiência,
João largou o brinquedo favorito ao ser convidado
para ver fotos do “teatro”, disponíveis na internet.
Ele apontava cada imagem e, do seu jeito, descrevia
sensações e sentimentos: identificou o escuro e a
cena em que sentiu medo, descreveu objetos. Esti-
mulado a falar, disse “eu vi o peixinho”; sobre a atriz,
afirmou que “fez água”, “fez sapato”, “fez barulho”,
“coitado do sapato”. Lembrou-se de que o sapato
era colocado na árvore. Depois de cinco minutos, já
cansado, disse “eu vou desligar” (o computador).
“O bebê não é uma página em branco”, afirma
Clarice Cardell; “ele tem abertura total para a mú-
sica, os gestos”. Atriz da companhia, Clarice acha
que cada espetáculo é uma oportunidade de ser
transparente: “trata-se de um mundo muito profun-
do e intenso, é difícil fazer caras e bocas para os
bebês, você se sente na corda bamba”.
Em determinado momento da apresentação de
“Pupila D’Água”, as atrizes batem os sapatos ver-
melhos no chão, produzindo seqüências de som e
silêncio. Em Brasília, um menino com uma chupeta
na boca e uma fralda na mão, em pé, sapateou no
mesmo ritmo das batidas, levantou os braços e gi-
rou, imitando os gestos das atrizes em cena.
Para manter a relação com a platéia, que é muito
frágil, as atrizes enfocam o bebê, que também está
em cena. No espaço pequeno, as crianças ficam
muito próximas ao palco. Eventualmente, Clarice
olha para os olhos de um dos bebês e se aproxima;
ele corresponde ao olhar e se mantém atento. “Eu
me permito me perder nesses olhares, eles me ali-
mentam”, diz a atriz.
O mundo dos bebês
reportagem
ou sapato no chão, fala das
atrizes, música, gritos de be-
bês gravados, despejo de
grãos, água escorrendo.
A pesquisadora canaden-
se Sandra Trehub, da Univer-
sidade de Toronto , descobriu
que os bebês têm percepção
musical muito desenvolvida,
comparável à de músicos
profissionais. Eles reconhe-
cem tons, melodias, tonali-
dades e ritmos, memorizam
seqüências musicais e perce-
bem padrões em canções de
diferentes culturas. Segundo
tais pesquisas, o ser humano
nasce com essa habilidade e
a perde durante o processo
de crescimento, pois a expo-
sição a um único padrão limi-
ta a percepção musical.
Os bebês são muito sensí-
veis e abertos não somente à
música, mas também às de-
mais linguagens. As peças de
La Casa Incierta favorecem a
contemplação ativa, pois for-
necem elementos para a in-
terpretação dos pequeninos
da platéia. A essa experiên-
cia, Lareda contrapõe a con-
templação passiva, “propor-
cionada pela televisão e por
determinada literatura, que
não colocam perguntas para
as crianças”.
Reações das
platéias
O teatro para bebês foi de-
senvolvido na França, entre
as décadas de 1980 e 1990.
A companhia La Casa Incierta
começou a produzir esse gê-
nero teatral a partir de 2002,
38 • revista criança
na Espanha. Até setembro
de 2007, o grupo havia feito
mais de 400 apresentações
de “Pupila D’Água” e mais de
800 de “A Geometria dos So-
nhos”, na Europa e no Brasil.
La Casa Incierta apresentou
as duas peças, entre agosto
e setembro de 2007, em Bra-
sília (DF), Rio de Janeiro (RJ)
e São Paulo (SP).
As platéias reagem de
acordo com o local, a cultura
e a situação em que os be-
bês assistem ao espetáculo,
se acompanhados dos pais
ou com a creche. Por exem-
plo, “quando o adulto sente
medo de que o bebê tenha
medo, o bebê fica apreensi-
vo”, relata Lareda.
No Rio de Janeiro, o dire-
tor notou que o público adulto
não faz diferença entre os es-
paços do palco e da platéia,
“o oposto do que acontece
na Rússia, onde o palco é um
espaço sagrado”. Nas apre-
sentações em São Paulo, ele
observou a existência de uma
unidade física muito grande
entre pais e filhos, “provavel-
mente porque passam pouco
tempo juntos”; os bebês não
se aventuram sozinhos.
Em apresentações para
creches em Brasília, Lareda
percebeu certa teimosia da
platéia no início do espetá-
culo, que ele atribui a rela-
ções familiares não conhe-
cidas – como muita pobreza
e carência – à ausência das
mães, ou por não se sentirem
acolhidas pelos adultos. Uma
dessas apresentações come-
çou com uma choradeira co-
letiva; depois, as crianças se
acalmaram.
Num dos espetáculos
apresentados para creches,
em São Paulo, havia uma
criança que se manteve mui-
to contida, relata Lareda. Tra-
tava-se de “A Geometria dos
Sonhos”, em cujo encerra-
mento a atriz repete a palavra
“mamãe” várias vezes, em
tom de angústia, como um
bebê à procura de sua mãe.
Depois da peça, a atriz foi
conversar com esta criança e
a abraçou. A criança chorou
e contou que não tinha mãe.
“Chorar é bom para a saúde”,
sentencia o diretor.
reportagem
revista criança • 39
A menina que roubava livros
Autor: Markus Zusak
Tradutora: Vera Ribeiro
Editora: Intrínseca
Magda P. Muller Lopes
A Menina que roubava livros é uma obra
poética, inusitada, arrebatadora, que emo-
ciona, desperta alegria, mas também tristeza
e revolta. Entre 1939 e 1943, na Alemanha
nazista, a menina Liesel Meminger sobrevive
a três encontros com a Morte, o que impres-
siona a ”ceifadora de vidas”, que decide en-
tão contar a história.
Desde que foi deixada na rua Himmel,
aos cuidados de Hans Hubermann, um
amável pintor desempregado, e sua espo-
sa Rosa, uma dona de casa ranzinza, Lie-
sel busca o sentido de sua vida. Ao chegar
à casa dos Hubermann, a menina trazia
consigo O Manual do Coveiro, seu primei-
ro livro, furtado do rapaz que enterrou seu
Os corvos de Pearblossom
Autor: Aldous Huxley
Ilustradora: Beatrice Alemangna
Tradutor: Luiz Antonio Aguiar
Editora: Record
Nada como ler uma história com perso-
nagens que parecem velhos conhecidos
nossos. Quem nunca soube de uma cobra
egoísta e gulosa? De uma coruja sábia que
sempre tem solução para tudo? De um casal
de corvos formado por uma mulher faladei-
irmãozinho, horas antes de ela ser entregue
aos pais adotivos.
Foi o primeiro de uma série de livros rou-
bados nos quatro anos seguintes. O gosto
por roubá-los tornou-se, então, uma ocupa-
ção para Liesel. As histórias dos livros rouba-
dos e de outros que ganhou de aniversário
passam a nortear e dar certo sentido à sua
existência, em meio à miséria, à morte e à
destruição provocadas pela guerra.
Além do encontro e das vivências pro-
porcionados pela leitura dos livros, outros
encontros foram fundamentais na história
da menina. Primeiro com Hans, seu amoro-
so pai adotivo, que a ensinou a ler. Depois,
com Rudy, companheiro de aventura. Com
a mulher do prefeito, com quem desenvolve
certa cumplicidade. E, finalmente, com Max,
o judeu escondido no porão, sobre o qual ju-
rou nunca falar. Personagens que marcaram
sua vida para sempre, nesta época sombria,
mas também rica de aventuras infantis e sen-
timentos nobres.
Toda a narrativa é intercalada por comen-
tários geniais e reflexões inusitadas da nar-
radora Morte sobre o ser humano. Segundo
ela, por exemplo, a humanidade pode ser
“tão medonha e tão gloriosa, e ter palavras e
histórias tão amaldiçoadas e tão brilhantes”.
resenha
40 • revista criança
O título faz uma pergunta para a gente
pensar. A forma circular, como a da roda,
com sua linha curva, pode virar um quadra-
do com lados e ângulos iguais? A pergunta
é danada. Pense. Pode? Ah, não pode. Será?
São formas tão diferentes uma da outra. Uma
coisa pode se transformar em outra? Posso
me transformar naquilo que não sou? Mas
preste atenção, mágica aqui não vale. Ah,
não! É preciso encontrar outro modo de re-
solver essa questão.
Primeiro, um passeio por formas bem re-
dondas como a bola, o pneu, o queijo, a lua
em certas noites. Depois, você vai descobrir
que o redondo faz também galinha, porco,
gato, em imprevistas aventuras da forma.
Mas como o redondo vai conseguir fazer o
quadrado? Vendo uma fila de redondos a
gente pode ter uma idéia. A solução? Sem
truque nem mágica? Só na página 22.
Percorrendo as páginas deste livro, perce-
be-se que muita coisa que parece impossível
no primeiro momento na realidade não é. A
questão é pôr a cabeça para funcionar. Aí,
até o redondo pode ficar quadrado.
O título faz parte do Acervo 1 – Literatura
na infância: imagens e palavras – PNBE/2008
para a Educação Infantil.
Um redondo pode ser
quadrado?
Autor e ilustrador: Canini
Editora: Saraiva
ra e um marido que nem lhe dá bola? Essa
história de Aldous Huxley, famoso escritor in-
glês, tem todos esses personagens juntos e
um final muito engraçado.
Imagine o que o casal de corvos, com a
ajuda da coruja, fez para se livrar da cobra
que come os ovos do ninho deles. Nem pen-
se em ações violentas. A solução está em
um plano bem bolado. Pare a leitura antes
do final e tente descobrir o resultado. Depois,
vá até a última página e descubra sorrindo
como uma cobra pode ser útil para um casal
de corvos com muitos filhos.
O título faz parte do Acervo 2 – Literatura
na infância: imagens e palavras – PNBE/2008
para a Educação Infantil.
resenha
revista criança • 41
A Coordenação Geral de
Educação Infantil (Coedi) tem
recebido inúmeras consultas
sobre a Lei nº 11.274, de 6 de
fevereiro de 2006, que esta-
belece a ampliação do ensino
fundamental para 9 anos exi-
gindo que as crianças sejam
matriculadas nessa etapa da
educação básica a partir dos
6 anos completos. A maior
parte delas levanta dúvidas
sobre a faixa etária a ser aten-
dida pela educação infantil.
É importante que todos os
profissionais das creches e
das pré-escolas estejam bem
informados sobre o assunto e
tenham condições de ajudar as
famílias a respeito do tema. Por
isso, buscamos nesta seção
Cartas esclarecer a questão.
A Lei 11.274 se baseia no
princípio de que, para uma par-
cela da população brasileira
que não tem acesso à educa-
ção infantil, antecipar a idade
de ingresso no ensino funda-
mental significa a garantia de
um ano a mais de educação
básica para as crianças.
Os municípios possuem
prazo até 2010 para implantar
o ensino fundamental obriga-
tório de 9 anos. Nos municí-
pios que já criaram as condi-
ções para o cumprimento da
lei, todas as crianças que já
possuem 6 anos ou irão com-
pletá-los ainda no início do
ano letivo devem ser matricu-
ladas no ensino fundamental.
Mas, atenção! Para as
crianças que já freqüentam a
educação infantil, essa medi-
da não eliminou a pré-escola,
apenas diminuiu a duração do
chamado período pré-escolar
para um grupo de crianças:
aquelas que têm 6 anos com-
pletos no início do ano.
É fundamental explicar
aos pais e familiares que esta
criança não está pulando ou
perdendo um ano. Ela apenas
vai freqüentar este ano no en-
sino fundamental e não mais
na educação infantil.
Vale destacar que a educa-
ção infantil continua atendendo
criançasquecompletam6anos
no decorrer do ano letivo. Trata-
se de uma alteração na forma
de organizar a distribuição das
crianças no percurso escolar.
Essa alteração exige das insti-
tuições de educação infantil e
das escolas de ensino funda-
mental uma revisão ou ajuste
na proposta pedagógica.
Tal medida busca regula-
rizar uma ambigüidade his-
tórica do sistema educacio-
nal brasileiro: crianças de 6
anos já eram matriculadas
no ensino fundamental há
muitos anos, mas na medi-
da da disponibilidade de va-
gas da rede de ensino local.
A novidade da Lei 11.274 é
colocar como central o direi-
to da criança e não subor-
dinar esse direito à ”capaci-
dade física e financeira das
redes de ensino”.
Nesse contexto, é impor-
tante não permitir a matrícula
de crianças com menos de
5 anos e 10 meses no en-
sino fundamental. Quando
isto ocorre, fica caracteriza-
do o desrespeito ao direito
da criança de 0 a 6 anos à
educação infantil. Além disto,
desconsideram-se as carac-
terísticas desta etapa da vida
e fragiliza-se a concepção de
educação infantil.
Não respeitar o corte etá-
rio de 6 anos completos para
matrícula no ensino funda-
mental significa manter crité-
rios distintos e duplicidade no
sistema.Naeducaçãoescolar
brasileira, a flexibilidade está
sempre admitida e garantida,
pois ela é um dos pilares da
organização e funcionamento
dos sistemas de ensino. Mas
a flexibilidade deve servir para
lidar com as exceções, e não
tornar-se a regra.
Diálogo com
as cartas
recebidas
cartas
revista criança • 41
42 • revista criança
Novas matrículas no
Proinfantil
Em 2008, 4,7 mil professores de creches
e pré-escolas públicas, comunitárias ou con-
fessionais, iniciaram o curso de magistério,
nível médio, do Programa de Formação Ini-
cial dos Professores em Exercício na Edu-
cação Infantil (Proinfantil). Nesta nova etapa
participam do programa as universidades
federais de Goiás, Mato Grosso do Sul, Rio
Grande do Norte e Pará.
O curso tem duração de 2 anos e é uma
parceria entre o MEC e as secretarias esta-
duais de educação. Até 2007, cerca de 3 mil
professores já tinham sido habilitados nos
estados de Alagoas, Amazonas, Bahia, Cea-
rá, Goiás, Piauí, Rondônia e Sergipe.
Proinfância
O MEC, comprometido com a expansão e
melhoria da qualidade da educação infantil,
vem implementando um conjunto de ações
de apoio e assessoramento técnico aos mu-
nicípios. Dentre elas destaca-se o Programa
Nacional de Reestruturação e Aparelhagem
da Rede Escolar Pública de Educação Infantil
(Proinfância).
Mais de 4,3 mil municípios manifestaram
interesse no Proinfância. Até 2008, o Fundo
Nacional de Desenvolvimento da Educação
(FNDE) estabeleceu convênio com 955 muni-
cípios para construção de escolas de educa-
ção infantil.
Simultaneamente ao processo de constru-
ção, o MEC executará o acompanhamento
técnico. Este trabalho abrange o monitora-
mento das obras e o assessoramento técnico
pedagógico e será feito por meio da Secreta-
ria de Educação Básica (SEB) e do FNDE.
O modelo padrão, oferecido pelo MEC, é
de uma escola com 1.100 m2 equipada e com
laboratório de informática, em área mínima de
2.800 m2, com horta escolar, área de recrea-
ção ao ar livre, área verde e estacionamento.
Cada projeto recebe cerca de R$ 707 mil.
Creches conveniadas
Com o objetivo de orientar os municípios
para melhorar a política de conveniamento,
o MEC elaborou o documento “Orientações
sobre convênios entre secretarias municipais
de educação e instituições comunitárias,
confessionais ou filantrópicas sem fins lucra-
tivos, para a oferta da Educação Infantil”.
O documento foi construído em um pro-
cesso coletivo, coordenado pelo MECa partir
de GT composto de representantes da União
Nacional dos Dirigentes Municipais de Edu-
cação (Undime), União Nacional dos Conse-
lhos Municipais de Educação (Uncme), Mo-
vimento Interfóruns de Educação Infantil do
Brasil (Mieib), Confederação Nacional dos
Trabalhadores em Estabelecimentos de En-
sino (Contee), Organização das Nações Uni-
das para a Educação, a Ciência e a Cultura
(Unesco) e Associação Nacional de Pós-gra-
duação e Pesquisa em Educação (Anped).
Conferência Nacional de
Educação Básica
Em abril de 2008, aconteceu em Brasília a
Conferência Nacional da Educação. Realiza-
da após as 27 conferências estaduais, a Con-
ferência Nacional teve cinco eixos temáticos:
1) os desafios da construção de um sistema
nacional articulado de educação; 2) demo-
cratização da gestão e qualidade social da
educação básica; 3) construção do regime de
colaboração entre os sistemas de ensino, ten-
do como um dos instrumentos o financiamen-
to da educação; 4) inclusão e diversidade na
educação básica; 5) formação e valorização
profissional. Além disso, a Conferência teve
em sua programação o colóquio “Educação
Infantil em novas perspectivas, como primeira
etapa da educação básica”.
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Educação infantil: desafios da quantidade e qualidade

  • 1. do professor de educação infantil entrevista: matéria especial: artigo: Revista Maria do Pilar Lacerda Almeida e Silva Programa apóia a construção de creches e pré-escolas e dá assessoria a municípios Pelo direito à educação infantil: Movimento Interfóruns de Educação Infantil do Brasil Educação da Criança de 0 a 3 anos em espaço coletivo Programa apóia a construção de creches e pré-escolas
  • 2. 2 • revista criança expediente Presidência Ministério da Educação Secretaria Executiva Secretaria de Educação Básica Diretoria de Concepções e Orientações Curri- culares para a Educação Básica Coordenação Geral de Educação Infantil Jornalista Responsável César Augusto Pinheiro de Oliveira Editor Alex Criado Reportagem Adriana Maricato e Heloisa d`Arcanchy. Colaboradores Adrianne Ogêda Guedes, Ângela Maria F. Rabe- lo Barreto, Magda P. Muller Lopes, Maria Carmem Silveira Barbosa, Maria Clotilde Rossetti Ferreira e Rodrigo Faleiro. Direção de Arte e Produção Tech Gráfica Criação e Projeto Gráfico Daniel Ribeiro Diagramação e Editoração Daniel Ribeiro Fotografias André Dusek, Júlio Cesar Paes de Oliveira, Edu- cadoras do Berçário/Maternal da Creche Carochi- nha/Coseas/USP Revisão Margaret de Palermo Silva Foto Capa Educadoras do Berçário/Maternal da Creche Ca- rochinha/Coseas/USP Envie cartas para o endereço: Ministério da Educação/SEB/DCOCEB – Coordenação Geral de Educação Infantil Esplanada dos Ministérios, Bloco L – Edifício Sede, 6º andar – Sala 623 70047-900 Brasília – DF. Tel: (61) 21048645 E-mail: revistacrianca@mec.gov.br Tiragem dessa edição: 268.470 exemplares Dezembro de 2008
  • 3. revista criança • 3 5 9 24 4 5 9 28 24 20 27 34 39 41 42 carta ao professor entrevista Maria do Pilar Lacerda Almeida e Silva caleidoscópio Educação da Criança de 0 a 3 anos em espaço coletivo professor faz literatura Afinal, o que é ser professor? matéria especial Programa apóia a construção de creches e pré-escolas e dá as- sessoria a municípios artigo Pelo direito à educação infantil: Movimento Interfóruns de Educação Infantil do Brasil relato Professores premiados do Brasil reportagem notas cartas Bebês vão ao teatro resenha arte A Última Ceia43 sumário
  • 4. Prezada professora, prezado professor: ste número da Revista Criança apresenta uma entrevista com a secretária de educação básica do MEC, professora Maria do Pilar Lacerda Almeida e Silva, na qual são discutidos os desafios atuais da educação infantil brasileira e as propostas do governo federal. A Matéria Especial aborda o Programa Nacional de Reestruturação e Apa- relhagem da Rede Escolar Pública de Educação Infantil – Proinfância, uma das ações que compõem o Plano de Desenvolvimento da Educação (PDE). O Proinfância visa a contribuir com os municípios para garantir o direito das crianças de até 5 anos e 11 meses de idade à educação infantil de qualidade. Em 2008, o Fundo Nacional de De- senvolvimento da Educação (FNDE) firma acordo com 955 municípios conveniados com este objetivo. Dentre os inúmeros desafios da educação infantil no país, destaca-se o atendimento da faixa etária de 0 a 3 anos. Quais princípios devem orientar a educação de crianças tão pequenas em espaços coletivos? Qual o papel da professora? Discutir diretrizes políticas, orientações curriculares, práticas pedagógicas, entre outros, para a criança desta faixa etária é um caminho na perspectiva de reafirmar o atendimento em creches como parte da educação básica. A seção Caleidoscópio apresenta a visão de conhecidos pesquisadores em relação à educação da criança de 0 a 3 anos, a fim de contribuir com o professor, sobre as pos- sibilidades de trabalho, a partir das características e especificidades desse período da infância. A professora Maria Clotilde Rossetti Ferreira destaca a indissociabilidade entre cuidar e educar na educação da criança pequena. A professora Maria Carmem Silveira Barbosa incita à construção de projetos educacionais voltados para esta faixa etária. E a professora Adrianne Ogêda Guedes ressalta a importância da comunicação com bebês e com crianças pequenas na educação infantil. A reportagem Bebês vão ao teatro relata o trabalho desenvolvido por uma companhia de teatro da Espanha, denominada La Casa Incierta, que propõe a aproximação entre a arte e a primeira infância, por meio da criação de um universo poético conjunto. A experi- ência teatral evidencia a competência social dos bebês e abre possibilidades de trabalho com teatro desde os primeiros meses de vida. O artigo de Ângela Maria F. Rabelo Barreto mostra a importância dos movimentos so- ciais na luta para garantir educação infantil de qualidade a todas as crianças de até 5 anos e 11 meses de idade ao descrever o surgimento e atuação do Movimento Interfóruns de Educação Infantil no Brasil (Mieib). O relato dos trabalhos vencedores do último Prêmio Professores do Brasil evidencia a importância de observar e estar conectado com a criança para o sucesso da ação pe- dagógica na educação infantil. Já a seção Cartas procura esclarecer algumas dúvidas acerca da Lei 11.274, que amplia o ensino fundamental para nove anos Envie artigo, pergunta, relato de experiência, criação literária para a Coordenação Ge- ral de Educação Infantil (Coedi). Não se esqueça de autorizar a publicação na Revista Criança, caso sua contribuição seja selecionada. Nossa equipe está interessada no diá- logo com as professoras e os professores. Desejamos que este número contribua de forma efetiva com sua reflexão sobre o de- senvolvimento e a educação da criança de até 5 anos e 11 meses de idade. Boa leitura! carta ao professor E 4 • revista criança
  • 5. revista criança • 5 entrevista Qual é o quadro atual da educação básica no Brasil? Maria do Pilar - O quadro é positivo, os índices dão si- nal de melhora. Aumentamos a inclusão das crianças, pra- ticamente universalizando o Maria do Pilar Lacerda Almeida e Silva As duas demandas da educação infantil: quantidade e qualidade Adriana Maricato / Brasília/DF os últimos meses, a educação brasileira ganhou um reno- vado alento. Programas, projetos e um novo modelo de financiamento levam o país a encarar outras perspectivas no que diz respeito à qualidade do ensino público. Como secretária de educação de Belo Horizonte e presidente da União Nacional dos Dirigentes Municipais de Educação (Undime), Maria do Pilar Lacerda Almeida e Silva participou de todo o processo de discussão e aprovação do Fundeb. Ago- ra, como secretária de educação básica do Ministério de Educação, sua tarefa é implantar o novo fundo e levar a cabo programas que induzam mudanças qua- litativas, sobretudo na educação infantil, como o Proinfância. Nesta entrevista, Maria do Pilar fala so- bre o significado dessas inovações para a qualidade da educação em nosso país. N
  • 6. 6 • revista criança ensino fundamental. Entretan- to, ainda hoje, existem cerca de 650 mil crianças entre 6 e 14 anos fora da escola, o que para o Brasil como um todo é muito pouco, mas para cada uma dessas crianças é muito grave. Estamos aumentando o atendimento da educação infantil e fazendo uma abran- gente e profunda discussão sobre o ensino médio. As perspectivas são boas, com a aprovação do piso na- cional salarial para os profes- sores, o fim da Desvinculação de Recursos da União (DRU) para a educação e o Índice de Desenvolvimento da Educa- ção Básica (IDEB), mostran- do que as séries iniciais co- meçam a reagir. Esperamos que, nos próximos anos, isso se reflita nas séries finais e no ensino médio. Quais são os principais de- safios da educação infantil atualmente? Maria do Pilar - Preci- samos aumentar expressi- vamente o atendimento às crianças de 0 a 3 anos, pois somente 15% delas estão em creches. Nós já dispomos de um atendimento maior para as de 4 e 5 anos, mas temos também de aumentar a cons- trução de prédios escolares e discutirmos mais o projeto pedagógico da pré-escola. O primeiro ponto para viabilizar isso é o financiamento para a educação infantil. O Fundeb incluiu o finan- ciamento da educação infan- til, inclusive o da creche. O mais importante e inovador é que está financiando tam- bém a rede conveniada. O Proinfância, programa do go- verno federal, vai investir R$ 1 bilhão entre 2007 e 2008 na construção de mil escolas de educação infantil em 950 mu- nicípios, além do esforço que os próprios municípios fazem na construção de creches. Vamos repetir esse número entre 2009 e 2010. Como a senhora avalia as demandas da educação in- fantil? Maria do Pilar - Existem duas grandes demandas: quantidade e qualidade. Ain- da não há prédios suficientes para atender todas as crian- ças, que é uma demanda primária. Depois há necessi- dade de definir e aprofundar melhor o nosso projeto peda- gógico para a infância e pen- sar em como realizar esse atendimento, fazer com que ele seja coerente com as ne- cessidades das famílias, com os orçamentos municipais e que inove ao reconhecer esse sujeito, que é a criança de 0 a 5 anos de idade. Ele demanda projeto pedagógi- co diferenciado, espaço físi- co adequado e profissionais com formação muito especí- fica. Temos clareza da prio- ridade e da importância da educação infantil, mas ain- da há muito trabalho a ser entrevista Precisamos aumentar expressivamente o atendimento às crianças de 0 a 3 anos, pois somente 15% delas estão em creches.
  • 7. revista criança • 7 feito, tanto na questão do financiamento quanto das concepções. Quais as perspectivas para educação infantil com a im- plantação do Fundeb? Maria do Pilar - De cres- cimento! Mas é importante destacar que o Fundeb remu- nera apenas a matrícula das crianças. Para a prefeitura receber recursos do Fundeb, ela deve construir as escolas e matricular as crianças. Por isso o Proinfância destina re- cursos para os municípios. Portanto, a perspectiva é que haja um crescimento grande da educação infantil. O Proinfância revelou enor- me demanda dos municí- pios em relação a investi- mentos do governo federal. A senhora considera que a construção já assegura uma educação infantil de qualidade? Maria do Pilar - A cons- trução da obra é parte do pro- cesso, mas ela isoladamente garante pouca coisa além da vaga. O prédio só vai asse- gurar uma educação de qua- lidade se vier acompanhado de um projeto pedagógico consistente e um grupo de profissionais com formação muito sólida. Eles têm que saber quem é aquela crian- ça, a diferença entre ela e a criança mais velha, a impor- tância das brincadeiras, da contação de histórias, das ro- tinas. Tudo isso é fundamental para que a construção tenha sentido. Não é suficiente um prédio ser bonito, mas vazio em termos de conteúdo. Deve ter um objetivo educacional a partir do entendimento de quem é essa criança. Por isso o equipamento da educação infantil é estratégico. Uma escola de educação infantil que seja tratada igual a uma escola de séries finais do en- sino fundamental torna-se um desastre. As cadeiras devem ser adequadas, as cores di- ferentes, os brinquedos muito bem especificados para não haver peças pequenas, por exemplo. É uma fase que exi- ge muito detalhamento, muito critério e muita clareza da fun- ção daquele espaço, que não é um depósito de crianças. Qual é o papel da educa- ção infantil na formação do leitor? Maria do Pilar - Trata-se de um equívoco achar que a educação infantil não pode trabalhar com leitura, pois quanto mais cedo histórias orais e escritas entrarem na vida das crianças, maiores as chances de elas gostarem de ler. Primeiro, as crianças escutam histórias lidas pelos adultos, depois conhecem o livro como um objeto. Mesmo antes da alfabetização, folhe- ando e olhando figuras, as crianças estão lendo, do jeito delas. Elas também apren- entrevista ...quanto mais cedo histórias orais e escritas entrarem na vida das crianças, maiores as chances de elas gostarem de ler.
  • 8. 8 • revista criança a inovação do Proinfância ao debater com equipes técni- cas das secretarias munici- pais. A contribuição do arqui- teto, por exemplo, tem a ver com o projeto pedagógico, pois disso depende a pró- pria concepção de sala. As escolas infantis tendem a ter salas maiores divididas em vários ambientes; elas não trabalham com a concepção de sala de aula. Na educação infantil, a sala pode ter qua- tro cantos: um de brinquedo, um de descanso, um de ativi- dades pedagógicas e um de leitura. Assim, a Secretaria de Educação Básica tem desen- volvido programas para que as escolas tenham acesso a essas possibilidades. Quais as perspectivas para que todos os municípios brasileiros sejam contem- plados pelo Proinfância? Maria do Pilar - À medi- da que o orçamento do MEC possibilite, vamos atender cada vez mais municípios. Muitos já fazem o atendimen- to da educação infantil com recursos próprios. Vamos priorizar cidades grandes com orçamento pequeno, como algumas capitais do Nordeste, que têm grande população, onde a demanda é grande, mas o orçamento insuficiente. E também, aque- las cidades que ainda não re- alizam atendimento. dem observando o gesto de leitura dos outros, as chama- das “práticas de leitura e de escrita”. Além de ter acesso aos materiais de leitura, como livros e revistas, as crianças devem aprender a usá-los. Por isso se recomendam as práticas de roda de leitura, contação de histórias, leitura de livros, sistema de malas de leitura, de cantinhos, brin- cadeiras com livros. Então, os professores também pre- cisam se tornar leitores para que sintam prazer no convívio com o material escrito e pas- sem isso para as crianças. O MEC tem programas mui- to importantes, como o livro didático e bibliotecas nas escolas. Como a senhora entende a possibilidade de um programa específico de distribuição de brinquedos? Maria do Pilar - Nós já dis- pomos de algo semelhante, o Programa de Equipamentos para a Educação Infantil, que inclui distribuição de brinque- dos e de livros. Nós fizemos uma cesta de livros para a educação infantil e também uma cesta de material espe- cífico para esta faixa etária. A escola de educação infantil não pode ser vista como um lugar de guardar crianças, somente do “cuidar” e, nesse sentido, o MEC tem ampliado sua forma de trabalhar. Pen- sar no projeto pedagógico, no equipamento, na forma- ção de professores, essa é entrevista Os professores também precisam se tornar leitores para que sintam prazer no convívio com o material escrito e passem isso para as crianças.
  • 9. revista criança • 9 caleidoscópio estabelecimento educacional que atende crianças de até 3 anos de idade enfrenta uma complexidade de demandas basicamen- te vinculadas a três segmentos: as crianças, seus pais ou famí- lia, professores e funcionários. Entretanto, a instituição, embora responda à necessidade de mães e pais trabalhadores urbanos e rurais e se configure como uma área de trabalho e emprego, tem como objetivo principal assegurar o direito da criança à educação. Desta forma, o grande desafio é construir uma prática pedagógica de qualidade e fundamentada em uma visão ampla de educação que afirme a infância como um ciclo de vida pleno de possibilidade. Isto implica em considerar educação e cuidado como indissociáveis e a criança como ser ativo, competente e produtor de cultura. Para participar deste Caleidoscópio convidamos Adrianne Ogêda Guedes, professora do curso de especialização em educação infantil da PUC-RJ, Maria Clotilde Rossetti Ferreira, professora da USP (Ribeirão Preto) e Coordenadora de Investigações sobre o desenvolvimento Hu- mano e Educação Infantil (CINDEDI) e Maria Carmen Silveira Barbosa, professora da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS). Educação da Criança de 0 a 3 anos em espaço coletivo O caleidoscópio Foto:Arquivo/divulgação caleidoscópio
  • 10. 10 • revista criança caleidoscópio estos, olhares, balbu- cios, contato, imitação. A comunicação com bebês e crianças pequenas nos convida a observar com atenção as diferentes formas de expressão que têm curso nesse especial momento, os primeiros anos da vida huma- na. Dialogar com os bebês requer interagir com suas manifestações e com eles construir sentidos, apoiando a estruturação da linguagem infantil e de suas formas de comunicação com o mundo. Portanto, conhecer os signifi- cados das ações e interações infantis é fundamental para nossa atuação nas creches e pré-escolas. Só assim é pos- sível apoiar de fato a criança quando necessário, incenti- vando-a em suas conquistas e aquisições. Desde muito pequenas, as crianças já possuem mo- dos de se aproximarem umas das outras, que variam indivi- dualmente e de grupo para grupo. Podemos ver crian- ças bem pequenas, com até 1 ano de idade, que mesmo sem articular a fala encon- tram formas de estabelecer parcerias pelo movimento, pelos gestos, pela imitação etc. Tomemos essas cenas como exemplos: No pátio de um espaço de educação infantil, algumas crianças com idade de até 2 anos estão juntas. Uma delas resolve correr de uma ponta a outra do pátio. Em seguida to- das as outras correm, em meio a gostosas gargalhadas. Na sala de atividades des- A comunicação com bebês e com crianças pequenas: a imitação como forma de conhecer o mundo Adrianne Ogêda Guedes GDoutora em Educação pela Universi- dade Federal Fluminense (UFF/RJ), professora do curso de especializa- ção em educação infantil da PUC-RJ. Atua também em cursos de forma- ção continuada promovidos pela Secretaria Municipal de Educação do Rio de Janeiro e foi consultora do Proinfantil. Foto: Arquivo/divulgação 10 • revista criança
  • 11. revista criança • 11 caleidoscópio se mesmo grupo, a profes- sora traz uma novidade: uma sacola cheia de bolsinhas e bonés. Assim que apresenta o material para as crianças, elas se põem a manipulá-los. Uma das crianças pega uma bolsa, põe um boné e acena, como que se despedindo. Na mes- ma hora a professora pergun- ta: “Aonde você vai?”. A crian- ça sorri e responde: “Paia” (praia). A partir daí, o grupo se contagia com o movimento do amigo e o professor vai insti- gando a brincadeira: “Vocês vão de carro? Quem vai diri- gir? Não corre muito viu? Vão tomar sorvete na praia? Etc”. Os comentários da professora vão provocando novas ações, e em pouco tempo todos es- tão dando tchau, agrupando- se como se estivessem em um carro. Nasceu uma nova brincadeira! Todos os dias, em um gru- po com idade de até 1 ano, as crianças se reúnem numa sala para brincar. A porta da sala só é fechada na parte in- ferior. Sendo assim, todos os que chegam por lá, seja para dar um recado, seja para visi- tar, são vistos pelas crianças. Esse grupo já conhece bem os espaços da creche e em muitos momentos passeia por eles. Um dos meninos do grupo, bastante ativo e de- senvolto em sua caminhada, olha para os visitantes que passam por ali e levanta os braços em direção a eles. Ele quer passear! Para en- tendermos o significado do movimento de braços deste menino, é preciso levar em conta outras informações que possuímos sobre ele e o grupo. Caso contrário, po- deríamos atribuir outros sen- tidos ao seu movimento (ele poderia estar querendo colo, ou mostrando algo em suas mãos, ou pedindo para ir ao banheiro). Quem já não viu cenas como essas? Tais exemplos nos mostram que, a partir do movimento vivido coleti- vamente, o grupo criou um modo próprio de relação, uma brincadeira cujo disparador foi o corpo e o movimento na ob- servação do outro (e também o objeto, no caso do passeio). Mesmo bem pequenas, as crianças se afetam umas as outras e criam formas próprias de brincarem juntas. O aprendizado pela imitação Relacionar-se com o outro se dá de muitas e diversas formas. Uma criança que co- meçou a freqüentar a creche pode passar alguns dias ou meses mais observadora. Aparentemente poderíamos dizer que ela não está se re- lacionando, pois não faz ne- nhum movimento em direção a outras crianças. No entanto, se observarmos o interesse com que ela acompanha as ações do grupo, os movimentos e brincadeiras que passa a fazer a partir dessa observação, po- deremos perceber claramente o quanto a presença do outro influencia suas ações. As experiências partilha- das entre as crianças vão constituindo a história, a cul- tura do grupo. Essas experi- ências permitem que as crian- ças estabeleçam relações de confiança, de intimidade, de pertencimento. Nesse senti- do a imitação tem papel im- portante, o de integrar, criar identificações, significados partilhados coletivamente. A imitação faz parte do de- senvolvimento cognitivo e cul- tural da criança. É pela imita- ção que ela vai experimentar comportamentos e ações que talvez ainda não fizes- se por conta própria. Nesse sentido ela se coloca em si- tuação de aprendizagem, de ampliação de seus recursos de ação. Impulsionada pelos modelos que a cercam, vai criando e incorporando no- vas formas de ação. As trocas com o adulto Com Vigotski (1987), com- preendemos que a criança, quando imita, apreende a atividade do outro e realiza aprendizagem. Não se trata de mera cópia, uma vez que para imitar alguém ela preci- sa compreender o comporta- mento do outro, envolver-se intelectualmente na atividade, o que implica representá-lo e avaliar a adequação de sua imitação. É também desse autor o conceito de Zona de Desenvolvimento Proximal, que se refere à diferença en- tre o desenvolvimento atual
  • 12. 12 • revista criança da criança e aquilo que ela consegue fazer com o auxílio de outras pessoas. A presen- ça e ajuda do outro permite que a criança faça mais do que conseguiria fazer sozi- nha, atingindo novos níveis de desenvolvimento. Aqui- lo que a criança realiza hoje com ajuda poderá amanhã realizar sozinha. Podemos assim, colocar em destaque a importância das interações das crianças entre si e com os adultos no cotidiano da educação infantil. Partimos do princípio de que o desenvolvimento humano se dá por meio das interações estabelecidas com outros se- res humanos, em ambientes físicos e sociais culturalmen- te estruturados. Portanto, são essas trocas que se consti- tuem nas oportunidades de crescimento e construção de conhecimentos. A linguagem do choro É nos primeiros anos de vida que muitas crianças freqüentam as creches e pré-escolas. Nesse período nossa dependência do outro constitui uma peculiaridade especial do desenvolvimen- to (Wallon, 2007). Ela vai se transformando gradualmen- te, à medida que a criança vai conquistando novas for- mas de ação. Desde bebês possuímos certa organização comporta- mental e algumas condições para perceber e reagir às si- tuações exteriores, principal- mente aos parceiros diversos que formam nosso meio hu- mano. É na relação com os outros que vamos compreen- dendo o mundo, dando signi- ficado para as ações, domi- nando formas de agir, pensar e sentir presentes em nosso meio cultural, desenvolvendo a capacidade de expressão e de linguagem. Tomemos como exemplo o comportamento do bebê em seus primeiros meses de vida. Inicialmente ele chora em reação a diferentes incô- modos e ajustes orgânicos: cólicas, sono, fome, neces- sidades de higiene etc. Os adultos responsáveis pelos cuidados com o bebê reagem ao choro e tomam atitudes para ampará-lo, oferecendo- lhe alimento, colo, trocando suas fraldas etc. Pouco a pouco, o bebê percebe que sempre que chora obtém a atenção de seus objetos de afeição. Co- meça então a chorar não mais como ação reflexa: agora seu choro se torna intencional, isto é, ele chora para obter a aten- ção desejada e a resolução de seus desconfortos. Depois de algum tempo, podemos até diferenciar quando o cho- ro indica fome, ou sono, ou apenas necessidade de proxi- midade física. Não apenas o bebê vai controlando seu cho- ro (mais intenso, mais alto), como também os adultos que se relacionam com ele vão aprendendo, na interação, a diferenciar suas formas de expressão e construindo jun- to com ele novos e diferentes significados, tanto para o cho- ro quanto para os demais ges- tos expressivos que a criança vai desenvolvendo. caleidoscópio Foto:Arquivo/divulgação
  • 13. revista criança • 13 O espaço de educação infantil Vale destacar que a forma como o adulto vai compre- ender esse choro será fun- damental para que a criança vá também atribuindo sentido os diferentes desafios que a convivência põe em cena. Vimos então que a imita- ção é uma forma de conhe- cer o outro, de compreender formas de se relacionar e expressar a partir da vivên- cia com os parceiros, sejam crianças ou adultos. Será a partir da interação que as crianças descobrirão formas socialmente construídas de estar juntas, comunicar-se, elaborarem regras coletivas. É o encontro com o outro que dispara nosso desen- volvimento. Referências: GUEDES, Adrianne Ogêda. A comunicação com bebês e com crianças pequenas (Unid. 5 – OTP mód II). Programa de Formação Inicial do Professor da Educação Infantil em Exercício – PROINFAN- TIL. Brasília: MEC/DPEIEF, 2004. _____________. O corpo nosso de cada dia. Programa Salto para o futuro. TVE: abril de 2008. (dispo- nível no site do programa). OLIVEIRA, Marta Kohl. Vygotski - Aprendizado e desenvolvimento. Um processo sócio-histórico. São Paulo: Scipione, 1993. VYGOTSKI, L. S.. Pensamento e linguagem. São Paulo: Martins Fontes, 1987. ____________. A construção do pensamento e da linguagem. São Paulo: Martins Fontes, 2001. WALLON, Henri. A evolução psi- cológica da criança. São Paulo: Martins Fontes, 2007 às suas sensações. Para ela, embora reconheça o descon- forto físico, a discriminação entre o que exatamente “está lhe incomodando” não é cla- ra. Se por acaso o adulto rea- ge ao choro do bebê, achan- do que sempre que ele chora é porque está com fome e o alimenta, é provável que o bebê comece a associar suas sensações desconfortá- veis àquela forma de conforto apresentada pelo adulto (ao alimento, nesse caso). Por isso é importante inves- tigarmos as expressões infan- tis, tentando compreender os diferentes significados que se expressam em seus compor- tamentos. Será por meio de nossa ajuda que, desde muito cedo, o bebê irá compreender e dar sentido ao que sente e vive. Podemos mesmo dizer que nascemos disponíveis para o contato com o outro e dependemos dele para nosso desenvolvimento. O aprendizado da convi- vência é potencializado nos espaços de educação infan- til. É nesses locais que pri- vilegiadamente poderemos aprender a negociar com o outro, reconhecer os dife- rentes pontos de vista, lidar com conflitos de interesse, promover situações coope- rativas, internalizar regras, trocar afeto etc. No ambien- te das creches e pré-escolas as crianças poderão ter múl- tiplas oportunidades de se relacionarem, desenvolvendo formas de comunicação va- riadas. E também de vivenciar caleidoscópio
  • 14. 14 • revista criança caleidoscópio inserção das crianças de 0 a 3 anos de idade no sistema de ensino impõe-nos um grande de- safio. Como garantir tanto o cuidado quanto a educação nessa faixa etária? Embora a relação entre cuidar e educar seja necessária e indissociá- vel em todo e qualquer pro- cesso educativo, na educa- ção da criança pequena ela se torna imprescindível. Para sobreviver, o filhote humano necessita mais de cuidados de um adulto do que qualquer outro animal. Ao nascer, ele enfrenta uma imaturidade motora muito grande, que o faz depender por longos anos dos outros que dele cuidam. Mas essa longa dependência também torna o ser humano capaz de aprender com os outros e de se adaptar aos mais variados ambientes e situações. Inicialmente se achava que, ao nascer, o bebê era imatu- ro e dependente em todos os sentidos. Nas últimas dé- cadas, foram desenvolvidos vários estudos que mostra- A educação coletiva do pequeno cidadão de 0 a 3 anos* Maria Clotilde Rossetti Ferreira ram que o bebê humano tem uma série de competências auditivas, visuais e olfativas. Ele também possui maior ex- pressividade do que qualquer outro animal; não apenas ex- pressividade facial, mas tam- bém vocalizações, gestos e posturas que favorecem muito sua interação e comunicação com outras pessoas. Na realidade, o bebê apre- senta essa interessante con- tradição: grande imaturidade motora, mas competência social única. Essa capacida- de é que vai lhe possibilitar interagir com outras pessoas, que irão introduzi-lo na cultura e interpretarão o mundo para ele e ele para o mundo. Nas condições materiais e sociais em que os adultos vivem e de acordo com sua cultura, seus costumes e crenças, eles or- ganizam o ambiente, permi- tindo às crianças pequenas agir nele e sobre ele. Possi- bilitam, assim, que as coisas desse mundo façam sentido para a criança. Essa realidade humana bastante complexa encon- * Este artigo constitui versão modificada de outro publicado anteriormente na revista Pátio Educação Infantil, Ano I, nº 1 (abril/julho 2003), pág. 10:12, ArtMed Editora, Porto Alegre/RS, com o título: A necessária asso- ciação entre EDUCAR e CUIDAR. (Cindedi). A autora agradece auxílios da Fapesp e CNPq a suas pesquisas. ADoutora em Psicologia pela Univer- sity of London e professora da USP (Ribeirão Preto), onde coordena o Centro de Investigações sobre o Desenvolvimento Humano e Educação Infantil
  • 15. revista criança • 15 caleidoscópio lie Chaplin no filme Tempos Modernos. Duas educadoras compunham a situação, com um grupo de 15 crianças de 2 a 3 anos. O ritmo de umas e de outras era bem diferenciado. Enquanto as educadoras, automática e rapidamente, desempenhavam as tarefas de despir, lavar, secar e ves- tir uma criança após a outra, as crianças eram submetidas a um contínuo e longo tempo de espera. De início, permane- ciam em pinicos, encostadas à parede. Quando chegava sua vez, eram pegas, esfrega- das, enxaguadas e deixadas, ainda pingando, no estrado para esperar o momento de serem vestidas e penteadas pela outra educadora. Terminado esse procedi- mento, ficavam à espera da rotina seguinte, sendo re- preendidas se não ficassem quietas e silenciosas. Pouca ou nenhuma oportunidade tra-se bem retratada em uma expressão no ditado do povo Xhosa, de Nelson Mandela: Pessoas são pessoas através de outras pessoas. Tal dita- do contrapõe-se fortemente à dissociação entre cuidar e educar, tão freqüente em es- colas, pré-escolas e creches. Esquecemos que, ao cui- dar ou descuidar da criança, estamos colocando-a em certa posição, dando-lhe cer- tos sentidos, os quais contri- buem para constituí-la como pessoa. Certas experiências observadas em algumas cre- ches e pré-escolas podem ajudar a evidenciar isso. As situações de higiene são as mais típicas. O banho passivo A rotina de banho observa- da em uma creche lembrava as linhas de montagem das fábricas, ironizadas por Char- lhes era propiciada para exer- cer alguma autonomia na situ- ação, curtir o prazer da água no corpo, aprender, interagir e brincar umas com as outras. A organização dessa rotina de cuidados estava claramen- te prepando as crianças para serem submissas e passivas, sem iniciativa e autonomia. A mesma situação do banho pode ser trabalhada de for- ma completamente diversa. O ambiente e a rotina podem ser organizados de maneira a oferecer ocasião para as crianças desenvolverem com autonomia uma série de ha- bilidades, como despir, lavar, secar, vestir e calçar a si pró- prias e às outros. Podem ter oportunidade de experimen- tar a temperatura e outras qualidades da água, a textu- ra do sabão e das esponjas. Podem ensinar a cuidar dos outros, ou serem cuidadas por eles. Com isso, estare- mos exercendo um cuida- do/educação que as coloca em uma posição mais ativa, de alguém competente para interagir, aprender e exercer uma série de funções. Discriminação cruel A injusta estrutura social brasileira se espelha sobre- maneira nas instituições edu- cacionais, onde as atividades de cuidado são com freqüên- cia empurradas para os de menor salário e status. Isso ocorre porque a essas ativi- dades é atribuído um menor valor simbólico que àquelas Foto:carochinha/Coseas/USP
  • 16. 16 • revista criança caleidoscópio denominadas educativas. Nas creches, nota-se fre- qüente discriminação entre “as professoras”, entendidas como responsáveis pela par- te mais nobre da educação, e “as auxiliares, atendentes, serventes ou pajens”, res- ponsáveis pela parte menos nobre, de cuidado das crian- ças e do ambiente. Suposta- mente, as primeiras formam a cabeça da criança, responsa- bilizando-se pelas atividades ditas de aprendizagem cog- nitiva, definidas no currículo escolar. Já as outras cuidam das atividades de alimenta- ção, higiene, limpeza, des- canso e recreação, as quais, supostamente, requerem me- nor qualificação. Como a dis- criminação é grande, quem educa não se propõe a cuidar e quem cuida não se consi- dera apto para educar, como se essa cisão fosse possível. Em estudo sobre a inclu- são/exclusão de crianças com paralisia cerebral na pré- escola (Yazzle, Amorim & Ros- setti-Ferreira, 2004), pudemos observar os efeitos perversos dessa dissociação. A pessoa portadora de necessidades especiais usualmente requer maior cuidado, seja no que se refere a apoio ambiental (ram- pas, cadeiras adequadas etc), seja no sentido de um auxílio mais direto e efetivo em ativi- dades nas quais não tem au- tonomia, como ir ao banheiro, por exemplo. As professoras da pré-escola mostraram- se despreparadas e atônitas diante dessa situação. Para elas, esse tipo de função não lhes cabia, e sim às serventes, que não estavam disponíveis em vários momentos. Na realidade, nossa inves- tigação pôs em evidência o fato de que todas as crian- ças precisam, em vários mo- mentos, de algum cuidado especial, adequado a suas necessidades individuais. As professoras, porém, não estão preparadas para isso, pois acham que sua função é apenas ensinar saberes es- pecificados em um currículo escolar predefinido. Quando obrigadas a exercer ativida- des de cuidado, geralmente o fazem à revelia das crianças. O ritual da alimentação Porém, tanto o processo de cuidado quanto o de ensi- no-aprendizagem tornam-se muito mais efetivos e praze- rosos quando há real sintonia entre quem cuida e quem é cuidado, entre quem ensina e quem aprende. Um processo no qual a educadora é capaz de perceber o momento da criança, de proporcionar con- dições que a acolham e moti- vem, envolvendo-a e compar- tilhando com ela atividades variadas, as quais podem ter partido da iniciativa seja da criança, seja do adulto. Ao colocar a criança em uma posição mais ativa, de parceria e co-autoria do que ocorre e de seu próprio pro- cesso de cuidado e aprendi- zagem, a professora estará lhe dando oportunidade de construir uma identidade po- sitiva a respeito de si mesma, de pessoa capaz de se cui- dar e ser cuidada, de interagir com outros e dominar diferen- tes habilidades e conteúdos. A identidade da criança também está sendo formada durante atividades de vida diária, como a alimentação, por exemplo. Muito da cultura e dos saberes de um povo é transmitido nessa prática so- cial. Que o digam os italianos, árabes, franceses e os brasi- leiros do Norte ao Sul! O pre- paro da comida e o momento da refeição constituem ocasi- ões extremamente ricas para a aprendizagem e desenvol- vimento de hábitos e costu- mes individuais e culturais. No entanto, essa situação é freqüentemente tratada na instituição como uma rotina cansativa, da qual os adultos desejam desvencilhar-se o mais rapidamente possível. As atividades de cuidado/ educação de crianças cujos direitos são reconhecidos e respeitados pela instituição e por seus educadores devem envolver o cultivo da identida- de familiar, de gênero e raça. Para isto, podem ser progra- madassituaçõesnascrianças possam explorar sua história individual e familiar, descobrir e ser acolhidas em sua indi- vidualidade, aprendendo a reconhecer e respeitar as di- ferenças próprias e alheias. Propiciar oportunidades para as crianças aprende- rem a gostar de si próprias,
  • 17. revista criança • 17 caleidoscópio desenvolvendo um autocon- ceito positivo e aprendendo a reconhecer e respeitar as características pessoais de cada um constitui tarefa edu- cativa das mais importantes, tanto na infância quanto na adolescência. Educar e cuidar: inseparáveis A indissociabilidade en- tre cuidado e educação pre- cisa permear todo projeto pedagógico de uma creche ou pré-escola. Trata-se, de certa forma, de uma filosofia de atuação que prevalece, ou não, em todo o planeja- mento. As famílias não pro- curam a instituição apenas para que proporcione a seus filhos os aprendizados defini- dos no currículo escolar. Elas buscam compartilhar com os educadores o cuidado e a educação de seus filhos. Esperam que suas crianças sejam acolhidas em sua indi- vidualidade, o que comporta necessidades variadas. Para finalizar, gostaria de propor uma reflexão interes- sante. Na época atual, em que a maior ou menor oportu- nidade de acesso ao conhe- cimento define muitas vezes o futuro de uma pessoa, as atividades de cuidado as- sumem cada vez mais uma posição de destaque. As máquinas e os robôs estão substituindo o ser humano em várias tarefas, mas não nas de cuidado! O setor de empregos que mais cresce é o de serviços. E a competência neles exigi- da envolve também delicade- za e cuidado no trato. Outros segmentos que apresentam acentuado crescimento di- zem respeito diretamente ao cuidado das pessoas e do ambiente ecológico. Cabe então a pergunta: será que estaremos preparando um futuro melhor para nossas crianças, se deixarmos de fora o cuidado das tarefas educativas em nossas cre- ches e pré-escolas? Foto: Carochinha/Coseas/USP Referências: YAZZLE, C.H.D.; AMORIM, K.S.; ROSSETTI-FERREIRA, M. C. A rede de significações na investigação do processo de inclusão de crianças por- tadoras de paralisia cerebral em pré-escolas. In: Maria Clo- tilde Rossetti-Ferreira; Kátia de Souza Amorim; Ana Paula Soares da Silva; Ana Maria de Almeida Carvalho (Orgs.). Rede de significações e o es- tudo do desenvolvimento hu- mano, Porto Alegre: Artmed Editora, 2004, p. 189-206.
  • 18. caleidoscópio m dos grandes desafios para o campo da educação infantil, neste início de século XXI, tem sido o de cons- truir propostas pedagógicas para atender os bebês e as crianças pequeninhas em instituições educacionais. Educadores, professores, pais, crianças, gestores e políticos necessitam participar da formulação de proje- tos político-pedagógicos que ultrapassem a assistência às necessidades biológicas e o adestramento das crian- ças em hábitos e costumes. É preciso construir projetos educacionais que possibilitem às crianças ampliar suas potencialidades e suas capacidades, desenvolvendo suas singularidades e constituindo-se pela participação na vida coletiva. Para educar crianças, necessitamos objetivos claros e precisos que direcionem para a construção de seres hu- manos capazes de viver na sociedade contemporânea. Segundo Odena (1999), o objetivo geral para a escola de 0 a 3 anos deve ser o de “formar pessoas para a auto- nomia pessoal e a solidariedade, capazes de experimen- tar, expressar-se, comunicar-se, sentir segurança, amar, ser feliz, ter autodomínio e compreender seu contexto”. Para as crianças, ir para a escola de educação infantil é uma oportunidade de viver com um grupo ampliado de pessoas – adultos e crianças – num contexto pensado especialmente para a sua educação. A creche se caracteriza por ser um ambiente social de aceitação, de confiança, de contato corporal, brincadei- ras, conversas. Isto é, um lugar rico em possibili- dades para adquirir novas e posi- tivas experiências e linguagens: corporais, cognitivas, afetivas e emocionais. Talvez a carac- terística mais importante da creche seja o convívio, a cons- trução de relacionamentos. Enfim, Pensar a educação das crianças de 0 a 3 anos em ambientes de educação coletiva Maria Carmem Silveira Barbosa UDoutora em Ciências Sociais aplica- da à Educação pela Universidade de Campinas (Unicamp) e professora da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) 18 • revista criança
  • 19. revista criança • 19 caleidoscópio adequadas? Existem discipli- nas curriculares específicas? Necessitamos acolher os bebês e oferecer a eles tan- to as tradições culturais do seu grupo de pertença, como abrir seus olhinhos para a novidade do mundo, enrique- cendo a vida cotidiana, dan- do atenção aos detalhes, aos sentimentos, sensações, ale- grias que muitas vezes nos passam despercebidos. Na creche se educa não apenas pelo que se fala, mas por toda uma postura corpo- ral, cultural, relacional, de va- lores. Viver com intensidade as experiências que se consti- tuem diariamente nas escolas infantis e estar atento ao que acontece, realizando interven- ções adequadas é base da pedagogia com as crianças bem pequeninas. É preciso educar os sentidos, os movi- mentos, as linguagens, o pen- samento, a autonomia pesso- al e a sociabilidade. A escola não apenas sig- nifica um espaço educador para meninos e meninas, mas representa uma institui- ção com múltiplos participan- tes, como os pais e a equipe de trabalho. É um local onde todos se educam de modo colaborativo. Por isso, para organizar uma proposta pedagógica para a educação infantil, é preciso conhecer as caracte- rísticas gerais do meio social e cultural em que a escola se situa e interagir com os pais. É necessário saber que fins perseguimos, como quere- mos que nossas crianças se desenvolvam, como quere- mos que seja nossa escola e qual seu papel na comuni- dade. E assim, formular uma identidade para a escola. Referências: ODENA, Pepa. Infancia y escuela de 0 a 3 años. Barce- lona: Associacion de Maes- tros Rosa Sensat/MEC, 1995. TONUCCI, Francesco. Com olhos de criança. Porto Alegre: Artes medicas, 1999. a participação em um grupo social e a busca de sentido de pertencimento a um comu- nidade. Afinal, nós humanos somos seres sociais. Na escola infantil as crian- ças aprendem as combina- ções para o convívio social, aprendem a integrar-se com outras crianças, a trabalhar em grupos, a dividir os brin- quedos e também a atenção da professora, a cuidar das suas coisas (organizar, em- prestar e guardar) e das dos demais. Também ali desen- volvem o senso de respeito público e de coletividade. Como afirma Tonnucci (1999), nos constituímos a partir das “pequenas atividades cotidia- nas”, pois estas, ao tornarem- se hábitos, fundamentam a autonomia das crianças. Assim, trabalhar com be- bês (0 a 3 anos) não é fazer uma creche ou jardim de in- fância simplificado, adaptado e, muitas vezes, de baixa qua- lidade. Ao contrário, trabalhar com bebês vai exigir a cons- trução de novas respostas, de outras formas de exercitar e pensar a pedagogia. Educar bebês em espa- ços de educação coletiva é pensar em um desafio à edu- cação escolar como ela tem sido realizada até hoje. Os be- bês causam-nos indagações, como: o que deve constar em um currículo para crianças de 1 e 2 anos? Qual o papel da avaliação pedagógica numa turma de 3 anos? Quais as metodologias de trabalho
  • 20. 20 • revista criança matéria de capa educação de crianças pequenas em instituições de edu- cação infantil é reconhecida como um investimento ne- cessário para o seu desenvolvimento integral desde os primeiros meses. Não há o que discutir, todos têm direito à educação de qualidade. O acesso à creche e à pré-escola é um direito constitucional de toda criança. Entretanto, não é bem isso o que acontece. No Brasil, 67% das crianças de 4 até 5 anos estão matriculadas em institui- ções de educação infantil e na faixa etária de 0 até 3 anos o atendimento é de apenas 15%. Estes dados comprovam que a meta do Plano Nacional de Educação (PNE) de ampliar o atendimento das crianças de 0 a 3 anos para 50% e das crian- ças de 4 a 5 anos e 11 meses para 80%, até 2011, está muito longe de ser alcançada. Portanto, um dos desafios da polí- Programa apóia a construção de creches e pré-escolas e dá assessoria a municípios A Proinfância matéria especial
  • 21. revista criança • 21 matéria especial tica educacional é ampliar a oferta da educação infantil pública para receber todas as crianças que demandam atendimento. Este atendimento deve ser oferecido em ambientes adequados, preferencialmen- te planejados para este fim, Foto:ArquivoFNDE Foto:ArquivoFNDE Foto:ArquivoFNDE pois o espaço físico é um dos componentes educativos, e este ambiente deve incenti- var o desenvolvimento inte- gral das crianças. Tendo em vista que muitos municípios brasileiros apresentam ne- cessidades técnicas e finan- ceiras para ampliar a oferta e atender com qualidade esta primeira etapa da educação básica, o governo federal criou o Programa Nacional de Reestruturação e Apa- relhagem da Rede Escolar Pública de Educação Infantil (Proinfância), com o objetivo de possibilitar a construção, a reestruturação e a aquisição de equipamentos para a rede física da educação infantil. O programa, criado em 2007, é uma das ações do Plano de Desenvolvimento da Educação (PDE), que busca garantir o direito das crianças de até 5 anos e 11 meses à educação infantil de qualida- de na rede pública de ensino. A elaboração do projeto arquitetônico do Proinfância considerouasorientaçõesdos Parâmetros Básicos de Infra- estrutura para Instituições de Educação Infantil (MEC/SEB/ COEDI, 2006) e a legislação correlata, garantindo a aces- sibilidade, a segurança, a hi- giene, além de espaços para brincar e interagir com adultos e outras crianças.
  • 22. 22 • revista criança O Proinfância irá atender municípios avaliados por um conjunto de indicadores sociais, demográficos populacionais e educacionais com maior núme- ro de crianças com idade até 5 matéria especial Construção adequada O prédio financiado pelo Proinfância poderá atender, em período integral, até 112 crianças e contará com os se- guintes ambientes: Área de Serviços: Lavanderia Rouparia Serviços gerais (área descoberta/ GLP/Lixo) Depósito de material de limpeza Sanitários/vestiário para funcionários Circulação Área administrativa: Recepção Secretaria Almoxarifado Sala de professores/reunião Sala da diretoria/coordenação Sanitários Área de circulação Área de Alimentação: Refeitório Cozinha Preparo Cocção Distribuição Lactário Lavagem de utensílios Lavagem de panelas Recepção e Estocagem Alimentos não perecíveis (despensa) Alimentos perecíveis (freezer/geladeira) Área Pedagógica: Creche I – 0 a 11 meses Acesso/escaninhos Sala de atividades Sala de repouso Brinquedos/alimentação Banho/fraldário Solário/varanda Creche II - 1 ano a 2 anos Acesso/escaninhos Sala de atividades Sala de repouso Banho/banheiro Solário/varanda Creche III – 2 anos a 3 anos Acesso/escaninhos Sala de atividades Sala de repouso Solário/varanda Pré-Escola - 4 anos a 5 anos Sala de atividades Solário/varanda Sala Multiuso (TV, DVD, biblioteca) Informática
  • 23. revista criança • 23 Para iniciar o trabalho de assessoramento técnico-peda- gógico, os municípios contem- plados com o programa foram divididos em pólos. Nos meses de abril e maio, foram realiza- das reuniões em cada pólo com representantes da área pedagógica das secretarias municipais de Educação bem como representantes do setor de obras destes municípios. Além dos dirigentes e téc- nicos municipais, participaram destes encontros representan- tes de conselhos municipais e estaduais de Educação, fóruns de educação infantil, universi- dades, da União Nacional dos Dirigentes Municipais de Edu- cação (Undime) e outros parcei- ros.Comisso,foiarticuladauma rede de colaboração à política de educação infantil, de modo que os municípios e entidades possam se apoiar mutuamente na elaboração e implantação das ações necessárias. Nas reuniões, surgiram as mais diversas demandas, a partir das quais o Ministério da Educação, por meio da Coor- denação-Geral de Educação Infantil (Coedi), irá definir uma agenda de assessoramento técnico aos municípios con- templados com o Programa. Ou seja, ao mesmo tempo em que as obras serão realizadas, os dirigentes municipais de educação receberão assistên- cia técnica pedagógica sobre autorização de funcionamento, critério de matrícula, quadro de recursos humanos, rotinas de atendimento, projeto arquitetô- nico e relação com as famílias. Para as professoras Sílvia Degaraes e Adriana Librelot- to, da Secretaria de Educação de Campo Verde (MT), essas reuniões promoveram o forta- lecimento dos municípios, pois trouxeram subsídios para a construção de uma política de educação infantil. O Proinfância, portanto, não se restringe à construção de novas instalações, mas é um programa de apoio e fortaleci- mento à política de educação infantil. Para a coordenadora- geral de educação infantil da Secretaria de Educação Bá- sica do MEC, Rita Coelho, os encontros foram importantes para orientar os representan- tes municipais de que a cons- trução que estamos realizando precisa estar a serviço de uma proposta pedagógica consis- tente, a fim de assegurar edu- cação infantil de qualidade. Para Cássia Vilanova, as- sessora da Secretaria de Educação de Itabuna (BA), o ProInfância contribui para que os municípios ofereçam edu- cação de qualidade. Segun- do a professora, “a educação das nossas crianças também passa pelo ambiente onde elas participam e interagem. E interagir em um ambiente pen- sado, construído e organizado para a infância, juntamente com profissionais comprome- tidos com a qualidade social da educação, é um direito de nossas crianças”. anos e 11 meses, com índice de vulnerabilidadesocialmaisaltoe que disponham de educadores com formação adequada para atuar na educação infantil. No dia 19 de maio de 2008, para marcar o primeiro ano do PDE, houve em Brasília um en- contro com prefeitos de todo o país. No evento, o MEC liberou o pagamento dos 496 primei- ros convênios celebrados com municípios para construção de 515 instituições de educação infantil. Posteriormente, foram conveniados mais 500 muni- cípios. Estão previstas cerca de 1.000 novos convênios até o fim de 2009. No encontro com os prefeitos, o ministro da Educação, Fernando Haddad, destacou que é preciso eqüa- lizar as oportunidades educa- cionais: “Não importa onde a criança nasça, seu direito de aprender deve ser garantido”. Apoio técnico Para garantir a qualidade e assessorar os municípios na for- mulação da política de educa- ção infantil, o MEC disponibiliza, além do apoio técnico e finan- ceiro para a realização da obra, assessoramento pedagógico para os municípios organizarem ofuncionamentodasinstituições de educação infantil. Foto:ArquivoFNDE matéria especial
  • 24. 24 • revista criança artigo Um pouco de história A educação das crianças em creches e pré-escolas no Bra- sil, direito reconhecido na Constituição de 1988, tem sua história marcada por mobilizações sociais. Na década de 1970, foram os movimentos de mulheres e os de luta por creche seus maiores pro- tagonistas. Nos anos que precederam a Constituição, a defesa do direito foi ampliada com o movimento Criança e Constituinte, que incorporou diferentes segmentos da sociedade. Garantiu-se, assim, na Carta Magna e, posteriormente, no Es- tatuto da Criança e do Adolescente (ECA), o reconhecimento da condição de sujeitos de direitos às crianças e adolescentes, atri- buindo-lhes prioridade nas várias políticas públicas. Entre esses direitos estava o de atendimento em creches e pré-escolas para as crianças até 6 anos de idade. O início dos anos 1990 caracteriza-se pela discussão das le- Pelo direito à educação infantil: Movimento Interfóruns de Educação Infantil do Brasil Ângela Maria F. Rabelo Barreto Doutora em psicologia pela Universidade de Brasília (UnB) e membro do Comitê Diretivo do Movimento Interfóruns de Educação Infantil do Brasil (Mieib). Foto: Arquivo Coedi
  • 25. revista criança • 25 gislações que irão regulamentar vários temas constitucio- nais. Promulgam- se o ECA (1990) e a Lei Orgânica da Assistência Social (1993), ambos de fundamental im- portância para a infância e a adoles- cência. A área edu- cacional vive um debate mais longo e difícil em torno da Lei de Diretrizes e Bases da Educa- ção Nacional (LDB), que transcorre mais da metade da dé- cada sem ser apro- vada pelo Congres- so Nacional, o que ocorreria somente em dezembro de 1995. Nesse período, no vazio de- corrente da inexistência da lei maiordaeducação,oMinistério da Educação toma a iniciativa de definir, com os outros seg- mentos educacionais, uma po- lítica nacional para a educação infantil, consoante com os pro- jetos de LDB que tramitavam no Congresso Nacional. Os representantes de instituições convidados a discutir a propos- ta de política do Ministério, mui- tos deles participantes do mo- vimento Criança e Constituinte, propõem a criação de uma Co- missão Nacional de Educação Infantil (CNEI), com o objetivo de formular e implementar po- líticas na área. A CNEI atuou de 1993 a 1996, e em alguns es- tados foram criadas comissões estaduais com formato e objeti- vos semelhantes. O ano de 1994 representou momento de significado espe- cial para a educação básica com a realização da Conferên- cia Nacional de Educação para Todos. Um dos eventos pre- paratórios à Conferência foi o I Simpósio Nacional de Educa- ção Infantil, no qual se discutiu e aprovou a Política Nacional de Educação Infantil, com o apoio da CNEI. Em 1996, no bojo da pre- paração do II Simpósio Nacio- nal de Educação Infantil e IV Simpósio Latino-Americano de Atenção à Criança, reuniões estaduais e seminários regio- nais estimularam a criação de comissões ou fóruns de edu- cação infantil em estados que ainda não os possuíam. Em 1999, percebendo a ne- cessidade de articulação na- cional em torno da defesa do direito à educação infantil, in- tegrantes dos fóruns de Minas Gerais, Rio de Janeiro e São Paulo convidaram outros fóruns para discutir como fazê-la. Em reuniões entre representantes desses três estados e do Ce- ará, Mato Grosso do Sul e de Santa Catarina, constituiu-se o Movimento Nacional de Edu- cação Infantil do Brasil, com a sigla Mieib. O que é e pelo que luta o Mieib Constituído por fóruns esta- duais, regionais e municipais de educação infantil, que se organizam de forma autônoma em cada local e se integram na- cionalmente por uma pauta de lutacomum,oMieibéumespa- ço de discussão e articulação suprapartidário, comprometido com a expansão e melhoria da qualidade da educação infantil no Brasil. O Mieib é aberto à participa- ção de todos os interessados na educação infantil. De modo geral, participam dos fóruns e do Mieib órgãos governamen- tais na área da educação, as- sistência social, saúde, justiça e outros; organizações não-go- vernamentais; instituições de ensino superior, ensino médio e outras que atuam com a for- mação de professores; con- selhos estaduais e conselhos municipais de educação, con- selhos de direito da criança e do adolescente, conselhos de assistência social e outros; re- presentantes de creches e pré- escolas públicas e privadas, famílias, comunidades e sindi- catos; instituições de pesquisa; professores e pesquisadores. O Movimento possui um comitê diretivo, eleito a cada dois anos em encontros nacionais. A atuação do Mieib é orien- tada por princípios básicos, como garantia do direito cons- titucional das crianças de até 6 anos à educação infantil, in- dependentemente de raça, gê- nero, etnia, credo e condições socioeconômicas; concepção de criança como sujeito de di- reitos, ativo e participativo no seu contexto histórico-cultural; indissociabilidade do cuidar e do educar; respeito ao direito artigoartigo
  • 26. 26 • revista criança Executiva, atualmente sediada no Centro de Cultura Luiz Frei- re, em Pernambuco, e com o site www.mieib.org.br. OMieibtambémparticipade diferentes instâncias e redes de defesa dos direitos da criança e da educação, para as quais contribui com seus posiciona- mentos e mobilizações. Desta- cam-se entre elas a Campanha Nacional pelo Direito à Educa- ção, que coordenou o “Fundeb pra Valer!”, a Rede de Monito- ramento Presidente Amigo da Criança e a Rede Nacional Pri- meira Infância. Tem represen- tação no Comitê Nacional de Políticas de Educação Básica do MEC, o que lhe possibilita intervir nas discussões das po- líticas e ações do Ministério na área da educação infantil. Em abril de 2008, o Mieib participou da Conferência Na- cional de Educação Básica, contribuindo para assegurar lugar de destaque à educação das crianças até 6 anos na pau- ta das políticas de educação. da família de optar pelo aten- dimento na educação infantil; reconhecimento da educação infantil como primeira etapa da educação básica; garantia de inclusão das crianças com defi- ciência nas classes comuns de educação infantil. Sendo sua finalidade defen- der coletivamente a garantia do direito das crianças de até 6 anos ao atendimento na educa- ção infantil, o Mieib tem como bandeiras de luta a ampliação de vagas em creches e pré-es- colas; a destinação de recur- sos públicos adequados para a educação infantil; a melhoria da qualidade do atendimento; a formação e valorização dos profissionais da educação in- fantil; a implementação da pro- posta pedagógica elaborada de forma democrática e par- ticipativa pelas instituições de educação infantil. Além dessas, que podem ser consideradas de caráter permanente, outras são de na- tureza conjuntural e respondem a problemas decorrentes de momentos históricos vi- vidos pela educação in- fantil no país. Assim, são pontos fundamentais da luta do Mieib a integra- ção das instituições de educação infantil públi- cas e privadas, aos sis- temas de ensino; o esta- belecimento de normas para o funcionamento e regularizaçãodasinstitui- ções de educação infan- til; e o controle social da implantação do Fundeb (Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação). No caso do Fundeb, deve ser lembrado o papel que teve o Mieib na luta vitoriosa pela in- clusão das creches nesse im- portante mecanismo de finan- ciamento da educação básica no Brasil. As carrinhatas e o mo- vimento “Fraldas Pintadas”, que contaram com a mobilização e participação das instituições comunitárias, engrossaram a iniciativa “Fundeb pra Valer!”, que tinha entre seus principais pontos a inclusão da creche no Fundo. Com essa vitória, muitas crianças excluídas do atendi- mento em creches e pré-esco- las poderão ter a oportunidade de freqüentá-las e se beneficia- rem efetivamente da primeira etapa da educação básica. Nos últimos anos, o Mieib participou de pesquisas e pu- blicações sobre a qualidade da educação infantil, o custo-alu- no, entre outras. Para sua atua- ção, conta com uma Secretaria Foto: Arquivo Coedi artigo
  • 27. revista criança • 27 professor faz literatura ara ser professor, fizeram-me acreditar que precisaria de muito pouco, talvez quase nada. Ser alguém esperto, ter imaginação, usar da criatividade, ler alguns livros, responder o que for preciso, saber utilizar a palavra, ouvir quando necessário, calar em momentos determinados, cantar só quando for convidado, não sorrir de coisas bobas, chamar a atenção para manter a disciplina, cumprir o conteúdo, planejar o trivial. Com o passar do tempo, descobri que fui enganado pelo didático. Na caminhada da profissão, tudo o que pensei ter aprendido não passou de ilusão. Lidar com gente não é fácil não. Além de teorias e métodos revolucionários, é preciso mais do que saber. Ensinar não é passar instrução para a criança aprender. Professor tem que ser ator, cantor, mágico, palhaço, artista, malabarista, um pouco de mãe e às vezes ter jeito pai. Tem que expor emoção, pôr sentimento no que faz, mexer com o coração, ter paciência e compreensão. Pois ser professor, na verdade, é ser gente que constrói não só personalidade. Contribui na formação do caráter, guia nos caminhos da aprendizagem, auxilia na formação do cidadão. Ser professor é mais que uma profissão. Afinal, o que é ser professor? Alessandra Regina Braga Veloso P revista criança • 27 Pedagoga, atuando como professora de educação infantil no Distrito Federal.
  • 28. 28 • revista criança relato bservar o aluno em sala de aula é o primeiro passo para o sucesso do professor e o desenvolvi- mento da criança. Foi o que demonstraram os projetos se- lecionados pelo Prêmio Pro- fessores do Brasil – 2ª edição. Dez professores da educação infantil e nove das séries ini- ciais (1ª a 4ª) do ensino fun- damental da rede pública re- ceberam, cada um, R$ 5 mil, troféu e diploma, em cerimô- nia realizada no dia 15 de ou- Professores premiados do Brasil Prêmio Professores do Brasil reconhece profissionais que constroem o conhecimento a partir da realidade das crianças Heloisa d’Arcanchy Brasília/DF tubro, em Brasília. O prêmio é oferecido pelo Ministério da Educação em parceria com a Fundação Bunge, Funda- ção Orsa, Conselho Nacional de Secretários de Educação (Consed) e União Nacional dos Dirigentes Municipais de Educação (Undime). No dia seguinte à premia- ção, os 19 educadores que se destacaram entre os 1.564 inscritos no ano de 2007, par- ticiparam de um seminário, no qual puderam apresen- O
  • 29. revista criança • 29 relato tar e discutir suas experiên- cias. Para quem assistiu, fi- cou claro que professores e professoras deixaram de ser meros repassadores de co- nhecimento. Eles constroem esse conhecimento com os alunos, a partir da realidade deles, do que eles gostam e do que precisam trabalhar. O resultado são crianças moti- vadas com a escola. E tam- bém familiares e comunidade envolvidos com a educação de suas crianças. “O mérito principal do prê- mio é incentivar o registro das práticas realizadas em sala de aula”, salienta a diretora de Políticas de Formação, Mate- riais Didáticos e Tecnologias para a Educação Básica do Ministério da Educação, Jea- nete Beauchamp. “Entende- mos que, quando o professor registra a sua prática, ele faz uma reflexão sobre o próprio trabalho e também constrói saberes pedagógicos”. As experiências premiadas serão reunidas em uma pu- blicação e distribuídas para as secretarias de Educação de todo o país. “Mais do que estabelecer uma competição, pretendemos divulgar os tra- balhos que vêm sendo reali- “Quando o profes- sor registra a sua prática, ele faz uma reflexão sobre o próprio trabalho e constrói saberes”. zados nas escolas brasileiras e que podem servir de mode- lo para outros educadores, evidentemente com as devi- das adaptações às diferentes realidades”, observa Jeanete. Para Giovana Barbosa, coordenadora de projetos da Fundação Orsa, que investe há mais de 13 anos em pro- jetos e programas voltados para a infância, o prêmio re- vela o desenvolvimento da prática do professor e reforça a importância das parcerias entre Estado e sociedade. “O prêmio nos permite conhecer o que está acontecendo em cada cantinho deste Brasil, como esse profissional se destaca hoje, qual conheci- mento teórico ele tem, como ele une essa teoria à prática olhando para as coisas espe- cíficas de suas regiões”.
  • 30. 30 • revista criança relato Cultura A professora Maria Aparecida Rodrigues da Costa queria trabalhar a questão da vio- lência em sala de aula, por causa da atitu- de dos alunos diante de determinadas situ- ações. Mas os caminhos que ela escolhia não eram bem aceitos pelos estudantes de 6 anos. Quando percebeu o interesse deles pelo caranguejo, muito comum na Ilha das Caieiras, em Vitória (ES), onde fica o Centro Municipal de Educação Infantil (CMEI) Padre Giovanni Bartesaghi, decidiu aprofundar o conhecimento da meninada sobre o ambien- te em que viviam e realizou o projeto “A Cul- tura de uma ilha no coração capixaba”. Os alunos refletiram sobre a poluição do meio ambiente, envolveram-se rapidamente em atividades, conheceram como se fabrica a panela de barro usada para fazer a mo- queca de caranguejo e visitaram um restau- rante típico da região. Além da parceria com empresários locais, a escola contou com a participação de estudantes da Universidade Federal do Espírito Santo, que ensinaram técnicas de grafismo, cerâmica e pintura em negativos. Durante o processo, os alunos re- Negros O projeto começou quando os alunos de 3 anos da professora Geanne Duarte Polini excluíram uma coleguinha negra das brinca- deiras. A professora procurou a pedagoga do CMEI Jacynta Ferreira de Souza Simões, em Vitória (ES) e, juntas, trabalharam o tema das diferenças a partir da literatura infantil. O livro Menina Bonita do Laço de Fita, da es- critora Ana Maria Machado, caiu como uma luva: conta a história de uma linda menina negra, que engana o coelho sobre o segredo de ser tão pretinha: - “é só tomar café”, diz a menina. A partir do interesse pela história, a profes- sora desenvolveu o projeto “Somos diferen- tes. Ninguém é igual a ninguém” e montou estratégias de trabalho para que as crianças percebessem que no mundo há diferenças e existe beleza nisso. “Nós fizemos a receita do café na sala para que os alunos percebes- sem que não adianta tomar café, cada um nasce de um jeito; fize- mos passeios pela ci- dade para observar as diferentes flores, cada uma com sua beleza; comparamos animais e visitamos um viveiro de coelhos de diversas cores, todos belos”, conta a professora. Oficinas de trança afro, teatro e compras no supermercado para o aniversário da boneca ajudaram as crianças a respeitar as diferen- ças e ainda trabalhar a matemática. Índios A cultura indígena foi trabalhada pela professora Fran- cimaura Miranda de Souza, no projeto “Conhecer para Respeitar”, da EMEI Balão Mágico, em Rolim de Moura (RO). A professora usou material de leitura e fotografias que tirou durante uma visita a duas aldeias para mostrar que os indígenas são muito parecidos com os brancos. “Antes eles eram vistos como seres mitológicos da flo- resta”, explica. vitalizaram o espaço do refeitório, aprenden- do a gostar mais da escola e a respeitar os colegas.
  • 31. revista criança • 31 relato Meio ambiente Na Escola Municipal de Educação Infantil Maria Rosa do Prado, em Montividiu (GO), a professora Rosemeire Freitas Carvalho se in- comodava com o desmatamento acelerado da pequena cidade. Sentia falta da sombra das árvores, dos animais, do canto dos pás- saros. Mais do que falar sobre o meio am- biente, ela queria que os próprios alunos – de 4 a 6 anos – percebessem a importância da preservação da natureza. Uma solução foi levar fotografias antigas da cidade e perceber como esses lugares estão atualmente. Com jornais e revistas, observaram também paisagens de outros municípios. Durante o projeto “Não quere- mos ‘meio ambiente’, queremos o ‘ambiente inteiro’”, a turma fez passeios para conhecer os novos bairros que surgiam e observaram o rio tomado pelo lixo das construções. “Foi nesse momento que eles se integraram ao trabalho. Não pudemos fazer o piquenique. Não havia uma árvore para dar sombra”, re- lata a educadora. A professora Rosemeire conta que as crian- ças passaram a cobrar ações nesse sentido. “Um dos alunos não tinha árvore perto de casa e o pai precisou arrumar um lugar pra plantá- la. E quando eu falava em construir uma casa, eles perguntavam: - “tem como plantar uma árvore perto dessa casa?” Cientistas mirins Era uma vez uma libélula no pátio da esco- la. E a professora atenta transformou o caso em pesquisa científica. “Pequenos Pesquisa- dores, Grandes Descobertas” é o projeto de Rosimere Dobrowolski Oteka, que leciona no CMEI Santa Isabel, em Ponta Grossa (PR). Ela desenvolveu o que se chama “escuta sensí- vel”. Quando o professor está atento àquilo que os alunos falam ou fazem, ele consegue perceber qual é realmente a necessidade das crianças. E aproveita o interesse delas para despertar o gosto pela aprendizagem. Depois da libélula, encontraram abe- lhas, joaninhas, grilos... “Os alunos ficaram fascinados com os tamanhos, as cores, as diferenças entre os insetos. Foi possível de- senvolver e articular a curiosidade com as outras áreas do conhecimento”. As crianças registraram as descobertas com desenhos e textos coletivos, experimentaram pintura com tinta feita de terra, tinta guache, recorte e colagem. Também houve um trabalho de conscientização sobre a dengue. “Se nós perguntarmos para elas sobre a dengue, elas sabem os cuidados que devemos to- mar”, observou Rosimere. Figurinhas Quem não gosta de montar um álbum e trocar figurinhas? Melhor ainda se elas for- marem a sua própria história! Foi o que pen- sou a professora Luciene Silva de Sousa, da Escola Estadual de Ensino Fundamental Re- pública, no Rio de Janeiro, quando um aluno levou um álbum desses para a aula. Surgiu o projeto “Figurinhas da Infância”. Os alunos entre 5 e 6 anos se divertiram e aprenderam enquanto completavam o álbum em que eles mesmos eram os per- sonagens. Fotos de família e ilustrações foram multiplicadas e ganharam números. Até uma banca foi improvisada para simu- lar a venda. Para completar o álbum, as crianças trocavam as figurinhas repetidas e conheciam a vida dos colegas. A história da professora Luciene Sousa, recém-chegada à Escola República, também está no álbum. Isso permitiu que os alunos a conhecessem melhor e facilitou o trabalho em sala. “No fim do ano, eles levaram para casa um álbum completo, com a história de todos. E, durante a montagem, trabalhamos a matemática, a linguagem, as diferenças, a cooperação”, relata a professora, que pro- meteu dividir o prêmio com os alunos, co-au- tores da produção.
  • 32. 32 • revista criança Final feliz Os alunos de 5 e 6 anos da professora Thelma Lílian Bighetti Sória, da EMEI 1, 2... Feijão com Arroz, em Marília (SP), não mos- travam interesse pelas histórias. Quando ela levava os livros para a sala de aula, eles pe- gavam vários ao mesmo tempo, mas logo os largavam. Motivada pela idéia de que a leitura é fun- damental para a formação de um indivíduo, a professora montou uma pequena bibliote- ca na sala. Bastaram um tapete e uma cai- xa de livros. Quando o aluno terminava uma atividade, podia folhear os livros, e quando todos terminavam, a professora contava his- tórias. “Fizemos com que eles entendessem que toda história tem início, meio e fim, e que esse final nem sempre é o que eles queriam”, conta Thelma. Princesas diferentes Três projetos trabalharam a literatura no Prêmio Professores do Brasil. Um tapete má- gico na sala de aula do Centro Educacional Infantil Padre Réus, em Palhoça (SC), levou os alunos de 3 e 4 anos da professora Mari Stela Boschetto da Silva Silveira a muitas via- gens. As crianças percorreram histórias nas quais as bruxas e os lobos podiam ser bons e príncipes e princesas tinham as mais va- riadas aparências. A intenção da professora Mari Silveira foi trabalhar com as crianças os estereótipos, tais como “o feio é mau” ou “as princesas são brancas e lindas”. Para realizar o projeto “Reconstruindo His- tórias”, a professora e os alunos construíram grandes cenários com material reciclado, como a baleia da história do Pinóquio e um castelo em que as crianças podiam entrar e brincar. Com o cenário pronto, eles recebe- ram a visita de príncipes africanos e outros personagens. O trabalho despertou a imagi- Dentes Uma reportagem num jornal local chamou a atenção das irmãs Luísa e Luciana Rita Bellin- canta Salvi, professoras da Escola Básica Municipal Santa Cruz, em Concórdia (SC). A ma- téria falava de problemas do município com a saúde bucal infantil. As professoras levaram o jornal e outros textos sobre o assunto para a aula de leitura. Rapidamente, os alunos de 4 a 6 anos se identificaram com as fotos, apontando semelhanças em suas bocas. A necessidade de promover ações educativas ficou clara. Luciana e Luísa pesquisaram em livros, revistas, internet, usaram poesias que orientavam as crianças para os cuidados com os dentes. O trabalho levou transformações para a escola. Não havia espelhos em frente às pias, mas logo foram providenciados. “Não adiantava ensinar a escovar os den- tes se a criança não pudesse visualizar a prática”, explica Luciana. Mas era preciso conscientizar também a família. A Secretaria Municipal de Saúde man- dou, então, uma dentista até a escola para orientar pais e filhos. “A criança passou a cobrar dos pais que escovassem os dentes e ainda orientavam o modo correto. Cobravam o fio dental e quiseram até ir à dentista. Perderam o medo”, conta a professora, feliz com os resultados. O projeto “Mostrando os Dentes” trabalhou diversas áreas do conhecimento e possibilitou mudanças na vida das crianças. nação das crianças, que começaram a criar as próprias versões para as histórias. relato
  • 33. revista criança • 33 Ótimas experiências podem se perder porque não foram registradas. Adotar um ca- derno de anotações é uma boa sugestão. Quando o professor escreve a sua prática diariamente e depois lê o que fez durante o ano, é capaz de perceber melhor o desen- volvimento dos alunos, onde errou, onde acertou, e redirecionar o trabalho. “Eu pego o caderno de planejamento e um outro caderno onde colocamos os pontos trabalhados no dia, que depois vão servir de reflexão. Isso me dá uma visão clara da prática e até daquilo que foi possível ou não foi possível executar”, ensina a professora Maria Aparecida Santos. Fotografias, ilustrações, tudo que puder contribuir para o registro é importante. Todos os dias, ao final das atividades, a professora Geanne Polini e os alunos registram o que fizeram naquele período. Ela escreve, eles desenham. A esse caderno ela dá o nome de “Livro Vida”. O registro da prática Gibiteca Único homem entre os professores pre- miados, Marcelo Campos Pereira, da Escola Municipal de Ensino Infantil Sonho de Crian- ça, de Pompéia (SP), apresentou o projeto “Semeando o prazer de ler com as histórias em quadrinhos”. O professor iniciou com os alunos uma campanha para montar a gibite- ca da escola. Além da leitura, eles aprende- ram sobre solidariedade. Com a ajuda dos pais, foram à rádio, ao jornal local, montaram cartazes e caixas de coleta e recolheram 300 revistinhas. Uma das técnicas utilizadas para desen- volver a leitura a partir dos quadrinhos foi montar um cartaz com vários quadros e co- brir as figuras uma a uma. Então, o professor Marcelo mostrava uma por vez. “A criança analisa as expressões dos personagens e fica mais fácil identificar as situações. Com isso trabalhamos três coisas: a inferência, pela qual a criança pode inventar uma histó- ria em cima daquele quadrinho; a questão da antecipação: você pergunta o que vai acon- tecer com o outro quadrinho coberto e ela vai ter que criar também; e a conferência: ela verifica se aquilo que ela criou realmente faz parte da história.” Com a ajuda da prefeitura, o projeto con- seguiu um trenzinho, onde os alunos do pro- fessor Marcelo, vestidos como os persona- gens dos gibis, levam para outras escolas os gibis e o gosto pela leitura. “Hoje eles têm facilidade de ler a seqüência, a localização (esquerda, direita) e desenvolveram também a escrita, porque as crianças se interessam em saber o que está dentro do balãozinho”, diz o professor, emocionado. Depois da leitura, a professora discutia com os alunos: “vocês gostaram? Porque será que ele quis fazer isso? Será que não tinha outro jeito de ele conseguir o que que- ria?” Assim, as crianças passaram a se inte- ressar mais pela leitura e começaram a levar livros para casa e recontar as histórias para as mães e os pais. E estes foram convidados a contar histórias na escola. relato
  • 34. 34 • revista criança reportagem Bebês vão ao teatro Adriana Maricato │ Brasília/DF Espetáculos criados a partir do olhar das crianças pequenas ajudam bebês a superar seus medos e angústias • revista criança
  • 35. revista criança • 35 P Pais e mães com filhos até 3 anos aguardam no sa- guão do teatro, onde são recebidos por Carlos Lare- da, diretor da companhia La Casa Incierta. Ele expli- ca as regras do jogo: crianças autônomas sentam na frente do palco e os bebês de colo ficam na segunda fileira, com os adultos responsáveis. O ambiente é pequeno e inti- mista, portanto requer silêncio – outra regra do jogo – e por revista criança •
  • 36. 36 • revista criança reportagem isso os adultos não devem explicar os acontecimentos para as crianças. “Elas nas- cem poetas, são capazes de compreender a peça”, afirma o diretor. No ambiente escuro, elas são conduzidas e acomoda- das próximo ao palco, em uma área iluminada. O que se vê pela próxima meia hora é fascinante: bebês em silên- cio, atentos ao que se passa no palco, eventualmente dan- do gritinhos, falando, baten- do palmas, pulando no colo dos pais, imitando os gestos e movimentos das atrizes. Também olham curiosos uns para os outros. Alguns deles tentam alcançar o palco, mas são impedidos de avançar – permanecer na platéia é uma das regras. Crianças que já falam repetem os nomes dos objetos em cena e palavras ditas pelas atrizes: pé, sapa- to, água, pedra, voar, peixe, mamãe. Para os adultos, o espe- táculo parece non-sense. Estímulos visuais, sonoros e verbais são simultaneamente explorados, intercalados por frases poéticas, gestos e mo- vimentos corporais das atri- zes, compondo uma narrativa não-linear. Se não faz muito sentido para os pais e edu- cadores presentes, a peça atende à capacidade percep- tiva dos bebês na platéia. A iluminação, de várias cores, é alternada com o es- curo ao longo do espetáculo. No início, os bebês sentem medo do escuro, o que é normal. O teatro os ajuda a vivenciar esse tipo de senti- mento e a superá-lo. “Pode ser o medo de perder o pai ou a mãe, uma experiência associada à morte”, explica Lareda. “A criança pequena é muito corajosa, pois é capaz de enfrentar suas emoções”. Sons, luzes, objetos, ruídos e música O diretor conta que os espetáculos de La Casa In- cierta nascem da observa- ção, durante seis meses, de crianças em creches. O con- texto familiar também é uma forte referência, já que Lare- da é pai de dois filhos com a atriz Clarice Cardell, também da companhia. Eles constro- em as peças a partir do olhar de seus bebês. Durante os espetáculos, as atrizes desenvolvem jogos de colocar-tirar, esconder-re- velar, puxar-soltar, experimen- tos com sons e luzes. Na trilha sonora, reprodução de vozes de outras crianças e música. “Existe uma idéia de que as crianças pequenas desenvol- vem a compreensão pelo veí- culo sensorial”, afirma o diretor. Ou seja, bebês viveriam num mundo sem sentido porque ainda não desenvolveram a lin- guagem verbal, compreensão que Lareda rejeita. Para ele, o sentido pode ser construí- do também a partir de outras linguagens, que os pequenos percebem: musical, oral, plás- tica, cênica e gestual. De um emaranhado de fios coloridos puxados de um lado para outro sai um úni- co fio, que é, então, cortado por uma tesoura. Uma pedra amarrada a uma corda re- presenta o bebê com cordão umbilical. Um objeto dourado em formato de meia esfera oca colocado sobre a barriga de uma atriz significa a barri- ga de uma mulher grávida. Segundo Lareda, as per- guntas mais profundas sobre existência e identidade são feitas pelos seres humanos nos seus primeiros anos. É assim que o nascimento, fato mais importante da vida e próximo da experiência dos pequenos, torna-se o tema das peças. Tudo o que se relaciona a isso – gravidez, aconchego, embalo, pre- sença (ou ausência) da mãe – acaba sendo representado. O espetáculo baseia-se numa estrutura de pensa- mento complexo, no qual vá- rias camadas são exploradas simultaneamente: os planos conceitual, emocional, narra- tivo, sensitivo e perceptivo. “O bebê tem uma percepção cinestésica do acontecimen- to”, explica o diretor. Em ou- tras palavras, as crianças pe- quenas percebem o ambiente a partir de várias sensações e sentimentos simultâneos, e reagem a todos eles. Durante a peça, as crian- ças viram a cabeça em dire- ção à origem de cada som ouvido por elas – toque de objeto metálico ou sino com vareta, batimento de pedra
  • 37. revista criança • 37 João Corbert, 2 anos e 2 meses, ao assistir “Pu- pila D’Água” em companhia da mãe e da tia, saiu do espetáculo perguntando “cadê o teatro?”. Nos dias seguintes, pediu várias vezes para voltar lá e apontava a foto da peça no “livro do teatro” (pro- gramação do festival Cena Contemporânea), onde tinha “a moça”. Uma semana após sua primeira experiência, João largou o brinquedo favorito ao ser convidado para ver fotos do “teatro”, disponíveis na internet. Ele apontava cada imagem e, do seu jeito, descrevia sensações e sentimentos: identificou o escuro e a cena em que sentiu medo, descreveu objetos. Esti- mulado a falar, disse “eu vi o peixinho”; sobre a atriz, afirmou que “fez água”, “fez sapato”, “fez barulho”, “coitado do sapato”. Lembrou-se de que o sapato era colocado na árvore. Depois de cinco minutos, já cansado, disse “eu vou desligar” (o computador). “O bebê não é uma página em branco”, afirma Clarice Cardell; “ele tem abertura total para a mú- sica, os gestos”. Atriz da companhia, Clarice acha que cada espetáculo é uma oportunidade de ser transparente: “trata-se de um mundo muito profun- do e intenso, é difícil fazer caras e bocas para os bebês, você se sente na corda bamba”. Em determinado momento da apresentação de “Pupila D’Água”, as atrizes batem os sapatos ver- melhos no chão, produzindo seqüências de som e silêncio. Em Brasília, um menino com uma chupeta na boca e uma fralda na mão, em pé, sapateou no mesmo ritmo das batidas, levantou os braços e gi- rou, imitando os gestos das atrizes em cena. Para manter a relação com a platéia, que é muito frágil, as atrizes enfocam o bebê, que também está em cena. No espaço pequeno, as crianças ficam muito próximas ao palco. Eventualmente, Clarice olha para os olhos de um dos bebês e se aproxima; ele corresponde ao olhar e se mantém atento. “Eu me permito me perder nesses olhares, eles me ali- mentam”, diz a atriz. O mundo dos bebês reportagem ou sapato no chão, fala das atrizes, música, gritos de be- bês gravados, despejo de grãos, água escorrendo. A pesquisadora canaden- se Sandra Trehub, da Univer- sidade de Toronto , descobriu que os bebês têm percepção musical muito desenvolvida, comparável à de músicos profissionais. Eles reconhe- cem tons, melodias, tonali- dades e ritmos, memorizam seqüências musicais e perce- bem padrões em canções de diferentes culturas. Segundo tais pesquisas, o ser humano nasce com essa habilidade e a perde durante o processo de crescimento, pois a expo- sição a um único padrão limi- ta a percepção musical. Os bebês são muito sensí- veis e abertos não somente à música, mas também às de- mais linguagens. As peças de La Casa Incierta favorecem a contemplação ativa, pois for- necem elementos para a in- terpretação dos pequeninos da platéia. A essa experiên- cia, Lareda contrapõe a con- templação passiva, “propor- cionada pela televisão e por determinada literatura, que não colocam perguntas para as crianças”. Reações das platéias O teatro para bebês foi de- senvolvido na França, entre as décadas de 1980 e 1990. A companhia La Casa Incierta começou a produzir esse gê- nero teatral a partir de 2002,
  • 38. 38 • revista criança na Espanha. Até setembro de 2007, o grupo havia feito mais de 400 apresentações de “Pupila D’Água” e mais de 800 de “A Geometria dos So- nhos”, na Europa e no Brasil. La Casa Incierta apresentou as duas peças, entre agosto e setembro de 2007, em Bra- sília (DF), Rio de Janeiro (RJ) e São Paulo (SP). As platéias reagem de acordo com o local, a cultura e a situação em que os be- bês assistem ao espetáculo, se acompanhados dos pais ou com a creche. Por exem- plo, “quando o adulto sente medo de que o bebê tenha medo, o bebê fica apreensi- vo”, relata Lareda. No Rio de Janeiro, o dire- tor notou que o público adulto não faz diferença entre os es- paços do palco e da platéia, “o oposto do que acontece na Rússia, onde o palco é um espaço sagrado”. Nas apre- sentações em São Paulo, ele observou a existência de uma unidade física muito grande entre pais e filhos, “provavel- mente porque passam pouco tempo juntos”; os bebês não se aventuram sozinhos. Em apresentações para creches em Brasília, Lareda percebeu certa teimosia da platéia no início do espetá- culo, que ele atribui a rela- ções familiares não conhe- cidas – como muita pobreza e carência – à ausência das mães, ou por não se sentirem acolhidas pelos adultos. Uma dessas apresentações come- çou com uma choradeira co- letiva; depois, as crianças se acalmaram. Num dos espetáculos apresentados para creches, em São Paulo, havia uma criança que se manteve mui- to contida, relata Lareda. Tra- tava-se de “A Geometria dos Sonhos”, em cujo encerra- mento a atriz repete a palavra “mamãe” várias vezes, em tom de angústia, como um bebê à procura de sua mãe. Depois da peça, a atriz foi conversar com esta criança e a abraçou. A criança chorou e contou que não tinha mãe. “Chorar é bom para a saúde”, sentencia o diretor. reportagem
  • 39. revista criança • 39 A menina que roubava livros Autor: Markus Zusak Tradutora: Vera Ribeiro Editora: Intrínseca Magda P. Muller Lopes A Menina que roubava livros é uma obra poética, inusitada, arrebatadora, que emo- ciona, desperta alegria, mas também tristeza e revolta. Entre 1939 e 1943, na Alemanha nazista, a menina Liesel Meminger sobrevive a três encontros com a Morte, o que impres- siona a ”ceifadora de vidas”, que decide en- tão contar a história. Desde que foi deixada na rua Himmel, aos cuidados de Hans Hubermann, um amável pintor desempregado, e sua espo- sa Rosa, uma dona de casa ranzinza, Lie- sel busca o sentido de sua vida. Ao chegar à casa dos Hubermann, a menina trazia consigo O Manual do Coveiro, seu primei- ro livro, furtado do rapaz que enterrou seu Os corvos de Pearblossom Autor: Aldous Huxley Ilustradora: Beatrice Alemangna Tradutor: Luiz Antonio Aguiar Editora: Record Nada como ler uma história com perso- nagens que parecem velhos conhecidos nossos. Quem nunca soube de uma cobra egoísta e gulosa? De uma coruja sábia que sempre tem solução para tudo? De um casal de corvos formado por uma mulher faladei- irmãozinho, horas antes de ela ser entregue aos pais adotivos. Foi o primeiro de uma série de livros rou- bados nos quatro anos seguintes. O gosto por roubá-los tornou-se, então, uma ocupa- ção para Liesel. As histórias dos livros rouba- dos e de outros que ganhou de aniversário passam a nortear e dar certo sentido à sua existência, em meio à miséria, à morte e à destruição provocadas pela guerra. Além do encontro e das vivências pro- porcionados pela leitura dos livros, outros encontros foram fundamentais na história da menina. Primeiro com Hans, seu amoro- so pai adotivo, que a ensinou a ler. Depois, com Rudy, companheiro de aventura. Com a mulher do prefeito, com quem desenvolve certa cumplicidade. E, finalmente, com Max, o judeu escondido no porão, sobre o qual ju- rou nunca falar. Personagens que marcaram sua vida para sempre, nesta época sombria, mas também rica de aventuras infantis e sen- timentos nobres. Toda a narrativa é intercalada por comen- tários geniais e reflexões inusitadas da nar- radora Morte sobre o ser humano. Segundo ela, por exemplo, a humanidade pode ser “tão medonha e tão gloriosa, e ter palavras e histórias tão amaldiçoadas e tão brilhantes”. resenha
  • 40. 40 • revista criança O título faz uma pergunta para a gente pensar. A forma circular, como a da roda, com sua linha curva, pode virar um quadra- do com lados e ângulos iguais? A pergunta é danada. Pense. Pode? Ah, não pode. Será? São formas tão diferentes uma da outra. Uma coisa pode se transformar em outra? Posso me transformar naquilo que não sou? Mas preste atenção, mágica aqui não vale. Ah, não! É preciso encontrar outro modo de re- solver essa questão. Primeiro, um passeio por formas bem re- dondas como a bola, o pneu, o queijo, a lua em certas noites. Depois, você vai descobrir que o redondo faz também galinha, porco, gato, em imprevistas aventuras da forma. Mas como o redondo vai conseguir fazer o quadrado? Vendo uma fila de redondos a gente pode ter uma idéia. A solução? Sem truque nem mágica? Só na página 22. Percorrendo as páginas deste livro, perce- be-se que muita coisa que parece impossível no primeiro momento na realidade não é. A questão é pôr a cabeça para funcionar. Aí, até o redondo pode ficar quadrado. O título faz parte do Acervo 1 – Literatura na infância: imagens e palavras – PNBE/2008 para a Educação Infantil. Um redondo pode ser quadrado? Autor e ilustrador: Canini Editora: Saraiva ra e um marido que nem lhe dá bola? Essa história de Aldous Huxley, famoso escritor in- glês, tem todos esses personagens juntos e um final muito engraçado. Imagine o que o casal de corvos, com a ajuda da coruja, fez para se livrar da cobra que come os ovos do ninho deles. Nem pen- se em ações violentas. A solução está em um plano bem bolado. Pare a leitura antes do final e tente descobrir o resultado. Depois, vá até a última página e descubra sorrindo como uma cobra pode ser útil para um casal de corvos com muitos filhos. O título faz parte do Acervo 2 – Literatura na infância: imagens e palavras – PNBE/2008 para a Educação Infantil. resenha
  • 41. revista criança • 41 A Coordenação Geral de Educação Infantil (Coedi) tem recebido inúmeras consultas sobre a Lei nº 11.274, de 6 de fevereiro de 2006, que esta- belece a ampliação do ensino fundamental para 9 anos exi- gindo que as crianças sejam matriculadas nessa etapa da educação básica a partir dos 6 anos completos. A maior parte delas levanta dúvidas sobre a faixa etária a ser aten- dida pela educação infantil. É importante que todos os profissionais das creches e das pré-escolas estejam bem informados sobre o assunto e tenham condições de ajudar as famílias a respeito do tema. Por isso, buscamos nesta seção Cartas esclarecer a questão. A Lei 11.274 se baseia no princípio de que, para uma par- cela da população brasileira que não tem acesso à educa- ção infantil, antecipar a idade de ingresso no ensino funda- mental significa a garantia de um ano a mais de educação básica para as crianças. Os municípios possuem prazo até 2010 para implantar o ensino fundamental obriga- tório de 9 anos. Nos municí- pios que já criaram as condi- ções para o cumprimento da lei, todas as crianças que já possuem 6 anos ou irão com- pletá-los ainda no início do ano letivo devem ser matricu- ladas no ensino fundamental. Mas, atenção! Para as crianças que já freqüentam a educação infantil, essa medi- da não eliminou a pré-escola, apenas diminuiu a duração do chamado período pré-escolar para um grupo de crianças: aquelas que têm 6 anos com- pletos no início do ano. É fundamental explicar aos pais e familiares que esta criança não está pulando ou perdendo um ano. Ela apenas vai freqüentar este ano no en- sino fundamental e não mais na educação infantil. Vale destacar que a educa- ção infantil continua atendendo criançasquecompletam6anos no decorrer do ano letivo. Trata- se de uma alteração na forma de organizar a distribuição das crianças no percurso escolar. Essa alteração exige das insti- tuições de educação infantil e das escolas de ensino funda- mental uma revisão ou ajuste na proposta pedagógica. Tal medida busca regula- rizar uma ambigüidade his- tórica do sistema educacio- nal brasileiro: crianças de 6 anos já eram matriculadas no ensino fundamental há muitos anos, mas na medi- da da disponibilidade de va- gas da rede de ensino local. A novidade da Lei 11.274 é colocar como central o direi- to da criança e não subor- dinar esse direito à ”capaci- dade física e financeira das redes de ensino”. Nesse contexto, é impor- tante não permitir a matrícula de crianças com menos de 5 anos e 10 meses no en- sino fundamental. Quando isto ocorre, fica caracteriza- do o desrespeito ao direito da criança de 0 a 6 anos à educação infantil. Além disto, desconsideram-se as carac- terísticas desta etapa da vida e fragiliza-se a concepção de educação infantil. Não respeitar o corte etá- rio de 6 anos completos para matrícula no ensino funda- mental significa manter crité- rios distintos e duplicidade no sistema.Naeducaçãoescolar brasileira, a flexibilidade está sempre admitida e garantida, pois ela é um dos pilares da organização e funcionamento dos sistemas de ensino. Mas a flexibilidade deve servir para lidar com as exceções, e não tornar-se a regra. Diálogo com as cartas recebidas cartas revista criança • 41
  • 42. 42 • revista criança Novas matrículas no Proinfantil Em 2008, 4,7 mil professores de creches e pré-escolas públicas, comunitárias ou con- fessionais, iniciaram o curso de magistério, nível médio, do Programa de Formação Ini- cial dos Professores em Exercício na Edu- cação Infantil (Proinfantil). Nesta nova etapa participam do programa as universidades federais de Goiás, Mato Grosso do Sul, Rio Grande do Norte e Pará. O curso tem duração de 2 anos e é uma parceria entre o MEC e as secretarias esta- duais de educação. Até 2007, cerca de 3 mil professores já tinham sido habilitados nos estados de Alagoas, Amazonas, Bahia, Cea- rá, Goiás, Piauí, Rondônia e Sergipe. Proinfância O MEC, comprometido com a expansão e melhoria da qualidade da educação infantil, vem implementando um conjunto de ações de apoio e assessoramento técnico aos mu- nicípios. Dentre elas destaca-se o Programa Nacional de Reestruturação e Aparelhagem da Rede Escolar Pública de Educação Infantil (Proinfância). Mais de 4,3 mil municípios manifestaram interesse no Proinfância. Até 2008, o Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE) estabeleceu convênio com 955 muni- cípios para construção de escolas de educa- ção infantil. Simultaneamente ao processo de constru- ção, o MEC executará o acompanhamento técnico. Este trabalho abrange o monitora- mento das obras e o assessoramento técnico pedagógico e será feito por meio da Secreta- ria de Educação Básica (SEB) e do FNDE. O modelo padrão, oferecido pelo MEC, é de uma escola com 1.100 m2 equipada e com laboratório de informática, em área mínima de 2.800 m2, com horta escolar, área de recrea- ção ao ar livre, área verde e estacionamento. Cada projeto recebe cerca de R$ 707 mil. Creches conveniadas Com o objetivo de orientar os municípios para melhorar a política de conveniamento, o MEC elaborou o documento “Orientações sobre convênios entre secretarias municipais de educação e instituições comunitárias, confessionais ou filantrópicas sem fins lucra- tivos, para a oferta da Educação Infantil”. O documento foi construído em um pro- cesso coletivo, coordenado pelo MECa partir de GT composto de representantes da União Nacional dos Dirigentes Municipais de Edu- cação (Undime), União Nacional dos Conse- lhos Municipais de Educação (Uncme), Mo- vimento Interfóruns de Educação Infantil do Brasil (Mieib), Confederação Nacional dos Trabalhadores em Estabelecimentos de En- sino (Contee), Organização das Nações Uni- das para a Educação, a Ciência e a Cultura (Unesco) e Associação Nacional de Pós-gra- duação e Pesquisa em Educação (Anped). Conferência Nacional de Educação Básica Em abril de 2008, aconteceu em Brasília a Conferência Nacional da Educação. Realiza- da após as 27 conferências estaduais, a Con- ferência Nacional teve cinco eixos temáticos: 1) os desafios da construção de um sistema nacional articulado de educação; 2) demo- cratização da gestão e qualidade social da educação básica; 3) construção do regime de colaboração entre os sistemas de ensino, ten- do como um dos instrumentos o financiamen- to da educação; 4) inclusão e diversidade na educação básica; 5) formação e valorização profissional. Além disso, a Conferência teve em sua programação o colóquio “Educação Infantil em novas perspectivas, como primeira etapa da educação básica”. notas