Este documento fornece informações sobre a avaliação fonoaudiológica de pacientes ortodônticos. Discute a importância da anamnese para identificar hábitos bucais inadequados e como a forma e função estão intimamente relacionadas. Também descreve as posturas normais de repouso dos lábios e língua e os principais tópicos da avaliação clínica, incluindo observações informais e exame clínico.
2. AVALIAÇÃO
FONOAUDIOLÓGICA
283
INTRODUÇÃO
no Brasil é realizada pelo fonoaudiólogo. Os objetivos deste tratamento são não só evitar as recidivas
oclusais após a retirada do aparelho, como também, favorecer o tratamento ortodôntico retirando as forças musculares contrárias à terapia.
Este capítulo pretende fornecer ao ortodontista dados para que possa identificar alterações
musculares e funcionais.
Desde 1839, com Le Foulon, vários pesquisadores vêm se dedicando ao estudo das relações existentes entre a presença da má oclusâo dental e 'as
anomalias anatomofuncionais da cavidade bucal,
Pode-se afirmar que o desenvolvimento muscular e ósseo estão em íntima relação. A ação
modeladora dos músculos sobre os arcos dentais quando bem equilibrada e harmoniosa,
pode favorecer uma oclusão adequada, Concluise que qualquer alteração no mecanismo funcional poderá determinar desvios e conseqüentes
deformações ósseas.
Os músculos, ao exercerem sua função, modelam os ossos e. de certo modo dirigem o seu
crescimento.
Segundo Graber, apesar de ser o tecido ósseo
um dos mais duros do corpo, é um dos mais plásticos e que mais respondem ãs forças funcionais.
Por isso, é necessário que todos os profissionais
que de alguma maneira se relacionam com esta
área, os ortodontistas em particular, saibam identificar alterações musculares e funcionais orofaciais. O tratamento destas alterações favorece a estabilidade dos casos tratados ortodonticamente. A
ele deu-se o nome de terapia miofuncional e aqui
I - DIAGNÓSTICO
I-ANAMNESE
A avaliação da musculatura oral deve ser precedida de uma anamnese, com o objetivo maior
de averiguar se o paciente é portador de algum
hábito bucal inadequado como sucção do dedo
(Figs. 14.1 e 14.2) ou chupeta (Fig. 14.3) - reportar ao Capítulo 13 - pois sabe-se que eles
podem interferir no padrão regular de crescimento facial sendo por isso a etiologia de muitas
más oclusões . Além do mais, a permanência do
hábito inadequado impedirá a automatização das
posturas bucais corretas e afetará a fisiologia oral.
Portanto, identificar o hábito bucal inadequado é fundamental
para assegurar a estabilidade da correção ortodôntica.
"
14.1B
lA
Fig. 14.1 A e B - Paciente portador do hábito bucal inadequado de sucção do polegar. Notar a má posição dos lábios e mandíbula quando o polegar
está dentro da boca,
3. 284
ORTODONTIA·
DIAGNÓSTICO
E PL:ANEJAMENTO CLÍNICO
c
14.
Fig. , 4.1 C e D - Efeitos do uso inadequado da sucção do polegar:
eversão do lábio inferior e mordida aberta anterior.
-.
Fig. , 4.2 - Conformação
polegar.
do palato duro decorrente
da sucção do
2- INTER-RELAÇÃO FORMA E FUNÇÃO
Há muito se admite a importância da interrelação forma e função e pergunta-se: são as
alterações funcionais que causam a má oclusão
ou o inverso?
Através de pesquisas foi observado que:
aqueles que acreditam que a má oclusão causa
alterações funcionais preconizam que a forma
anatômica determina a função, bastando, por-
Fig. 14.3 - Hábito de sucção da chupeta. Notar o número de chupetas
indicando que o seu uso é contínuo.
tanto, conigir a má oclusão para que a função
normalize-se espontaneamente.
-,
Isso pode ocorrer? Sim, mas não se pode
prever se ocorrerá.
Como também há outros que acreditam
que a função determina a forma.
Na verdade ainda não se chegou a uma conclusão exata do que é primário: Forma ou Função.
O importante é não dicotomizar forma e
função. Ambos os aspectos devem ser avaliados
4. AVALIAÇÃO FONOAUDIOLÓGICA
concomitantemente, sem priorizações, de um
sobre o outro. O avaliador deverá realizar um
esforço no sentido de tratar o problema na sua
totalidade, permitindo todas as possibilidades.
É fundamental manter-se aberto à análise das
inter-relações variadas entre a oclusão dental e
as funções, pois forma e função estão em íntima relação.
Recentemente, Bianchini ressaltou a importância da análise cefalométrica como complemento à avaliação fonoaudiológica. Ocorre que
alguns componentes anatõmicos são bastante
difíceis de serem obtidos sem a observação de
radiografias. Os dados da análise cefalométrica
devem ser fornecidos pelo ortodontista e auxiliam o diagnóstico. Para o fonoaudiólogo os
ângulos mais importantes são aqueles que fornecem os dados para a classificação do tipo facial do paciente, espaço nasofaríngeo e a inclinação dos incisivos.
"A visualização dos espaços orgânicos e
mensuração da quantidade de crescimento ósseo, principalmente em relação à maxila e à
mandíbula (plano sagital), pode prever ou estabelecer padrões posturais de língua e lábios específicos para aquele indivíduo, assim como
pode prever também as dificuldades para o estabelecimento destes padrões posturais" (Bianchini).
Para a fonoaudiologia, o trabalho de Bianchini. foi um passo importante em busca de se
estabelecer com maior precisão a relação forma e função que deverá ser a base de toda a
avaliação.
3- POSTURAS NORMAIS DE REPOUSO
Sabe-se que os dentes são mantidos em alinhamento pelo equilíbrio de forças musculares
antagônicas que, internamente, estão representadas pela ação dos músculos da língua e externamente pelos músculos orbicular, mentoniano e bucinador (periorais).
Segundo Winders, a força da língua sobre
os dentes é maior que a exercida pelos músculos periorais.
A ação modeladora destes músculos é exercida tanto em repouso como em ação, ou seja,
durante as funções. Portanto, a ação da musculatura em repouso é ativa no equilíbrio ósseo.
Para mover os dentes são necessárias forças
leves e contínuas. As pressões de repouso da
língua e lábios atuam desta forma e, portanto,
podem influenciar na posição dos dentes. Especialmente considerando que, em freqüência,
o
285
fica-se mais tempo com a musculatura em repouso do que em ação.
A postura normal de repouso dos lábios é
fechados sem esforço (Fig. 14.4). Para isso, o
lábio inferior deve cobrir os incisivos superiores em mais ou menos 2mm.
Fig. 14.4 - Postura normal de repouso dos lábios. Observar "que os
lábios estão ocluídos sem esforça.
A posição de repouso dos lábios superior
e inferior pode ser influenciada pela posição
anteroposterior dos incisivos superiores e inferiores." Conseqüentemente,
é importante
que os i~cisivos estejam alinhados e colocados corretamente neste sentido para possibilitar postura labial adequada. Outros quatro
fatores podem influenciar o comportamento
labial: altura labial com relação ao processo
alveolar, força, comprimento e espessura dos
lábios.
Encontra-se, na literatura, duas formas de
definir a postura normal de repouso da língua:
a) Toque de toda a porção anterior da língua
na região da papila palatina; ela está sempre
elevada, conforme Altmann (Fig. 14.5A).
b) O dorso da língua toca o palato de leve enquanto a ponta normalmente está em repouso
na fossa lingual ou sulco dos incisivos inferiores, segundo Moyers (Fig. 14.5B).
Ocorre que a língua possui uma infinidade
de movimentos. É muito versátil adapt/ndo-se
facilmente às irregularidades da cavidade bucal.
Por isso, sua postura geralmente está relacionada com as alterações presentes no meio bucal. A
posição normal da ponta da língua tem relação
com a dimensão anteroposterior e vertical da
cavidade oral, conforme Bianchini.
5. 286
ORTODONTIA·
DIAGNÓSTICO
E PLANEJAMENTO CLíNICO
14.5A
1
Fig. 14.5. A - Postura de repouso da língua elevada, com sua porção
anterior tocando a papila palatina, (Segundo Altmann). B - Postura de
repouso da língua com a-pomo repousando no sulco dos incisivos
inferiores ou na fossa lingual (Segundo Moyers).
11-TÓPICOS DA AVALIAÇÃO
I -OBSERVAÇÃO INFORMAL
Antes do exame clínico propriamente dito,
considera-se importante que seja feita uma observação informal, ou seja, uma observação
onde o paciente não saiba que está sendo avaliado. Informações preciosas são captadas a par-.
tir desta etapa da avaliação.
Constata-se que algumas situações são muito comuns de ocorrerem:
a) durante o exame clínico o paciente mantém
os lábios fechados, enquanto que em situação
espontânea fica com eles abertos.
b) o paciente pode repetir corretamente
uma palavra que em fala espontânea emite
alterada.
Por isso, sugere-se que sejam feitas observações em sala de espera ou durante conversa
informal.
2 - EXAME CLíNICO
o exame clínico deve ser feito com o
paciente sentado na cadeira, de modo que
ua coluna esteja ereta e sua cabeça bem
posicionada.
A - Postura Corporal e Postura de Cabeça
A postura de cabeça é importante de ser
observada, pois interfere no posicionamento
da língua dentro 'da cavidade bucal.
"Um desvio de cabeça será; às vezes,
suficien te para que a língua ocupe mais
um lado da cavidade bucal do que o outro"
(Marchesan) .
Se não há equilíbrio adequado da cabeça
sobre o tronco, pode haver incentivo de crescimento anômalo das bases ósseas.
A posição da cabeça geralmente está associada com o eixo corporal. Por isso, desvios ao nível do eixo corporal como cifóse,
escoliose e lordose, podem ter como consequência a mudança na postura da cabeça,
justificando assim uma avaliação fisioterápica (Fig. 14.6).
B - Avaliação das posturas
lábios e língua
de repouso
dos
As pressões de repouso dos lábios e língua
interferem sobre os dentes e ossos, por isso,
torna-se necessário incluir a sua avaliação como
parte do exame clínico.
Atualmente há concordância em que não se
pode avaliar da mesma forma indivíduos com
características de oclusão dental e forma esquelética diferentes.
7. 288
ORTODONTIA·
Por isso, serão citadas as alterações musculares e funcionais mais freqüentes em cada tipo
de má oclusão.
Os pacientes portadores de má oclusão de
Classe I geralmente apresentam perfil esquelético reto, por isso, os lábios e a língua têm maiores possibilidades 'de manterem suas posturas
normais de repouso.
.' ',' e '.
.' Nos pacientes portadores de má oclusão de
Classe Ildisisâo 1 a postura dos lábios e língua
fhVíli> depender da existência ou não de discrepân-
DIAGNÓSTICO
E PLANEJAMENTO CLíNICO
cia entre as bases ósseas. Quando há alteração
óssea, as alterações labiais são freqüentes. Os lábios têm dificuldade de se manterem fechados em
função da distância existente entre eles, r~sultante da discrepância óssea. Por isso, o lábio superior
tende a se tornar hipofuncionante e algumas vezes incompetente. O lábio inferior, por sua vez,
pode se tomar evertido e hipotônico. Como resultante final existem duas possibilidades: o lábio
inferior pode fazer o vedamento bucal com os
incisivos superiores (Fig. 14.7) ou algumas vezes
14.
14.7A
Fig. /4.7. A, B -
Vista de frente e perfil do paciente que apresenta lábio inferior interposto entre incisivos superiores e inferiores.
Fig./4.7.C
- Observar a inclinação para vestibular dos incisivos
superiores dificultando o vedamento labial adequado.
Fig.14. 7.0 - Postura de repouso dos lábios, Notar que o lábio inferior
está atrás dos incisivos superiores.
8. AVALIAÇÃO
FONOAUDIOLÓGICA
289
Fig. /4.7.E - Notar a adaptação do lábio inferior à inclinação dos
incisivos. Observar lábio superior encurtado e lábio inferior atrás dos
incisivos superiores.
pode ocluir com o lábio superior, porém com
tensão do músculo mentoniano. Este fica tenso,
em conseqüência do esforço excessivo que ele
está fazendo para que ocorra o vedamento labial.
No paciente com Classe II divisão Ia esquelética; a postura de repouso da língua geralmente é
elevada na su~ porção dorsal e rebaixada no seu
ápice devido à dimensão anteroposterior diminuída que é caracterizada por desproporção entre a
maxila e a mandíbula. A língua em repouso também pode encontrar-se entre os arcos dentais.
Nos pacientes portadores de má oclusão de
Classe II divisão 2a, é comum que haja vedamento labial normal.
Pacientes portadores de Classe III com alterações ósseas presentes, como por exemplo ma-
xila normal e mandíbula avançada, podem
apresentar dificuldade de vedamento labial. Os
lábios ficam abertos e a língua hipotônica, alargada, plana ou elevada, acomodada no soalho
da boca, pois a língua tende sempre a ocupar o
espaço maior que lhe é oferecido.
~
Pacientes portadores de mordida aberta dental, geralmente possuem postura lingual alterada. A abertura anterior é um convite para a língua avançar e ocupar o espaço vazio, tornandose portanto projetada. Alguns questionam se foi
a língua, com sua postura anteriorizada, que
provocou a mordida aberta ou se foi a mordida
aberta que provocou sua postura anterior. Tanto a primeira quanto a segunda hipótese são
possíveis de serem constatadas (Fig. 14.8).
14.8A
14.8B
Fig. /4.8 A - Paciente com mordida aberta anterior. B - Observar postura da língua em repouso que encontra-se projetada e adaptada à má oclusão.
9. ORTODONTIA·
290
Pacientes portadores de mordida aberta esquelética podem apresentar dificuldade de vedamento labial e posicionamento lingual incorreto em função do terço inferior da face que
pode estar aumentado.
Em todos os casos citados acima, sem que
haja correção da forma, dificilmente conseguese atingir uma estabilidade postural dos lábios
e língua. Por isso, muitas vezes o ortodontista
deve interferir antes ou concomitantemente ao
tratamento fonoaudiológico.
Vale ressaltar, também, que os freios labial e
língual têm interferência nas posturas de repouso.
O freio lingual, tanto de inserção longa
como curta no sentido vertical, limita a movimentação do terço anterior da língua, interferindo na postura da mesma em repouso e durante as funções.
Por sua vez, o freio labial curto pode limitar
a movimentação labial e, com isso, dificultar o
vedamento.
c - Descrição
DIAGNÓSTICO
E PLANEJAMENTO CLíNICO
3- Dolicofacial
ou
face longa
• padrão de crescimento facial vertical
• ângulo goníaco aberto
• altura facial inferior aumentada
• musculatura
débil e estirada
A altura facial inferior aumentada pode dificultar a oclusão labial e o posicionamento da
língua.
A musculatura
mais flácida, associada à
face longa, pode levar à exacerbação dos padrões funcionais
e da forma apresentada
pelo indivíduo.
b - Padrões faciais sagitais
1- Classe I - perfil esquelético reto
2- Classe II ou Classe II esquelética - perfil convexo
3- Classe III ou Classe III esquelética - perfil
côncavo
da Face
D - Avaliação das funções
Determinar o tipo facial do paciente é um
complemento diagnóstico de grande importância, já que, desproporções entre ossos e partes
moles, determinam com freqüência problemas
miofuncionais sendo também um auxiliar no
prognóstico de tratamento.
Pode-se encontrar alterações faciais decorrentes da combinação dos padrões de crescimento sagital e vertical.
Funções
abcd-
Mastigação
Deglutição
Respiração
Fonação
Todas as funções referidas são interdependentes e comandadas por grupos musculares
que atuam de forma combinada e, em várias
delas, concomitantemente.
a - Padrões faciais verticais
a - Mastigação
1 - Mesofacial
2 - Braquifacial
ou
face curta
• padrão de crescimento facial médio
• terços da face equilibrados
• padrão de crescimento facial horizontal
• ângulo goníaco fechado
• altura facial inferior diminuída
• musculatura forte e encurtada
O terço inferior diminuído limita o espaço
interno vertical, restringindo a movimentação
da língua.
A musculatura forte da face curta pode diminuir os efeitos causados pela presença de um
hábito bucal inadequado.
A mastigação é uma função aprendida, condicionada e automática.
Assim como a deglutição, a mastigação faz
parte de um processo maior que é a digestão.
Observa-se que o indivíduo que apresenta
uma boa oclusão pode mastigar bilateralmente
de forma alternada ou simultânea: mastiga primeiro de um lado e depois passa o bolo alimentar' para o outro ou mastiga dos dois lados
ao mesmo tempo.
De acordo com Hedegard e Wictorine, o
padrão da mastigação natural, típica e instrumentada por dentes naturais, consiste em alternar o mais homogeneamente
possível o lado
de trabalho, ou seja, regularmente o alimento
vai ora para a direita, ora para esquerda, em
número similar de vezes.
10. AVALIAÇÃO
291
FONOAUDIOLÓGICA
Muitos estudos têm concluído que a mastigação bilateral alternada estimula as estruturas de
suporte e favorece um crescimento harmonioso.
Por isso, indivíduos com preferência mastigatória unilateral de longa duração podem "ter
um crescimento assimétrico da face. Este padrão de mastigação ocorre com mais freqüência na presença de alterações como mordida
aberta posterior, cáries, ausências dentais ou
mordida cruzada posterior.
Segundo alguns autores, a mastigação unilateral pode ser a causa ou a conseqüência de
uma mordida cruzada posterior. Tem-se observado que indivíduos que possuem mordida cruzada unilateral têm maior facilidade paxa mastigar no lado do cruzamento em decorrência da
dimensão vertical diminuída. Ao mesmo tempo
observa-se que pode haver impedimento dos
movimentos de lateralidade da mandíbula por
interferência das cúspides.
Sabe-se, conforme Bradley, que no lado do
trabalho (onde está ocorrendo a mastigação)
as forças desenvolvidas durante a mastigação
são maiores e duram mais do que o lado oposto. Isso repercute nas condições dos músculos
envolvidos na mastigação. É comum observar
nestes casos o masseter do lado do trabalho,
mais forte e encurtado e, no lado do balanceio,
o masseter mais fraco e estirado justamente
pela falta de uso. Tal quadro pode provocar
assimetrias faciais, dependendo da fase de crescimento do paciente em questão, ou até problemas de ATM. Para se avaliar o músculo masseter pode-se tocá-lo levemente durante a mastigação ou pedir para o paciente apertar os
dentes e procurar sentir a contração, através de
palpação.
No caso das mordidas cruzadas unilaterais,
para que se estabeleça a mastigação bilateral é
necessário o descruzamento da mordida. Muitos pacientes com mordida cruzada unilateral,
quando orientados para a mastigação bilateral,
não conseguem modificar seu padrão mastigatório o que se atribui a presença do cruzamento. Por isso, nestes casos, prioriza-se o tratamento ortodôntico e somente depois, orienta-se o paciente a mastigação bilateral.
Alguns estudos têm sido feitos no sentido
de se estabelecer relação entre má oclusão e
padrão mastigatório.
Na mastigação normal os primeiros movimentos mandibulares são executados no sentido vertical e quando o alimento começa a ser
triturado os movimentos se dão de forma rotatória. Recentemente, Junqueira observou que
pacientes Classe Ill costumam apresentar movimentos mandibulares com pouca rotação e lateralização da mandíbula.
Por sua vez, Bianchini observou que no paciente Classe II esquelética, durante amastigação, há tendência à anteriorização mandibular
com dificuldade de oclusão labial. Na Classe
III esquelética prevalecem os movimentos
mais verticais da mandíbula, mastigação anterior ou a utilização excessiva do dorso da língua fazendo o esmagamento do alimento contra o palato.
Constata-se que são poucas as informações
sobre o padrão mastigatório normal para cada
tipo de má oclusão. No entanto, admite-se a
necessidade do restabelecimento
da oclusão
para que o padrão mastigatório se normalize.
b - Deglutição
A deglutíçâo constitui a fase final da mastigação e o início da digestão dos alimentos.
Compreende um conjunto de movimentos que
de início são voluntários e posteriormente involuntários.
O mecanismo da deglutição funciona de
forma diferente na criança e no adulto. Até
aproximadamente os quatro anos de idade a
criança deglute com os maxilares separados e a
língua entre eles. Depois desta idade, a criança
inicia a passagem para uma deglutição madura
que envolve a oclusão de todos os dentes, o
toque da língua na parte anterior do palato
(região da papila palatina) e a mínima contração dos lábios (Fig. 14.9). O desvio no padrão
maduro de deglutição denomina-se deglutição
atípica.
Diversos autores referem-se à deglutição atípica como um dos hábitos bucais a interferir
no estabelecimento e manutenção de uma boa
Fig. /4.9- Postura da língua durante a deglutição madura (Segundo Moyers).
11. 292
."
ORTODONTIA·
oclusão dental, por isso enfatizam a necessidade do clínico em saber identificá-la e tratá-Ia.
Segundo Hanson, o alinhamento dental é
ameaçado quando na presença de pressões atípicas. Pressões excessivamente fortes e/ou freqüentes da língua, geralmente acompanhadas
de pressões muito leves e/ou pouco freqüentes
dos lábios, contribuem para o desenvolvimento,
permanência ou recidiva da má oclusão dental.
Segundo o referido autor, a deglutição atípica caracteriza-se por apoio ou pressão da
DIAGNÓSTICO
E PLANEJAMENTO CLÍNICO
língua sobre mais da metade da superfície lingual dos incisivos ou cúspides, tanto superiores como inferiores, ou projeção da língua
entre os dentes superiores e inferiores, tanto
durante o repouso quanto durante a deglutição de saliva, líquidos ou alimentos
(Fig.
14.10). Segundo Hanson, caso a projeção da
língua, na deglutição, seja observada somente
com relação a um dos três elementos, mas,
não em repouso, fica descaracterizada
a deglutição atípica.
Fig. /4./ O - Deglutição atípica. Projeção da língua entre os dentes
superiores e inferiores durante a deglutição de saliva.
Existem alguns sintomas que também são
citados como parte do quadro do deglutidor
atípico:
• musculatura perioral hiperativa - (FIg. 14.11)
• ausência de .contraçâo do masseter
Em sendo o segundo ítem o mais controvertido, será interessante observar que: para
alguns autores, na deglutição normal a contração dos masseteres se dá pela elevação e
conseqüente
estabilização
da mandíbula
e
língua, facilitando assim a deglutição dos sólidos. Na deglutição dos líquidos esta estabilização não é tão necessária e a contração
pode ser mínima. Quando há ausência total
de contração, geralmente é porque a língua
se colocou entre os maxilares, o que será então considerado atípico.
Porém, para Marchesan, a ausência de contração de masseter não caracteriza atipia, pois
através de estudos eletromiográficos demonstrou que a contração de masseter ocorre anteriormente à deglutição. Isso é explicado pelo
fato do masseter levantar a mandíbula e a seguir relaxar-se, para que o ventre anterior do
digástrico tenha sua ação - que é posterior a do
masseter - e não conjunta.
Na deglutição atípica ao invés da ponta da
língua tocar a papila pala tina, como na deglutição normal, ela projeta-se entre os arcos ou
simplesmente exerce uma pressão na região
anterior ou lateral da face lingual' dos dentes
(Fig. 14.12).
Considera-se que a deglutiçào atípica caracteriza-sepelo desvio do padrão maduro de deglutição,
por isso alguns autores a chamam de imatura ou
infantil. A partir dos 4 anos de idade a criança já
tem condições melhores para deglutir com a ponta da língua pressionada na papila palatina, já que
antes dessa idade ela vem passando por processos
de maturação dos órgãos fonoarticulatórios,
como também vem sofrendo as alterações anatômicas estruturais necessárias, tais como: o osso
hióide desce, abaixando e retraindo a língua; o
esqueleto facial e a cavidade oral crescem proporcionalmente mais que a língua, fornecendo
espaço para ela desempenhar suas funções; os
dentes erupcionam e, em termos funcionais, os
lábios, a língua e a mandíbula adquirem funções
independentes.
Até a criança atingir o padrão maduro de
deglutição, ela passa por vários padrões intermediários. Por isso, a partir dos 4 anos, a criança deve ser observada com atenção especial,
12. AVALIAÇÃO
'4.'
293
FONOAUDIOLÓGICA
Fig.
I.A - Deglutição atípica. Observar a postura de repouso dos
lábios que se encontram fechados com esforço.
'4.'
Fig.
'.B - Na seqüência, musculatura
a deglutição de líquido.
perioral hiperativa durante
14.12B
4.12A
Fig. '4.'2 - Deglutição atípica. A - Projeção anterior da língua entre os arcos. B - Projeção lateral da língua entre os arcos.
~~ fOAoE FEDE~Jl fi) f" (:tm~() OE ODONTOLOGIA
~:Jli;iH;;,~ROFDR FRANCISCO G,ÁL'>~
13. 294
ORTODONTIA·
pois caso apresente deglutição atípica não
acompanhada de outro problema (como alterações na fala e/ou respiração bucal), pode
apenas manter-se sob observação até os 7 ou 8
anos, pois durante a dentição mista há um pe- .
ríodo de transição na maturação dos órgãos
fonoarticulatórios.
Caso contrário deverá ser
encaminhada para o tratamento.
DIAGNÓSTICO
E PLANEJAMENTO CLÍNICO
Muitos autores têm ressaltado a importância
de se pesquisar as causas da deglutição atípica
para que ela seja efetivamente tratada. Muitas
vezes ela pode ser decorrente de um mau funcionamento de outras funções como a mastigação e a respiração (Fig. 14.13).
Uma mastigação eficiente (caracterizada
pela medida do tamanho das partículas' em que
14.
14.13A
Fig. /4./3 - Causas da deglutição atípica. A - O paciente apresenta respiração bucal que promoveu mudanças na posição de repouso dos lábios,
língua e mandíbula resultando em alterações na deglutição. B - Amígdalas hipertroVadas. Se as infecções forem recorrentes o paciente tenderá a
deglutir com a língua em posição anterior para evitar sensação dolorosa (Segundo Netter).
.
o alimento foi dividido e determinada pela ausência de partículas grandes) permite uma deglutição adequada, pois o alimento foi preparado de forma correta. Em contrapartida, uma
mastigação ineficiente leva o indivíduo a deglutir o alimento em partículas maiores dificultando a deglutição. Por isso, muitas vezes observa-se
o movimento de jogar a cabeça para trás feito
como uma tentativa de facilitar a deglutição.
Com relação à respiração bucal, sabe-se que
ela pode promover mudanças na posição de
repouso da língua e mandíbula, acarretando
alterações na deglutição. Por isso, é preciso
adequar a mastigação e respiração para que a
deglutição normalize-se.
São também citados como fatores responsáveis da deglutição atípica: hábitos de sucção
inadequados, amígdalas hipertrofiadas, língua
hipotônica, espaços abertos durante a dentição
mista, tipo facial, más oc1usões, e características
genéticas estruturais.
Em 1965, Cleall criticou o conceito de deglutição normal, pois pôde verificar em seus
estudos que as posições e os movimentos das
estruturas bucais se devem às características
morfológicas individuais, ou melhor, o sistema
estomatognático possui a habilidade de adaptar-se às mudanças do meio bucal. Segundo
esta mesma linha de pensamento, diversos estudos advogam que a interposição lingual é
conseqüência
de uma relação morfológica
anormal e, portanto, de adaptação da língua à
má oc1usão. Daí a razão de substituir o termo
deglutição atípica por deglutição adaptada.
14. AVALIAÇÃO
,
FONOAUDIOLÓGICA
Para ele, a adaptação pode intensificar ou manter a má oclusão.
Vários pesquisadores
concordam com a
idéia de que existe uma relação importante
entre o grau e o tipo de má oclusão e a presença ou ausência de deglutição atípica. Para que
a língua atue adequadamente
e execute padrões vegetativos maduros ela necessita de espaços amplos. Qualquer limitação seja vertical,
lateral ou longitudinal faz com que a língua se
295
movimente em direção a um espaço não limitado, ou seja, a abertura da cavidade bucal, (Fig.
14.14). Assim nos indivíduos portadores de
mordida aberta anterior haverá uma tendência
da língua projetar-se para frente. Como disse
Moyers, algumas mordidas abertas resultam da
posição anormal da língua, enquanto outras
provocam uma adaptação na função, ou seja, a
língua se expande em conseqüência do meio
propício (Fig. 14.15).
14.14B
Fig. /4./4
A, B - Mordida cruzada /imitando a movimentação
da língua durante a deglutição.
14.15B
Fig. /4./5 A - Mordida aberta anterior. B - Vista lateral. C - Projeção
anterior da língua no espaço da mordida aberta.
15. 296
ORTODONTIA·
Autores como Subtelny, asseveram que a
função é uma adaptação à forma encontrada.
Para ele a função não deve ser corrigida antes
da correção da forma. Após esta, a função pode
ter sido normalizada automaticamente ou ter
suas alterações diminuídas.
Contrapondo-se a eles, pesquisadores como
Hanson, Straub e Cooper acreditam que a força da língua é que desequilibra a oclusão.
Com relação a esta polêmica tem-se constatado que a normalização
da forma pode
trazer a normalização da função. Entretanto,
em alguns casos, observa-se que mesmo depois da correção da forma alguns padrões
adaptativos utilizados anteriormente
podem
permanecer,
prejudicando
o tratamento ortodôntico e necessitando, portanto, da terapia miofuncional.
DIAGNÓSTICO
E PLANEJAMENTO CLÍNICO
Considerando-se que a função adapta-se à
forma, não se pode esperar que indivíduos com
formas diferentes executem as funções de maneira igual. O paciente Classe II divisão Ia com
sobressaliência pronunciada comumente apresenta deglutição com interposição do lábio inferior atrás dos incisivos superiores e atividade
intensa dos músculos do mento e bucinador
(Fig. 14.16). Pode haver concomitantemente
deslize mandibular anterior durante a deglutição para aumentar o espaço intrabucal. O
arco superior pode apresentar-se com grande
atresia limitando a movimentação da língua
para cima, havendo então interposição lingual
entre os arcos. No paciente Classe III esquelético a deglutição ocorre com grande anteriorização da língua e participação atípica da musculatura perioral.
14.~
l-1.16A
Fig. '4.'6 A - Paciente em posição de repouso. A inclinação dos
incisivos superiores favorece a interposição labial. B - Na seqüência o
paciente deglutindo saliva e repetindo a mesma posição.
Então, através dos dados apresentados,
fica claro que a deglutição é um tema que
uscita opiniões bastante controvertidas.
E
como em todos os outros aspectos o tema
deglutição em especial deverá ainda ter seu
estudo continuado.
c - Respiração
A função respiratória normal se faz por via
nasal. Nas fossas nasais o ar é limpo, aquecido e
umidificado para depois ser conduzido aos pulmões onde serão efetuadas as trocas gasosas.
16. AVALIAÇÃO
297
FONOAUDIOLÓGICA
Quando há impedimento da respiração nasal,
estabelece-se a respiração bucal. O termo respiração bucal refere-se àqueles que respiram predominantemente pela boca, pois alguns deles podem apresentar algum grau de respiração nasal:
Aceita-se com freqüência que a respiração bucal possa ser a etiologia de muitas
más oclusões (Linder-Aronson).
Portanto, o
tratamento ortodôntico sem o cuidado adequado com a respiração bucal corre o risco
de recidivar.
A função respiratória está diretamente ligada ao desenvolvimento
dentofacial. Todo
paciente com obstrução nasal crônica pode
tornar-se um respirador bucal, o que normalmente leva a alterações na face, principalmente
durante
a fase de crescimento
(Mocellin). Freqüentemente
as alterações
conseqüentes de uma respiração bucal vão
depender da idade em que o indivíduo ad-
quiriu a obstrução nasal, da severidade e
duração da obstrução, como em todas as
outras funções.
Estas alterações da respiração tem também
significativa interferência da carga genética. O
indivíduo apresentando determinadas características hereditárias como espaço nasofaríngeo
reduzido, fossas nasais estreitas e outras, tenderá a apresentar a respiração bucal que nesses casos, posteriormente atuará como agente
exacerbador das alterações. Estas considerações encontram
apoio no pensamento
de
Emslie e Mayoral em que se discute se a respiracão bucal é a causa ou conseqüência das deformidades várias.
Quando a obstrução nasal ocorre em dimensões suficientes para impedir a respiração
nasal terá como resultante adaptações posturais
das estruturas da cabeça e região do pescoço
(Figs. 14.17 e 14.18).
,
17A
14.17B
Fig. 14.17 - Paciente respirador bucal. A - Observar postura inadequada de repouso da língua e lábios. B - Observar lábios oe/uídos com esforço.
18A
14.18B
Fig. 14.18 A - Face de um respirador bucal. Notar incompetência mandibular, labial e lingual. Observar olheiras e aspecto cansado. B «Observar
vedomento labial forçado.
Para o diagnóstico da presença ou não de
respiração bucal, deve-se estar atento a sintomas que são característicos do quadro, e que
serão descritos a seguir.
A necessidade de estabelecer um adequado fluxo
aéreo por via bucal promoverá trocas posturais da
língua e da mandíbula, cujos possíveisefeitos indesejáveisno crescimento facial têm sido discutidos.
17. 298
ORTODONTIA'
Em geral, o respirador bucal não apresenta
competência labial que pode ser definida como
capacidade de manter os lábios em contato. Eles
necessitam ficar abertos para facilitar a entrada
de ar pela boca. Conseqüentemente pode haver
DIAGNÓSTICO
E PLANEJAMENTO CLíNICO
alteração do tônus com hipofunção dos lábios e
bochechas. O lábio superior pode apresentar-se
retraído ou curto e o inferior evertido e, algumas vezes, com aspecto alterado, pois os lábios
podem estar secos e rachados (Fig. 14.19).
Fig. 14.19 - Lábios abertos evertidos, com aspecto volumoso e
ressecado _.característico do respirador bucal.
Alguns respiradores bucais apresentam hipotonia e hipofunção dos músculos elevadores
da mandíbula (masseter, temporais, pterigoideos mediais), resultando na mudança da posição
de repouso da mesma. Ocorre um rebaixamento mandibular para facilitar o fluxo aéreo via
bucal e a este fato dá-se o nome de incompetência mandibular.
A língua, em geral, apresenta-se baixa, em
posição inferior para facilitar a entrada de ar
pela boca. Algumas vezes pode-se observá-Ia
com o dorso elevado com a finalidade de regular o fluxo de ar.
Alterações no diâmetro transversal e profundidade palatal foram observados por diversos autores. No respirador bucal o palato
pode apresentar-se alto ou atrésico. Alguns
atribuem este fato à posição de repouso da
língua no soalho bucal, pois nesta conjuntura ela não exerce força contra o palato, perdendo assim sua função de modeladora natural.
Em estudos comparativos entre respiradores
nasais e bucais encontrou-se um conjunto de
alterações musculares que se denominou Síndrome da Face Longa ou Faces Adenoideanas
(Fig.14.20).
Ela caracteríza-se por:
• face longa e estreita
• ângulo goníaco aumentado
cia de crescimento vertical
pela tendên-
• base posterior do crânio mais curta
• palato alto e/ou atrésico
• incompetência mandibular, labial e lingual
• narinas estreitas
• cabeça má posicionada em relação ao pescoço (inclinada para trás)
Entretanto,
vale ressaltar que nem todo
respirador bucal apresenta tal quadro.
A respiração bucal pode ter uma causa orgânica ou ser apenas um hábito vicioso.
A respiração bucal viciosa, é aquela em que
não há nenhuma obstrução das vias aéreas superiores, e sim má posição dos lábios, língua e
mandíbula. Ou seja, o indivíduo respira pela
boca, embora tenha capacidade anatomofisiológica de respirar pelo nariz.
A respiração bucal orgânica é aquela em
que há problemas orgânicos obstruindo
a
passagem de ar pelo nariz. As causas da obstrução nasal são muitas, mas as mais freqüentes
são: hipertrofia
da vegetação adenoideana
(Fig. 14.21, 14.22), rinite alérgica, desvio de
septo, sinusite, bronquite, hipertrofia dos cornetos nasais e infecções crônicas das amígdalas
palatinas.
Quando a respiração bucal é de origem obstrutiva, torna-se necessário encaminhar ao otorrinolaringologista para que ele possa fazer tratamento medicamentoso ou mesmo cirúrgico
para, só então, iniciar a fonoterapia, visando à
instalação da respiração nasal e fortalecimento
da musculatura bucal.
18. 299
AVALIAÇÃO FONOAUDIOLÓGICA
90A
14.20B
~
~ .,..,.. ...
~ ~
;:1
S; 'JJ ~
':)
-:::)
=
o d
..,.,
o
;:;o
.....
?]
=
("")
u;
it,
(I
r~)
(")
Z
-;
o
r:
"o
o
00
~'5>
x:
~.
4.20C
14.20D
Fig. /4.20 - Síndrome da face longa. A, B - Face longa ou faces adenoideanas.
confirmada pelos dados da análise cefalométrica.
c, O -
Observar inclinação do plano mandibular, que deverá ser
&:
t:"i
a
19. 300
Fig. '4.2' - Radiografta lateral mostrando
ORTODONTIA·
hipertrofta da vegetação
adenoideana.
Segundo Marchesan e Krakauer, o tratamento fonoterápico de crianças respiradoras
bucais entre 4 a 5 anos, sem características genéticas desfavoráveis, tem como finalidade dar
condição de postura correta dos lábios e da lín!TUa, com a manutenção destas condições facie
litar o desenvolvimento mais harmônico das
esrruturas.
Segundo as mesmas autoras, os respiradores
bucais adultos podem ser divididos em dois tipos:
• Os que se tornam respiradores bucais na
fase adulta
• Os que já eram respiradores bucais desde
a infância e só procuraram tratamento na fase
adulta.
O primeiro grupo geralmente apresenta
problemas musculares e não ósseos, uma vez
que o crescimento facial já havia terminado
quando se tornaram respiradores bucais. Assim, o suce so do tratamento fonoterápico nes- - casos é maior.
[Q ao segundo
tipo, a fonoterapia
e ' não levar às condições ideais, uma
-:: e o cre cimento craniofacial já finaliciente pode muitas vezes, apresen-- acões de po icionamento de bases ós__
~- ente acomodação dos múscu-
DIAGNÓSTICO
E PLANEJAMENTO CLÍNICO
Fig. 14.22 - Radiografta lateral de um paciente com espaço nasofaríngeo
normal.
Ias nestas bases ósseas alteradas não permitirá o pleno sucesso da terapia fonoaudiológica, ja que esta atua apenas sobre a parte muscular.
d - Fonação
Através de observações e pesquisas, Cauhepé chegou à conclusão de que os mesmos pontos onde à língua toca na deglutição serão os pontos de articulação da fala.
Por exemplo, os fonemas produzidos com
a ponta da língua terão o seu ponto de articulação no mesmo lugar onde esta pressiona
no ato da deglutição. Assim a projeção anterior da língua durante a deglutição pode estar
correlacionada a sua projeção anterior durante
a emissão dos fonemas fricativos /S/, /Z/ (ceceio anterior ou sigmatismo) e linguoalveolares /T/, /D/, /N/ e /L/. Entretanto, vale ressaltar que nem todo deglutidor atípico apresenta necessariamente tais alterações.
Da mesma forma como nas outras funções, é possível fazer uma associação entre a
articulação dos fonemas à má oclusão e tipo
facial.
Nos indivíduos portadores de Classe II esquelética, é comum observar distorções na
fala, principalmente na emissão dos fonemas
20. AVALIAÇÃO
301
FONOAUDIOLÓGICA
Fig. /4.23 - Projeção anterior da língua na emissão do fonema S
caraàerizando ceceio anterior.
bilabiais, que são aqueles produzidos pelo
contato rápido entre lábios superior e inferior. São os fonemas /P /, /B/ e/M/.
Devido
à sobressaliência acentuada causada pela discrepância entre as bases ósseas, o contato bilabial torna-se difícil, por isso o lábio inferior
oclui com os incisivos superiores para a emissão do som. Isto ocorre principalmente quando os lábios estão hipotônicos e com pouca
mobilidade.
É comum, também, haver deslize mandibular e projeção da língua entre os arcos na emissão das fricativas /S/ e /Z/ (Bianchini).
Nos pacientes portadores de Classe 111esquelética, as distorções mais observadas associa~-se aos fonemas bilabiais (lP /, /B /, /M/)
e aos fonemas labiodentais (lF / e IV/) que
podem ser emitidos, freqüentemente,
com o
lábio superior em contato com o bordo incisal
dos incisivos inferiores .
.Os movimentos da ponta da língua, por
sua vez, podem ser substituídos pelo meio ou
dorso na emissão dos fonemas /T/, /D, /N/e
tismo (projeção anterior da língua na emissão dos fonemas /S/ e /Z/)
(Fig. 14.23).
Alguns explicam a projeção lingual durante a emissão destes sons, como conseqüência do espaço aberto oferecido pela mordida. Porém, vale ressaltar que a mordida
aberta anterior
pode ou não vir acompanhada de um ceceio anterior e vice-versa.
O ceceio lateral, que se caracteriza por uma
distorção dos fonemas /S/ e /Z/ difere do ceceio anterior por apresentar escape de ar lateral e posicionamento posterior da língua. Este
tipo de ceceio ocorre comumente em pacientes portadores de má oclusão de Classe 11 esquelética, mordida aberta lateral e sobremordida.
Especificamente
no paciente braquifacial
com mordida profunda, o espaço interno vertical é bastante diminuído,
dificultando
a
mobilidade lingual e acarretando
o ceceio
lateral. A falta de espaço pode ser compensada por um deslize mandibular
anterior, e
conseqüentemente
um escape posterior da
língua bilateralmente,
tendo como produto
final o ceceio lateral.
o paciente face curta, o espaço diminuído
faz com que a língua não tenha espaço suficiente para elevar suas bordas e produzir os
fonemas /S/ e /Z/ com precisão.
Os pacientes com face longa podem apresentar enfraquecimento
na emissão das bilabiais e uma fala com anteriorização de língua.
Desta maneira, pretendeu-se ressaltar que
algumas distorções da fala, que comumente estão associadas a uma disfunção muscular, podem estar relacionadas à má oclusão e tipo facial. Assim sendo, freqüentemente, o tratamento da má oclusão deve preceder ou ser concomitante ao tratamento da fala.
/L/.
Nas mordidas
abertas anteriores
é comum se observar a projeção
anterior
da
língua na emissão dos fonemas
/T /, /D /,
/N/ e /L/
(que normalmente
serão produzidos com o terço anterior da língua tocando o palato) e ceceio anterior ou sigma-
111 - FICHA DE AVALIAÇÃO
FUNCIONAL
Na clínica de Pós-Graduação de Ortodontia
da Universidade Cidade de São Paulo, utiliza-se
a seguinte ficha de avaliação funcional:
21. ORTODONTIA·
302
DIAGNÓSTICO
E PLANEJAMENTO CLÍNICO
AVALIAÇÃO FUNCIONAL
N°
Nome:
Idade:
Sexo:
Data:
/
/
RESPIRAÇÃO
I. Característica miofacial
2. Competência labial
3. Competência lingual
4. Competência mandibular
5. Reflexo alar
6. Forma do palato
7. Tonsilas
8. Adenóide
9. Patologias associadas
Avaliação da Respiração
Obs.:
OBSERVAÇÃO
normal
sim
sim
sim
sim
normal
normais
(
(
(
(
(
(
(
)
)
)
)
)
)
)
alterada
não
não
não
não
alterada
alteradas
ausentes
alterada
ausentes
sinusites
rinite
bronquite
asma
outras
(
(
(
(
(
(
(
(
(
(
(
(
(
(
(
)
)
)
)
)
)
)
)
)
)
)
)
)
)
)
normal
(
)
não
(
)
NASAL
(
)
BUCAt
(
)
sim
normal
sim
normal
normal
normal
normal
normal
(
(
(
(
(
(
(
(
)
)
)
)
)
)
)
)
não
alterado
não
alterada
alterada
alterado
alterada
alterado
(
(
(
(
(
(
(
(
)
)
)
)
)
)
)
)
normal
normal
(
(
)
)
alterada
alterada
(
(
)
)
normal
(
)
alterada
(
)
NORMAL
(
)
ATíPICA
(
)
DEGLUTIÇÃO
I
I. Vedamento labial
2. Lábios com pressionamento
3. Mímica peribucal
4. Língua (anatomia)
(função)
(repouso)
5. Função do masseter
6. Freio lingual
7. Emissão de fonemas
a. Bilabiais (p/b/m)
b. Lingualveolares
(t/d/n/I)
c. Fricativos (s/zJch/g)
Avaliação da Deglutição
Obs.:
I
22. AVALIAÇÃO
303
FONOAUDIOLÓGICA
N°
SUCçÃO
I. Hábitos de sucção
ausente
(
)
chupeta
dedo
mamadeira
lábio
outros
(
(
(
(
(
)
)
)
)
)
inadequado
unilateral
assimétrica
(
(
(
)
)
)
onicofagia
bruxismo
outros
(
(
(
)
)
)
(
(
(
)
)
)
Obs.:
MASTIGAÇÃO
I.
2.
3.
4.
Hábito alimentar
Preferência mastigatória
Musculatura do masseter
Hábitos de mastigação
adequado
bilateral
simétrica
ausentes
(
(
(
(
)
)
)
)
Obs.:
,
AVALIAÇÃO COMPLEMENTAR
Fonoaudiologia
Otorrinolaringologia
outros
Obs. finais.:
(Segundo Carvalho, Sato- Tsuji, Cotrim-Ferreira,
Esta ficha de avaliação
volvida por fonoaudiólogos
dividida de acordo com as
ração, deglutição, fonação,
Santos Jr., Scanavini, Julien e Pereira Jr).
funcional, desene ortodontistas, é
funções de respisucção e mastiga-
ção. Com o intuito de facilitar sua aplicação
clínica e visualização, cada característica é
anotada na coluna da esquerda (aspectos
normais) ou da direita (aspectos alterados).
23. 304
ORTODONTIA'
IV - CONSIDERAÇÕES FINAIS
~-
...'.
..
A proposta deste capítulo foi fornecer alguns conhecimentos básicos e essenciais a respeito das funções e das eventuais alterações
miofuncionais.
O conhecimento
das alterações miofuncionais por parte do ortodontista
é fundamental,já que com ele pode atuar de modo a
evitar recidivas das más oc1usões e tornar
seus encaminhamentos
mais precisos, acertivos e eficientes.
O avaliador deve ser flexível o suficiente
para encarar cada caso como único. Deve evitar
fazer padronizações, pois a capacidade adaptativa de cada indivíduo- é muito variável. Para
alguns, alterações de oclusão, nem que sejam
mínimas, podem ser suficientes como fator desencadeante de uma alteração da função enquanto, para outros, isto poderá não ocorrer.
Deve-se ter claro, no entanto, que as previsões
sobre possíveis alterações são dificeis, já que
possuímos dados insuficientes e discutíveis sobre as relações de causalidade envolvidas.
A terapia miofuncional visa adequar a propriocepção, o tônus, as posturas de repouso de
lábio e língua e as funções.
O sucesso do tratamento vai depender de
alguns fatores tais como:
1) Diagnóstico preciso
É realmente aquela alteração funcional a
causa da não estabilidade do tratamento ortodôntico?
Deve-se saber que alterações miofuncionais
podem ser a causa de uma determinada recidiva ou não.
2) O meio bucal deve estar favorável para correção da função.
DIAGNÓSTICO
E PLANEJAMENTO CLíNICO
3) Utilizar a terapêutica adequada para cada caso.
4) Motivação do paciente.
5) Maturidade orgânica e emocional do paciente.
6) Ter uma família que favoreça o tratamento.
É necessário compreender as limitações da
forma para aceitar as limitações do trabalho
miofuncional. De maneira geral, pode-se esperar melhor prognóstico para pacientes mesofaciais com alterações basicamente dentais.
O paciente dolicofacial tende a apresentar
pior resposta ao trabalho funcional, mesmo
após a correção da forma, em razão de sua
musculatura mais fraca. Por outro lado, no dizer de Bianchini, pode-se esperar bons resultados do .paciente face curta moderada, em função de sua musculatura forte.
Com relação ã época do início do tratamento miofuncional, não existe uma regra, podendo ser feito antes, durante ou após o tratamento ortodôntico. Uma definição do momento
deverá estar vinculada à análise conjunta de
todos aspectos acima expostos e variará em função das características individuais do paciente.
Na documentação fotográfica (Fig. 14.25)
que se segue, pode-se observar uma paciente
que apresenta a postura de repouso e as funções alteradas.
Notam-se dois aspectos:
1 - Todas as alterações da postura de repouso e
das funções são influenciadas pelo tipo de má
oclusão.
2 - As funções são interdependentes
de tal
modo que uma alteração em qualquer uma
delas leva a um desequilíbrio nas outras. Neste
caso, em particular, a mastigação ineficiente
precedeu a deglutição atípica.
24. AVALIAÇÃO
FONOAUDIOLÓGICA
305
25A
14.25B
"'C
14.25D
25E
Fig. /4.25 A, B - Foto de frente e perfil. Observar postura do lábio
inferior. Notar que ele se posiciona atrás dos incisivos superiores,
enquanto que o lábio superior mostra-se encurtodo. C - Visão
intrabucal da mesma paciente. O - Notar posicionamento dos
incisivos inferiores com relação ao palato e aos incisivos superiores
favorecendo a postura labial alterada. E - Notar vestibularização dos
incisivos superiores.
26. AVALIAÇÃO
FONOAUDIOLÓGICA
307
14.25J
14.25L
5M
14.25N
Fig. /4.25 J - Utilizou-se uma bolacha para avaliara mastigação. L - Observar que a incfinação dos incisivos dificulta a mastigação com lábios fechados.
M, N - Observar que para deglutir a bolacha a paciente repete os mesmos movimentos que para deglutição da água. Os fragmentos de bolacha
que restaram sobre o lábio inferior denotam uma mastigação ineflciente.
27. 308
ORTODONTIA'
DIAGNÓSTICO
E PLANEJAMENTO CLíNICO
14.250
14.25Q
Fig. 14.25.0 - Lábios em repouso. P - Emissão do (onema F com o
ponto de articulação alterado. Q - Emissão do [onemo B com o ponto
de articulação alterado. Tais alterações decorrem da vestibularização
dos incisivos superiores.
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