3. "Felizes os pais que podem mostrar a seus filhos o que seus
ancestrais conquistaram"
(ditado, sem autor, no museu de Londrina PR)
* * *
"Aquele que se mantém presente na memória dos entes queridos,
não está morto. Morto é apenas aquele que é esquecido"
(Barão Josef Cristiano von Zedlitz, poeta austríaco, 1790-1862)
* * *
O autor
René Robert Kràhenbühl
Ob. Rainweg 6
CH-4414 Füllinsdorf BL
Suíça
rene.r.kraehenbuehl@bluewin.ch
Traduções do alemão para o português Revisão da edição em português
Walter Kràhenbühl Dione Kràhembühl Salvador Haydée Kràhenbühl Padula
Rua Otávio Mazzotini, 595 Rua D. Joaquim M. Silva Leite, 40 Rua Monteiro Lobato, 72
Jardim do Lago Jardim do Lago Centro
BR-13050-016 Campinas SP BR-13050-006 Campinas SP BR-13930-000 Serra Negra SP
familiasalvador@terra.com.br hkpadula@uol.com.br
4. índice Páginas
Prefácio 1
Introdução e agradecimentos 2-3
Um cofre misterioso 4-9
Maus tempos (na Suíça) - bons tempos (no Brasil) 10-16
27 cartas dos emigrantes (traduzidas para o português) 17-71
Fotos e ilustrações 72 - 88
Apêndice
a) Glossário e Equivalentes 89 - 92
b) Câmbio, medidas e pesos 93
c) Indicação das fontes 94 - 95
d) Bibliografia 96 - 99
e) Tabelas dos filhos de João Kráyenbühl (1789-1859),
de Signau BE, (Linhagem A - H) e seus descendentes 100 - 126
f) Lista das colônias parceiras no estado de São Paulo nas 127 • 128
=
quais trabalharam imigrantes suíços e alemães
g) Mapas da Suíça: Central, Signau e arredores, Schlossrued
Mapas do Brasil: Santos, São Paulo, Campinas, Friburgo SP 129-136
h) A família do autor 137
6. Introdução e agradecimentos
Finalmente a história dos 4 irmãos de meu bisavô Ulrich Kràhenbühl 1 , que em 1854 e
1857 emigraram da Suíça para o Brasil, pode ser divulgada.
Quando, em 1977, eu terminei um levantamento da família Kràhenbühl de Signau2, esta-
va com a firme convicção de que pouco tempo seria necessário para lançar a segunda
parte da pesquisa. Mas, as diversas interrupções do trabalho no Brasil e a contínua
descoberta de novos parentes, datas históricas, documentos e fotografias, sempre me
forçaram a adiar a intenção. Tinha a impressão de que precisaria esperar pela finalização
da coleta dos dados para a publicação. Sabe-se, também, que a história familiar nunca se
conclui. Sempre há alterações nas famílias, nos locais e muitos outros acontecimentos
podem ocorrer.
Talvez ainda esperássemos muito tempo por este livro, se eu não tivesse sido motivado
pelos parentes brasileiros para transcrever a antiga escrita para a forma atual. Assim,
decidi ilustrar com fotografias a fascinante história dos Kràhenbühl e relacioná-la com a
genealogia correspondente. Esta publicação confirma o orgulho que vocês podem ter de
seus ancestrais. Ao contrário de muitos descendentes de imigrantes, vocês têm a prova
da sua origem.
Esta publicação poderá, também, fortalecer os laços familiares entre a Suíça e o Brasil.
Os raros documentos e a história dos parentes nascidos no século XIX estão prestes a
cair no esquecimento, também dentre os descendentes na Suíça. Eu espero que este
livro seja um impulso para que as novas gerações procurem contatos e os conservem.
Walter Kràhenbühl e sua filha Dione, com suas traduções, e Haydée Kràhenbühl
Padula, com suas correções, possibilitaram a edição deste livro em dois idiomas.
Um agradecimento especial do autor aos seguintes parentes, pessoas e instituições pelo
seu apoio financeiro, cooperação, estímulo, disponibilidade ou doação de documentos e
fotos:
No Brasil
Adyr José Bannwart, Campinas-SP
Alberto Morato Kràhenbühl, São Paulo-SP
Cyro & Saly Pincke Kràhenbühl, Dois Córrego-SP
Dione Kráhembühl Salvador, Campinas-SP
Elise Philipowsky Costa, Piracicaba-SP
Guido Kràhenbühl & Vilma do Carmo Costa Oliveira, Ituverava-SP
Haydée Kràhenbühl Padula, Serra Negra-SP
Helena Ferreira de Camargo, Birigüí-SP
Hélio Morato Kràhenbühl +
Henni Ingried Hein, Serra Negra-SP
Lea & Godofredo Rollbusch, Indaiatuba-SP
Marcos & Pedro Paulo Valvano Kràhenbühl, Piracicaba-SP
Maria Alvina von Ah Kràhenbühl, Campinas-SP
Mercedes Petry, Botucatú-SP
Newton & Jacy Fahl, Londrina-PR
1
Ulrich Kràhenbühl (1827-1906).
2
Vide Bibliografia n°23.
2
7. Nizze Krãhenbühl Ferraz +
Noedy Krãhenbühl Costa +
Paulo Masuti Levy, Limeira SP
Rachel Morato Krãhenbühl, Jundiaí SP
Ruy Carlos de Camargo Vieira, Brasília DF
Tácito Morato Krãhenbühl +
Walter & Ernestina Krãhenbühl, Campinas SP
Fundação Pró-Memória, Indaiatuba SP
Instituto Histórico e Geográfico de Piracicaba SP
Instituto Martius-Staden, São Paulo SP
Museu Histórico e Pedagógico Prudente de Moraes, Piracicaba SP
Unicamp, Campinas SP
Gostaria de mencionar e agradecer especialmente o patrocínio de Alberto Morato
Krãhenbühl e família (proprietários da empresa Consurb S/A, São Paulo-SP). Graças a sua
colaboração financeira, foi possível oferecer este livro a um preço reduzido e, assim,
conseguir maior número de interessados.
Sr. Alberto diz o seguinte:
"Ao conhecer a extensa e minuciosa pesquisa geneaiógica realizada com entusiasmo e dedicação por meu
primo suíço René, pude reviver várias lembranças de minha infância em Piracicaba. Meu avô João que
juntamente com seu irmão Frederico e seu pai Peter criaram a 1a fábrica de veículos de transporte e outros
artefatos mecânicos do Estado de São Paulo, conhecida como Casa Krãhenbühl, as histórias de minha avó
em seu sotaque alemão e principalmente o exemplo de vida de meu pai Pedro Krãhenbühl. Homem de
hábitos simples. Dotado de vasta cultura adquirida inicialmente nas arcadas da faculdade de direito São
Francisco. Dom nato para a política, sempre objetivando o bem comum, com inigualável desprendimento
dos bens materiais, ao longo de sua trajetória como deputado estadual por duas gestões. Espirituoso e
arguto na percepção das cenas do cotidiano e na divulgação dos acontecimentos da época, retratados em
sua coluna no "Jornal de Piracicaba", do qual foi proprietário. Campeão brasileiro de charadas. Colaborador
assíduo das palavras cruzadas do jornal "O Estado de S^oJtyjJcy. Poeta e escritor carismático.
Dedico portanto esta publicação a meu pai e a todos os seus descendentes e parentes, pois o que
somos hoje, devemos a estes homens que honraram o nosso nome e a história de nossas vidas."
Na Suíça
Ruth Gehrig-Kráhenbühl, Davos GR
Elise Kráhenbühl-Meier +
Hans Kráhenbühl-Meier, Full A G
Christian & Trudi Kráhenbühl-Meyer, Ammerswil AG
Robert & Lena Kráhenbühl-Stóckli +
Werner & Frida Krãhenbühl-Süess +
Nella Lüdi-Kráhenbühl +
Klara Meier-Kráhenbühl, Dintikon AG
Lina Schneider-Kráhenbühl, Biel/Bienne BE
Elsbeth Schweingruber-Appenzeller, Luzern LU
Nelly Sommer-Roth, Dintikon AG
Helen Suter-Hunziker +
Rita Zubler-Kráhenbühl, Dintikon AG
Arquivo Estadual de Aargau, Aarau AG
Arquivo Estadual de Graubünden GR
Dr. Béatrice Ziegler Witschi, Hinterkappelen BE
Kràhen ... Gralhas.
Krãhenbühl ...Colina das gralhas !
(Desenho por Nicole Weibel-Krãhenbühl)
8. Um cofre misterioso e 27 cartas dos emigrantes
Tudo começou na casa de minha avó Elisa Krâhenbuhl-Meier em Dintikon
Meus falecidos pais, Robert e Lena Kràhenbühl-Stõckli 3 , residiram durante mais de 40
anos em Burgdorf onde minha irmã Ruth 5 e eu 6 vivemos a nossa infância. Robert e
Lena 7 tinham uma forte tradição familiar. Não havia festa da qual não tomássemos parte,
viajando até nossos avós maternos na região do Glarnerlancf. Inicialmente de trem e
mais tarde, de carro.
No caminho fazíamos sempre uma parada em Dintikon, onde morava minha avó paterna,
Elisa Kràhenbühl-Meier, viúva de Fritz (Frederico).
Nessas terras também residiu meu bisavô Ulrich Kràhenbühl (1827-1906) (Linha F). Ele
era o sucessor do seu pai, Johannes (João) Krãyenbühl [Pai-tronco], arrendatário no
castelo de Rued. Depois da morte de sua esposa Ana Bárbara, nascida Zurflüh, em
1902, ele mudou-se para a quinta do seu filho em Dintikon, onde passou seus últimos
anos e, em 1906, foi sepultado.
Seu filho Fritz (Frederico), meu avô paterno, viveu até 1946. Por isso, minhas lembranças
dele já estão bastante desbotadas - lamentávelmente I Por ser um assíduo leitor e
escritor, ele estava sempre em contato com os emigrantes para o Brasil, irmãos e
sobrinhos de seu pai.
Da casa arrendada... ...no "Schloss" Rued... ...para Dintikon
9
Minha tia Lina ainda soube informar que os parentes brasileiros, certa vez, mandaram
um saco de café cru. Os suíços não sabiam como utilizá-lo até que, finalmente, des-
cobriram uma torrefação. Este saco vazio desapareceu, mas, felizmente, não ocorreu o
mesmo com parte das cartas que vieram do Brasil. Minha avó Elisa Kràhenbühl foi a
primeira que passou às minhas mãos alguns documentos que tinham sido conservados,
ainda com a antiga grafia alemã, para que eu - sendo criança - tivesse uma distração,
3
Na Suíça é lei e costume que a mulher tome como primeiro nome o do ma' do e segjndo o do pai.
4
Burgdorf, uma cidade de 15 000 habitantes, capital do Emmental. e aprox S.2Z z.z ~aptal Berna.
5
Ruth Vollenweider-Kráhenbühl (*1.8.1945). Vide foto na página 79.
6
René Robert Kràhenbühl (*16.3.1939).
7
Vide foto na página 80.
8
Glarnerland = estado de Glarus na Suíça oriental.
9
Lina Elise Kull-Krãhenbühl (1901-1987), filha de Fritz Krãherbü- -
4
9. permitindo-lhes conversar e "fofocar" sossegadamente. Posteriormente, recebi mais
cartas antigas de meu padrinho Werner Krãhenbühl 1 0 que era o novo proprietário da
fazenda "Krãhenbühl".
.
/W/í"r/A- 'd^jggÊ Tí.^fcL
Elisa e Fritz Kráhenbühl-Meier Ulrich e Barbara Kràhenbühl-Zurflüh (Linha F)
Naquele tempo, como filatelista, interessavam-me primeiramente selos e carimbos
postais. Foi grande a decepção, pois, os meninos da vizinhança já os haviam recortado
ou descolado. Eu conseguia ler as cartas muito vagamente. Por isso sempre tinha de
chamar minha mãe para que me ajudasse. Ela sempre me incentivava para que
aprendesse a grafia do alemão antigo, pelo que, hoje, ainda lhe sou grato. Sem esses
conhecimentos, minhas pesquisas genealógicas não teriam progredido. Os livros de
registros nas igrejas suíças, já desde o século XVI, bem como os do Brasil na época da
imigração suíço-germânica - todos na grafia da época, formam a base de cada pesquisa
familiar.
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••• •
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Primeira carta enviada pelos emigrantes em 1857.
As cartas foram endereçadas para o irmão Ulrich
em Schlossrued e mais tarde em Dintikon na Suíça.
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10
W e r n e r K r á h e n b ü h l - S ü e s s ( 1 9 0 8 - 1 9 7 9 ) , filho de Fritz K r á h e n b ü h l - M e i e r , p a d r i n h o de R e n é K r ã h e n b ü h l .
5
10. Uma nova emigração
Meu interesse por estas exóticas cartas e por seus remetentes foi despertado - e para
sempre - na ocasião em que me foi oferecido um cargo de assistente de diretoria na filial
da firma matriz, J.R. Geigy Ltda, Basiléia, em São Paulo, no ano de 1963. Imaginem a
sensação de um membro da família Kràhenbühl ao poder viajar para o Brasil um século
depois da emigração dos quatro irmãos de meu bisavô I Em 1854 e 1857, viajaram de
navio à vela r e eu aqui cheguei de avião. Estava bastante entusiasmado: o Brasil, então,
passou a ser a minha segunda Pátria 12 . Chegando ao Brasil, escrevi minha primeira carta
para o endereço dos irmãos Kràhenbühl em Piracicaba. Uma carta do ano de 1896 em
papel timbrado da firma Kràhenbühl era a única referência que eu tinha. Estava ciente de
que nem o número da casa existiria mais I
Pode-se, criticar o serviço dos correios e, principalmente, o do Brasil. Mas, no meu caso,
em especial, minha carta chegou às mãos de um funcionário do correio em Piracicaba,
que deveria ser alguém com pendores para detetive, pois a encaminhou para o Doutor
Noedy Kràhenbühl Costa, advogado muito conhecido na cidade: um gênio em
linguagens antigas e modernas, culto, autor de muitos artigos para o "Jornal de
Piracicaba", e, além disso, uma pessoa muito receptiva, o que plenamente logo vivenciei.
Sua resposta chegou em seguida e superou minhas mais ousadas expectativas. Ele fazia-
me um precioso esboço da genealogia de Peter Kràhenbühl. Pedro, assim era
chamado no Brasil, era o bisavô de Noedy. Desta forma éramos primos em 3 o g r a u e, me
deparei com uma verdadeira "mina de ouro". Até o falecimento de Noedy 14 , há seis anos,
nós mantivemos um forte contato. Suas cartas, a maioria de conteúdo histórico-familiar,
são verdadeiras obras-primas, não somente pelo seu conteúdo prazeroso, mas, também,
pela linguagem extremamente adequada, enriquecida de imagens, impregnada de
expressões em alemão, inglês, francês, latim e grego.
Ao Noedy sou muito grato pelas muitas informações e documentos. Ele presenteou-me
com o batistério original 15 do Johannes (João) Kràhenbühl, avô de Noedy, que havia
sido dado pelo padrinho Ulrich 16 ao seu afilhado. Este está de volta à Suíça e, hoje,
ocupa um lugar de honra no meu arquivo.
Também foi ele quem me mostrou o cemitério de Friburgo (Friedburg) em Campinas. Por
várias semanas, num sol ardente 17 , fiquei copiando as inscrições das lápides, sem saber
da existência do Walter Kràhenbühl nas proximidades, que, mais tarde, passou a cuidar
deste cemitério e fez uma minuciosa catalogação 18 das sepulturas.
!
MU.-m-. futmci hi f.inmvv
O endereço que deu certo ! A
fábrica «Kràhenbühl» em Pira-
c caba ainda existe - com pro-
; r a ~ a de fabricação atualizado
11
Cristiano & Pedro, de H a m c „ r g : : .ee_: T- L :: -rruérpia pelo veleiro
"Boussole".
12
Principalmente porque a nossa c r — 5 ' a • • .o—a Sã: c: . de páginas 80/81.
13
Peter (Pedro) Kràhenbühl (1824-1887
14
Noedy Kràhenbühl Costa [4." / 9" 5 - 2~ - I I . . ü e 83.
15
Vide ilustração na página 80.
16
Meu bisavô.
17
Vide foto na página 7.
18
Vide Bibliografia n c 2 6 .
6
11. Somente em 1979 19 tive a oportunidade de conhecer o Walter 2 0 Kràhenbühl e firmar uma
parceria, obtendo informações de Nicolau Kràhenbühl (Linha H).
Como sua esposa Ernestina 21 , nascida Nilson Steffen, e descendente da linhagem de
Samuel Kràhenbühl (Linha G), ficaram, assim, estabelecidos três pontos de contato para
minhas pesquisas.
Faz-se necessário, mencionar duas outras especiais senhoras: Henni Ingried Hein da
linhagem de Samuel e Haydée Kràhenbühl Padula da linhagem de Niklaus, que me
acompanharam ativamente desde 1975, nas minhas primeiras pesquisas, até hoje 22 .
Espero que a amizade de Walter e Ema como, também, da Henni e da Haydée se
conserve por muito tempo. Sem a preciosa colaboração deles, este livro não seria tal qual
hoje se apresenta, com este rico material fotográfico.
Até 1990 foi impossível detectar qualquer rastro de Cristiano Kràhenbühl (Linha D) e de
seus descendentes. Graças à pesquisa de Ruy Camargo Vieira 23 de Brasília, esta
linhagem é, também hoje, conhecida, pois Maria Kràhenbühl (1879-1978), uma filha de
Cristiano, acima mencionado, era casada com Guilherme Stein Jr 24 e participou na
fundação da Igreja Adventista 25 no Brasil.
René no calor (1979) Noedy Kràhenbühl Costa e neto Eduardo Ema N. Kràhenbühl Steffen
É um verdadeiro milagre, que 27 cartas e muitos outros documentos tenham sobrevivido
por mais de 100 anos. Partindo do princípio de que, desde 1854 26 até 1906 27 , teriam sido
escritas uma média de duas a três cartas ao ano para o meu bisavô em Schlossrued,
mais tarde em Dintikon, teríamos hoje, à disposição cerca de cem a cento e cinqüenta
cartas para pesquisa, se - sim - se elas não tivessem sido jogadas no fogão à lenha I
Mas, não quero lamentar, pois alguma coisa extraordinária - além das cartas, documentos
e da fotografia da família de Niklaus 28 , sobreviveu ao nosso tempo efêmero: o misterioso
cofre I Este deve ter sido doado ao meu tataravô Johannes (João) Kràhenbühl, ou ao
seu sucessor, meu bisavô Ulrich, pelo proprietário do castelo: Carlos Frederico Rodolfo
May von Rued 29 , para que ele pudesse guardar bem o contrato e o dinheiro do
arrendamento. Assim, também as cartas tiveram um lugar seguro porque aquele cofre,
19
Festa do Centenário da fundação da escola de Friburgo em Campinas. Vide "Correio Popular" em
Campinas, Edição de 17.10.2004 e fotos nas páginas 72, 73 e 74.
20
Walter Kràhenbühl (*27.7.1922) (Linha H).
21
Ernestina (Ema) Nilson Kràhenbühl (*8.12.1928) (Linha G).
22
Henni e Haydée moram em Serra Negra SP.
23
Vide foto na página 8.
24
Bisavô de Ruy Camargo Vieira: Vide Bibliografia n°5.
25
Vide foto na página 8.
26
Chegada de Cristiano e Pedro no Brasil.
27
Falecimento de Nicolau.
28
Foto da capa.
29
Vide Bibliografia n°20.
7
12. por meio de uma chave especial, podia ser ancorado a um armário ou ao assoalho - uma
invenção genial. Assim meu bisavô conseguiu levar consigo na sua mudança para
Dintikon, esta peça singular junto com a correspondência tão preciosa.
« AQUI DORMEM'-,
GUILHERME STE1N JIÍNIOB
* Í 3 - Í 1 . 1871 + 05-16-1957
MARIA KRÀHENBÜHL S T E I N
* 13-12-1879 + 01 - 04 - 1978
ELE
SÉTIMO DIA BATIZADO HO BRASIL,NA<SÍA
Haydée Kràhenbühl Padula + Henni Ingried
Hein (1980) BRASILEIRA.
•PRIMEIRO AÜTOR ADVENTISTA NO BHASIL.
IDVESTIFFTAS; AR K
•
•DEDIClrfôS NOSSA VICà A DEB5. ESTAHOÍ
FIEPTÍFLFFIJÍDO ATÉ O DIA DA VOLTA DE JE!
- ••
r . T E a v A M E S f E COM E L E : ,
,v n f l i j i ÂDVÈ"SírST4,DO SÉTIMO DIA
COMEMORAR 0 CENTEKARIO DA "PRIMEIRA
E S C O L A S(BATINA E FBI METRO BATISMO
I I A L I Í Ã B O S NO BRASIL, RECORDA. COM
GRATIDÃO, D E S S E S OtIERIDOS PIONEIROS
IMDALATTÍBÀ, 23 DE SETEMBRO CE ISãS,
No cemitério de Indaiatuba SP
Ruy Carlos de Camargo Vieira na Suíça junto
com Nelly + Fredy Sommer-Roth em Dintikon
Frederico (Fritz), filho do Ulrich, depois da morte de seu pai, continuou usando esse
cofre. Após o término do serviço rural, costumava sentar-se à escrivaninha para preparar
a correspondência para o Brasil. Com o seu falecimento, o cofre - mencionado
continuamente por meu pai - desapareceu. Há um ano, minha prima Rita 30 surpreendeu-
me, oferecendo-me como presente, aquele cofrezinho, encontrado na arrumação da casa.
Em péssimo estado de conservação estava esta obra-prima de um marceneiro desco-
nhecido. Depois de uma restauração bem sucedida, alegro-me, diariamente, por tê-lo
comigo.
Transcrevi para o alemão atual as vinte e sete cartas dos emigrantes. Walter Kràhenbühl
e a sua filha Dione Krãhembühl 3 1 Salvador traduziram-nas para o português, de modo
que os descendentes dos quatro imigrantes suíços pudessem lê-las, também. As notas de
rodapé têm por objetivo explicar termos desconhecidos, não usuais, localidades e
O cofre com as cartas está aberto Walter Kràhenbühl em Campinas - traduzindo
30
Rita Z u b l e r - K r ã h e n b ü h l e m Dintikon AG.
31
V i d e e x p l i c a ç ã o na p á g i n a 92, r o d a p é n ° 2 6 3 .
8
13. Notável não é somente a linda e limpa escrita dos remetentes, principalmente as do
Niklaus, logicamente por ser professor, mas, sobretudo, o conteúdo das cartas. Davam
informações sobre acontecimentos na família, mas estendiam-se em considerações sobre
condições climáticas, preços dos produtos agropecuários e demais informações impor-
tantes para a época. É impressionante observar o fato de que as pessoas, em sua maio-
ria, levando uma vida árdua num ambiente simples e rural, consi-
gam dissertar, analisar e tecer comentários pessoais sobre as
situações político-econômicas e sociais do país. Infelizmente, até
hoje não foram encontradas, no Brasil, as cartas escritas pelo meu
bisavô Ulrich para os seus irmãos, com exceção de um lindo cartão
postal do Rütli32, enviado no ano de 1905 para Niklaus e Samuel.
Espero que todas as cartas, contratos, ilustrações, fotografias como
também objetos do meu arquivo de família 33 , estejam à disposição
dos descendentes da linhagem Krãhenbühl até quando eu fizer
minha passagem.
Dione Krãhembühl Salvador
Com a publicação das vinte e sete cartas em formato de livro, tenho a satisfação de saber
que um pedaço do cofre misterioso está sendo compartilhado com a nossa família e com
o público leitor.
( a.MjW«H {Sen 1£ $í'etiyt£ei /!(•£.
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fír.f /...,. ,.,',» .• r-, . „ .. • , ;./ <„ ..'- t .,• Jt .. . . . <• r.- i.l „•:;
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7*
r- 1 . . , í-, / . V - 'Í'f* V —
* JL
- .«•' JC , JÍ, f..
Nicolau Krãhenbühl tinha uma boa escrita
Postal de „Rütli" enviado por Ulrich Krãhenbühl
32
Local histórico na Suíça situado a margem do lago de Lucerna, berço da fundação do Estado em 1291.
33
O arquivo informatizado (FAMARCHIV) contém mais de 7000 referências. O autor aceita, com prazer,
originais e cópias de fotos e outros documentos familiares.
14. Maus tempos (na Suíça) - bons tempos (no Brasil)
Por que se emigrava da Suíça naqueles tempos ?
A Suíça nem sempre foi a "terra que mina leite e mel". No século XIX, os camponeses e
também os artesãos, com uma legislação liberal, tinham menos proteção do Estado e
uma forte concorrência estrangeira, o que culminou, para muitas famílias, na fatalidade:
declarar falência e transformar-se em dependentes do auxílio social. Como, naquele tem-
po as famílias tinham muitos filhos, o problema se agravava sobremaneira.
Béatrice Ziegler descreve em seu livro "Schweizer statt Sklaven" 34 as condições de partida
como segue:
"...A legislação da República Helvetica (1798-1803), com a eliminação das servitudes e a
extinção das culturas obrigatórias na região central do país, resultou não somente numa
maior liberdade nas condições de produção - que tolhiam o desenvolvimento - mas
também expôs completamente o lavrador à economia monetária, a concorrência e quase
sempre ã obrigação de pagamentos de liberação. Logo teve início a luta pelo solo, pela
sobrevivência; ao sistema de parcelamento das áreas rurais contrapunha-se a
concentração destas.
Lavradores mais ricos começaram a utilizar o seu solo com maior investimento de capital
e se esforçaram por formar áreas arredondadas, de fácil manejo, através da compra de
parcelas menores. Medidas como a divisão de áreas municipais de uso comum e a
extinção do iivre uso de florestas empobreceram cidadãos que não possuíam área rural
própria, pois não lhes permitiam criar animais, privando-os assim de uma base -mesmo
que parca - de subsistência.
Com a eliminação das restrições profissionais na República Helvetica, também os
artesãos foram impelidos a uma concorrência, o que levou os profissionais da
comunidade, que gozavam de proteção até então, a uma grave crise ou mesmo à ruína.
Com a supressão das restrições á migração na República Helvetica iniciou-se
imediatamente uma intensa migração interna. O desemprego latente ou patente em
muitas regiões rurais levou suas vítimas a abandonar as comunidades de origem, pois
tinham a esperança de um futuro melhor nas regiões ainda fortes economicamente ou em
franco desenvolvimento, principalmente nas cidades. Isto significava um alívio efetivo para
as comunidades em que ocorria a emigração, já que os emigrantes em geral perdiam
seus direitos á ajuda e aos serviços oferecidos pelo
município...".
J Htrífy ^tj-j;nnirríx;ui, Além desta tendência geral, havia obrigações individuais. No
caso de meu tataravô, Johannes Kràyenbühl [João Kràhen-
bühl], é certo que como arrendatário, por si só, pôde oferecer
para o grande número de filhos um lar onde ninguém precisou
«^Sfiwia J
V passar fome. Além disso, o valor de 1700 francos anuais para
o arrendamento tinha de ser alcançado, havendo também a
obrigação de suplementar o proprietário do castelo com uma
parte da produção da quinta. O contrato de arrendamento
assinado em 1839 menciona, dentre outros, que "... o
arrendatário deverá fornecer gratuitamente a palha para
forração do curral ... bem como 18 hectares de batata e 15
cestas de cenoura....".
Contrato de arrendamento (1839)
34
Vide Bibliografia n°49. A citação foi traduzida pela Sra. Annagret Schellenberg, São Paulo SP.
10
15. Quem já teve a oportunidade de caminhar na colina deste castelo, pode facilmente sentir
como era dura a vida do trabalhador no campo, no curral e na quinta nos tempos de
Gotthelf 35 . Tudo isso se agravava diante da falta da esposa, mãe de família, já falecida em
1834 em Signau.
É surpreendente constatar que, com falecimento dele, em 20 de maio de 1859, cada um
de seus oito filhos herdasse quase 2000 francos 3 6 . T a m b é m naquela época era uma
vultosa soma. Certamente era resultado de grande economia.
A família Kràhenbühl natural de Signau no Emmental
Johannes Kràyenbiihl 3 7 , pai dos quatro irmãos emigrantes, Cristiano, Pedro, Samuel e
Nicolau, começou como serviçal na quinta "Grossmatf em Signau BE.Como se tornou
arrendatário no castelo de Rued, ainda hoje é desconhecido. Suponho que o fato de seu
sogro 3 8 ser arrendatário no castelo "novo" de Signau, forneceu boas referências para que
o proprietário em Schlossrued o contratasse. Após o falecimento de sua esposa Bárbara,
teve de cuidar, sozinho, dos oito filhos com idades entre 1 a 21 anos. Em vista da ameaça
de empobrecimento, a decisão de deslocar-se para Schlossrued, certamente deve ter-lhe
agradado bastante, apesar de ele e de sua família serem, por muitas gerações, 3 9 de
Emmental.
O arrendamento regulamentado prometia, no míni-
mo, saciar as bocas famintas e dar uma boa forma-
ção aos filhos que ainda estavam na casa após os
casamentos das filhas mais velhas: Elisabete e
Bárbara. Logo ficou claro que o posto de arrendatá-
rio, bastante reconhecido pela sociedade da época,
prometia renda suficiente para sustentar apenas uma
família. A situação agravou-se em virtude de uma
temível doença que se alastrou pela plantação de
A quinta „Grossmatt" perto de Signau onde bata-tas.
trabalhou Johannes Kráyenbühl (1789-1859)
Cristiano e Pedro casaram-se ainda jovens e se empenharam na formação de novas
gerações, enquanto João, Ulrich, Samuel e Nicolau continuaram ajudando o pai na
fazenda.
a yaaaasaoaaayaâ Por isso, deve ter parecido não só para eles,
OrlSEEEaE^-EimS mas também para muitos suíços na mesma
E. DE P â R A V I Ç I . J I IU ZXSMGUn situação, um verdadeiro milagre as notícias
lle&erfar^cfír-lí ttrfctrg; dos jornais de que estavam procu-rando
'tõttitll- l
; voluntários para a emigração para o Brasil. O
jutdt i>urf<f»rtft í c r b o f l c h c n í c u ?fejjtcr!H!fl'5õ€et»p&uiHt^cn.
fato de muitas comunidades apoi-arem os
I 2t.li.*I.irf-**.. ;*;«Jík
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«» j&vjfr£aí ai -:.i< j , - planos para emigração, através de
| K . áj?.
m j jfeff^Mj .. | ' j financiamento para viagem, resultou que,
3' ••••••StMf. v «iiMiitei. Stítiaw fia *t -i'-. : • •
entre 1850-1860, aproximadamente 65000
-V ! I V - -
suíços, procurassem um novo futuro, dis-
V tante da Pátria 40 .
O contrato de emigração para Pedro Kràhenbühl (1854)
35
Jeremias Gotthelf (1797-1854), pastor, professor e famoso escritor suíço em Lützelflüh BE.
36
Correspondendo hoje a aprox. 20 000 francos suíços ou aprox. R$ 50.000.
37
Johannes Krãyenbühl-Berger (1789-1859): vide tabela pai-tronco no Apêndice.
38
Pai da Magdalena, nascida Berger, (1790-1834) de Langnau i.E.
39
Em linha direta dos ancestrais se encontra Conrad [Conrado] Kráyenbühl, nascido por volta de 1549, nos
registros da igreja de Signau. Vide também brasão da família Kràhenbühl, de Signau, na página 75.
40
Conforme J.L. Spyri (Apêndice c, n° 12).
11
16. A emigração -e os remanescentes
Em 1854 Cristiano e Pedro, na idade de 32 e 30 anos, respectivamente, deixaram
Schlossrued com suas famílias, com destino à Basiléia para, em Hamburgo, embarcarem
no navio a velas "Hannover" sob o comando do capitão Büttner: Cristiano, acompanhado
de sua esposa Ana Bárbara, nascida Maurer, e de sua filha Ana Bárbara de sete anos e
Pedro com sua esposa Bárbara Margarida, nascida Zurflüh e com cinco filhos na idade
de 6 a 14 anos. O navio a velas deixou o porto em 15 de setembro 41 com destino a
Santos e ancorou em meados de novembro.
Infelizmente, não foram encontrados, com exceção do contrato de emigração, evidências,
documentos e cartas escritas pelos emigrantes do período de 1854 até 1857. Por
informações obtidas posteriormente, sabe-se que Cristiano e Pedro foram, inicialmente,
contratados pelas colônias Sete Quedas e São Lourenço. Aparentemente, davam boas
informações para os irmãos remanescentes. Estas notícias positivas vindas do Brasil,
certamente motivaram os dois irmãos, ainda solteiros, Samuel e Nicolau, a também procu-
rarem sua sorte na emigração. De sua primeira carta escrita ainda em Santos, datada de
6 de agosto de 1857, sabemos que em Antuérpia eles embarcaram no navio a velas
"Boussole" e, oito semanas depois, pisaram em terras brasileiras (vide carta n° 1 na
página 19).
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t O veleiro „Boussole" de Nicolau e Samuel (1857)
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O passaporte de Samuel Krãhenbühl
A colônia São Lourenço SP
Cópia da lista dos passageiros no arquivo (FAMARCHIV) de René Krãhenbühl.
12
17. Também eles começaram ganhando o seu pão
na fazenda de café do Senador Luiz Antônio
Souza Barros em São Lourenço. Pelas 27 en-
^ cantadoras cartas soubemos bastante sobre o
destino deles e de seus irmãos, sobre as suas
•
alegrias e tristezas, êxitos e fracassos, desa-
pegos e invejas, acrescidos de observações
muito elucidativas sobre a situação política e
econômica. Ficamos surpresos, não somente
com estas análises impressionantes, quase filo-
.1 ^
sóficas, saídas da mão de simples campone-
p
ses, mas, também, com paralelo que podemos
traçar com a situação do Brasil de hoje.
Na ocasião da morte do pai João na idade de
70 anos em Schlossrued e estando seu filho
João [Hans] já independente e estabelecido
/ / . , com sua família na aldeia vizinha de Gonten-
schwil, seu recém-casado filho Ulrich perma-
/ •,/ < neceu na quinta, assumindo o arrendamento e
passando a ser o interlocutor com seus irmãos
emigrantes.
Procuração com as assinaturas dos 4 emigrantes
Os relacionamentos não se rompem
Quem já viveu por um tempo prolongado no exterior sabe o quanto é importante ter em
sua Pátria um ancoradouro à disposição. Hoje com uma ligação ou uma mensagem
eletrônica pode-se rapidamente esclarecer e resolver muitas coisas. Em 1859, quando o
pai João foi sepultado na Suíça, não havia estes meios de comunicação. Apenas o
correio funcionava, de maneira mais lenta do que hoje: as cartas eram transportadas por
navios a vela e, mais tarde, por navios a vapor. Chegando ao porto, ainda tinham de
percorrer uma grande distância até o destinatário tanto no Brasil quanto na Suíça.
Dependiam do transporte em carroças, puxadas por cavalos e, posteriormente, de trem o
que consumia, ainda, alguns dias ou mesmo semanas.
Ulrich exerce sua missão para com os irmãos com lealdade e honestidade, resolvendo
questões de cartório e registros de modo que conseguiu transferir para cada irmão
emigrante, em 1862, a herança no valor de, aproximadamente, dois mil francos suíços 42 .
A despeito do triste momento, para as famílias na Suíça e no Brasil, o dinheiro era muito
bem vindo, pois permitia que os irmãos colonos
pagassem os empréstimos da viagem e os pri-
meiros compromissos assumidos podendo de-
clarar-se livres de débitos e independentes.
<<v ••••• • . i . A
/...../..... •.,„.-A i^/^//....^..-/^a Ulrich vai prorrogando o seu contrato em
, • .... Schlossrued até a morte de sua esposa Ana
Bárbara de Trub BE [irmã de Bárbara Mar-
' ' 7 7
garida, esposa de Pedro, sendo duplamente
cunhados/as] e só, então, muda-se para casa
Recibo da herança para Samuel Kràhenbühl d o s e u ú n i c o fi|ho prjtz e m Dintikon.
42
Vide cópia do recibo nesta página.
13
18. De volta ao Brasil
Cristiano 43 , o mais velho dos quatro irmãos, trabalha temporariamente como escriturário
no Consulado Suíço em Campinas e na cons-
trução da estrada de ferro. Dos quatro filhos que
teve, dois morreram infantes na Suíça, uma
w^' mi emigrou junto com os pais, casando-se em
glpT ? wc (tii- ~iri-o.2l5.2iT
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S gPiracicaba K e stKS'•'•" » v ^CO
E A A F l- Pauio 1870, formando a linha "Stein"44. Da outra filha,
y s C.R O C A « M C r F PÁ
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.• i M S
Cristina, nascida e registrada no Brasil, perde-
ram-se os rastros após a morte de seu pai em
1883. 45
Pedro 46 , formado em mecânica e fundição,
decide abandonar a plantação de café e trans-
formar-se num construtor de "trolys", mudando-
se para Piracicaba. Em 1870 funda com os dois
filhos Frederico e João, a casa "Krãhenbühl".
A crescente industrialização favorece o enri-
fafer«Hcf>íí§ **
05
W quecimento dele e dos filhos. Até hoje se nota,
T O ÒASSt
OA em Piracicaba, o espírito empresarial da família
Krãhenbühl.
Nota-se que os outros seis filhos também foram
CASA KRÃHENBÜHL PIRACICABA
bem sucedidos tanto na área da política como
Promoção da Casa Krãhenbühl da economia, das ciências e da literatura.
Samuel 47 e sua esposa Maria Ursula Margarida Item de Rhàzüns
GR e Nicolau 48 com sua segunda 49 esposa Anna Donatsch de
Malans GR e famílias mantêm, durante toda a vida, fortes laços
vivendo extremamente unidos, perto de Campinas, onde compram
terras e exercem uma agricultura extensa e rentável. As casas
deles, ainda existentes hoje, quase deveriam ser denominadas
mansões - testemunho do seu árduo trabalho e economia. Em
1879, juntamente com imigrantes alemães, fundam uma escola
alemã própria e dão à vila o nome de Friedburg (Friburgo)50.
Graças à sua sólida formação escolar, engajam-se ativamente na
comunidade e sobressaem-se tomando sempre novas iniciativas:
Nicolau atuou ativamente como professor por mais de dez anos.
Maria Ursula Margarida e
Samuel Krãhenbühl
43
Christian Kràhenbühl-Maurer (1822-1883): vide Linha D nas tabelas de descendentes.
44
Vide Bibliografia n°5.
45
Vide carta n°19, datada 6.6.1883 de Campinas e carta n°22, datada de 30.12.1891.
46
Peter Kràhenbühl-Zurflüh (1824-1887): vide Linha E nas tabelas de descendentes.
47
Samuel Kràhenbühl-ltem (1829-1910): vide Linha G nas tabelas de descendentes.
48
Niklaus [ou Nikolaus] Kráhenbühl-Donatsch (1833-1917]: vide Linha H nas tabelas de descendentes.
49
A sua primeira esposa, Philippina Thamerus, de Münsterappel (Alemanha), morre aos 22 anos de idade
sem deixar filhos.
50
Vide Bibliografia n°25.
14
19. Ele e Samuel dentre outras atividades abrem caminhos para construção de um cemitério
próprio, inaugurado em 6 de fevereiro de 1887, após muita oposição.
No dia 20 de julho de 1884 a sogra 51 de Samuel é a primeira pessoa a ser enterrada no
campo onde se estabeleceu mais tarde o cemitério 52 . Até hoje ele é cuidado pelos
descendentes com amor e carinho 53 .
Walter e Erna no cemitério Igreja luterana de Friburgo SP Pedra dos fundadores de Friburgo SP
com Newton, Jacy + Martha Fahl e
Henriqueta Büll (1979)
Como última testemunha da geração imigrante, morre a segunda mulher de Nicolau, Ana
Donatsch [Donatz], em 25 de julho de 1929. Ela deixa uma extensa legião de descen-
dentes sendo 14 filhos, 78 netos e inúmeros bisnetos. A sua herança é considerável 54 .
Contrato da herança de Anna (Ana) Fundadores de Friedburg/Friburgo SP perto de Campinas
Kráhenbühl-Donatz
Resumo
Os maus tempos na Suíça obrigaram a emigração dos quatro irmãos da família
Krãhenbühl para o Brasil, que no século XIX 55 aboliu a escravatura e procurou
trabalhadores especialmente para as plantações de café 56 . Embora, naquele tempo, a
imprensa européia alertasse sobre os perigos da exploração do emigrante - tema, até, de
livros 57 da época - o estabelecimento dos Krãhenbühl e dos seus descendentes trans-
51
Maria Elisabeth (Elisa) Goldmann, de Einsiedeln SZ, casada Item, de Malans GR (1805-1884).
52
Ela foi sepultada antes da conclusão do cemitério.
53
Vide foto nesta página (Walter e Erna no cemitério).
54
Vide documento de herança de 30.4.1935 nesta página.
55
Abolição da escravatura foi em 13.5.1888.
56
Vide lista das colônias parceiras no estado de São Paulo no Apêndice.
57
Vide Bibliografia n ° 3 e 4.
15
20. correu com sucesso. Isto se faz perceptível nas cartas onde não se cansam de ressaltar a
gratidão à velha Pátria e a Deus pela vida na nova terra. Neste contexto, permito-me citar
novamente Béatrice Ziegler, que finaliza o livro já citado como segue:
"...Eles (isto se refere em especial a Peter Krãhenbühl e seus descendentes) foram de
longe a mais bem sucedida das famílias listadas. Seu destino é interessante porque a
família ascendeu socialmente de uma família de simples artesãos a uma "família de
empresários". Os irmãos Krãhenbühl eram mecânicos e segeiros. Embora tivessem
assinado o contrato usual de parceria, teriam sido logo empregados como mecânicos pelo
senador Luiz Antônio de Souza Barros. Graças a uma herança conseguiram pagar suas
dívidas nos anos sessenta. A família Krãhenbühl tornou-se não só muito rica, mas
também teve acesso ã elite local de fazendeiros. A segunda geração integrou-se na
sociedade brasileira: a língua, a escolaridade e o seu ambiente geral se tornaram
brasileiros... A ascensão dos Krãhenbühl sem dúvida deveu-se de um lado à técnica e a
seus conhecimentos profissionais assim como ã completa falta de concorrentes em suas
circunjacências, e, de outro lado, à sua conseqüente integração no ambiento não-
suíço...".
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2Str íKf^íefüBflewntrbuittt.
A bela casa de Nicolau Krãhenbühl em Anna + Niklaus Krãhenbühl Nicolau Krãhenbühl foi baptizado em
Friburgo SP construída em 1900 Signau (Suíça) no dia 29.12.1833
Acrescente-se que tanto Pedro em Piracicaba como Cristiano, Nicolau e Samuel, em
Campinas e arredores, juntamente com os seus descendentes, hoje espalhados em todo
o Brasil, eram bem conscientes de suas raízes e até hoje ainda o são. No cotidiano,
valores e tradições da velha pátria são cuidados e mantidos em família e no trabalho.
O Bairro de Friburgo é um testemunho vivo desta filosofia.
Após esta descrição rudimentar sobre a bem sucedida emi/imigração dos irmãos, agora
convido os leitores e leitoras a se envolverem no mundo destes corajosos pioneiros, há
150 anos, num país ainda tão inexplorado. Através da
leitura das cartas originais 58 ao irmão Ulrich, meu
bisavô, remanescente na Suíça, o leitor terá o melhor
retrato da vida desses imigrantes pioneiros.
Signau no Emmental (aprox. 1900)
58
V i d e as 2 7 cartas d o s e m i g r a n t e s (traduzidas p a r a o p o r t u g u ê s ) .
16
21. Relação das 27 correspondências 59 que Ulrich Krãhenbühl (1827-1906)
de Signau-BE, residente em Schlossrued AG e posteriormente em
Dintikon AG (Suíça), recebeu dos irmãos Pedro, Cristiano, Nicolau e
Samuel, que emigraram para o Brasil em 1854 e 1857, bem como de
seus familiares.
N2 Localidades e datas Signatários Página
1* Santos, 6 de agosto 1857 Samuel & Nicolau 19
2 São Lourenço, 4 de julho 1860 Pedro & Cristiano 26
3 São Lourenço, 17 de maio 1861 Samuel & Nicolau 27
4* Campinas, 25 de dezembro 1862 Nicolau 29
5 Sítio Posse, 25 de dezembro 1863 Nicolau 31
6 Sítio Posse, 8 de outubro 1864 Nicolau 33
7 Campinas, 25 de novembro 1864 Nicolau 34
8 St. Lorenzo, 17 de julho 1865 Pedro 36
9* Campinas, 16 de dezembro 1866 Nicolau 38
10* Campinas, 2 de junho 1871 Nicolau 40
11 Piracicaba, 7 de setembro 1872 Pedro 43
12* Campinas, 21 de novembro 1873 Nicolau 44
13 Campinas, 20 de novembro 1874 Nicolau 47
14 Campinas, 23 de abril 1875 Nicolau 48
15 Campinas, 20 de setembro 1877 Cristiano 50
16* Campinas, 13 de dezembro 1878 Nicolau 51
17 Friedburg, 13 de abril 1882 Nicolau 53
18 Piracicaba, 8 de janeiro 1883 Pedro e sua esposa Margarida 56
19 Campinas, 6 de junho 1883 Cristina, filha de Pedro 57
20 Piracicaba, 6 de junho 1888 Margarida, esposa de Pedro 58
21 Piracicaba, 4 de abril 1890 Margarida, esposa de Pedro 60
22* Friedburg, 30 de dezembro 1891 Nicolau 62
23 Friedburg, 3 de maio 1893 Nicolau 65
59
Os originais das cartas estão no arquivo pessoal (FAMARCHIV) de René Krãhenbühl.
17
22. 24 Piracicaba, 10 de julho 1896 Frederico, filho de Pedro 66
25 Piracicaba, 31 de janeiro 1899 João, filho de Pedro 67
26 Friedburg, 27 de outubro 1902 Nicolau 68
27* Friedburg, 11 de setembro 1906 Nicolau para o seu sobrinho 70
Frederico (filho de Ulrich)
* = reproduzidas na publicação "Castelo da Paz" por Walter Krãhenbühl, de Campinas SP
em julho de 199260.
Observações
• Para melhor compreensão, muitas vezes o texto teve que ser dividido em novas seções.
• Na tradução das cartas para o português, procurou-se preservar a construção da frase
original para que não se perdesse o caráter espontâneo das mesmas, sua originalidade e
simplicidade.
• Deixamos, porém, de propósito, a linguagem da época e o modo de expressar dos
remetentes das cartas.
• Explicações complementares foram inseridas entre colchetes pelo autor.
® Nomes de pessoas estão em negrito quando, pela primeira vez, aparecem numa página,
e localidades aparecem em itálico, com o objetivo de salientá-los, facilitando a consulta.
60
Vide Bibliografia n°25.
18
23. BR-1 Santos, 6 de agosto de 1857
Amado pai 61 , irmãos, irmã, parentes e conhecidos,
Desde que os deixamos já decorreu bastante tempo e, certamente, muitas vezes vocês
devem ter imaginado como estaríamos passando: se ainda vivíamos, ou se as águas do
mar nos teriam tragado. Até, agora, nada de mal nos aconteceu e estamos, graças a
Deus, muito bem e, também, com saúde. Chegamos a Santos no dia 15 de julho.
De Antuérpia62 escrevemos-lhes uma carta 63 no dia 10 de maio, espero que a tenham
recebido. O embarque não aconteceu no dia 11, como havíamos escrito, pois deveriam
chegar ainda mais pessoas, e por isso, o embarque foi prorrogado para o dia 20. Já
navegávamos na saída do porto, quando elas chegaram. Foi, então, lançada âncora e
estas pessoas, aproximadamente 30, ainda embarcaram.
Em Antuérpia a espera foi bastante enfadonha, pois ela é uma grande cidade sem
nenhuma montanha. Ali há cavalos muito grandes e fortes. Na torre da grande igreja há
um carrilhão, que, a cada quarto de hora, toca lindas melodias e, na hora completa, toca
durante 5 minutos.
Diziam sempre que nos países baixos não se ouvem os trovões. Na realidade, não é
assim, pois nos dias 11 e 12 passaram tempestades sobre Antuérpia com fortes relâm-
pagos e trovões. Verdade é que não tão fortes como lá na Suíça. Fora isso, tivemos
sempre tempo bom.
De Basei até Antuérpia não foi necessário pagar nada pelos nossos caixotes. Um
secretário da "Steinmann" 64 havia exigido de nós 2 francos, alegando que ele havia pago
esta importância lá na estação. Mas, depois, devolveu-os dizendo que o escritório pagaria
tudo.
Por estes dias, a emigração via Antuérpia foi bastante intensa. Só em nosso alojamento
estiveram abrigadas, por algum tempo, mais de 100 pessoas e o mesmo ocorreu no
alojamento da "Cidade de Luxemburgo", onde estavam também muitos suíços. Cerca de
oito dias antes do nosso, partiu um navio com destino ao Rio Grande do Sul. Dois dias
antes, partiu um e, junto com o nosso, outro para a América do Norte.
Quando esperávamos em Antuérpia, pagamos ao Senhor Steinmann, 40 francos cada
um, para podermos nos alojar no camarote. Então recebemos camas e louças. As camas
eram compostas de colchões e travesseiros feitos com capim e os cobertores de algodão.
Os utensílios eram constituídos de um pequeno caldeirão, no qual era servida a comida e
onde, mais tarde, também cozinhávamos a sopa; uma jarra para água, um bule para café,
duas tigelas, duas canecas, duas colheres e 2 garfos. Tudo era feito de folha de flandres.
Nosso navio tinha dois mastros e se chamava "Boussole 65 ". Tinha 42 passos 66 de
comprimento e 6 Vá de largura. Atrás e na frente, era um pouco mais estreito e ficava,
61
Esta carta foi dirigida ao pai Johannes Kràhenbühl, Lehenmann no castelo de Rued (vide ilustração na
página 4).
62
Antuérpia era, além dos portos de Bremen e Hamburgo, o mais importante para a emigração dirigida ao
Brasil.
63
Infelizmente, nem todas as cartas enviadas foram salvas, muitas foram perdidas ou queimadas pelas
famílias seguintes à Ulrich Kràhenbühl. A carta, em referência, também.
64
Steinmann era uma das muitas agências de viagem para emigração. Vide ilustração na página 11.
65
Vide ilustração na página 12.
66
1 passo = 7 1 - 7 5 cm.
19
24. contando o corrimão, mais ou menos 10 pés 67 acima da água. As laterais desciam quase
reto até a água. A parte da frente saía inclinada para fora da água e a parte acima da
água era arredondada. Onde estava em contato com a água era mais pontiaguda e de
uma construção especial. Também a parte de trás saía inclinada para fora da água. A
parte que ficava submersa, era chapeada de ferro. O quanto estava submersa, não
sabemos. O compartimento mais profundo do navio chamava porão. Qual a sua
profundidade, também não sabemos, pois, bem no fundo havia carvão, e em cima deste,
barricas com água, barricas com carne, batatas e outros caixotes. No compartimento
intermediário, bem na frente, estava o alojamento dos marinheiros; é claro, isolado do
restante do compartimento. Em seguida, a parte dos passageiros com mais ou menos 51/2
pés de altura. Nas laterais, estavam as camas, duas sobrepostas, com capacidade para 4
pessoas cada. A de baixo ficava mais ou menos a V2 pé acima do piso. Atrás destas,
havia mais um porão.
Na proa, havia uma bomba para bombear a água do mar. Em seguida, a roldana para
baixar e levantar a âncora, depois, a entrada para o alojamento dos marinheiros. Logo
adiante ficava o mastro dianteiro, a cozinha dos passageiros, a entrada da frente do
compartimento intermediário, a cozinha do camarote, a abertura por onde os barris,
pacotes e caixotes eram baixados e içados; depois o mastro traseiro, depois a bomba de
tirar a água que penetra no navio, em seguida a entrada traseira para o compartimento
intermediário e, por último, o camarote. Este tinha 8 passos de comprimento e 5 de
largura. No camarote, as camas eram individuais. Por trás da cabina, finalmente, estava a
roda da direção e a barra do leme.
Em volta de todo convés, havia um corrimão de 41/2 pés de altura, com aberturas para
saída da água que era arremessada a bordo. A parte da frente era de madeira bastante
grossa. Cada mastro podia ter aproximadamente 70 pés de altura e era formado de três
partes cada um. No mastro dianteiro - ambos estavam um pouco inclinados para trás -
havia 3 e, no de trás, 4 velas sobrepostas. No mastro inferior poderia ter mais ou menos
40 pés de comprimento e as superiores eram menores. Em cada mastro havia ainda uma
vela lateral, que era usada com vento lateral que, aliás, é o melhor. Bem na frente, na
proa, havia outro mastro, bastante inclinado para frente sobre a água e era chamado de
mastro de quilha. Neste havia também 3 velas, que eram usadas somente com vento
lateral. Quando o vento era fraco e principalmente quando vinha de trás, então eram
estendidas velas menores junto às grandes e que eram chamadas de "velas de arrasto".
Nosso navio era um bom veleiro, pois deixamos para trás vários navios, mesmo menores
com 3 mastros. Assim, no dia 27 de junho alcançamos um que deixou Antuérpia 9 ou 10
dias antes de nós com destino ao Rio. Vimos navios quase todos os dias. Quando
navegávamos pelo canal, ali, não raro podiam-se contar 8, 10, 12 e até mais.
A tripulação de nosso navio era composta de 146 pessoas, 197 passageiros, entre eles
muitas crianças, 5 marinheiros, (um já embarcou doente - ele tremia pelo corpo todo), o
capitão, o timoneiro, o contramestre e 1 grumete 68 .
Alguns dentre os passageiros não tinham muita higiene, principalmente as mulheres. O
passageiro mais idoso tinha 65 anos. Entre os passageiros havia muitos provenientes da
Prússia. Nós éramos os únicos suíços, mas convivemos muito bem com todos. Nunca
recebemos, nem da tripulação, nem da parte dos passageiros, uma palavra rude. Italianos
e Franceses não havia no nosso navio, como erradamente havíamos escrito e, sim, duas
famílias belgas, que falavam o mesmo "flamengo" como se fala também em Antuérpia.
67
1 pé = 30-33 cm.
68
Marinheiro de inferior graduação.
20
25. A comida era preparada por dois passageiros, que provavelmente eram pagos pelo
"Steinmann". Havia um outro que era encarregado de buscar os alimentos e entregá-los
aos cozinheiros. A cozinha, como vocês poderão ver, era muito pequena. De um lado
media 6 pés, do outro somente 4. Sobre o fogão podiam ser colocadas 6 panelas, mas só
4 recebiam a chama direta, as outras duas recebiam o calor indireto. Antes de começar o
enjôo, também faziam café, mas durante o tempo do enjôo e mesmo depois, faziam
somente aqueles que queriam, pois a maioria não gostava mais de café, inclusive nós.
Leite usávamos somente nas torradas, no café não era muito bom, pois geralmente
talhava.
Durante o enjôo só cozinhavam duas vezes por dia, ao meio dia e a noite. De manhã, a
maioria fazia para si uma sopa, nós também, é claro uma sopa "cega" 69 pois no navio não
havia nem manteiga, nem banha. Os outros passageiros tinham consigo farinha, ovos,
manteiga, pão, presunto e toucinho e com isso cozinhavam algo melhor. No tempo de
enjôo é muito bom ter destas coisas consigo. Também frutas secas, farinha torrada,
migalhas de pão torrado, queijo, "Schabzieger" 70 e uma boa aguardente 71 são recomen-
dados. Também leite é bom. Nós estávamos muito contentes com nosso suco de cereja e
ameixa, pois no tempo do enjôo davam pouca carne bovina, arroz queimado e batatas
cozidas. Nada disso tínhamos vontade de comer. Por muitas vezes, bem que teríamos
comido alguma coisa, mas não tínhamos apetite para nada, e ficar sem comer também
não é bom.
Perto da costa chegaram até o navio três homens com um barco, vendendo pão, fumo e
açúcar. Também compramos um pãozinho deles. Agora comíamos um bocado de pão,
com um gole de "Schnaps" e isso nos animava bastante. Mas, o pão acabou antes do
enjôo. Quando se quiser levar pão a bordo, não se deve levá-lo de casa, mas comprá-lo
na cidade do porto, para que não se estrague antes do embarque. Quando o enjôo havia
passado, cozinhava-se novamente três vezes por dia. De manhã davam uma sopa de
batatas, é claro, sem farinha ou pão, quatro panelas cheias. Para nós dois vinha uma
quantia que um só não ficava satisfeito. Ao meio dia, davam arroz ou feijão, ervilhas ou
cevadinha, que é uma espécie de cevada. Eram seis panelas cheias, também davam
carne de boi ou de porco. A cevadinha e o arroz não eram muito apetitosos. À noite
cozinhavam seis panelas de batatas. Essas comíamos com sal, alguns dias depois foi
distribuída a carne de porco crua, porque a maior parte era toucinho. A partir daí fazíamos
carne grelhada ou salada, mas muitas vezes tínhamos de esperar bastante até conseguir
entrar na cozinha, porque lá cozinhavam de manhã até tarde da noite e, também, sempre
tínhamos de procurar por uma frigideira ou uma lata. No dia 25 de junho acabaram as
batatas. A partir dai, cozinhavam novamente duas vezes por dia, de manhã: arroz e
cevadinha; à tarde: feijão ou ervilhas, às vezes também arroz ou cevada, mas todos os
dias davam carne bovina.
Pegávamos água todos os dias e ela era, mais ou menos, suficiente. Cada família pegava
para si, mas tinha de ceder parte dela para cozinhar. Todas as semanas davam um pouco
de vinagre e duas colheres de açúcar por pessoa. Pão torrado nós dois recebíamos 7
libras 72 por semana. Depois que distribuíram carne crua de porco, também recebíamos
farinha, uma caneca duas vezes por semana, por pessoa. Desta, mandávamos fazer
panquecas, que eram muito gostosas. Nós cuidávamos de ter sempre uma boa reserva
de toucinho, pois ovos, ou coisa semelhante, não tínhamos para misturar. Carne bovina e
de porco, davam, em geral, pequenas porções, não muito mais que um bom bocado. Na
69
Cega no sentido de "sem olhos", porque não continha manteiga ou gordura !
70
"Schabzieger" é um tipo de queijo duro, contendo ervas: uma especialidade do estado de Glarus.
71
"Kirsch" (aguardente suíça feita de cereja), ou "Schnaps" (aguardente suíça tipo bagaceira).
72
Uma libra eqüivale a 0,453 kg.
21
26. verdade, sempre tivemos que jejuar um pouco, o que, para quem não trabalha, até que é
tolerável, apesar de que, depois do enjôo, tínhamos muito apetite. Não aconselhamos a
ninguém emigrar via Antuérpia, pois como fomos informados, via Hamburgo73 é muito
melhor, principalmente com a alimentação.
No dia 21, foi novamente levantada a âncora, mas avançamos somente até por volta de
meio dia. Não havia quase nada de vento e com a chegada da maré, fomos obrigados a
ancorar de novo, pois até Antuérpia tanto a maré cheia como a baixa, são muito fortes. No
dia 22, finalmente, com vento forte saímos para o mar. Perto da costa, no quebradouro, o
vento não era favorável, ele vinha quase que contra nós e, por isso, tivemos de navegar
em bordejo [vaivém], as velas tinham de ser sempre viradas e corrigidas as suas
posições. O vento era tão forte, que chegou a inclinar tanto o navio, que parecia tombar.
No convés, quase ninguém conseguiu se manter em pé. No mar, o vento era bem
favorável e avançamos rapidamente. Em alto mar, o piloto que nos acompanhou desde
Antuérpia, deixou nosso navio, voltando de barco para Antuérpia. Com tempo encoberto e
tempestade, o mar tem um tom verde-escuro. Com tempo bom, parece mais azul-escuro.
Próximo à terra, toma sempre uma cor de verde-sujo.
Os primeiros 14 dias, em que estivemos no mar, foram bastante chuvosos, frios e
tempestuosos. Muitas vezes era arremessada grande quantidade de água sobre o
convés. Quando alguém olhava preocupado para aquilo, os marinheiros diziam que isso
ainda não era nada, que ainda podia ficar pior, que é assim mesmo com tempestade.
Durante este tempo, passamos muito frio, dia e noite. Estaríamos muito contentes se
tivéssemos conosco as nossas ceroulas. O mesmo aconteceu com quase todos os
passageiros. No segundo dia em que estávamos em alto mar, começou o enjôo.
Começou bastante forte e durou aproximadamente oito dias, para alguns até mais, outros
nem foram atingidos. Nós passamos, mais ou menos. Devido ao mau tempo o navio
balançava terrivelmente.
Em 5 dias, navegamos pelo canal. Da costa inglesa podia-se avistar alguma coisa, mas
da francesa nada, pois estava tudo encoberto. A partir do dia 10 de junho tivemos tempo
bom, sem tempestades e também mais quente. O tempo permaneceu bom até o dia 28
de junho. De 28 de junho até 9 de julho, tivemos mau tempo, mas a partir daí, até a
chegada, tivemos tempo bom. No mar, o tempo é muito variável, muda a cada instante.
Na manhã do dia 11 de junho, avistamos a Ilha da Madeira. É uma das ilhas canárias do
norte. Pertence ao continente africano, mas é habitada pelos portugueses. Da Ilha
Antônia, da qual os nossos irmãos escreveram, não vimos nada. No domingo, dia 21 de
junho, os marinheiros e alguns passageiros fizeram uma encenação. Vestiram fantasias e
se mascararam com tintas, e um deles, seminu, representava "Netuno", o deus dos
mares, prometeu conduzir-nos em segurança até Santos. No final, ele ordenou o batismo
e, então, pegaram água e jogaram sobre as pessoas. À noite desceram um barril pequeno
até o mar, que continha resina e alcatrão e que foi incendiado. O capitão dizia que este
era o "cometa" que deveria destruir a terra.
Se tivéssemos tido vento no decorrer da semana, teríamos atingido a linha do equador,
mas tivemos calmaria por três dias. Isso aconteceu só no dia 28. A temperatura era
agradável. Na manhã do dia 9 de julho avistamos as montanhas do Continente Brasileiro.
Poderíamos ter chegado a Santos ainda nesse dia, mas o vento nos abandonou. Para
chegar a Santos é necessário navegar por um braço de mar. Por falta de vento, pudemos
embocar, apenas, no dia 12, quando então navegamos até próximo à fortaleza e ali
ancoramos novamente, porque o vento não era favorável. De manhã, então, veio um
73
O porto de embarque importante para o Brasil era Antuérpia, logo depois de Hamburgo e Bremen.
22
27. piloto, numa canoa, que nos deveria conduzir até Santos. A partir daí o capitão não
mandava mais nada, quem mandava agora, era o piloto. Nesse dia, pudemos navegar só
até o forte e lá foi preciso ancorar novamente. Então, a polícia veio ao navio. Aqui a
tripulação também tinha de ser examinada por um médico, assim como aconteceu em
Antuérpia. Pelo médico tivemos que esperar um dia, pois ele tinha de vir de Santos. Ali
comemos as primeiras frutas brasileiras. O capitão, o piloto e dois marinheiros foram com
um barco até a costa e trouxeram frutas. Também rosas e outras flores, ainda que agora
aqui seja inverno. Das frutas ganhamos duas bananas cada um, que eram muito
gostosas. Na manhã do dia 14, chegou, enfim, o médico. Mas, de pouco valeu, pois,
apenas, a metade das pessoas ainda estava no convés e por isso ele logo se retirou
novamente.
Nesse dia, finalmente, chegamos a Santos, pois estávamos distantes, apenas, uma hora.
A partir do forte, um policial nos acompanhou a bordo. Assim que chegamos a Santos, a
polícia subiu a bordo, mas ainda não pudemos desembarcar e tivemos que dormir, mais
uma vez, no navio. Também dois policiais ficaram a bordo. Em 15 de julho, tivemos de
entregar os passaportes e só aí teve início o desembarque. Passageiros e caixotes foram
levados em barcos até á margem, pois o navio não chegava até lá. As caixas tiveram que
ser examinadas primeiro no navio. Aqui a inspeção foi mais rigorosa, mas ninguém
perdeu nada. Se alguém tem muita bagagem, é bom colocar alguns "Mil-réis" no bolso do
policial.
Ficamos muito alegres em poder pisar novamente em terra firme. Foi bom que saímos do
navio, pois começaram algumas brigas a bordo e, com isso, talvez até seriam tomados de
nós alguns pertences. Ficamos sem dois lenços de pescoço, três cachimbos, 1 pequena
gramática e 2 pentes de bolso. Tudo, inclusive a gramática desapareceu do camarote.
Pela gramática e os cachimbos, nós sentimos muito, pois a gramática agora seria muito
útil para nós e os cachimbos não pudemos comprar em Antuérpia, porque lá não
encontramos de boa qualidade. (Espingardas e pistolas eram baratos em Antuérpia). Em
Santos fomos alojados numa hospedaria, onde nos foi permitido ficar gratuitamente por
dois dias. Ali a comida era boa.
Até aqui estivemos exatamente oito semanas, ou 56 dias no mar, e deixamos para trás
aproximadamente 1500 milhas alemãs ou geográficas 74 . Tivemos uma viagem feliz, sem
tempestades, sem nenhuma doença a bordo. Poderia facilmente ter surgido alguma
doença, pois o espaço no alojamento intermediário era muito pequeno para tanta gente.
De lavar o alojamento, conforme nossos irmãos escreveram, nunca se falou nada, pois o
espaço que não era ocupado pelas camas, estava quase todo tomado por caixas e
caixotes, de tal maneira que quase não se podia passar. Nós também tínhamos uma
caixa no porão deste compartimento. Nós estávamos contentes por nos alojarmos no
camarote. Pagamos para isso mas não nos arrependemos, pois no compartimento
intermediário havia sempre um cheiro desagradável, ou melhor dizendo, um fedor. O
melhor de tudo foi que tivemos uma boa tripulação, todos ainda jovens, até o capitão. A
todos temos de dar os nossos melhores elogios.
O "Gigersami" [Samuel Gyger 75 ] escreveu uma frase sobre as mulheres e os marinheiros.
Neste aspecto ele tinha certa razão, pois em nosso navio aconteceu algo semelhante.
O marinheiro que embarcou já doente, morreu. Ele foi embrulhado e costurado numa lona
velha e, em seguida, baixado ao mar. Ele era um terrível pinguço. Parecia ter, no mínimo,
50 anos, quando na realidade tinha, apenas, 32. Fora esse, não morreu ninguém, todos
chegaram com saúde. "Pois no mar e na terra, nós estamos nas mãos de Deus" ["Denn
zu Meer und zu Land, wir Menschen sind in Gottes Hand"].
74
1 milha alemã = 7,420 km.
75
Pessoa desconhecida.
23
28. Em nosso navio também havia colonos para Vergueiro 7 6 , mas não pudemos subir com
eles, pois disseram que Vergueiro não quer saber mais nada de suíços. 77 Um certo Müller
de Zurich está lá com Vergueiro e este veio até o alojamento para encontrar os colonos.
Mas ele não se comportou como nosso compatriota, pois "comia do pão do Vergueiro".
Nós pedimos informações de Samuel von Loo 78 , e aí fomos encaminhados para um
alemão de nome Wagner. Este não estava mais lá, realmente esteve ali por algum tempo,
mas, atualmente, estaria trabalhando na estrada perto de São Paulo.
Matter 79 também não está mais em Santos. Eles desistiram de sua venda. Ele agora é
ambulante de várias mercadorias. Esteve por aqui nestes dias com três mulas. Com o
Wagner encontramos um outro suíço de Sumiswalcf O Wagner, que é homem muito
honesto, aconselhou-nos a não subir, mas primeiro escrever para nossos irmãos, dando a
notícia da nossa chegada, pois ele disse que alugar um guia com animais nos custaria
muito dinheiro. Se os nossos irmãos estivessem em boa situação então, certamente,
desceria um deles para nos buscar. Segundo ele, como no passado também já ouvimos
dizer, nas colônias não é tudo assim como deveria ser, pois algumas famílias pagaram o
transporte de suas bagagens e, ainda, tinham alguma reserva financeira ao chegar nas
colônias e, agora, teriam muitas dívidas. Por outro lado também fomos informados de que
não devemos nos preocupar com isso, pois Lourenço [São Lourenço] é uma das melhores
colônias. Sobre isso em breve poderemos dar notícias mais detalhadas, pois já escre-
vemos para os nossos irmãos 81 .
Queríamos ir até Cubatão, que fica cerca de três horas daqui, para trabalhar lá na
estrada, mas fomos informados em tempo, que lá eles não aceitam mais ninguém.
Samuel ficou com Wagner e para mim [Niklaus] o Wagner conseguiu um lugar com um
português, ou brasileiro.
Nós dois iniciamos um trabalho no dia 18 de julho. Nós nos encontramos com freqüência,
pois estamos na mesma cidade. Por quanto tempo vamos ficar por aqui, não sabemos,
vamos esperar pela resposta de nossos irmãos. De qualquer maneira, aqui não é um
ambiente saudável: o que não é morro, é charco, em redor de Santos. Também chove
muito aqui. Para mim, o pior é o idioma, pois na casa onde estou, ninguém sabe uma
palavra em alemão.
Em Santos, há muito comércio, belas lojas, vendas há aos montes e, também, outros
estabelecimentos. Meu patrão tem uma venda. Aqui tudo é muito caro.
Terminamos agora esta carta, mas queremos escrever em breve novamente, quando
poderemos dar melhores informações sobre tudo. Quando receberem esta carta,
escrevam logo, dizendo se estão com saúde, ou como estão vocês. Se caso nós não
estivermos mais aqui, certamente vamos encontrar ajuda para, mesmo assim, recebê-la.
Saudamos a todos mil vezes, principalmente ao pai, e esperamos que esta carta encontre
todos bem e com saúde. Saudamos também o coral masculino e demais amigos.
Niklaus Krãhenbühl Samuel Krãhenbühl
76
Nicolau Pereira de Campos Vergueiro era Senador e um dos maiores proprietários de cafezais.
77
A razão deve ter sido por causa da revolta de suíços na colônia Ibicaba. Vide Bibliografia n ° 3 & 4.
78
Pessoa desconhecida.
79
Pessoa desconhecida.
80
Aldeia no Emmental.
81
Trata-se dos irmãos Cristiano e Pedro que já haviam emigrado em 1854 via Hamburgo.
24
29. Deve-se usar o seguinte endereço:
Irmãos Krãhenbühl
aos cuidados de Sekose Seitenthal,
ferreiro fabricante de cubos 82
Santos
As cartas poderiam ser enviadas só para um de nós como vocês preferirem. Mas de
qualquer forma em letras francesas 83 . As cartas que nos foram confiadas, já colocamos
no correio.
Na época de 1854 e 1857 ainda não existia estrada de ferro...
82
Uma profissão daquele tempo para "trolys".
83
A grafia alemã não era compreensível no Brasil, por isso a solicitação.
25
30. BR-2 Colônia São Lourenço84, 4 de julho de 1860
Amados irmãos,
Em sua carta de 19.2.1860, endereçada a nosso irmão Niklaus, vimos a triste notícia do
falecimento de nosso pai. Além disso, vimos também, que a nossa dívida na nossa pátria,
referente a despesas de herança, foi cancelada, ou que o nosso credor a pagou com o
dinheiro de nossa herança. 85 Agora nossa dívida na pátria foi cancelada mas, mesmo
assim, nós continuamos a contabilizá-la para efeito do cálculo dos juros, enquanto não
temos os recibos de quitação.
Agora, gostaríamos de lhes pedir, como também a nosso irmão que providenciassem
esses recibos, um do Senhor May 86 e um da comissão da divisão da herança no tabelião.
Mas, tudo deve ser muito bem feito. Os recibos devem ter selo da Comunidade, selo da
Chancelaria do Estado e também o nacional. Ainda são necessários a assinatura e o selo
do Embaixador Brasileiro ou do Cônsul na Suíça.
Por favor, providenciem estes recibos de quitação o mais rápido possível, pois
gostaríamos de recebê-los enquanto o Senhor Tschudi S / ainda está aqui no país. Pode
acontecer que nosso patrão não queira aceitá-los, então, queremos que o Tschudi ne-
gocie com ele. Quando ele vier à colônia, como foi dito que provavelmente ele virá, então
queremos falar antes com ele. Para o pagamento de eventuais despesas e para o seu
trabalho, pegue dinheiro dos juros da sua herança.
Gostaríamos de receber o mais rápido possível a herança que ainda nos cabe. Escrevam-
nos, informando com quem vai estar o dinheiro e a quem devemos nos dirigir e se uma
carta nossa será suficiente para receber o dinheiro, ou então, como deverá ser feito.
Ainda uma observação: nós viemos para este país com destino à propriedade de
Vergueiro 88 , mas, já, em Santos, Vergueiro nos transferiu para o atual patrão: Senhor
Luiz Antônio 89 . Luiz Antônio liquidou todas as despesas que Vergueiro teve com nossa
viagem desde a nossa pátria. Agora, ou o Vergueiro não pagou a despesa na Suíça, ou o
Senhor May a recebeu duas vezes. May, na verdade, nem teria o direito de recebê-lo,
pois teria que repassá-lo para o Vergueiro. O Senhor May disse, também, formalmente,
que ele daria esse dinheiro, somente para um teste, para ver se seria devolvido ou não.
Nós e nossas famílias estamos todos bem de saúde e os filhos já cresceram bastante.
Nós todos de nossas famílias enviamos a vocês todos nossas cordiais saudações.
Seus irmãos Peter Kràhenbühl Christian Kràhenbühl
84
São Lourenço era uma das muitas colônias de café. Vide foto na página 12.
85
A herança recebida após o falecimento do pai João.
86
Von May era o dono do castelo de "Rued", no qual trabalhava o irmão Ulrich Kràhenbühl.
87
J.J Tschudi era o delegado extraordinário do Conselho Federal Suíço, para investigar as condições de
trabalho nas colônias.
88
José Vergueiro era proprietário da fazenda Ibicaba próxima a Limeira SP.
89
Luiz Antônio de Souza Barros, proprietário da colônia São Lourenço, situada entre Piracicaba e Rio Claro.
26
31. BR-3 São Lourenço, 17 de maio de 1861
Muito amado irmão !
Sua carta de 16 de dezembro de 1860 recebi corretamente e a enviei, em seguida, para
meus irmãos em São Lourenço. Enquanto não estivermos todos reunidos, não poderemos
fazer nada em relação à nossa herança porque moro três léguas 90 distante de Campinas,
na direção de Itu. Quando me desliguei do serviço da estrada, lá cheguei e encontrei um
alemão de nome Friedrich [Frederico] Thamerus 91 e agora, em janeiro, me casei com a
filha dele, a Philippina 92 . Até hoje estou com meu sogro, que tem bastantes terras. Agora,
estou com idéia de também comprar terras. Estou muito contente com minha mulher, com
meu sogro e com todos da casa. No mês de maio, meu sogro e eu subimos até São
Lourenço, distante 14 léguas. Antes, quase não se conseguia andar por aquele caminho
ruim.
Informo-lhe que, conforme você nos orientou, fizemos no Judiciário em Piracicaba
procuração de plenos-poderes 93 , que será enviada a seguir. Atestados de vida não
mandamos fazer porque nos disseram que estes seriam desnecessários, já que tivemos
que assinar de próprio punho a certidão e, que isso seria suficiente prova de vida porque
os mortos não podem escrever mais.
Agora pedimos a você que, quando receber a procuração, faça com que, o mais rápido
possível, possa nos enviar a nossa herança, pois todos nós necessitamos muito dela.
Você deve saber aonde obter uma letra de câmbio: O Banco de Zurich está em contato
com casas de comércio no Rio de Janeiro, outra seria a casa Volenweiler [Vollenweider]
em Liestai, que negocia com Rio de Janeiro; em Schõftland, Walti & Lüthi [deve tratar-se
de Walter & Lüthi em Schõftland, estado de Aargau] poderão orientar onde poderão
conseguir um intercâmbio. Provavelmente a remessa deve ser feita por intermédio do
Cônsul no Rio, pois através dele, nós também enviaremos o nosso documento. Se, por
algum motivo, os de Signau não quiserem aceitar a procuração, alegando não estar certa
e não quiserem liberar o nosso bem hereditário, então vá até autoridades superiores.
Se ela foi averiguada pelo Cônsul então, com certeza, ela é correta e tem valor. Para o
seu esforço, trabalho e perda de tempo retire do saldo a quantidade suficiente para você
ficar contente. Os de Signau devem prestar contas a você 94 .
O que o Tschudi 9 5 fez aqui, não posso informar. Pelo que se sabe, não fez nada. A
informação é que ele encontrou tudo bem em ordem, mesmo que em muitos lugares reine
muita desordem. Em São Lourenço ele permaneceu, talvez, duas ou três horas. Cristiano
apenas conseguiu falar com ele sobre a dívida da pátria. Então ele o informou que,
certamente, os recibos serão enviados a ele, todo o restante ele providenciará. Mas,
como de início foi anunciado, ele já está de posse dos recibos, e até aqui nada foi
providenciado. No jornal alemão de Petrópolis, nós lemos que em breve Tschudi viajará
novamente. Agora, nossos irmãos, têm esperança de que ele pague duas vezes a dívida
da pátria, isto é, aqui e na Suíça.
Com as receitas, até agora, não fizemos nenhuma experiência. Dos costumes, das frutas
e das árvores daqui agora eu não posso escrever nada, mas, prometo fazê-lo em breve.
90
1 légua = 6600 m.
91
Niklaus trabalhou no melhoramento do caminho que ligava Piracicaba até fazenda Sete Quedas em
Campinas e Frederico Thamerus foi o primeiro morador do Bairro Friburgo. Vide foto na página 28.
92
Philippina Thamerus (1840-1862), foi a primeira esposa de Niklaus; não teve filhos.
93
Vide ilustração na página 13.
94
Niklaus nesta carta trata o seu irmão de V.Sa.
95
Johann Jakob Tschudi era delegado extraordinário do Conselho Federal da Suíça para avaliar as
condições de trabalho dos parceiros suíços nas colônias.
27
32. No Gigersami [deve se tratar de um certo Samuel Giger ou Gyger, emigrante também
da Suíça] a situação é péssima. Desde que ele passou a ser um Senhor, ele bebe
demais. Provavelmente ele também se casará logo. No ano passado, eu também ainda
escrevi uma carta ao Henrique Müller, marceneiro em Hõfli96.
Até aqui estivemos todos bem, menos o Samuel, que esteve doente novamente. Ele
ainda está na colônia e trabalha lá com os carros. Nós todos daqui saudamos muitíssimo
a todos e desejamos-lhes tudo de bom e boa saúde.
Seus irmãos Niklaus Kràhenbühl Samuel Kràhenbühl
Schlossrued AG com o castelo e a casa arrendada de Ulrich
Krãhenbühl-Zurflüh
Casa de Frederico Thamerus, primeiro morador em Friburgo SP
e primeiro sogro de Nicolau Kràhenbühl
96
D e n o m i n a ç ã o g e o g r á f i c a e m Schlossrued AG.
28
33. BR-4 Campinas, 25 de dezembro de 1862
Cordialmente amados irmãos,
Recebemos a carta de 21 de janeiro de 1862, e reconhecemos quanto trabalho você teve,
Ulrich, para conseguir o dinheiro. A carta de 14 de julho de 1862 também recebemos do
Vice-cônsul Suíço da província de São Paulo em Campinas e naquela ocasião o dinheiro
também já estava no Rio de Janeiro. O Vice-cônsul Krug 97 , em Campinas, arranjou um
meio para que ele conseguisse o dinheiro numa casa de Campinas. Mas para que não
nos fosse descontado a porcentagem, tivemos que esperar dois meses, até 1 ° de
novembro. Mas tivemos que dar um recibo já na notificação que o dinheiro estaria no Rio.
Contra esse recibo, nos foi fornecido um cheque. O recibo teve que ser em Francos, no
valor como despachado por você. O Cônsul do Rio e o de Campinas descontaram quase
100 mil-réis pelo trabalho. Mas, como o câmbio foi de um Franco por 360 réis 98 , ainda nos
sobrou mais que imaginávamos. Agora estamos de posse do nosso dinheiro e agra-
decemos você de coração por todo seu trabalho e preocupação que teve com isso.
Também já providenciamos uma segunda procuração para uso em futuros processos de
herança. Pode ser até que ela já esteja em suas mãos. Caso ache que isso de repente
não agrade as pessoas envolvidas no caso, então a mantenha oculta. Cristiano acha que
talvez não poderia agradar as pessoas de Bãrau". Pedro anexou uma carta à pro-
curação.
Fui atingido por um destino cruel, no qual faleceu a minha mulher 100 em decorrência de
uma grave enfermidade. Já na Páscoa, a doença começou a se manifestar e foi se
agravando sempre mais. Mais de dois meses teve que ficar quase só de cama, até que
em 14 de novembro ela foi para a eternidade, com a idade de apenas 22 anos. Seus
restos mortais descansam no cemitério alemão de Campinas101. Foi um golpe cruel, que
destruiu minhas mais belas esperanças. É inconfortável e triste, que tive que perder essa
boa alma.
O Samuel agora mora V2 quarto de hora distante de mim. Ele tem um filhinho, Felipe.
Pedro também tem um, que foi batizado Jorge. Pedro e Cristiano ainda estão em São
Lourenço. Eles já têm bastante gado, Pedro tem 80 e Cristiano 60. Este ano deu muito
pouco café. Cristiano, que tem café velho, colheu 4 alqueires [1 alqueire corresponde a 50
litros!]. No próximo ano também deve dar pouco café, pois existe uma espécie de doença
nos cafezais. Neste ano saíram poucas famílias de colonos. O Vice-cônsul da província
de São Paulo, na incumbência do Cônsul geral do Rio, fez acerto de contas com eles.
Estes partiram para Cananéia102, na província do Paraná, não muito distante do mar. Lá
receberam algumas terras. Agora Pedro e Cristiano acham que se lá for bom, eles
também queriam ir. Alguém de St.Antônio, que já esta lá, vai escrever para eles. Há
alguns anos, várias pessoas partiram para itamburé, de Piracicaba rio abaixo. Lá deveria
ser construída uma cidade, mas lá houve muita febre 103 . Já há muito tempo não se ouve
mais falar nada daquilo; creio que até já foi abandonado. É para lá que os meus irmãos
queriam ir. Foi uma sorte que não puderam, por causa de suas dívidas. Sobre Cananéia,
uma pessoa sincera ainda lhes escreverá. Também não é tão longe, para que alguém
daqui não possa ir até lá.
97
Provavelmente se trata do Cônsul alemão, Franz Krug (vide Germânia, ano III, 30.6.1880).
98
Vide também Apêndice.
99
Pequena aldeia perto de Langnau i.E.
100
A primeira mulher de Nicolau chamava-se Philippina (1840-1862) e era filha do primeiro colono,
Frederico Thamerus. Vide foto na página 28.
101
O cemitério alemão de Campinas não existe mais e os registros ainda não foram encontrados.
102
Cananéia = colônia no estado de São Paulo perto da divisa com Paraná.
103
Febre amarela.
29