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Mário de Andrade
                                      (1893-1945)



MODERNISMO – Primeira geração

→ROMANCE MODERNO

1ª publicação – 1927
AMAR, VERBO INTRANSITIVO – IDÍLIO

Idílio: 1. Amor terno e delicado. 2. Colóquio amoroso:
 relações entre namorados. 3. Produto da fantasia;
 devaneio, utopia
A perplexidade é inevitável, uma vez que idílio
 implica numa forma singela de amor em que não
 pairam dúvidas quanto à reciprocidade entre dois
 sujeitos.

Amar, verbo intransitivo: contradição
Gramática: quem ama, ama algo: VTD
Livro: quem ama, ama: VI
CONTEXTO HISTÓRICO
Na Europa, o período denominado
 ‘entre guerras’ caracterizou-se por uma profunda
 crise econômica, social e moral que atingiu os
 países capitalistas na década de 20. Na Alemanha,
 particularmente, a situação era pior: havia um
 clima propício, como nos demais países que
 perderam a guerra, ao nascimento de um violento
 nacionalismo. No caso, sabemos, estava aberta a
 brecha para a ascensão do nazismo.
CONTEXTO HISTÓRICO
No Brasil, apesar da guerra, o clima era bem
 outro: havia um relativo otimismo em relação ao
 futuro. Superávamos o atraso de um país agrário
 num estado mesmo de euforia pelo dinheiro
 proveniente da plantação e comércio do café e
 vislumbrava-se a possibilidade de unir esta
 riqueza à nova riqueza industrial. Fräulein,
 diante de realidades tão opostas, se adapta. Aliás,
 seu poder de adaptação é insistentemente
 enfatizado pelo narrador:
CONTEXTO HISTÓRICO

“[...] tornaram a vida insuportável na Alemanha.
 Mesmo antes de 14 a existência arrastava difícil lá,
 Fräulein se adaptou. Veio pro Brasil, Rio de Janeiro.
 Depois Curitiba onde não teve o que fazer. Rio de
 Janeiro. São Paulo. Agora tinha que viver com os
 Souza Costas. Se adaptou.”
Amar, verbo intransitivo, de mário de andrade
     Amar, Verbo Intransitivo, chama a atenção por             inúmeros
aspectos. A linguagem, provavelmente considerada “errada” na época,
pois se afasta do português castiço ao imitar (às vezes de forma
eficiente, às vezes não) o padrão coloquial brasileiro. É como se o texto
escrito imitasse a maneira de falar do nosso povo. É um livro para se
fazer de conta que se está ouvindo e, não, lendo.

Um romance modernista da primeira fase (1922 – 1930),
impregnado de um espírito de destruição até ao exagero. O espírito da
“Semana de Arte Moderna”: destruir para construir tudo de novo. A mola
real de toda a obra do autor é a pesquisa, a busca.
 A universalidade do romance está personificada em Fräulein, pois
  traz um mundo de contradições e efervescências                 que
  caracterizavam a Alemanha (Período entre a 1ª e a 2ª Guerra
  Mundial – República de Weimar);
 Fräulein tem tendências autoritárias, totalitaristas. Ela acredita,
  entre outras coisas, que a mulher deve casar, ter quantos filhos a
  natureza prover, servir ao marido, cuidar da casa... É a
  caracterização, segundo Mário de Andrade, do alemão medíocre,
  alemão médio;
 Intertextualidade com o Hermann e Dorotéia, de Goethe (Narra a
  história de uma jovem refugiada por causa da Rev. Francesa que vaga pela Alemanha e encontra
  o jovem rico, Hermann. Ele a leva para trabalhar na casa e acaba apaixonando-se por ela.
  Transforma-a em patroa.);
 Plano de Fräulein : Quer ensinar o amor e não o sexo (Como Sousa Costa
  quer) e casar-se ;

 Fräulein (universo racional, onde os fins justificam os meios voltada para a
  mera sobrevivênvia, anônima, burguesa) X Elza (universo emocional, mais
  humano, sofredor, individualizado);

 Elza não traz e não precisa de sobrenome; Fräulein e Elza, sempre
  mencionados separadamente, valem como um todo;

 Fräulein não é solidária com as outras mulheres. É sempre severa no julgar
  Laura, a esposa de Souza Costa, não se apega às meninas. A governanta
  é, sim, uma eficiente professora de sexo: teórica, e, principalmente, prática.
  “Professora de amor... porém não nascera pra isso, sabia. As circunstâncias
  é que tinham feito dela a professora de amor. Se adaptara...” (Pág. 71)
 Constante emprego das digressões, boa parte
delas metalinguísticas, outra parte sociológicas,
que fazem lembrar o estilo machadiano. Mais uma
vez, a obra apresenta elementos formais que a
colocam à frente de seu tempo, caracterizando-a,
portanto, como moderna.
 Dentro do aspecto sociológico, há que se entender uma
posição meio ambígua de Mário de Andrade, como se ele
mostrasse uma “paixão crítica” por seu povo, principalmente o
paulistano. Note-se que critica valores brasileiros, ao mesmo
tempo que diz que é a nossa forma de comportamento, deixando
subentendido um certo ar de “não tem jeito”, “somos assim
mesmo”.

Além disso, ao mesmo tempo em que elogia o estrangeiro,
principalmente a força dos alemães, desmerece-os ao mostrá-los
como extremamente metódicos, ineptos para o calor latino. Sem
mencionar que reconhece que o imigrante está sendo como que
simpaticamente absorvido por nossa cultura.
    O que mais chama a
atenção é a utilização da
teoria freudiana (grande
paixão do autor) como
embasamento da trama.
Foco narrativo
A narrativa é feita na terceira pessoa, por um narrador
que não faz parte do romance. É o narrador tradicional, um
narrador onisciente e onipresente. Mas há ainda um outro
ponto de vista: o autor se coloca dentro do livro para
fazer suas numerosas observações marginais. Para
comentar, criticar, expor ideias, concordar ou discordar... É
uma velha mania do romance tradicional. E os comentários
são feitos na primeira pessoa.

Isto não sei se é bem se é mal, mas a culpa é toda de Elza.
Isto sei e afirmo...
Volto a afirmar que o meu livro tem 50 leitores. Comigo 51.
Linguagem e Estrutura

A narrativa corre sem divisões de capítulos. Mário de Andrade usa as
formas conhecidas de discurso. É mais frequente o discurso direto,
nos diálogos, mas em algumas vezes, usa também o discurso
indireto e o discurso indireto livre.

Mário de Andrade transgride a norma culta em aspectos como
pontuação e concordância (Ver posfácio!).

A narrativa segue, de modo geral, uma linha linear: princípio, meio e
fim. Começa com a chegada de Fräulein, se estende em episódios e
incidentes, acaba com a saída de Fräulein. Quando termina o idílio, o
autor escreve “Fim” e, depois, ainda narra um pequeno episódio:

Um encontro de longe entre Carlos e Fräulein, num corso de carnaval.
Freqüentemente a narrativa fica retardada pelos comentários marginais
do autor: algumas vezes exposição de tese.
A pontuação da frase é muito liberal. Conscientemente liberal. O ritmo de
leitura depende muito da capacidade de cada leitor. Abandona a pontuação
quando as frases se amontoam, acavalando-se umas sobre as outras,
polifônicas, simultâneas, fugindo das regrinhas escolares de pontos e vírgulas.

É preciso lembrar que Mário de Andrade é sempre um experimentador em
busca de soluções novas para a linguagem. Para alcançar ou tentar suas
inovações ele trabalhou suadamente: fazia e refazia suas redações em versões
diferentes. Assim em Amar, Verbo Intransitivo e mais ainda em Macunaíma.

Sobre Fräulein : Agora primeiro vou deixar o livro descansar uma semana ou
mais sem pegar nele, depois principiarei a corrigir e a escrever o livro na forma
definitiva. Definitiva? Não posso garantir nada, não. Fräulein teve quatro
redações diferentes! (Carta a Manuel Bandeira, pág. 184).
LINGUAGEM E ESTRUTURA

Apesar de certos alongamentos em seus comentários
marginais, o autor escreve com rapidez, dinamicamente,
em frases e palavras com jeito cinematográfico.

 Usa uma linguagem sincopada, cheia de elipses que
obrigam o leitor a ligar e completar os pensamentos. Em
vez de dizer e de explicar tudo, apenas sugere em frases
curtas, mínimas.
PERSONAGENS

Em geral, são fabricadas, artificiais, sem
muita vida ou substância humana. As
personagens são bem parecidas e
socialmente domesticadas.

A ação principal está em Fräulein : seu
domínio sexual, com imperturbável
serenidade bem alemã, contrasta com a
espontaneidade      sexual,    com    a
impetuosidade     bem    brasileira  do
excelente aluno (em sexo), Carlos.
PERSONAGENS


Felisberto Sousa Costa - pai de
Carlos. É o centro, não afetivo, mas
administrativo da casa em que
mantém, mais ou menos, o regime
patriarcalista.   Deve-se notar que o
comportamento de Sousa Costa,
acerca de sua atitude de contratar uma
profissional do amor para realizar os
serviços debaixo do seu próprio teto,
revela determinados valores da
                                                  O narrador mostra-se bastante
burguesia da época. Ele se comporta
                                         cruel. Ficaram claras as suas críticas à
como um ‘novo rico’ que acha que o
                 rico
                                         burguesia paulistana e à sua mania de
dinheiro pode tomar posse de tudo, até
                              tudo
                                         tentar ser o que não é ou esconder o que
da iniciação sexual. São ricos que
                                         no fundo é. Observa-se a genialidade do
ainda não têm, no entender de Mário
                                         narrador ao descrever Sousa Costa
de Andrade, estrutura para merecer
                                         usando brilhantina até no bigode.
seu presente status.
                                         Assemelha-se à esposa, que também usa
                                         produto para alisar o cabelo. Querem
                                         esconder que são tão mestiços quanto o
                                         resto do país.
D. Laura - mãe de Carlos, esposa
de Felisberto. Como devia, sempre
obedece ao marido. É uma senhora
bem       composta,    acomodada,
burguesa.     Uma    senhora     da
sociedade e que mantém todas as
aparências de seriedade religiosa e
familiar.   Concorda    com      os
argumentos tão convincentes... do
marido, na educação do único filho-
homem.
Carlos Alberto – filho,
entre 15 e 16 anos. Uma
espécie de “enfant gaté”
(um queridinho da família,
porque único) e que,
certamente, deverá ser o
principal herdeiro do nome,
da fortuna e das realizações
paternas.      Como      era
costume,      possivelmente,
deveria ser a projeção do
pai, a sua continuação.
Centraliza a narrativa, é
personagem do pequeno
drama amoroso do livro, ao
lado da governanta alemã,
Elza.
Elza – Fräulein
(=     senhorita),    governanta
alemã. Tão importante que ela
dava nome ao romance. Como é
Fräulein? Ela é a mais humana e
real, mais de carne e osso.
Talvez arrancada da vida. Ela,
sem muito interesse, cuida
também     da      educação    ou
instrução      das       meninas:
principalmente     para   ensinar
alemão e piano. São três
meninas que, apenas, completam
a família burguesa. São três
meninas que brincam de casinha.
Maria Luísa - irmã de Carlos, tem 12 anos. Ela vai ser o centro de uma
narrativa dentro do romance: a sua doença e a viagem ao Rio de Janeiro,
para um clima mais saudável em oposição ao frio paulistano.

Laurita - irmã de Carlos, tem 7 anos.

Aldina - irmã caçula de Carlos. Tem 5 anos.

Tanaka - mordomo.
Enredo

         Felisberto Souza Costa, um novo-rico, um homem burguês, bem
posto na vida, contrata uma governanta alemã, de 35 anos, para a
educação do filho, principalmente para a sua educação sexual: “Não me
agradaria ser tomada por aventureira, sou séria, e tenho 35 anos,
senhor. Certamente não irei se sua esposa não souber o que vou
fazer lá”.
         Elza vai ficar conhecida e será chamada sempre pela palavra
alemã Fräulein (senhorita). Chegou à mansão de Souza Costa, numa
terça-feira: “Ganharia algum dinheiro... Voltaria para a Alemanha... Se
casaria com um moço ‘comprido, magro’, muito alvo, quase
transparente...”).
         A família era formada pelo pai, por D. Laura, o jovem Carlos e as
meninas: Maria Luísa, com 12 anos; Laurita, com 7, e Aldinha,com 5.
Havia também na casa um criado japonês: Tanaka. A criançada toda
começou logo aprendendo alemão e chamando a governanta de Fräulein.
Carlos não está muito para o estudo. Fräulein logo se ajeitou na família,
uma família “imóvel mas feliz”. Mas o papel principal da governanta é
ensinar o “amor”.
Nesse idílio, nos deparamos com um lírico nostálgico voltado para o
passado, remetendo à obra de Saint-Pierre, a de Gessner, e reportando-se
também a de Wagner, músico e poeta alemão, cuja influência foi
determinante para a formação da identidade nacional.
 Wilhelm Richard Wagner (Leipzig, Alemanha, 22 de maio de 1813 —
   Veneza, Itália, 13 de fevereiro de 1883) foi um maestro, compositor,
   diretor de teatro e ensaista alemão, primeiramente conhecido por suas
   óperas (ou "dramas musicais", como ele posteriormente chamou). As
   composições de Wagner, particularmente essas do fim do período, são
   notáveis por suas texturas complexas, harmonias ricas e orquestração, e
   o elaborado uso de Leitmotiv: temas musicais associados com caráter
   induvidual, lugares, ideias ou outros elementos. Por não gostar da
   maioria das outras óperas de compositores, Wagner escreveu
   simultaneamente a música e libreto, para todos os seus trabalhos.
   Wagner foi o pioneiro em avanços da linguagem musical, tais como o
   cromatismo extremo e a rápica mudança dos centros tonais, que muito
   influenciou no desenvolvimento da música erudita europeia. Sua Tristan
   und Isolde é algumas vezes descrita como um marco do início da música
   moderna. A influência de Wagner vai além da música, é também sentida
   na filosofia, literatura, artes visuais e teatro. Ele teve sua própria casa de
   ópera, o Bayreuth Festspielhaus. Wagner conquistou tudo isso, apesar
   de viver até suas últimas décadas em um exílio político, amores
   turbulentos, pobreza e a fuda de seus credores. O impacto de suas ideia
   pode ser sentidas em muitas artes do longo de todo o século XX.
   Tristan und Isolde ("Tristão e Isolda", em alemão) é uma ópera em três
   atos com música e libreto do compositor alemão Richard Wagner,
   baseada em uma lenda medieval narrada por Gottfried Von Strassburg. A
   estreia da obra foi em 10 de Junho de 1865, em Munique, no Teatro da
   Baviera, sob regência do maestro Hans von Bülow.A partitura de Tristan
   und Isolde é um marco importantíssimo da música erudita moderna por
   apontar para a dissolução da tonalidade, cuja consequência será o
   atonalismo                     do                   século                 XX.

   https://www.youtube.com/watch?v=8VEqNv6Y-DQ
Chegada de Fräulein à Mansão


             Terça-feira o táxi parou no portão da Vila Laura. Elza apeou ajeitando o casaco, toda de
pardo, enquanto o motorista botava as duas malas, as caixas e embrulhos no chão. Era esperada. Já
carregavam as malas pra dentro. Uns olhos de 12 anos em que uma gaforinha americana enroscava a
galharia negro-azul apareceu na porta. E no silêncio pomposo do casão o xilofone tiniu:
             — A governanta está aí! Mamãe! a governanta está aí!
             — Já sei, menina! Não grite assim!
             Elza discutia o preço da corrida.
             —... e com tantas malas, a senhora...
             — É muito. Aqui estão cinco. Passe bem. Ah, a gorjeta...
             Deitou quinhentos réis na mão do motorista. Atravessou as roseiras festivas do jardim.
             Dia primeiro ou dois de setembro, não lembro mais. Porém é fácil de saber por causa da
terça-feira.
             Bem diferente dos quartinhos de pensão... Alegre, espaçoso. Pelas duas janelas escancaradas
entrava a serenidade rica dos jardins. O olhar torcendo para a esquerda seguia a disciplinada carreira das
árvores na avenida. Em Higienópolis os bondes passam com bulha quase grave soberbosa, macaqueando
o bem-estar dos autos particulares. É o mimetismo arisco e irônico das coisas ditas inanimadas. São
bondes que nem badalam. Procedem como o rico-de-repente que no chá da senhora Tal, família campineira
de sangue, adquire na epiderme do fraque a macieza dos tradicionais e cruza as mãos nas costas — que
importância! — pra que a gente não repare na grossura dos dedos, no quadrado das unhas chatas. Neto de
Borbas me secunda desdenhoso que badalo e mãos ásperas nem por isso deixam de existir, ora! o badalo
pode não tocar e mãos se enluvam.
             Elza trouxe de novo os olhos de fora. O criado japonês botara as malas bem no meio do vazio.
Estúpidas assim. As caixas, os embrulhos perturbavam as retas legítimas. (Págs. 48 a 50)
Amar, verbo intransitivo, de mário de andrade
ATENÇÃO!
ATENÇÃO!

Descrição do corpo de Fraülein: Isso do corpo de Fräulein não ser perfeito, em nada enfraquece a história. Lhe
dá mesmo certa honestidade espiritual e não provoca sonhos. E aliás, se renascente e perfeito, o idílio seria o mesmo.
Fräulein não é bonita, não. Porém traços muito regulares, coloridos de cor real. E agora que se veste, a gente pode olhar
com mais franqueza isso que fica de fora e ao mundo pertence, agrada, não, não agrada? Não se pinta, quase nem usa pó-
de-arroz. A pele estica, discretamente polida com os arrancos da carne sã. O embate é cruento. Resiste a pele, o sangue se
alastra pelo interior e Fräulein toda se roseia agradavelmente.
O que mais atrai nela são os beiços, curtos, bastante largos, sempre encarnados. E inda bem que sabem rir:
entremostram apenas os dentinhos dum amarelo sadio mas sem frescor. Olhos castanhos, pouco fundos. Se abrem
grandes, muito claros, verdadeiramente sem expressão. Por isso duma calma quase religiosa, puros. Que cabelos
mudáveis! ora louros, ora sombrios, dum pardo em fogo interior. Ela tem esse jeito de os arranjar, que estão sempre
pedindo arranjo outra vez. As vezes as madeixas de Fräulein se apresentam embaraçadas, soltas de forma tal, que as luzes
penetram nelas e se cruzam, como numa plantação nova de eucaliptos. Ora é a mecha mais loura que Fräulein prende e
cem vezes torna a cair... (Págs. 56 a 58)
ATENÇÃO:

             Na cena em que Fräulein e Carlos encontram-se na biblioteca, a sedução do aluno pela professora se
processa gradativamente; percebe-se uma tensão provocada pela indefinição e pelo jogo de revelar e encobrir
estabelecido tacitamente entre ambos, até o momento em que a situação se inverte, e Fräulein surpreende-se com os
próprios sentimentos.




               Deitou o braço direito sobre o dele, lhe segurando a mão, soerguendo-a do papel. Assim, não é para intrigar, porém ele ficava abraçado.
Abaixou a cabeça, querendo e não querendo, que desespero! era demais! se ergueu violento. Empurrou a cadeira. Machucou Fräulein.
               — Não escrevo mais!
               Ela ficou branca, tomou com um golpe. Custou o:
               — Que é isso? Venha escrever, Carlos!
               — Desse jeito não escrevo mais!
A              briu a luz da janela. Olhava pra fora, raivoso, enterrando virilmente as mãos nos bolsos do pijama, incapaz de sair daquela sala. Fräulein
não compreendia. Estava bela. Corada. Os cabelos eriçados, metálicos. Doía nela o desejo daquele ingênuo, amou-o no momento com delírio.
Revelação! (Págs. 88-90)
ATENÇÃO:

          Carlos entrara no quarto de Fräulein. Mal tivera tempo de. Porém já machucara a amante,
cruzando as pernas sentado. Tátão, tão, tão!
          - Meu Deus! Entra Sousa Costa. (Pág. 134)
Fräulein sacudida pelos soluços nervosos entrou no automóvel .
Partiam mesmo. Debruçou-se ainda na portinhola:
        - Meu Carlos... (Pág.139)

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Amar, verbo intransitivo, de mário de andrade

  • 1. Mário de Andrade (1893-1945) MODERNISMO – Primeira geração →ROMANCE MODERNO 1ª publicação – 1927
  • 2. AMAR, VERBO INTRANSITIVO – IDÍLIO Idílio: 1. Amor terno e delicado. 2. Colóquio amoroso: relações entre namorados. 3. Produto da fantasia; devaneio, utopia A perplexidade é inevitável, uma vez que idílio implica numa forma singela de amor em que não pairam dúvidas quanto à reciprocidade entre dois sujeitos. Amar, verbo intransitivo: contradição Gramática: quem ama, ama algo: VTD Livro: quem ama, ama: VI
  • 3. CONTEXTO HISTÓRICO Na Europa, o período denominado ‘entre guerras’ caracterizou-se por uma profunda crise econômica, social e moral que atingiu os países capitalistas na década de 20. Na Alemanha, particularmente, a situação era pior: havia um clima propício, como nos demais países que perderam a guerra, ao nascimento de um violento nacionalismo. No caso, sabemos, estava aberta a brecha para a ascensão do nazismo.
  • 4. CONTEXTO HISTÓRICO No Brasil, apesar da guerra, o clima era bem outro: havia um relativo otimismo em relação ao futuro. Superávamos o atraso de um país agrário num estado mesmo de euforia pelo dinheiro proveniente da plantação e comércio do café e vislumbrava-se a possibilidade de unir esta riqueza à nova riqueza industrial. Fräulein, diante de realidades tão opostas, se adapta. Aliás, seu poder de adaptação é insistentemente enfatizado pelo narrador:
  • 5. CONTEXTO HISTÓRICO “[...] tornaram a vida insuportável na Alemanha. Mesmo antes de 14 a existência arrastava difícil lá, Fräulein se adaptou. Veio pro Brasil, Rio de Janeiro. Depois Curitiba onde não teve o que fazer. Rio de Janeiro. São Paulo. Agora tinha que viver com os Souza Costas. Se adaptou.”
  • 7. Amar, Verbo Intransitivo, chama a atenção por inúmeros aspectos. A linguagem, provavelmente considerada “errada” na época, pois se afasta do português castiço ao imitar (às vezes de forma eficiente, às vezes não) o padrão coloquial brasileiro. É como se o texto escrito imitasse a maneira de falar do nosso povo. É um livro para se fazer de conta que se está ouvindo e, não, lendo. Um romance modernista da primeira fase (1922 – 1930), impregnado de um espírito de destruição até ao exagero. O espírito da “Semana de Arte Moderna”: destruir para construir tudo de novo. A mola real de toda a obra do autor é a pesquisa, a busca.
  • 8.  A universalidade do romance está personificada em Fräulein, pois traz um mundo de contradições e efervescências que caracterizavam a Alemanha (Período entre a 1ª e a 2ª Guerra Mundial – República de Weimar);  Fräulein tem tendências autoritárias, totalitaristas. Ela acredita, entre outras coisas, que a mulher deve casar, ter quantos filhos a natureza prover, servir ao marido, cuidar da casa... É a caracterização, segundo Mário de Andrade, do alemão medíocre, alemão médio;  Intertextualidade com o Hermann e Dorotéia, de Goethe (Narra a história de uma jovem refugiada por causa da Rev. Francesa que vaga pela Alemanha e encontra o jovem rico, Hermann. Ele a leva para trabalhar na casa e acaba apaixonando-se por ela. Transforma-a em patroa.);
  • 9.  Plano de Fräulein : Quer ensinar o amor e não o sexo (Como Sousa Costa quer) e casar-se ;  Fräulein (universo racional, onde os fins justificam os meios voltada para a mera sobrevivênvia, anônima, burguesa) X Elza (universo emocional, mais humano, sofredor, individualizado);  Elza não traz e não precisa de sobrenome; Fräulein e Elza, sempre mencionados separadamente, valem como um todo;  Fräulein não é solidária com as outras mulheres. É sempre severa no julgar Laura, a esposa de Souza Costa, não se apega às meninas. A governanta é, sim, uma eficiente professora de sexo: teórica, e, principalmente, prática. “Professora de amor... porém não nascera pra isso, sabia. As circunstâncias é que tinham feito dela a professora de amor. Se adaptara...” (Pág. 71)
  • 10.  Constante emprego das digressões, boa parte delas metalinguísticas, outra parte sociológicas, que fazem lembrar o estilo machadiano. Mais uma vez, a obra apresenta elementos formais que a colocam à frente de seu tempo, caracterizando-a, portanto, como moderna.
  • 11.  Dentro do aspecto sociológico, há que se entender uma posição meio ambígua de Mário de Andrade, como se ele mostrasse uma “paixão crítica” por seu povo, principalmente o paulistano. Note-se que critica valores brasileiros, ao mesmo tempo que diz que é a nossa forma de comportamento, deixando subentendido um certo ar de “não tem jeito”, “somos assim mesmo”. Além disso, ao mesmo tempo em que elogia o estrangeiro, principalmente a força dos alemães, desmerece-os ao mostrá-los como extremamente metódicos, ineptos para o calor latino. Sem mencionar que reconhece que o imigrante está sendo como que simpaticamente absorvido por nossa cultura.
  • 12. O que mais chama a atenção é a utilização da teoria freudiana (grande paixão do autor) como embasamento da trama.
  • 13. Foco narrativo A narrativa é feita na terceira pessoa, por um narrador que não faz parte do romance. É o narrador tradicional, um narrador onisciente e onipresente. Mas há ainda um outro ponto de vista: o autor se coloca dentro do livro para fazer suas numerosas observações marginais. Para comentar, criticar, expor ideias, concordar ou discordar... É uma velha mania do romance tradicional. E os comentários são feitos na primeira pessoa. Isto não sei se é bem se é mal, mas a culpa é toda de Elza. Isto sei e afirmo... Volto a afirmar que o meu livro tem 50 leitores. Comigo 51.
  • 14. Linguagem e Estrutura A narrativa corre sem divisões de capítulos. Mário de Andrade usa as formas conhecidas de discurso. É mais frequente o discurso direto, nos diálogos, mas em algumas vezes, usa também o discurso indireto e o discurso indireto livre. Mário de Andrade transgride a norma culta em aspectos como pontuação e concordância (Ver posfácio!). A narrativa segue, de modo geral, uma linha linear: princípio, meio e fim. Começa com a chegada de Fräulein, se estende em episódios e incidentes, acaba com a saída de Fräulein. Quando termina o idílio, o autor escreve “Fim” e, depois, ainda narra um pequeno episódio: Um encontro de longe entre Carlos e Fräulein, num corso de carnaval. Freqüentemente a narrativa fica retardada pelos comentários marginais do autor: algumas vezes exposição de tese.
  • 15. A pontuação da frase é muito liberal. Conscientemente liberal. O ritmo de leitura depende muito da capacidade de cada leitor. Abandona a pontuação quando as frases se amontoam, acavalando-se umas sobre as outras, polifônicas, simultâneas, fugindo das regrinhas escolares de pontos e vírgulas. É preciso lembrar que Mário de Andrade é sempre um experimentador em busca de soluções novas para a linguagem. Para alcançar ou tentar suas inovações ele trabalhou suadamente: fazia e refazia suas redações em versões diferentes. Assim em Amar, Verbo Intransitivo e mais ainda em Macunaíma. Sobre Fräulein : Agora primeiro vou deixar o livro descansar uma semana ou mais sem pegar nele, depois principiarei a corrigir e a escrever o livro na forma definitiva. Definitiva? Não posso garantir nada, não. Fräulein teve quatro redações diferentes! (Carta a Manuel Bandeira, pág. 184).
  • 16. LINGUAGEM E ESTRUTURA Apesar de certos alongamentos em seus comentários marginais, o autor escreve com rapidez, dinamicamente, em frases e palavras com jeito cinematográfico.  Usa uma linguagem sincopada, cheia de elipses que obrigam o leitor a ligar e completar os pensamentos. Em vez de dizer e de explicar tudo, apenas sugere em frases curtas, mínimas.
  • 17. PERSONAGENS Em geral, são fabricadas, artificiais, sem muita vida ou substância humana. As personagens são bem parecidas e socialmente domesticadas. A ação principal está em Fräulein : seu domínio sexual, com imperturbável serenidade bem alemã, contrasta com a espontaneidade sexual, com a impetuosidade bem brasileira do excelente aluno (em sexo), Carlos.
  • 18. PERSONAGENS Felisberto Sousa Costa - pai de Carlos. É o centro, não afetivo, mas administrativo da casa em que mantém, mais ou menos, o regime patriarcalista. Deve-se notar que o comportamento de Sousa Costa, acerca de sua atitude de contratar uma profissional do amor para realizar os serviços debaixo do seu próprio teto, revela determinados valores da O narrador mostra-se bastante burguesia da época. Ele se comporta cruel. Ficaram claras as suas críticas à como um ‘novo rico’ que acha que o rico burguesia paulistana e à sua mania de dinheiro pode tomar posse de tudo, até tudo tentar ser o que não é ou esconder o que da iniciação sexual. São ricos que no fundo é. Observa-se a genialidade do ainda não têm, no entender de Mário narrador ao descrever Sousa Costa de Andrade, estrutura para merecer usando brilhantina até no bigode. seu presente status. Assemelha-se à esposa, que também usa produto para alisar o cabelo. Querem esconder que são tão mestiços quanto o resto do país.
  • 19. D. Laura - mãe de Carlos, esposa de Felisberto. Como devia, sempre obedece ao marido. É uma senhora bem composta, acomodada, burguesa. Uma senhora da sociedade e que mantém todas as aparências de seriedade religiosa e familiar. Concorda com os argumentos tão convincentes... do marido, na educação do único filho- homem.
  • 20. Carlos Alberto – filho, entre 15 e 16 anos. Uma espécie de “enfant gaté” (um queridinho da família, porque único) e que, certamente, deverá ser o principal herdeiro do nome, da fortuna e das realizações paternas. Como era costume, possivelmente, deveria ser a projeção do pai, a sua continuação. Centraliza a narrativa, é personagem do pequeno drama amoroso do livro, ao lado da governanta alemã, Elza.
  • 21. Elza – Fräulein (= senhorita), governanta alemã. Tão importante que ela dava nome ao romance. Como é Fräulein? Ela é a mais humana e real, mais de carne e osso. Talvez arrancada da vida. Ela, sem muito interesse, cuida também da educação ou instrução das meninas: principalmente para ensinar alemão e piano. São três meninas que, apenas, completam a família burguesa. São três meninas que brincam de casinha.
  • 22. Maria Luísa - irmã de Carlos, tem 12 anos. Ela vai ser o centro de uma narrativa dentro do romance: a sua doença e a viagem ao Rio de Janeiro, para um clima mais saudável em oposição ao frio paulistano. Laurita - irmã de Carlos, tem 7 anos. Aldina - irmã caçula de Carlos. Tem 5 anos. Tanaka - mordomo.
  • 23. Enredo Felisberto Souza Costa, um novo-rico, um homem burguês, bem posto na vida, contrata uma governanta alemã, de 35 anos, para a educação do filho, principalmente para a sua educação sexual: “Não me agradaria ser tomada por aventureira, sou séria, e tenho 35 anos, senhor. Certamente não irei se sua esposa não souber o que vou fazer lá”. Elza vai ficar conhecida e será chamada sempre pela palavra alemã Fräulein (senhorita). Chegou à mansão de Souza Costa, numa terça-feira: “Ganharia algum dinheiro... Voltaria para a Alemanha... Se casaria com um moço ‘comprido, magro’, muito alvo, quase transparente...”). A família era formada pelo pai, por D. Laura, o jovem Carlos e as meninas: Maria Luísa, com 12 anos; Laurita, com 7, e Aldinha,com 5. Havia também na casa um criado japonês: Tanaka. A criançada toda começou logo aprendendo alemão e chamando a governanta de Fräulein. Carlos não está muito para o estudo. Fräulein logo se ajeitou na família, uma família “imóvel mas feliz”. Mas o papel principal da governanta é ensinar o “amor”.
  • 24. Nesse idílio, nos deparamos com um lírico nostálgico voltado para o passado, remetendo à obra de Saint-Pierre, a de Gessner, e reportando-se também a de Wagner, músico e poeta alemão, cuja influência foi determinante para a formação da identidade nacional.
  • 25.  Wilhelm Richard Wagner (Leipzig, Alemanha, 22 de maio de 1813 — Veneza, Itália, 13 de fevereiro de 1883) foi um maestro, compositor, diretor de teatro e ensaista alemão, primeiramente conhecido por suas óperas (ou "dramas musicais", como ele posteriormente chamou). As composições de Wagner, particularmente essas do fim do período, são notáveis por suas texturas complexas, harmonias ricas e orquestração, e o elaborado uso de Leitmotiv: temas musicais associados com caráter induvidual, lugares, ideias ou outros elementos. Por não gostar da maioria das outras óperas de compositores, Wagner escreveu simultaneamente a música e libreto, para todos os seus trabalhos. Wagner foi o pioneiro em avanços da linguagem musical, tais como o cromatismo extremo e a rápica mudança dos centros tonais, que muito influenciou no desenvolvimento da música erudita europeia. Sua Tristan und Isolde é algumas vezes descrita como um marco do início da música moderna. A influência de Wagner vai além da música, é também sentida na filosofia, literatura, artes visuais e teatro. Ele teve sua própria casa de ópera, o Bayreuth Festspielhaus. Wagner conquistou tudo isso, apesar de viver até suas últimas décadas em um exílio político, amores turbulentos, pobreza e a fuda de seus credores. O impacto de suas ideia pode ser sentidas em muitas artes do longo de todo o século XX. Tristan und Isolde ("Tristão e Isolda", em alemão) é uma ópera em três atos com música e libreto do compositor alemão Richard Wagner, baseada em uma lenda medieval narrada por Gottfried Von Strassburg. A estreia da obra foi em 10 de Junho de 1865, em Munique, no Teatro da Baviera, sob regência do maestro Hans von Bülow.A partitura de Tristan und Isolde é um marco importantíssimo da música erudita moderna por apontar para a dissolução da tonalidade, cuja consequência será o atonalismo do século XX. https://www.youtube.com/watch?v=8VEqNv6Y-DQ
  • 26. Chegada de Fräulein à Mansão Terça-feira o táxi parou no portão da Vila Laura. Elza apeou ajeitando o casaco, toda de pardo, enquanto o motorista botava as duas malas, as caixas e embrulhos no chão. Era esperada. Já carregavam as malas pra dentro. Uns olhos de 12 anos em que uma gaforinha americana enroscava a galharia negro-azul apareceu na porta. E no silêncio pomposo do casão o xilofone tiniu: — A governanta está aí! Mamãe! a governanta está aí! — Já sei, menina! Não grite assim! Elza discutia o preço da corrida. —... e com tantas malas, a senhora... — É muito. Aqui estão cinco. Passe bem. Ah, a gorjeta... Deitou quinhentos réis na mão do motorista. Atravessou as roseiras festivas do jardim. Dia primeiro ou dois de setembro, não lembro mais. Porém é fácil de saber por causa da terça-feira. Bem diferente dos quartinhos de pensão... Alegre, espaçoso. Pelas duas janelas escancaradas entrava a serenidade rica dos jardins. O olhar torcendo para a esquerda seguia a disciplinada carreira das árvores na avenida. Em Higienópolis os bondes passam com bulha quase grave soberbosa, macaqueando o bem-estar dos autos particulares. É o mimetismo arisco e irônico das coisas ditas inanimadas. São bondes que nem badalam. Procedem como o rico-de-repente que no chá da senhora Tal, família campineira de sangue, adquire na epiderme do fraque a macieza dos tradicionais e cruza as mãos nas costas — que importância! — pra que a gente não repare na grossura dos dedos, no quadrado das unhas chatas. Neto de Borbas me secunda desdenhoso que badalo e mãos ásperas nem por isso deixam de existir, ora! o badalo pode não tocar e mãos se enluvam. Elza trouxe de novo os olhos de fora. O criado japonês botara as malas bem no meio do vazio. Estúpidas assim. As caixas, os embrulhos perturbavam as retas legítimas. (Págs. 48 a 50)
  • 28. ATENÇÃO! ATENÇÃO! Descrição do corpo de Fraülein: Isso do corpo de Fräulein não ser perfeito, em nada enfraquece a história. Lhe dá mesmo certa honestidade espiritual e não provoca sonhos. E aliás, se renascente e perfeito, o idílio seria o mesmo. Fräulein não é bonita, não. Porém traços muito regulares, coloridos de cor real. E agora que se veste, a gente pode olhar com mais franqueza isso que fica de fora e ao mundo pertence, agrada, não, não agrada? Não se pinta, quase nem usa pó- de-arroz. A pele estica, discretamente polida com os arrancos da carne sã. O embate é cruento. Resiste a pele, o sangue se alastra pelo interior e Fräulein toda se roseia agradavelmente. O que mais atrai nela são os beiços, curtos, bastante largos, sempre encarnados. E inda bem que sabem rir: entremostram apenas os dentinhos dum amarelo sadio mas sem frescor. Olhos castanhos, pouco fundos. Se abrem grandes, muito claros, verdadeiramente sem expressão. Por isso duma calma quase religiosa, puros. Que cabelos mudáveis! ora louros, ora sombrios, dum pardo em fogo interior. Ela tem esse jeito de os arranjar, que estão sempre pedindo arranjo outra vez. As vezes as madeixas de Fräulein se apresentam embaraçadas, soltas de forma tal, que as luzes penetram nelas e se cruzam, como numa plantação nova de eucaliptos. Ora é a mecha mais loura que Fräulein prende e cem vezes torna a cair... (Págs. 56 a 58)
  • 29. ATENÇÃO: Na cena em que Fräulein e Carlos encontram-se na biblioteca, a sedução do aluno pela professora se processa gradativamente; percebe-se uma tensão provocada pela indefinição e pelo jogo de revelar e encobrir estabelecido tacitamente entre ambos, até o momento em que a situação se inverte, e Fräulein surpreende-se com os próprios sentimentos. Deitou o braço direito sobre o dele, lhe segurando a mão, soerguendo-a do papel. Assim, não é para intrigar, porém ele ficava abraçado. Abaixou a cabeça, querendo e não querendo, que desespero! era demais! se ergueu violento. Empurrou a cadeira. Machucou Fräulein. — Não escrevo mais! Ela ficou branca, tomou com um golpe. Custou o: — Que é isso? Venha escrever, Carlos! — Desse jeito não escrevo mais! A briu a luz da janela. Olhava pra fora, raivoso, enterrando virilmente as mãos nos bolsos do pijama, incapaz de sair daquela sala. Fräulein não compreendia. Estava bela. Corada. Os cabelos eriçados, metálicos. Doía nela o desejo daquele ingênuo, amou-o no momento com delírio. Revelação! (Págs. 88-90)
  • 30. ATENÇÃO: Carlos entrara no quarto de Fräulein. Mal tivera tempo de. Porém já machucara a amante, cruzando as pernas sentado. Tátão, tão, tão! - Meu Deus! Entra Sousa Costa. (Pág. 134)
  • 31. Fräulein sacudida pelos soluços nervosos entrou no automóvel . Partiam mesmo. Debruçou-se ainda na portinhola: - Meu Carlos... (Pág.139)