Este guia apresenta as primeiras recomendações alimentares oficiais para toda a população brasileira, tendo como objetivo principal promover a saúde e prevenir doenças crônicas. Ele reconhece que o perfil de saúde no Brasil mudou, com aumento de doenças como obesidade e diabetes, e que dietas ricas em vegetais e pobres em gordura, açúcar e sal podem prevenir muitas dessas doenças. As recomendações deste guia visam orientar políticas públicas e estilos de vida sa
3. Sumário
Prefácio ..................................................................................................................................................................................... 5
PARTE UM
Introdução geral ...................................................................................................................................................................... 9
Princípios ............................................................................................................................................................................... 12
O guia e as recomendações .............................................................................................................................................. 16
Recomendação 1 – A Alimentação e as refeições ....................................................................................................... 18
Recomendação 2 – Alimentos fontes de amido .......................................................................................................... 21
Recomendação 3 – Legumes, Verduras e Frutas ........................................................................................................ 26
Recomendação 4 – Feijões e outros alimentos vegetais ricos em proteínas ........................................................ 33
Recomendação 5 – Alimentos de origem animal ........................................................................................................ 37
Recomendação 6 – Alimentos concentrados em gorduras e açúcares .................................................................. 42
Recomendação 7 – Preparação e processamento dos alimentos ............................................................................ 47
Recomendação 8 – Água ................................................................................................................................................. 55
Recomendação Especial – 1 Atividade Física ............................................................................................................... 57
Recomendação Especial – 2 Amamentação ................................................................................................................. 63
Recomendação Especial 3 Bebidas alcoólicas ............................................................................................................. 66
Colocando as recomendações em prática ..................................................................................................................... 70
PARTE DOIS
A comprovação científica .................................................................................................................................................. 79
A Transformação do Brasil ................................................................................................................................................. 80
Consumo de Alimentos e Bebidas no Brasil .................................................................................................................. 86
A Epidemiologia das Doenças Relacionadas à Alimentação no Brasil ..................................................................... 92
Orientações para a Alimentação e Saúde .................................................................................................................... 101
Requerimento Energético Diário .................................................................................................................................... 104
A Política Nacional de Alimentação e Nutrição .......................................................................................................... 106
Utilizando o Rótulo dos Alimentos ................................................................................................................................. 108
Porções de Alimentos ........................................................................................................................................................ 111
Referências ......................................................................................................................................................................... 116
Colaboradores e Agradecimentos
SUPLEMENTO
Resumo das recomendações
4.
5. Prefácio
Nas últimas duas ou três gerações, e mesmo países do mundo, causadas pelas doenças
na última década, o Brasil, em muitos cardíacas e o câncer.
aspectos, mudou profundamente. Estas mesmas recomendações são tam-
Podemos vislumbrar esta afirmação em bém adequadas para a prevenção de outras
importantes áreas de responsabilidade do doenças crônicas comuns – tais como a
Ministério da Saúde. As nossas políticas e diabetes, a hipertensão e o derrame cerebral
programas de saúde pública criaram um e comporão, certamente o elenco de ações
contexto em que a mortalidade infantil para a prevenção da obesidade, que por si
diminuiu consideravelmente e, por outro só aument a o risco dessas e de outras
lado, a esperança de vida ao nascer doenças graves. Por outro lado, as defi-
aumentou. Os flagelos da deficiência ciências nutricionais e as doenças infecciosas 5
nutricional e as graves doenças infecciosas, ainda compõem as prioridades em saúde
principalmente nas crianças e bebês, foram pública no Brasil. Neste sentido as reco-
Guia alimentar para a população brasileira
reduzidas. Temos sucessos pelos quais mendações também contribuem para a
podemos nos orgulhar, no que diz respeito prevenção de deficiências nutricionais, que
ao incentivo ao aleit amento materno e fortalecem a resistência a muitas doenças
também no controle da epidemia de HIV- infecciosas de crianças e adultos.
AIDS. No entanto, apesar destes grandes Por estes fatores consideramos que este
avanços, defrontamo-nos, ainda, com muitos guia contém três mensagens centrais para a
desafios na área da saúde pública. As taxas promoção da saúde e – prevenção das
de lesões e morte em nossas estradas, bem doenças crônicas não-transmissíveis, das
como por violência, são demasiadamente carências nutricionais e doenças infecciosas
elevadas. – em um único conjunto.
A pobreza é ainda a causa principal de Muitas das recomendações neste guia
muitas doenças, e muitos milhões de famílias correspondem aos alimentos e refeições
brasileiras ainda não têm acesso a uma tradicionalmente consumidas pelas famílias
alimentação adequada. Convivemos com brasileiras de todos os níveis econômicos,
um quadro aparentemente contraditório portanto, ao contrário do senso comum,
onde atualmente, as taxas de obesidade, uma alimentação saudável não é neces-
diabetes, hipertensão arterial, doenças sariamente cara.
cardíacas e câncer estão aumentando em um Este é um guia brasileiro, concebido a
ritmo alarmante. partir da cultura e tradições alimentares do
O “Guia Alimentar para a População nosso país. Ele abrange quatro grupos
Brasileira” contém as primeiras reco- completos de recomendações. Um é para
mendações alimentares oficiais para toda a todas as pessoas, concebido para todos os
nossa população. Ele é publicado em um contextos. O segundo grupo é para o governo
momento particularmente especial da e para a indústria. O terceiro grupo é para
história do conhecimento. As evidências os profissionais que trabalham direta ou
científicas acumuladas até o momento são indiretamente com a questão alimentar, do
inequívocas, consistentes e claras para a nível nacional ao local , em serviços de
prevenção das causas mais comuns de morte saúde, escolas e outras instituições. E o
prematura no Brasil e em grande parte dos quarto grupo traduz as recomendações para
6. o ambiente familiar. Foi desenvolvido para conjunto articulado de planos e programas
valorizar uma parte preciosa da nossa de ação de responsabilidade e/ou compar-
herança pois a família que compartilha suas tilhada do Ministério da Saúde com o
refeições, provavelmente é uma família que objetivo último de promover a saúde e a
se alimenta melhor. alimentação saudável e o conseqüente bom
Este Guia, é referência central da diretriz estado nutricional. Acredita-se que elas serão
de promoção de práticas alimentares e úteis para os profissionais da saúde, para os
estilos de vida saudáveis da Política Nacional trabalhadores nas comunidades, para as
de Alimentação e Nutrição e integra um famílias do Brasil e para o nosso país.
6
6
Prefácio
9. Introdução geral
Este guia é destinado a todas as pessoas envolvidas com a saúde pública e familiar. Seu
objetivo geral é contribuir na promoção de uma boa saúde durante toda a vida e de
maneira mais específica no aumento da resistência a doenças infecciosas e na prevenção
de deficiências nutricionais, cáries dentárias, doenças intestinais, obesidade, diabetes,
osteoporose, hipertensão, derrames, doenças cardíacas, câncer e outras doenças crônicas.
No Brasil, a esperança de vida ao nascer aumentou Os modelos de cuidados de saúde desenvolvidos
notavelmente nas décadas recentes, principalmente principalmente pelos (e para os) países de renda
devido à ampliação da rede básica de serviços de mais elevada referem-se quase que exclusivamente
saúde, melhoria das condições de saneamento, a intervenções profissionais tais como triagem em
universalização das ações de vacinação, melhoria massa, tratamentos médicos e cirúrgicos disponíveis 9
da qualidade sanitária dos alimentos e a outras e cuidados paliativos, juntamente com mudanças
Guia alimentar para a população brasileira
medidas de saúde pública, juntamente com o individuais e de modos de vida (WHO, 2000a).
aumento do nível médio de renda e de escolaridade. Eles dependem de sistemas de cuidados de saúde
Estes fatores tiveram o efeito de reduzir a públicos e/ou privados universalmente disponíveis,
mortalidade infantil, proteger a saúde das mães e de disponibilidade elevada de rendimentos pessoais
reduzir a incidência de desnutrição infantil e de e de sistemas de seguro, que são extremamente caros
doenças infecciosas graves, principalmente durante e que, muitas vezes, dedicam-se à doença somente
a infância e a juventude no seu estado avançado, quando ela pode ser
irreversível. Eles são inadequados e inaplicáveis às
dimensões atuais e futuras do problema. Na
O peso multiplicado da doença verdade, o encargo financeiro e social desses
modelos atuais é provavelmente muito pesado,
A deficiência nutricional e a infecção ainda são tanto para o governo, quanto para os cidadãos de
desafios fundamentais da saúde pública no Brasil. qualquer país, mesmo de países ricos (WCRF,1997).
Ao mesmo tempo, o perfil epidemiológico adquiriu
uma maior complexidade, tendo os padrões de
doenças mudado radicalmente. Agora, as doenças Doença e meio ambiente
cardiovasculares e o câncer são, em conjunto, a
causa mais comum de morte registrada no Brasil. A maioria das doenças são causadas por fatores
Nosso país, ao lado da maioria dos países da individuais e ambientais e, por essa razão, podem
América Latina, da África e da Ásia, se depara com ser evitáveis. Nós todos nascemos mais ou menos
as novas epidemias de obesidade, diabetes, suscetíveis a determinadas doenças, mas os fatores
osteoporose, doenças cardíacas e câncer do pulmão, genéticos, por si só, não são comumente a principal
do cólon e do reto, da mama, da próstata e outros. causa. A vulnerabilidade conduz à doença quando
Esse peso multiplicado da doença, sujeito a se tornar as condições ambientais são favoráveis ao seu
ainda pior à medida que a população brasileira aparecimento. As causas subjacentes fundamentais
aumenta e envelhece, não pode ser suportado de muitas doenças são a pobreza, a migração, a
apenas com tratamentos médicos e cirúrgicos, apesar ausência de saneamento, a falta de esperança e de
destes serem de importância vital (Sen, 1999). informação e a guerra (Dubos, 1959). Esses
Mesmo em países de maior renda, o custo do problemas não podem ser resolvidos imediata-
tratamento das doenças crônicas constitui um mente. Igualmente, existe atualmente um consenso
enorme encargo social e econômico. geral sobre as principais causas das doenças crônicas,
10. como cáries dentárias, prisão de ventre e outras em conseqüência, contêm muitas fibras dietéticas,
doenças intestinais, obesidade (que por si é uma gorduras insaturadas, vitaminas, minerais e outros
doença e também um fator de risco para outras componentes bioativos. Contêm também, geral-
doenças), diabetes, hipertensão, derrame, osteopo- mente, baixos teores de gorduras, açúcares, sal e
rose, doenças cardíacas coronárias e cânceres. álcool.
Também é de consenso que muitas dessas doenças Esse consenso científico, que ficou evidente nos
crônicas têm algumas causas comuns, entre as quais anos 80 e foi consolidado nos anos 90, é uma
destacam-se o hábito de fumar, a inadequação informação vital para os governos e para outros
alimentar e a inatividade física. Fatores estes que agentes de transformação, porque implica uma
no momento são os alvos principais para uma reorientação de prioridades. Ele incentiva as
estratégia global de prevenção e controle das doenças políticas delineadas para criar ou proteger sistemas
crônicas (WHO, 2003a). alimentares baseados em uma grande variedade de
Especificamente, os relatórios internacionais alimentos de origem vegetal.
nos quais este guia se baseia e que sintetizam a Por exemplo, em nível nacional, a recomen-
literatura científica mundial atual, consideram que dação para o consumo de maiores quantidades de
as evidências sobre a composição de dietas que legumes, verduras e frutas e menos gorduras,
protegem contra a maioria das doenças crônicas já açúcares e alimentos com alto teor de sal tem
acumulam comprovação suficiente para a elabo- implicações profundas nas políticas e práticas
10 ração de recomendações que promovam a saúde e agrícolas e industriais. Adicionalmente, o consenso
previnam estes males (NRC, 1989a; WHO, 1990a; de que dietas baseadas em uma grande variedade
Introdução Geral
WCRF, 1997; PAHO, 1998a; ACC/SCN, 2000; de alimentos de origem vegetal protegem contra as
WHO, 2003b), doenças, implica em, por exemplo, desenvolver ou
Assim, essas condições ambientais que são identificar formas efetivas e atuais de apoio a
fatores de risco para estas doenças, apesar de práticas antigas, porque, em muitas partes do
complexas, podem ser alterados mais rapidamente, mundo, incluindo o Brasil, a agricultura tradicional,
por ações desenvolvidas pelos governos – quando a produção e o processamento de alimentos criaram
estes assumem a liderança junto com os profissionais culturas alimentares baseadas em grãos, tais como:
da Saúde, a indústria, as organizações sociais civis e arroz; raízes como a mandioca; leguminosas, na
a mídia – quanto pelas famílias e pela própria maioria feijões; e também legumes, verduras e frutas.
comunidade. No Brasil, principalmente nas regiões Norte e
Nordeste e periferias de grandes centros urbanos,
temas como insegurança alimentar e nutricional,
A ciência comprovou a tradição incluindo o conhecimento sobre a quantidade e
variedade de alimentos, permanecem funda-
As recomendações compõe uma alimentação mentais.
semelhante a utilizada tradicionalmente em muitas Milhões de nossas famílias sofrem de deficiência
regiões do mundo que possuem uma cultura nutricional e de doenças infecciosas, porque não
alimentar consolidada e onde as pessoas não podem encontrar nem comprar alimentos sufi-
convivem com situações de insegurança alimentar cientes para satisfazerem as suas necessidades
e nutricional. básicas.A segurança alimentar e nutricional de toda
Tal como referido nos relatórios citados a nossa população é um desafio a ser vencido pois
anteriormente, e em muitos outros, e nas recomen- dietas insuficientes e monótonas baseadas em um
dações deste guia, essas dietas apresentam as número limitado de alimentos são inadequadas e
seguintes características: são ricas em grãos, pães, prejudiciais à saúde.
massas, tubérculos, raízes e outros alimentos com A promoção da saúde e a prevenção das doenças
alto teor de amido, preferencialmente na sua forma são e permanecerão sendo centrais para os planos e
integral; são ricas e variadas em legumes, verduras e programas de políticas de saúde pública do Brasil.
frutas existentes durante o ano e em leguminosas e Isso significa não somente cuidados básicos de
outros alimentos que fornecem proteínas de origem saúde na comunidade, parte do Programa de Saúde
vegetal; incluem pequenas quantidades de carnes, da Família, mas também – o que é algumas vezes
laticínios e outros produtos de origem animal; e, denominado como "a prevenção primordial" – a
11. proteção e a criação de fatores ambientais que nossa saúde é abundante e variado ao longo das
constituam uma proteção contra as doenças, a épocas do ano e regiões de nosso país (Ministério
transformação daqueles fatores que aumentam o da Saúde, 2002a).
risco de doenças, e a promoção da saúde em todos Os programas de alimentação e nutrição
os níveis de governo e ação (WHO, 1990b). brasileiros, conforme mencionados neste guia (veja
Aquilo que comemos e bebemos não é somente as páginas xx-xx) enfocam a promoção de uma
uma questão de escolha individual. A pobreza e a alimentação saudável e a prevenção de doenças,
qualidade da informação disponível obviamente no seu conjunto evitando, a não ser em recomen-
frustram, ou pelo menos restringem, uma escolha dações específicas para determinadas doenças,
verdadeira. E, na cultura brasileira, o que comemos estimular ou restringir o consumo de determinado
e bebemos é ainda, em grande parte, uma questão alimento. Essa abordagem integrada é também
familiar e social. Em geral, contrariamente ao que apoiada por provas convincentes de que as
possamos imaginar, as escolhas alimentares são deficiências nutricionais e as doenças crônicas estão
determinadas não tanto pela preferência e pelos biologicamente associadas e de que, especifi-
hábitos, mas muito mais pelo sistema que cria o camente, a desnutrição da criança no útero materno
abastecimento de alimentos e bebidas. aumenta a suscetibilidade a um conjunto de
O termo "sistema alimentar" refere-se ao doenças crônicas na vida adulta (BARKER, 1998;
conjunto de processos que incluem agricultura e PAHO, 2000; ACC/SCN and IFPRI, 2000).
produção, processamento, distribuição, importação 11
e exportação, publicidade, abastecimento, comer-
Guia alimentar para a população brasileira
cialização, preparação e consumo de alimentos e
bebidas. (SOBAL, KHAN et al, 1998) Os sistemas
alimentares são profundamente influenciados pelas
condições naturais do clima e solo, pela história,
pela cultura e pelas políticas e práticas econômicas
e comerciais. Estes são fatores ambientais funda-
mentais que afetam a saúde de todos. Se estes
sistemas produzem alimentos que são inadequados
ou inseguros e que aumentam os riscos de doenças
crônicas, eles precisam ser mudados.
Uma abordagem integrada
As políticas e os programas brasileiros de alimen-
tação e nutrição não podem se preocupar somente
com a prevenção e com o controle de doenças
crônicas. As deficiências nutricionais e as doenças
infecciosas – não somente entre os jovens e as
crianças, mas em todo o ciclo de vida – perma-
necem como aspectos fundamentais da saúde
pública no Brasil.
As recomendações deste guia, quando prati-
cadas, terão também o efeito de apoiar a prevenção
de deficiências nutricionais e o aumento da
resistência a muitas doenças infecciosas (Scrimshaw,
Taylor et al, 1968; Tomkins, Watson, 1999;
Scrimshaw, 2000).
Uma alimentação saudável não é neces-
sariamente cara. E, no Brasil por nossas condições
de produção agrícola, o alimento que é bom para a
12. Princípios
As recomendações deste guia, concebido para profissionais de Saúde, formuladores e
implementadores de ações de governo em áreas correlacionadas, indústria e para membros
das famílias, segue um conjunto de princípios. Alguns deles são comuns em vários relatórios
de recomendações dietéticas. Outros são específicos para nossa realidade. Assim, a
abordagem baseada na família reflete a cultura brasileira e a atual preocupação com a
relação entre doenças, alimentação e modos de vida.
Nenhuma doença existe sem causa, pelo menos um tais como obesidade, diabetes, doenças do coração
tipo de causa. Mas muitas, se não a maioria das e câncer e também deficiências nutricionais e
doenças mais comuns, são mais ou menos prove- doenças infecciosas, uma vez que a resistência a
12 nientes do meio e assim elas podem ser, pelo menos, elas é aumentada por dietas adequadas e nutritivas
parcialmente controladas ou prevenidas por meio (Scrimshaw, Taylor et al, 1968; Tomkins, Watson,
Princípios
da preservação ou da alteração de fatores ambientais 1999; Scrimshaw, 2000).
no contexto da vida nacional, comunitária e Assim se dá prioridade ao controle e à preven-
familiar. (McKEOWN, 1979, 1988). ção desses três tipos de doenças relacionadas com
alimentação, por meio de uma série única de
recomendações integradas. Essas primeiras reco-
Abrangência mendações oficiais brasileiras são parte da estratégia
de implementação da Política Nacional de
Tornou-se evidente, nos últimos 10 ou 15 anos, que Alimentação e Nutrição, integrante da Política
uma abordagem nutricional abrangente, direta- Nacional de Saúde brasileira (Ministério da Saúde,
mente orientada para as deficiências e doenças 2000).
crônicas, é possível, necessária e viável (Bengoa, As necessidades especiais das crianças com até
Torún et al, 1988, 1989; WHO, 1990a; WCRF, dois anos de idade são objeto de orientações
1997; ACC/SCN, 2000; ACC/SCN and IFPRI, publicadas em documentos específicos (Ministério
2000; WHO, 2003b). Não é mais necessário nem da Saúde, 2002b).
apropriado delinear recomendações destinadas a
prevenir um tipo específico de doença relacionada
com a alimentação. Na verdade, tais recomen- Referencial Positivos
dações isoladas "competem" umas com as outras, e,
quando são diferentes ou parecem entrar em Sempre que possível, as recomendações deste guia
conflito, criam confusão e imobilismo. Os foram desenvolvidas a partir de um referencial
profissionais de saúde de países como o Brasil, onde positivo. Elas enfatizam primeiramente as
as deficiências nutricionais permanecem endê- vantagens dos alimentos e das bebidas saudáveis.
micas, precisam saber que as políticas e os programas Estimulando o consumo de determinados alimen-
elaborados para prevenir doenças crônicas também tos mais do que proibindo o de outros. A segunda e
irão prevenir deficiências nutricionais. terceira recomendações, para alimentos que
As recomendações deste guia (páginas XX, e o contêm amidos (páginas xx) e para hortaliças e frutas
sumário nas páginas XXX) são, por essa razão, (páginas xx), são exemplos de recomendações
destinadas a promover o abastecimento e o consu- positivas.
mo de alimentos e bebidas saudáveis, com vistas a Mensagens com uma abordagem positiva são
reduzir a prevalência de todos os tipos de doenças mais eficazes, porque as pessoas são naturalmente
relacionadas com a alimentação. Estas são doenças mais atraídas por este tipo de contexto. Algumas
13. orientações com caráter restritivo – como, por calculadas (ver "Necessidades humanas de
exemplo, para que se consuma menos gorduras, energia", página xx).
menos gorduras saturadas e açúcar (páginas xx menos
sódio (sal) (páginas xx) – são contudo ainda
inevitáveis. Multisetorial
Cada recomendação neste guia é expressa de quatro
Explicitação de Quantidades maneiras. A primeira é uma recomendação para
todas as pessoas e é concebida para ser utilizada em
As recomendações específicas para profissionais de diferentes contextos informativos e educacionais.
Saúde e membros de famílias são, sempre que Posteriormente, há recomendações para aqueles
possível, quantificadas e expressas como limites de setores da sociedade que estão intrinsecamente mais
consumo ou por números de porções. Recomen- preocupados com o tema, são as orientações para
dações qualitativas, tais como "coma muitas os governos ou para as indústrias; objetivos para os
legumes, verduras e frutas" ou "modere o seu profissionais de saúde; e recomendações para
consumo de açúcar", são úteis como orientações membros da família.
gerais, mas necessitam de recomendações quantifi- Existem vantagens nessa abordagem multise-
cadas adicionais para se tornarem concretas e torial. Os governos e a indústria têm responsa-
práticas (Southgate, Cannon et al, 1990). Dois bilidades próprias. Os profissionais de saúde 13
exemplos de recomendações quantificadas são precisam de objetivos com uma conotação mais
Guia alimentar para a população brasileira
(páginas xx): técnica. E os membros das famílias precisam de
recomendações práticas, o que é complementado
Objetivo para profissionais de Saúde na seção, "Dicas" (páginas xx). Deste tipo de
Uma variedade de frutas e hortaliças existentes abordagem poderão também fazer uso outros
durante todo o ano que garantem cerca de 10% do profissionais, como os de educação e comunicação,
consumo total de energia do dia. por exemplo, que necessitem de uma abordagem
Isso significa um aumento de 300% (o triplo) mais prática sobre os temas de alimentação.
do consumo médio atual.
Quanto às Orientações para os governos e para a
Recomendação para os membros da família indústria Os profissionais que atuam no governo,
Consumo de três porções de hortaliças, ou em todos os níveis – federal, estadual e municipal –
mais,como parte principal da refeição e de 3 porções precisam ter acesso aos grandes consensos cientí-
de frutas, ou mais, diariamente, como sobremesa ficos e operacionais entre alimentação e saúde de
ou lanches. maneira que não sejam criadas situações de
competição ou anulação entre programas e ações e
possamos caminhar no sentido da formulação e
Variações das quantidades implementação de políticas saudáveis e sustentá-
veis em diferentes áreas. O mesmo se aplica a todos
As recomendações são geralmente expressas com os ramos da indústria de alimentos, incluindo
uma margem de variação. Assim, "cerca de 10 agricultores, produtores, distribuidores, fornece-
porcento" e "três ou mais porções" indicam dores de alimentação, importadores e exportadores.
variações. É do interesse de todos que o sistema alimentar
O princípio da quantificação implica que as brasileiro seja saudável. Na verdade, quanto mais
recomendações são expressas como porcentagens valor se dá à alimentação, mais prósperos todos os
ou proporções do consumo total de energia envolvidos tendem a ser. Por exemplo, é provável
ingerido. Aqui, vamos considerar como parâ- que a recomendação dietética mais importante
metro um brasileiro(a) com uma ingestão média deste guia seja a de que todas as pessoas devem
diária de 2.000 calorias (Kcal) de alimentos e consumir mais hortaliças e frutas. Correspon-
bebidas. As porções recomendadas para grupos e dentemente, a orientação para os governos e
pessoas com exigências significativamente também para o setor industrial é a promoção da
diferentes de 2000 calorias por dia podem ser produção, manufatura e consumo de todos os tipos
14. de hortaliças e frutas, principalmente aquelas que são para as pessoas com idade igual ou superior a 2
existam localmente. A iniciativa de promover o anos.
resgate e consumo de alimentos regionais (Minis- Orientações especiais para membros da família
tério da Saúde, 2002b) contribui para a concre- considerados "de risco" ou em situação clínica
tização desta recomendação, assim como a maior relacionada a alguma doença que necessite uma
disponibilidade destes produtos no comércio. alteração específica na alimentação deverão ser
elaboradas por nutricionistas nos serviços de saúde.
Os Objetivos para os Profissionais de Saúde são
destinados a capacitar os profissionais de Saúde a
orientarem adequadamente grupos populacionais Baseada em alimentos
saudáveis a partir dos dois anos de idade. Foram
especificamente elaboradas para profissionais – em Considerando que não nos alimentamos de
nível nacional, regional, estadual, institucional, nutrientes mas de alimentos palpáveis, com cheiro,
municipal e da comunidade – cujas preocupações cor, textura e sabor, as recomendações são baseadas
incluem promover uma saúde adequada e prevenir em alimentos e, consideradas no seu conjunto,
doenças. Isso significa que as orientações são referentes a um plano alimentar completo. Isso
destinadas a manter as pessoas saudáveis e, portanto, significa que, sempre que possível, são expressas em
não estão incluídos orientações para grupos "de termos de alimentos e bebidas (e atividade física,
14 risco" e pessoas já doentes. como fator associado à dieta), mais do que em termos
de componentes nutricionais, como normalmente
Princípios
Quanto às Orientações para os membros da Família. a maioria dos documentos com orientações
Os documentos que contêm recomendações dietéticas reportavam até os anos 90.
dietéticas normalmente fazem uma distinção entre Os argumentos a favor das recomendações
populações e indivíduos (NRC, 1989a; WHO, dietéticas baseadas em alimentos são muito bem
1990a; WCRF, 1997; WHO, 2003b). Este guia documentados. As recomendações para alimentos
segue esse princípio. As recomendações se dirigem e bebidas, quando devidamente especificadas, são
aos indivíduos inseridos em um conjunto familiar facilmente compreendidas por todas as pessoas. Ao
ou grupo de convívio, considerando que as escolhas contrário, as recomendações sobre componentes
alimentares feitas pelos brasileiros são, ainda, nutricionais, tais como gorduras saturadas, fibras e
fortemente influenciadas pelos valores familiares e ácido fólico são relevantes para profissionais de
de grupo. Aqui há um objetivo implícito de saúde, sendo úteis e muitas vezes essenciais no
revalorizar a refeição em grupo. Compartilhar as planejamento de serviços de alimentação e úteis
refeições em família é, por si só, um hábito saudável, também aos consumidores no que se refere aos
tanto cultural como social e nutricionalmente. Os rótulos dos alimentos. Além disso, o aumento da
relatórios cujas orientações dietéticas se concen- quantidade de evidências científicas sobre doenças
tram nos indivíduos podem, paradoxalmente, ter e relação com dietas é expresso em termos de
efeitos negativos visto que podem ter o efeito futuro alimentos e bebidas, mais do que em termos de
de isolar o indivíduo da família. Na América do componentes dietéticos. (WCRF, 1997;
Norte e na Europa Ocidental, as pessoas cada vez WHO,1998).
mais se isolam dos outros membros da família, As recomendações com base nos alimentos têm
mesmo quando estão sob o mesmo teto; é um sentido especial nos documentos nacionais,
crescente a porcentagem de refeições feitas pelo porque elas especificam o tipo dos alimentos,
indivíduo de maneira solitária, fora de casa e bebidas e refeições consumidas no país.
mesmo em casa.
As orientações para os membros da família e Com base em uma alimentação
"Colocando as recomendações em prática" (páginas completa
xx) são normalmente especificadas em quantidades
individuais para facilitar a transformação para o As recomendações, consideradas como um todo,
número específico de membros familiares. referem-se ao conjunto da alimentação, a fim de
Tal como os objetivos para os profissionais de que o abastecimento de alimentos, as compras e as
saúde, as orientações para os membros da família refeições familiares possam ser planejadas. A
15. maioria dos alimentos e bebidas que são parte Este é um guia, para a população do Brasil, dos
significativa da alimentação desempenham um alimentos e bebidas do Brasil.
papel na diminuição ou no aumento do risco de
algumas doenças.
Como é evidente na recomendação 7 (páginas
xx), "dieta" e/ou "alimentação" significam o
alimento e a bebida tal como produzidos, pro-
cessados, preservados, cozidos e preparados.
Igualmente, dado o efeito sinérgico existente entre
alimentação e atividade física foi incluída uma
recomendação sobre o tema (páginas xx).
Brasileiro
Este guia contém as primeiras recomendações
alimentares oficiais para o Brasil e para os brasileiros.
Ele é brasileiro e está fundamentado na cultura
alimentar brasileira. A ciência na qual as recomen- 15
dações estão baseadas é, com certeza, universal, e
Guia alimentar para a população brasileira
os objetivos e orientações utilizam como base as
recomendações e os textos de apoio recentemente
publicados em documentos de caráter global,
internacional e outros (NRC, 1989a; WHO, 1990a;
WCRF, 1997; ACC/SCN, 2000; ACC/SCN and
IFPRI, 2000; WHO, 2003b). Além disso, este guia
também se assemelha, enquanto o desenvolvi-
mento de seus princípios, com outros recentemente
produzidos em muitos países da América Latina
(PAHO, 1998a) e em outras partes do mundo.
Muitas vezes supõe-se que a alimentação
saudável é muito diferente da que as pessoas
consomem habitualmente. E é verdade que os
brasileiros, tanto os que vivem nas cidades como os
que vivem em áreas rurais, atualmente consomem
poucas hortaliças e frutas e muitos alimentos e
bebidas gordurosos, com alto teor de açúcares e/ou
sal. (Ver "Consumo de alimentos e bebidas no
Brasil", páginas xx; ver Monteiro, Mondini et al,
1995a; Monteiro, Mondini et al, 2000; Monteiro,
2000). Mas muitos alimentos, bebidas e refeições
tradicionais brasileiras são saudáveis e também
gostosos, como se mostra na seção sobre "Alimentos
e Bebidas" (páginas xx).
Procurou-se elaborar este guia em uma lingua-
gem simples e os profissionais de Saúde que
trabalham na comunidade são encorajados a
utilizá-lo como base para a elaboração de folhe-
tos,cartazes e outros instrumentos de apoio
adaptados às condições locais.
16. O guia e as recomendações
A ciência comprova aquilo que ao longo do tempo a sabedoria popular, e
alguns cientistas há milênios apregoavam, a alimentação saudável é a base
para a nossa saúde. A natureza e a qualidade daquilo que comemos e
bebemos é de importância fundamental para a nossa saúde e para as
possibilidades de desfrutarmos todas as fases da vida de uma forma produtiva
e ativa e termos uma velhice longa e saudável. As recomendações aqui
expressas indicam uma versão precisa do que as nossas avós sabiam.
O Guia Aliment ar para a população alimentos que estão disponíveis ao longo de
brasileira está organizado em duas grandes todo o ano. As três recomendações seguintes
16
partes. A primeira desenvolve o conjunto de (páginas xx) especificam os componentes de
recomendações visando a aliment ação diet as com base em veget ais, as quais
saudável e a promoção da saúde. A segunda constituem-se: de grãos (como o arroz e o
O guia e as recomendações
contém as evidências científicas, o panorama trigo) e de outros alimentos que contêm
epidemiológico brasileiro em relação às amido (como pães, massas e mandioca); de
doenças crônicas não-transmissíveis e os legumes, verduras e frutas; e leguminosas e
dados de consumo alimentar disponíveis. outros vegetais ricos em proteínas.
Apresenta-se, ainda, de maneira sucinta, as A quinta recomendação (páginas xx)diz
ações do Ministério da Saúde. respeito aos alimentos de origem animal, os
Todas as recomendações deste guia, e res- quais são nutritivos e integram diet as
pectivos textos de apoio, são apresentados a saudáveis, na sua maior parte, quando
seguir (páginas xx). As recomendações estão contêm somente pequenas quantidades de
sumarizadas no suplemento especial de 8 gorduras saturadas. A sexta recomendação
páginas. (páginas xx) é sobre alimentos e bebidas com
Todas as recomendações estão dispostas altos teores de gorduras e açúcares, preju-
da mesma maneira. Primeiro, a recomen- diciais à saúde, a não ser que sejam
dação para todas as pessoas, expressa consumidos somente ocasionalmente. A
sumariamente numa linguagem clara. maior parte dos alimentos que comemos é,
Depois, seguem-se: orientações específicas obviamente, processada de alguma forma, e
para os governos e para a indústria; objetivos a sétima recomendação (páginas xx) é sobre
para os profissionais de saúde; e orientações os métodos de produção, processamento,
para os membros da família. As orientações preservação (incluindo a colocação de sal),
para os membros das famílias são detalha- preparação e cozimento dos alimentos.
damente desenvolvidas em outra seção, A oitava, e última recomendação (páginas
onde são dadas cerca de 100 dicas (páginas xx) é sobre a água, que é vital para a saúde.
xx). Cada recomendação é discutida, com a Em seguida colocamos 3 recomendações
devida justificativa científica. especiais. A primeira trata da atividade física
A primeira recomendação (páginas xx) regular ao longo da vida que, aliada à
refere-se a refeições no seu conjunto. Para a alimentação saudável result am em um
proteção contra todos os tipos de doenças impacto positivo e protetor à saúde. Como
relacionadas com alimentos, elas devem ser este guia é para as pessoas a partir dos 2 anos,
adequadas e ricas com a variedade de pode parecer surpreendente existir uma
17. recomendação especial sobre a amamen-
tação (página xx). Mas é imprescindível
reafirmarmos que o leite do peito é um
alimento essencial para os bebês, mas
também que a amamentação protege a
saúde da própria mãe e também das suas
crianças, não somente durante a amamen-
t ação, mas por toda a vida. A terceira
recomendação especial diz respeito às
bebidas alcoólicas, cujo consumo regular
geram danos diretos à saúde como também
podem comprometer o estado nutricional
do indivíduo (páginas xx).
As recomendações são seguidas de
orientações práticas. Como este título sugere,
são informações que dão aos membros da
família muitas idéias sobre como cumprir as
recomendações e como planejar refeições 17
deliciosas, acessíveis e saudáveis.
Esperamos que as recomendações sejam
Guia alimentar para a população brasileira
consideradas claras e úteis ao trabalho dos
profissionais brasileiros e à qualidade de vida
de nossas famílias.
18. Recomendação 1
A Alimentação e as refeições
Recomendação para todos
Refeições e lanches são saudáveis quando consumidos em quantidade adequada,
tem uma composição variada, são coloridos e saborosos. São compostos, na sua
maioria, por alimentos de origem vegetal, com baixos teores de gorduras, sal e
produtos derivados do leite.
Recomendação para os governos e indústria
Aumentar e incentivar a produção, processamento, abastecimento e consumo de
todos os tipos de alimentos que compõem as diferentes formas de alimentação
saudável.
18
Objetivo para os profissionais de saúde
Recomendação 1
Alimentos ricos em amido, de preferência integrais, legumes, verduras e frutas e
leguminosas, no seu conjunto, devem compor entre 60-70% do total de calorias
diárias.
Orientar sobre a escolha de carne magra e de aves, todos os tipos de peixe e
laticínios desnatados.
Limitar o consumo de alimentos com alto teor de açúcares, gorduras e sal e de
bebidas alcoólicas.
Orientações aos membros da família
Desfrutem refeições variadas ricas em alimentos com amido, legumes, verduras e
frutas e leguminosas; dêem preferência a carne magra, aves e leite e derivados
desnatados e a todos os tipos de peixe; diminuam os alimentos com elevada
quantidade de açúcares, gorduras e sal e consumam pouco ou nada de bebidas
alcoólicas.
Introdução WHO, 1990b; WHO 2002a WCRF, 1997; PAHO,
1998b; ACC/SCN, 2000)
Existe uma grande variedade de formas de Alimentos de origem animal são, sem dúvida,
alimentação saudável. Estas formas são, na sua parte de uma alimentação saudável que inclue uma
maioria, constituídas por três tipos de alimentos pequena quantidade de carne de boi ou porco, aves
básicos: (1) alimentos com amido, como os grãos e seus derivados, peixe e também o leite, queijo e
(incluindo o arroz e o trigo), pães, massas, tubérculos outros laticínios, preferencialmente desnatados.
(como as batatas e o inhame) e raízes (como a Os sistemas alimentares que geram alimentos
mandioca); (2) os legumes, verduras e as frutas; e, variados de origem vegetal, acrescido aos tipos mais
(3) os alimentos vegetais ricos em proteínas saudáveis de alimentos de origem animal, tendo
(particularmente as leguminosas como os feijões e como base a cultura alimentar nacional e regional,
também as sementes e os seus óleos). (NRC, 1989a; são de importância fundamental para a saúde
19. pública e para a segurança alimentar e nutricional durante todas as fases do ciclo de vida . Se adequada
de um país. e variada, essa alimentação previne também as
deficiências nutricionais. Ela também protege
Discussão contra as doenças infecciosas, porque é rica em
nutrientes que podem melhorar a função imuno-
As recomendações contidas neste guia garantem a lógica. Pessoas bem alimentadas são mais resistentes
alimentação saudável necessária para as pessoas às infecções. (Scrimshaw, Taylor et al, 1968; ACC/
SABENDO UM POUCO MAIS
As recomendações
Cada recomendação é expressa em quatro formas diferentes, e os diferentes tipos de
recomendações estão listados no suplemento. As recomendações funcionam como um conjunto
articulado. A orientação geral para todas as pessoas e para os membros da família foram elaboradas
com uma linguagem mais simples e prática. O conteúdo destas recomendações é expresso com
maior precisão nos objetivos quantificados para os profissionais de saúde. 19
A recomendação para todas as pessoas é elaborada como um guia geral, claro e de fácil
lembrança. Ela utiliza palavras-chave. Por exemplo, termos como "adequado" indica que todas
Guia alimentar para a população brasileira
as pessoas precisam comer; "variado" significa a composição com diferentes tipos de alimentos,
que é a melhor maneira de se garantir plenamente o aporte de todos os tipos de vitaminas e
minerais necessários; "colorido" indica que as diferentes cores, principalmente dos legumes,
verduras e frutas, facilitam a ingestão de diferentes nutrientes; e "delicioso" enfatiza que as
refeições devem ser de paladar agradável, de maneira a desmistificar o senso comum de que o
que é saudável não é bom e também visa resgatar o valor da culinária .
A recomendação para os governos e a indústria é destinada aos formuladores de políticas e
programas nos níveis federal, estatal e municipal, ou a executivos e profissionais de
desenvolvimento de produtos de toda a cadeia do sistema alimentar, incluindo os agricultores,
produtores de alimentos, distribuidores e fornecedores de alimentação, etc.
O objetivo para profissionais de saúde é destinado àqueles que exercem suas atividades em
serviços de alimentação, orientação alimentar, abastecimento de alimentos etc. Aqui também
se incluem pesquisadores, cientistas interessados em alimentos, nutrição e saúde pública;
profissionais envolvidos com alimentação escolar e pré-escolar, hospitais e outras instituições
e nutricionistas que trabalham em nível individual ou comunitário. Esses objetivos estão escritos
numa linguagem técnica, usando critérios aceitos internacionalmente e, na maior parte das
vezes, estão quantificados.
Finalmente, a orientação aos membros da família é particularmente dirigida ao membro da
família que normalmente é responsável pelo planejamento, compras e preparação das refeições,
de maneira a facilitar o exercício de sua responsabilidade pela alimentação familiar. É importante
esclarecer que esta recomendação aplica-se a todos os grupos que tenham uma convivência
que possibilite o compartilhamento de refeições e não apenas à família em sentido estrito.
As orientações presentes neste guia são adequadas para todos os indivíduos sadios maiores
de 2 anos de idade.
As recomendações no seu conjunto constituem uma totalidade, e precisam ser consideradas
conjuntamente. Por exemplo, a recomendação que orienta que a base das refeições seja de
vegetais poderia ser mal interpretada, porque os óleos, os açúcares e as bebidas alcoólicas são
de origem vegetal, bem como os pães brancos. Mas qualquer pessoa que leia as recomendações
2, 6 e a especial sobre bebidas alcoólicas (páginas xx) pode ver que uma alimentação baseada
20. SCN, 2000; Scrimshaw, 2000). Essa alimentação doenças crônicas, incluindo as doenças cardíacas e
protege contra as doenças crônicas graves e alguns tipos de câncer.(WHO, 1990b; DHSS. 1994;
potencialmente fatais como hipertensão, derrame, WCRF, 1997; WHO, 2000a; WHO- 2002a).
doenças cardíacas e cânceres, as quais, em conjunto,
são no momento, a principal causa de incapacidade
e morte no Brasil. Isso devido a três motivos inter- Outros comentários sobre as recomendações:
relacionados: (1) ela é rica em nutrientes que
protegem e mantêm todos os sistemas orgânicos; Orientação para os governos e a indústria
(2) contém naturalmente baixos teores de gorduras Deve-se enfatizar a produção, manufatura, abaste-
saturadas, gorduras em geral, açúcares, sal e álcool, cimento – e consumo humano de todos os tipos de
componentes relacionados ao aumento de risco de alimento que são benéficos para a saúde. O
doenças crônicas; (3) a sua densidade calórica é conhecimento sobre a vocação de produção das
relativamente baixa, e assim protege contra o diferentes regiões e ecossistemas deve ser divulgada
sobrepeso e a obesidade que aumentam o risco de e respeitada. Em algumas partes do país, o solo é
doenças crônicas (NRC, 1989a; WHO, 1990b; mais propício à produção de carne e laticínios.
WCRF, 1997; WHO, 2000a; ACC/SCN 2000; Em outros lugares, os agricultores devem ser
WHO 2002a). encorajados a desenvolverem a horticultura e a
produção de outros tipos de alimentos vegetais, com
20 o benefício adicional de que este tipo de agricultura
Consumo pode requerer trabalho menos intensivo e ser mais
Recomendação 1
produtiva.
Nos principais aspectos, a alimentação tradicional
Brasileira é saudável. As diferentes expressões Objetivo para os profissionais de saúde
regionais geralmente são ricas em grãos, principal- Todas as alimentações deverão ser adequadas. Em
mente arroz e leguminosas, os quais, em conjunto, bebês e crianças, a ingestão inadequada de energia
garantem as calorias e são uma fonte completa de através dos alimentos é, por si só, uma deficiência
proteínas, contendo também muitos nutricional. O abastecimento de alimentos nas
outros nutrientes. regiões mais pobres do Brasil é muitas vezes
O problema maior reside, tanto no passado como inadequado e deficiente, gerando uma situação de
atualmente, no baixo consumo de legumes, verduras baixa variedade, alto custo e conseqüente insufi-
e frutas, o que é surpreendente devido à grande ciência de oferta de micro-nutrientes e, muitas vezes,
variedade e abundância de frutas brasileiras; e também de macro-nutrientes. Nestas situações não
também no alto consumo de açúcares e sal. Um só a quantidade de alimentos, mas a variedade se
outro aspecto mais recente é o aumento no consumo tornam essenciais.
de gordura total e saturada, com a elevação no O objetivo de 60-70 % do total de ingestão de
consumo de produtos industrializados , o que é um energia proveniente de alimentos ricos em amido,
grave risco à saúde pública uma vez que a população preferencialmente na sua forma integral, legumes,
é cada vez menos ativa fisicamente. Ver "Consumo verduras e frutas e leguminosas é uma combinação
de alimentos e bebidas no Brasil" (páginas xx). dos três objetivos apresentados nas recomendações
O consumo de alimentos de origem animal no nas páginas a seguir (páginas xx).
Brasil é, em média, moderado. Os valores médios
encobrem as variações regionais e sócio-econô- Orientação para os membros da família
micas. Carnes, aves, peixes, ovos, leite, queijo e Essa orientação corresponde quase que totalmente
outros alimentos de origem animal são nutritivos, e às refeições tradicionais brasileiras, com a
alimentações ricas em calorias e proteínas importante exceção de que as recomendações
promovem o crescimento, principalmente no início presentes são para refeições ricas e variadas em
da vida. Mas a carne e seus derivados e o leite e os legumes, verduras e frutas e relativamente baixas
laticínios tendem a ter um elevado teor de gordura em açúcares, gordura e sal.
total e saturada e, assim, uma alimentação com
alta concentração de alimentos de origem animal
tendem a aumentar o risco de obesidade e outras
21. Recomendação 2
Alimentos fontes de amido
Recomendação para todos
Grãos como o arroz e o trigo, pães, massas, tubérculos como batatas, raízes como a
mandioca e outros alimentos ricos em amido devem ser o centro da maioria das
refeições.
Orientação para os governos e a indústria
Promover a produção, industrialização e consumo de todos os tipos de alimentos
ricos em amido, preferencialmente na sua forma integral e principalmente aqueles
originários do Brasil.
21
Objetivo para os profissionais de saúde
Guia alimentar para a população brasileira
Alimentos ricos em amido, de preferência integrais ou minimamente processados,
que garantam 45-55% da energia total, até um máximo de 60%. Isso significa um
aumento de 40% (2/5) do consumo médio atual.
Orientação para os membros da família
Comer de 5 a 7 porções de grãos, pães, massas, raízes, tubérculos e outros
alimentos ricos em amido, de preferência integrais ou minimamente processados,
todos os dias.
Introdução advém deste elemento. Os grãos, como as sementes,
contêm amido e proteína e, no conjunto, são ricos
As principais fontes de amido na alimentação do em vitaminas do Complexo B e outras vitaminas,
brasileiro são provenientes de grãos como o arroz, o minerais, óleos essenciais e fibras dietéticas.
trigo e o milho, de tubérculos como a batata e da Esses nutrientes ficam retidos no arroz e na
raíz genuinamente nacional, a mandioca. A maior farinha de trigo integrais. Mas o arroz branco, o pão
parte do pão consumido é feito com farinha de branco e a farinha e as massas comuns são refinados
trigo refinada. de tal forma que se eliminam a maior parte das
Biscoitos e pães também podem ser feitos de vitaminas, minerais, óleos e fibras. A parboilização
trigo, milho, arroz ou centeio. Todos os tipos de do arroz retém mais vitaminas do complexo B e óleos.
massa e pizza são feitos à base de trigo. Grande parte dos cereais industrializados desti-
Os grãos contêm, na sua composição, cerca de nados à refeição matinal são quase sempre feitos de
70% de amido. Tubérculos e raízes com amido, milho refinado, trigo ou arroz, com quantidades
tais como, batatas, batata doce, mandioca e inhame, variáveis de açúcar adicional, sal e outros ingredi-
tem alta porcentagem de água e assim contêm, entes e, muitas vezes, fortificados com vitaminas e
relativamente, menos amido por unidade de peso, minerais. Os tubérculos e as raízes contêm amido e
mas a maior parte da energia que proporcionam muito menos proteínas do que os grãos.
22. Também contém vitaminas e minerais em vitamina B9 , certamente protegem a integridade
quantidades variáveis. As batatas inglesa e doce são da medula espinal da criança na fase de desenvol-
boas fontes de ácido ascórbico (vitamina C). A batata vimento uterino (WYNN, 1979; GARZA, 1993).
doce é rica em carotenos, os pre-curssores vegetais Fibra dietética é o termo geral para as partes dos
da vitamina A. Na sua forma integral, todos os vegetais que resistem à digestão. Na natureza, todos
tubérculos e raízes são ricos em fibras dietéticas, as os alimentos vegetais contêm fibra. As alimentações
quais, junto com a vitamina B, são perdidas quando com alto teor relativo de alimentos com amido na
os alimentos são descascados. sua forma integral e, por isso, com teor alto de fibra
A mandioca, alimento rico em amido e e tipo de amido que não são digeridos, são boas
originário do Brasil, pode ser consumida na sua para a função intestinal. Elas protegem contra a
forma integral ou refinada como farinha e são constipação intestinal e possivelmente contra a
inúmeros os exemplos da culinária nacional para doença diverticular e o câncer do cólon. (Royal
seu uso em preparações salgadas e doces. Os College of Physicians, 1980; WCRF, 1997). (Ver
tubérculos e as raízes podem ser cozidos de todas as também "Fibra Dietética", páginas xx).
maneiras e combinados com outros alimentos. A outra forma de expressar os benefícios das
Quando fritos, incorporam muita gordura. dietas ricas em amido é em termos não do que elas
possuem, mas do que não possuem. Considerando
a mesma ingestão de calorias, as alimentações ricas
22 Discussão em amido terão menor quantidade de gorduras e
provavelmente de açúcares. Em termos técnicos,
Recomendação 2
Desde os primórdios da agricultura, há cerca de elas serão concentradas em nutrientes ao invés de
12.000 anos, e até muito recentemente na história, concen-tradas em energia. Se esse tipo de alimen-
a maior parte da energia consumida pela maioria tação é também de baixo teor de gorduras saturadas,
das populações tinha origem em alimentos à base elas não só protegerão contra o sobrepeso, obesidade
de amido. e cânceres relacionados com a obesidade, mas
Quando o consumo de amido acarreta o também contra as hiperlipidemias e as doenças do
fornecimento de 75 % ou mais do total calórico da coração (NRC, 1989a; WHO, 1990b; DHSS, 1994;
alimentação e há monotonia nos tipos de alimentos WCRF, 1997; WHO, 2000a; ACC/SCN, 2000).
consumidos pode haver o desenvolvimento de
alguma deficiência nutricional. No caso específico
da mandioca, alimento nacionalmente consumido Consumo
e importante fonte de energia e com baixo teor
proteico, crianças de famílias de baixa renda no Apesar de o arroz ser muitas vezes o alimento mais
Nordeste estão em risco de deficiência de proteínas importante para o aporte energético na alimentação
e também de micro-nutrientes, (Southgate, 1993a) do brasileiro (NEPA, 1997), pesquisas mostram que
tornando-se mais vulneráveis às doenças infecciosas a média de consumo de alimentos com amido no
(Scrimshaw,Taylor et al, 1968; Scrimshaw, 2000). Brasil – identificados como arroz, outros grãos e
Essas alimentações pobres possivelmente aumen- derivados (exceto biscoitos), raízes e tubérculos era,
tam o risco de alguns tipos de câncer em adultos nas regiões metropolitanas, em 1996, 36.1 % do
(WCRF, 1997). total de energia, o que está um pouco abaixo da
Uma alimentação rica em amido pode ser maioria dos países da América Latina, bem como
expressa de duas maneiras: Primeiro, quando em abaixo da média mundial e da média recomen-
sua forma integral e com pouco processamento, a dada neste guia. Comparando com outros países, o
alimentação fica rica em vitamina B, em outras consumo de alimentos com amido está, no Brasil,
vitaminas e minerais, ácidos graxos essenciais e decrescendo gradualmente. (Ver "Consumo de
fibras dietéticas. (As hortaliças, frutas e leguminosas Alimentos e Bebidas no Brasil", páginas xx)
são também nutritivos da mesma forma; ver páginas (Monteiro, 2000; Monteiro et al, 2000).
16-20). Um fato também preocupante é que a maior
As vitaminas do complexo B e os ácidos-graxos parte do arroz, farinha de trigo, pães, massas e outros
essenciais participam do metabolismo do sistema alimentos com amido consumidos são refinados, e
nervoso. As alimentações ricas em ácido fólico, ou muitas vezes são consumidos juntamente com
23. grandes quantidades de gorduras e açúcar. Neste aspectos. Primeiro, as famílias não comem ali-
guia, pastéis, torradas, batatas fritas, biscoitos, bolos mentos com amido em quantidades suficientes.
e massas de torta não são considerados alimentos Segundo, a maior parte dos alimentos com amidos
com amido, mas sim alimentos com alto teor de que é ingerida é altamente refinada e processada e,
gordura e açúcar (páginas xx). por isso, perdeu parte do seu valor nutricional.
Tal como os alimentos com amido, a alimen- Terceiro, a maioria dos alimentos com amido é
tação brasileira típica não é saudável em três consumida com gordura, açúcar ou sal, que são
SABENDO UM POUCO MAIS
Como começar?
As recomendações deste guia tem origem no conhecimento científico atual expresso
em uma série de relatórios de especialistas e produzidos pelas Nações Unidas e por outras
agências internacionais, bem como pelos Ministérios da Saúde de diferentes países, nos
últimos dez ou pouco mais anos. Elas são portanto confiáveis e atuais. Após olhar para
todas as recomendações neste guia, sumarizadas no suplemento , você pode pensar: "Por
onde e como começar?" 23
Para alguns tipos de alimentos há muitas diferenças entre o que as pessoas no Brasil
Guia alimentar para a população brasileira
consomem atualmente e o que se recomenda neste guia.
Uma comunidade ou família típicas podem estar bem longe de atender à maioria das
recomendações. Na verdade, os dados mostram ("Consumo de alimentos e bebidas no
Brasil", páginas xx) que os brasileiros tendem a consumir menos alimentos com amido e
menos leguminosas, estamos perdendo o hábito de ter feijão na mesa todos os dias; que
o consumo de legumes, verduras e frutas é muito baixo; que o consumo de alimentos
gordurosos e ricos em açúcares, bem como de refrigerantes, está aumentando;que o
consumo de sal está muito elevado; que o consumo de álcool é comum; e também que
estamos menos ativos fisicamente e ficando com mais sobrepeso e obesos.
O objetivo deste guia é contribuir para que estas tendências sejam revertidas. Os
membros da família que seguirem essas orientações estarão mais protegidos contra todos
os tipos de doenças relacionadas com a alimentação e darão a si próprios uma oportunidade
de desfrutar uma vida longa e ativa. Da mesma forma, os profissionais de saúde que
atingirem todos os objetivos no planejamento da orientação alimentar e do abastecimento
de alimentos e/ou refeições estarão dando uma contribuição valiosa para a saúde pública.
Um exemplo:
Se a família não está acostumada a consumir muitos alimentos de origem vegetal e se
há uma grande valorização no consumo de carne e outros alimentos de origem animal,
não desanime. Faça uma coisa de cada vez. Veja "Como colocar as recomendações em
prática" (páginas xx) e verifique qual se adapta melhor à família e situação. Incentive-os
a seguir a maior parte ou todas as orientações dentro de um prazo de 6 meses.
Prioridades? Todas as orientações deste guia são importantes, mas as recomendações
sobre legumes, verduras e frutas são, para a maioria das famílias, as mais importantes de
todas. Isto porque além de serem importantes por si só, contribuindo para a variedade da
alimentação, aporte de micro-nutrientes etc, o aumento no consumo destes alimentos
certamente provocará uma re-orientação ou deslocamento no consumo com a redução
de outros não tão desejáveis como os com alto teor de gordura e açúcares. É uma substituição
positiva e gradual. E ao mesmo tempo constituem, talvez, no maior desafio, pois as
orientações sobre Legumes, Verduras e Frutas são para quantidades muito mais elevadas
que a média consumida pela família brasileira atualmente.
24. SABENDO UM POUCO MAIS
O consumo recomendado de alimentos vegetais
Recomenda-se aos membros da família o consumo de 6 porções de alimentos com amidos
por dia. Nas próximas páginas, você verá que também se recomenda aos membros da
família que comam 6 ou mais porções de frutas ou hortaliças e duas porções de leguminosas
(feijão) por dia. Em termos de calorias, a recomendação geral é que 60-70 % de energia
diária provenham dos vegetais, de preferência integrais ou minimamente processados e,
quando as alimentações forem adequadas e variadas, um número maior de porções destes
alimentos pode também ser saudável.
Essas recomendações gerais para vegetais são semelhantes às que são elaboradas nos
mais recentes documentos oficiais e nos relatórios produzidos internacionalmente (WHO,
1990b; WCRF, 1997; ACC/SN, 2000;Eurodiet 2001; WHO 2002 a ), para os Estados
Unidos e alguns países da América Latina (NRC, 1989; PAHO,1998b).
Você pode pensar "mas que tanto!" ou "eu não posso comer tudo isso!". Vamos explicar.
Primeiro, quando forem mencionados pesos dos alimentos eles serão referentes a alimentos
24 preparados e prontos para consumo. No prato, o arroz e o feijão, por exemplo, pesam
muito mais do que quando secos. Segundo, a recomendação supõe um consumo médio
Recomendação 2
de 2000 calorias (Kcals) por dia. Enquanto os homens ativos podem e devem consumir
mais do que isso, os membros inativos, a maioria dos outros membros, os mais jovens ou
então as mulheres, recomenda-se menos ou porções menores. (Ver "Necessidades humanas
de energia", página 88 ee "Tamanhos das porções dos alimentos e das bebidas" (páginas
xx e xx).
Mas comparado com o que os brasileiros consomem atualmente (Consumo de alimentos
e bebidas no Brasil, páginas xx), é verdade que as recomendações indicam quantidades
maiores de alimentos com amido e vegetais . Nunca é demais repetir que este aumento de
consumo não inclui o incentivo aos alimentos preparados e processados, tais como biscoitos
e bolos e alguns cereais matinais, onde a maior parte da energia provém de gorduras e/ou
de açúcares.
adicionados durante a industrialização, o cozi- destas doenças. Um total de 61 recomendava o
mento ou mesmo à mesa. aumento de consumo de fibra dietética, 64 de
Esses números e tendências indicam que a cereais e 52 de pães (geralmente integral) e 34 mais
população brasileira, a fim de alcançar os objetivos batatas. Não foi encontrada, entre estes documentos,
médios recomendados, deveria consumir cerca de nenhuma recomendação contraditória. Um total
40 % mais de alimentos com amido do que de 19 determinavam quantitativamente as reco-
consome atualmente, de preferência na sua forma mendações dadas – que variavam entre 45 e 55 %
integral ou com um mínimo de processamento. ou mais do total de calorias diárias provindas de
alimentos ricos em amido. Neste grupo de
alimentos, nestes documentos, o feijão, em geral
Recomendações estava incluído (Cannon,1992).
Estas recomendações e os objetivos quant-
A análise de 100 documentos técnicos relacionados ificados são semelhantes e, às vezes, um pouco mais
com a prevenção de doenças crônicas publicados baixos aos valores publicados em recentes
no mundo inteiro entre 1961 e 1991, indicou que documentos internacionais mais importantes (NRC,
64 citavam os alimentos ricos em amido, dos quais 1989a; WHO, 1990b; WCRF, 1997; ACC/SCN,
62 recomendavam um aumento geral e 2 reco- 2000; WHO 2002a).
mendavam um aumento para pessoas com risco
25. Outros comentários sobre as recomendações:
Orientação para o governo e a indústria
O incentivo à utilização de alimentos naturais ou
com um mínimo de processamento em programas
como os de alimentação escolar, a capacitação dos
profissionais responsáveis pela alimentação de
crianças em escolas e creches para o desenvol-
vimento de hábitos alimentares saudáveis são
exemplos de ações governamentais que contribuem
para o alcance desta recomendação. Também é de
suma importância iniciativas de capacitação dos
profissionais de saúde em atividade na atenção
básica em alimentação e nutrição de maneira a
assegurar informação e orientação adequadas aos
usuários em todas as fases do ciclo de vida. No caso
da indústria o desenvolvimento de produtos com
baixo teor de refinamento, gordura e açúcar
também é positivo. 25
Guia alimentar para a população brasileira
Objetivo para profissionais de Saúde
Metade ou mais da metade das calorias das diferentes
refeições deverá ter origem em alimentos com
amido. O objetivo de aumentar 40 % do consumo
pretende alcançar 50 % do total calórico diário.
Em situações em que a alimentação é adequada e
variada poderia-se chegar até 60%. Geralmente as
alimentações compostas por alimentos à base de
amido não refinados e que alcancem apenas o
limite inferior recomendável, são mais saudáveis
que as constituídas por alimentos refinados que se
encontram no limite superior.
Orientação para os membros da família
Fiquem atentos ao que estamos denominando
"porção", muitas vezes pode ocorrer que o seu
padrão de consumo de determinado alimento seja
alto, e o que para você é uma porção, em termos da
recomendação pode valer duas ou mais por-
ções.Também, lembre-se que a forma mais saudável
de consumo de alimentos fontes de amido é quando
eles não foram preparados com gordura ou açúcar.
Ver também "Quantidade de vegetais recomen-
dada" (páginas xx), e Colocando as recomendações
em prática (páginas xx).
26. Recomendação 3
Legumes, Verduras e Frutas
Recomendação para todos
Legumes, verduras e frutas disponíveis durante todo o ano, ricos em fibras,
vitaminas e minerais e outros nutrientes vitais, protegem a saúde.
Orientação para os governos e a indústria
Promover a produção, o processamento, sem perda do valor nutricional, e consumo
de todos os tipos de legumes, verduras e frutas, principalmente daquelas de origem
local. Incentivar e fomentar a produção de maneira a reduzir os custos de produção
e comercialização de legumes, verduras e frutas
26
Objetivo para os profissionais de saúde
Recomendação 3
Uma variedade de legumes, verduras e frutas existentes durante todo o ano deve
garantir 10% do total de energia diária. Isso significa um aumento de 300% (o
triplo) do consumo médio atual.
Orientação para os membros da família
Consumo de 3 ou mais porções de legumes e verduras e de 2 porções ou mais de
frutas como parte principal das refeições, sobremesas e lanches, diariamente.
Introdução verde, cebola, abóbora, espinafre. Os vegetais
utilizados, preponderantemente em forma crua e
Dependendo da região e cultura alimentar as em preparações do tipo saladas são denominados
pessoas podem denominar de maneiras distintas os hortaliças, também são extremamente variados.
alimentos vegetais. Desta maneira, pode-se Alguns exemplos são pepino, diferentes tipos de
encontrar sob a denominação "verdura" todo o alface, pimentão, rabanete e tomate. Fungos como
grupo de hortaliças e legumes. A depender da cogumelos, alhos e todos os tipos de ervas e
situação de trabalho específica, adaptações de especiarias são considerados vegetais.
linguagem deverão ser feitas para facilitar a com- Frutas são as partes da planta que contêm as
preensão e manter a correção do tipo de alimento sementes. Alguns exemplos são acerola, maçã,
que se está incentivando o consumo. Esclarecendo abacate, banana, caju, cereja, figo, uva, goiaba,
a abordagem aqui adotada. kiwi, limão, manga, melão, laranja, mamão,
Como denominação mais genérica temos os pêssego, ameixa, pêra, abacaxi, carambola,
vegetais que são as folhas, raízes, talos, bulbos ou morango e tangerina. Outras frutas são o côco,
flores cultivados ou coletados. Alguns vegetais são tâmaras, figos, uvas e ameixas, que também
classificados botanicamente como frutas. A vari- podem ser comercializadas e consumidas em sua
edade de vegetais é imensa, alguns de ocorrência forma desidratada. As regiões brasileiras tem uma
apenas local ou regional, os de comercialização riqueza incalculável na variedade de frutas e
mais abrangente incluem beterraba, brócolis, couve, hortaliças locais (ver "Alimentos Regionais, nesta
cenoura, couve-flor, abobrinha, berinjela, feijão seção).
27. Os alimentos vegetais, as hortaliças e as frutas legumes, verduras e frutas, bem como em grãos e
são ricas em fibra dietética e diferentes tipos de legu-minosas. (Ver o quadro nesta seção).
vitaminas como: os carotenóides (precursores Ao contrário da grande maioria das frutas, os
vegetais da vitamina A, que existem em grande cocos, azeitonas e abacates contêm muita gordura.
quantidade nos vegetais e frutas coloridos), os folatos Neste guia, alimentos vegetais como os
(uma vitamina do complexo B, assim chamada tubérculos e as raízes como a batata e a mandioca
porque se encontra nas folhagens) e o ácido são considerados alimentos com amido (páginas
ascórbico (vitamina C). Com referência aos xx), e os feijões e outros grãos de leguminosas são
minerais, todos os legumes, verduras e frutas são considerados vegetais ricos em proteínas (páginas
ricos em potássio, cuja necessidade aumenta com xx). Produtos com alta concentração de açúcar como
alimentação de alto teor de sódio, e algumas contêm as geléias de fruta e as bebidas com sabor de fruta
quantidades suficientes de magnésio, cálcio e não fazem parte do conjunto de alimentos cujo
elementos-traço, em quantidades que dependem consumo esta sendo incentivado nesta recomen-
da qualidade do solo no qual são produzidos dação (páginas xx). Essas distinções são feitas em
(Southgate, 1993b). Talvez de importância outros relatórios referentes à nutrição e à saúde.
comparável sejam os fitoquímicos presentes nos (NRC, 1989a; WHO, 1990b; WCRF, 1997; ACC/
27
SABENDO UM POUCO MAIS
Guia alimentar para a população brasileira
O que são legumes, verduras e frutas para os
fins de recomendação deste guia?
Aqui está o que é referido por legumes, verduras e frutas neste guia. Primeiro, o termo
coloquial "legumes, verduras e frutas" é usado para enfatizar a importância da variedade
alimentar e também para o fato de que tanto hortaliças como frutas deveriam ser partes
importantes das refeições, e não somente lanches esporádicos(National Heart Forum,
1997 a ; WCRF,1997).
Em seguida, as frutas e as hortaliças são consideradas excelentes alimentos e são
abundantes no Brasil. No entanto, esta ênfase concentra-se, principalmente em suas formas
naturais e, portanto, os produtos enlatados, conservas de frutas e vegetais; frutas em calda
sucos de frutas engarrafados, em caixas ou em latas devem ser evitados porque, geralmente,
possuem alto teor de sal ou de açúcar Estes alimentos e ainda as geléias e os refrigerantes
de frutas estão incluídos em "Bebidas ricas em açúcar" (páginas xx).
Assim, um conjunto de alimentos vegetais tanto do ponto de vista botânico como
culinário, não estão incluídos na presente recomendação.
Neste guia, como em outros sobre saúde e nutrição, estão agrupados e incentiva-se o
consumo dos alimentos de origem vegetal, na sua forma integral ou com o mínimo de
processamento, que têm (com raras exceções) baixas calorias e são ricos em micronutrientes.
Todos os tipos de hortaliças, consumidas cruas ou cozidas, folhas, talos, bulbos e (com
exceções) raízes, fungos, ervas e especiarias estão incluídas.
O mesmo para todas as frutas e sementes, raízes de baixa caloria, como cenouras e
beterrabas. Os tubérculos como as batatas e raízes como mandioca e inhame são considerados
alimentos ricos em amido. (páginas 13-15).Os feijões, em parte devido à sua importância
tradicional no Brasil, e também porque somados ao arroz fornecem proteína de boa qualidade
biológica, foram incluídos na recomendação que trata de alimentos vegetais ricos em
proteínas. Nesta mesma recomendação estão incluídas as demais leguminosas, as nozes e
as sementes (páginas xx).
28. SABENDO UM POUCO MAIS
A constipação intestinal
A constipação ou obstipação ou "prisão de ventre" é uma doença provocada
principalmente pelo consumo insuficiente de fibras, porém outros aspectos também
são importantes para aqueles que já apresentam esta doença como por aqueles que
desejam manter um bom funcionamento intestinal, evitando esta e outras doenças de
origem gastrointestinal.
O bom funcionamento intestinal depende de três aspectos inseparáveis. São eles:
a ingestão de água, o consumo de fibras e a prática de atividade física. A regularidade
da atividade intestinal só é adequada quando estes três aspectos estão presentes. As
fibras auxiliam na formação do bolo fecal em parceria com a quantidade de água
ingerida e a atividade física é a responsável por estimular a atividade muscular intestinal.
Portanto, movimente-se e selecione bem os alimentos. A quantidade média
recomendada para a ingestão de fibras é de 30 gramas/dia.
A forte tendência de consumo de alimentos industrializados pode agravar ou
28 prejudicar o consumo de diário de fibras. Os alimentos industrializados são, em sua
grande maioria, processados. O processamento acaba retirando alguns nutrientes do
Recomendação 3
alimento sendo as fibras um deles. Observe através da rotulagem nutricional a
quantidade de fibras disponível nos alimentos selecionados para o seu consumo.
Os legumes, verduras e frutas (por ex. mamão, tamarino, laranja, ameixa, manga,
folhas em geral) são alimentos in natura, e ótimas fontes de fibras e micronutrientes,
além de também serem pouco densos energeticamente. Os cereais integrais como
arroz integral, pão integral, centeio, aveia, sementes de linhaça, farelo de aveia e trigo
etc também são ótimas alternativas para aumentar a quantidade de fibras ingeridas.
SCN, 2000) Ver também abaixo "O que são sangue e no metabolismo de ácidos graxos e
legumes, verduras e frutas?" aminoácidos; e o solo pode ser insuficiente em iodo
que faz parte da constituição do hormônio
tiroidiano – tiroxina – que regula o metabolismo
Discussão energético. (ver "Alimentos de origem animal",
páginas xx, e "Preparação e Processamento dos
Os legumes, verduras e frutas não garantem proteção Alimentos", páginas xx).
contradeficiência de energia e proteínas, porque a Alimentos ricos em carotenóides (precursores
sua densidade energética é baixa em comparação vegetais da vitamina A), encontrados em muitos
com os vegetais incluídos no grupo dos amidos. legumes, verduras e frutas, protegem contra
Mas o consumo regular de uma variedade colorida xeroftalmia, cataratas e outras doenças oculares. O
de hortaliças e frutas, juntamente com alimentos ácido ascórbico (vitamina C)aumenta a absorção
ricos em amido pouco processados, oferece garantia de ferro e assim ajuda a prevenir a anemia ferropriva.
contra a deficiência da maior parte de vitaminas e Isso é muito importante nas regiões onde a
minerais, isoladamente ou em conjunto, aumen- deficiência de vitamina A e de ferro é alta
tando a resistência às infecções. Isso se comprova a (McLaren, Loveridge et al, 1993; Halsted, 1993;
partir das funções biológicas e biodisponibilidade Klerk, Jansen et al, 1998).
dos nutrientes contidos nos legumes, verduras e nas Há provas recentes de que as alimentações ricas
frutas (Scrimshaw, Taylor et al, 1968; Scrimshaw, em legumes, verduras e frutas protegem contra as
2000). Existem exceções: os vegetais não contêm doenças pulmonares crônicas e obstrutivas,
vitamina B12 – que junto com o folato participa incluindo a asma e a bronquite. O mecanismo de
da formação das hemácias – células vermelhas do ação parece ser a melhoria do fluxo de ar provocado