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2ª CA
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ANDRADE, Manuel C. Caminhos e descaminhos
da geografia. Campinas: Papirus, 1989. ............................................................. 4
HAESBAERT, Rogério. O mito da desterritorialização.
Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2004 ................................................. 8
SANTOS, Milton; SILVEIRA, Maria Laura.
O Brasil: território e sociedade no início do século XXI.
Rio de Janeiro: Record, 2001. .......................................................... 13
SANTOS, M. (Org). Novos Rumos da Geografia Brasileira.
São Paulo: Hucitec, 1982. ................................................................ 16
SIMIELLI, Maria Elena R. Cartografia no
ensino fundamental e médio. In: CARLOS, Ana Fani A. (Org.).
A geografia na sala de aula.
São Paulo: Contexto, 1999. p. 92-108. ............................................ 19
VESENTINI, José William (Org.).
Ensino de geografia no século XXI.
São Paulo: Papirus, 2005. ................................................................ 21
4
Nº 18
MAIO/2006
ANDRADE, Manuel C. Caminhos e descaminhos da geografia. Campinas: Papirus, 1989.
Elaborada pelo Professor Auro Moreno Romero
Mestre em Geografia – USP
1 – INTRODUÇÃO
Manuel C. de Andrade apresenta nesse livro uma
coleção de artigos escritos no período compreendido
entre os anos de 1984/1987, portanto, um momento
em que o Brasil e o mundo passavam por grandes trans-
formações sociais e políticas. É neste contexto de mu-
danças que o autor rediscute o papel da geografia, como
ciência capaz de corroborar com a melhoria da quali-
dade de vida de todos e do geógrafo, como cidadão
que participa das mudanças e as ajuda compreender.
Assim, podemos dividir o livro, segundo o autor, nos
seguintes artigos: A geografia e o problema da
interdisciplinaridade entre as ciências; A geografia e a
crise brasileira; Populismo e organização social do es-
paço; Perspectivas do papel do geógrafo, como profis-
sional no Brasil; O livro didático de geografia no con-
texto da prática de ensino e A geografia e o problema
da redivisão territorial do Brasil.
2 - A GEOGRAFIA E O PROBLEMA DA
INTERDISCIPLINARIDADE ENTRE AS CIÊNCIAS
Desde o século XVIII, principalmente com Kant e,
no século XIX, com Comte, estabelecer os limites en-
tre os campos das várias ciências tem se tornado uma
preocupação para os filósofos. O conhecimento cien-
tífico não pode ser compartimentado, todavia existe
um problema entre a vastidão de conhecimentos de-
senvolvidos pela humanidade e a capacidade do ho-
mem de acumulá-lo em um único campo. Sendo as-
sim, a questão reside em como, sem quebrar o prin-
cípio da totalidade dos conhecimentos, estabelecer
ramos específicos para cada área do conhecimento.
A preocupação central do autor neste artigo é como a
geografia, que só se tornou uma ciência autônoma
nas últimas décadas do século XIX, se posiciona no
quadro das ciências.
2.1 – Da natureza da Geografia
O que seria a Geografia e qual o seu objeto de
estudo? Inicialmente a Geografia se constituía em um
conhecimento eminentemente prático, empírico e li-
mitado em catalogar e cartografar os lugares, servin-
do aos exércitos, governos e aos comerciantes que
necessitavam de informações sobre os principais pro-
dutos a serem explorados em uma determinada área.
Na proporção que os navegantes necessitavam de mais
segurança nas viagens, a Geografia foi ganhando um
caráter científico e estabelecendo relacionamento com
outras ciências.
A ciência geográfica ganha notoriedade a partir do
século XIX quando Humboldt observou as relações exis-
tentes entre a natureza de um lugar e as formas de
exploração desenvolvidas pelo homem. No mesmo
período Karl Hitter, procurou estudar os vários siste-
mas de organização do espaço terrestre, comparando
povos, instituições e sistemas de utilização de recur-
sos. Assim, esses dois pensadores alemães deram à
Geografia um status de ciência. Karl Hitter dedicou-se
muito mais ao ensino, desenvolvendo o método com-
parativo em Geografia, sendo professor de Ratzel e Elissé
Reclus que consolidariam o conhecimento geográfico
em bases verdadeiramente científicas.
Ratzel naturalista alemão viveu em uma época em
que a Alemanha realizava sua unidade e seus estudos
foram muito utilizados na política alemã do “espaço
vital”, daí ser considerado o fundador da escola
determinista e ter dado suporte teórico à Geopolítica
fundada por Kjillen em 1911. Ao contrário de Ratzel
que apoiava a expansão imperialista alemã, Elissé
Reclus militou contra essa política, adotando uma
política de contestação do imperialismo, por isso ter
ficado esquecido e marginalizado.
Já no século XX as concepções acerca da Geogra-
fia se diferenciam e ganham importância as chama-
das escolas nacionais, cada uma refletindo os inte-
resses de seus países, principalmente no que diz res-
peito ao imperialismo e ao processo de colonização.
A influência do positivismo na Geografia aumen-
tou o problema sobre a delimitação de qual deveria
ser a área de estudo da Geografia. Influenciada pelo
positivismo, a Geografia foi compartimentada em vá-
rios setores ou ramos: Geografia da População, Geo-
grafia Agrária entre outras. Essa visão departimentada
do contismo só será questionada após a Revolução
Russa, que através do marxismo, proporcionou que a
interdisciplinaridade fosse exercitada mais intensamen-
te na Geografia.
No caso Brasileiro a Geografia se desenvolveu muito
lentamente limitando-se aos estudos descritivos. Foi
só a partir de 1930 com a criação do IBGE e das pri-
meiras faculdades de Filosofia que a Geografia Brasi-
leira ganha um caráter científico. Daí delinearam-se
várias correntes: as preocupadas com a Geopolítica,
de cunho militar e as de modelo francesa (mais filo-
sófica) trazida por Pierre Mombeig Pierre Deffontaines
e Francis Ruellan. Também se destacam nesse perío-
do ensaístas como Gilberto Freire, Josué de Castro e
Caio Prado Junior.
Esse modelo de Geografia perdura até os anos 60
quando dois modelos de Geografia se chocam: uma
a serviço de um projeto de desenvolvimento capitalis-
ta dependente para o país (Geografia Quantitativa) e
outro que questionava a pretensa neutralidade da
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Geografia Quantitativa que dava suporte aos gover-
nos autoritários da época (Geografia Crítica). Os
Quantitivistas, em baixa durante toda a década de 80,
reaparecem nos anos 90 inspirados pela informática
e pelo uso do computador.
2.2 - O problema da interdisciplinaridade
Para o autor a interdisciplinaridade ganha uma di-
mensão especial na Geografia, pois a existência de
uma Geografia Humana e de uma Geografia Física é
apenas artificial e apenas serve para estabelecer uma
dicotomia que acaba pondo em risco a própria exis-
tência geográfica. Os saberes próprios da Geografia
tais como: a climatologia, a geomorfologia, pedologia,
etc. acabaram por se tornar objeto de estudo de es-
pecialista, criando assim uma preocupação para a
Geografia definir seu objeto.
Sendo a Geografia uma ciência social é importan-
te que estreite sua relação com as chamadas ciências
do homem, surgindo assim, saberes intermediários
entre elas e a Geografia.
A Geografia deve, portanto estabelecer um conta-
to direto com a História, com a Antropologia, com a
Economia Política entre outras ciências. É justamen-
te essa aproximação que enriquece a Geografia e tam-
bém as outras ciências.
3 – A GEOGRAFIA E A CRISE BRASILEIRA.
A palavra crise é uma das mais usadas no Brasil,
da mesma forma que o Brasil a Geografia também se
encontra em crise, isso porque antes de ser profissio-
nal o geógrafo é um cidadão e daí, dentro de sua área
de atuação, deve colaborar para procurar os caminhos
que ajudem na reformulação da sociedade brasileira.
3.1. – Características da crise brasileira.
O Brasil, apesar de ser um país de grande exten-
são territorial, rico em recursos naturais e com uma
população numerosa, se apresenta como um país po-
bre. Esse atraso em parte pode ser explicado em fun-
ção de nossa herança colonial, sustentada na explo-
ração dos recursos naturais e nas populações indíge-
nas e negras.
Ainda hoje, passado mais de 200 anos de nossa
independência, feita sem revolução e sem nenhuma
transformação, o país pouco mudou e praticamente
até os anos de 1930 o Brasil era dominado pelos gran-
des proprietários rurais.
A partir da década de 30, abriu-se espaço para os
grupos urbanos na participação da vida política. O
país se urbanizou e verificou-se o surgimento de uma
burguesia urbana que se aliou aos antigos chefes ru-
rais mantendo a estrutura de dominação. As leis tra-
balhistas, notadamente populistas acabaram fazendo
algumas concessões às classes mais baixas, todavia
mantendo o sistema social excludente.
Com exceção da PETROBRÁS, toda nossa econo-
mia foi sendo incorporada ao capitalismo internacio-
nal. O Brasil adotou um modelo econômico exporta-
dor sob alegação da necessidade de se pagar a dívida
externa, caindo em um círculo vicioso. Exporta para
pagar a dívida e aumenta a dívida por dar prioridade à
política exportadora.
3.2 - A crise da Geografia.
Em uma sociedade permanentemente em crise é
natural, que a Geografia, como ciência social, tam-
bém se encontre em crise.
Os grupos que estão no poder esperam que a Ge-
ografia esteja a serviço da exclusão social, que contri-
bua para beneficiar o grande capital. Todavia as su-
cessivas crises internacionais colocaram sob suspeita
a Geografia institucional e trouxe o problema do com-
prometimento do geógrafo com o país.
3.3 – A geografia e a crise
Sabendo que o país vive momentos de crise, o que
seve ser discutido é qual deve ser o papel do geógrafo
no momento atual.
Assim, para Andrade, o geógrafo só poderá con-
tribuir com seu país se possuir uma boa formação
científica; ser capaz de analisar a realidade brasileira,
dentro de sua especificidade; entender que não basta
descrever o visível, mas também perceber e interpretá-
lo; aceitar que existe um processo dialético na produ-
ção do espaço que obriga o geógrafo a dispor de um
quadro teórico que lhe permita analisar tanto as con-
dições do meio natural, submetidas também a um
processo dinâmico, como conhecer bem a estrutura
da sociedade em que vive; Possuir boa formação filo-
sófica para que com esta e com a práxis possa carac-
terizar as categorias que vai utilizar e por fim, possuir
um espírito critico e apaixonado para poder fugir dos
modelos filosóficos idealistas que as classes dominan-
tes utilizam com maestria para desviar os estudiosos
do caminho seguro na procura das soluções para a
problemática da sociedade.
Em síntese, é grande a responsabilidade do
geógrafo diante da crise que atinge o país e a sua
ciência. Cabe a ele participar do encontro de uma saída
autêntica para a crise nacional e de uma solução para
a retirada de sua própria ciência do descrédito e das
dificuldades com que ela se defronta.
4 - POPULISMO E ORGANIZAÇÃO
SOCIAL DO ESPAÇO.
O populismo é sempre tema atual e dos mais com-
plexos constituindo-se um desafio à reflexão. O
populismo é uma das formas de governo mais co-
muns em sociedades de transição, típicas dos países
subdesenvolvidos.
Constituem-se em um desafio refletir sobre a socie-
dade, política e a organização do espaço em regimes
populistas. Para o autor, o estudioso que se propor a
estudar o relacionamento entre o populismo e as for-
mas de organização do espaço se vê obrigado a ma-
nejar com categorias científicas as mais diversificadas.
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Necessita refletir, levando em conta que o espaço nunca
está organizado de forma definitiva, não é algo estáti-
co, é profundamente dinâmico e vai se modificando
dialeticamente de forma permanente. O espaço pro-
duzido é sempre temporário pois é produto das rela-
ções dialéticas entre sociedade e natureza, permane-
cendo ora de forma mais intensa, ora de forma me-
nos intensa em permanente transformação.
4.1 – Do espaço organizado
Durante muito tempo admitiu-se que o espaço ou
era produto da influência da natureza, havendo um
determinismo do meio natural sobre a ação do ho-
mem, ou, que sem se libertar da influência do
ambientalismo, haveria possibilidades recíprocas da
influência do homem sobre o meio e do meio sobre o
homem – o possibilismo.
Hoje ao analisarmos o espaço em suas várias es-
calas devemos considerar um erro darmos ênfase
unicamente qualitativa, ou seja, a problemática es-
pacial não pode ser vista apenas pela visão da Geo-
grafia. A análise espacial exige a participação da socio-
logia, da antropologia, da história, da economia, da
política entre outras ciências.
Ao estudarmos o espaço produzido deve-se levar
em conta que esse espaço é a resultante de uma evo-
lução e foi produto da ação de numerosos fatores,
bastante diversificados. É necessário destacar que a
interferência individual na organização do espaço é
praticamente nula por isso o que importa é entender-
mos como atua a sociedade em seu conjunto. Na
medida em que nossa sociedade constitui-se em uma
sociedade capitalista, a organização do espaço irá re-
fletir, dentro de certas limitações, os interesses das
classes dominantes. Limitações impostas pelas diver-
gências de interesses dentro das classes dominantes
e pelas pressões impostas pelas classes dominadas.
Desta forma, a organização de um determinado
espaço, sempre irá refletir as estruturas sociais exis-
tentes e dominantes.
4.2 – O populismo e suas características
Os governos populistas são típicos dos países sub-
desenvolvidos, nos períodos de crises sociais. Sem-
pre que ocorre uma certa instabilidade política e soci-
al e é comum o surgimento de lideres carismáticos.
O líder populista não tem compromisso com mudan-
ças reais, procura com reformas superficiais atenuar
as tensões.
No Brasil, os períodos populistas muitas vezes se
seguem ou coexistem com períodos autoritários (1930/
34,1937/45 e 1964).
4.3 – O populismo e a produção do espaço social
A questão central, segundo o autor, é discutir quais
são as repercussões de uma política populista sobre
o espaço social produzido? Ou ainda, com que inten-
sidade uma ação populista pode modificar o espaço
anteriormente produzido e que marcas poderá deixar
para o futuro?
No Brasil podemos dizer que o populismo estava
muito mais voltado para as populações urbanas do
que para as rurais. A modernização da indústria veio
a atender os desejos de uma burguesia urbana, toda-
via, as intervenções que favoreceram às mudanças não
provocaram alterações nas velhas formas de poder.
As transformações urbanas e indústriais provoca-
ram um grande êxodo rural, principalmente de traba-
lhadores sem qualificação o que provocou ainda mais
a queda no padrão da qualidade de vida, das condi-
ções sanitárias, da segurança, da saúde, etc.
O crescimento urbano foi ainda estimulado pela
construção de grandes rodovias que facilitaram a
integração do território. O deslocamento de popula-
ção (para atender as classes dominantes nacional e
as empresas estrangeiras) se deu de forma
desordenada em sem planejamento provocando a
destruição e a degradação do meio ambiente.
Poderíamos citar diversos exemplos, todavia o que
importa é demonstrar como a atuação populista pode
modificar a organização espacial do país nas mais di-
versas escalas exacerbando as tendências dominan-
tes em um país inserido na área de domínio do capi-
talismo periférico.
5 – PERSPECTIVAS DO PAPEL DO GEÓGRAFO
COMO PROFISSIONAL, NO BRASIL
Para discutir o papel do geógrafo como profissio-
nal o autor coloca duas questões:
1- Qual a formação profissional do geógrafo;
2- Qual o mercado de trabalho que oferece oportuni-
dades ao profissional de geografia.
Nas primeiras quatro décadas do século XX prati-
camente não houve preocupação, no Brasil, em se
formar profissionais que requeriam maior especiali-
zação, como é o caso da Geografia.
A Geografia só começou ser lecionada oficialmen-
te em institutos superiores após a Revolução de 1930,
com a criação dos cursos de Geografia e História, nas
faculdades de filosofia e com a introdução de uma
disciplina de Geografia Econômica nos cursos de Ad-
ministração e Finanças, de Ciências Contábeis e
Atuariais e de Administração Pública e de Empresas.
Mesmo assim a Geografia não era ministrada com
a finalidade de formar geógrafos mas sim formar pro-
fessores para as escolas de ensino médio e dar subsí-
dios aos economistas e administradores.
5.1 – Os primeiros trabalhos geográficos
Os primeiros trabalhos geográficos foram elabo-
rados por não geógrafos. Trabalhos, sobretudo im-
portantes quando das questões de limites, de frontei-
ras entre o Brasil e as Repúblicas Vizinhas. Podemos
considerar como pioneiros dos estudos geográficos,
embora não sendo geógrafos, Olville Derby, Teodoro
Sampaio, Capistrano de Abreu, Oliveira Viana, Gilber-
to Freire e Caio Prado Junior, todavia é Delgado de
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Carvalho que pode ser considerado o primeiro geógrafo
brasileiro, precursor da Geografia científica no Brasil,
com trabalhos publicados no início do século XX.
5.2 – A oportunidade para a existência
de geógrafos profissionais
A formação de geógrafos foi proporcional às exi-
gências criadas pelo desenvolvimento do país. No
IBGE, houve uma grande preocupação com as fron-
teiras do Brasil e com a necessidade de uma nova
divisão regional. O IBGE foi uma das grandes escolas
de formação de geógrafos, enviando técnicos para
realizarem cursos na França, principalmente para de-
senvolverem uma teoria sobre região que pudesse ser
aplicada ao Brasil.
Um outro segmento que contribuiu para a forma-
ção de geógrafos foi a USP, que passou a exigir dos
candidatos a professores o título de doutor. As nume-
rosas teses de doutoramento, então defendidas, se
constituíram num verdadeiro marco para a história
do desenvolvimento da Geografia Brasileira.
Fundada em 1945 a AGB desempenhou um gran-
de papel para a formação de pesquisadores. Criada
em São Paulo expandiu-se para todo o Brasil. Foram
de suma importância os congressos e os grupos de
trabalho que se formaram no interior da AGB.
O desmembramento dos cursos de Geografia e
História, a partir de 1955 favoreceu o surgimento de
inúmeras disciplinas auxiliares - embora agudizando
ainda mais a dicotomia entre Geografia física e hu-
mana – deu à Geografia mais autonomia.
5.3 – A pós-graduação e a regulamentação da profissão
Nos anos 60 houve no Brasil um grande estimulo à
criação de cursos de pós-graduação, seguindo o mode-
lo norte-americano. Os primeiros mestrados surgiram
ma Universidade de São Paulo posteriormente foram
sendo implantados cursos na Universidade Federal do
Pernambuco, na UNESP, na Universidade Federal de
Sergipe, na Universidade Federal de Santa Catarina.
5.4 – As perspectivas para o geógrafo
As perspectivas para o geógrafo não são muito
amplas. Elas surgem sobretudo no setor público, nas
áreas de planejamento, defesa do meio ambiente, pro-
blemas de urbanização etc. Inicialmente a procura era
maior por cartógrafos – área onde os geógrafos en-
frentavam uma série concorrência dos engenheiros.
Além dessas áreas os geógrafos encontram traba-
lho nos estudos rurais, principalmente em um mo-
mento em que se discute tanto uma reformulação
fundiária. Na empresa privada o geógrafo encontra
espaço nas empresas de mineração, exploração agrí-
cola, de transportes, principalmente após o governo
começar a exigir das empresas maiores cuidados quan-
to à preservação ambiental.
Após anos de batalha a profissão de geógrafo foi
regulamentada pelo projeto de Lei 6664 de 26 de ju-
nho de 1979 que estabeleceu ao geógrafo um campo
de atuação específico, bem delimitado e tecnocrático.
Elaborada no período ditatorial, essa Lei vinculou os
geógrafos ao CONFEA, ao lado dos engenheiros, agrô-
nomos e dos arquitetos, ignorando a formação
humanística que caracteriza a Geografia. Hoje a Geo-
grafia desempenha um grande papel na vida brasilei-
ra e tem, pelas condições do país e pela capacidade
de seus profissionais, um grande espaço a ocupar na
construção do Brasil de amanhã.
6 - O LIVRO DIDÁTICO DE GEOGRAFIA
NO CONTEXTO DA PRÁTICA DE ENSINO
6.1 – O livro didático no 1o
e 2o
graus
Os primeiros livros didáticos refletiam o modelo
de ensino de geografia que se praticava até 1930. Os
estudantes eram obrigados a decorar nomes de aci-
dentes geográficos – linha costeira, relevo, rios, la-
gos, nomes de capitais e de principais cidades etc.
Após 1930 Delgado de Carvalho, inspirado na Ge-
ografia Francesa, publica uma série de livros sobre o
Brasil, chegando a publicar, com fim estritamente di-
dático, uma Corografia do Brasil. A reforma educaci-
onal Francisco de Campos deu grande ênfase à Geo-
grafia que passou a ser ensinada nas cinco séries do
ensino ginasial. Essa reforma animou novos profes-
sores a escreverem compêndios de geografia. Daí
surgiram, na década de 30, as coleções de livros es-
critos por Delgado de Carvalho e Aroldo de Azevedo,
Pierre Mombeig, João Dias da Silveira, Maria da Con-
ceição Vicente de Carvalho.
Com a reforma do Estado Novo, a Geografia, con-
siderada uma ciência conservadora, ganhou espaço
e passou a ser ensinada em todo curso secundário.
No início da década de 50 surgiram novos livros
didáticos que procuraram apresentar, de forma mais
dinâmica, os fenômenos geográficos, abandonando
as classificações estáticas, principalmente tratando-
se das climáticas.
Nos anos 60, com o domínio de uma política
populista, houve maior estímulo à produção de livros
didáticos aparecendo novos autores e editoras que
além dos livros didáticos produziam os cadernos de
exercícios, os chamados “livros do mestre”, com res-
postas e formulações prontas, limitando a criatividade
do professor e a perda de reflexão por parte deste.
Assim, é fundamental uma revisão total no ensino
de geografia no nível médio. O professor deve utilizar,
além do livro didático, outras formas auxiliares de
pesquisa. Os livros didáticos além de serem melhora-
dos necessitam ter um caráter mais regional afim que
os estudantes comecem a aprendizagem a partir da
paisagem com que convivem diariamente. A geogra-
fia não pode ser ensinada a partir de grandes concep-
ções generalizantes, ela deve dar maior atenção à pro-
dução do espaço.
6.2 – O livro didático para o ensino superior
Para o ensino superior, o problema é bem diverso,
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o livro texto perde importância, embora também seja
indispensável para dar uma linha mestra ao pensamento
do formando, quer captando-o para uma linha de pen-
samento do autor, quer levando-o a raciocinar de for-
ma crítica sobre essa linha de pensamento.
7 – A GEOGRAFIA E O PROBLEMA DA
REDIVISÃO TERRITORIAL DO BRASIL
7.1 – Origem da divisão
político-administrativa do Brasil
O Brasil, apesar de sua grande extensão territorial
e de sua elevada população, comparado a outros pa-
íses vê-se pouco dividido politicamente, o que traz
conseqüências nem sempre favoráveis à administra-
ção e ao seu desenvolvimento.
A divisão político-administrativa, com pequenas al-
terações, pouco mudou desde o período colonial. Do
ponto de vista geográfico, admite-se que os estados de
grande extensão territorial mantiveram a sua unidade
em função da inexistência de um povoamento efetivo
por parte do colonizador, concentrando as populações
próximas de algumas cidades de maior expressão.
7.2 – Os estados e as reivindicações autonomistas
A divisão político-administrativa brasileira sempre
foi muito questionada, isto porque se consiste numa
divisão abstrata e irreal na medida que ignora os inte-
resses e as aspirações populares.
Os grandes estados não dispõem de recursos para
promover o desenvolvimento de áreas periféricas ao
mesmo tempo em os habitantes de áreas muito po-
voadas se sentem desvinculados do estado que per-
tencem e defendem o direito à autonomia alegando
sentirem-se desprezados pelos governos estaduais.
7.3 – A Assembléia Constituinte e a
divisão político-administrativa do Brasil
Na Assembléia Constituinte foram apresentados
projetos de redivisão territorial do Brasil levando-nos
a pensar se essas propostas correspondem às aspira-
ções de suas populações ou aos interesses das oli-
garquias que controlam o poder nessas áreas. O que
deveria ser levado em consideração no momento em
que se discute a divisão do país em mais estados são
as áreas de fronteiras. Os parlamentares e adminis-
tradores deveriam estudar a possibilidade de criação
de territórios federais em áreas fronteiriças, potenci-
almente ricas e sujeitas à infiltração estrangeira.
7.4 – Há outra alternativa
Talvez uma alternativa à divisão dos velhos esta-
dos seria a criação de uma nova escala de divisão
territorial de nível superior à municipal e inferior à es-
tadual. Ela constituiria na criação de departamentos
ou regiões administrativas nos vários estados, sobre-
tudo nos de maior extensão territorial, que interme-
diariam os dois níveis de administração.
8 – REFLEXÕES A RESPEITO
DO DOUTORADO EM GEOGRAFIA.
Os cursos de pós-graduação foram implantados
durante o período autoritário sendo que antes disso
havia a nível federal um sistema bastante diferente.
Após dois anos de formados na graduação os inte-
ressados em seguir uma carreira universitária podiam
se inscrever para o concurso de Livre Docência apre-
sentando uma tese já elaborada. O cargo de profes-
sor catedrático era obtido mediante concurso.
A deficiência de doutores na área de Geografia no
Brasil resulta da falta de tradição na formação de dou-
tores nas universidades federais.
Quanto à Geografia, o grande debate que ela está
provocando atinge a sua conceituação e os métodos
utilizados; cremos que a Geografia encontra-se em
um processo evolutivo rápido de modo que, ao lado
das pesquisas empíricas, vem se travando uma pro-
funda discussão teórica que deságua em posições fi-
losóficas e epistemológicas as mais diversas.
A grande importância dos cursos de pós-gradua-
ção em Geografia, segundo Andrade, é a possibilida-
de de deixarmos de copiar os modelos estrangeiros
de Geografia e desenvolvermos nossa ciência de for-
ma crítica e autônoma.
HAESBAERT, Rogério. O mito da desterritorialização:
do “fim dos territórios” à multiterritorialidade. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2004.
Elaborada pela Profa. Joyce Regina da Silva Magalhães Bozzi
Graduada em Letras – Especialista em Ensino Superior – UNOPAR-PR
Território e desterritorialização nas ciências so-
ciais. Com a globalização via internet e o ciberespaço
está destruindo a territorialidade das fronteiras dos
Estados e criando um único espaço virtual? O mundo
estaria se desterritorializando? A tese de Rogério
Haesbaert é que o movimento de destruição de territó-
rios (com o mito da desterritorialização – um mundo
sem fronteiras, sociedade em rede) é, na verdade, a
reconstrução do território em novas bases, isto porque
o homem não vive sem território e que a sociedade
não pode existir sem territorialidade. A questão é, se-
gundo Haesbaert, enfocar o território numa perspecti-
va geográfica intrinsecamente integradora, ou seja, num
sentido múltiplo e relacional, respeitando a diversidade
9
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e a dinâmica temporal do mundo. Assim, a terri-
torialização é vista para além do processo de domínio
político-econômico, ou de apropriação simbólico-cul-
tural do espaço pelos grupos humanos. Portanto, cada
ser humano precisa territorializar-se. Para Haesbaert, a
questão não é o fenômeno da desterritorialização, mas
o da multiterritorialização: experimentar diferentes ter-
ritórios ao mesmo tempo. Entretanto, as relações ca-
pitalistas relegaram a maior parte da humanidade à
“exclusão aviltante ou às inclusões extremamente pre-
cárias, no qual no lugar de partilharem múltiplos ter-
ritórios, vaguem em busca de um, o mais elementar
território da sobrevivência cotidiana, como é o caso
dos múltiplos territórios precários que abrigam sem-
tetos, sem terras e outros grupos minoritários que
parecem não ter lugar numa desordem de ‘aglomera-
dos humanos’ (...) estigmatizados e separados”. Por-
tanto, “o sonho da multiterritorialidade generalizada,
dos ‘territórios-rede’ a conectar a humanidade intei-
ra, parte (...) da territorialidade mínima, abriga e acon-
chego, condição indispensável para (...) estimular a
individualidade e promover o convício solidário das
multiplicidades – de todos e de cada um de nós”, diz
Haesbaert.
As questões sociológicas referentes ao espaço e
território tiveram as contribuições de Michel Foucault
(emergência de uma era centrada no tempo e no es-
paço com destaque para a questão do poder), Jameson
(sobre a questão da cultura e espaço), Deleuze e
Guatarri (geofilosofia – no qual atentou para o perigo
do fascínio da desterritorialização: “inteiramente des-
providos de territórios, nos fragilizamos até desman-
char irremediavelmente”). Já no Brasil há a contri-
buição de Otávio Ianni e, principalmente, Milton San-
tos. Para este, a “desterritorialização é, freqüen-
temente, uma outra palavra para significar
estranhamente, que é, também, desculturização” e
há, segundo ele, uma associação entre “ordem glo-
bal” que “desterritorializa” e “ordem local” que
“reterritorializa”. Mas sobre o olhar geográfico, deve-
se compreender esta análise a partir da multerrito-
rialidade. Portanto, para Haesbaert, sobre a desterrito-
rialização:
a) não há definição clara de territórios nos debates
que focalizam a desterritorialização; o território ora
aparece como algo “dado”, um conceito implícito
ou a priori referido a um espaço absoluto, oura
ele é definido de forma negativa, isto é, a partir
daquilo que ele não é;
b) desterritorialização é focalizada quase sempre como
um processo genérico numa relação dicotômica e
não intrinsecamente vinculada à sua contraparte, a
(re)territorialização; este dualismo mais geral encon-
tra-se ligado a vários outros, como as dissociações
entre espaço e tempo, espaço e sociedade, materi-
al e imaterial, fixação e mobilidade;
c) desterritorialização significando “fim dos territóri-
os” aparece associada, sobretudo, com a predo-
minância de redes, completamente dissociadas de
e/ou opostas a territórios, e como se crescente
globalização e mobilidade fossem sempre sinôni-
mos de desterritorialização.
Entender a Desterritorialização a partir da defi-
nição de Território. Trata-se de analisar as questões
de como as diferentes concepções de território, ao longo
da tradição do pensamento geográfico e sociológico,
servem de pano de fundo para o debate sobre a
desterritorialização. Território pode ser compreendido
em três vertentes básicas: a) política – referida às rela-
ções espaço-poder ou jurídico-política – relativa a to-
das as relações espaço-poder institucionalizadas. Ter-
ritório: espaço delimitado e controlado, no qual se exerce
um determinado poder relacionado ao poder político
do Estado. Trata-se do jogo entre os “macropoderes”
políticos institucionalizados e os “micropoderes” (Michel
Foucault); b) cultural (culturalista) ou simbólico-cul-
tural (Bourdieu): território como produto da apropria-
ção/valorização simbólica de um grupo em relação ao
seu espaço vivido; c) econômica (economicista): terri-
tório como fonte de recursos e incorporado no embate
entre duas classes sociais e na relação capital-traba-
lho, como produto da divisão “territorial” do trabalho.
Entretanto, segundo Haesbaert, há um entrecruzamento
de proposições teóricas, no qual é fundamental trazer
uma outra postura teórica que seja mais ampla: terri-
tório numa perspectiva integradora e relacional, no
qual traz a idéia de território como um híbrido, seja
entre o mundo material e ideal, seja entre natureza e
sociedade, em suas múltiplas esferas (econômica, po-
lítica e cultural).
Haesbaert postula uma leitura integradora e
relacional do território. Hoje, a “experiência
integradora” é possível somente se estivermos arti-
culados (em rede) através de múltiplas escalas. Não
há território sem uma estruturação em rede que
conecta diferentes pontos ou áreas. É o domínio dos
“territórios-rede”, espacialmente descontínuos, mas
intensamente conectados e articulados entre si. Tra-
ta-se de uma leitura integrada do espaço social com
uma visão de território a partir da concepção de es-
paço como um híbrido na indissociação entre movi-
mento e (relativa) estabilidade. Território, neste sen-
tido, pode ser concebido a partir da imbricação de
múltiplas relações de poder, do poder mais material
das relações econômico-políticas ao poder mais sim-
bólico das relações de ordem mais estritamente cul-
tural. Para além de uma leitura puramente materialis-
ta do poder, na leitura relacional, o poder é com-
preendido “como relação, e não como coisa a qual
possuímos ou da qual somos expropriados, envolve
não apenas as relações sociais concretas, mas tam-
bém as representações que elas veiculam e, de certa
forma, também produzem. Assim, não há como se-
parar o poder político nem sentido mais estrito do
poder simbólico”.
Território e Desterritorialização em Deleuze e
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Guattari. Trata-se de uma concepção teoricamente mais
elaborada sobre desterritorialização que vem da filoso-
fia, como um dos conceitos centrais do pós-estrutura-
lismo de Guilles Deleuze e Félix Guattari. Segundo eles,
“não há território sem um vetor de saída do território, e
não há saída do território, ou seja, desterritorialização,
sem, ao mesmo tempo, um esforço para se
reterritorializar em outra parte”. Os territórios sempre
comportam dentro de si vetores de desterritorialização e
de reterritorialização. Muito mais do que uma coisa ou
objeto, diz Haesbaert, “o território é um ato, uma ação,
uma relação, um movimento” (de territorialização e
desterritorialização), um ritmo, um movimento que se
repete e sobre o qual se exerce um controle. Esta dialética
envolve a criação e a destruição de territórios, conforme
nos atestam Deleuze e Guattari: “o território pode se
desterritorializar, isto é, abrir-se, engajar-se em linhas
de fuga e até sair do seu curso e se destruir. A espécie
humana está mergulhada num imenso movimento de
desterritorialização, no sentido de que seus territórios
‘originais’ se desfazem ininterruptamente com a divi-
são social do trabalho, com a ação dos deuses univer-
sais que ultrapassam os quadros da tribo e da etnia,
com os sistemas maquínicos que a levam a atraves-
sar, cada vez mais rapidamente, as estratificações
materiais e mentais”. Para compreensão desta dialética
entre desterritorialização e reterritorialização, exemplifica-
se com a condição do bóia-fria morador de periferias
urbanas. Assim, como entender este universo para a ge-
ografia? Segundo Deleuze, “a geografia não se conten-
ta em fornecer uma matéria e lugares variáveis para a
forma histórica. Ela não é somente humana e física,
mas mental, como a paisagem. Ela arranca a história
do culto da necessidade, para fazer valer a
irredutibilidade da contingência, ela a arranca do cul-
to das origens, para afirmar a potência de um ‘meio’
(...). Enfim, ela arranca a história de si mesma para
descobrir os devires, que não são a história mesmo
quando nela recaem (...)”. Ora, se a Geografia menos-
prezou as dinâmicas desreterritorializadoras como cen-
tro de sua análise, trata-se de recuperar os estudos es-
paciais em torno dos fenômenos de deslocamento e das
desconexões, especialmente diante da nossa nova ex-
periência “pós-moderna” de espaço-tempo, diz
Haesbaert.
Pós-modernidade e Geometrias do Poder. Ana-
lisa-se desterritorialização, no sentindo de que não
representa mais uma extinção de território, e sim uma
dificuldade de definir o novo tipo de território muito
mais múltiplo e descontínuo, que está surgindo. No
âmbito da historicidade fica complexo analisar a con-
cepção de desterritorialização, especialmente quan-
do relaciona a experiência entre espaço-tempo,
modernidade e a pós-modernidade. Após rompimen-
to com uma época, o pós-modernismo estabelece uma
nova sensibilidade, uma nova leitura e uma nova ex-
periência de mundo, diretamente vinculada aos no-
vos paradigmas tecnológicos que balançam as anti-
gas certezas e os antigos laços da sociedade com o
espaço. No período da Revolução Industrial já mos-
trava traços que estavam sendo gestados pela
modernidade como “tudo que é sólido” tende a se
“desmanchar no ar” segundo Berman.
Enquanto a modernidade passava pelo mito da
Revolução, a pós-modernidade estaria ligada à repe-
tição, ao anti-histórico, ao presente contínuo, enfim,
na ótica severamente crítica. O projeto central da
modernidade enfatizava o indivíduo-sujeito na esfera
da autonomia individual, levando como marco desta
época a reterritorialização, ou seja, o individuo sus-
tentado pelo individualismo, faz com que indivíduo
queira ultrapassar os diversos territórios, comunitári-
os. Caracteriza-se sinteticamente o pós-modernismo
aquele que desestabiliza a estrutura metonímica que
relaciona presença e ausência com proximidade e dis-
tância, assim compreende-se que desreterritorialização
está fortemente vinculada com o fenômeno da com-
pressão tempo-espaço onde a sociedade complexa
vive no paradoxo da desigualdade diferenciada.
Múltiplas Dimensões da Desterritorialização:
perspectivas econômicas, política e cultural. A
desterritorialização é tratada em três grandes dimen-
sões sociais sendo elas: a econômica, a dimensão
política e a perspectiva simbólica ou cultural em sen-
tido mais restrito. A problemática destas dimensões
engloba a questão de território e a territorialização
sempre focados num sentido mais restrito, pelo qual
se busca responder problemáticas específicas ligadas
a questões econômicas, políticas ou culturais, mais
do que a problemática social que envolveria uma no-
ção de território mais integradora implícita quando se
fala em processos de exclusão social, já que exclusão
será vista aqui como um fenômeno amplo e comple-
xo, ao mesmo tempo de natureza econômica, política
e cultural.
Na dimensão da perspectiva econômica pode-
mos observar que não é a maior tradição nos debates
sobre território assim analisando três pontos de vista
econômicos que afetam a desterritorialização:
a) a desterritorialização é vista como sinônimo de
globalização econômica, esta situação econômica
acontece quando se forma um mercado mundial
com fluxos comercias e financeiros e de informa-
ções cada vez mais independentes de base
territoriais bem definidas, como a dos Estados
nações:
b) em um sentido mais complexo podemos dar ênfa-
se a um dos momentos do processo de globalização
ou ao mais típico, aquele chamado capitalismo pós-
fordista ou capitalismo de acumulação flexível, fle-
xibilidade esta que seria responsável pelo enfraque-
cimento das bases territoriais;
c) em um sentido mais específico citamos ainda a
desterritorialização como um processo vinculado
pela economia globalizada, o setor financeiro, onde
a tecnologia informacional tornaria mais evidente
tanto a imaterialidade quanto a instantaneidade.
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Dentro da perspectiva política pode-se delimitar
seus aspectos onde território é aquele que vincula
espaço e soberania estatal, ou seja, território como a
área ou espaço de exercício da soberania de um Esta-
do. Através do aparecimento do Estado vê-se que ele
é o primeiro responsável pelo primeiro grande movi-
mento de desterritorialização, na medida em que ele
imprime a divisão de terra pela organização adminis-
trativa, fundiária e residencial.
No quadro da desterritorialização numa perspec-
tiva cultural, pode-se pensar o território ao longo da
história do pensamento nas Ciências Sociais, especi-
almente entre geógrafos e cientistas políticos. Partin-
do do par História-mito e da herança helenística, en-
quanto as “potências regem o mundo” produz histó-
ria, as cidades e seus territórios produzem e se ali-
mentam de mitos.
Desterritorialização e Mobilidade. Os processos
de territorialização classificam como fruto de interação
entre relações sociais e controle do/pelo espaço, rela-
ções de poder em sentido amplo, ao mesmo tempo
de forma mais concreta (dominação) e mais simbóli-
ca (um tipo de apropriação). Em uma visão mais tra-
dicional desterritorializar significa então, diminuir ou
enfraquecer o controle das fronteiras, aumentando
assim a dinâmica, a fluidez, em suma, em suma, a
mobilidade, seja ela de pessoas, bens materiais, capi-
tal ou informações. A desterritorialização em conse-
qüência do território torna-se assim discurso da mo-
bilidade tanto da mobilidade material quanto da mo-
bilidade imaterial, especialmente aquele diretamente
ligado aos fenômenos de compressão tempo-espa-
ço, propagado pela informatização através do chamado
ciberespaço. Os frutos da sociedade sem territoria-
lidade, sem local, torna a mobilidade generalizada, ou
seja, os territórios são construídos a partir do movi-
mento e onde o local se fundamenta na diferença das
mobilidades. Em um ângulo mais complexo da
desterritorialização vemos freqüentemente uma cres-
cente mobilidade das pessoas, seja como, novos nô-
mades, vagabundos, viajantes, turistas, imigrantes
refugiados ou como exilados – expressões cujo signi-
ficado costuma ir muito além de seu sentido literal.
No contexto geográfico, segundo o Haesbaert,
“podemos definir mobilidade como uma relação so-
cial ligada à mudança de lugar, isto é, como conjun-
to de mobilidades pelas quais os membros de uma
sociedade tratam a possibilidade de eles próprios ou
outros ocuparem sucessivamente vários lugares”.
Busca-se através de uma análise níveis para a
desterritorialização para cada grupo ou classe social,
percebe-se claramente que aquilo que é denominado
desterritorialização para a elite planetária que se
locomove com facilidade nada tem a ver com o des-
locamento compulsório das classes mais pobres. Na
classe que compõe os ricos a desterritorialização para
os ricos, pode ser confundida com uma multiterrito-
rialidade segura, mergulhada na flexibilidade e em
experiências múltiplas de mobilidade.
Dentro da sociedade percebe-se o tamanho do valor
dado à sociedade contemporânea, ou seja, não signi-
ficando obrigatoriamente que a mobilidade social num
mundo onde o movimento é regra, a fixidez e a esta-
bilidade podem acabar, de alguma forma, transfor-
mando-se também numa espécie de triunfo ou de
recurso.
Territórios, Redes e Aglomerados de Exclusão.
Pode-se identificar território no movimento ou pelo
movimento. Talvez esta seja a grande novidade da
nossa experiência espaço-temporal dita pós-moder-
na, onde controlar o espaço indispensável à nossa
reprodução não significa apenas controlar áreas e
definir fronteiras. Com a globalização a comunicação
revoluciona a formação de territórios pela configura-
ção de redes que podem mesmo prescindir de alguns
de seus componentes materiais fundamentais, como
linhas de energia ou até mesmo cabos telefônicos. O
território hoje, mais do que nunca, considera-se tam-
bém movimento, ritmo, fluxo, rede não se trata de
um movimento qualquer, ou de um movimento de
feições meramente funcionais: ele é também um
movimento dotado de significado, de expressividade,
isto é, que tem um significado determinado para quem
constrói ou dele usufrui. As redes participam de um
jogo ambivalente com os fluidos, ao mesmo tempo
tentando canalizá-los e/ou sendo desestruturadas por
eles, cria-se então a noção de aglomerados que sur-
ge pela necessidade de dar conta de outros tipos de
espaços que não se encaixavam claramente na lógi-
ca zonal, nem na lógica reticular.
Esta noção de aglomerados de exclusão traduz a
dimensão geográfica ou espacial dos processos mais
extremos de exclusão social porque ela parece expres-
sar bem a condição de desterritorialização ou de
territorialização precária a que estamos nos referin-
do. Em um sentido mais amplo, podemos considerar
que “aglomerados de exclusão” seriam o exemplo mais
representativo especificamente no caso dos aglome-
rados de massa impostos pela sociedade capitalista,
presentes em maior ou menor grau praticamente em
todos os espaços do nosso tempo.
Da Desterritorialização à Multiterritorialidade. Aqui
Haesbaert defende a tese de que desterritorialização é,
na verdade, uma nova forma de territorialização, a que
chamamos de “multiterritorialidade”: um processo
concomitante de destruição e construção de territóri-
os mesclando diferentes modalidades territoriais, como
é o caso dos “territórios-zona” e os “territórios-rede”,
em múltiplas escalas e novas formas de articulação
territorial. Segundo Rogério Haesbaert, “o mundo ‘mo-
derno’ das territorialidades contínuas/contíguas regidas
pelo princípio da exclusividade (...) estaria cedendo
lugar hoje ao mundo das múltiplas territorialidades
ativadas de acordo com os interesses, o momento e o
lugar em que nos encontramos”. Trata-se então, de
um “mosaico-padrão” de unidades territoriais em área,
seu convívio com uma miríade de territórios-rede mar-
cados pela descontinuidade e pela fragmentação que
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os possibilita a passagem de um território a outro, num
jogo que denomina-se multiterritorialidade humana.
Desterritorialização: é a reterritorialização complexa,
em rede e com fortes conotações rizomáticas, ou seja,
não-hierárquicas.
Neste contexto, destaca-se a “globalização”, isto
é, a dialética entre o global e o local combinados, ao
mesmo tempo: “o global e o local são processos,
não localizações. Globalização e localização produ-
zem todos os espaços como híbridos, como sítios
‘globais’ tanto de diferenciação quanto de integração.
O local e o global não são entidades fixas, mas são
produzidas de forma contingente, sempre em pro-
cessos de re-produção, nunca completados”. Assim,
a presença de territórios-rede proporciona as condi-
ções para a existência da multiterritorialidade. Esta
depende, sobretudo do contexto social, econômico,
político e cultural em que estamos situados. Multiter-
ritorialidade contemporânea pode ser altamente com-
plexa e dotada de ampla flexibilidade, como também,
ser ativada e desativada numa incrível velocidade.
Portanto, segundo Haesbaert, quem tiver mais opções
para ativar e comandar a riqueza da multiterritorialidade
que potencialmente se encontre a seu dispor, seja atra-
vés de movimentos progressistas (movimento Zapatista
de Chiapas), seja através de movimentos retrógrados
ou conservadores (Al Qaeda), consegue maior poder
para produzir mudanças sociais (“linhas de fuga”), no
sentido de um movimento concomitante de desterrito-
rialização e reterritorialização.
Desterritorialização como Mito. O discurso da
desterritorialização se coloca, segundo Haesbaert, como
um “discurso eurocêntrico ou ‘primeiro-mundista’,
atento muito mais à realidade das elites efetivamente
globalizadas e alheio à ebulição da diversidade de
experiências e reconstruções do espaço em curso não
só nas chamadas periferias do planeta como no inte-
rior das próprias metrópoles centrais. Com certeza, o
desprezo de algumas correntes filosóficas pela
materialidade do mundo (elaboradas em países ‘cen-
trais’) contribuiu para essa difusão da idéia de um
mundo de extinção dos territórios ou mergulhado numa
dinâmica crescente de desterritorialização”.
O fenômeno da desterritorialização e reterritoria-
lização não é um fenômeno pós-moderno ou da soci-
edade pós-industrial ou da sociedade informacional,
visto que o próprio império romano, medieval e o pró-
prio Marx como Durkheim já falavam destes fenôme-
nos. Também o é de longa data a questão do espaço
como esfera de possibilidade da existência da
multiplicidade. Assim, o espaço é a condição múltipla
de possibilidade tanto de desterritorialização e
reterritorialização, simultâneos. Não obstante, Haes-
baert acrescenta ainda o fenômeno da Multiterrito-
rialidade, para manter e enfatizar a idéia de processo,
de permanente movimento e devir. Multiterrito-
rialização: é a condensação de um processo que re-
presenta a territorialização através da própria
desterritorialização. Desterritorialização não é apenas:
a) desmaterialização ou domínio de relações simbóli-
cas ou “virtuais”; b) “não-presença” ou desvinculação
do aqui e do agora; c) aceleração do movimento ou
predomínio da fluidez sobre a estabilidade; d) enfra-
quecimento dos controles espaciais através de limi-
tes-fronteiras e áreas; e) aumento da hibridização cul-
tural; f) justaposição e imbricação de territórios. As-
sim, a desterritorialização é um mito.
Não obstante, muitas vezes, o pano de fundo dos
discursos sobre a desterritorialização é o movimento
neoliberal que prega o “fim das fronteiras” e o “fim
do Estado” para a livre atuação das forças do merca-
do. Assim, desterritorialização, referida aí à elite pla-
netária, é um mito. Não passa, para Haesbaert, de
um rearranjo territorial sob condições de grande com-
preensão do espaço-tempo, em que as transforma-
ções nas relações ligadas à distância e à presença-
ausência tornam-se ainda mais intensas as dinâmi-
cas de desigualdade e de diferenciação do espaço pla-
netário. Trata-se, neste sentido, da forma “versátil de
reterritorialização dos ‘de cima’ que se forja, por ou-
tro lado, grande parte da desterritorialização dos ‘de
baixo’, através do agravamento da desigualdade e
da exclusão pela concentração de renda, do capital
(dos investimentos) e da infra-estrutura, associada à
ausência de políticas efetivas de redistribuição, aos
investimentos mais na especulação financeira do que
no setor produtivo gerador de empregos, e à
globalização da cultura do status e do valor contábil
em uma sociedade de consumo estendida a todas
as esferas da vida humana”.
Entretanto, para além de hierarquizar as pedras,
plantas, animais, pessoas deve-se considerar o “par-
lamento das coisas” (Bruno Latour), no qual “não
admite nenhuma hierarquia ontológica entre as coi-
sas existentes”. Portanto, deve-se ter “amor por tudo
o que existe” (Gualandi). Este amor deve estar no cen-
tro de nossos processos de territorialização, pela “cons-
trução de territórios que não fossem simples territó-
rios funcionais de re-produção (exploração) econô-
mica e dominação política, mas efetivamente espa-
ços de apropriação e identificação social, em cuja
transformação nos sentíssemos efetivamente identi-
ficados e comprometidos” (Haesbaert). É “o espaço
do prazer” (Lefevre). Mas, como “amar tudo o que
existe”, num mundo de crescente e abominável desi-
gualdade, exclusão, segregação, violência e insegu-
rança? Para tanto - para poder “amar tudo o que existe”
e construir territórios efetivamente/afetivamente apro-
priados - é necessário “acabar com toda exploração
e indiferença dos homens entre si e dos homens para
com a própria natureza”, diz Haesbaert.
Para que os territórios não sejam mais instrumen-
tos de alienação, segregação, opressão e “in-seguran-
ça”, mas espaços estimuladores, ao mesmo tempo,
da diversidade e da igualdade sociais. O tempo denota
que, segundo Santos, “a força dos fracos é o seu tem-
po lento”. Mesmo que a corrente ideológica do capita-
lismo volátil tente destruir as referências territoriais ou
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que constrói multiterritorialidades num sentido
destabilizador fragmentador de falta de liberdade, da
dinâmica do consumo desenfreado, do correr o risco
de perder todos os nosso referenciais e fragilizarmos
até “desmanchar irremediavelmente” (Guattari), por
outro lado, já no universo dos “espaços lentos” e do
“reenraizamento” cabe reconhecer e lutar por essa
unidade das coisas do mundo e do território no interior
dessa unidade, estimular o potencial “invencionático”,
criativo, de multiplicidade. Trata-se de lutar concreta-
mente para, segundo Haesbaert, construir uma socie-
dade onde não só esteja muito mais democratizado o
acesso à mais ampla multiterritorialidade – e a convi-
vência de múltiplas territorialidades, onde estejam sem-
pre abertas, também, as possibilidades para a
reavaliação de nossas escolhas e a conseqüente cria-
ção de outras territorialidades ainda mais igualitárias e
respeitadoras da diferença humana.
Antes de ser a desterritorialização a grande ques-
tão da passagem de século (como quer Virilo), o que
está dominando, segundo Haesbaert, é a complexi-
dade das reterritorializações, “numa multiplicidade
de territorialidades nunca antes vista, dos limites mais
fechados e fixos da guetoficação e dos ‘neoterritórios’
da globalização”.
Portanto, conclui-se com singular maestria
Haesbaert: “O grande dilema deste novo século será
o da desigualdade entre as múltiplas velocidades,
ritmos e níveis de des-re-territorialização, especial-
mente aquela entre a minoria que tem pleno acesso
e usufrui dos territórios-rede capitalistas globais que
asseguram sua multiterritorialidade, e a massa ou
os ‘aglomerados’ crescentes de pessoas que vivem
na mais precária territorialização ou, em outras pa-
lavras, mais incisivas, na mais violenta exclusão e/
ou reclusão socioespacial”.
SANTOS, Milton & SILVEIRA, Laura Maria. O Brasil Território e sociedade
no início do século XXI. Rio de Janeiro: Record, 2001.
Elaborada pela Profa. Joyce Regina da Silva Magalhães Bozzi
Graduada em Letras – Especialista em Ensino Superior – UNOPAR-PR
1. A questão: o uso do território.
A partir do século XXI, dá-se uma dimensão às pa-
lavras com mais ênfase, devido à diversidade lingüísti-
ca e assim são atribuídos novos sentidos e o aumento
de vocábulos. Estas mudanças freqüentes na lingua-
gem fazem com que dificulte a interpretação das pala-
vras, por exemplo, território e espaço. Pode-se atribuir
a estas palavras as seguintes significações: território,
extensão apropriada e usada, visto que se define es-
paço como extensão indefinida. Território segundo os
autores é um nome político de um país, é difícil falar-
mos de um Estado sem um território.
O território é visto como unidade e diversidade
como uma questão central da história humana. Cada
período pode, assim, perguntar o que é novo no es-
paço e como se combina com que já existe. O pano
de fundo de cada país constitui o estudo das suas
diversas etapas e do momento atual, que marca o iní-
cio da divisão territorial do trabalho.
A partir da criação da divisão do trabalho estabe-
lece uma hierarquia entre as pessoas e lugares jul-
gando a capacidade de agir das pessoas, das firmas e
das instituições, assim instaura-se nos dias atuais um
novo conjunto de técnicas que constroem uma a base
material da vida da sociedade transformando em um
meio técnico-científico informacional, sendo a expres-
são geográfica mais utilizada da globalização. Ensi-
nando a olhar a constituição do território a partir dos
seus usos, do seu movimento, formando um conjun-
to de suas partes, reconhecendo as respectivas
complementaridades.
Para o contexto geográfico, a palavra território tam-
bém é definida como: implantação de infra-estrutura,
de ciência, técnica e informação, estudo do povoa-
mento, e, sobretudo, com a ocupação econômica. O
grande crescimento urbano demonstra como os sis-
temas de movimento de homens, capitais, produtos,
mercadorias, serviços, mensagens, ordens contribu-
em para o fluído de território.
Com as cidades crescendo e o número maior de
pessoas em um número cada vez menor de lugares, a
urbanização significa uma maior divisão de trabalho
resultando em melhor qualidade de território.
Para obtenção da qualidade de território há uma
necessidade de regulação política do território, ou seja,
resultado é a criação de regiões do mandar e regiões
do fazer.
A criação deste vínculo do mandar e fazer obser-
vamos como as técnicas são desenvolvidas para me-
lhor eficácia, divisão e a especialização do trabalho
nos lugares como: a incorporação de técnicas ao solo
(rodovias, ferrovias, hidrelétricas, telecomunicações,
emissora de rádios e TV, etc.), objetos técnicos liga-
dos à produção (veículos, implementos), insumos téc-
nico-científicos (sementes, adubos, propaganda,
consultoria).
As técnicas desenvolvidas ao longo do tempo per-
cebem que há uma preocupação muito maior para o
entendimento das diferenças regionais e com o novo
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dinamismo para busca de uma interpretação geográ-
fica da sociedade brasileira.
2. A formação da Região Concentrada
e a urbanização interior.
Na década de 1930, houve o momento da
integração nacional, sendo descoberta São Paulo como
a metrópole industrial, pois estavam presentes todos
os tipos de fabricação.
A revolução de 1932 trouxe a necessidade do avan-
ço, e o crescimento para o transporte que facilitaria a
circulação de mercadorias entre os Estados e a União.
O transporte foi um grande marco neste período, prin-
cipalmente o marítimo onde se localizavam os mer-
cados permitindo um tráfego mais intenso.
Os migrantes dos estados que provinham da Bahia,
Minas Gerais, Pernambuco, Alagoas, Ceará e Sergipe
começaram a chegar entre 1935 e 1939, ultrapassando
os números de estrangeiros, assim fazendo um mo-
mento preliminar da integração territorial dado por
uma integração regional do Sudeste e do Sul.
3. A integração nacional.
No período de 1945 a 1950, São Paulo se firma
como grande metrópole fabril do país, o que Milton
Braga Furtado chama de crescimento industrial in-
tencional, para diferenciá-lo do crescimento industri-
al não intencional dos anos 30.
Estabelece um domínio paulista, com um aumen-
to grande nos investimentos que se iniciava no regi-
me de Getúlio Vargas facilitando a concentração eco-
nômica e espacial, desenvolvendo o mercado não ape-
nas fora, mas sim dentro do país.
Neste período da história acontece a Segunda Guerra
Mundial, favorecendo São Paulo como centro produ-
tor, e ao mesmo tempo, distribuição primária. A difi-
culdade financeira dos transportes marítimos acelera a
instalação do império do caminhão em São Paulo.
Neste período de transição econômica e a criação
de uma indústria automobilística conflui com a cons-
trução de Brasília que foi um passo importante para as
rodovias, pois sem o desenvolvimento industrial de São
Paulo seria impossível a construção de Brasília.
A partir deste período também ocorreu o golpe de
Estado de 1964 que foi considerado como um “novo
passo” para internacionalização da economia brasi-
leira. Os movimentos reforçam os demais, enquanto
a economia e a sociedade se renovam.
4. Uma reorganização produtiva do território.
O desenvolvimento da ciência, da técnica e o ace-
lerado mundo das informações, fazem com que au-
mente a especialização do trabalho nos lugares. Atra-
vés deste momento surge uma nova divisão territorial,
fundada na ocupação de áreas até então periféricas e
na remodelação de regiões já ocupadas.
Nos anos 70 e 80, amplia-se a descentralização
industrial devido o grande número de estabelecimen-
tos industriais no Brasil, sendo as áreas de mais com-
plexos industriais as regiões Sul, alguns pontos do Cen-
tro-Oeste, Nordeste e do Norte (Manaus).
Ainda neste período podemos destacar o avanço e
as inovações na agricultura tratando de uma nova
geografia feita de belts que são heranças e cristaliza-
ções de fronts próprios de uma divisão do trabalho
anterior; áreas que ocupadas em outro momento, hoje
se densificam e se tecnificam. Constitucionalmente
integradas a estes novos avanços as terras ganham
nova valorização que acabam por “expulsar” certos
produtos para áreas ainda não utilizadas.
Podemos ver que, nas áreas privilegiadas pela con-
centração, o trabalho adquire maior especialização e
cresce a necessidade de intercâmbios. As cidades tor-
nam-se especializadas reforçando a capacidade de
conhecimento e informação.
5. Por uma geografia do movimento.
Não basta apenas produzir, precisa por a produ-
ção em movimento. Para esta circulação acontecer é
preciso a dialética entre a freqüência e a espessura
dos movimentos no período contemporâneo e a cons-
trução e a modernização dos aeroportos, portos, es-
tradas, ferrovias e hidrovias.
Os fluxos aéreos. A concentração maior destes flu-
xos acontece entre São Paulo e o Rio de Janeiro onde
a divisão de trabalho é extrema e a vida de relações
assume especial relevo. Além da facilidade podemos
classificar a utilidade da aviação na agricultura para o
controle e a aplicação de fertilizantes e pesticidas de
forma rápida nas grandes fazendas.
As ferrovias são resultado de conflitos e acordos
sempre provisórios entre o Estado e as empresas fa-
zendo assim que o seu fluxo seja sempre datado au-
mentando as cargas transportadas. O uso das ferro-
vias não serve apenas para o transporte de cargas e
sim de pessoas também, entre os anos de 1970 e
1994 foi criado nos estados de São Paulo e Rio de
Janeiro as companhias de trens metropolitanos.
A expansão das grandes metrópoles fez com que
houvesse uma integração do território através das estra-
das, assim aumentando o fluxo rodoviário levando a dis-
puta com as ferrovias e favorecendo o aumento de gran-
des empresas no sistema rodoviário dando autonomia
ao poder público e domínio mercantil completo.
As hidrovias classificam-se através das cinco baci-
as brasileiras tendo como critérios os elementos soci-
ais e econômicos diversos. Podemos citar a Amazô-
nia que a maior parte da população utiliza transporte
fluvial, ou seja, é uma pequena camada da sociedade
que tem acesso aos transportes aéreo e ao rodoviário
assim torna-se o meio mais acessível de transporte.
6. O território brasileiro:
do passado ao presente.
As tendências para uma dinâmica de um país que
se industrializa começaram a partir do século XX, que
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já vinha revelando o crescimento industrial que se deum
a partir dos estados como Bahia, Pernambuco, Rio
de Janeiro, São Paulo e Rio Grande do Sul. Nestas
regiões é implantado o sistema ferroviário, e depois
estradas de rodagem facilitando a vida agrícola e pa-
ralelamente a população urbana crescia de maneira
mais rápida.
Com a evolução vertiginosa da cidade de São Pau-
lo, cresce também a sua base industrial, estabelecen-
do uma aliança com outras indústrias, desse modo
fortalecendo um denso tecido industrial, do qual vão
valer as atividades comerciais, de serviços, de trans-
porte, do governo e as próprias indústrias presentes
ali e em outros pontos do Brasil, inclusive, em muitos
casos, o próprio Rio de Janeiro.
7. Uma ordem espacial:
a economia política do território.
Ao falarmos de ordem espacial, nos referimos no-
vamente ao explicado em uso, ou seja, cada momen-
to da história tende a produzir sua ordem espacial,
que se associa a uma ordem econômica e uma or-
dem social, sendo necessário entender sua realidade
a partir de forças que, freqüentemente, não são visí-
veis a olho nu.
Caracterizamos o espaço como um conjunto
indissociável de sistemas de objetos e sistemas de ações.
Trata-se de caracterizar uma situação na qual, em cada
área, os objetos tendem a exercer certas funções e os
respectivos processos são em grande parte, submeti-
dos ao papel regulador de instituições e empresas.
O crescimento do território leva o desenvolvimen-
to de atividades econômicas modernas que permite
uma cooperação entre empresas que facilita o pro-
cesso de privatização do território. Este comportamen-
to influencia também outras empresas, industriais,
agrícolas e de serviços, influenciando fortemente o
comportamento do poder público, na União, nos Es-
tados e nos Municípios.
O uso do território é objeto de divisões de traba-
lho, as empresas produzem atividades e produzem a
sua própria divisão de trabalho. Através das lógicas
globais, percebemos que os circuitos de cooperação
são também circuitos de competição, o que conduz à
questão explicativa maior de saber quem, em deter-
minadas circunstâncias, regula quem.
O valor dado ao território é caracterizado pela no-
ção de espaço, que inclui uma utilização privilegiada
dos bens públicos e uma utilização hierárquica dos
bens privados. Neste aspecto as empresas tornam a
desempenhar um papel central na produção e no fun-
cionamento do território e da economia.
8. Desvalorizações e
revalorizações do território.
O território é palco de grandes disputas comerciais
sendo as maiores delas o espaço, que se torna um objeto
de articulações entre grandes empresas. Existe uma
verdadeira gangorra constante, pois o território é “uno”
e seu movimento é solidário, desta maneira a desvalo-
rização e revalorização obedecem a uma lógica.
A quantificação do valor do território que a lógica
obedece, é dado pelo tipo de produto fabricado. No
ano de 1950 observa-se um grande movimento mi-
gratório no país, e a diversidade de origens vão cada
vez mais se misturando sobre o território.
Este aglomerado de pessoas tentava a sua estabi-
lidade, no campo, segundo Milton Santos, no ano de
1997 foram registrados pela Comissão Pastoral da
Terra 622 conflitos pela terra brasileira, em uma quantia
aproximadamente de 16 milhões de hectares produti-
vos não utilizados pelo Brasil.
Os processos de valorização da terra por consoli-
dação das frentes pioneiras tiveram, certamente, um
papel detonador em vários movimentos migratórios
do país.
9. Neoliberalismo e uso do território.
As mudanças importantes para a utilização do terri-
tório começam a partir da prática do neoliberalismo,
tornando o uso do território mais seletivo, assim pu-
nindo as populações mais pobres, isoladas, mais dis-
persas e mais distantes de grandes centros produtivos.
O monopólio criado pelo neoliberalismo afastan-
do as populações mais carentes, assim aumentando
o êxodo rural, aumentando a concentração de pesso-
as nos grandes centros, atrás de empregos, desleal-
mente a concorrência é grande e cada vez a diminui-
ção no salário dos trabalhadores. Só conferir o au-
mento de incidência de trabalho escravo.
Dentro da divisão geográfica o neoliberalismo
conduz a uma seletividade dos provedores de bens e
serviços, que geram a acumulação e a competitividade
assim causando uma maior dificuldade para as
pessoas mais pobres e isoladas, mostrando que os
grandes centros também criam gente pobre, pois há
um grande número de mão de obra que precisa de
trabalho.
As grandes metrópoles seguem o padrão da
globalização onde novas fontes de riqueza e novas
razões de pobreza se estabelecem nas grandes cida-
des. A globalização amplia a variedade econômica,
cultural, religiosa e lingüística multiplicando os mo-
delos produtivos de circulação e de consumo.
10. A racionalidade do espaço: da solidariedade
orgânica à solidariedade organizacional.
A racionalidade dentro do espaço pode-se carac-
terizar pelos aspectos cujas condições materiais e
políticas permitem um uso considerado produtivo pelos
atores econômicos, sociais, culturais e políticos dota-
dos de racionalidade. Só pode haver racionalidade de
espaço quando o território oferece as condições ne-
cessárias.
No auge da globalização, em nossos atuais dias,
podemos afirmar que racionalidade de espaço está a
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serviço das grandes empresas privadas, fazendo com
que estas empresas constituam em território as ade-
quações técnicas e políticas necessárias para que usu-
fruam uma maior produtividade e uma maior
lucratividade.
O neoliberalismo faz com que a racionalidade pri-
vada tenha benefícios sobre os recursos públicos, le-
vando com que os setores sociais sejam prejudicados
para manter o setor privado.
A solidariedade orgânica parte do ponto em que
suas atividades exercidas em território usado, fruto do
superação. Esta cultura da crise se relaciona como o
poder na medida em que questiona a ideologia do
poder e re-funda os fundamentos teóricos críticos da
própria geografia no sentido de explicar e transfor-
mar o real.
Num segundo momento, passar da crise da totali-
dade aos espaços da geografia. Nem o progresso nem
as riquezas naturais são infinitos. Portanto o sonho do
consumo infinito acabou. Que fazer? Há condições
materiais para realizar objetivos que a própria humani-
dade se põe em seus vários espaços: da prática, da
técnica, da pesquisa, da ciência, do trabalho intelectu-
al, das opções possíveis e os espaços da geografia. O
espaço da prática é o mais imediato, empírico e coti-
diano. O espaço das soluções práticas do dia a dia. Já
o espaço da técnica faz a codificação e formalização
do empírico. É saber elaborado. O espaço da pesqui-
sa implica razão e técnica, imaginação ordenada e fa-
zer metódico. É investigação analítica (hipótese, ob-
servação, análise de dados e generalização). Implica
operações mentais mais complexas do que o homem
prático e homem técnico. O espaço da ciência ultra-
passa a relação racionalismo-empirismo. É a elabora-
ção rigorosa de conexão interna de seus saberes, es-
paços da prática, técnica e pesquisa. O espaço do tra-
balho intelectual se depara com a contradição da divi-
são social do trabalho (intelectuais e técnicos versus
trabalhadores manuais) e diante desta fragmentação
social põe-se como opção entre dicotomia social e
unidade. O espaço das opções possíveis deve definir
os objetivos a serem alcançados e descobrir as condi-
ções reais de sua efetivação. Assim, os espaços da ge-
ografia se põem como espaços plurais. O espaço da
geografia, espaço: a) da ciência e ideologia que se re-
laciona com a interdisciplinaridade; b) de seu próprio
espaço interno; c) referido ao segmento do real; d) do
subespaço do real que remete à subtotalidade em seu
conjunto; e) do discurso que extrapola a subtotalidade,
como consciência do real no todo e na parte.
próprio dinamismo, tenham uma evolução e recons-
trução locais relativamente autônomas e apontando
para um destino comum.
A solidariedade organizacional supõe uma
interdependência até certo ponto mecânica, produto
de normas presididas por interesses de modo geral
mercantis, mutáveis em função de fatores do merca-
do. Dentro deste contexto verificamos que a solidari-
edade organizacional é paralela à produção de uma
racionalidade que não interessa à maior parte das
empresas nem da população.
SANTOS, Milton (org). Novos rumos da geografia brasileira. São Paulo: Hucitec, 1982.
Claudemir Lopes Bozzi
Filósofo, especialista em Filosofia Política e Jurídica – UEL
Num primeiro momento apontaremos as princi-
pais contribuições brasileiras à teoria da geografia; em
seguida, veremos a geografia e o espaço brasileiro.
I – Contribuições brasileiras
à teoria da geografia.
Contribuição à crítica da crise da geografia, de
Armando Corrêa da Silva. A crise da geografia se con-
figura como a crise da cultura que gerou a expansão
do capitalismo. Da idéia de espaço totalmente livre,
planeta terra, passou-se para a noção de solo frag-
mentado. Compreender o espaço global é consciên-
cia de suas partes (unidades), como um todo de rela-
ção. É tensão dialética entre o todo e a parte. Assim,
a geografia atual é uma cultura em crise e na consci-
ência, cultura da crise. Como a cultura contemporâ-
nea é a composição de um mosaico, também a geo-
grafia atual é um mosaico (indivíduo e grupo social).
A crise da geografia é parte da cultura da crise. Sur-
gem, então, vários obstáculos: a) a crise da geogra-
fia, a ideologia do fim das ideologias; b) crise dos
geógrafos, renovação e multiplicidade de ideologias;
c) crise da universidade como lugar de produção da
geografia, abalo dos fundamentos empíricos das ide-
ologias; d) a crise do ensino, síntese e fim das ideolo-
gias. Portanto, é a crise efetivada como crise de con-
sumo e consumo de crise. O que fazer? No dia se-
guinte inquirir a liberdade da consciência da necessi-
dade. A liberdade da consciência e consciência da li-
berdade. Consciência da necessidade individual e so-
cial. Consciência da sobre determinação. Vem o pro-
jeto! Efetivar a continuidade, mas com a técnica e a
metodologia analítica a serviço da coletividade do tra-
balho. Assim, a objetividade do real é posta sob o
teleológico: serviço da humanidade. A metodologia
analítica se instrumentaliza como libertação: põe a
cultura da crise e se torna ciência da cultura em crise.
Pela contradição já possuem em si o germe de sua
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Algumas considerações do espaço geográfico,
de Roberto Lobato Corrêa. Que é espaço? Para o
geógrafo é a superfície da terra vista enquanto mora-
da, do homem e de sua história. Trata-se de pensar o
espaço-morada do homem. Qual a natureza do espa-
ço geográfico? Como o geógrafo pensa este espaço e
qual o conceito de processo espacial? O conceito de
espaço (Harvey) tem variado historicamente: espaço
absoluto, espaço relativo e espaço relacional. No con-
ceito de espaço absoluto: o espaço é uma coisa em
si mesma e associado às idéias de áreas ou região e de
unicidade, associado à geografia regional (Hartshorne).
Já o espaço relativo: entendido a partir de “relacio-
namentos entre objetos, só existe porque os objetos
existem e se relacionam mutuamente. Assim, o movi-
mento de pessoas, bens, serviços e informações veri-
ficam-se em um espaço relativo porque custa dinhei-
ro, tempo, energia para se vencer a fricção da distân-
cia” (Harvey). Pode cair no perigo de geografia como
conexão, direção e distância sem referência com o so-
cial ou a serviço do “custo-benefício” do capitalismo.
Por fim, o espaço relacional: como existindo nos ob-
jetos – “no sentido de que um objeto somente pode
existir na medida em que ele contenha e represente
dentro de si relações com outros objetos” (Harvey). Mas
porque três conceitos de espaço? Porque: a) espaço
como valor de uso, no qual o homem valoriza a fertili-
dade e amenidades físicas; b) no mercado capitalista o
espaço possui valor de troca – espaço como extração
de renda (espaço é mercadoria), monopólio de classe;
c) espaço como conteúdo relacional do qual extrai ren-
da de monopólio. Portanto, trata-se de estudar o espa-
ço-morada a partir da formação social de uma deter-
minada sociedade. O espaço-morada do homem é de
natureza social. Neste sentido, destaca Corrêa, a ação
humana tem papel fundamental na organização do
espaço. Pensa-se nos atores que monopolizam os meios
de produção e o Estado. De um lado, a acumulação
do capital e, de outro, a reprodução da força-de-traba-
lho. Os processos espaciais são efetivados para res-
ponder, numa sociedade de mercado, estas duas for-
ças antagônicas. Por elas ocorrem a concentração e
dispersão da ação humana-tempo-espaço-mudança.
Assim, o espaço reflete valores socialmente enraizados
na comunidade. Portanto, trata-se de pensar o espa-
ço-morada do homem em suas conexões com tempo
e espaço, pois são experiências humanas.
Repensando a geografia, de Ruy Moreira. O pro-
cesso de socialização na natureza pelo trabalho soci-
al, i. é, a transformação da história natural em histó-
ria dos homens implica uma estrutura de relações sob
determinação do social. É esta estrutura complexa e
em perpétuo movimento dialético que conhecemos
sob a designação de espaço geográfico. História dos
homens e história da natureza são inseparáveis. Há
múltiplas determinações na relação dialética entre o
homem e a natureza na qual, pela ação do trabalho
humano sobre a forma-natureza, gera a forma-socie-
dade. Portanto, o modo de socialização da natureza
faz o homem, pelo trabalho, e a ação da natureza so-
bre o homem o faz sujeito natural. Segundo Moreira,
“é a estrutura econômica da formação econômico-
social que determina a organização espacial, mas é
a conjuntura política que comanda seus movimen-
tos (processos e formas)”. Pensemos, por exemplo,
nas classes sociais e seus lugares geográficos: o ca-
ráter de classe determina o caráter do lugar, seu ar-
ranjo espacial: a estética da moradia, a natureza dos
serviços, a “política pública” de infra-estrutura espa-
cial, a geometria. O espaço geográfico, portanto é
condição da reprodução econômico-social da socie-
dade. A organização do espaço, enquanto reprodu-
ção da produção capitalista, desempenha papel de
mediação de espaço enquanto arranjo: econômico
como uma formação de múltiplos espaços desiguais
(espaços industriais; instrumentos de trabalho; meios
de consumo individuais e coletivos;), jurídico-político
(aparelhos ideológicos e repressivos do Estado), ide-
ológico (aparelhos ideológicos de prescrição da ideo-
logia dominante: escola, igreja, quartel, tribunais).
Necessário desenvolver um método específico para a
geografia: a partir do arranjo social, apreender a
dialética social da formação econômico-social. Assim,
a teoria crítica do espaço deve possui três facetas: a
formação econômico-social, o modo de produção e
a formação sócio-espacial. Por fim, sobre a análise
geográfica deve-se argüir a direção das determinações
e descobrir a essência da aparência. Portanto, o ca-
minho seguro do método é, segundo Moreira, o da
imersão no arranjo espacial no jogo das suas deter-
minações múltiplas, sobretudo as determinações de
classe. Conhecer para transformar!
Repensando a teoria das localidades centrais,
de Roberto Lobato Corrêa. Repensar a teoria da loca-
lidade criticando-a e recuperá-la em um nível mais
elevado. Primeiro: a rede hierarquizada de localida-
des centrais constitui-se em uma forma de organiza-
ção do espaço vinculado ao capitalismo, sendo de
natureza histórica. Segundo: a rede de localidades
centrais cumpre simultaneamente dois papéis que são
complementares: de um lado, constitui-se em um meio
para o processo de acumulação capitalista, e de ou-
tro, constitui-se em um meio para a reprodução das
classes sociais. Isto significa que a rede de localida-
des centrais constitui-se em um meio através do qual
a reprodução do modo de produção capitalista se ve-
rifica. Terceiro: as redes de localidades centrais apre-
sentam-se caracterizadas por arranjos estruturais e
espaciais diversos, isto porque o capitalismo se verifi-
ca de modo desigual. Quarto: a rede de localidades
centrais constitui-se em uma estrutura territorial cuja
análise possibilita a compreensão do sistema urbano
de países não industrializados ou onde a industrializa-
ção se verifica espacialmente concentrada. Quinto:
possibilidade da conexão entre rede de localidades
centrais e capitalismo monopolítico. A emergência de
outro arranjo estrutural e espacial da distribuição de
bens e serviços caracterizados pela especialização dos
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centros de mercado, tanto no nível intra-urbano como
regional, onde tais centros oferecem uma gama de
bens e serviços altamente associados entre si em ter-
mos de complementaridade. Por fim, trata-se de ana-
lisar a questão da teoria das localidades centrais e de
repensar em uma outra teoria geográfica que esteja
fundada nas relações entre sociedades historicamen-
te determinadas e o espaço.
Espaço e tempo: compreensão materialista e
dialética, de Ariovaldo Umbelino de Oliveira. Espaço
e tempo configuram-se no embate entre o materialis-
mo dialético e o idealismo. Para este, espaço e tempo
são figuras de representação idealista da subjetivida-
de (Kant). Para o materialismo espaço e tempo são
formas essenciais da existência da matéria movente
(Fataliev). Afirma-se também, para o materialismo, a
extensão como essência do espaço. Este espaço tam-
bém configura a ordem das coisas (ou desordem),
como também os princípios e as leis dos fenômenos,
mas também graças ao tempo, é nele que se configu-
ra a luta dos contrários e a possibilidade objetiva de
mudar o curso dos fenômenos sociais, históricos e
econômicos – no tempo e no espaço. Assim, o tempo
pode ser “lei” de mutação dos fenômenos. Para a con-
cepção materialista dialética de espaço e tempo como
formas peculiares de existência da matéria em movi-
mento. Espaço: forma de ser da matéria, visto que
toda matéria ocupa um espaço. Portanto há uma uni-
dade indissolúvel par a matéria: movimento, espaço e
tempo. Convém frisar, segundo Ariovaldo, que a uni-
dade, a diversidade e a interdependência do espaço e
tempo consistem, pois em uma das noções funda-
mentais que fazem parte da concepção materialista-
dialético do espaço e tempo. Por fim, convém ressal-
tar que espaço e tempo possuem uma unidade na
diversidade. Tempo e espaço são duas formas
intercondicionadas de ser da matéria. Espaço é movi-
mento e transformação da matéria. Portanto, confor-
me Ariovaldo, “Tempo e espaço se acham, pois,
indissoluvelmente unidos ao movimento da maté-
ria, ao movimento concebido no sentido materialis-
ta dialético, não como estados particulares de coi-
sas ou fenômenos particulares, mas como forma
universal de ser da matéria; acha-se igualmente unido
ao movimento concebido como transformação, como
desenvolvimento que inclui o nascimento do novo”.
A geografia como valorização do espaço, de
Antonio Carlos Robert Moraes e Wanderley Messias
da Costa. Afirmam a tese de se passar de uma teoria
crítica, como superação do paradigma positivista e
funcionalista, para uma teoria marxista da e na geo-
grafia. Aqui é fundamental o método do materialismo
histórico dialético aplicado ao objeto da geografia.
Como método de interpretar o real. Trata-se de ado-
tar o materialismo histórico e dialético enquanto um
método revolucionário que funde ciência e história,
do qual emergem categorias como modo de produ-
ção, formação econômico-social, relações de produ-
ção etc., e conceitos como capital, trabalho assalari-
ado, valor-de-uso, riqueza natural, etc., à luz deste
arsenal metodológico analisar a categoria território e
valor, concentração territorial do capital, entre outros.
Portanto, trata-se de destacar a valorização do territó-
rio (urbano e rural, questão agrária) como objeto da
geografia marxista.
Alguns problemas atuais da contribuição mar-
xista, de Milton Santos. Santos cita algumas atitudes
para desenvolver uma geografia marxista. Primeira: a
necessidade do trabalho teórico-empírico (recolher o
real); segunda: a teorização como incorporação reno-
vadora (sem ter medo de conhecer, de forma crítica,
outras teorias); terceira atitude: contra o dogmatismo
(autocrítica); quarta: agir contra o congelamento dos
conceitos (o real é dinâmico, tudo flui). Por fim, a no-
ção do real deve abarcar a totalidade, ou real-total como
categoria essencial do fazer do geógrafo. E, por outro
lado, há necessidade de renovação do discurso cientí-
fico. Visto que o real está penetrado pela história e pelo
tempo corrente e concreto.
II – Estudando a geografia e o espaço brasileiro.
Estrutura agrária e dominação do campo – no-
tas para um debate, de Carlos Walter Porto Gonçal-
ves. Em síntese pode-se dizer que: “1) o desenvolvi-
mento do capitalismo é desigual e combinado e, des-
de a sua gênese, se apóia numa divisão do trabalho
em escala mundial; 2) por isso, o desenvolvimento de-
sigual e combinado, cada Estado nacional acaba por
se constituir numa articulação contraditória, particu-
lar, de classes que, no entanto, significa um elemento
da configuração imperialista mundial; 3) a “questão
agrária” não pode se compreendida em si mesma, posto
que o significado próprio às diversas formas de organi-
zação deste ramo da produção social é dado pelas
injunções da produção e reprodução ampliada do ca-
pital; 4) nos países de desenvolvimento capitalista re-
tardatário a questão agrária assume um caráter parti-
cular, dada a articulação do grande capital com a pro-
priedade fundiária; 5) no Brasil essa articulação come-
ça por se delinear na segunda metade do século XIX, é
redefinida nos anos 30 e cristalizada no golpe militar
de 1964; 6) ao “fundir quimicamente” o grande capital
com o grande proprietário de terras, o desenvolvimen-
to retardatário do capitalismo cumpriu uma das tare-
fas da revolução burguesa, i. é, a constituição da uni-
dade nacional; 7) ao fazer isto, unificou a luta de clas-
ses em todo o território nacional – a luta indígena, dos
posseiros, do bóia-fria com a luta dos operários do ABC;
8) que o Estado – órgão centralizador do grande capi-
tal e da grande propriedade fundiária não pode, en-
quanto tiver esta composição de classe, realizar a re-
forma agrária; 9) resta a dúvida: até que ponto um es-
tado de compromisso que busque incorporar parte das
aspirações das classes dominadas seria capaz de reali-
zar tal tarefa, considerando-se o atual estágio da eco-
nomia mundial?”, diz.
Crise econômico-social no Brasil e o limite do
espaço, de Manoel Fernando Gonçalves Seabra. Tra-
19
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ta-se, sinteticamente, que a crise tenha componentes
político-ideológicos, possui fundamento econômico,
i.é, crise de acumulação capitalista. O Brasil está in-
serido como capitalismo periférico e dependente
(tecnológica e financeira) do imperialismo (america-
no), conforme a década de 50 e o golpe militar de
1964 o demonstram. Com a homogeneização deste
modelo de capital irradiado pelo Brasil possibilita
fissuras para sua crise e a possibilidade do novo.
O pensamento geográfico e a realidade brasilei-
ra, de Manuel Correia de Andrade. Segundo Andrade,
é hora de descolonizar a teoria da geografia de seu
peso histórico: francês, americano, entre outros. Sua
proposta é a construção de uma teoria da geografia
genuinamente brasileira, sem desprezar, é claro, a con-
tribuição externa. Cita alguns autores brasileiros que
falam de alguma forma de geografia e de sua
cosmovisão: os cronistas viajantes e aventureiros, e os
estudos de: Capristano de Abreu, Euclides da Cunha,
Joaquim Nabuco, Caio Prado Jr., Raimundo Faoro,
Sérgio Buarque de Holanda, Gilberto Freyre, Djacir
Menezes, Florestan Fernandes, Darcy Ribeiro, Antonio
Candido, Amélia Cohn, Nelson Werneck Sodré, Josué
de Castro, Milton Santos, Manoel Seabra, Lea Goldstein,
Armando Corrêa da Silva, entre outros. Portanto, criar
uma identidade teórica de nossa diversidade.
Notas sobre a geografia urbana brasileira, de
Armen Mamigonian. Seu destaque para duas linhas de
pesquisa para os estudos urbanos: 1) o processo de
industrialização continua despertando interesse entre
economistas, historiadores e sociólogos com poucas
contribuições dos geógrafos. Apesar disso, destacam-
se os temas: bloqueios dos ramos industriais desen-
volvidos em São Paulo; a desnacionalização de inúme-
ros ramos industriais; a industrialização das metrópo-
les regionais num processo de substituição de impor-
tações (mercado regional), mas sob o controle exter-
no. 2) As relações das cidades com sua interlância agrá-
ria; crises de abastecimento de mercado interno (do
leite, por ex.); cidades e renda fundiárias; estudos so-
bre a classificação territorial : que é o rural e o urbano.
Novos rumos da geografia brasileira, de Milton
Santos. A geografia (fundação, estatuto teórico e pro-
dução) está situada às grandes crises da própria hu-
manidade (veja a 2ª Grande Guerra Mundial e o fenô-
meno das migrações). Herdeira do embate entre
empirismo (positivismo) e idealismo, triunfou, no sé-
culo XIX, a geografia como ciência positiva. Pós 2ª
Guerra, com a bipolaridade mundial, recebe o peso
da ideologia americana (imperialista) – instrumento
hegemônico do capital. Entretanto, com nova crise
do quantitativismo surge a possibilidade de repensar
o homem e seu espaço e, com isso, de renovação da
geografia. É o contexto geopolítico da ditadura mili-
tar no Brasil e da resistência de parte dos intelectuais
(caso exemplar foi a publicação da Associação dos
Geógrafos Brasileira), movimentos sociais, OAB, ABI,
entre outros. Outro problema é o boicote e censura
da imprensa em relação às publicações que questio-
nam o poder estabelecido. Há também o obstáculo
do monopólio das fontes, veja o caso do IBGE, que
se fecha perante os geógrafos críticos. Impera a fonte
e divulgação de cópias dóceis dos estrangeirismos.
Entretanto, é imperioso, segundo Milton Santos, a
construção de uma geografia brasileira descolo-
nizada: elaboração de trabalhos autônomos, auto-
gerados e auto-sustentados. Trata-se de aprender nos-
so lugar no mundo e nossa localização específica neste
mundo. Para tanto, se faz premente romper com a
tradição empirista e desenvolver uma fundamentação
e práxis comprometida com a teoria da geografia que
reflita nosso mundo real, com a formação do geógrafo,
com o compromisso intelectual e político no sentido
de reconstrução nacional, salienta Milton Santos.
SIMIELLI, Maria Elena R. Cartografia no ensino fundamental e médio. In: CARLOS, Ana Fani A.
(Org.). A geografia na sala de aula. São Paulo: Contexto, 1999. p. 92-108.
Resenha elaborada pelo Professor Auro Moreno Romero
Mestre em geografia pela USP
Uma das grandes preocupações da autora neste
texto consiste em como realizar a transposição das
informações da cartografia, enquanto disciplina uni-
versitária, para o ensino de geografia no ensino fun-
damental e médio. É fundamental desenvolver méto-
dos que permitam essa transposição sem que se
desconfigure, desvalorize ou empobreça o ensino uni-
versitário da cartografia.
O saber universitário se apresenta sob forma de
peças de um quebra-cabeça sem uma imagem coe-
rente na qual ele é multiplicado, separado, deixando
ao observador a possibilidade de construir várias ima-
gens. É a partir desse saber universitário que um sa-
ber ensinado deve ser elaborado, reconstruído, reor-
ganizado. É necessário destacar que os saberes de-
senvolvidos nos ensino fundamental e médio não se
constituem em um resumo do saber universitário.
Assim, mais do que uma transposição didática,
trata-se de reconstruir o saber geográfico sobre ba-
ses parcialmente diferentes já que os objetivos e os
meios da prática de geografia não são os mesmos na
universidade e no ensino fundamental e médio.
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A RECONSTRUÇÃO DEVE SER
FEITA EM VÁRIOS NÍVEIS
1. Reconstrução no nível dos programas oficiais
Apenas uma parte da temática universitária deve
ser implementada para determinar os conteúdos do
ensino fundamental e médio, levando-se em conta os
objetivos da formação geral do educando. No que diz
respeito ao método de ensino é muito mais interes-
sante, no ensino fundamental e médio, partir do mé-
todo indutivo – do particular para o geral – do concre-
to para o abstrato. Os modos de raciocínio, os instru-
mentos metodológicos, os temas de pesquisa, mui-
tas vezes devem ser colocados de lado.
2. Reconstrução no nível do professor
Diferentes professores elaboram cursos e lições
muito diversas. Cada professor reconstrói a geografia
à sua maneira. O professor retém apenas uma parte
do programa oficial seja devido: ao tempo, aos seus
objetivos, à sua capacidade de interpretação pessoal,
suas necessidades ou ainda, em função dos interes-
ses dos seus alunos.
3. Reconstrução no nível da lição
À medida que as lições prosseguem e os alunos
adquirem novas competências, o conteúdo dos cur-
sos e métodos de ensino previstos são modificados e
reconstruídos.
4. Reconstrução no nível do aluno
O aluno, por sua vez, constrói ele mesmo seu sa-
ber, retendo apenas uma parte dos conteúdos, inte-
grando-a à sua maneira nos esquemas de pensamento
e ação.
Do ensino fundamental para o médio os conteú-
dos e métodos se modificam e o problema principal a
ser administrado pelo professor é evitar o desvirtua-
mento total do projeto geográfico ou ainda, que sur-
jam contradições entre o saber ensinado e o saber
universitário. A cada lição o professor deve realizar
uma triagem e classificar os fatos propostos pelo sa-
ber universitário propondo uma adaptação coerente
para os objetivos e capacidades dos alunos do ensino
fundamental e médio, com o objetivo de evitar gran-
des desvios.
A CARTOGRAFIA NO ENSINO DA GEOGRAFIA
Os mapas nos permitem ter domínio espacial e
realizar sínteses dos fenômenos que ocorrem num
determinado espaço. Os mapas nos auxiliam no dia-
a-dia ou ainda pode-se ter diferentes produtos repre-
sentando deferentes informações para diferentes fi-
nalidades: mapas de turismo, de planejamento, ro-
doviários, minerais, geológicos, entre outros.
É importante destacar que cada aluno tem um
potencial diferente para leitura e interpretação de
mapas. Sendo assim, alunos de 1a
à 6a
séries, traba-
lhariam basicamente com alfabetização cartográfica,
da 6a
à 8a
séries os alunos já possuirão condições de
estar trabalhando com análise, localização e com a
correlação. Já no ensino médio juntamente com a
análise, localização, correlação, também se insere a
síntese.
Assim, a cartografia, além de constituir um recur-
so visual, oferece aos professores a possibilidade de
se trabalhar em três níveis:
1) Localização e análise – cartas de análise, distribui-
ção ou repartição, que analisam o fenômeno iso-
ladamente.
2) Correlação – permite a combinação de duas ou
mais cartas de análise.
3) Síntese – mostra as relações entre várias cartas de
análise, apresentando-se em uma carta síntese.
Dentro dessa proposta de localização, análise, cor-
relação e síntese - aplicadas para a alfabetização
cartográfica - devemos oferecer às crianças de 1a
à 4a
séries subsídios que favoreçam a compreensão dos
elementos presentes nas representações gráficas, so-
bretudo os mapas. Em outras palavras, a idéia é edu-
car o aluno para uma visão cartográfica.
Para que possamos educar nossos alunos para a
cartografia é necessário, em primeiro lugar, aprovei-
tar-se do interesse natural das crianças pelas imagens
utilizando-se de inúmeros recursos visuais tais como:
desenhos, figuras, tabelas, jogos e representações
feitas por crianças.
A cartografia, para as séries iniciais, deve iniciar
seu trabalho com o estudo do espaço concreto dos
alunos, o mais próximo deles, ou seja, o espaço da
sala de aula, o espaço da escola, espaço do bairro
para somente, nos dois últimos anos, se falar em es-
paços maiores.
O que importa é desenvolver a capacidade de lei-
tura e para que a alfabetização alcance bons resulta-
dos se faz necessário o de desenvolvimento de no-
ções de:
• Visão oblíqua e visão vertical;
• Imagem tridimensional, imagem bidimensional;
• Alfabeto cartográfico: ponto, linha e área;
• Construção da noção de legenda;
• Proporção e escala;
• Lateralidade/referências, orientação
Quanto à cartografia para 5a
e 8a
séries pode ser
trabalhada a partir de dois eixos:
No primeiro eixo, trabalha-se com o produto
cartográfico já elaborado, tendo um aluno leitor críti-
co no final do processo.
No segundo eixo, o aluno é participante do pro-
cesso ou participante efetivo, resultando deste segundo
eixo um aluno mapeador consciente. Esses dois eixos
têm como objetivo básico eliminar a situação do alu-
no copiador de mapas. A cartografia-cópia e a carto-
grafia-desenho são atividades que não devem ser con-
sideradas como possibilidades efetivas de trabalho em
sala de aula.
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Resumo de artigos sobre geografia e sua evolução

  • 3. ANDRADE, Manuel C. Caminhos e descaminhos da geografia. Campinas: Papirus, 1989. ............................................................. 4 HAESBAERT, Rogério. O mito da desterritorialização. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2004 ................................................. 8 SANTOS, Milton; SILVEIRA, Maria Laura. O Brasil: território e sociedade no início do século XXI. Rio de Janeiro: Record, 2001. .......................................................... 13 SANTOS, M. (Org). Novos Rumos da Geografia Brasileira. São Paulo: Hucitec, 1982. ................................................................ 16 SIMIELLI, Maria Elena R. Cartografia no ensino fundamental e médio. In: CARLOS, Ana Fani A. (Org.). A geografia na sala de aula. São Paulo: Contexto, 1999. p. 92-108. ............................................ 19 VESENTINI, José William (Org.). Ensino de geografia no século XXI. São Paulo: Papirus, 2005. ................................................................ 21
  • 4. 4 Nº 18 MAIO/2006 ANDRADE, Manuel C. Caminhos e descaminhos da geografia. Campinas: Papirus, 1989. Elaborada pelo Professor Auro Moreno Romero Mestre em Geografia – USP 1 – INTRODUÇÃO Manuel C. de Andrade apresenta nesse livro uma coleção de artigos escritos no período compreendido entre os anos de 1984/1987, portanto, um momento em que o Brasil e o mundo passavam por grandes trans- formações sociais e políticas. É neste contexto de mu- danças que o autor rediscute o papel da geografia, como ciência capaz de corroborar com a melhoria da quali- dade de vida de todos e do geógrafo, como cidadão que participa das mudanças e as ajuda compreender. Assim, podemos dividir o livro, segundo o autor, nos seguintes artigos: A geografia e o problema da interdisciplinaridade entre as ciências; A geografia e a crise brasileira; Populismo e organização social do es- paço; Perspectivas do papel do geógrafo, como profis- sional no Brasil; O livro didático de geografia no con- texto da prática de ensino e A geografia e o problema da redivisão territorial do Brasil. 2 - A GEOGRAFIA E O PROBLEMA DA INTERDISCIPLINARIDADE ENTRE AS CIÊNCIAS Desde o século XVIII, principalmente com Kant e, no século XIX, com Comte, estabelecer os limites en- tre os campos das várias ciências tem se tornado uma preocupação para os filósofos. O conhecimento cien- tífico não pode ser compartimentado, todavia existe um problema entre a vastidão de conhecimentos de- senvolvidos pela humanidade e a capacidade do ho- mem de acumulá-lo em um único campo. Sendo as- sim, a questão reside em como, sem quebrar o prin- cípio da totalidade dos conhecimentos, estabelecer ramos específicos para cada área do conhecimento. A preocupação central do autor neste artigo é como a geografia, que só se tornou uma ciência autônoma nas últimas décadas do século XIX, se posiciona no quadro das ciências. 2.1 – Da natureza da Geografia O que seria a Geografia e qual o seu objeto de estudo? Inicialmente a Geografia se constituía em um conhecimento eminentemente prático, empírico e li- mitado em catalogar e cartografar os lugares, servin- do aos exércitos, governos e aos comerciantes que necessitavam de informações sobre os principais pro- dutos a serem explorados em uma determinada área. Na proporção que os navegantes necessitavam de mais segurança nas viagens, a Geografia foi ganhando um caráter científico e estabelecendo relacionamento com outras ciências. A ciência geográfica ganha notoriedade a partir do século XIX quando Humboldt observou as relações exis- tentes entre a natureza de um lugar e as formas de exploração desenvolvidas pelo homem. No mesmo período Karl Hitter, procurou estudar os vários siste- mas de organização do espaço terrestre, comparando povos, instituições e sistemas de utilização de recur- sos. Assim, esses dois pensadores alemães deram à Geografia um status de ciência. Karl Hitter dedicou-se muito mais ao ensino, desenvolvendo o método com- parativo em Geografia, sendo professor de Ratzel e Elissé Reclus que consolidariam o conhecimento geográfico em bases verdadeiramente científicas. Ratzel naturalista alemão viveu em uma época em que a Alemanha realizava sua unidade e seus estudos foram muito utilizados na política alemã do “espaço vital”, daí ser considerado o fundador da escola determinista e ter dado suporte teórico à Geopolítica fundada por Kjillen em 1911. Ao contrário de Ratzel que apoiava a expansão imperialista alemã, Elissé Reclus militou contra essa política, adotando uma política de contestação do imperialismo, por isso ter ficado esquecido e marginalizado. Já no século XX as concepções acerca da Geogra- fia se diferenciam e ganham importância as chama- das escolas nacionais, cada uma refletindo os inte- resses de seus países, principalmente no que diz res- peito ao imperialismo e ao processo de colonização. A influência do positivismo na Geografia aumen- tou o problema sobre a delimitação de qual deveria ser a área de estudo da Geografia. Influenciada pelo positivismo, a Geografia foi compartimentada em vá- rios setores ou ramos: Geografia da População, Geo- grafia Agrária entre outras. Essa visão departimentada do contismo só será questionada após a Revolução Russa, que através do marxismo, proporcionou que a interdisciplinaridade fosse exercitada mais intensamen- te na Geografia. No caso Brasileiro a Geografia se desenvolveu muito lentamente limitando-se aos estudos descritivos. Foi só a partir de 1930 com a criação do IBGE e das pri- meiras faculdades de Filosofia que a Geografia Brasi- leira ganha um caráter científico. Daí delinearam-se várias correntes: as preocupadas com a Geopolítica, de cunho militar e as de modelo francesa (mais filo- sófica) trazida por Pierre Mombeig Pierre Deffontaines e Francis Ruellan. Também se destacam nesse perío- do ensaístas como Gilberto Freire, Josué de Castro e Caio Prado Junior. Esse modelo de Geografia perdura até os anos 60 quando dois modelos de Geografia se chocam: uma a serviço de um projeto de desenvolvimento capitalis- ta dependente para o país (Geografia Quantitativa) e outro que questionava a pretensa neutralidade da
  • 5. 5 Nº 18 MAIO/2006 Geografia Quantitativa que dava suporte aos gover- nos autoritários da época (Geografia Crítica). Os Quantitivistas, em baixa durante toda a década de 80, reaparecem nos anos 90 inspirados pela informática e pelo uso do computador. 2.2 - O problema da interdisciplinaridade Para o autor a interdisciplinaridade ganha uma di- mensão especial na Geografia, pois a existência de uma Geografia Humana e de uma Geografia Física é apenas artificial e apenas serve para estabelecer uma dicotomia que acaba pondo em risco a própria exis- tência geográfica. Os saberes próprios da Geografia tais como: a climatologia, a geomorfologia, pedologia, etc. acabaram por se tornar objeto de estudo de es- pecialista, criando assim uma preocupação para a Geografia definir seu objeto. Sendo a Geografia uma ciência social é importan- te que estreite sua relação com as chamadas ciências do homem, surgindo assim, saberes intermediários entre elas e a Geografia. A Geografia deve, portanto estabelecer um conta- to direto com a História, com a Antropologia, com a Economia Política entre outras ciências. É justamen- te essa aproximação que enriquece a Geografia e tam- bém as outras ciências. 3 – A GEOGRAFIA E A CRISE BRASILEIRA. A palavra crise é uma das mais usadas no Brasil, da mesma forma que o Brasil a Geografia também se encontra em crise, isso porque antes de ser profissio- nal o geógrafo é um cidadão e daí, dentro de sua área de atuação, deve colaborar para procurar os caminhos que ajudem na reformulação da sociedade brasileira. 3.1. – Características da crise brasileira. O Brasil, apesar de ser um país de grande exten- são territorial, rico em recursos naturais e com uma população numerosa, se apresenta como um país po- bre. Esse atraso em parte pode ser explicado em fun- ção de nossa herança colonial, sustentada na explo- ração dos recursos naturais e nas populações indíge- nas e negras. Ainda hoje, passado mais de 200 anos de nossa independência, feita sem revolução e sem nenhuma transformação, o país pouco mudou e praticamente até os anos de 1930 o Brasil era dominado pelos gran- des proprietários rurais. A partir da década de 30, abriu-se espaço para os grupos urbanos na participação da vida política. O país se urbanizou e verificou-se o surgimento de uma burguesia urbana que se aliou aos antigos chefes ru- rais mantendo a estrutura de dominação. As leis tra- balhistas, notadamente populistas acabaram fazendo algumas concessões às classes mais baixas, todavia mantendo o sistema social excludente. Com exceção da PETROBRÁS, toda nossa econo- mia foi sendo incorporada ao capitalismo internacio- nal. O Brasil adotou um modelo econômico exporta- dor sob alegação da necessidade de se pagar a dívida externa, caindo em um círculo vicioso. Exporta para pagar a dívida e aumenta a dívida por dar prioridade à política exportadora. 3.2 - A crise da Geografia. Em uma sociedade permanentemente em crise é natural, que a Geografia, como ciência social, tam- bém se encontre em crise. Os grupos que estão no poder esperam que a Ge- ografia esteja a serviço da exclusão social, que contri- bua para beneficiar o grande capital. Todavia as su- cessivas crises internacionais colocaram sob suspeita a Geografia institucional e trouxe o problema do com- prometimento do geógrafo com o país. 3.3 – A geografia e a crise Sabendo que o país vive momentos de crise, o que seve ser discutido é qual deve ser o papel do geógrafo no momento atual. Assim, para Andrade, o geógrafo só poderá con- tribuir com seu país se possuir uma boa formação científica; ser capaz de analisar a realidade brasileira, dentro de sua especificidade; entender que não basta descrever o visível, mas também perceber e interpretá- lo; aceitar que existe um processo dialético na produ- ção do espaço que obriga o geógrafo a dispor de um quadro teórico que lhe permita analisar tanto as con- dições do meio natural, submetidas também a um processo dinâmico, como conhecer bem a estrutura da sociedade em que vive; Possuir boa formação filo- sófica para que com esta e com a práxis possa carac- terizar as categorias que vai utilizar e por fim, possuir um espírito critico e apaixonado para poder fugir dos modelos filosóficos idealistas que as classes dominan- tes utilizam com maestria para desviar os estudiosos do caminho seguro na procura das soluções para a problemática da sociedade. Em síntese, é grande a responsabilidade do geógrafo diante da crise que atinge o país e a sua ciência. Cabe a ele participar do encontro de uma saída autêntica para a crise nacional e de uma solução para a retirada de sua própria ciência do descrédito e das dificuldades com que ela se defronta. 4 - POPULISMO E ORGANIZAÇÃO SOCIAL DO ESPAÇO. O populismo é sempre tema atual e dos mais com- plexos constituindo-se um desafio à reflexão. O populismo é uma das formas de governo mais co- muns em sociedades de transição, típicas dos países subdesenvolvidos. Constituem-se em um desafio refletir sobre a socie- dade, política e a organização do espaço em regimes populistas. Para o autor, o estudioso que se propor a estudar o relacionamento entre o populismo e as for- mas de organização do espaço se vê obrigado a ma- nejar com categorias científicas as mais diversificadas.
  • 6. 6 Nº 18 MAIO/2006 Necessita refletir, levando em conta que o espaço nunca está organizado de forma definitiva, não é algo estáti- co, é profundamente dinâmico e vai se modificando dialeticamente de forma permanente. O espaço pro- duzido é sempre temporário pois é produto das rela- ções dialéticas entre sociedade e natureza, permane- cendo ora de forma mais intensa, ora de forma me- nos intensa em permanente transformação. 4.1 – Do espaço organizado Durante muito tempo admitiu-se que o espaço ou era produto da influência da natureza, havendo um determinismo do meio natural sobre a ação do ho- mem, ou, que sem se libertar da influência do ambientalismo, haveria possibilidades recíprocas da influência do homem sobre o meio e do meio sobre o homem – o possibilismo. Hoje ao analisarmos o espaço em suas várias es- calas devemos considerar um erro darmos ênfase unicamente qualitativa, ou seja, a problemática es- pacial não pode ser vista apenas pela visão da Geo- grafia. A análise espacial exige a participação da socio- logia, da antropologia, da história, da economia, da política entre outras ciências. Ao estudarmos o espaço produzido deve-se levar em conta que esse espaço é a resultante de uma evo- lução e foi produto da ação de numerosos fatores, bastante diversificados. É necessário destacar que a interferência individual na organização do espaço é praticamente nula por isso o que importa é entender- mos como atua a sociedade em seu conjunto. Na medida em que nossa sociedade constitui-se em uma sociedade capitalista, a organização do espaço irá re- fletir, dentro de certas limitações, os interesses das classes dominantes. Limitações impostas pelas diver- gências de interesses dentro das classes dominantes e pelas pressões impostas pelas classes dominadas. Desta forma, a organização de um determinado espaço, sempre irá refletir as estruturas sociais exis- tentes e dominantes. 4.2 – O populismo e suas características Os governos populistas são típicos dos países sub- desenvolvidos, nos períodos de crises sociais. Sem- pre que ocorre uma certa instabilidade política e soci- al e é comum o surgimento de lideres carismáticos. O líder populista não tem compromisso com mudan- ças reais, procura com reformas superficiais atenuar as tensões. No Brasil, os períodos populistas muitas vezes se seguem ou coexistem com períodos autoritários (1930/ 34,1937/45 e 1964). 4.3 – O populismo e a produção do espaço social A questão central, segundo o autor, é discutir quais são as repercussões de uma política populista sobre o espaço social produzido? Ou ainda, com que inten- sidade uma ação populista pode modificar o espaço anteriormente produzido e que marcas poderá deixar para o futuro? No Brasil podemos dizer que o populismo estava muito mais voltado para as populações urbanas do que para as rurais. A modernização da indústria veio a atender os desejos de uma burguesia urbana, toda- via, as intervenções que favoreceram às mudanças não provocaram alterações nas velhas formas de poder. As transformações urbanas e indústriais provoca- ram um grande êxodo rural, principalmente de traba- lhadores sem qualificação o que provocou ainda mais a queda no padrão da qualidade de vida, das condi- ções sanitárias, da segurança, da saúde, etc. O crescimento urbano foi ainda estimulado pela construção de grandes rodovias que facilitaram a integração do território. O deslocamento de popula- ção (para atender as classes dominantes nacional e as empresas estrangeiras) se deu de forma desordenada em sem planejamento provocando a destruição e a degradação do meio ambiente. Poderíamos citar diversos exemplos, todavia o que importa é demonstrar como a atuação populista pode modificar a organização espacial do país nas mais di- versas escalas exacerbando as tendências dominan- tes em um país inserido na área de domínio do capi- talismo periférico. 5 – PERSPECTIVAS DO PAPEL DO GEÓGRAFO COMO PROFISSIONAL, NO BRASIL Para discutir o papel do geógrafo como profissio- nal o autor coloca duas questões: 1- Qual a formação profissional do geógrafo; 2- Qual o mercado de trabalho que oferece oportuni- dades ao profissional de geografia. Nas primeiras quatro décadas do século XX prati- camente não houve preocupação, no Brasil, em se formar profissionais que requeriam maior especiali- zação, como é o caso da Geografia. A Geografia só começou ser lecionada oficialmen- te em institutos superiores após a Revolução de 1930, com a criação dos cursos de Geografia e História, nas faculdades de filosofia e com a introdução de uma disciplina de Geografia Econômica nos cursos de Ad- ministração e Finanças, de Ciências Contábeis e Atuariais e de Administração Pública e de Empresas. Mesmo assim a Geografia não era ministrada com a finalidade de formar geógrafos mas sim formar pro- fessores para as escolas de ensino médio e dar subsí- dios aos economistas e administradores. 5.1 – Os primeiros trabalhos geográficos Os primeiros trabalhos geográficos foram elabo- rados por não geógrafos. Trabalhos, sobretudo im- portantes quando das questões de limites, de frontei- ras entre o Brasil e as Repúblicas Vizinhas. Podemos considerar como pioneiros dos estudos geográficos, embora não sendo geógrafos, Olville Derby, Teodoro Sampaio, Capistrano de Abreu, Oliveira Viana, Gilber- to Freire e Caio Prado Junior, todavia é Delgado de
  • 7. 7 Nº 18 MAIO/2006 Carvalho que pode ser considerado o primeiro geógrafo brasileiro, precursor da Geografia científica no Brasil, com trabalhos publicados no início do século XX. 5.2 – A oportunidade para a existência de geógrafos profissionais A formação de geógrafos foi proporcional às exi- gências criadas pelo desenvolvimento do país. No IBGE, houve uma grande preocupação com as fron- teiras do Brasil e com a necessidade de uma nova divisão regional. O IBGE foi uma das grandes escolas de formação de geógrafos, enviando técnicos para realizarem cursos na França, principalmente para de- senvolverem uma teoria sobre região que pudesse ser aplicada ao Brasil. Um outro segmento que contribuiu para a forma- ção de geógrafos foi a USP, que passou a exigir dos candidatos a professores o título de doutor. As nume- rosas teses de doutoramento, então defendidas, se constituíram num verdadeiro marco para a história do desenvolvimento da Geografia Brasileira. Fundada em 1945 a AGB desempenhou um gran- de papel para a formação de pesquisadores. Criada em São Paulo expandiu-se para todo o Brasil. Foram de suma importância os congressos e os grupos de trabalho que se formaram no interior da AGB. O desmembramento dos cursos de Geografia e História, a partir de 1955 favoreceu o surgimento de inúmeras disciplinas auxiliares - embora agudizando ainda mais a dicotomia entre Geografia física e hu- mana – deu à Geografia mais autonomia. 5.3 – A pós-graduação e a regulamentação da profissão Nos anos 60 houve no Brasil um grande estimulo à criação de cursos de pós-graduação, seguindo o mode- lo norte-americano. Os primeiros mestrados surgiram ma Universidade de São Paulo posteriormente foram sendo implantados cursos na Universidade Federal do Pernambuco, na UNESP, na Universidade Federal de Sergipe, na Universidade Federal de Santa Catarina. 5.4 – As perspectivas para o geógrafo As perspectivas para o geógrafo não são muito amplas. Elas surgem sobretudo no setor público, nas áreas de planejamento, defesa do meio ambiente, pro- blemas de urbanização etc. Inicialmente a procura era maior por cartógrafos – área onde os geógrafos en- frentavam uma série concorrência dos engenheiros. Além dessas áreas os geógrafos encontram traba- lho nos estudos rurais, principalmente em um mo- mento em que se discute tanto uma reformulação fundiária. Na empresa privada o geógrafo encontra espaço nas empresas de mineração, exploração agrí- cola, de transportes, principalmente após o governo começar a exigir das empresas maiores cuidados quan- to à preservação ambiental. Após anos de batalha a profissão de geógrafo foi regulamentada pelo projeto de Lei 6664 de 26 de ju- nho de 1979 que estabeleceu ao geógrafo um campo de atuação específico, bem delimitado e tecnocrático. Elaborada no período ditatorial, essa Lei vinculou os geógrafos ao CONFEA, ao lado dos engenheiros, agrô- nomos e dos arquitetos, ignorando a formação humanística que caracteriza a Geografia. Hoje a Geo- grafia desempenha um grande papel na vida brasilei- ra e tem, pelas condições do país e pela capacidade de seus profissionais, um grande espaço a ocupar na construção do Brasil de amanhã. 6 - O LIVRO DIDÁTICO DE GEOGRAFIA NO CONTEXTO DA PRÁTICA DE ENSINO 6.1 – O livro didático no 1o e 2o graus Os primeiros livros didáticos refletiam o modelo de ensino de geografia que se praticava até 1930. Os estudantes eram obrigados a decorar nomes de aci- dentes geográficos – linha costeira, relevo, rios, la- gos, nomes de capitais e de principais cidades etc. Após 1930 Delgado de Carvalho, inspirado na Ge- ografia Francesa, publica uma série de livros sobre o Brasil, chegando a publicar, com fim estritamente di- dático, uma Corografia do Brasil. A reforma educaci- onal Francisco de Campos deu grande ênfase à Geo- grafia que passou a ser ensinada nas cinco séries do ensino ginasial. Essa reforma animou novos profes- sores a escreverem compêndios de geografia. Daí surgiram, na década de 30, as coleções de livros es- critos por Delgado de Carvalho e Aroldo de Azevedo, Pierre Mombeig, João Dias da Silveira, Maria da Con- ceição Vicente de Carvalho. Com a reforma do Estado Novo, a Geografia, con- siderada uma ciência conservadora, ganhou espaço e passou a ser ensinada em todo curso secundário. No início da década de 50 surgiram novos livros didáticos que procuraram apresentar, de forma mais dinâmica, os fenômenos geográficos, abandonando as classificações estáticas, principalmente tratando- se das climáticas. Nos anos 60, com o domínio de uma política populista, houve maior estímulo à produção de livros didáticos aparecendo novos autores e editoras que além dos livros didáticos produziam os cadernos de exercícios, os chamados “livros do mestre”, com res- postas e formulações prontas, limitando a criatividade do professor e a perda de reflexão por parte deste. Assim, é fundamental uma revisão total no ensino de geografia no nível médio. O professor deve utilizar, além do livro didático, outras formas auxiliares de pesquisa. Os livros didáticos além de serem melhora- dos necessitam ter um caráter mais regional afim que os estudantes comecem a aprendizagem a partir da paisagem com que convivem diariamente. A geogra- fia não pode ser ensinada a partir de grandes concep- ções generalizantes, ela deve dar maior atenção à pro- dução do espaço. 6.2 – O livro didático para o ensino superior Para o ensino superior, o problema é bem diverso,
  • 8. 8 Nº 18 MAIO/2006 o livro texto perde importância, embora também seja indispensável para dar uma linha mestra ao pensamento do formando, quer captando-o para uma linha de pen- samento do autor, quer levando-o a raciocinar de for- ma crítica sobre essa linha de pensamento. 7 – A GEOGRAFIA E O PROBLEMA DA REDIVISÃO TERRITORIAL DO BRASIL 7.1 – Origem da divisão político-administrativa do Brasil O Brasil, apesar de sua grande extensão territorial e de sua elevada população, comparado a outros pa- íses vê-se pouco dividido politicamente, o que traz conseqüências nem sempre favoráveis à administra- ção e ao seu desenvolvimento. A divisão político-administrativa, com pequenas al- terações, pouco mudou desde o período colonial. Do ponto de vista geográfico, admite-se que os estados de grande extensão territorial mantiveram a sua unidade em função da inexistência de um povoamento efetivo por parte do colonizador, concentrando as populações próximas de algumas cidades de maior expressão. 7.2 – Os estados e as reivindicações autonomistas A divisão político-administrativa brasileira sempre foi muito questionada, isto porque se consiste numa divisão abstrata e irreal na medida que ignora os inte- resses e as aspirações populares. Os grandes estados não dispõem de recursos para promover o desenvolvimento de áreas periféricas ao mesmo tempo em os habitantes de áreas muito po- voadas se sentem desvinculados do estado que per- tencem e defendem o direito à autonomia alegando sentirem-se desprezados pelos governos estaduais. 7.3 – A Assembléia Constituinte e a divisão político-administrativa do Brasil Na Assembléia Constituinte foram apresentados projetos de redivisão territorial do Brasil levando-nos a pensar se essas propostas correspondem às aspira- ções de suas populações ou aos interesses das oli- garquias que controlam o poder nessas áreas. O que deveria ser levado em consideração no momento em que se discute a divisão do país em mais estados são as áreas de fronteiras. Os parlamentares e adminis- tradores deveriam estudar a possibilidade de criação de territórios federais em áreas fronteiriças, potenci- almente ricas e sujeitas à infiltração estrangeira. 7.4 – Há outra alternativa Talvez uma alternativa à divisão dos velhos esta- dos seria a criação de uma nova escala de divisão territorial de nível superior à municipal e inferior à es- tadual. Ela constituiria na criação de departamentos ou regiões administrativas nos vários estados, sobre- tudo nos de maior extensão territorial, que interme- diariam os dois níveis de administração. 8 – REFLEXÕES A RESPEITO DO DOUTORADO EM GEOGRAFIA. Os cursos de pós-graduação foram implantados durante o período autoritário sendo que antes disso havia a nível federal um sistema bastante diferente. Após dois anos de formados na graduação os inte- ressados em seguir uma carreira universitária podiam se inscrever para o concurso de Livre Docência apre- sentando uma tese já elaborada. O cargo de profes- sor catedrático era obtido mediante concurso. A deficiência de doutores na área de Geografia no Brasil resulta da falta de tradição na formação de dou- tores nas universidades federais. Quanto à Geografia, o grande debate que ela está provocando atinge a sua conceituação e os métodos utilizados; cremos que a Geografia encontra-se em um processo evolutivo rápido de modo que, ao lado das pesquisas empíricas, vem se travando uma pro- funda discussão teórica que deságua em posições fi- losóficas e epistemológicas as mais diversas. A grande importância dos cursos de pós-gradua- ção em Geografia, segundo Andrade, é a possibilida- de de deixarmos de copiar os modelos estrangeiros de Geografia e desenvolvermos nossa ciência de for- ma crítica e autônoma. HAESBAERT, Rogério. O mito da desterritorialização: do “fim dos territórios” à multiterritorialidade. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2004. Elaborada pela Profa. Joyce Regina da Silva Magalhães Bozzi Graduada em Letras – Especialista em Ensino Superior – UNOPAR-PR Território e desterritorialização nas ciências so- ciais. Com a globalização via internet e o ciberespaço está destruindo a territorialidade das fronteiras dos Estados e criando um único espaço virtual? O mundo estaria se desterritorializando? A tese de Rogério Haesbaert é que o movimento de destruição de territó- rios (com o mito da desterritorialização – um mundo sem fronteiras, sociedade em rede) é, na verdade, a reconstrução do território em novas bases, isto porque o homem não vive sem território e que a sociedade não pode existir sem territorialidade. A questão é, se- gundo Haesbaert, enfocar o território numa perspecti- va geográfica intrinsecamente integradora, ou seja, num sentido múltiplo e relacional, respeitando a diversidade
  • 9. 9 Nº 18 MAIO/2006 e a dinâmica temporal do mundo. Assim, a terri- torialização é vista para além do processo de domínio político-econômico, ou de apropriação simbólico-cul- tural do espaço pelos grupos humanos. Portanto, cada ser humano precisa territorializar-se. Para Haesbaert, a questão não é o fenômeno da desterritorialização, mas o da multiterritorialização: experimentar diferentes ter- ritórios ao mesmo tempo. Entretanto, as relações ca- pitalistas relegaram a maior parte da humanidade à “exclusão aviltante ou às inclusões extremamente pre- cárias, no qual no lugar de partilharem múltiplos ter- ritórios, vaguem em busca de um, o mais elementar território da sobrevivência cotidiana, como é o caso dos múltiplos territórios precários que abrigam sem- tetos, sem terras e outros grupos minoritários que parecem não ter lugar numa desordem de ‘aglomera- dos humanos’ (...) estigmatizados e separados”. Por- tanto, “o sonho da multiterritorialidade generalizada, dos ‘territórios-rede’ a conectar a humanidade intei- ra, parte (...) da territorialidade mínima, abriga e acon- chego, condição indispensável para (...) estimular a individualidade e promover o convício solidário das multiplicidades – de todos e de cada um de nós”, diz Haesbaert. As questões sociológicas referentes ao espaço e território tiveram as contribuições de Michel Foucault (emergência de uma era centrada no tempo e no es- paço com destaque para a questão do poder), Jameson (sobre a questão da cultura e espaço), Deleuze e Guatarri (geofilosofia – no qual atentou para o perigo do fascínio da desterritorialização: “inteiramente des- providos de territórios, nos fragilizamos até desman- char irremediavelmente”). Já no Brasil há a contri- buição de Otávio Ianni e, principalmente, Milton San- tos. Para este, a “desterritorialização é, freqüen- temente, uma outra palavra para significar estranhamente, que é, também, desculturização” e há, segundo ele, uma associação entre “ordem glo- bal” que “desterritorializa” e “ordem local” que “reterritorializa”. Mas sobre o olhar geográfico, deve- se compreender esta análise a partir da multerrito- rialidade. Portanto, para Haesbaert, sobre a desterrito- rialização: a) não há definição clara de territórios nos debates que focalizam a desterritorialização; o território ora aparece como algo “dado”, um conceito implícito ou a priori referido a um espaço absoluto, oura ele é definido de forma negativa, isto é, a partir daquilo que ele não é; b) desterritorialização é focalizada quase sempre como um processo genérico numa relação dicotômica e não intrinsecamente vinculada à sua contraparte, a (re)territorialização; este dualismo mais geral encon- tra-se ligado a vários outros, como as dissociações entre espaço e tempo, espaço e sociedade, materi- al e imaterial, fixação e mobilidade; c) desterritorialização significando “fim dos territóri- os” aparece associada, sobretudo, com a predo- minância de redes, completamente dissociadas de e/ou opostas a territórios, e como se crescente globalização e mobilidade fossem sempre sinôni- mos de desterritorialização. Entender a Desterritorialização a partir da defi- nição de Território. Trata-se de analisar as questões de como as diferentes concepções de território, ao longo da tradição do pensamento geográfico e sociológico, servem de pano de fundo para o debate sobre a desterritorialização. Território pode ser compreendido em três vertentes básicas: a) política – referida às rela- ções espaço-poder ou jurídico-política – relativa a to- das as relações espaço-poder institucionalizadas. Ter- ritório: espaço delimitado e controlado, no qual se exerce um determinado poder relacionado ao poder político do Estado. Trata-se do jogo entre os “macropoderes” políticos institucionalizados e os “micropoderes” (Michel Foucault); b) cultural (culturalista) ou simbólico-cul- tural (Bourdieu): território como produto da apropria- ção/valorização simbólica de um grupo em relação ao seu espaço vivido; c) econômica (economicista): terri- tório como fonte de recursos e incorporado no embate entre duas classes sociais e na relação capital-traba- lho, como produto da divisão “territorial” do trabalho. Entretanto, segundo Haesbaert, há um entrecruzamento de proposições teóricas, no qual é fundamental trazer uma outra postura teórica que seja mais ampla: terri- tório numa perspectiva integradora e relacional, no qual traz a idéia de território como um híbrido, seja entre o mundo material e ideal, seja entre natureza e sociedade, em suas múltiplas esferas (econômica, po- lítica e cultural). Haesbaert postula uma leitura integradora e relacional do território. Hoje, a “experiência integradora” é possível somente se estivermos arti- culados (em rede) através de múltiplas escalas. Não há território sem uma estruturação em rede que conecta diferentes pontos ou áreas. É o domínio dos “territórios-rede”, espacialmente descontínuos, mas intensamente conectados e articulados entre si. Tra- ta-se de uma leitura integrada do espaço social com uma visão de território a partir da concepção de es- paço como um híbrido na indissociação entre movi- mento e (relativa) estabilidade. Território, neste sen- tido, pode ser concebido a partir da imbricação de múltiplas relações de poder, do poder mais material das relações econômico-políticas ao poder mais sim- bólico das relações de ordem mais estritamente cul- tural. Para além de uma leitura puramente materialis- ta do poder, na leitura relacional, o poder é com- preendido “como relação, e não como coisa a qual possuímos ou da qual somos expropriados, envolve não apenas as relações sociais concretas, mas tam- bém as representações que elas veiculam e, de certa forma, também produzem. Assim, não há como se- parar o poder político nem sentido mais estrito do poder simbólico”. Território e Desterritorialização em Deleuze e
  • 10. 10 Nº 18 MAIO/2006 Guattari. Trata-se de uma concepção teoricamente mais elaborada sobre desterritorialização que vem da filoso- fia, como um dos conceitos centrais do pós-estrutura- lismo de Guilles Deleuze e Félix Guattari. Segundo eles, “não há território sem um vetor de saída do território, e não há saída do território, ou seja, desterritorialização, sem, ao mesmo tempo, um esforço para se reterritorializar em outra parte”. Os territórios sempre comportam dentro de si vetores de desterritorialização e de reterritorialização. Muito mais do que uma coisa ou objeto, diz Haesbaert, “o território é um ato, uma ação, uma relação, um movimento” (de territorialização e desterritorialização), um ritmo, um movimento que se repete e sobre o qual se exerce um controle. Esta dialética envolve a criação e a destruição de territórios, conforme nos atestam Deleuze e Guattari: “o território pode se desterritorializar, isto é, abrir-se, engajar-se em linhas de fuga e até sair do seu curso e se destruir. A espécie humana está mergulhada num imenso movimento de desterritorialização, no sentido de que seus territórios ‘originais’ se desfazem ininterruptamente com a divi- são social do trabalho, com a ação dos deuses univer- sais que ultrapassam os quadros da tribo e da etnia, com os sistemas maquínicos que a levam a atraves- sar, cada vez mais rapidamente, as estratificações materiais e mentais”. Para compreensão desta dialética entre desterritorialização e reterritorialização, exemplifica- se com a condição do bóia-fria morador de periferias urbanas. Assim, como entender este universo para a ge- ografia? Segundo Deleuze, “a geografia não se conten- ta em fornecer uma matéria e lugares variáveis para a forma histórica. Ela não é somente humana e física, mas mental, como a paisagem. Ela arranca a história do culto da necessidade, para fazer valer a irredutibilidade da contingência, ela a arranca do cul- to das origens, para afirmar a potência de um ‘meio’ (...). Enfim, ela arranca a história de si mesma para descobrir os devires, que não são a história mesmo quando nela recaem (...)”. Ora, se a Geografia menos- prezou as dinâmicas desreterritorializadoras como cen- tro de sua análise, trata-se de recuperar os estudos es- paciais em torno dos fenômenos de deslocamento e das desconexões, especialmente diante da nossa nova ex- periência “pós-moderna” de espaço-tempo, diz Haesbaert. Pós-modernidade e Geometrias do Poder. Ana- lisa-se desterritorialização, no sentindo de que não representa mais uma extinção de território, e sim uma dificuldade de definir o novo tipo de território muito mais múltiplo e descontínuo, que está surgindo. No âmbito da historicidade fica complexo analisar a con- cepção de desterritorialização, especialmente quan- do relaciona a experiência entre espaço-tempo, modernidade e a pós-modernidade. Após rompimen- to com uma época, o pós-modernismo estabelece uma nova sensibilidade, uma nova leitura e uma nova ex- periência de mundo, diretamente vinculada aos no- vos paradigmas tecnológicos que balançam as anti- gas certezas e os antigos laços da sociedade com o espaço. No período da Revolução Industrial já mos- trava traços que estavam sendo gestados pela modernidade como “tudo que é sólido” tende a se “desmanchar no ar” segundo Berman. Enquanto a modernidade passava pelo mito da Revolução, a pós-modernidade estaria ligada à repe- tição, ao anti-histórico, ao presente contínuo, enfim, na ótica severamente crítica. O projeto central da modernidade enfatizava o indivíduo-sujeito na esfera da autonomia individual, levando como marco desta época a reterritorialização, ou seja, o individuo sus- tentado pelo individualismo, faz com que indivíduo queira ultrapassar os diversos territórios, comunitári- os. Caracteriza-se sinteticamente o pós-modernismo aquele que desestabiliza a estrutura metonímica que relaciona presença e ausência com proximidade e dis- tância, assim compreende-se que desreterritorialização está fortemente vinculada com o fenômeno da com- pressão tempo-espaço onde a sociedade complexa vive no paradoxo da desigualdade diferenciada. Múltiplas Dimensões da Desterritorialização: perspectivas econômicas, política e cultural. A desterritorialização é tratada em três grandes dimen- sões sociais sendo elas: a econômica, a dimensão política e a perspectiva simbólica ou cultural em sen- tido mais restrito. A problemática destas dimensões engloba a questão de território e a territorialização sempre focados num sentido mais restrito, pelo qual se busca responder problemáticas específicas ligadas a questões econômicas, políticas ou culturais, mais do que a problemática social que envolveria uma no- ção de território mais integradora implícita quando se fala em processos de exclusão social, já que exclusão será vista aqui como um fenômeno amplo e comple- xo, ao mesmo tempo de natureza econômica, política e cultural. Na dimensão da perspectiva econômica pode- mos observar que não é a maior tradição nos debates sobre território assim analisando três pontos de vista econômicos que afetam a desterritorialização: a) a desterritorialização é vista como sinônimo de globalização econômica, esta situação econômica acontece quando se forma um mercado mundial com fluxos comercias e financeiros e de informa- ções cada vez mais independentes de base territoriais bem definidas, como a dos Estados nações: b) em um sentido mais complexo podemos dar ênfa- se a um dos momentos do processo de globalização ou ao mais típico, aquele chamado capitalismo pós- fordista ou capitalismo de acumulação flexível, fle- xibilidade esta que seria responsável pelo enfraque- cimento das bases territoriais; c) em um sentido mais específico citamos ainda a desterritorialização como um processo vinculado pela economia globalizada, o setor financeiro, onde a tecnologia informacional tornaria mais evidente tanto a imaterialidade quanto a instantaneidade.
  • 11. 11 Nº 18 MAIO/2006 Dentro da perspectiva política pode-se delimitar seus aspectos onde território é aquele que vincula espaço e soberania estatal, ou seja, território como a área ou espaço de exercício da soberania de um Esta- do. Através do aparecimento do Estado vê-se que ele é o primeiro responsável pelo primeiro grande movi- mento de desterritorialização, na medida em que ele imprime a divisão de terra pela organização adminis- trativa, fundiária e residencial. No quadro da desterritorialização numa perspec- tiva cultural, pode-se pensar o território ao longo da história do pensamento nas Ciências Sociais, especi- almente entre geógrafos e cientistas políticos. Partin- do do par História-mito e da herança helenística, en- quanto as “potências regem o mundo” produz histó- ria, as cidades e seus territórios produzem e se ali- mentam de mitos. Desterritorialização e Mobilidade. Os processos de territorialização classificam como fruto de interação entre relações sociais e controle do/pelo espaço, rela- ções de poder em sentido amplo, ao mesmo tempo de forma mais concreta (dominação) e mais simbóli- ca (um tipo de apropriação). Em uma visão mais tra- dicional desterritorializar significa então, diminuir ou enfraquecer o controle das fronteiras, aumentando assim a dinâmica, a fluidez, em suma, em suma, a mobilidade, seja ela de pessoas, bens materiais, capi- tal ou informações. A desterritorialização em conse- qüência do território torna-se assim discurso da mo- bilidade tanto da mobilidade material quanto da mo- bilidade imaterial, especialmente aquele diretamente ligado aos fenômenos de compressão tempo-espa- ço, propagado pela informatização através do chamado ciberespaço. Os frutos da sociedade sem territoria- lidade, sem local, torna a mobilidade generalizada, ou seja, os territórios são construídos a partir do movi- mento e onde o local se fundamenta na diferença das mobilidades. Em um ângulo mais complexo da desterritorialização vemos freqüentemente uma cres- cente mobilidade das pessoas, seja como, novos nô- mades, vagabundos, viajantes, turistas, imigrantes refugiados ou como exilados – expressões cujo signi- ficado costuma ir muito além de seu sentido literal. No contexto geográfico, segundo o Haesbaert, “podemos definir mobilidade como uma relação so- cial ligada à mudança de lugar, isto é, como conjun- to de mobilidades pelas quais os membros de uma sociedade tratam a possibilidade de eles próprios ou outros ocuparem sucessivamente vários lugares”. Busca-se através de uma análise níveis para a desterritorialização para cada grupo ou classe social, percebe-se claramente que aquilo que é denominado desterritorialização para a elite planetária que se locomove com facilidade nada tem a ver com o des- locamento compulsório das classes mais pobres. Na classe que compõe os ricos a desterritorialização para os ricos, pode ser confundida com uma multiterrito- rialidade segura, mergulhada na flexibilidade e em experiências múltiplas de mobilidade. Dentro da sociedade percebe-se o tamanho do valor dado à sociedade contemporânea, ou seja, não signi- ficando obrigatoriamente que a mobilidade social num mundo onde o movimento é regra, a fixidez e a esta- bilidade podem acabar, de alguma forma, transfor- mando-se também numa espécie de triunfo ou de recurso. Territórios, Redes e Aglomerados de Exclusão. Pode-se identificar território no movimento ou pelo movimento. Talvez esta seja a grande novidade da nossa experiência espaço-temporal dita pós-moder- na, onde controlar o espaço indispensável à nossa reprodução não significa apenas controlar áreas e definir fronteiras. Com a globalização a comunicação revoluciona a formação de territórios pela configura- ção de redes que podem mesmo prescindir de alguns de seus componentes materiais fundamentais, como linhas de energia ou até mesmo cabos telefônicos. O território hoje, mais do que nunca, considera-se tam- bém movimento, ritmo, fluxo, rede não se trata de um movimento qualquer, ou de um movimento de feições meramente funcionais: ele é também um movimento dotado de significado, de expressividade, isto é, que tem um significado determinado para quem constrói ou dele usufrui. As redes participam de um jogo ambivalente com os fluidos, ao mesmo tempo tentando canalizá-los e/ou sendo desestruturadas por eles, cria-se então a noção de aglomerados que sur- ge pela necessidade de dar conta de outros tipos de espaços que não se encaixavam claramente na lógi- ca zonal, nem na lógica reticular. Esta noção de aglomerados de exclusão traduz a dimensão geográfica ou espacial dos processos mais extremos de exclusão social porque ela parece expres- sar bem a condição de desterritorialização ou de territorialização precária a que estamos nos referin- do. Em um sentido mais amplo, podemos considerar que “aglomerados de exclusão” seriam o exemplo mais representativo especificamente no caso dos aglome- rados de massa impostos pela sociedade capitalista, presentes em maior ou menor grau praticamente em todos os espaços do nosso tempo. Da Desterritorialização à Multiterritorialidade. Aqui Haesbaert defende a tese de que desterritorialização é, na verdade, uma nova forma de territorialização, a que chamamos de “multiterritorialidade”: um processo concomitante de destruição e construção de territóri- os mesclando diferentes modalidades territoriais, como é o caso dos “territórios-zona” e os “territórios-rede”, em múltiplas escalas e novas formas de articulação territorial. Segundo Rogério Haesbaert, “o mundo ‘mo- derno’ das territorialidades contínuas/contíguas regidas pelo princípio da exclusividade (...) estaria cedendo lugar hoje ao mundo das múltiplas territorialidades ativadas de acordo com os interesses, o momento e o lugar em que nos encontramos”. Trata-se então, de um “mosaico-padrão” de unidades territoriais em área, seu convívio com uma miríade de territórios-rede mar- cados pela descontinuidade e pela fragmentação que
  • 12. 12 Nº 18 MAIO/2006 os possibilita a passagem de um território a outro, num jogo que denomina-se multiterritorialidade humana. Desterritorialização: é a reterritorialização complexa, em rede e com fortes conotações rizomáticas, ou seja, não-hierárquicas. Neste contexto, destaca-se a “globalização”, isto é, a dialética entre o global e o local combinados, ao mesmo tempo: “o global e o local são processos, não localizações. Globalização e localização produ- zem todos os espaços como híbridos, como sítios ‘globais’ tanto de diferenciação quanto de integração. O local e o global não são entidades fixas, mas são produzidas de forma contingente, sempre em pro- cessos de re-produção, nunca completados”. Assim, a presença de territórios-rede proporciona as condi- ções para a existência da multiterritorialidade. Esta depende, sobretudo do contexto social, econômico, político e cultural em que estamos situados. Multiter- ritorialidade contemporânea pode ser altamente com- plexa e dotada de ampla flexibilidade, como também, ser ativada e desativada numa incrível velocidade. Portanto, segundo Haesbaert, quem tiver mais opções para ativar e comandar a riqueza da multiterritorialidade que potencialmente se encontre a seu dispor, seja atra- vés de movimentos progressistas (movimento Zapatista de Chiapas), seja através de movimentos retrógrados ou conservadores (Al Qaeda), consegue maior poder para produzir mudanças sociais (“linhas de fuga”), no sentido de um movimento concomitante de desterrito- rialização e reterritorialização. Desterritorialização como Mito. O discurso da desterritorialização se coloca, segundo Haesbaert, como um “discurso eurocêntrico ou ‘primeiro-mundista’, atento muito mais à realidade das elites efetivamente globalizadas e alheio à ebulição da diversidade de experiências e reconstruções do espaço em curso não só nas chamadas periferias do planeta como no inte- rior das próprias metrópoles centrais. Com certeza, o desprezo de algumas correntes filosóficas pela materialidade do mundo (elaboradas em países ‘cen- trais’) contribuiu para essa difusão da idéia de um mundo de extinção dos territórios ou mergulhado numa dinâmica crescente de desterritorialização”. O fenômeno da desterritorialização e reterritoria- lização não é um fenômeno pós-moderno ou da soci- edade pós-industrial ou da sociedade informacional, visto que o próprio império romano, medieval e o pró- prio Marx como Durkheim já falavam destes fenôme- nos. Também o é de longa data a questão do espaço como esfera de possibilidade da existência da multiplicidade. Assim, o espaço é a condição múltipla de possibilidade tanto de desterritorialização e reterritorialização, simultâneos. Não obstante, Haes- baert acrescenta ainda o fenômeno da Multiterrito- rialidade, para manter e enfatizar a idéia de processo, de permanente movimento e devir. Multiterrito- rialização: é a condensação de um processo que re- presenta a territorialização através da própria desterritorialização. Desterritorialização não é apenas: a) desmaterialização ou domínio de relações simbóli- cas ou “virtuais”; b) “não-presença” ou desvinculação do aqui e do agora; c) aceleração do movimento ou predomínio da fluidez sobre a estabilidade; d) enfra- quecimento dos controles espaciais através de limi- tes-fronteiras e áreas; e) aumento da hibridização cul- tural; f) justaposição e imbricação de territórios. As- sim, a desterritorialização é um mito. Não obstante, muitas vezes, o pano de fundo dos discursos sobre a desterritorialização é o movimento neoliberal que prega o “fim das fronteiras” e o “fim do Estado” para a livre atuação das forças do merca- do. Assim, desterritorialização, referida aí à elite pla- netária, é um mito. Não passa, para Haesbaert, de um rearranjo territorial sob condições de grande com- preensão do espaço-tempo, em que as transforma- ções nas relações ligadas à distância e à presença- ausência tornam-se ainda mais intensas as dinâmi- cas de desigualdade e de diferenciação do espaço pla- netário. Trata-se, neste sentido, da forma “versátil de reterritorialização dos ‘de cima’ que se forja, por ou- tro lado, grande parte da desterritorialização dos ‘de baixo’, através do agravamento da desigualdade e da exclusão pela concentração de renda, do capital (dos investimentos) e da infra-estrutura, associada à ausência de políticas efetivas de redistribuição, aos investimentos mais na especulação financeira do que no setor produtivo gerador de empregos, e à globalização da cultura do status e do valor contábil em uma sociedade de consumo estendida a todas as esferas da vida humana”. Entretanto, para além de hierarquizar as pedras, plantas, animais, pessoas deve-se considerar o “par- lamento das coisas” (Bruno Latour), no qual “não admite nenhuma hierarquia ontológica entre as coi- sas existentes”. Portanto, deve-se ter “amor por tudo o que existe” (Gualandi). Este amor deve estar no cen- tro de nossos processos de territorialização, pela “cons- trução de territórios que não fossem simples territó- rios funcionais de re-produção (exploração) econô- mica e dominação política, mas efetivamente espa- ços de apropriação e identificação social, em cuja transformação nos sentíssemos efetivamente identi- ficados e comprometidos” (Haesbaert). É “o espaço do prazer” (Lefevre). Mas, como “amar tudo o que existe”, num mundo de crescente e abominável desi- gualdade, exclusão, segregação, violência e insegu- rança? Para tanto - para poder “amar tudo o que existe” e construir territórios efetivamente/afetivamente apro- priados - é necessário “acabar com toda exploração e indiferença dos homens entre si e dos homens para com a própria natureza”, diz Haesbaert. Para que os territórios não sejam mais instrumen- tos de alienação, segregação, opressão e “in-seguran- ça”, mas espaços estimuladores, ao mesmo tempo, da diversidade e da igualdade sociais. O tempo denota que, segundo Santos, “a força dos fracos é o seu tem- po lento”. Mesmo que a corrente ideológica do capita- lismo volátil tente destruir as referências territoriais ou
  • 13. 13 Nº 18 MAIO/2006 que constrói multiterritorialidades num sentido destabilizador fragmentador de falta de liberdade, da dinâmica do consumo desenfreado, do correr o risco de perder todos os nosso referenciais e fragilizarmos até “desmanchar irremediavelmente” (Guattari), por outro lado, já no universo dos “espaços lentos” e do “reenraizamento” cabe reconhecer e lutar por essa unidade das coisas do mundo e do território no interior dessa unidade, estimular o potencial “invencionático”, criativo, de multiplicidade. Trata-se de lutar concreta- mente para, segundo Haesbaert, construir uma socie- dade onde não só esteja muito mais democratizado o acesso à mais ampla multiterritorialidade – e a convi- vência de múltiplas territorialidades, onde estejam sem- pre abertas, também, as possibilidades para a reavaliação de nossas escolhas e a conseqüente cria- ção de outras territorialidades ainda mais igualitárias e respeitadoras da diferença humana. Antes de ser a desterritorialização a grande ques- tão da passagem de século (como quer Virilo), o que está dominando, segundo Haesbaert, é a complexi- dade das reterritorializações, “numa multiplicidade de territorialidades nunca antes vista, dos limites mais fechados e fixos da guetoficação e dos ‘neoterritórios’ da globalização”. Portanto, conclui-se com singular maestria Haesbaert: “O grande dilema deste novo século será o da desigualdade entre as múltiplas velocidades, ritmos e níveis de des-re-territorialização, especial- mente aquela entre a minoria que tem pleno acesso e usufrui dos territórios-rede capitalistas globais que asseguram sua multiterritorialidade, e a massa ou os ‘aglomerados’ crescentes de pessoas que vivem na mais precária territorialização ou, em outras pa- lavras, mais incisivas, na mais violenta exclusão e/ ou reclusão socioespacial”. SANTOS, Milton & SILVEIRA, Laura Maria. O Brasil Território e sociedade no início do século XXI. Rio de Janeiro: Record, 2001. Elaborada pela Profa. Joyce Regina da Silva Magalhães Bozzi Graduada em Letras – Especialista em Ensino Superior – UNOPAR-PR 1. A questão: o uso do território. A partir do século XXI, dá-se uma dimensão às pa- lavras com mais ênfase, devido à diversidade lingüísti- ca e assim são atribuídos novos sentidos e o aumento de vocábulos. Estas mudanças freqüentes na lingua- gem fazem com que dificulte a interpretação das pala- vras, por exemplo, território e espaço. Pode-se atribuir a estas palavras as seguintes significações: território, extensão apropriada e usada, visto que se define es- paço como extensão indefinida. Território segundo os autores é um nome político de um país, é difícil falar- mos de um Estado sem um território. O território é visto como unidade e diversidade como uma questão central da história humana. Cada período pode, assim, perguntar o que é novo no es- paço e como se combina com que já existe. O pano de fundo de cada país constitui o estudo das suas diversas etapas e do momento atual, que marca o iní- cio da divisão territorial do trabalho. A partir da criação da divisão do trabalho estabe- lece uma hierarquia entre as pessoas e lugares jul- gando a capacidade de agir das pessoas, das firmas e das instituições, assim instaura-se nos dias atuais um novo conjunto de técnicas que constroem uma a base material da vida da sociedade transformando em um meio técnico-científico informacional, sendo a expres- são geográfica mais utilizada da globalização. Ensi- nando a olhar a constituição do território a partir dos seus usos, do seu movimento, formando um conjun- to de suas partes, reconhecendo as respectivas complementaridades. Para o contexto geográfico, a palavra território tam- bém é definida como: implantação de infra-estrutura, de ciência, técnica e informação, estudo do povoa- mento, e, sobretudo, com a ocupação econômica. O grande crescimento urbano demonstra como os sis- temas de movimento de homens, capitais, produtos, mercadorias, serviços, mensagens, ordens contribu- em para o fluído de território. Com as cidades crescendo e o número maior de pessoas em um número cada vez menor de lugares, a urbanização significa uma maior divisão de trabalho resultando em melhor qualidade de território. Para obtenção da qualidade de território há uma necessidade de regulação política do território, ou seja, resultado é a criação de regiões do mandar e regiões do fazer. A criação deste vínculo do mandar e fazer obser- vamos como as técnicas são desenvolvidas para me- lhor eficácia, divisão e a especialização do trabalho nos lugares como: a incorporação de técnicas ao solo (rodovias, ferrovias, hidrelétricas, telecomunicações, emissora de rádios e TV, etc.), objetos técnicos liga- dos à produção (veículos, implementos), insumos téc- nico-científicos (sementes, adubos, propaganda, consultoria). As técnicas desenvolvidas ao longo do tempo per- cebem que há uma preocupação muito maior para o entendimento das diferenças regionais e com o novo
  • 14. 14 Nº 18 MAIO/2006 dinamismo para busca de uma interpretação geográ- fica da sociedade brasileira. 2. A formação da Região Concentrada e a urbanização interior. Na década de 1930, houve o momento da integração nacional, sendo descoberta São Paulo como a metrópole industrial, pois estavam presentes todos os tipos de fabricação. A revolução de 1932 trouxe a necessidade do avan- ço, e o crescimento para o transporte que facilitaria a circulação de mercadorias entre os Estados e a União. O transporte foi um grande marco neste período, prin- cipalmente o marítimo onde se localizavam os mer- cados permitindo um tráfego mais intenso. Os migrantes dos estados que provinham da Bahia, Minas Gerais, Pernambuco, Alagoas, Ceará e Sergipe começaram a chegar entre 1935 e 1939, ultrapassando os números de estrangeiros, assim fazendo um mo- mento preliminar da integração territorial dado por uma integração regional do Sudeste e do Sul. 3. A integração nacional. No período de 1945 a 1950, São Paulo se firma como grande metrópole fabril do país, o que Milton Braga Furtado chama de crescimento industrial in- tencional, para diferenciá-lo do crescimento industri- al não intencional dos anos 30. Estabelece um domínio paulista, com um aumen- to grande nos investimentos que se iniciava no regi- me de Getúlio Vargas facilitando a concentração eco- nômica e espacial, desenvolvendo o mercado não ape- nas fora, mas sim dentro do país. Neste período da história acontece a Segunda Guerra Mundial, favorecendo São Paulo como centro produ- tor, e ao mesmo tempo, distribuição primária. A difi- culdade financeira dos transportes marítimos acelera a instalação do império do caminhão em São Paulo. Neste período de transição econômica e a criação de uma indústria automobilística conflui com a cons- trução de Brasília que foi um passo importante para as rodovias, pois sem o desenvolvimento industrial de São Paulo seria impossível a construção de Brasília. A partir deste período também ocorreu o golpe de Estado de 1964 que foi considerado como um “novo passo” para internacionalização da economia brasi- leira. Os movimentos reforçam os demais, enquanto a economia e a sociedade se renovam. 4. Uma reorganização produtiva do território. O desenvolvimento da ciência, da técnica e o ace- lerado mundo das informações, fazem com que au- mente a especialização do trabalho nos lugares. Atra- vés deste momento surge uma nova divisão territorial, fundada na ocupação de áreas até então periféricas e na remodelação de regiões já ocupadas. Nos anos 70 e 80, amplia-se a descentralização industrial devido o grande número de estabelecimen- tos industriais no Brasil, sendo as áreas de mais com- plexos industriais as regiões Sul, alguns pontos do Cen- tro-Oeste, Nordeste e do Norte (Manaus). Ainda neste período podemos destacar o avanço e as inovações na agricultura tratando de uma nova geografia feita de belts que são heranças e cristaliza- ções de fronts próprios de uma divisão do trabalho anterior; áreas que ocupadas em outro momento, hoje se densificam e se tecnificam. Constitucionalmente integradas a estes novos avanços as terras ganham nova valorização que acabam por “expulsar” certos produtos para áreas ainda não utilizadas. Podemos ver que, nas áreas privilegiadas pela con- centração, o trabalho adquire maior especialização e cresce a necessidade de intercâmbios. As cidades tor- nam-se especializadas reforçando a capacidade de conhecimento e informação. 5. Por uma geografia do movimento. Não basta apenas produzir, precisa por a produ- ção em movimento. Para esta circulação acontecer é preciso a dialética entre a freqüência e a espessura dos movimentos no período contemporâneo e a cons- trução e a modernização dos aeroportos, portos, es- tradas, ferrovias e hidrovias. Os fluxos aéreos. A concentração maior destes flu- xos acontece entre São Paulo e o Rio de Janeiro onde a divisão de trabalho é extrema e a vida de relações assume especial relevo. Além da facilidade podemos classificar a utilidade da aviação na agricultura para o controle e a aplicação de fertilizantes e pesticidas de forma rápida nas grandes fazendas. As ferrovias são resultado de conflitos e acordos sempre provisórios entre o Estado e as empresas fa- zendo assim que o seu fluxo seja sempre datado au- mentando as cargas transportadas. O uso das ferro- vias não serve apenas para o transporte de cargas e sim de pessoas também, entre os anos de 1970 e 1994 foi criado nos estados de São Paulo e Rio de Janeiro as companhias de trens metropolitanos. A expansão das grandes metrópoles fez com que houvesse uma integração do território através das estra- das, assim aumentando o fluxo rodoviário levando a dis- puta com as ferrovias e favorecendo o aumento de gran- des empresas no sistema rodoviário dando autonomia ao poder público e domínio mercantil completo. As hidrovias classificam-se através das cinco baci- as brasileiras tendo como critérios os elementos soci- ais e econômicos diversos. Podemos citar a Amazô- nia que a maior parte da população utiliza transporte fluvial, ou seja, é uma pequena camada da sociedade que tem acesso aos transportes aéreo e ao rodoviário assim torna-se o meio mais acessível de transporte. 6. O território brasileiro: do passado ao presente. As tendências para uma dinâmica de um país que se industrializa começaram a partir do século XX, que
  • 15. 15 Nº 18 MAIO/2006 já vinha revelando o crescimento industrial que se deum a partir dos estados como Bahia, Pernambuco, Rio de Janeiro, São Paulo e Rio Grande do Sul. Nestas regiões é implantado o sistema ferroviário, e depois estradas de rodagem facilitando a vida agrícola e pa- ralelamente a população urbana crescia de maneira mais rápida. Com a evolução vertiginosa da cidade de São Pau- lo, cresce também a sua base industrial, estabelecen- do uma aliança com outras indústrias, desse modo fortalecendo um denso tecido industrial, do qual vão valer as atividades comerciais, de serviços, de trans- porte, do governo e as próprias indústrias presentes ali e em outros pontos do Brasil, inclusive, em muitos casos, o próprio Rio de Janeiro. 7. Uma ordem espacial: a economia política do território. Ao falarmos de ordem espacial, nos referimos no- vamente ao explicado em uso, ou seja, cada momen- to da história tende a produzir sua ordem espacial, que se associa a uma ordem econômica e uma or- dem social, sendo necessário entender sua realidade a partir de forças que, freqüentemente, não são visí- veis a olho nu. Caracterizamos o espaço como um conjunto indissociável de sistemas de objetos e sistemas de ações. Trata-se de caracterizar uma situação na qual, em cada área, os objetos tendem a exercer certas funções e os respectivos processos são em grande parte, submeti- dos ao papel regulador de instituições e empresas. O crescimento do território leva o desenvolvimen- to de atividades econômicas modernas que permite uma cooperação entre empresas que facilita o pro- cesso de privatização do território. Este comportamen- to influencia também outras empresas, industriais, agrícolas e de serviços, influenciando fortemente o comportamento do poder público, na União, nos Es- tados e nos Municípios. O uso do território é objeto de divisões de traba- lho, as empresas produzem atividades e produzem a sua própria divisão de trabalho. Através das lógicas globais, percebemos que os circuitos de cooperação são também circuitos de competição, o que conduz à questão explicativa maior de saber quem, em deter- minadas circunstâncias, regula quem. O valor dado ao território é caracterizado pela no- ção de espaço, que inclui uma utilização privilegiada dos bens públicos e uma utilização hierárquica dos bens privados. Neste aspecto as empresas tornam a desempenhar um papel central na produção e no fun- cionamento do território e da economia. 8. Desvalorizações e revalorizações do território. O território é palco de grandes disputas comerciais sendo as maiores delas o espaço, que se torna um objeto de articulações entre grandes empresas. Existe uma verdadeira gangorra constante, pois o território é “uno” e seu movimento é solidário, desta maneira a desvalo- rização e revalorização obedecem a uma lógica. A quantificação do valor do território que a lógica obedece, é dado pelo tipo de produto fabricado. No ano de 1950 observa-se um grande movimento mi- gratório no país, e a diversidade de origens vão cada vez mais se misturando sobre o território. Este aglomerado de pessoas tentava a sua estabi- lidade, no campo, segundo Milton Santos, no ano de 1997 foram registrados pela Comissão Pastoral da Terra 622 conflitos pela terra brasileira, em uma quantia aproximadamente de 16 milhões de hectares produti- vos não utilizados pelo Brasil. Os processos de valorização da terra por consoli- dação das frentes pioneiras tiveram, certamente, um papel detonador em vários movimentos migratórios do país. 9. Neoliberalismo e uso do território. As mudanças importantes para a utilização do terri- tório começam a partir da prática do neoliberalismo, tornando o uso do território mais seletivo, assim pu- nindo as populações mais pobres, isoladas, mais dis- persas e mais distantes de grandes centros produtivos. O monopólio criado pelo neoliberalismo afastan- do as populações mais carentes, assim aumentando o êxodo rural, aumentando a concentração de pesso- as nos grandes centros, atrás de empregos, desleal- mente a concorrência é grande e cada vez a diminui- ção no salário dos trabalhadores. Só conferir o au- mento de incidência de trabalho escravo. Dentro da divisão geográfica o neoliberalismo conduz a uma seletividade dos provedores de bens e serviços, que geram a acumulação e a competitividade assim causando uma maior dificuldade para as pessoas mais pobres e isoladas, mostrando que os grandes centros também criam gente pobre, pois há um grande número de mão de obra que precisa de trabalho. As grandes metrópoles seguem o padrão da globalização onde novas fontes de riqueza e novas razões de pobreza se estabelecem nas grandes cida- des. A globalização amplia a variedade econômica, cultural, religiosa e lingüística multiplicando os mo- delos produtivos de circulação e de consumo. 10. A racionalidade do espaço: da solidariedade orgânica à solidariedade organizacional. A racionalidade dentro do espaço pode-se carac- terizar pelos aspectos cujas condições materiais e políticas permitem um uso considerado produtivo pelos atores econômicos, sociais, culturais e políticos dota- dos de racionalidade. Só pode haver racionalidade de espaço quando o território oferece as condições ne- cessárias. No auge da globalização, em nossos atuais dias, podemos afirmar que racionalidade de espaço está a
  • 16. 16 Nº 18 MAIO/2006 serviço das grandes empresas privadas, fazendo com que estas empresas constituam em território as ade- quações técnicas e políticas necessárias para que usu- fruam uma maior produtividade e uma maior lucratividade. O neoliberalismo faz com que a racionalidade pri- vada tenha benefícios sobre os recursos públicos, le- vando com que os setores sociais sejam prejudicados para manter o setor privado. A solidariedade orgânica parte do ponto em que suas atividades exercidas em território usado, fruto do superação. Esta cultura da crise se relaciona como o poder na medida em que questiona a ideologia do poder e re-funda os fundamentos teóricos críticos da própria geografia no sentido de explicar e transfor- mar o real. Num segundo momento, passar da crise da totali- dade aos espaços da geografia. Nem o progresso nem as riquezas naturais são infinitos. Portanto o sonho do consumo infinito acabou. Que fazer? Há condições materiais para realizar objetivos que a própria humani- dade se põe em seus vários espaços: da prática, da técnica, da pesquisa, da ciência, do trabalho intelectu- al, das opções possíveis e os espaços da geografia. O espaço da prática é o mais imediato, empírico e coti- diano. O espaço das soluções práticas do dia a dia. Já o espaço da técnica faz a codificação e formalização do empírico. É saber elaborado. O espaço da pesqui- sa implica razão e técnica, imaginação ordenada e fa- zer metódico. É investigação analítica (hipótese, ob- servação, análise de dados e generalização). Implica operações mentais mais complexas do que o homem prático e homem técnico. O espaço da ciência ultra- passa a relação racionalismo-empirismo. É a elabora- ção rigorosa de conexão interna de seus saberes, es- paços da prática, técnica e pesquisa. O espaço do tra- balho intelectual se depara com a contradição da divi- são social do trabalho (intelectuais e técnicos versus trabalhadores manuais) e diante desta fragmentação social põe-se como opção entre dicotomia social e unidade. O espaço das opções possíveis deve definir os objetivos a serem alcançados e descobrir as condi- ções reais de sua efetivação. Assim, os espaços da ge- ografia se põem como espaços plurais. O espaço da geografia, espaço: a) da ciência e ideologia que se re- laciona com a interdisciplinaridade; b) de seu próprio espaço interno; c) referido ao segmento do real; d) do subespaço do real que remete à subtotalidade em seu conjunto; e) do discurso que extrapola a subtotalidade, como consciência do real no todo e na parte. próprio dinamismo, tenham uma evolução e recons- trução locais relativamente autônomas e apontando para um destino comum. A solidariedade organizacional supõe uma interdependência até certo ponto mecânica, produto de normas presididas por interesses de modo geral mercantis, mutáveis em função de fatores do merca- do. Dentro deste contexto verificamos que a solidari- edade organizacional é paralela à produção de uma racionalidade que não interessa à maior parte das empresas nem da população. SANTOS, Milton (org). Novos rumos da geografia brasileira. São Paulo: Hucitec, 1982. Claudemir Lopes Bozzi Filósofo, especialista em Filosofia Política e Jurídica – UEL Num primeiro momento apontaremos as princi- pais contribuições brasileiras à teoria da geografia; em seguida, veremos a geografia e o espaço brasileiro. I – Contribuições brasileiras à teoria da geografia. Contribuição à crítica da crise da geografia, de Armando Corrêa da Silva. A crise da geografia se con- figura como a crise da cultura que gerou a expansão do capitalismo. Da idéia de espaço totalmente livre, planeta terra, passou-se para a noção de solo frag- mentado. Compreender o espaço global é consciên- cia de suas partes (unidades), como um todo de rela- ção. É tensão dialética entre o todo e a parte. Assim, a geografia atual é uma cultura em crise e na consci- ência, cultura da crise. Como a cultura contemporâ- nea é a composição de um mosaico, também a geo- grafia atual é um mosaico (indivíduo e grupo social). A crise da geografia é parte da cultura da crise. Sur- gem, então, vários obstáculos: a) a crise da geogra- fia, a ideologia do fim das ideologias; b) crise dos geógrafos, renovação e multiplicidade de ideologias; c) crise da universidade como lugar de produção da geografia, abalo dos fundamentos empíricos das ide- ologias; d) a crise do ensino, síntese e fim das ideolo- gias. Portanto, é a crise efetivada como crise de con- sumo e consumo de crise. O que fazer? No dia se- guinte inquirir a liberdade da consciência da necessi- dade. A liberdade da consciência e consciência da li- berdade. Consciência da necessidade individual e so- cial. Consciência da sobre determinação. Vem o pro- jeto! Efetivar a continuidade, mas com a técnica e a metodologia analítica a serviço da coletividade do tra- balho. Assim, a objetividade do real é posta sob o teleológico: serviço da humanidade. A metodologia analítica se instrumentaliza como libertação: põe a cultura da crise e se torna ciência da cultura em crise. Pela contradição já possuem em si o germe de sua
  • 17. 17 Nº 18 MAIO/2006 Algumas considerações do espaço geográfico, de Roberto Lobato Corrêa. Que é espaço? Para o geógrafo é a superfície da terra vista enquanto mora- da, do homem e de sua história. Trata-se de pensar o espaço-morada do homem. Qual a natureza do espa- ço geográfico? Como o geógrafo pensa este espaço e qual o conceito de processo espacial? O conceito de espaço (Harvey) tem variado historicamente: espaço absoluto, espaço relativo e espaço relacional. No con- ceito de espaço absoluto: o espaço é uma coisa em si mesma e associado às idéias de áreas ou região e de unicidade, associado à geografia regional (Hartshorne). Já o espaço relativo: entendido a partir de “relacio- namentos entre objetos, só existe porque os objetos existem e se relacionam mutuamente. Assim, o movi- mento de pessoas, bens, serviços e informações veri- ficam-se em um espaço relativo porque custa dinhei- ro, tempo, energia para se vencer a fricção da distân- cia” (Harvey). Pode cair no perigo de geografia como conexão, direção e distância sem referência com o so- cial ou a serviço do “custo-benefício” do capitalismo. Por fim, o espaço relacional: como existindo nos ob- jetos – “no sentido de que um objeto somente pode existir na medida em que ele contenha e represente dentro de si relações com outros objetos” (Harvey). Mas porque três conceitos de espaço? Porque: a) espaço como valor de uso, no qual o homem valoriza a fertili- dade e amenidades físicas; b) no mercado capitalista o espaço possui valor de troca – espaço como extração de renda (espaço é mercadoria), monopólio de classe; c) espaço como conteúdo relacional do qual extrai ren- da de monopólio. Portanto, trata-se de estudar o espa- ço-morada a partir da formação social de uma deter- minada sociedade. O espaço-morada do homem é de natureza social. Neste sentido, destaca Corrêa, a ação humana tem papel fundamental na organização do espaço. Pensa-se nos atores que monopolizam os meios de produção e o Estado. De um lado, a acumulação do capital e, de outro, a reprodução da força-de-traba- lho. Os processos espaciais são efetivados para res- ponder, numa sociedade de mercado, estas duas for- ças antagônicas. Por elas ocorrem a concentração e dispersão da ação humana-tempo-espaço-mudança. Assim, o espaço reflete valores socialmente enraizados na comunidade. Portanto, trata-se de pensar o espa- ço-morada do homem em suas conexões com tempo e espaço, pois são experiências humanas. Repensando a geografia, de Ruy Moreira. O pro- cesso de socialização na natureza pelo trabalho soci- al, i. é, a transformação da história natural em histó- ria dos homens implica uma estrutura de relações sob determinação do social. É esta estrutura complexa e em perpétuo movimento dialético que conhecemos sob a designação de espaço geográfico. História dos homens e história da natureza são inseparáveis. Há múltiplas determinações na relação dialética entre o homem e a natureza na qual, pela ação do trabalho humano sobre a forma-natureza, gera a forma-socie- dade. Portanto, o modo de socialização da natureza faz o homem, pelo trabalho, e a ação da natureza so- bre o homem o faz sujeito natural. Segundo Moreira, “é a estrutura econômica da formação econômico- social que determina a organização espacial, mas é a conjuntura política que comanda seus movimen- tos (processos e formas)”. Pensemos, por exemplo, nas classes sociais e seus lugares geográficos: o ca- ráter de classe determina o caráter do lugar, seu ar- ranjo espacial: a estética da moradia, a natureza dos serviços, a “política pública” de infra-estrutura espa- cial, a geometria. O espaço geográfico, portanto é condição da reprodução econômico-social da socie- dade. A organização do espaço, enquanto reprodu- ção da produção capitalista, desempenha papel de mediação de espaço enquanto arranjo: econômico como uma formação de múltiplos espaços desiguais (espaços industriais; instrumentos de trabalho; meios de consumo individuais e coletivos;), jurídico-político (aparelhos ideológicos e repressivos do Estado), ide- ológico (aparelhos ideológicos de prescrição da ideo- logia dominante: escola, igreja, quartel, tribunais). Necessário desenvolver um método específico para a geografia: a partir do arranjo social, apreender a dialética social da formação econômico-social. Assim, a teoria crítica do espaço deve possui três facetas: a formação econômico-social, o modo de produção e a formação sócio-espacial. Por fim, sobre a análise geográfica deve-se argüir a direção das determinações e descobrir a essência da aparência. Portanto, o ca- minho seguro do método é, segundo Moreira, o da imersão no arranjo espacial no jogo das suas deter- minações múltiplas, sobretudo as determinações de classe. Conhecer para transformar! Repensando a teoria das localidades centrais, de Roberto Lobato Corrêa. Repensar a teoria da loca- lidade criticando-a e recuperá-la em um nível mais elevado. Primeiro: a rede hierarquizada de localida- des centrais constitui-se em uma forma de organiza- ção do espaço vinculado ao capitalismo, sendo de natureza histórica. Segundo: a rede de localidades centrais cumpre simultaneamente dois papéis que são complementares: de um lado, constitui-se em um meio para o processo de acumulação capitalista, e de ou- tro, constitui-se em um meio para a reprodução das classes sociais. Isto significa que a rede de localida- des centrais constitui-se em um meio através do qual a reprodução do modo de produção capitalista se ve- rifica. Terceiro: as redes de localidades centrais apre- sentam-se caracterizadas por arranjos estruturais e espaciais diversos, isto porque o capitalismo se verifi- ca de modo desigual. Quarto: a rede de localidades centrais constitui-se em uma estrutura territorial cuja análise possibilita a compreensão do sistema urbano de países não industrializados ou onde a industrializa- ção se verifica espacialmente concentrada. Quinto: possibilidade da conexão entre rede de localidades centrais e capitalismo monopolítico. A emergência de outro arranjo estrutural e espacial da distribuição de bens e serviços caracterizados pela especialização dos
  • 18. 18 Nº 18 MAIO/2006 centros de mercado, tanto no nível intra-urbano como regional, onde tais centros oferecem uma gama de bens e serviços altamente associados entre si em ter- mos de complementaridade. Por fim, trata-se de ana- lisar a questão da teoria das localidades centrais e de repensar em uma outra teoria geográfica que esteja fundada nas relações entre sociedades historicamen- te determinadas e o espaço. Espaço e tempo: compreensão materialista e dialética, de Ariovaldo Umbelino de Oliveira. Espaço e tempo configuram-se no embate entre o materialis- mo dialético e o idealismo. Para este, espaço e tempo são figuras de representação idealista da subjetivida- de (Kant). Para o materialismo espaço e tempo são formas essenciais da existência da matéria movente (Fataliev). Afirma-se também, para o materialismo, a extensão como essência do espaço. Este espaço tam- bém configura a ordem das coisas (ou desordem), como também os princípios e as leis dos fenômenos, mas também graças ao tempo, é nele que se configu- ra a luta dos contrários e a possibilidade objetiva de mudar o curso dos fenômenos sociais, históricos e econômicos – no tempo e no espaço. Assim, o tempo pode ser “lei” de mutação dos fenômenos. Para a con- cepção materialista dialética de espaço e tempo como formas peculiares de existência da matéria em movi- mento. Espaço: forma de ser da matéria, visto que toda matéria ocupa um espaço. Portanto há uma uni- dade indissolúvel par a matéria: movimento, espaço e tempo. Convém frisar, segundo Ariovaldo, que a uni- dade, a diversidade e a interdependência do espaço e tempo consistem, pois em uma das noções funda- mentais que fazem parte da concepção materialista- dialético do espaço e tempo. Por fim, convém ressal- tar que espaço e tempo possuem uma unidade na diversidade. Tempo e espaço são duas formas intercondicionadas de ser da matéria. Espaço é movi- mento e transformação da matéria. Portanto, confor- me Ariovaldo, “Tempo e espaço se acham, pois, indissoluvelmente unidos ao movimento da maté- ria, ao movimento concebido no sentido materialis- ta dialético, não como estados particulares de coi- sas ou fenômenos particulares, mas como forma universal de ser da matéria; acha-se igualmente unido ao movimento concebido como transformação, como desenvolvimento que inclui o nascimento do novo”. A geografia como valorização do espaço, de Antonio Carlos Robert Moraes e Wanderley Messias da Costa. Afirmam a tese de se passar de uma teoria crítica, como superação do paradigma positivista e funcionalista, para uma teoria marxista da e na geo- grafia. Aqui é fundamental o método do materialismo histórico dialético aplicado ao objeto da geografia. Como método de interpretar o real. Trata-se de ado- tar o materialismo histórico e dialético enquanto um método revolucionário que funde ciência e história, do qual emergem categorias como modo de produ- ção, formação econômico-social, relações de produ- ção etc., e conceitos como capital, trabalho assalari- ado, valor-de-uso, riqueza natural, etc., à luz deste arsenal metodológico analisar a categoria território e valor, concentração territorial do capital, entre outros. Portanto, trata-se de destacar a valorização do territó- rio (urbano e rural, questão agrária) como objeto da geografia marxista. Alguns problemas atuais da contribuição mar- xista, de Milton Santos. Santos cita algumas atitudes para desenvolver uma geografia marxista. Primeira: a necessidade do trabalho teórico-empírico (recolher o real); segunda: a teorização como incorporação reno- vadora (sem ter medo de conhecer, de forma crítica, outras teorias); terceira atitude: contra o dogmatismo (autocrítica); quarta: agir contra o congelamento dos conceitos (o real é dinâmico, tudo flui). Por fim, a no- ção do real deve abarcar a totalidade, ou real-total como categoria essencial do fazer do geógrafo. E, por outro lado, há necessidade de renovação do discurso cientí- fico. Visto que o real está penetrado pela história e pelo tempo corrente e concreto. II – Estudando a geografia e o espaço brasileiro. Estrutura agrária e dominação do campo – no- tas para um debate, de Carlos Walter Porto Gonçal- ves. Em síntese pode-se dizer que: “1) o desenvolvi- mento do capitalismo é desigual e combinado e, des- de a sua gênese, se apóia numa divisão do trabalho em escala mundial; 2) por isso, o desenvolvimento de- sigual e combinado, cada Estado nacional acaba por se constituir numa articulação contraditória, particu- lar, de classes que, no entanto, significa um elemento da configuração imperialista mundial; 3) a “questão agrária” não pode se compreendida em si mesma, posto que o significado próprio às diversas formas de organi- zação deste ramo da produção social é dado pelas injunções da produção e reprodução ampliada do ca- pital; 4) nos países de desenvolvimento capitalista re- tardatário a questão agrária assume um caráter parti- cular, dada a articulação do grande capital com a pro- priedade fundiária; 5) no Brasil essa articulação come- ça por se delinear na segunda metade do século XIX, é redefinida nos anos 30 e cristalizada no golpe militar de 1964; 6) ao “fundir quimicamente” o grande capital com o grande proprietário de terras, o desenvolvimen- to retardatário do capitalismo cumpriu uma das tare- fas da revolução burguesa, i. é, a constituição da uni- dade nacional; 7) ao fazer isto, unificou a luta de clas- ses em todo o território nacional – a luta indígena, dos posseiros, do bóia-fria com a luta dos operários do ABC; 8) que o Estado – órgão centralizador do grande capi- tal e da grande propriedade fundiária não pode, en- quanto tiver esta composição de classe, realizar a re- forma agrária; 9) resta a dúvida: até que ponto um es- tado de compromisso que busque incorporar parte das aspirações das classes dominadas seria capaz de reali- zar tal tarefa, considerando-se o atual estágio da eco- nomia mundial?”, diz. Crise econômico-social no Brasil e o limite do espaço, de Manoel Fernando Gonçalves Seabra. Tra-
  • 19. 19 Nº 18 MAIO/2006 ta-se, sinteticamente, que a crise tenha componentes político-ideológicos, possui fundamento econômico, i.é, crise de acumulação capitalista. O Brasil está in- serido como capitalismo periférico e dependente (tecnológica e financeira) do imperialismo (america- no), conforme a década de 50 e o golpe militar de 1964 o demonstram. Com a homogeneização deste modelo de capital irradiado pelo Brasil possibilita fissuras para sua crise e a possibilidade do novo. O pensamento geográfico e a realidade brasilei- ra, de Manuel Correia de Andrade. Segundo Andrade, é hora de descolonizar a teoria da geografia de seu peso histórico: francês, americano, entre outros. Sua proposta é a construção de uma teoria da geografia genuinamente brasileira, sem desprezar, é claro, a con- tribuição externa. Cita alguns autores brasileiros que falam de alguma forma de geografia e de sua cosmovisão: os cronistas viajantes e aventureiros, e os estudos de: Capristano de Abreu, Euclides da Cunha, Joaquim Nabuco, Caio Prado Jr., Raimundo Faoro, Sérgio Buarque de Holanda, Gilberto Freyre, Djacir Menezes, Florestan Fernandes, Darcy Ribeiro, Antonio Candido, Amélia Cohn, Nelson Werneck Sodré, Josué de Castro, Milton Santos, Manoel Seabra, Lea Goldstein, Armando Corrêa da Silva, entre outros. Portanto, criar uma identidade teórica de nossa diversidade. Notas sobre a geografia urbana brasileira, de Armen Mamigonian. Seu destaque para duas linhas de pesquisa para os estudos urbanos: 1) o processo de industrialização continua despertando interesse entre economistas, historiadores e sociólogos com poucas contribuições dos geógrafos. Apesar disso, destacam- se os temas: bloqueios dos ramos industriais desen- volvidos em São Paulo; a desnacionalização de inúme- ros ramos industriais; a industrialização das metrópo- les regionais num processo de substituição de impor- tações (mercado regional), mas sob o controle exter- no. 2) As relações das cidades com sua interlância agrá- ria; crises de abastecimento de mercado interno (do leite, por ex.); cidades e renda fundiárias; estudos so- bre a classificação territorial : que é o rural e o urbano. Novos rumos da geografia brasileira, de Milton Santos. A geografia (fundação, estatuto teórico e pro- dução) está situada às grandes crises da própria hu- manidade (veja a 2ª Grande Guerra Mundial e o fenô- meno das migrações). Herdeira do embate entre empirismo (positivismo) e idealismo, triunfou, no sé- culo XIX, a geografia como ciência positiva. Pós 2ª Guerra, com a bipolaridade mundial, recebe o peso da ideologia americana (imperialista) – instrumento hegemônico do capital. Entretanto, com nova crise do quantitativismo surge a possibilidade de repensar o homem e seu espaço e, com isso, de renovação da geografia. É o contexto geopolítico da ditadura mili- tar no Brasil e da resistência de parte dos intelectuais (caso exemplar foi a publicação da Associação dos Geógrafos Brasileira), movimentos sociais, OAB, ABI, entre outros. Outro problema é o boicote e censura da imprensa em relação às publicações que questio- nam o poder estabelecido. Há também o obstáculo do monopólio das fontes, veja o caso do IBGE, que se fecha perante os geógrafos críticos. Impera a fonte e divulgação de cópias dóceis dos estrangeirismos. Entretanto, é imperioso, segundo Milton Santos, a construção de uma geografia brasileira descolo- nizada: elaboração de trabalhos autônomos, auto- gerados e auto-sustentados. Trata-se de aprender nos- so lugar no mundo e nossa localização específica neste mundo. Para tanto, se faz premente romper com a tradição empirista e desenvolver uma fundamentação e práxis comprometida com a teoria da geografia que reflita nosso mundo real, com a formação do geógrafo, com o compromisso intelectual e político no sentido de reconstrução nacional, salienta Milton Santos. SIMIELLI, Maria Elena R. Cartografia no ensino fundamental e médio. In: CARLOS, Ana Fani A. (Org.). A geografia na sala de aula. São Paulo: Contexto, 1999. p. 92-108. Resenha elaborada pelo Professor Auro Moreno Romero Mestre em geografia pela USP Uma das grandes preocupações da autora neste texto consiste em como realizar a transposição das informações da cartografia, enquanto disciplina uni- versitária, para o ensino de geografia no ensino fun- damental e médio. É fundamental desenvolver méto- dos que permitam essa transposição sem que se desconfigure, desvalorize ou empobreça o ensino uni- versitário da cartografia. O saber universitário se apresenta sob forma de peças de um quebra-cabeça sem uma imagem coe- rente na qual ele é multiplicado, separado, deixando ao observador a possibilidade de construir várias ima- gens. É a partir desse saber universitário que um sa- ber ensinado deve ser elaborado, reconstruído, reor- ganizado. É necessário destacar que os saberes de- senvolvidos nos ensino fundamental e médio não se constituem em um resumo do saber universitário. Assim, mais do que uma transposição didática, trata-se de reconstruir o saber geográfico sobre ba- ses parcialmente diferentes já que os objetivos e os meios da prática de geografia não são os mesmos na universidade e no ensino fundamental e médio.
  • 20. 20 Nº 18 MAIO/2006 A RECONSTRUÇÃO DEVE SER FEITA EM VÁRIOS NÍVEIS 1. Reconstrução no nível dos programas oficiais Apenas uma parte da temática universitária deve ser implementada para determinar os conteúdos do ensino fundamental e médio, levando-se em conta os objetivos da formação geral do educando. No que diz respeito ao método de ensino é muito mais interes- sante, no ensino fundamental e médio, partir do mé- todo indutivo – do particular para o geral – do concre- to para o abstrato. Os modos de raciocínio, os instru- mentos metodológicos, os temas de pesquisa, mui- tas vezes devem ser colocados de lado. 2. Reconstrução no nível do professor Diferentes professores elaboram cursos e lições muito diversas. Cada professor reconstrói a geografia à sua maneira. O professor retém apenas uma parte do programa oficial seja devido: ao tempo, aos seus objetivos, à sua capacidade de interpretação pessoal, suas necessidades ou ainda, em função dos interes- ses dos seus alunos. 3. Reconstrução no nível da lição À medida que as lições prosseguem e os alunos adquirem novas competências, o conteúdo dos cur- sos e métodos de ensino previstos são modificados e reconstruídos. 4. Reconstrução no nível do aluno O aluno, por sua vez, constrói ele mesmo seu sa- ber, retendo apenas uma parte dos conteúdos, inte- grando-a à sua maneira nos esquemas de pensamento e ação. Do ensino fundamental para o médio os conteú- dos e métodos se modificam e o problema principal a ser administrado pelo professor é evitar o desvirtua- mento total do projeto geográfico ou ainda, que sur- jam contradições entre o saber ensinado e o saber universitário. A cada lição o professor deve realizar uma triagem e classificar os fatos propostos pelo sa- ber universitário propondo uma adaptação coerente para os objetivos e capacidades dos alunos do ensino fundamental e médio, com o objetivo de evitar gran- des desvios. A CARTOGRAFIA NO ENSINO DA GEOGRAFIA Os mapas nos permitem ter domínio espacial e realizar sínteses dos fenômenos que ocorrem num determinado espaço. Os mapas nos auxiliam no dia- a-dia ou ainda pode-se ter diferentes produtos repre- sentando deferentes informações para diferentes fi- nalidades: mapas de turismo, de planejamento, ro- doviários, minerais, geológicos, entre outros. É importante destacar que cada aluno tem um potencial diferente para leitura e interpretação de mapas. Sendo assim, alunos de 1a à 6a séries, traba- lhariam basicamente com alfabetização cartográfica, da 6a à 8a séries os alunos já possuirão condições de estar trabalhando com análise, localização e com a correlação. Já no ensino médio juntamente com a análise, localização, correlação, também se insere a síntese. Assim, a cartografia, além de constituir um recur- so visual, oferece aos professores a possibilidade de se trabalhar em três níveis: 1) Localização e análise – cartas de análise, distribui- ção ou repartição, que analisam o fenômeno iso- ladamente. 2) Correlação – permite a combinação de duas ou mais cartas de análise. 3) Síntese – mostra as relações entre várias cartas de análise, apresentando-se em uma carta síntese. Dentro dessa proposta de localização, análise, cor- relação e síntese - aplicadas para a alfabetização cartográfica - devemos oferecer às crianças de 1a à 4a séries subsídios que favoreçam a compreensão dos elementos presentes nas representações gráficas, so- bretudo os mapas. Em outras palavras, a idéia é edu- car o aluno para uma visão cartográfica. Para que possamos educar nossos alunos para a cartografia é necessário, em primeiro lugar, aprovei- tar-se do interesse natural das crianças pelas imagens utilizando-se de inúmeros recursos visuais tais como: desenhos, figuras, tabelas, jogos e representações feitas por crianças. A cartografia, para as séries iniciais, deve iniciar seu trabalho com o estudo do espaço concreto dos alunos, o mais próximo deles, ou seja, o espaço da sala de aula, o espaço da escola, espaço do bairro para somente, nos dois últimos anos, se falar em es- paços maiores. O que importa é desenvolver a capacidade de lei- tura e para que a alfabetização alcance bons resulta- dos se faz necessário o de desenvolvimento de no- ções de: • Visão oblíqua e visão vertical; • Imagem tridimensional, imagem bidimensional; • Alfabeto cartográfico: ponto, linha e área; • Construção da noção de legenda; • Proporção e escala; • Lateralidade/referências, orientação Quanto à cartografia para 5a e 8a séries pode ser trabalhada a partir de dois eixos: No primeiro eixo, trabalha-se com o produto cartográfico já elaborado, tendo um aluno leitor críti- co no final do processo. No segundo eixo, o aluno é participante do pro- cesso ou participante efetivo, resultando deste segundo eixo um aluno mapeador consciente. Esses dois eixos têm como objetivo básico eliminar a situação do alu- no copiador de mapas. A cartografia-cópia e a carto- grafia-desenho são atividades que não devem ser con- sideradas como possibilidades efetivas de trabalho em sala de aula.