1. PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DE PERNAMBUCO
JUÍZO DE DIREITO DA 29ª VARA CÍVEL DA CAPITAL
RECIFE - PE
PROCESSO Nº 0085855-42.2013.8.17.0001
AUTOR: Ministério Público de Pernambuco
RÉU: Companhia Energética de Pernambuco - CELPE
DECISÃO INTERLOCUTÓRIA
Vistos etc.
O Ministério Público de Pernambuco, representado pela Promotoria de Justiça de
Defesa da Cidadania da Capital, propôs a presente Ação Civil Pública com Pedido
de Tutela Antecipada em face da Companhia Energética de Pernambuco - CELPE,
igualmente qualificada na exordial.
Aduz que tomou conhecimento, pela mídia, acerca da ocorrência de "mortes" por
choque elétrico no Estado de Pernambuco; que conforme relatório da ARPE (Agência
Reguladora do Estado), no ano de 2011, 31(trinta e uma) pessoas faleceram em
razão dos choques na rede elétrica da demandada; que em junho/2013 foram
registradas duas mortes em um lapso temporal de 10 dias, fatos que denunciam o
descaso da demandada com a segurança de sua rede elétrica.
Esclarece que o Processo Administrativo Punitivo nº0013/12-CEE-ARPE concluiu que
a Concessionária ré não está a atuar em conformidade com as leis de regência;
que são 19 pontos discordância, e ainda, que notificada para se pronunciar sobre
os óbitos ocorridos entre janeiro/2012 - 14/junho/2013 informou que a maioria
das mortes ocorreu em "... acidentes devido à culpa das vítimas".
Aponta ainda, que 80% do valor da multa aplicada pela Agência Reguladora
decorrem da inobservância às normas e regras de segurança.
Ao final, com o escopo de impedir a ocorrência de outros óbitos, requer, em
medida liminar antecipatória dos efeitos da tutela, que seja determinado à
demandada, que:
1 - cumpra as normas de segurança estipuladas na legislação, garantindo a
segurança da população;
2 - apresente à ARPE plano de trabalho com cronograma detalhado de todas as
medidas a serem adotadas no atendimento à legislação, no que tange ao quesito
"segurança";
3 - comunique ao juízo, no prazo de 30 dias, a comprovação das medidas adotadas
para garantir a segurança da população pernambucana.
2. Ademais, no mérito, pugna pela confirmação dos pedidos liminares e, ainda, que a
demandada: a) mantenha a rede elétrica em conformidade com os padrões
estabelecidos pela ANEEL; b) seja compelida à prestação do fornecimento de
serviço de energia eficiente, regular e seguro; c) seja condenada, de forma
genérica, ao pagamento de indenização por cada óbito decorrente de choque
elétrico no Estado; d) seja condenada a dar conhecimento aos consumidores, para
que os que tiverem sido lesados pela sua conduta possam obter o ressarcimento
individual através de liquidação subsequente; e, igualmente, postula pela
condenação da ré ao pagamento de indenização a título de reparação pelos danos
morais coletivos causados.
É o relatório. Passo a fundamentar.
A princípio, insta ressaltar que o Ministério Público possui legitimidade ativa
para promover a defesa dos direitos e interesses difusos ou coletivos dos
consumidores (LACP, art. 1º), bem como de interesses ou direitos individuais
homogêneos, inclusive no que se refere à prestação de serviços públicos, haja
vista a presunção de relevância da questão para a coletividade.
A prova inequívoca restou claramente demonstrada, através de toda documentação
carreada aos autos, especialmente o Procedimento Administrativo Punitivo
instaurado pela Agência Reguladora (ARPE), sobretudo pelas constantes
ocorrências relatadas pelas mídias de comunicação de massa, as quais denunciam
que a demandada age de forma negligente recorrente em relação à segurança de sua
rede de distribuição de energia elétrica.
Neste contexto, em respeito aos ditames constitucionais, porquanto
concessionária do serviço público, bem como em homenagem à legislação
consumerista, resta concluir que a demandada tem o dever de proceder aos devidos
reparos, substituição e aperfeiçoamento de linhas de transmissão, bem como
corrigir oscilações no fornecimento de energia, de modo a tornar seu serviço
eficiente, regular, e seguro a população, imediatamente.
Nesse sentido, já decidiu o STJ, sob a relatoria do MM Min. Ari Pargendler, que
'a concessionária de serviço público encarregada do fornecimento de energia
elétrica tem a obrigação de zelar pela perfeita manutenção de seus equipamentos
e rede; deixando de fazê-lo, responde pelos danos daí resultantes' (REsp. n.
712.231/CE, rel. Min. Ari Pargendler, DJ de 4-6-07).
Induvidosa, portanto, a verossimilhança da alegação, restando, por conseqüência,
atendido o requisito previsto no caput do artigo 273 do CPC.
Quanto ao fundado receio de dano irreversível ou de difícil reparação (CPC, art.
273, I), necessário à concessão da tutela de urgência liminar, tal pressuposto
dispensa maiores comentários, uma vez que: a) além de ser fato notório que os
acidentes, inclusive fatais, derivados de choques em vias públicas, estão a se
repetir de forma assustadora na região metropolitana do Recife, e os fatos
notórios independem de prova, ex vi legis, do CPC, art. 334, I; além disso a
falta de segurança na rede transmissão de energia elétrica põe em risco a saúde
3. pública, em especial a vida e a segurança dos consumidores, consoante restou
sobejamente demonstrado nos autos, pelo que tenho que o perigo de dano
irreparável ou de difícil reparação está presente.
Noutra ponta, percebe-se que inexiste perigo de reversão da demora em desfavor
da parte ré, com o deferimento da antecipação eficacial dos efeitos da tutela
pretendida.
Assim, mesmo que agindo em sede sumária de cognição, considero que não há perigo
de impossibilidade de reversão da medida e que, também, se impõe a superação a
do contraditório prévio. Nessa senda, bem preleciona Roy Reis Friede, que:
"A Medida Liminar pode ser conceituada como o provimento administrativo
cautelar, fundado no poder discricionário do Juiz, admitido sempre que se
destaquem relevantes e urgentes os fundamentos do pedido, em mira da qual estará
um ato ou omissão capaz de baldar o pronunciamento judicial definitivo que
reconheça, a final, o direito do impetrante no Mandado de Segurança, do
requerente da Medida Cautelar (ação cautelar) ou do autor da Ação Popular e na
Ação Civil Pública." (Vide Aspectos Fundamentais das Medidas Liminares, 2a
edição, Forense, p. 49).
Portanto, em razão do notório não atendimento por parte da concessionária
demandada às normas de segurança determinadas pelas leis e atos administrativos
de regência da atividade em questão; considerando que tal postura foi observada
em Processo Administrativo regido pela ARPE, o qual culminou em penalidade
pecuniária por parte da agência reguladora local; considerando, também, o dever
de preservar a saúde e a segurança dos consumidores e evitar-lhes danos à saúde,
tenho por necessária a concessão da antecipação dos efeitos da tutela
jurisdicional pretendida.
Assim, passo a decidir:
Diante do exposto, e considerando presentes a verossimilhança da alegação e,
também, o perigo da demora na prestação da jurisdição, lastreado no poder geral
de cautela, o qual corrobora a impossibilidade de se prolongar a exposição da
população aos riscos decorrentes da deficiência na manutenção da rede de
transmissão de energia da demandada, com fulcro no CPC, arts. 273 c/c 461, e no
art. 12, da Lei 7.347 /85, DEFIRO a antecipação dos efeitos da tutela pleiteada
na inicial, para determinar que a demandada: a) apresente à Agência Reguladora
de Pernambuco, ARPE e a este Juízo, no prazo de 10 dias, plano de trabalho com
cronograma detalhado de todas as medidas a serem adotadas no atendimento à
legislação, devendo, inclusive, explicitar o prazo para implantação das medidas
respectivas, tudo em estrita observação à Legislação e atos administrativos em
vigor, pertinentes à matéria.
Intimem-se a demandada, via Oficial de Justiça, para cumprir o presente decisum
na forma acima disposta, sob pena de, após tal prazo, e não comprovado o
atendimento à ordem liminar, arcar com multa diária no valor de R$ 1.000.000,00
(um milhão de reais), na forma contida no § 5º, 461, do CPC c/c LACP, art. 12,
multa essa que reverterá ao Fundo mencionado no artigo 13 da Lei nº 7.347/1985.
4. No mesmo mandado, cite-se a ré para exercer, querendo, o direito de defesa
(artigo 297 do CPC), no prazo de 15 (quinze) dias, sob pena de revelia (art. 285
c/c 319 do CPC).
Determino, ex vi, do artigo 94, do CDC, a publicação de edital no órgão oficial,
a fim de que os interessados possam intervir no processo como litisconsortes.
CUMPRA-SE. Recife, 21 de outubro de 2013.
Alexandre Freire Pimentel
Juiz de Direito