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Educação moral: PCNs e o ensino de ética na Educação de Jovens e Adultos – EJA
Amâncio L. Correa Pimentel
M. Dulcinea da S. Loureiro.
Universidade Regional do Cariri - URCA
Brasil
Ensino de Filosofia
Trabalho Completo
pimentelalc@gmail.com
mdslou@uol.com.br
RESUMO
A questão: é possível uma educação moral? Encontra diferentes respostas na educação brasileira com
a implementação de políticas educacionais materializadas em disciplinas como “Educação Moral e
Cívica”, “Orgnização Social e Política Brasileira – OSPB” e, em 1997 com a implementação dos
Parâmetros Curriculares Nacionais - PCNs com o Tema Transversal Ética. Uma reflexão sobre uma
formação ética deve pressupor e explicitar o que a norteia e, uma análise que busque compreender
uma proposta que faz parte de uma política pública de formação ética deve levar em conta esses
pressupostos implícitos ou explícitos que se encontram subjacentes a estas formulações.
O presente texto é fruto de uma pesquisa que é tecida à partir de: (i) aprofundamento teórico com a
análise do Tema transversal Ética, Paulo Freire e Martin Bubber; (ii) trabalho de campo que constou
de observações realizadas nos espaços de socialização de uma escola de Juazeiro do Norte - Ce em
duas salas de aula de Educação de Jovens e Adultos – EJA e (iii) entrevistas realizadas com as
professoras.
O trabalho de campo buscou apreender: a compreensão dos professores acerca dos PCNs mais
especificamente do tema transversal Ética; como os professores conceituam e vivenciam o diálogo na
sua prática docente; a questão da afetividade e da autonomia como elementos para a constituição da
identidade e da moralidade dos jovens.
A análise da proposta dos PCNs revelou a ausência de uma reflexão sobre a construção da identidade,
do achado do eu no outro, do achado do outro em sua alteridade, que seria o sentido da ética. Outra
percepção que tivemos é a de que assuntos de grande importância e que estão no âmbito da ética como
autonomia, expressividade, criatividade e diálogo são pouco ou quase nada trabalhados no documento.
Qualquer trabalho que tenha por objetivo uma formação humana, no mais amplo sentido do termo
pressupõe o diálogo, não como algo que se agrega para fins técnicos ou como monólogo, mas como
reconhecimento do outro em sua alteridade e de si no outro.
Palavras-chave – Ética, PCNs, diálogo, Educação de Jovens e Adultos.
CONSIDERAÇÕES INICIAIS
A existência humana não pode ser pensada sem uma referência ética e moral, nem podemos
reduzir a ética a um conjunto de deveres ou a um código de regras de caráter normativo e prescritivo.
O conceito de ética e moral implica um olhar para a ação, a questão “como devo agir perante os
outros?” encontra sentido a partir da alteridade, ou seja, o outro é o pólo que ao mesmo tempo me
singulariza, fortalecendo minha identidade e me universaliza enquanto humanidade, neste sentido, a
ética coloca em questão o respeito e a solidariedade. Perguntar sobre qual deve ser, ou em que deve se
pautar minha ação, trás a reflexão sobre o que é bom, mal, desejado, desejável, razoável, justo,
injusto...
A preocupação com a educação moral das novas gerações é persistente nas sociedades, essa
formação pode ocorrer diluída no conjunto de práticas e/ou instituições que sustentam cada estrutura
social nos diferentes momentos históricos, podendo também ocorrer de forma institucionalizada,
regulamentada nas políticas educacionais e nos currículos oficiais.
A questão: é possível uma educação moral? Encontra diferentes respostas na educação
brasileira com a implementação de políticas educacionais materializadas em disciplinas como
“Educação Moral e Cívica”, “Organização Social e Política Brasileira – OSPB” já a partir da década
de 30 do século XX e, em 1997 com a implementação dos Parâmetros Curriculares Nacionais - PCNs
com o Tema Transversal Ética. Portanto, uma reflexão sobre uma formação ética deve pressupor e
explicitar o que a norteia e, uma análise que busque compreender uma proposta que faz parte de uma
política pública de formação ética deve levar em conta esses pressupostos implícitos ou explícitos que
se encontram subjacentes a estas formulações.
O presente texto é fruto de uma pesquisa que é tecida à partir de: (i) aprofundamento teórico
com a leitura de Paulo Freire e Martin Bubber, análise do Tema transversal Ética; (ii) trabalho de
campo em uma escola do Município do Juazeiro do Norte – Ce, que constou de observações realizadas
nos espaços de socialização da escola e em duas salas de aula de Educação de Jovens e Adultos - EJA
e (iii) entrevistas realizadas com as professoras das salas de EJA em que ocorreram as observações.
Para a análise resolvemos dar nomes fictícios as professoras, que foram denominadas de Milena e
Helena.
A pesquisa objetivou compreender como os professores do EJA apreendem Ética e Moral e até
que ponto essas concepções norteiam sua ação pedagógica. Bem como, apreender em que medida o
trabalho a partir de eixos temáticos que perpassem transversalmente o currículo foi assimilada e
materializada em práticas docentes e, identificar nas relações estabelecidas entre professores e alunos
como o diálogo é vivenciado.
1- O TEMA TRANSVERSAL ÉTICA
Os PCNs elaborados em 1997 trazem os temas transversais como inovação curricular
articulando os conhecimentos disciplinares com a discussão de temáticas sociais. Tendo por eixo Ética
e Cidadania busca-se problematizar questões e interesses antes não contemplados no currículo a partir
dos princípios da dignidade humana, da igualdade de direitos, da participação e co-responsabilidade
pela vida social, princípios estes, respaldados pela Constituição Federal de 1988 e pela Lei de
Diretrizes e Bases da Educação Nacional de 1996.
As temáticas escolhidas (ética, saúde, pluralidade cultural e orientação sexual) para serem
trabalhadas transversalmente têm por pressuposto que a educação deve formar as novas gerações
dentro dos princípios democráticos que devem reger a vida social e política. Assim, os temas
transversais abarcam um conjunto de saberes diretamente relacionados com o exercício da cidadania e
atravessa diferentes áreas do conhecimento. O currículo escolar, nesse sentido, ganha em flexibilidade
com a implementação da reflexão acerca destas temáticas.
A formulação dos temas transversais a primeira vista, se apresenta como uma alternativa ao
modelo de estruturação curricular organizado em disciplinas escolares, os “temas transversais”
permitiriam, portanto, mais flexibilização e possibilidade de diálogo entre os diferentes saberes, já
que, ao não ter mais a rigidez das disciplinas, perpassariam todos os conhecimentos não se fixando em
nenhum espaço específico dentro da estrutura escolar, podendo ser trabalhado em qualquer disciplina,
por qualquer professor e até por mais de um professor, caso seja necessário e/ou haja disposição dos
docentes. Nesse sentido os temas transversais seriam por excelência o espaço da interdisciplinaridade
e da transdisciplinaridade, melhor dizendo, o espaço em que os conhecimentos se entrelaçariam.
No entanto, essa mesma “flexibilidade” e “autonomia” também gera uma série de problemas,
senão vejamos, como não há uma disciplina que seja responsável especificamente por trabalhar esses
conteúdos acaba por gerar um não-lugar específico, pode estar em toda parte acaba não estando em
lugar nenhum.
Moreno (In: BUSQUETS, 1997) propõe uma forma de conceber a transversalidade como uma
nova concepção de ensino e de conhecimento. Nesta concepção os conteúdos escolares tradicionais
não como fins em si mesmos, mas como meio para se atingir a fins, na busca da construção da
cidadania e de uma sociedade mais justa.
Waskman pensa em uma proposta que tem como tese o ensino da filosofia como contribuição
para a formação ética “à medida que intervém no processo de construção pessoal do estudante” (2002,
p. 25). O alfa e ômega da ética, ou seja, o princípio e o fim dela é o humano, “o sentido da ética, se
pode entender, então, como tarefa de cuidado de si que se constitui o conhecimento e a construção da
própria identidade” (Ibdem, p. 29), Martin Buber vai nos dizer que “o EU se realiza na relação com o
TU” (2001, p. 12) e, portanto sendo “toda vida atual encontro” (Idem), em seu modo de ver, relação só
pode ser reciprocidade onde “meu TU atua sobre mim assim como eu atuo sobre ele.” (Ibdem, p. 18).
Mediante isso acreditamos que uma reflexão sobre ética deva nos remeter às relações humanas como
sendo fundamentais à construção de si, como dissemos acima, contudo, ao estudarmos o Tema
Transversal Ética dos PCN’S para a partir daí verificarmos até que ponto há uma proposta de reflexão
sobre ética, o que se viu é que tal documento traz mais um apanhado de regras morais a serem
ensinadas do que uma reflexão filosófica sobre ética.
Questionamos às professoras acerca de seus conhecimentos sobre os PCN’S, sobretudo do
Tema Transversal Ética e, ambas responderam que conhecem os PCN’S e que fazem uso dos mesmos,
mas especificamente sobre o Tema Ética, a profª Milena disse que embora saiba que existe admitiu
nunca o ter lido e a profª Helena disse que já o estudou, mas não se lembrava do seu conteúdo. O que
se pôde perceber é que não há uma base teórica que oriente as professoras no trabalho de questões
morais e éticas em sala, o que, a priori, não as desqualifica para tal já que tais questões são tratadas no
dia-a-dia desde a família.
Os Temas Transversais podendo ser trabalhados por todos os professores e transversalmente a
qualquer disciplina acaba por ser destituído de um lugar específico o que faz com que eles fiquem sem
lugar e acabam por não serem trabalhados. Entretanto, isso, a nosso ver não se constitui em um
problema, já que acreditamos não haver necessidade de uma disciplina específica acerca do tema.
Acreditamos, como diria Paulo Freire, que “estar longe, ou pior, fora da ética, entre nós, mulheres e
homens é uma transgressão. É por isso que transformar a experiência educativa em puro treinamento
técnico é amesquinhar o que há de fundamentalmente humano no exercício educativo: o seu caráter
formador”. (1996, p.33)
Ou seja, o exercício da educação já deve ser em si um ato ético e, portanto, formador do
humano. Vale ressaltar, porém que o fato de acreditarmos não ser indispensável uma disciplina
específica de ética e moral não estamos dizendo que tais questões não devam ser trabalhadas, pelo
contrário, acreditamos ser de grande importância que tais reflexões sejam feitas, já que são parte
constitutiva da existência humana.
2. AÇÃO DOCENTE E A QUESTÃO DA ÉTICA.
Mesmo que as professoras entrevistadas não tivessem familiaridade com Tema Transversal de
Ética quando perguntadas se achavam importante serem trabalhadas questões éticas e morais em sala
ambas admitiram que consideram de extrema importância.
A profª Helena fala sobre “mostrar para poder cobrar”, deixando claro sua compreensão de
ética enquanto um conjunto de comportamentos exemplares a serem imitados, como por exemplo, não
poder falar no celular em sala, formas de se vestir e diz que embora tenha “o direito a viver” no seu
“particular”, ou seja, fora da escola, ela “deve uma satisfação à sociedade”, pois, “a sociedade cobra
de você”. Paulo Freire alerta em Pedagogia da Autonomia que, mais do que o discurso do professor
suas ações, o que ele efetivamente faz marcam e formam os alunos.
A profª Milena inicia sua exposição falando de ética como disciplina e regras, ela chega a
dizer: “quando entro na minha sala de aula, no primeiro dia eu digo logo quais são as minhas regras.”
Enfatiza que é no jardim de infância que se deve iniciar o ensino de princípios éticos e, no ensino
fundamental, a primeira coisa que que se deve trabalhar é a ética, caso contrário, ou seja, caso não se
trabalhe essas questões na infância e logo no início do ano letivo, “jamais você vai conseguir
disciplinar uma sala”.
Profª Milena em suas palavras se refere à ética como disciplina e regras, o que nos remete a
Durkheim quando diz que o primeiro elemento da educação moral é a disciplina, este pensador vai
dizer que a moral é um sistema de regras muito precisas e que agir bem é obedecer bem.
De nossa parte acreditamos, por um lado, nem ser uma prova de conduta ética um
comportamento socialmente aceitável, aprovado e admirável, nem, por outro, um sistema de regras a
serem seguidas apenas.
Paulo Freire falando sobre a descoberta do Brasil vai dizer que não houve descoberta e sim
conquista, por parte dos portugueses, e se ele tivesse que comemorar algo não seria tal invasão, mas a
rebelião contra a invasão (2000), por muitas vezes este pensador vai se referir a rebeldia e rebelião
como atos éticos, pois, não pode ser considerado ético qualquer coisa que fira a vocação humana de
ser mais apenas por que se tornou uma tradição ou chegou a vigorar como lei, afinal “a desumanização
[é] a negação da vocação humana de ser mais” (FREIRE, 1980, p.30) e, portanto, um ato antiético e
imoral.
Por vezes, ao nos deixarmos levar pelo vigente, pelo “aprovado pela maioria”, pelas medíocres
leis da média que são moral e inquestionavelmente aceitas, em nome da “justiça” nos tornamos
“demasiadamente justos”, ou hipocritamente justos, como nos advertiu o autor do livro de Eclesiastes
(1996), e em nome da “moral” nos esquecemos da ética e quanto a isso Buber chega a dizer que “a
moral pode mascarar a face do nosso próximo” (1982, p.51), ou seja, em nome do cego, ou melhor, do
impensado cumprimento do “moralmente aceito por todos”, deixamos de perceber o próximo que
deveria ser o ponto de partida e de chegada de qualquer ato moral ou ético.
2.1 AÇÃO DOCENTE, ÉTICA E AFETIVIDADE
No discurso das professoras está presente a preocupação com a formação dos jovens não só no
que se refere aos conteúdos, mas também com as questões pessoais que envolve o cotidiano, acreditam
que como professoras precisam estar dispostas a ajudar, até mesmo, a resolver problemas pessoais,
fora da escola, ou seja, ambas entendem a educação não apenas como uma ponte para formação
técnica, mas também de formação humana. Helena chegou a dizer que vê a “educação como uma
missão de ajudar pessoas”. O que em nossa opinião é também uma das facetas da educação. Freire diz:
E o que dizer, mas sobretudo esperar de mim, se, como professor não me acho tomado por
este outro saber, o de que preciso estar aberto ao gosto de querer bem, às vezes, à coragem de
querer bem aos educandos [...] Significa de fato que a afetividade não me assusta, que não
tenho medo de expressá-la. Significa esta abertura ao querer bem a maneira que tenho de
autenticamente selar o meu compromisso com os educandos, numa prática específica do ser
humano. (FREIRE, 1996, p.141)
Freire continua dizendo que “a prática educativa é tudo isso: afetividade, alegria, capacidade
científica, domínio técnico a serviço da mudança...” (1996, p. 143). Durante todo o tempo em que
estivemos na escola, nos momentos de observação ou nas entrevistas percebemos afetividade e
interesse no bem estar dos alunos por parte das professoras.
Em alguns casos percebemos até certo excesso de afetividade que chegava a atrapalhar nos
momentos em que se exigia das professoras um pouco mais de rigidez, Freire alerta que “o que não
posso obviamente é permitir que minha afetividade interfira no... exercício de minha autoridade”
(1996, p. 141).
Questionamos as professoras sobre os conflitos vivenciados em sala de aula que envolvem
ética, a professora Helena respondeu que na sala de aula os conflitos se apresentam nas brincadeiras,
mas que na sociedade sim, várias vezes.
Aqui existem ao menos três coisas a serem pensadas: (i) Às vezes falta um olhar mais voltado
para as questões éticas para que se veja e perceba os conflitos, (ii) às vezes o que falta é coragem para
admitir que nossas salas não são compostas por alunos perfeitos e que conflitos são um fato e nesse
caso afetividade em excesso geralmente turva a visão para conflitos desse tipo e por fim (iii) o fato de
que estamos tão imersos em nossos preconceitos, medos que nem percebemos mais algumas atitudes,
falas, coerções como preconceituosas e carregadas de conflitos.
Vale dizer que em um dos dias de observação na sala desta mesma professora (Helena)
iniciou-se uma conversa depreciativa sobre uma aluna da escola de outra turma, cujo termo utilizado
por eles foi; “sapatão” falando que ela não prestava por ser como era, algumas mulheres diziam que
nem deixavam que a tal “sapatão” se aproximasse delas. A professora estava em sala no momento e,
ou não percebeu, ou percebeu e achou que poderia deixar passar, talvez por não encontrar maneiras de
trabalhar esse preconceito.
3. ÉTICA, SOCIEDADE E FAMÍLIA
No decorrer da entrevista as professoras enfatizam que a ética é um conjunto de
comportamentos que são necessários para a vida na sociedade e são passados pela família,
estabelecem, portanto, uma relação entre ética, sociedade, família. A profª Helena disse que “as
pessoas precisam chegar na sociedade sabendo se apresentar da maneira correta”, pois a sociedade
cobra um comportamento apropriado.
Diante disso ela vai dizer então que a “primeira pastoral é em casa” e que “existem
características que a pessoa traz do meio em que vive”, ou seja, caso você não tenha vindo de um meio
que tenha trabalhado essas questões, não necessariamente como questões, mas como atos intrínsecos à
vida que também recebe o nome popular de ‘educação’, ela diz; “você ainda precisa crescer muito”, ou
seja, pode-se trazer de casa os primeiros subsídios para um bom comportamento em sociedade e caso
isso não tenha sido a realidade de uma determinada pessoa esta precisará crescer muito e a escola
ajudará nesse crescimento.
Uma das preocupações de Freire era também a forma como os pais educavam seus filhos,
assim ele se expressa: “a mim me dá pena e preocupação quando convivo com famílias que
experimentam a ‘tirania da liberdade’ em que as crianças podem tudo: gritam, riscam as paredes,
ameaçam as visitas em face da autoridade complacente dos pais que se pensam ainda campeões da
liberdade”. (2000, p. 29)
Mais adiante ele diz:
Quão equivocados se acham os pais e mães ou quão despreparados se encontram para o
exercício de sua paternidade e de sua maternidade quando, em nome do respeito à liberdade
de seus filhos, os deixam entregues a si mesmos, a seus caprichos, a seus desejos [...] A
demonstração permanente de afeto é necessária, fundamental, mas não de afeto como forma
de arrependimento. Não posso pedir desculpas ao meu filho por ter feito o que deveria ter
realmente feito. (Ibdem, p. 36)
Acreditamos que o lar tem influencia na formação ética e moral do sujeito, entretanto, não
queremos também cair no equívoco de reduzir formação ética a um conjunto de normas morais
vigentes transmitidas de pais para filhos, portanto, pensamos que dependendo da forma como se dá a
relação, entre pais e filhos ou em família de um modo geral, é possível que seja forjado no sujeito um
sentimento e entendimento – mesmo que não seja sistematizado ou intelectualmente explicado – de
ética que não absolutiza comportamentos aceitando variadas e diferentes formas de expressão quando
as mesmas não ferem a dignidade do ser humano.
Indignado, Freire falando do caso dos adolescentes que incendiaram o índio pataxó Galdino de
Jesus dos Santos, se expressa da seguinte maneira:
Penso em suas casas, em sua classe social, em sua vizinhança, em sua escola. Penso em outras
coisas mais, no testemunho que lhes deram de pensar e de como pensar. A posição do pobre,
do mendigo, do negro, da mulher, do camponês, do operário, do índio neste pensar. Penso na
mentalidade materialista da posse das coisas, no descaso pela decência, na fixação do prazer,
no desrespeito pelas coisas do espírito consideradas de menor ou de nenhuma valia. [...]
Registro o todopoderosismo de suas liberdades, isentas de qualquer limite, liberdade virando
licenciosidade zombando de tudo e de todos. (2000, p. 66)
Quais testemunhos de pensamentos, atos e de como pensar o humano, estão forjando nossos
filhos, alunos, cidadãos, interventores na história e agentes de transformação do mundo? Pois, já que a
história é feita por homens e mulheres, que homens e mulheres desejamos que nossos filhos sejam?
Portanto, acreditamos que a família tem papel fundamental na formação humana das crianças,
formação essa que nunca termina e a escola pode dar continuidade, reforço ou até mesmo, em alguns
casos, atuar nas bases desse processo.
4. ÉTICA: AUTONOMIA, EXPRESSIVIDADE E CRIATIVIDADE
Em Ação cultural para a liberdade Freire diz que “a educação, qualquer que seja o nível em
que se dê, se fará mais verdadeira quanto mais estimule o desenvolvimento desta necessidade radical
dos seres humanos, a sua expressividade.” (FREIRE, 1981a, p. 20) Portanto, acreditamos que uma
“educação” que iniba ou não estimule a autonomia, a expressividade e a criatividade de seus
educandos é uma educação que perde oportunidade de potencializar atributos do homem sendo assim
duvidosa em relação a sua eticidade.
Durante as observações, em um dia de prova na sala de EJA IV, uma aluna perguntou à
professora sobre duas questões que não estava entendendo, professora Helena disse então que aquelas
perguntas eram pessoais e, portanto, exigiam respostas criativas e individuais. A aluna então deu a
seguinte resposta: “Não sei responder a perguntas pessoais.”
Nesse momento fomos remetidos imediatamente a pensar em autonomia e expressividade,
atributos estes sem os quais a criatividade é inviabilizada e a questão da ética comprometida. Fizemos
propositalmente o uso do termo atributo, já que expressividade e criatividade são atributos das
crianças desde que nascem e se não forem tolhidas, a probabilidade de crescerem assim é real,
entretanto, no decorrer do crescimento, os pais, professores e outros atuam negando e inibindo essas
virtudes, por vezes sem perceber, mas causando uma diminuição desta vocação ontológica.
Portanto, o ato de tolher nesse caso é um ato antiético, já que diminui o ser, cabe então tanto
aos pais como aos professores trabalharem com seus filhos e alunos a expressividade, autonomia e
criatividade que advém da liberdade, sem deixar que a liberdade vire licenciosidade ou libertinagem
afinal “toda vez que se suprime a liberdade, fica êle (o homem) um ser meramente ajustado ou
acomodado. E é por isso que, minimizado e cerceado, acomodado a ajustamentos que lhe sejam
impostos, sem o direito de discuti-los, o homem sacrifica imediatamente a sua capacidade criadora”.
(Idem, 1981b, p.42)
Esta ausência de expressividade, de auto afirmação, essa minimização e acomodamento
podem desencadear em desrespeito próprio, o Tema Transversal de Ética abordando essa questão diz:
“Uma criança a quem nunca se dê possibilidade de se afirmar, de ter êxito nos seus menores
empreendimentos, uma criança sempre humilhada, dificilmente desenvolverá alguma forma de
respeito próprio”. (BRASIL, p.86)
5. DIÁLOGO: INÍCIO, MEIO E FIM DA RELAÇÃO PROFESSOR/ALUNO
Acima trabalhamos a questão da autonomia e da expressividade. Acreditamos que a falta de
diálogo opera em favor da negação destas, já que, dentre outras coisas, é imposição e descrença na
capacidade do outro o que funciona como inibidor de expressividade e criatividade.
Quando perguntada sobre sua concepção de diálogo a professora Milena disse: “diálogo para
mim é o momento onde você senta para conversar e não para brigar” e continua dizendo que através
do diálogo pode-se “até entrar na vida pessoal” do educando para ajudá-lo em questões pessoais,
depois ela coloca que a falta de diálogo de alguns alunos com ela ocasiona em um déficit de
aprendizagem por não se abrirem, mais a frente ela vai dizer que através do diálogo se obtém a
confiança dos alunos e, por fim, quando perguntada acerca da importância do diálogo entre os alunos
disse que “o diálogo é importante por que um aprende com o outro.”
A profª Helena, em uma resposta bastante longa acerca desse ponto da entrevista, expressou
mais a forma como dialoga e os assuntos dos momentos de diálogo do que sua concepção do mesmo,
podemos inferir a partir da sua fala a concepção que se encontra subjacente. Ela começa dizendo que
ela e seus alunos falam “a mesma língua” e isso facilita para que o diálogo aconteça, durante as
conversas ela fala com os alunos no sentido de aconselhá-los acerca de suas vidas pessoais, de estudo
e profissional, o diálogo é uma forma de aproveitar o tempo com alguém que está precisando de você
e vai dizer que o diálogo é uma das bases mais importantes da relação entre pessoas e mais
especificamente entre professor e aluno.
Vejamos o que Buber diz acerca desse assunto:
Conheço três espécies de diálogo: o autêntico – não importa se falado ou silencioso – onde
cada um dos participantes tem de fato em mente o outro ou os outros na sua presença e no seu
modo de ser e a eles se volta com a intenção de estabelecer entre eles e si próprio uma
reciprocidade viva; o diálogo técnico, que é movido unicamente pela necessidade de um
entendimento objetivo; e o monólogo disfarçado de diálogo, onde dois ou mais homens
reunidos num local, falam cada um consigo mesmo [...] a primeira espécie de diálogo tornou-
se rara [...] (1982, p. 53).
Tentemos pensar, à luz dessa reflexão de Buber e de outras de Freire, a forma como as
professoras entendem o diálogo.
Com algumas diferenças acerca da forma como entendem o diálogo, podemos encontrar
pontos em comum na fala das professoras senão, vejamos: tanto a profª Milena como a profª Helena se
colocam em uma posição semelhante quanto ao diálogo em relação aos educandos com quem
dialogam, e a posição é a de quem tem o que dizer enquanto os educandos tem que ouvir.
A primeira diz que no diálogo (i) pode entrar na vida pessoal do aluno e (ii) que quando falta o
diálogo há um déficit de aprendizagem para o aluno e (iii) que o diálogo entre os alunos é importante
pois eles aprendem entre si. Ou seja, em momento algum vemos a professora se dispondo à
reciprocidade como acabamos de ler em Buber quando fala do diálogo autêntico. O que vemos é uma
posição onde a pessoa que pode doar algo é ela e a que pode aprender algo é o educando no momento
do diálogo.
Profª Helena fala de modo claro acerca de aconselhar e gastar tempo com quem está
precisando de sua ajuda, onde mais uma vez percebemos que a posição em que se coloca é a de quem
doa a alguém que recebe.
Não queremos minimizar a importância dos conselhos e do ter como e querer ajudar, já que
em alguns momentos tudo o que precisamos é ouvir e aprender apenas, mas, pensar o diálogo somente
como isso é minimizá-lo e empobrecê-lo, em nenhum momento das entrevistas as professoras se
colocaram na posição de que o diálogo também lhes serve para que cresçam a aprendam com as
experiências e leitura de mundo de seus alunos.
Vale ressaltar que as professoras em suas concepções e práticas (com toda a boa vontade)
ainda pensam no diálogo também na perspectiva do monólogo. Pois, como vimos profª Milena afirma
que no início do ano define as regras da sala, o que indica que ela pensa que só em reunir a sala para
apresentar essas regras e até mesmo escutá-los quanto ao entendimento das mesmas se constitui em
diálogo quando na verdade é monólogo de alguém que dotado de “saber”, ‘autoridade/poder” define o
que fazer e como.
Partindo de Freire podemos dizer “que ninguém sabe tudo e que ninguém tudo ignora” (2005,
p. 27) e por isso, uma atitude de se colocar apenas na posição de quem sabe e pode ajudar é se colocar
num patamar acima dos que nos escutam o que não deixa de operar em função da inibição das
vocações humanas. Afinal o “diálogo é o encontro dos homens para Ser Mais” (1980, p. 97)
Sentimos falta na análise do documento dos Temas transversais – Ética, na fala das
professoras e nas observações, de um trabalho para instaurar um diálogo autêntico, pois “o diálogo
[autêntico] é este encontro dos homens, mediatizados pelo mundo, para pronunciá-lo [...]” (1980, p.
93), ou seja, os homens se encontram para mudarem e transformarem o mundo e suas histórias
pessoais. Através do diálogo os homens se encontram para debates, lutas, fazer reivindicações e
revoluções desde ações e necessidades menores até ações e necessidades maiores, como vimos, por
exemplo, recentemente, egípcios em diálogo, reunidos e unidos para reivindicarem por uma causa e
transformarem a sua história e pronunciarem o mundo da forma como acreditam ser mais justo.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Durante a realização da pesquisa pudemos perceber que de fato a proposta de uma reflexão
sobre a construção da identidade, do achado do eu no outro, do achado do outro em sua alteridade, que
seria o sentido da ética, não é uma realidade nas propostas dos PCNs - Tema Transversal de Ética.
Outra percepção que tivemos é a de que assuntos de grande importância e que estão no âmbito
da ética como autonomia, expressividade, criatividade e diálogo são pouco ou quase nada trabalhados
no documento o que põe em dúvida a eticidade das “educações” propostas visto que são temas sem os
quais a vocação humana de ser mais fica comprometida. Qualquer trabalho que tenha por objetivo uma
formação humana, no mais amplo sentido do termo pressupõe o diálogo, não como algo que se agrega
para fins técnicos ou como monólogo, mas como reconhecimento do outro em sua alteridade e de si no
outro. Partindo de Freire (2005) podemos dizer que ninguém sabe tudo e que ninguém tudo ignora
nesse sentido, o diálogo é o encontro dos homens para Ser Mais.
Qualquer proposta de formação moral (oficial e sistematizada) só faz sentido quando surge da
necessidade da escola, do enfrentamento dos problemas, conflitos que surgem.
Vale pensar sobre o desconhecimento das professoras em relação aos PCNS, especificamente
ao tema Transversal – Ética, posto que os Parâmetros Curriculares estão há mais de uma década em
vigência, não há por parte das professoras e nem do núcleo gestor da escola uma preocupação em
conhecer o documento, nem portanto, uma cobrança quanto a necessidade de se trabalhar os temas
transversais, como já foi enfatizado não ocorreu por parte dos docentes a assimilação da
transversalidade e o que acabou se concretizando foi a supervalorização das disciplinas escolares e de
seus saberes constituídos e o que não se enquadra nesse esquema acaba não se incorporando ao
trabalho sistematizado da escola, ficando por conta do currículo oculto diluído no cotidiano da escola.
A concepção de ética e moral que se encontra implícito no discurso das professoras se
aproxima da concepção defendida por Durkheim no sentido de pensar a ética como um conjunto de
regras e normas de conduta e de que devem por meio da disciplina ser repassados as novas gerações,
não há a assunção de uma ética que pressuponha o diálogo, a autonomia e a liberdade dos educandos
como sugeriu Paulo Freire.
Ainda que as professoras não tenham explicitado em suas falas, o que se percebe é que as
mesmas não se sentem preparadas para lidarem com questões referentes à ética e moral e diante desse
sentimento acabam por tomarem atitudes diversas que em geral não ajudam a resolver os conflitos
vivenciados.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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temas transversais, ética / Secretaria de Educação Fundamental. Brasília: MEC/SEF, 1997.
BUBER, Martin. Do diálogo e do dialógico. São Paulo: Ed. Perspectiva S.A., 1982
BUBER, Martin. Eu e Tu. 8ª ed. São Paulo: Centauro, 2001.
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FREIRE, Paulo. A importância do ato de ler. 46ª Ed. São Paulo: Cortez, 2005.
FREIRE, Paulo. Comunicação e extensão. 7a. Ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1983.
FREIRE, Paulo. Educação como prática da liberdade. 12a. Ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1981b.
FREIRE, Paulo. Pedagogia da autonomia. 39a. Ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1996.
FREIRE, Paulo. Pedagogia do oprimido. 8a. Ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1980.
FREIRE, Paulo. Pedagogia da indignação. 39ª Ed. São Paulo: Unesp, 2000.
WAKSMAN V. Sentidos e sem-sentidos da educação moral. In: PIOVESAN, A.; EIDT, C.; GARCIA,
C. B.; HEUSER, E. M. D.; FRAGA, P. D. (orgs). Filosofia e ensino em debate. : Ed.UNIJUI, 2002.
CASTRO, E. Alonso Pensando sobre educação, ética e transversalidade. In: CASTRO, E. Alonso;
OLIVEIRA, P. Ramos.(orgs.) Educando para o pensar. São Paulo: Pioneira Thomson Lear, 2002.
A concepção de ética e moral que se encontra implícito no discurso das professoras se
aproxima da concepção defendida por Durkheim no sentido de pensar a ética como um conjunto de
regras e normas de conduta e de que devem por meio da disciplina ser repassados as novas gerações,
não há a assunção de uma ética que pressuponha o diálogo, a autonomia e a liberdade dos educandos
como sugeriu Paulo Freire.
Ainda que as professoras não tenham explicitado em suas falas, o que se percebe é que as
mesmas não se sentem preparadas para lidarem com questões referentes à ética e moral e diante desse
sentimento acabam por tomarem atitudes diversas que em geral não ajudam a resolver os conflitos
vivenciados.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
BRASIL. Secretaria de Educação Fundamental. Parâmetros Curriculares Nacionais: apresentação dos
temas transversais, ética / Secretaria de Educação Fundamental. Brasília: MEC/SEF, 1997.
BUBER, Martin. Do diálogo e do dialógico. São Paulo: Ed. Perspectiva S.A., 1982
BUBER, Martin. Eu e Tu. 8ª ed. São Paulo: Centauro, 2001.
BUSQUETS, M. Dolors (et e all) Temas transversais em educação: bases para uma formação
integral. São Paulo: Ática, 1997.
DURKHEIM, Emile. Educação moral. Petrópolis, RJ: Vozes, 2008.
FREIRE, Paulo. Ação cultural para a liberdade. 5a. Ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1981a.
FREIRE, Paulo. A importância do ato de ler. 46ª Ed. São Paulo: Cortez, 2005.
FREIRE, Paulo. Comunicação e extensão. 7a. Ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1983.
FREIRE, Paulo. Educação como prática da liberdade. 12a. Ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1981b.
FREIRE, Paulo. Pedagogia da autonomia. 39a. Ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1996.
FREIRE, Paulo. Pedagogia do oprimido. 8a. Ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1980.
FREIRE, Paulo. Pedagogia da indignação. 39ª Ed. São Paulo: Unesp, 2000.
WAKSMAN V. Sentidos e sem-sentidos da educação moral. In: PIOVESAN, A.; EIDT, C.; GARCIA,
C. B.; HEUSER, E. M. D.; FRAGA, P. D. (orgs). Filosofia e ensino em debate. : Ed.UNIJUI, 2002.
CASTRO, E. Alonso Pensando sobre educação, ética e transversalidade. In: CASTRO, E. Alonso;
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  • 1. Educação moral: PCNs e o ensino de ética na Educação de Jovens e Adultos – EJA Amâncio L. Correa Pimentel M. Dulcinea da S. Loureiro. Universidade Regional do Cariri - URCA Brasil Ensino de Filosofia Trabalho Completo pimentelalc@gmail.com mdslou@uol.com.br RESUMO A questão: é possível uma educação moral? Encontra diferentes respostas na educação brasileira com a implementação de políticas educacionais materializadas em disciplinas como “Educação Moral e Cívica”, “Orgnização Social e Política Brasileira – OSPB” e, em 1997 com a implementação dos Parâmetros Curriculares Nacionais - PCNs com o Tema Transversal Ética. Uma reflexão sobre uma formação ética deve pressupor e explicitar o que a norteia e, uma análise que busque compreender uma proposta que faz parte de uma política pública de formação ética deve levar em conta esses pressupostos implícitos ou explícitos que se encontram subjacentes a estas formulações. O presente texto é fruto de uma pesquisa que é tecida à partir de: (i) aprofundamento teórico com a análise do Tema transversal Ética, Paulo Freire e Martin Bubber; (ii) trabalho de campo que constou de observações realizadas nos espaços de socialização de uma escola de Juazeiro do Norte - Ce em duas salas de aula de Educação de Jovens e Adultos – EJA e (iii) entrevistas realizadas com as professoras. O trabalho de campo buscou apreender: a compreensão dos professores acerca dos PCNs mais especificamente do tema transversal Ética; como os professores conceituam e vivenciam o diálogo na sua prática docente; a questão da afetividade e da autonomia como elementos para a constituição da identidade e da moralidade dos jovens. A análise da proposta dos PCNs revelou a ausência de uma reflexão sobre a construção da identidade, do achado do eu no outro, do achado do outro em sua alteridade, que seria o sentido da ética. Outra percepção que tivemos é a de que assuntos de grande importância e que estão no âmbito da ética como autonomia, expressividade, criatividade e diálogo são pouco ou quase nada trabalhados no documento. Qualquer trabalho que tenha por objetivo uma formação humana, no mais amplo sentido do termo pressupõe o diálogo, não como algo que se agrega para fins técnicos ou como monólogo, mas como reconhecimento do outro em sua alteridade e de si no outro. Palavras-chave – Ética, PCNs, diálogo, Educação de Jovens e Adultos. CONSIDERAÇÕES INICIAIS A existência humana não pode ser pensada sem uma referência ética e moral, nem podemos reduzir a ética a um conjunto de deveres ou a um código de regras de caráter normativo e prescritivo. O conceito de ética e moral implica um olhar para a ação, a questão “como devo agir perante os outros?” encontra sentido a partir da alteridade, ou seja, o outro é o pólo que ao mesmo tempo me singulariza, fortalecendo minha identidade e me universaliza enquanto humanidade, neste sentido, a ética coloca em questão o respeito e a solidariedade. Perguntar sobre qual deve ser, ou em que deve se
  • 2. pautar minha ação, trás a reflexão sobre o que é bom, mal, desejado, desejável, razoável, justo, injusto... A preocupação com a educação moral das novas gerações é persistente nas sociedades, essa formação pode ocorrer diluída no conjunto de práticas e/ou instituições que sustentam cada estrutura social nos diferentes momentos históricos, podendo também ocorrer de forma institucionalizada, regulamentada nas políticas educacionais e nos currículos oficiais. A questão: é possível uma educação moral? Encontra diferentes respostas na educação brasileira com a implementação de políticas educacionais materializadas em disciplinas como “Educação Moral e Cívica”, “Organização Social e Política Brasileira – OSPB” já a partir da década de 30 do século XX e, em 1997 com a implementação dos Parâmetros Curriculares Nacionais - PCNs com o Tema Transversal Ética. Portanto, uma reflexão sobre uma formação ética deve pressupor e explicitar o que a norteia e, uma análise que busque compreender uma proposta que faz parte de uma política pública de formação ética deve levar em conta esses pressupostos implícitos ou explícitos que se encontram subjacentes a estas formulações. O presente texto é fruto de uma pesquisa que é tecida à partir de: (i) aprofundamento teórico com a leitura de Paulo Freire e Martin Bubber, análise do Tema transversal Ética; (ii) trabalho de campo em uma escola do Município do Juazeiro do Norte – Ce, que constou de observações realizadas nos espaços de socialização da escola e em duas salas de aula de Educação de Jovens e Adultos - EJA e (iii) entrevistas realizadas com as professoras das salas de EJA em que ocorreram as observações. Para a análise resolvemos dar nomes fictícios as professoras, que foram denominadas de Milena e Helena. A pesquisa objetivou compreender como os professores do EJA apreendem Ética e Moral e até que ponto essas concepções norteiam sua ação pedagógica. Bem como, apreender em que medida o trabalho a partir de eixos temáticos que perpassem transversalmente o currículo foi assimilada e materializada em práticas docentes e, identificar nas relações estabelecidas entre professores e alunos como o diálogo é vivenciado. 1- O TEMA TRANSVERSAL ÉTICA Os PCNs elaborados em 1997 trazem os temas transversais como inovação curricular articulando os conhecimentos disciplinares com a discussão de temáticas sociais. Tendo por eixo Ética e Cidadania busca-se problematizar questões e interesses antes não contemplados no currículo a partir dos princípios da dignidade humana, da igualdade de direitos, da participação e co-responsabilidade pela vida social, princípios estes, respaldados pela Constituição Federal de 1988 e pela Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional de 1996. As temáticas escolhidas (ética, saúde, pluralidade cultural e orientação sexual) para serem trabalhadas transversalmente têm por pressuposto que a educação deve formar as novas gerações dentro dos princípios democráticos que devem reger a vida social e política. Assim, os temas transversais abarcam um conjunto de saberes diretamente relacionados com o exercício da cidadania e atravessa diferentes áreas do conhecimento. O currículo escolar, nesse sentido, ganha em flexibilidade com a implementação da reflexão acerca destas temáticas. A formulação dos temas transversais a primeira vista, se apresenta como uma alternativa ao modelo de estruturação curricular organizado em disciplinas escolares, os “temas transversais” permitiriam, portanto, mais flexibilização e possibilidade de diálogo entre os diferentes saberes, já que, ao não ter mais a rigidez das disciplinas, perpassariam todos os conhecimentos não se fixando em nenhum espaço específico dentro da estrutura escolar, podendo ser trabalhado em qualquer disciplina, por qualquer professor e até por mais de um professor, caso seja necessário e/ou haja disposição dos docentes. Nesse sentido os temas transversais seriam por excelência o espaço da interdisciplinaridade e da transdisciplinaridade, melhor dizendo, o espaço em que os conhecimentos se entrelaçariam.
  • 3. No entanto, essa mesma “flexibilidade” e “autonomia” também gera uma série de problemas, senão vejamos, como não há uma disciplina que seja responsável especificamente por trabalhar esses conteúdos acaba por gerar um não-lugar específico, pode estar em toda parte acaba não estando em lugar nenhum. Moreno (In: BUSQUETS, 1997) propõe uma forma de conceber a transversalidade como uma nova concepção de ensino e de conhecimento. Nesta concepção os conteúdos escolares tradicionais não como fins em si mesmos, mas como meio para se atingir a fins, na busca da construção da cidadania e de uma sociedade mais justa. Waskman pensa em uma proposta que tem como tese o ensino da filosofia como contribuição para a formação ética “à medida que intervém no processo de construção pessoal do estudante” (2002, p. 25). O alfa e ômega da ética, ou seja, o princípio e o fim dela é o humano, “o sentido da ética, se pode entender, então, como tarefa de cuidado de si que se constitui o conhecimento e a construção da própria identidade” (Ibdem, p. 29), Martin Buber vai nos dizer que “o EU se realiza na relação com o TU” (2001, p. 12) e, portanto sendo “toda vida atual encontro” (Idem), em seu modo de ver, relação só pode ser reciprocidade onde “meu TU atua sobre mim assim como eu atuo sobre ele.” (Ibdem, p. 18). Mediante isso acreditamos que uma reflexão sobre ética deva nos remeter às relações humanas como sendo fundamentais à construção de si, como dissemos acima, contudo, ao estudarmos o Tema Transversal Ética dos PCN’S para a partir daí verificarmos até que ponto há uma proposta de reflexão sobre ética, o que se viu é que tal documento traz mais um apanhado de regras morais a serem ensinadas do que uma reflexão filosófica sobre ética. Questionamos às professoras acerca de seus conhecimentos sobre os PCN’S, sobretudo do Tema Transversal Ética e, ambas responderam que conhecem os PCN’S e que fazem uso dos mesmos, mas especificamente sobre o Tema Ética, a profª Milena disse que embora saiba que existe admitiu nunca o ter lido e a profª Helena disse que já o estudou, mas não se lembrava do seu conteúdo. O que se pôde perceber é que não há uma base teórica que oriente as professoras no trabalho de questões morais e éticas em sala, o que, a priori, não as desqualifica para tal já que tais questões são tratadas no dia-a-dia desde a família. Os Temas Transversais podendo ser trabalhados por todos os professores e transversalmente a qualquer disciplina acaba por ser destituído de um lugar específico o que faz com que eles fiquem sem lugar e acabam por não serem trabalhados. Entretanto, isso, a nosso ver não se constitui em um problema, já que acreditamos não haver necessidade de uma disciplina específica acerca do tema. Acreditamos, como diria Paulo Freire, que “estar longe, ou pior, fora da ética, entre nós, mulheres e homens é uma transgressão. É por isso que transformar a experiência educativa em puro treinamento técnico é amesquinhar o que há de fundamentalmente humano no exercício educativo: o seu caráter formador”. (1996, p.33) Ou seja, o exercício da educação já deve ser em si um ato ético e, portanto, formador do humano. Vale ressaltar, porém que o fato de acreditarmos não ser indispensável uma disciplina específica de ética e moral não estamos dizendo que tais questões não devam ser trabalhadas, pelo contrário, acreditamos ser de grande importância que tais reflexões sejam feitas, já que são parte constitutiva da existência humana. 2. AÇÃO DOCENTE E A QUESTÃO DA ÉTICA. Mesmo que as professoras entrevistadas não tivessem familiaridade com Tema Transversal de Ética quando perguntadas se achavam importante serem trabalhadas questões éticas e morais em sala ambas admitiram que consideram de extrema importância. A profª Helena fala sobre “mostrar para poder cobrar”, deixando claro sua compreensão de ética enquanto um conjunto de comportamentos exemplares a serem imitados, como por exemplo, não poder falar no celular em sala, formas de se vestir e diz que embora tenha “o direito a viver” no seu “particular”, ou seja, fora da escola, ela “deve uma satisfação à sociedade”, pois, “a sociedade cobra
  • 4. de você”. Paulo Freire alerta em Pedagogia da Autonomia que, mais do que o discurso do professor suas ações, o que ele efetivamente faz marcam e formam os alunos. A profª Milena inicia sua exposição falando de ética como disciplina e regras, ela chega a dizer: “quando entro na minha sala de aula, no primeiro dia eu digo logo quais são as minhas regras.” Enfatiza que é no jardim de infância que se deve iniciar o ensino de princípios éticos e, no ensino fundamental, a primeira coisa que que se deve trabalhar é a ética, caso contrário, ou seja, caso não se trabalhe essas questões na infância e logo no início do ano letivo, “jamais você vai conseguir disciplinar uma sala”. Profª Milena em suas palavras se refere à ética como disciplina e regras, o que nos remete a Durkheim quando diz que o primeiro elemento da educação moral é a disciplina, este pensador vai dizer que a moral é um sistema de regras muito precisas e que agir bem é obedecer bem. De nossa parte acreditamos, por um lado, nem ser uma prova de conduta ética um comportamento socialmente aceitável, aprovado e admirável, nem, por outro, um sistema de regras a serem seguidas apenas. Paulo Freire falando sobre a descoberta do Brasil vai dizer que não houve descoberta e sim conquista, por parte dos portugueses, e se ele tivesse que comemorar algo não seria tal invasão, mas a rebelião contra a invasão (2000), por muitas vezes este pensador vai se referir a rebeldia e rebelião como atos éticos, pois, não pode ser considerado ético qualquer coisa que fira a vocação humana de ser mais apenas por que se tornou uma tradição ou chegou a vigorar como lei, afinal “a desumanização [é] a negação da vocação humana de ser mais” (FREIRE, 1980, p.30) e, portanto, um ato antiético e imoral. Por vezes, ao nos deixarmos levar pelo vigente, pelo “aprovado pela maioria”, pelas medíocres leis da média que são moral e inquestionavelmente aceitas, em nome da “justiça” nos tornamos “demasiadamente justos”, ou hipocritamente justos, como nos advertiu o autor do livro de Eclesiastes (1996), e em nome da “moral” nos esquecemos da ética e quanto a isso Buber chega a dizer que “a moral pode mascarar a face do nosso próximo” (1982, p.51), ou seja, em nome do cego, ou melhor, do impensado cumprimento do “moralmente aceito por todos”, deixamos de perceber o próximo que deveria ser o ponto de partida e de chegada de qualquer ato moral ou ético. 2.1 AÇÃO DOCENTE, ÉTICA E AFETIVIDADE No discurso das professoras está presente a preocupação com a formação dos jovens não só no que se refere aos conteúdos, mas também com as questões pessoais que envolve o cotidiano, acreditam que como professoras precisam estar dispostas a ajudar, até mesmo, a resolver problemas pessoais, fora da escola, ou seja, ambas entendem a educação não apenas como uma ponte para formação técnica, mas também de formação humana. Helena chegou a dizer que vê a “educação como uma missão de ajudar pessoas”. O que em nossa opinião é também uma das facetas da educação. Freire diz: E o que dizer, mas sobretudo esperar de mim, se, como professor não me acho tomado por este outro saber, o de que preciso estar aberto ao gosto de querer bem, às vezes, à coragem de querer bem aos educandos [...] Significa de fato que a afetividade não me assusta, que não tenho medo de expressá-la. Significa esta abertura ao querer bem a maneira que tenho de autenticamente selar o meu compromisso com os educandos, numa prática específica do ser humano. (FREIRE, 1996, p.141) Freire continua dizendo que “a prática educativa é tudo isso: afetividade, alegria, capacidade científica, domínio técnico a serviço da mudança...” (1996, p. 143). Durante todo o tempo em que estivemos na escola, nos momentos de observação ou nas entrevistas percebemos afetividade e interesse no bem estar dos alunos por parte das professoras.
  • 5. Em alguns casos percebemos até certo excesso de afetividade que chegava a atrapalhar nos momentos em que se exigia das professoras um pouco mais de rigidez, Freire alerta que “o que não posso obviamente é permitir que minha afetividade interfira no... exercício de minha autoridade” (1996, p. 141). Questionamos as professoras sobre os conflitos vivenciados em sala de aula que envolvem ética, a professora Helena respondeu que na sala de aula os conflitos se apresentam nas brincadeiras, mas que na sociedade sim, várias vezes. Aqui existem ao menos três coisas a serem pensadas: (i) Às vezes falta um olhar mais voltado para as questões éticas para que se veja e perceba os conflitos, (ii) às vezes o que falta é coragem para admitir que nossas salas não são compostas por alunos perfeitos e que conflitos são um fato e nesse caso afetividade em excesso geralmente turva a visão para conflitos desse tipo e por fim (iii) o fato de que estamos tão imersos em nossos preconceitos, medos que nem percebemos mais algumas atitudes, falas, coerções como preconceituosas e carregadas de conflitos. Vale dizer que em um dos dias de observação na sala desta mesma professora (Helena) iniciou-se uma conversa depreciativa sobre uma aluna da escola de outra turma, cujo termo utilizado por eles foi; “sapatão” falando que ela não prestava por ser como era, algumas mulheres diziam que nem deixavam que a tal “sapatão” se aproximasse delas. A professora estava em sala no momento e, ou não percebeu, ou percebeu e achou que poderia deixar passar, talvez por não encontrar maneiras de trabalhar esse preconceito. 3. ÉTICA, SOCIEDADE E FAMÍLIA No decorrer da entrevista as professoras enfatizam que a ética é um conjunto de comportamentos que são necessários para a vida na sociedade e são passados pela família, estabelecem, portanto, uma relação entre ética, sociedade, família. A profª Helena disse que “as pessoas precisam chegar na sociedade sabendo se apresentar da maneira correta”, pois a sociedade cobra um comportamento apropriado. Diante disso ela vai dizer então que a “primeira pastoral é em casa” e que “existem características que a pessoa traz do meio em que vive”, ou seja, caso você não tenha vindo de um meio que tenha trabalhado essas questões, não necessariamente como questões, mas como atos intrínsecos à vida que também recebe o nome popular de ‘educação’, ela diz; “você ainda precisa crescer muito”, ou seja, pode-se trazer de casa os primeiros subsídios para um bom comportamento em sociedade e caso isso não tenha sido a realidade de uma determinada pessoa esta precisará crescer muito e a escola ajudará nesse crescimento. Uma das preocupações de Freire era também a forma como os pais educavam seus filhos, assim ele se expressa: “a mim me dá pena e preocupação quando convivo com famílias que experimentam a ‘tirania da liberdade’ em que as crianças podem tudo: gritam, riscam as paredes, ameaçam as visitas em face da autoridade complacente dos pais que se pensam ainda campeões da liberdade”. (2000, p. 29) Mais adiante ele diz: Quão equivocados se acham os pais e mães ou quão despreparados se encontram para o exercício de sua paternidade e de sua maternidade quando, em nome do respeito à liberdade de seus filhos, os deixam entregues a si mesmos, a seus caprichos, a seus desejos [...] A demonstração permanente de afeto é necessária, fundamental, mas não de afeto como forma de arrependimento. Não posso pedir desculpas ao meu filho por ter feito o que deveria ter realmente feito. (Ibdem, p. 36)
  • 6. Acreditamos que o lar tem influencia na formação ética e moral do sujeito, entretanto, não queremos também cair no equívoco de reduzir formação ética a um conjunto de normas morais vigentes transmitidas de pais para filhos, portanto, pensamos que dependendo da forma como se dá a relação, entre pais e filhos ou em família de um modo geral, é possível que seja forjado no sujeito um sentimento e entendimento – mesmo que não seja sistematizado ou intelectualmente explicado – de ética que não absolutiza comportamentos aceitando variadas e diferentes formas de expressão quando as mesmas não ferem a dignidade do ser humano. Indignado, Freire falando do caso dos adolescentes que incendiaram o índio pataxó Galdino de Jesus dos Santos, se expressa da seguinte maneira: Penso em suas casas, em sua classe social, em sua vizinhança, em sua escola. Penso em outras coisas mais, no testemunho que lhes deram de pensar e de como pensar. A posição do pobre, do mendigo, do negro, da mulher, do camponês, do operário, do índio neste pensar. Penso na mentalidade materialista da posse das coisas, no descaso pela decência, na fixação do prazer, no desrespeito pelas coisas do espírito consideradas de menor ou de nenhuma valia. [...] Registro o todopoderosismo de suas liberdades, isentas de qualquer limite, liberdade virando licenciosidade zombando de tudo e de todos. (2000, p. 66) Quais testemunhos de pensamentos, atos e de como pensar o humano, estão forjando nossos filhos, alunos, cidadãos, interventores na história e agentes de transformação do mundo? Pois, já que a história é feita por homens e mulheres, que homens e mulheres desejamos que nossos filhos sejam? Portanto, acreditamos que a família tem papel fundamental na formação humana das crianças, formação essa que nunca termina e a escola pode dar continuidade, reforço ou até mesmo, em alguns casos, atuar nas bases desse processo. 4. ÉTICA: AUTONOMIA, EXPRESSIVIDADE E CRIATIVIDADE Em Ação cultural para a liberdade Freire diz que “a educação, qualquer que seja o nível em que se dê, se fará mais verdadeira quanto mais estimule o desenvolvimento desta necessidade radical dos seres humanos, a sua expressividade.” (FREIRE, 1981a, p. 20) Portanto, acreditamos que uma “educação” que iniba ou não estimule a autonomia, a expressividade e a criatividade de seus educandos é uma educação que perde oportunidade de potencializar atributos do homem sendo assim duvidosa em relação a sua eticidade. Durante as observações, em um dia de prova na sala de EJA IV, uma aluna perguntou à professora sobre duas questões que não estava entendendo, professora Helena disse então que aquelas perguntas eram pessoais e, portanto, exigiam respostas criativas e individuais. A aluna então deu a seguinte resposta: “Não sei responder a perguntas pessoais.” Nesse momento fomos remetidos imediatamente a pensar em autonomia e expressividade, atributos estes sem os quais a criatividade é inviabilizada e a questão da ética comprometida. Fizemos propositalmente o uso do termo atributo, já que expressividade e criatividade são atributos das crianças desde que nascem e se não forem tolhidas, a probabilidade de crescerem assim é real, entretanto, no decorrer do crescimento, os pais, professores e outros atuam negando e inibindo essas virtudes, por vezes sem perceber, mas causando uma diminuição desta vocação ontológica. Portanto, o ato de tolher nesse caso é um ato antiético, já que diminui o ser, cabe então tanto aos pais como aos professores trabalharem com seus filhos e alunos a expressividade, autonomia e criatividade que advém da liberdade, sem deixar que a liberdade vire licenciosidade ou libertinagem afinal “toda vez que se suprime a liberdade, fica êle (o homem) um ser meramente ajustado ou acomodado. E é por isso que, minimizado e cerceado, acomodado a ajustamentos que lhe sejam impostos, sem o direito de discuti-los, o homem sacrifica imediatamente a sua capacidade criadora”. (Idem, 1981b, p.42)
  • 7. Esta ausência de expressividade, de auto afirmação, essa minimização e acomodamento podem desencadear em desrespeito próprio, o Tema Transversal de Ética abordando essa questão diz: “Uma criança a quem nunca se dê possibilidade de se afirmar, de ter êxito nos seus menores empreendimentos, uma criança sempre humilhada, dificilmente desenvolverá alguma forma de respeito próprio”. (BRASIL, p.86) 5. DIÁLOGO: INÍCIO, MEIO E FIM DA RELAÇÃO PROFESSOR/ALUNO Acima trabalhamos a questão da autonomia e da expressividade. Acreditamos que a falta de diálogo opera em favor da negação destas, já que, dentre outras coisas, é imposição e descrença na capacidade do outro o que funciona como inibidor de expressividade e criatividade. Quando perguntada sobre sua concepção de diálogo a professora Milena disse: “diálogo para mim é o momento onde você senta para conversar e não para brigar” e continua dizendo que através do diálogo pode-se “até entrar na vida pessoal” do educando para ajudá-lo em questões pessoais, depois ela coloca que a falta de diálogo de alguns alunos com ela ocasiona em um déficit de aprendizagem por não se abrirem, mais a frente ela vai dizer que através do diálogo se obtém a confiança dos alunos e, por fim, quando perguntada acerca da importância do diálogo entre os alunos disse que “o diálogo é importante por que um aprende com o outro.” A profª Helena, em uma resposta bastante longa acerca desse ponto da entrevista, expressou mais a forma como dialoga e os assuntos dos momentos de diálogo do que sua concepção do mesmo, podemos inferir a partir da sua fala a concepção que se encontra subjacente. Ela começa dizendo que ela e seus alunos falam “a mesma língua” e isso facilita para que o diálogo aconteça, durante as conversas ela fala com os alunos no sentido de aconselhá-los acerca de suas vidas pessoais, de estudo e profissional, o diálogo é uma forma de aproveitar o tempo com alguém que está precisando de você e vai dizer que o diálogo é uma das bases mais importantes da relação entre pessoas e mais especificamente entre professor e aluno. Vejamos o que Buber diz acerca desse assunto: Conheço três espécies de diálogo: o autêntico – não importa se falado ou silencioso – onde cada um dos participantes tem de fato em mente o outro ou os outros na sua presença e no seu modo de ser e a eles se volta com a intenção de estabelecer entre eles e si próprio uma reciprocidade viva; o diálogo técnico, que é movido unicamente pela necessidade de um entendimento objetivo; e o monólogo disfarçado de diálogo, onde dois ou mais homens reunidos num local, falam cada um consigo mesmo [...] a primeira espécie de diálogo tornou- se rara [...] (1982, p. 53). Tentemos pensar, à luz dessa reflexão de Buber e de outras de Freire, a forma como as professoras entendem o diálogo. Com algumas diferenças acerca da forma como entendem o diálogo, podemos encontrar pontos em comum na fala das professoras senão, vejamos: tanto a profª Milena como a profª Helena se colocam em uma posição semelhante quanto ao diálogo em relação aos educandos com quem dialogam, e a posição é a de quem tem o que dizer enquanto os educandos tem que ouvir. A primeira diz que no diálogo (i) pode entrar na vida pessoal do aluno e (ii) que quando falta o diálogo há um déficit de aprendizagem para o aluno e (iii) que o diálogo entre os alunos é importante pois eles aprendem entre si. Ou seja, em momento algum vemos a professora se dispondo à reciprocidade como acabamos de ler em Buber quando fala do diálogo autêntico. O que vemos é uma posição onde a pessoa que pode doar algo é ela e a que pode aprender algo é o educando no momento do diálogo.
  • 8. Profª Helena fala de modo claro acerca de aconselhar e gastar tempo com quem está precisando de sua ajuda, onde mais uma vez percebemos que a posição em que se coloca é a de quem doa a alguém que recebe. Não queremos minimizar a importância dos conselhos e do ter como e querer ajudar, já que em alguns momentos tudo o que precisamos é ouvir e aprender apenas, mas, pensar o diálogo somente como isso é minimizá-lo e empobrecê-lo, em nenhum momento das entrevistas as professoras se colocaram na posição de que o diálogo também lhes serve para que cresçam a aprendam com as experiências e leitura de mundo de seus alunos. Vale ressaltar que as professoras em suas concepções e práticas (com toda a boa vontade) ainda pensam no diálogo também na perspectiva do monólogo. Pois, como vimos profª Milena afirma que no início do ano define as regras da sala, o que indica que ela pensa que só em reunir a sala para apresentar essas regras e até mesmo escutá-los quanto ao entendimento das mesmas se constitui em diálogo quando na verdade é monólogo de alguém que dotado de “saber”, ‘autoridade/poder” define o que fazer e como. Partindo de Freire podemos dizer “que ninguém sabe tudo e que ninguém tudo ignora” (2005, p. 27) e por isso, uma atitude de se colocar apenas na posição de quem sabe e pode ajudar é se colocar num patamar acima dos que nos escutam o que não deixa de operar em função da inibição das vocações humanas. Afinal o “diálogo é o encontro dos homens para Ser Mais” (1980, p. 97) Sentimos falta na análise do documento dos Temas transversais – Ética, na fala das professoras e nas observações, de um trabalho para instaurar um diálogo autêntico, pois “o diálogo [autêntico] é este encontro dos homens, mediatizados pelo mundo, para pronunciá-lo [...]” (1980, p. 93), ou seja, os homens se encontram para mudarem e transformarem o mundo e suas histórias pessoais. Através do diálogo os homens se encontram para debates, lutas, fazer reivindicações e revoluções desde ações e necessidades menores até ações e necessidades maiores, como vimos, por exemplo, recentemente, egípcios em diálogo, reunidos e unidos para reivindicarem por uma causa e transformarem a sua história e pronunciarem o mundo da forma como acreditam ser mais justo. CONSIDERAÇÕES FINAIS Durante a realização da pesquisa pudemos perceber que de fato a proposta de uma reflexão sobre a construção da identidade, do achado do eu no outro, do achado do outro em sua alteridade, que seria o sentido da ética, não é uma realidade nas propostas dos PCNs - Tema Transversal de Ética. Outra percepção que tivemos é a de que assuntos de grande importância e que estão no âmbito da ética como autonomia, expressividade, criatividade e diálogo são pouco ou quase nada trabalhados no documento o que põe em dúvida a eticidade das “educações” propostas visto que são temas sem os quais a vocação humana de ser mais fica comprometida. Qualquer trabalho que tenha por objetivo uma formação humana, no mais amplo sentido do termo pressupõe o diálogo, não como algo que se agrega para fins técnicos ou como monólogo, mas como reconhecimento do outro em sua alteridade e de si no outro. Partindo de Freire (2005) podemos dizer que ninguém sabe tudo e que ninguém tudo ignora nesse sentido, o diálogo é o encontro dos homens para Ser Mais. Qualquer proposta de formação moral (oficial e sistematizada) só faz sentido quando surge da necessidade da escola, do enfrentamento dos problemas, conflitos que surgem. Vale pensar sobre o desconhecimento das professoras em relação aos PCNS, especificamente ao tema Transversal – Ética, posto que os Parâmetros Curriculares estão há mais de uma década em vigência, não há por parte das professoras e nem do núcleo gestor da escola uma preocupação em conhecer o documento, nem portanto, uma cobrança quanto a necessidade de se trabalhar os temas transversais, como já foi enfatizado não ocorreu por parte dos docentes a assimilação da transversalidade e o que acabou se concretizando foi a supervalorização das disciplinas escolares e de seus saberes constituídos e o que não se enquadra nesse esquema acaba não se incorporando ao trabalho sistematizado da escola, ficando por conta do currículo oculto diluído no cotidiano da escola.
  • 9. A concepção de ética e moral que se encontra implícito no discurso das professoras se aproxima da concepção defendida por Durkheim no sentido de pensar a ética como um conjunto de regras e normas de conduta e de que devem por meio da disciplina ser repassados as novas gerações, não há a assunção de uma ética que pressuponha o diálogo, a autonomia e a liberdade dos educandos como sugeriu Paulo Freire. Ainda que as professoras não tenham explicitado em suas falas, o que se percebe é que as mesmas não se sentem preparadas para lidarem com questões referentes à ética e moral e diante desse sentimento acabam por tomarem atitudes diversas que em geral não ajudam a resolver os conflitos vivenciados. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS BRASIL. Secretaria de Educação Fundamental. Parâmetros Curriculares Nacionais: apresentação dos temas transversais, ética / Secretaria de Educação Fundamental. Brasília: MEC/SEF, 1997. BUBER, Martin. Do diálogo e do dialógico. São Paulo: Ed. Perspectiva S.A., 1982 BUBER, Martin. Eu e Tu. 8ª ed. São Paulo: Centauro, 2001. BUSQUETS, M. Dolors (et e all) Temas transversais em educação: bases para uma formação integral. São Paulo: Ática, 1997. DURKHEIM, Emile. Educação moral. Petrópolis, RJ: Vozes, 2008. FREIRE, Paulo. Ação cultural para a liberdade. 5a. Ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1981a. FREIRE, Paulo. A importância do ato de ler. 46ª Ed. São Paulo: Cortez, 2005. FREIRE, Paulo. Comunicação e extensão. 7a. Ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1983. FREIRE, Paulo. Educação como prática da liberdade. 12a. Ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1981b. FREIRE, Paulo. Pedagogia da autonomia. 39a. Ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1996. FREIRE, Paulo. Pedagogia do oprimido. 8a. Ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1980. FREIRE, Paulo. Pedagogia da indignação. 39ª Ed. São Paulo: Unesp, 2000. WAKSMAN V. Sentidos e sem-sentidos da educação moral. In: PIOVESAN, A.; EIDT, C.; GARCIA, C. B.; HEUSER, E. M. D.; FRAGA, P. D. (orgs). Filosofia e ensino em debate. : Ed.UNIJUI, 2002. CASTRO, E. Alonso Pensando sobre educação, ética e transversalidade. In: CASTRO, E. Alonso; OLIVEIRA, P. Ramos.(orgs.) Educando para o pensar. São Paulo: Pioneira Thomson Lear, 2002.
  • 10. A concepção de ética e moral que se encontra implícito no discurso das professoras se aproxima da concepção defendida por Durkheim no sentido de pensar a ética como um conjunto de regras e normas de conduta e de que devem por meio da disciplina ser repassados as novas gerações, não há a assunção de uma ética que pressuponha o diálogo, a autonomia e a liberdade dos educandos como sugeriu Paulo Freire. Ainda que as professoras não tenham explicitado em suas falas, o que se percebe é que as mesmas não se sentem preparadas para lidarem com questões referentes à ética e moral e diante desse sentimento acabam por tomarem atitudes diversas que em geral não ajudam a resolver os conflitos vivenciados. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS BRASIL. Secretaria de Educação Fundamental. Parâmetros Curriculares Nacionais: apresentação dos temas transversais, ética / Secretaria de Educação Fundamental. Brasília: MEC/SEF, 1997. BUBER, Martin. Do diálogo e do dialógico. São Paulo: Ed. Perspectiva S.A., 1982 BUBER, Martin. Eu e Tu. 8ª ed. São Paulo: Centauro, 2001. BUSQUETS, M. Dolors (et e all) Temas transversais em educação: bases para uma formação integral. São Paulo: Ática, 1997. DURKHEIM, Emile. Educação moral. Petrópolis, RJ: Vozes, 2008. FREIRE, Paulo. Ação cultural para a liberdade. 5a. Ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1981a. FREIRE, Paulo. A importância do ato de ler. 46ª Ed. São Paulo: Cortez, 2005. FREIRE, Paulo. Comunicação e extensão. 7a. Ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1983. FREIRE, Paulo. Educação como prática da liberdade. 12a. Ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1981b. FREIRE, Paulo. Pedagogia da autonomia. 39a. Ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1996. FREIRE, Paulo. Pedagogia do oprimido. 8a. Ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1980. FREIRE, Paulo. Pedagogia da indignação. 39ª Ed. São Paulo: Unesp, 2000. WAKSMAN V. Sentidos e sem-sentidos da educação moral. In: PIOVESAN, A.; EIDT, C.; GARCIA, C. B.; HEUSER, E. M. D.; FRAGA, P. D. (orgs). Filosofia e ensino em debate. : Ed.UNIJUI, 2002. CASTRO, E. Alonso Pensando sobre educação, ética e transversalidade. In: CASTRO, E. Alonso; OLIVEIRA, P. Ramos.(orgs.) Educando para o pensar. São Paulo: Pioneira Thomson Lear, 2002.