O documento descreve uma iniciativa piloto realizada pelo UNICEF, governo de Pernambuco e ONG Pé no Chão para promover diálogo e educação sobre prevenção de DST/HIV/AIDS com adolescentes em cumprimento de medidas socioeducativas. A ação incluiu oficinas participativas sobre o tema com 91 adolescentes e 10 técnicos de uma unidade, além de testes rápidos. O relatório destaca a importância de continuar abordando os direitos sexuais e reprodutivos deste público vulnerável e de adequar as políticas públic
Prevenção DST/HIV entre adolescentes em conflito com a lei
1. Diálogo, construção coletiva e ação 1
para a adequação das POLÍTICAS públicas
de atendimento socioeducativo, com
ênfase na prevenção, DIAGNóSTICO E
TRATAMENTO de DST/HIV/Aids
Diálogo, construção
coletiva E AÇÃO
2. 2 Diálogo, construção coletiva e ação
EXPEDIENTE
Realização
Fundo das Nações Unidas para a Infância (UNICEF)
Representante do UNICEF no Brasil: Gary Stahl
Coordenadora do Escritório do UNICEF em Recife: Jane Santos
Coordenadora do Programa de HIV/aids e de Sobrevivência e
Desenvolvimento Infantil: Cristina Albuquerque
Coordenadora do Programa de Proteção à Infância: Casimira Benge
Oficial do Programa HIV/Aids: Caio Oliveira
Oficial do Programa de Proteção à Infância: Fabiana Gorenstein
Consultora da área temática Proteção à Infância/ Recife: Irismar Silva
Secretaria da Criança e da Juventude do Estado de
Pernambuco
Secretário: Pedro Eurico
Secretário Executivo de Articulação
e Projetos Especiais: Eduardo Figueiredo
Secretária Executiva dos Sistemas Protetivo
e Socioeducativo: Lidiane Lopes
Fundação de Atendimento Socioeducativo - Funase
Presidente: Eutácio Borges
Diretora Geral da Política de Atendimento
Socioeducativo: Nadja Maria Alencar
Equipe Técnica: Divone Maria Cavalcante W. Cerqueira, Dinalva
Marques, Normando Albuquerque
Centro de Internação Provisória – CENIP/Recife
Coordenação Geral: Zélia Mesquita Barbosa
Equipe Técnica: Inalda Pessoa de Araújo, Ramon José de Melo
Ribeiro, Emston Gomes Ferreira, Soraya Almeida Benjamin,
Dione de Albuquerque Sotero, Flavia de Mello Cabral,
Rosamaria de Santana, Givanilda do Nascimento Silva, Vera
Lúcia Silva de Albuquerque, Maria Aparecida da Silva, Ednea
Maria Pereira, Gerlane Oliveira da Silva, Maria da Conceição
Santos e Sérgio Pereira da Silva.
Secretaria de Saúde do Estado de Pernambuco
Secretária: Ana Maria Albuquerque
Secretário Executivo de Vigilância à Saúde: Eronildo Felisberto
Diretora Geral de Controle de Doenças e Agravos: Rosilene Ramos
Gerente de Prevenção e Controle da Aids
e outras DSTs: François Figueiroa
Equipe técnica: Bethania Cunha, Naishe Matos, Felipe Ferreira, Jullieny
Neves, Grazielle Vasconcelos
Ong Grupo de Apoio Mútuo Pé no Chão
Coordenador: Jocimar Alves Borges
Educadores: Edilson Cândido da Silva (Maggo MC), Nielson da Silva Bezerra
e Adriano José da Silva Lima
Jovens: Carolayne da Silva Miranda, Ivanize Tallyta Alvez Souza, Lucas do
Nascimento e Enerson Fernando Ribeiro Alves
AGRADECIMENTOS
Ao Comitê Suiço do UNICEF que tem sido muito impor-
tante para a mobilização do governo Brasileiro e sociedade
civil na prevenção do HIV/Aids e outras doenças sexual-
mente transmissíveis, especialmente focando em crianças e
adolescentes em situação de rua e adolescentes em con-
flito com a lei.
À Secretaria da Criança e da Juventude do Estado de
Pernambuco pela articulação e apoio ao trabalho.
À Fundação de Atendimento Socioeducativo (FUNASE/
PE)/Centro de Internação Provisória (CENIP) e à Secretaria
Estadual de Saúde/Programa Estadual de DST/HIV/Aids
pelo acolhimento à ação e efetiva participação nas ativi-
dades.
E, em especial, aos meninos internos no CENIP que par-
ticiparam desta iniciativa e colaboraram imensamente para
os ganhos e aprendizados desta ação.
Produção Editorial e Fotografias
Daniel Meirinho
Revisão de Texto
Jane Santos e Irismar Silva
Projeto Gráfico
Via Design
Website: www.viadesign.com.br
A reprodução desta publicação, na íntegra ou em parte, é permitida desde
que citada a fonte.
Para proteger e manter o anonimato dos adolescentes e jovens do CENIP,
todos os nomes foram alterados.
3. Diálogo, construção coletiva e ação 3
O UNICEF no Brasil, em parceria com o Ministério
da Saúde, Secretaria de Saúde do Estado do Ceará,
Secretaria de Saúde do Município de Fortaleza, Rede
Nacional de Adolescentes e Jovens Vivendo com HIV
-Aids (RNAJVHA) e UNAIDS, está apoiando uma Estra-
tégia de Promoção à Saúde, Prevenção e Assistência às
DST/HIV/Aids e Hepatites Virais voltadas para adoles-
centes e jovens de 15 a 24 anos, por meio do Projeto
“Fique Sabendo Jovem – O Direito de Saber”.
Além de investir na população de adolescentes
e jovens em geral, o objetivo é intensificar as ações
de prevenção às DST e Aids, a oferta do diagnóstico
voluntário do HIV, sífilis, Hepatites Virais B&C, a imuni-
zação para a Hepatite B e o tratamento de DST/HIV/
Aids junto aos adolescentes e jovens em situação de
vulnerabilidade: homens que fazem sexo com homens
- HSH, gays, em privação de liberdade e cumprimento
de medidas socioeducativas, explorados sexualmen-
te, que usam drogas injetáveis, profissionais do sexo e
transgêneros. Estas chamadas populações-chave, são
as que têm menores possibilidades de acesso à preven-
ção, exames e tratamento.
Nessa perspectiva, e tendo como referencial a
parceria exitosa com a ONG Pé no Chão em relação
à prevenção das DST/HIV/Aids em crianças e ado-
lescentes em situação de rua (apoiada ao longo dos
últimos anos pelo Swiss Committee), o Escritório do
UNICEF em Recife resolveu apoiar o Governo de Per-
nambuco em uma ação ”piloto” com adolescentes em
conflito com a lei, ao longo do meses de junho e
julho de 2014, no Centro de Internação Provisória
(CENIP), uma das unidades assistenciais da Fundação
de Atendimento Socioeducativo (FUNASE).
A partir de uma metodologia participativa e de
educação entre pares foi possível construir um am-
biente de diálogo e participação efetiva dos adoles-
centes para que problemáticas associadas ao precon-
ceito, ao sexo seguro e às DST/HIV/Aids e Hepatites
Virais pudessem ser trabalhadas.
A interação do grupo em um espaço de reclusão
e de cumprimento de medidas socioeducativas só foi
possível mediante uma prática colaborativa de des-
construção do conhecimento prévio que os adoles-
centes possuíam sobre a temática. A partir de um
processo de reflexão identitária pessoal e coletiva, di-
nâmicas lúdicas foram pensadas e adaptadas à especi-
ficidade do grupo e às condição em que se encontram.
As ações conjuntas entre o UNICEF, governo es-
tadual, por meio da Secretaria da Criança e da Ju-
ventude (FUNASE / Secretarias Executivas de Arti-
culação e Projetos Especiais e dos Sistemas Protetivo
e Socioeducativo) e a Secretaria da Saúde (Secretaria
Executiva de Vigilância em Saúde/Diretoria Geral de
Controle de Doenças e Agravos/Programa de Preven-
ção e Controle da Aids e outras DSTs) e a ONG Pé no
Chão possibilitaram que essas instituições pudessem
enxergar com lucidez as violações de direito enfrenta-
das por esses meninos.
A experiência também indicou que os parceiros
precisam cada vez mais se preparar para responder ao
desafio, investindo em iniciativas que fortaleçam as
ações e compromissos com a garantia dos direitos se-
xuais e reprodutivos e o diagnóstico e tratamento de
DST/HIV/Aids, bem como para a promoção e inserção
do tema na agenda das políticas públicas, apostando
em metodologias que resgatem a brincadeira e a capa-
cidade de reflexão e diálogo.
Este relatório detalha a ação realizada – ativida-
des, metodologia, resultados, desafios e recomenda-
ções, atestando a necessidade de continuidade e apro-
fundamento das questões relacionadas à prevenção
das DST/HIV/Aids e aos direitos sexuais e reproduti-
vos com adolescentes em conflito com a lei e a de-
vida adequação das ações públicas de atendimento.
E reforça que as organizações da sociedade civil e
as diferentes esferas do governo precisam realizar um
trabalho articulado e intersetorial, considerando as
peculiaridades das ações de prevenção de adolescen-
tes e jovens em unidades socioeducativas, transfor-
mando o contexto de vulnerabilidade que expõe os
mesmos à infecção pelo HIV/Aids e outras doenças,
contribuindo, assim, para qualificar e promover o aces-
so aos seus direitos básicos.
Jane Santos
Coordenadora do Escritório do UNICEF em Recife
APRESENTAÇÃO
4. 4 Diálogo, construção coletiva e ação
A iniciativa piloto realizada com base no Proje-
to “Fique Sabendo Jovem – O Direito de Saber” apoia-
do pelo UNICEF Brasil, que demonstrou ser inovadora
e desafiante, encerra o projeto Brazil active: protecting
street children through sport and improved health and
social condition. A parceria foi firmada pelo UNICEF,
governo estadual, por meio da Secretaria da Criança e
da Juventude (FUNASE / Secretarias Executivas de Ar-
ticulação e Projetos Especiais e dos Sistemas Protetivo
e Socioeducativo) e a Secretaria da Saúde (Secretaria
Executiva de Vigilância em Saúde/Diretoria Geral de
Controle de Doenças e Agravos/Programa de Prevenção
e Controle da Aids e outras DSTs) e a ONG Pé no Chão.
O desenvolvimento de uma metodologia volta-
da para a prevenção das DST/HIV/Aids com crianças
e adolescente em situação de rua vem acontecendo
em Recife através de uma parceria em curso entre o
UNICEF, a ONG Pé no Chão e os Programas Estadual
e Municipal/Recife de DST/HIV/Aids. Nesta etapa do
projeto Brazil Active, os sujeitos da ação são adoles-
centes que cumprem medida socioeducativa de priva-
ção de liberdade no Estado de Pernambuco.
Além de enfrentar graves problemas de discrimi-
nação, exclusão social, violência e negação de direitos
básicos, esta população, com demandas específicas e
que apresenta elevado risco às infecções pelas doen-
ças sexualmente transmissíveis, são deixados de fora
dos planos nacionais de combate ao HIV e outras DST.
Leis e políticas discriminatórias também são grandes
obstáculos ao acesso a cuidados.
A experiência aconteceu no Centro de Internação
Provisória (CENIP-Recife), unidade responsável pelo aco-
lhimento provisório de adolescentes do sexo masculino
entre 12 e 17 anos em conflito com a lei e provenientes
da Região Metropolitana da Cidade do Recife e Zonas da
Mata Norte e Sul do estado de Pernambuco.
O reconhecimento pelo poder público da fragilida-
de dos mecanismos de prevenção e proteção dos direi-
tos sexuais e reprodutivos dos adolescentes em priva-
ção de liberdade possibilitou a realização de seis (06)
oficinas para 91 adolescentes e 10 técnicos da unidade,
com ênfase nas questões relacionadas à sensibilização,
discriminação, preconceito, prevenção, diagnóstico e
tratamento das DST/HIV/Aids.
A equipe do Programa Estadual de DST/HIV/Aids
complementou o trabalho, com a realização da coleta
e testagem rápida para HIV, Sífilis e Hepatites B e C,
além do aconselhamento e encaminhamentos oportu-
nos na entrega dos resultados.
Para Cristina Albuquerque, coordenadora do Progra-
ma de HIV/aids e de Sobrevivência e Desenvolvimento
Infantil do UNICEF no Brasil, a questão das DSTs e do
HIV é multifatorial e considera que adolescentes em
privação de liberdade são “populações-chaves” que ne-
cessitam de intervenções estratégicas específicas para
que políticas públicas sejam efetivadas de forma eficaz:
“São necessárias iniciativas para abrir um diálogo sobre
questões associadas aos direitos dos adolescentes em
conflito com a lei em qualquer espaço e em qualquer
situação”.
Este relatório sistematiza a dinâmica da ação, des-
tacando os resultados obtidos, as limitações encontra-
das, os desafios e as recomendações, na perspectiva de
continuidade do trabalho.
SUMÁRIO EXECUTIVO
5. Diálogo, construção coletiva e ação 5
SUMÁRIO
CONTEXTO 6
AS MEDIDAS SOCIEDUCATIVAS EM PERNAMBUCO
Centro de Internação Provisória (CENIP) - Recife
adolescência e vulnerabilidade
8
Construção da identidade individual e coletiva, com
autonomia e pela transformação social
Apostando em uma abordagem inovadora e intersetorial
para fazer valer direitos
17 16
PROTEÇÃO E EXIGIBILIDADE DOS DIREITOS
- REVENDO AS PRÁTICAS SOCIOEDUCATIVAS
desafios 25
recomendações 27
conclusão 28
história de vida 29
11
6. 6 Diálogo, construção coletiva e ação
públicas, associada às condições socioeconômicas e a
desestruturação familiar, empurra milhares de adoles-
centes a se envolverem em atos infracionais. Ao mes-
mo tempo, esses adolescentes são os indivíduos que
possuem uma maior fragilidade diante desse contexto
social, sendo os mais agredidos e vítimas da violência.
Ser adolescente do sexo masculino, proveniente
de territórios de exclusão social e vulnerabilidade é
a característica do perfil do adolescente em conflito
com a lei em Pernambuco. Dos que cumprem medidas
socioeducativas no estado, 96% são meninos e a sua
origem é visível quando se visita qualquer unidade so-
cioeducativa de internação, com uma supremacia de
adolescentes negros e pobres (vivem em famílias cujo
rendimento mensal varia de menos de um até dois sa-
lários-mínimos).
Para melhor compreensão sobre o sentido da ação
é necessário contextualizar o cenário de violência que
afeta o adolescente no Estado de Pernambuco. De
acordo com o Estudo Global sobre Homicídios 2013, o
Brasil possui 11 das 30 cidades mais violentas do mundo.
O Mapa da Violência de 2013 aponta o estado como o
quinto mais violento do país e a cidade do Recife assu-
me a quarta colocação entre as capitais mais perigosas
para adolescentes e jovens entre 15 e 24 anos .
Apesar dos programas sociais de combate à po-
breza do governo brasileiro, os contrastes sociais ain-
da são preocupantes nas regiões urbanas do Recife. As
crianças e adolescentes vítimas da desigualdade social
enfrentam problemas decorrentes do não acesso aos
seus direitos básicos, como alimentação, saúde, educa-
ção, proteção e moradia. A precariedade das políticas
CONTEXTO
Oficina sobre Conhecimento, Autonomia e Direitos para
Redução da Vulnerabilidade às DST / HIV / Aids
7. Diálogo, construção coletiva e ação 7
Entre as maiores problemáticas associadas à vio-
lência juvenil estão os baixos níveis de escolaridade e
o abandono escolar. O uso de drogas entre os adoles-
centes que cumprem medidas socioeducativas é outro
fator de risco importante, chegando à 85% de usuários.
Em geral, esses adolescentes e jovens são acompa-
nhados pelos Grupos de Orientação ao Dependente
(GOD) existentes em cada unidade.
As medidas socieducativas
de internação em Pernambuco
A execução das medidas socioeducativas de in-
ternação em Pernambuco fica a cargo da Fundação de
Atendimento Socioeducativo (FUNASE) vinculada à Se-
cretaria Estadual da Criança e da Juventude. A entida-
de atua de forma regionalizada, através de 23 unidades
que se distribuem entre Unidade de Atendimento Inicial
(UNIA), Centro de Internação Provisória (CENIP), Casa
de Semiliberdade (CASEM) e Centro de Atendimento
Socioeducativo (CASE). Nas unidades de internamento,
os adolescentes são distribuídos por sexo e idade, dos
12 aos 18 anos podendo, excepcionalmente, estender
sua aplicação a jovens com até 21 anos incompletos,
conforme previsto no art. 2º do do Estatuto da Criança
e do Adolescente - ECA).
Entre os delitos mais cometidos por adolescentes
estão a associação ao tráfico de drogas, furto, roubo e
tentativa de homicídio. Pernambuco está entre os cinco
estados com a maior população de internos no Brasil1
.
O maior crescimento de lotação nos últimos quatro
anos aconteceu no CENIP-Recife.
Segundo o relatório da FUNASE de março de 2014, o
sistema de atendimento socioeducativo em Pernambuco
possui capacidade para atender 1.025 adolescentes. Con-
tudo, só no mês de Março recebeu aproximadamente
1.516 internos. A problemática da superlotação se con-
centra nas unidades masculinas que atendem a Região
Metropolitana do Recife. Estas possuem a capacidade
medidas socioeducativas
Constitue-se na resposta estatal, aplicada pela autoridade judiciária, ao adolescente entre 12 e 18
anos (podendo, excepcionalmente, estender sua aplicação a jovens com até 21 anos incompletos,
conforme previsto no art. 2º do do Estatuto da Criança e do Adolescente - ECA), que cometeu
ato infracional (art. 112 ECA). Apesar de configurarem resposta à prática de um delito, devem
representar uma ação de caráter predominantemente educativo e não punitivo.
A medida não possui prazo determinado. Todavia, não pode ultrapassar três anos, devendo ser
reavaliada no máximo semestralmente.
Sistema Nacional
de Atendimento
Socioeducativo
(SINASE)
Com a aprovação em 2012 da
lei 12.594 do Sistema Nacional
de Atendimento Socioeducativo
(SINASE), as fundações de
atendimento socioeducativo do
Brasil vêm tentando se adequar
às políticas de atendimento e
regulamentação. Os parâmetros de
atendimento necessitam estarem
integrados com ações de educação,
saúde e profissionalização
que devem ser executadas
pelas equipes interdisciplinares,
bem como prover condições
humanizadas e dignas nas unidades
de internação para a de reeducação
dos adolescentes.
1 Dados do Levantamento Nacional do Atendimento Socioeducativo ao Adolescente em Conflito com a Lei de 2010.
8. 8 Diálogo, construção coletiva e ação
para atender 468 adolescentes, no entanto receberam
963 internos (mais do que o dobro) . A situação mais
grave é a do CENIP-Recife, que pode prestar assistência
a 90 adolescentes e, atualmente, em três pavilhões
atende uma população entre 250 e 290 internos. Do
efetivo masculino, 55% da população de adolescentes
em privação de liberdade é proveniente dos centros ur-
banos da Região Metropolitana do Recife. Destes, 42%
haviam abandonado a escola e 2,3% estavam cursando
ou concluíram o ensino médio.
Vale ressaltar que em Pernambuco o número de ado-
lescentes internos privados de liberdade é maior do que o
daqueles que cumprem medidas em meio aberto. O que
evidencia um tímido investimento nas medidas socioedu-
cativas em meio aberto, restando aos jovens as medidas
de internação, recomendáveis pelo Estatuto da Criança e
do Adolescente (ECA) como breves e excepcionais. Centro de Internação
Provisória (CENIP) - Recife
Na Região Metropolitana do Recife, assim como na
Zona da Mata Norte e Sul do Estado de Pernambuco,
um adolescente após ser apreendido por envolvimen-
to em um ato infracional é encaminhado para a Uni-
dade de Atendimento Inicial (UNIA). De acordo com
o entendimento do Juiz da Vara da Infância, o mesmo
pode ser liberado ou acolhido no Centro de Internação
Provisória (CENIP) Recife. Considerando os princípios
da brevidade, excepcionalidade e respeito à condição
peculiar de pessoa em desenvolvimento previsto pelo
ECA, o prazo máximo para o adolescente ficar em regi-
me de internação provisória é de 45 dias.
No CENIP, a lotação atual ultrapassa quase três
vezes a sua capacidade e a rotatividade semanal é de
aproximadamente 40 a 50 adolescentes que, após
audiência, seguem para medidas cautelares de interna-
mento, semiliberdade e liberdade assistida. Todo esse
contexto deflagra uma debilidade na infraestrutura em
atender a demanda atual e local.
A coordenadora geral do CENIP-Recife, Zélia Mes-
quita Barbosa, admite que ter uma população maior do
que a capacidade da unidade resulta em dificuldades no
trabalho de atendimento socioeducativo. “Seria muito
bom que ações como estas e parcerias como as que
estão sendo estabelecidas com a ONG Pé no Chão
e o UNICEF se tornassem rotina no CENIP”, relata a
O ECA
O Estatuto da Criança e do Adolescente
(ECA) apresenta um conjunto de normas do
ordenamento jurídico brasileiro que tem como
objetivo a proteção integral da criança e do
adolescente. A Lei nº 8069 foi aprovada em 13
de Julho de 1990 e tem como base as diretrizes
do Direitos Humanos aprovadas pela Convenção
sobre os Direitos da Criança e do Adolescente.
O ECA é composto por medidas protetivas e
socioeducativas, estas últimas, aplicadas aos
adolescentes envolvidos em atos infracionais
(Art. 112) e compreendem:
• Advertência;
• Obrigação de reparar o dano;
• Prestação de serviços à comunidade;
• Liberdade assistida;
• Inserção em regime de semiliberdade;
• Internação em estabelecimento educativo;
Sociólogos e psicólogos entendem que a interna-
ção, ao invés de possibilitar o retorno do adolescente
ao convívio social, torna muitas vezes esse objetivo
inviável. O rompimento com os vínculos familiares e
sociais é incompatível com a ideia da proteção integral
traduzida pelo ECA. O processo de assimilação de va-
lores institucionalizados nestas unidades faz com que
os adolescentes passem apenas a conviver com histó-
rias de vida semelhantes a sua, sendo imersos em um
ambiente negativo, de valores invertidos e baixa estima.
Para Jocimar Borges, coordenador da ONG Pé no Chão:“
A impressão que dá é que eles mesmos sentem que a
sociedade já não os deseja mais”.
9. Diálogo, construção coletiva e ação 9
adolescência e
vulnerabilidade
Adolescentes e jovens são considerados impor-
tantes grupos chave epidemiológico para as DST/HIV/
Aids e cada vez mais, grande parte das iniciativas de
educação sexual na adolescência focaliza a prevenção
de novas infecções, em especial, para a faixa etária dos
15 aos 19 anos.
Dados do Boletim Epidemiológico Aids 2010 reve-
lam que, embora os jovens tenham elevado o conhe-
cimento sobre prevenção da Aids e outras doenças se-
xualmente transmissíveis, há tendência de crescimento
do HIV. Um levantamento feito entre jovens, realizado
com mais de 35 mil meninos de 17 a 20 anos de idade,
indica que, em cinco anos, a prevalência do HIV nessa
população passou de 0,09% para 0,12%. O estudo tam-
bém revela que quanto menor a escolaridade, maior o
percentual de infectados pelo vírus da Aids.
Esse resultado tem relação especialmente com o
número de parceiros, coinfecção com outras doenças
sexualmente transmissíveis, relações homossexuais e
a prática de sexo não seguro.
É importante destacar que, embora a prevalência
da infecção pelo HIV na população de 15 a 49 anos
seja menor que 1% (0,61%), nas populações-chave, o ris-
co de infecção é maior que 5%.
Nesse cenário, o UNICEF entende que o Brasil ainda
encara desafios importantes para garantir o direito de
cada criança e cada adolescente a proteger-se e ser
protegido das DST/HIV/Aids, o que exige de governos,
coordenadora informando que a transitoriedade na per-
manência dos adolescentes também impede que ações
contínuas e sistemáticas possam ser desenvolvidas.
Para assegurar melhor atendimento aos adolescen-
tes, a unidade está passando por uma reforma estru-
tural a ser entregue no final do ano de 2014 e que
ampliará a capacidade de atendimento para 250 ado-
lescentes. A coordenadora informa que estão fazendo
melhorias através de uma reforma geral e estrutural
para que os adolescentes tenham uma estadia com
condições mais humanizadas.
sociedade civil e organismos internacionais uma reação
abrangente e decisiva, especialmente para a prevenção
da transmissão sexual entre os grupos mais vulnerá-
veis, onde a epidemia continua a crescer: mulheres, me-
ninas adolescentes e afro-descendentes de ambos os
sexos, HSH, gays e as consideradas populações-chave.
Questões associadas à vulnerabilidade podem
acarretar um impacto na vida reprodutiva dos jovens,
resultando na aquisição de doenças sexualmente
transmissíveis. Observa-se que a primeira relação sexu-
al tem ocorrido cada vez mais precocemente no Brasil,
10. 10 Diálogo, construção coletiva e ação
em média entre os 13 e 15 anos de idade2
. A cultura da
prevenção já começa deficiente quando o projeto Este
Jovem Brasileiro revela que 71% dos adolescentes não
usaram preservativo na primeira relação sexual.
Apesar de uma portaria Interministerial de 2004
aprovar as diretrizes para a atenção à saúde dos adoles-
centes em privação de liberdade e prever abordagens
educativas, ações de promoção e proteção à saúde na
atenção às DST/HIV/Aids, assim como a distribuição
de preservativos nas unidades de atendimento socioe-
ducativo, o cenário se agrava nessas unidades onde os
adolescentes cumprem medidas socioeducativas.
Como algumas unidades não distribuem preserva-
tivos, pela impossibilidade de visitas íntimas, por falta
de estrutura física para tal, o problema é potenciali-
zado, já que muitos dos internos possuem uma vida
sexual bastante ativa. “Muitos meninos possuem na-
moradas, são casados e alguns já têm filhos, o que
faz com que eles abandonem a camisinha”, relata a
pedagoga do CENIP Soraya Nunes de Almeida.
Em 2001 o UNICEF realizou a pesquisa Sem Liber-
dade, Sem Direitos, em seis estados brasileiros com
228 adolescentes privados de liberdade. O resultado
mostrou que 13% tinham tido alguma relação sexual
durante o período de internação e 15,8% relataram
casos de violência sexual dentro das unidades. O pro-
jeto Fique Vivo, de São Paulo, também aplicou 275
questionários, e o resultado é que os adolescentes
internos consideravam o sexo como um momento de
“descarrego”, “diversão” e “relaxamento”.
Um estudo3
realizado em um Centro de Atendi-
mento Socieducativo (CASE), em Recife, apontou que
95,4% dos adolescentes internos na FUNASE já ti-
nham tido relação sexual, sendo a maioria com mais
de um parceiro. Destes, 35% afirmaram não ter utili-
zado preservativo na última vez que tiveram relação
sexual e 41% nunca tiveram informações sobre DST/
HIV/Aids, como comprova o depoimento do jovem
participante das atividades Wendel4
, de 18 anos quan-
do menciona que “nunca o pessoal daqui da FUNASE
me falou sobre sexo ou sobre doenças”.
A temática da sensibilização para a prevenção das
DST/HIV/Aids no CENIP Recife argumenta-se pela ga-
rantia dos direitos sexuais e reprodutivos dos adoles-
centes internos do sexo masculino naquela unidade.
De acordo com a Lei nº. 12.594, de 2012, “é assegurado
ao adolescente casado ou que viva, comprovadamen-
te, em união estável o direito à visita íntima” (Art.68),
o que não compreende namoradas. No caso do CENIP
não está previsto na Lei do SINASE a visita íntima, por
ser uma unidade de internação provisória.
Outra problemática é a distribuição de preservativo
na unidade em função da visita íntima não estar prevista.
Segundo o coordenador do Pé no Chão, Jocimar Borges,
pelo fato dos adolescentes não receberem visitas ínti-
mas, supõe-se que eles não pratiquem relações sexuais.
“Existe uma dificuldade em solucionar esse problema,
por parte de todos os órgãos envolvidos e pela própria
lei. A nossa maior demanda, neste processo todo, é en-
frentar e iniciar um diálogo sobre esta questão”.
2 Dados do Ministério da Saúde
3 Condutas de saúde entre adolescentes em conflito com a lei (2006).
4 Todos os nomes dos adolescentes são fictícios com a finalidade de preservar a identidade dos participantes
11. Diálogo, construção coletiva e ação 11
Construção da identidade
individual e coletiva,
com autonomia e pela
transformação social
O trabalho desenvolvido há 20 anos pelo Grupo
Pé no Chão vem se constituindo como um dos projetos
mais inovadores e criativos em educação de rua no Bra-
sil, sendo modelo para qualquer programa que queira
melhorar a sua pedagogia de rua. A ação comunitária
está na base da filosofia do Grupo, tendo a rua como
espaço educacional. Das expressões artísticas, políti-
cas e lingüísticas, espelhadas nas artes urbanas, tipo
RAP, hip-hop, grafitte, breakdance, percussão, artes cê-
nicas e artes plásticas, emergem temas voltados para
a realidade dessas crianças e adolescentes, com des-
taque para a violência urbana e sexual, uso de drogas,
gravidez na adolescência, cuidados de saúde, direitos
sexuais e reprodutivos e prevenção das DST/HIV/Aids,
PROTEÇÃO E
EXIGIBILIDADE
DOS DIREITOS
- REVENDO
AS PRÁTICAS
SOCIOEDUCATIVAS
Oficina sobre Conhecimento, Autonomia e Direitos para
Redução da Vulnerabilidade às DST / HIV / Aids
12. 12 Diálogo, construção coletiva e ação
história da sociedade, entre outros, para que tenham
seus direitos cumpridos, respeitados e protegidos.
As ações visam contribuir para o bom atendimento
e a acessibilidade dessas crianças e adolescentes aos
serviços de saúde, educação e assistência social e, na
abordagem, são apoiados para que desenvolvam ativi-
dades que venham a aumentar a sua auto-estima, con-
dição essencial para ajudá-las a construir opções que
as tirem das ruas e construam seus projetos de vida.
A ONG vem sendo apoiada pelo UNICEF há cinco
anos e a experiência está relatada na publicação Te-
cendo Redes: Uma experiência de prevenção de DST/
HIV/Aids entre meninos e meninas em situação de rua.
A metodologia desta ação é fundamentada na
pedagogia da consciência crítica e valorização dos re-
pertórios de vida dos adolescentes envolvidos, e idea-
lizada pelo educador Paulo Freire. O método dialógico
possibilita que os adolescentes reflitam suas condições
e competências através do desenvolvimento individual
e coletivo, rompendo os estereótipos e estigmas so-
ciais que os colocam como “casos perdidos da socieda-
de” e sem perspectivas.
As atividades lúdicas e artísticas foram trazidas
para esta ação com adolescentes em privação de liber-
dade, mas com condição de vulnerabilidade bastante
similar às das crianças e adolescentes em situação de
rua. O intuito foi proporcionar uma reflexão que pos-
sibilitasse transmitir a informação sobre às DST/HIV/
Aids e os riscos associados à falta de prevenção, basea-
da nas vivências de cada participante e na produção de
expressões artísticas.
“São adolescentes em extremo grau de vulnera-
bilidade e é impossível fechar os olhos sobre suas vi-
das sexualmente ativas, em um espaço onde há uma
debilidade nos mecanismos de prevenção”, constata o
coordenador da ONG Pé no Chão. O fortalecimento da
autoestima dos adolescentes em conflito com a lei foi
descortinado através de atividades dinâmicas, lúdicas e
de contato físico, em um ambiente repleto de precon-
ceitos, estigmas e privações.
Apostando em uma abordagem
inovadora e intersetorial para
fazer valer direitos
A ação piloto realizada no CENIP foi desenvolvida
por uma rede de parceiros que lutam para reduzir a vul-
nerabilidade de adolescentes em privação de liberdade.
A finalidade é oferecer aos parceiros institucionais uma
metodologia que possa vir a ser implementada pela FU-
NASE, garantindo ações continuadas de prevenção às
DST/HIV/Aids nas demais unidades de internação. As
atividades propostas visaram estabelecer um espaço
de trocas com os adolescentes, onde informações e
orientações sobre práticas sexuais saudáveis e seguras
pudessem ser discutidas e compartilhadas, contribuin-
do para o exercício dos seus direitos sexuais e reprodu-
tivos.
Para a equipe da ONG Pé no Chão esse é o primeiro
passo para a construção de uma metodologia validada
pelos próprios beneficiários, incluindo os educadores
pedagógicos, e que precisa ser contínua e de impacto
direto na vida dos mesmos. “Cuidar da saúde é priorizar
a qualidade de vida para que algo que dá prazer e ale-
gria não vire dor e sofrimento”.
Estabelecimento das parcerias e o papel de
cada instituição
O primeiro contato do UNICEF junto com a ONG
Pé no Chão, foi com a Secretaria Estadual da Criança
e Juventude (SCJ), através do Secretário Executivo de
Articulação e Projetos Especiais, Eduardo Figueiredo, que
prontamente, acolheu a proposta para realizar ações de
prevenção às DST/HIV/Aids nas unidades de privação
de liberdade.
Como as ações socioeducativas na unidade de inter-
nação são executadas pela FUNASE, a SJC facilitou uma
reunião com o seu presidente, o Sr. Eutácio Borges, que
alinhou com as propostas e indicou o CENIP Recife para
o desenvolvimento da ação, considerando ser a unidade
de internação provisória o primeiro espaço de contato
dos adolescentes com cumprimento do regime fechado,
enquanto aguardam a sentença. A partir destas defini-
13. Diálogo, construção coletiva e ação 13
ções, foi identificada a importância do envolvimento da
Secretaria Estadual de Saúde no projeto, incentivando o
diagnóstico como primeiro passo para o tratamento e
prevenção de DST/HIV/Aids.
Na sequência, foi realizada a mobilização da equipe
do CENIP para a apresentação da ação, construção da
metodologia e definição de papéis. De forma participa-
ONG PÉ NO CHÃO,
Coordenação e suporte técnico à construção
da agenda e metodologia adaptável à realidade
local.
Realização de 02 oficinas de sensibilização
sobre DST/HIV/Aids e 01 oficina de rima,
realizadas em período integral (8hs/dia), com
os 25 adolescentes e 10 profissionais do CENIP.
Realização de 02 sessões do Cine Prevenção
com a participação de todos os adolescentes
em internação provisória, educadores e
gestores, familiares e convidados.
Produção de painel grafitado na sede do CENIP.
PROGRAMA ESTADUAL DE DST/HIV/Aids.
Realização de três Oficinas de Prevenção do
HIV/Aids e outras DST com a participação de
65 adolescentes.
Organização de dois dias de testagem rápida
voluntária – HIV, Sífilis e Hepatite B (coleta,
entrega de resultados, aconselhamento
e encaminhamentos oportunos) para 91
adolescentes.
SECRETARIA ESTADUAL DA CRIANÇA E DA
JUVENTUDE
Articulação com a FUNASE para discutir a ação
em parceria com o UNICEF e a ONG Pé no
Chão e contribuição à elaboração do plano de
ação.
Análise conjunta sobre os resultados da ação
e perspectiva de continuidade e expansão para
outras Unidades.
tiva e colaborativa foram estabelecidas as etapas para
a operacionalidade da proposta, incluindo rdefinições
sobre os recursos humanos, instalações físicas, núme-
ro de participantes, período das atividades, etc. Nessas
discussões, participaram o UNICEF, ONG Pé no Chão,
Programa Estadual de DST/HIV/Aids e equipes da FU-
NASE e CENIP.
UNICEF
Articulação com a rede de parceiros envolvidos
(Secretária da Criança e da Juventude de
Pernambuco, FUNASE, CENIP e Secretaria
Estadual de Saúde) e ONG Pé no Chão para
apresentar a proposta e definir grupo de
trabalho para construir o plano de ação.
Disponibilização da equipe técnica de
consultores para apoiar a realização das
atividades.
Elaboração do relatório técnico e da
sistematização da experiência.
Suporte financeiro aos facilitadores e produtos
de comunicação
FUNASE/CENIP
Coordenação geral das ações na Unidade.
Participação da equipe técnica (educadores
e agentes socieducativos) nas atividades
educativas, na testagem rápida e na entrega de
resultados.
Organização e seleção dos adolescentes
participantes.
Disponibilização da infraestrutura para a
realização das atividades.
Mediação com as famílias dos internos.
Solicitação aos órgãos judiciais competentes
da autorização de imagens dos adolescentes.
As funções e responsabilidades foram divididas
da seguinte forma:
14. 14 Diálogo, construção coletiva e ação
Sujeitos da Ação
25 adolescentes foram selecionados para participar
das oficinas dinamizadas pela ONG Pé no Chão. O crité-
rio foi que os mesmos meninos participassem em dois
turnos (grupo fixo). Outros 66 jovens participaram ape-
nas dos dois dias de formação com a equipe do Programa
Estadual de DST/HIV/Aids, coordenado pela Secretaria
de Saúde do estado. A seleção seguiu as orientações
da equipe técnica da FUNASE e do CENIP, convidando
os adolescentes chegados à unidade na semana anterior
ao início das atividades, uma vez que esses passariam no
máximo 45 dias de internamento, o que garantiria a parti-
cipação no período programado para a ação. Por meio de
rodas de diálogos, 10 tecnicos do CENIP (09 mulheres e
01 homem), incluindo 03 agentes de segurança, também
foram sensibilizados nas temáticas trabalhadas, visando
preencher a lacuna entre o conhecimento e as práticas,
para mudança de comportamento.
Envolvendo jovens mediadores
Quatro adolescentes (02 meninas e 02 meninos)
beneficiários do Pé no Chão e que agora atuam como
educadores no trabalho com jovens em situação de
rua, além de terem ajudado a desenvolver o Cine Pre-
venção5
, foram co-facilitadores nas oficinas. Para o edu-
cador Nielson Bezerra “eles foram uma ponte que me
permitiu circular entre o meu espaço de educador e
o dos meninos, me ajudando muito a chegar neles de
forma mais rápida, segura e passando confiança”.
O objetivo foi investir em um jeito de trabalhar que
vem sendo utilizado nas ações realizadas entre os ado-
lescentes e jovens para pautar os direitos sexuais e re-
produtivos: a metodologia conhecida como educação
entre pares, que valoriza a troca entre pessoas com
experiências semelhantes, com o jovem falando com
outro jovem do seu jeito, passando as informações e
os conhecimentos de que ele dispõe.
Oficina sobre Conhecimento, Autonomia e Direitos para
Redução da Vulnerabilidade às DST / HIV / Aids
5 O projeto Cine Prevenção centra-se na prevenção e combate ao preconceito contra as DST/ HIV/ Aids e inclui a exibição de um vídeo
animado produzido pelos adolescentes em suas próprias comunidades, apresentado aos habitantes locais e agentes públicos que atuam
na região.
15. Diálogo, construção coletiva e ação 15
“Apostamos no conhecimento do Pé no Chão com
crianças e adolescentes em situação de rua e propo-
mos a experiência para um ambiente fechado, como
uma instituição socieducativa, pois sabemos que o tra-
ATIVIDADES
Maio Junho Julho Agosto
Semanas Semanas Semanas Semanas
1ª 2ª 3ª 4ª 1ª 2ª 3ª 4ª 1ª 2ª 3ª 4ª 1ª 2ª 3ª 4ª
Reuniões para planejamento das ações
Oficina Conhecimentos, Autonomia e Direitos para Reduzir
a Vulnerabilidade às DST/HIV/Aids
Oficina de Rima/RAP – A Cultura de Rua e a Importância da
Prevenção
Roda de diálogo com os funcionários (as) do CENIP e
FUNASE através da reflexão coletiva sobre os principais
desafios e recomendações sobre a ação
Cine Prevenção
Painel grafitado
Oficinas de Prevenção do HIV/aids e Outras DST, coordenada
pela equipe do Programa Estadual de DST/HIV/Aids
Teste rápido - Coleta, entrega de resultados,
aconselhamento e encaminhamentos oportunos
Lançamento da Publicação sobre a experiencia no CENIP
Capacitação para profissionais de saúde da FUNASE/
CENIP sobre coleta, diagnóstico, aconselhamento e
acompanhamentos para os serviços de saúde de referência.
Relatório Final Comitê Suiço
CRONOGRAMA
X X
X
X
X
X
X
X
X
X
X
X
Atividades
As oficinas de sensibilização sobre a prevenção e
o preconceito associado às DST/HIV/Aids facilitadas
pela equipe do Pé no Chão, assim como as dinamizadas
pela Secretaria Estadual de Saúde, somaram seis en-
contros. As atividades realizadas com os adolescentes
aconteceram em salas do CENIP, sem a presença de
agentes socioeducativos de segurança para que os par-
ticipantes ficassem mais a vontade.
balho mediado por jovens aumenta a confiança dos
internos, que se identificam com seus pares”, ressalta
a Consultora de Proteção à Infância do UNICEF Recife,
Irismar Silva.
Foram utilizadas dinâmicas de grupo, artes urba-
nas, como RAP e grafitagem, exibições de vídeos, re-
flexão através do desenho e diálogos sobre precon-
ceito, risco e prevenção associados às DST/HIV/Aids.
As expressões artisticas facilitam a aproximação, o
acolhimento e a abordagem, em linguagem que su-
pera as dificuldades dos mesmos de falarem e se ex-
pressarem, porque têm níveis de escolaridade muito
baixos e se habituaram a um discurso simples. Então,
foi criado um ambiente de descontração e interesse
16. 16 Diálogo, construção coletiva e ação
para os adolescentes, que participaram ativamente
das atividades.
Todos os encontros foram filmados e se integra-
ram ao projeto Cine Prevenção. As oficinas foram fo-
tografadas, sempre mantendo o cuidado de preservar
a identidade dos adolescentes. Foram realizadas entre-
vistas com os participantes, suas mães, equipe técnica
do CENIP e como os jovens e educadores do Pé no
Chão, além da elaboração de histórias de vida. O pro-
pósito da coleta deste material foi apoiar a sistematiza-
ção da experiência.
Visando não constranger os adolescentes, não fo-
ram levantadas questões acerca dos sentimentos dos
mesmos sobre o que fizeram para estarem cumprindo
uma medida socioeducativa. Para os educadores do Pé
no Chão ficaria inviável levantar temáticas que neces-
sitariam de tempo para serem trabalhadas, alertando
que é altamente necessário fazer com que os partici-
pantes encontrem atitudes positivas e passem a acre-
ditar nelas. “Eles sentem que todos os definem pelas
coisas ruins e negativas que fizeram. Temos que valori-
zar o que cada um tem de bom para oferecer”, relata
Jocimar Borges.
“Não queria saber nem perguntava o que eles fize-
ram para estarem ali. Minha colaboração partiu para
uma projeção futura do que poderiam fazer de melhor.
Não quis abrir uma ferida e depois não ter tempo para
tratá-la”, alegou o educador social Nielson Bezerra.
1. Oficina Conhecimentos, Autonomia e Direitos
para Reduzir a Vulnerabilidade às DST/HIV/Aids
02 oficinas com Adolescentes - As atividades foram
desenvolvidas nos dois dias 10 e 13 de Junho, das 9h às
17h, mediada pelo educador social e especialista em
DST/HIV/Aids Nielson Bezerra. No primeiro dia, 25 ado-
lescentes participaram no período da manhã. Como a
participação foi voluntária, à tarde 04 internos não com-
pareceram, alegando que não queriam retornar à oficina.
No segundo dia, do grupo inicial, 20 estiveram presentes
nos dois turnos, pois cinco foram convocados em caráter
de urgência para audiências com juizado.
Tanto os educadores do Pé no Chão quando os
jovens mediadores revelaram terem tido algum receio
porque o grupo era composto por adolescentes que
estiveram envolvidos ou cometeram algum ato infracio-
nal violento. Contudo, essa barreira foi ultrapassada nos
primeiros momentos da atividade. “Vencida a etapa de
iniciar o diálogo com eles, o desafio foi buscar ler os
olhares de cada jovem. Essa ‘leitura’ guiou meus atos
educativos, fazendo com que eu mudasse rotas ou re-
fizesse caminhos”, afirmou o facilitador. O jovem do Pé
no Chão, Lucas do Nascimento, confessou: “No primeiro
dia não achei que iria ser tão fácil. Que o comportamen-
to seria diferente por eles estarem em uma instituição
como a FUNASE. Pensei que eles eram mais agressivos.
Mas, descobri que são jovens como eu”, disse.
O coordenador da ONG ressalta que acompanham
meninos e meninas em situação de rua que possuem as
mesmas histórias de vida, em que as necessidades e a
falta de oportunidades os empurram para contextos de
criminalidade e violência. “Eles são os mesmos jovens
que trabalhamos nas comunidades periféricas do Recife,
com as mesmas brincadeiras, desconfianças e aberturas”.
Os temas foram voltados para o preconceito, a
desconstrução dos estereótipos, a sensibilização e
orientação associados à prevenção das DSTs, com foco
especial em HIV. Após o estabelecimento das regras
de convivência, foram valorizadas as experiências de
cada participante através de atividades que fortale-
ceram a confiança e a autoestima do grupo. Durante
as oficinas a questão da prevenção e sexualidade foi
tratada de forma ambígua, pois, ao mesmo tempo que
poderia revelar prazer, também estaria relacionada a
dor e ao medo.
“
A interação com o
grupo foi muito boa.
Logo no começo eu
estava muito tímido e
não conhecia ninguém,
mas depois com as
brincadeiras e os
jovens do Pé no Chão
eu me soltei mais”
Adolescente Mateus,
16 anos
17. Diálogo, construção coletiva e ação 17
Segundo Nielson, são jovens de idades, tamanho
e porte físicos bem distintos, confinados em celas de
onde exalam o cheiro nauseante do cárcere. “Parece
provável o contato sexual entre eles, que pode ser
consentido ou não. Este tema parece ser proibido.
Encarar esta realidade significaria enfrentar questões
centrais que dizem respeito ao cuidado real com estes
jovens e ao atendimento integral de seus direitos se-
xuais e reprodutivos”, destacou.
“A interação com o grupo foi muito boa. Logo no
começo eu estava muito tímido e não conhecia nin-
guém, mas depois com as brincadeiras e os jovens do
Pé no Chão eu me soltei mais”, revelou o adolescente
Mateus, de 16 anos.
As atividades finalizaram com dinâmicas e ações
associadas à cultura de prevenção às DST/HIV/Aids,
além de uma avaliação participativa de todos os envol-
vidos. A equipe técnica que esteve envolvida na forma-
ção mostrou-se entusiasmada com o projeto.
Já informados sobre a continuação das atividades,
com a oficina de música (Rap), na qual trabalhariam os
conhecimentos vivenciados por eles durantes essas ofi-
cinas, os adolescentes se mostraram bastante entusias-
mado com a possibildade de gravarem uma música com
um Rapper. Na avaliação dos dois dias de oficinas, os
adolescentes já podiam expressar com mais segurança
suas impressões sobre a prevenção das DST/HIV/Aids
e encontravam-se mais descontraídos entre eles.
“Saber como se pega as doenças e como se previ-
ne foi muito bom para todo mundo. Depois das oficinas
ficávamos falando para nossos amigos como foi. Nin-
guém nunca tinha falado isso comigo. Só diziam para
eu usar a camisinha e eu nem sabia direito o porquê”,
revelou Marcos, 15 anos.
“Desenvolvi junto com eles. Sou muito tímida,
mas aqui me soltei e me senti a vontade de brincar e
conversar com eles”, disse a jovem Ivanize Tallyta. A
adolescente Carolayne Miranda afirmou que apesar
de ser um grupo em instituição só para meninos, eles
a respeitaram bastante. “A experiência de mediar esse
trabalho foi maravilhosa e vou levar para o resto da
minha vida. O que eles fizeram não me impediu de me
comunicar. Estar com eles aqui estes dias mexeu muito
comigo. Eu também me identifiquei com os internos
porque eles também vivenciam as mesmas realidades
e problemáticas que eu vivo. “São meninos de periferia
A experiência
de mediar esse
trabalho foi
maravilhosa e vou
levar para o resto
da minha vida. O
que eles fizeram
não me impediu
de comunicar
com o grupo de
adolescentes.
Estar com eles aqui
estes dias mexeu
muito comigo
Para mim não
interessa o que
eles fizeram de
mal, mas o que tem
de dentro, de bem.
Eles têm a mesma
realidade que nós
temos. São meninos
de periferia como a
agente”
Carolayne Miranda,
Jovem do Grupo pé no
Chão
“
18. 18 Diálogo, construção coletiva e ação
2. Oficina de Rima/RAP – A Cultura de Rua e a
Importância da Prevenção
Apesar de ter ocorrido em apenas um dia, a Oficina
de Rima foi a atividade mais participativa e mobiliza-
dora. Vinte jovens estiveram envolvidos na produção
de uma música (Rap) sobre a prevenção, facilitada pelo
Rapper Maggo MC (Edilson Cândido) e os jovens me-
diadores do Pé no Chão.
O Rap é um gênero musical que tem por caracterís-
ticas um ritmo acelerado, inconfundível. As letras que
compõem esta musicalidade são bastante longas, ge-
ralmente trazendo uma rima, onde a mensagem que se
procura transmitir é de cunho social, politico e educativo.
A letra da música foi construída a partir dos co-
nhecimentos obtidos pelos adolescentes nas 1ª e 2º
oficinas Conhecimentos, Autonomia e Direitos para
como a gente. A única diferença, que acho, é que não
tiveram o mesmo apoio da família e oportunidades que
eu tive. Mas, são iguais à mim”, mencionou a jovem de
16 anos.
Tatiana Gomes dos Santos, mãe do adolescente Ma-
teus confessa: “Já falei com ele algumas vezes sobre sexo
e prevenção, mas como sou mãe sempre fica um pouco
restrito. Ele nunca quer avançar muito sobre o assunto
comigo. Acho que falta a figura do pai. De um homem
onde ele poderia se abrir mais”, afirma a dona de casa.
Para a diarista Janaína Seabra da Silva, é responsabilidade
dos pais falar com seus filhos sobre sexualidade e pre-
venção, mas acredita que não se sente capaz de se ex-
pressar com seu filho. “Acho bacana a ideia de trazer es-
sas oficinas para eles. Principalmente porque estão todos
juntos e falam da experiência de cada um sem vergonha”,
menciona a mãe do adolescente Washington, de 16 anos.
19. Diálogo, construção coletiva e ação 19
Reduzir a Vulnerabilidade às DST/HIV/Aids, e ao fi-
nal foi gravada uma música (RAP da Prevenção) com
uma mensagem de orientação para os cuidados com a
prevenção, culminando com uma gravação feita pelos
próprios adolescentes, com trechos de performance
individual e coletiva.
“(…) E se você vacilou
Procure uma ajuda
Para buscar tratamento
Ou possivelmente a cura
Esse é o nosso recado
Direto do CENIP
Com sexo seguro
Todo mundo se previne (…)“
“A partir do instante que falam, escutam e com-
partilham suas práticas eles se comprometem no dis-
curso, passando a se sentirem responsáveis pela mu-
dança”, analisa o coordenador da atividade.
A criatividade e expressão artística foram estimu-
ladas, transformando rima em uma ferramenta de ma-
nifestação do que vivenciam e sentem, traduzindo suas
angústias e desejos em poesia. “Minha oficina contribui no
diálogo, multiplicando o conhecimento. Neste projeto os
adolescentes tiveram acesso à informação e esta neces-
sitava ser partilhada e projetada”, afirma Maggo MC.
A abertura à participação dos adolescentes é bas-
tante questionada quando estão inseridos em contex-
tos de privação de liberdade, sendo considerado um
grupo fechado para atividades. Maggo MC, discorda
deste argumento bastante utilizado por agentes so-
cioeducativos. “Os adolescentes internos demons-
tram estarem abertos a novas propostas e diálogos,
sempre ouvindo bastante e partilhando suas experi-
ências de vida”.
“Nunca achei que teria capacidade de fazer uma
música, ainda mais gravando com todo mundo junto,
em conjunto”, relatou o adolescente Wendel, de 18
anos. Algumas mães ficaram surpresas quando seus fi-
lhos no dia de visitas disseram que tinham feito uma
música. “Fico muito contente em saber que meu filho
está ocupando a cabeça com coisas boas que vão aju-
Nunca achei que
teria capacidade de
fazer uma música,
ainda mais gravando
todo mundo junto,
em conjunto. Tiverem
muitas brincadeiras que
deixaram todo mundo
mais a vontade para
depois falar sobre sexo.
Foi bom conhecermos
todos. Nunca falaria de
intimidade e sexo com
um estranho, sem que
eu sentisse confiança
nele.”
Adolescente interno
Wendel, 18 anos.
“
20. 20 Diálogo, construção coletiva e ação
dar ele a criar possibilidades de quando sair daqui pen-
sar em outras coisas”, confirmou Eliane Rodrigues de
Brito, mãe do jovem Hélio de 17 anos.
Para o adolescente Eduardo, de 16 anos, os jovens
do Pé no Chão ajudaram para que o grupo ficasse mais
tranquilo pois se estavam com eles eram pessoas con-
fiáveis. “Um deles é até meu vizinho. Mora na minha
rua. Tinha até meninas que nem se intimidaram por esse
lugar ser só para meninos”.
A oficina contribuiu para que os adolescentes pu-
dessem reforçar os conhecimentos e dessiminá-los em
forma de música e rimas. “O Rap é uma linguagem bas-
tante acessível a outros jovens, possibilitando que seja
propagada com mais facilidade dentro e fora da unida-
de de internação, pois ao ser gravado o conhecimento
é imortalizado e tem o poder de chegar a muitas outra
pessoas e lugares “, conclui Maggo MC.
3. Roda de diálogo com os funcionários (as) do
CENIP e FUNASE
Com a facilitação do coordenador da ONG Pé no
Chão, Jocimar Borges, 10 funcionários discutiram as
ações realizadas, os desafios e as recomendações. A
roda de diálogo foi um momento de reflexão com os
que estiveram diretamente ligados às atividades reali-
zadas durante as oficinas e testagem rápida. Foi obser-
vada a importância de primeiro romper com os precon-
ceitos, a discriminação e a falta de conhecimentos dos
próprios funcionários sobre a temática das DST/HIV/
Aids. Ao observarem as atividades realizadas, os mes-
mos puderam compreender que é possível tratar de um
tema sensível e complexo de forma criativa, lúdica e
participativa.
A equipe técnica que esteve envolvida na forma-
ção mostrou-se entusiasmada com o projeto e avaliou
como muito positiva a ação. De acordo com a pedago-
ga Soraya, esse projeto vem a somar. “Estamos todos
os dias em contato com eles e só o fato de vir pessoas
de fora, com dinâmicas mais atraentes, que falam a lín-
gua deles, fortalece. É como se fosse uma sala de aula
muito mais lúdica e animada”, afirma.
Também afirmaram que os adolescentes têm o di-
reito de ter preservada a sua sexualidade e que precisam
receber os cuidados necessários para sua saúde sexual.
Todavia, todos concordaram que será fundamental que
passem por uma capacitação específica e se mostra-
ram interessados na continuação da ação. E reconhe-
cem que também será preciso estabelecer uma ação
continuada que envolva todos os profissionais que es-
tão na unidade de internação para que cada um, a partir
de suas atividades, possa contribuir para a prevenção,
diagnostico e cuidados. promovendo um ambiente de
respeito, sigilo e confiança que favoreça a erradicação e
tratamento das DST/HIV/Aids nas Unidades.
Como primeira iniciativa, foi solicitado ao Programa
Estadual de DST/HIV/Aids que oferecesse uma capa-
citação para os profissionais de saúde do CENIP sobre
coleta, diagnóstico, aconselhamento e acompanha-
mentos para os serviços de saúde de referência. E que
21. Diálogo, construção coletiva e ação 21
seja montada no CENIP uma estrutura física e equipa-
mentos para a implantação de um serviço permanente.
A proposta foi acolhida pela equipe do Programa
Estadual de DST/HIV/Aids e já está prevista uma capa-
citação para a primeira quinzena de agosto do corren-
te ano, que vai contar não apenas com o treinamento
dos 10 profissionais de saúde, mas também com outros
10 profissionais de outras áreas que serão capacitados
para oferecer oficinas de sensibilização aos adolescen-
tes sobre o tema e para que possam atuar como refe-
rência nos aconselhamentos.
É importante destacar que a introdução dos testes
rápidos para HIV, Sífilis e Hepatites acontecerão de for-
ma gradual, pela necessidade de capacitação de profis-
sionais multiplicadores e executores nas metodologias
rápidas e também preparação do espaço e condições
para implantar esses diagnósticos em atendimento aos
adolescentes quanto ao acolhimento, aconselhamen-
to, execução da testagem, tratamento, encaminha-
mento e acompanhamento.
4. Cine Prevenção
Cine Prevenção (Ações culturais nas comunida-
des): O grupo Pé no Chão tem procurado, sempre,
pautar seu trabalho na exploração de metodologias
com linguagens apropriadas, interativas e atraentes às
crianças adolescentes e jovens em situação de rua,
visando garantir o pleno envolvimento dos mesmos
nas atividades propostas. Nessa perspectiva, realizou
em 2007, em parceria com a ONG Shine Light ( EUA),
uma oficina de audiovisual, que teve como um dos
produtos, a criação de um núcleo de vídeo que ga-
nhou o nome de Cine Favela, uma das atividades mais
curtidas pelas crianças e adolescentes.
O Cine Favela tem como objetivo capacitar as pró-
prias crianças e adolescentes para se apropriarem da
tecnologia, documentarem suas realidades e transfor-
marem tais produtos em instrumentos pedagógicos.
Essas produções têm sido exibidas em comunidades e
Estamos todos os
dias em contato com
eles e só o fato de vir
pessoas de fora, que
mostram uma dinâmica
diferente e falam a
língua deles é como
se fosse uma sala de
aula muito mais lúdica e
animada.
Soraya Nunes de Almeida
(Pedagoga)
“
Oficina de Rima/RAP – A Cultura de Rua
e a Importância da Prevenção
22. 22 Diálogo, construção coletiva e ação
escolas públicas da cidade do Recife e se configuraram
em momentos de diálogos abertos entre as crianças,
adolescentes e os moradores dessas comunidades.
Partindo dessa experiência exitosa e da animação
das próprias crianças e adolescentes, os adolescentes
construíram com muita qualidade e interatividade o fil-
me de animação Prevenção é Amor, com informações
sobre a prevenção das DST/HIV/Aids, e mobilização da
comunidade em torno da temática.
Na proposta de intervenção, também são exibidos
documentários, compostos a partir de entrevistas à
pessoas e lideranças das comunidades, religiosos (pa-
dre, pastor, mãe e pai de Santo) professores e diretores
de escolas, equipes de saúde da família e comercian-
tes. A idéia é compreender o pensamento dos mesmos
em relação ao Controle do HIV e as perguntas têm o
seguinte roteiro básico: Qual o seu conhecimento so-
bre as DST/HIV/Aids? Quais as formas de Contágio?
Como evitar a contaminação? Quais os riscos e perigos
para a Comunidade? Como e quanto você esta com-
prometido com a prevenção?
As entrevistas são editadas, compostas como do-
cumentário e apresentadas à comunidade antes do fil-
me Prevenção é Amor, afim de que os habitantes de
cada localidade se reconheçam apartir de cada depoi-
mento e resignifiquem sua compreensão sobre o tema,
se for o caso.
Para favorecer a mobilização dos moradores ao
trabalho preventivo, também são realizadas atividades
artísticas e culturais desenvolvidas por grupos das pró-
prias comunidades, além da apresentação de grupos
artísticos do Pé no Chão (danças populares e afro-bra-
sileiras, músicas, RAP, Hip hop, etc.).
A equipe entende que, na descontração desses
ambientes, torna-se mais possível e proveitoso se dis-
cutir os problemas que preocupam a comunidade e in-
centivar a reflexão a respeito das DST/HIV/Aids e da
necessidade da prevenção.
No final do mês de Julho acontecerá uma sessão
do Cine Prevenção no CENIP, com a exibição de um
curta-metragem de todas as atividades documenta-
das pela equipe do Pé no Chão, como culminância
das ações. Serão convidados adolescentes internos,
funcionário, familiares, gestores públicos e represen-
tantes da sociedade civil, entrevistados ao longo das
atividades.
Oficina de Rima/RAP – A Cultura de Rua
e a Importância da Prevenção
23. Diálogo, construção coletiva e ação 23
5. Painel grafitado
Para mais um registro das atividades realizadas no CE-
NIP, um educador da ONG Pé no Chão realizará uma pai-
nel gafitado dentro do CENIP, com o apoio e sugestões
dos adolescentes internos e profissionais. O painel será
afixado nas novas instalações da Unidade, como marco
da ação que foi iniciada neste Centro de Internação e
que, espera-se, seja também incorporada nas atividades
rotineiras das demais unidade de internação do Estado.
6. Oficinas de Prevenção do HIV/aids e Outras
DST, coordenada pela equipe do Programa
Estadual de DST/HIV/Aids
Durante dois dias o Programa Estadual de DST/
HIV/Aids, vinculado à Secretaria de Saúde de Pernam-
buco, dinamizou atividades participativas no CENIP, en-
volvendo 65 adolescentes.
Com o objetivo de ampliar o diagnóstico precoce
de Aids e outras doenças sexualmente transmissíveis
entre os adolescentes, foram realizadas oficinas de
sensibilização, pré-teste, coleta de material para os
testes, apresentação dos resultados, aconselhamento
e, nos casos necessários, encaminhamento para os ser-
viços de referência.
De acordo com a rotina do programa antes da cole-
ta para o teste foram realizadas 03 oficinas de sensibi-
lização sobre prevenção e preconceitos associados às
DST/HIV/Aids e para incentivar a realização do teste
rápido. A duração da atividade foi de aproximadamente
1 hora e 30 minutos, por oficina, as quais foram facilita-
das pela Psicóloga Bethania Cunha (Programa Estadual
de DST/HIV/Aids).
A metodologia foi participativa, contribuindo para
vencer a inibição inicial, comum entre os adolescentes.
“Por conta da rotina de horários de café da manhã, al-
moço e dos agentes de escolta, as oficinas não pude-
ram acontecer com a duração de no mínimo 3 horas,
usualmente utilizado nestes casos”. Relata a Psicóloga
Bethania Cunha.
Foram exibidos vídeos, produzidos desenhos e esti-
mulados debates a partir da estratégia da Árvore do Pra-
zer. A experiência é uma forma inovadora e estimulante
de trabalhar as DST/HIV/Aids com adolescentes, possi-
bilitando que experiências, dúvidas e tabus sobre o tema
sejam esclarecidos de uma forma dinâmica e espontânea.
Para a psicóloga do Programa Estadual de DST/
HIV/Aids, Bethania Cunha, é preciso observar que as
DSTs estão diretamente ligadas à uma vivência sexual
saudável. “O trabalho que deve ser feito não é apenas
com a doença em si, mas com a consciência destes
jovens que foram desassistidos da sociedade e tem
dificuldades para lidar com os seus próprios medos e
preconceitos”, declara.
A equipe destacou que devido ao pouco tempo de
permanência dos adolescentes no CENIP, o mais inte-
ressante seria ter uma preparação dos técnicos da Ins-
tituição para que eles próprios possam realizar essas
atividades com mais frequência. Um resultado bastante
positivo foi que todos os adolescentes que participa-
ram se voluntariaram para fazer a testagem.
Testagem rápida voluntária – HIV, Sífilis e Hepatite
B e C (coleta, entrega de resultados, aconselhamento
e encaminhamentos oportunos) - A oferta de testa-
gem rápida fora de unidades de saúde tem vantagens,
mas demanda alguns cuidados. É importante destacar
que a testagem foi voluntária e esclarecida.
Foram realizados dois dias de testagem rápida
para HIV, Sífilis e Hepatite B e C, com a coleta de 91
O trabalho que
deve ser feito não
é apenas com a
doença em si, mas
com a consciência
destes jovens que
foram desassistidos
da sociedade e tem
dificuldades para
lidar com os seus
próprios medos e
preconceitos”
Bethania Cunha,
psicóloga do Programa
Estadual de DST/aids
“
24. 24 Diálogo, construção coletiva e ação
testes. Houve todo um cuidado com o acesso a infor-
mações e orientações corretas, ao aconselhamento
na entrega do resultado, respeito à privacidade, sigilo
e confidencialidade das informações fornecidas pelos
adolescentes.
Dois testes deram reagente para HIV e quatro para
Sífilis. Os resultados foram comunicados diretamente
aos adolescentes, com o aconselhamento sobre o tra-
tamento e cuidados. Os adolescentes reagentes foram
encaminhados para os serviços de saúde de referência.
Um dos jovens que recebeu o teste HIV positivo já
havia sido diagnosticado, porém tinha abandonado o
tratamento. De acordo com a equipe do Programa Es-
tadual de DST/HIV/Aids, o número de testes positivos
está dentro da média. Segundo dados estatísticos o
esperado na população geral é de 0,6% e, entre popu-
lação privada de liberdade, fica em torno de 5%.
Apesar de ser uma unidade de internação provisó-
ria, Bethania Cunha alerta ainda para a importância da
disponibilização de preservativos na instituição socioe-
ducativa. No entanto, concorda que esta questão en-
volve a abertura de um diálogo com a gestão da FUNA-
SE e a Vara da Infância. “Os adolescentes chegam com
DSTs na unidade, saem daqui e têm relações sexuais
aqui. Apesar de não serem necessariamente homosse-
xuais, já possuem uma vida sexual bastante ativa e não
podem receber visitas íntimas”, aponta a psicóloga do
Programa Estadual de DST/HIV/Aids.
A coordenadora geral do CENIP, Zélia Mesquita
Barbosa, confirma já terem tido casos de adolescentes
soropositivos e relata os cuidados com a confidencia-
lidade e o impacto que a informação pode causar nos
outros internos que não possuem um conhecimento
mínimo das formas de contágio. Para a gestora, o CE-
NIP trabalha com uma população especial, vulnerável
e que necessita de apoio e suporte de todas as organi-
zações envolvidas com a temática. “Ações como esta
contribuem neste universo de suporte e prevenção e
podem se tornar uma rotina na unidade com o apoio da
rede criada para este projeto”, disse Barbosa.
Ações como esta vem
a contribuir neste
universo de suporte e
prevenção e podem se
tornar uma rotina na
unidade com o apoio da
rede criada para este
projeto”,
Zélia Mesquita Barbosa,
Coordenadora Geral do
Cenip Recife
“
Oficina sobre Conhecimento, Autonomia e Direitos para
Redução da Vulnerabilidade às DST / HIV / Aids
25. Diálogo, construção coletiva e ação 25
cessitando de propostas especificamente desenhadas
para esses adolescentes. A ação desenvolvida, ape-
sar de sua relevância na inclusão dos cuidados com a
saúde sexual no sistema socioeducativo, tem grandes
desafios para quebrar paradigmas que envolvem ta-
bus, preconceitos e prerrogativas legais relacionadas
com o reconhecimento e aceitação do direto sexual
e reprodutivo dos adolescentes privados de liberdade,
incluindo a inexistência de espaços adequados para as
visitas íntimas.
No caso do sistema socioeducativo, essa reali-
dade é ignorada e negada aos adolescentes quando
estes não recebem as orientações e cuidados que ne-
cessitam para protegerem a si e aos seus parceiros das
DST/HIV/Aids, gravidez, aborto, abuso ou violência
sexual. Os adolescentes que cumprem medidas so-
cioeducativas têm o direito de receber informações
abrangentes, terem acesso a serviços de saúde e ou-
tros tipos de apoio social, psicológico e legal durante
seu período de internação. É preciso considerar que
muitos adolescentes que estão privados de liberda-
de já mantinham relações sexuais anteriores ao mo-
mento da internação, e por isso mesmo, precisam de
condições seguras para viver a sua sexualidade. “A
privação de liberdade, que deve ser a última alterna-
tiva para adolescentes que cometeram delitos, não
pode significar a privação dos demais direitos, entre
eles o direito sexual e reprodutivo”, declara a Chefe
do Escritório do UNICEF em Recife Jane Santos.
Alguns funcionários, gestores e a própria mídia
não reconhecem os direitos sexuais dos adolescen-
tes privados de liberdade. Contudo, “a FUNASE já vem
discutindo formas de vencer estes desafios, através
das parcerias com outras Secretarias de Estado e a
sociedade civil”, afirma o presidente da FUNASE, Eu-
tácio Borges.
DESAFIOs
Dois grandes desafios para realizar a ação foram
também agentes propulsores para firmar a parceria
entre a FUNASE/CENIP, as Secretarias de Estado da
Criança e da Juventude e Saúde, a ONG Pé no Chão
e o UNICEF: o despreparo da equipe técnica do CE-
NIP para realizar atividades/atendimento socieducativo
sobre a temática da prevenção das DST/HIV/Aids, as-
sociada à superlotação da unidade, que sobrecarrega
os profissionais, os quais têm dificuldades em oferecer
atendimento adequado aos adolescentes. Este cenário
mobilizou os gestores públicos e profissionais do Cen-
tro de Internação Provisório a aceitar o desafio de ofe-
recer aos adolescentes e equipe de trabalho formação
para diagnóstico, prevenção e tratamentos às DST/
HIV/Aids, com o suporte do UNICEF, Programa Estadu-
al de DST/HIV/Aids e da ONG Pé no Chão.
Dados estatísticos nacionais indicam que o exces-
so de lotação nas unidades de internação comprome-
tem severamente a qualidade de vida e dos serviços
oferecidos aos adolescentes, fazendo com que o sis-
tema socioeducativo não ofereça meios para propiciar
a reeducação dos mesmos. As estruturas físicas e de
pessoal das unidades de privação de liberdade não são
adequadas para garantir o respeito e a dignidade desses
adolescentes. As unidades em sua grande maioria, são
lugares inóspitos, superlotados, e distantes do que pre-
vê a política de atendimento socioeducativo, em con-
sonância com o ECA. Esta realidade não é diferente no
CENIP, que vem buscando efetivar uma transição do
modelo de responsabilização punitiva para um mode-
lo educativo, de modo que as medidas socioeducativas
instituam direitos, interrompam a trajetória infracional e
permitam aos adolescentes a oportunidade para inclu-
são social, educacional, cultural e profissional.
As questões associadas às DST/HIV/Aids se agra-
vam nestes ambientes de privação de liberdade, ne-
26. 26 Diálogo, construção coletiva e ação
Diante dos resultados, lições apreendidas e desa-
fios colocados, os parceiros identificaram algumas re-
comedações, com caráter estruturante e que devem
RECOMENDAÇÕES
Sensibilizar todos profissionais sobre a
temática da prevenção das DST/HIV/Aids,
descontruindo mitos e preconceitos que
levam as discriminações.
Capacitar as equipes responsáveis pelo
processo de formação, diagnóstico e
aconselhamento dos adolescentes.
Garantir espaço físico, equipamentos e
materiais adequados para a realização das
atividades de formação e testagem.
Envolver organizações da sociedade civil com
experiência em trabalhos com adolescentes
nas questões de gênero, sexualidade, DST/
HIV/Aids, raça e etnia nas formações dos
profissionais e adolescentes.
Assegurar o diálogo entre a sociedade civil
e poder público na aplicação e garantia dos
direitos sexuais e reprodutivos dos adolescentes
em privação de liberdade (conforme previsto
no SINASE e ECA), com enfoque no acesso à
prevenção de DST/HIV/Aids.
Promover ações que garantam a
intersetorialidade, o trabalho em rede e o
fortalecimento do Sistema de Garantia de
Direitos, em relação à prevenção de DST/
HIV/Aids.
Promover atividades socioeducativas de
natureza lúdica e participativa, nas quais o
educador deve abrir mão de um modelo
rígido, para investir em um processo
dinâmico, dialógico, flexível e de partilha de
experiências individuais e coletivas.
Utilizar linguagens diversificadas (música,
teatro, audivisuais, dança, artes plásticas,
grafitagem, etc) para facilitar a apreensão dos
conteúdos pelos (as) adolescentes.
Aplicar a metodologia de educação entre
pares, desenvolvendo as habilidades de
adolescentes internos que possam trabalhar
com as equipes de profissionais como
monitores nas unidades, possibilitando que os
mesmos exercam seus direitos e deveres de
cidadania, trilhando assim um novo caminho
e sendo referência positiva para outros
adolescentes.
Proporcionar a todos (as) adolescentes que
passem pelo sistema socioeducativo de
privação de liberdade, a oportunidades de
serem informados sobre a prenvenção das
DST/HIV/Aids, com adoção de práticas de
sexo seguro, diagnóstico e tratamento precoce.
Envolver as famílias dos adolescentes
nas ações de prevenção, diagnóstico e
tratamento.
ser adotadas para a continuidade da ação no CENIP e a
ampliação para outras unidades de internação:
27. Diálogo, construção coletiva e ação 27
Após a avaliação de todos os envolvidos direta ou
indiretamente na ação piloto, obtida através de entre-
vistas, depoimentos e trabalhos em grupo, conclui-se
que quando há o interesse e empenho em torno de ob-
jetivos comuns é possível fazer melhor o que preconi-
za Constituição Federal e o Estatuto, fazendo valer as
premissas básicas ao enfrentamento da violência con-
tra crianças e adolescentes, assegurando então, um
sistema, de segurança e jurídico, eficiente e protetivo.
Nessa ação específica, um sentimento que marcou
o trabalho foi a vontade das pessoas envolvidas (ges-
tores, profissionais, educadores, jovens) em contribuir
para a mudança das condições desfavoráveis a que são
submetidos os adolescentes em privação de liberdade.
Apesar de desafiante, a intenção é realizar uma
atividade inovadora que possibilite a adoção de medi-
das preventivas e que possam ser implementadas em
outras unidades do sistema socioeducativo de cumpri-
mento de medidas de privação de liberdade no estado
de Pernambuco, beneficiando tantos meninos, quanto
meninas.
A partir da sistematização dessa experiência, foi
possível identificar as necessidades de ajustes estrutu-
rais para que o poder público possa incorporar a meto-
dologia no trabalho socioeducativo desenvolvido nas
unidades de internação da FUNASE. Todavia, considera-
mos que ainda serão necessárias discussões mais apro-
fundadas sobre a realidade vivida pelos adolescentes
nesses espaços, especialmente em relação à negação
dos seus direitos sexuais e reprodutivos.
É nesses adolescentes que a sociedade e o po-
der público devem investir para que os mesmos sejam
reinseridos na sociedade, diferentemente da realidade
atual que os transformam, ao mesmo tempo, em res-
ponsáveis e algozes na realidade violenta e excludente
a que são submetidos.
CONCLUSÃO
Os sentimentos expressos pelos adolescentes que
participaram das atividades emocionou a todos, pois
reflete o contentamento de estarem sendo tratados
com respeito, carinho e cuidados tão negados em suas
trajetórias de vida e que culminou em sua permanência
naquele local. Com isso, podemos buscar tornar efeti-
vo o primado da proteção integral.
Uma certeza motiva a equipe de trabalho: Apenas
mediante estratégias educativas emancipatórias pode-
se construir novo saberes, novas práticas e novos sujei-
tos. Mas é importante pensar em ações humanizadas,
que respeitem a individualidade dos adolescentes, com
ética, compromisso, amor, liberdade, afetividade, consi-
derando o indivíduo como ser único e especial e sujeito
de direitos. Enfim, o método possibilita a reconstrução
do conhecimento que leva ao exercício da cidadania.
O que eu aprendi
vai ficar aqui no
meu coração.
Porque sei que
o que vocês me
ensinaram foi
mesmo de coração.
Vou levar isso
para o resto da
vida”.
(Marcos, adolescente
de 15 anos)
“
28. 28 Diálogo, construção coletiva e ação
ADOLESCENTE WENDEL, 18 ANOS
Wendel, de 18 anos, vive no bairro do Arruda, região
de periferia da capital Pernambucana, Recife. Mora
com a mãe e dois irmãos mais novos. Trabalha
como ajudante em uma banca na feira de Casa
Amarela, onde sua mãe vende, todos os dias,
verduras para a comunidade local. Há dois (2) anos,
o jovem abandonou a escola, mas dizia sempre
aos familiares e a si mesmo que queria concluir o
ensino fundamental, onde parou na quarta série.
O adolescente foi acusado de ter-se envolvido em
um ato infracional poucos dias antes de completar
a maioridade, sendo então encaminhado para o
Centro de Internamento Provisório (CENIP-Recife),
onde aguardava a sentença do juiz.
Sua mãe a comerciante Andréa da Silva Pereira visita
Wendel todas as terças e quintas-feiras a tarde, dias
reservado pela FUNASE. Esta foi a primeira passagem
do adolescente pelo sistema socioeducativo. Casou
com 15 anos e assim permaneceu por quase três
anos. Os pais do jovem e da adolescente, na época
com 16, construiram uma pequena casa de alvenaria
na comunidade do Arruda, que permaneceu com a
ex-companheira quando se separaram. “Ele voltou a
viver comigo”, explica a mãe do rapaz.
O adolescente, que participou de todas as oficinas
desenvolvidas pelo Grupo Pé no Chão acredita que
ainda falta muita informação para os jovens que
estão na rua sobre prevenção de doenças e formas
de contágio. Para Wendel, “só dizer para o amigo usar
camisinha não basta. Tem que explicar tudo, como foi
explicado para mim”.
Disse que nunca achou que teria a capacidade de fazer
uma música, ainda mais gravar com todos em conjunto.
“Tiveram muitas brincadeiras que deixou todo mundo
mais a vontade para depois falar sobre sexo. Foi bom
conhecer todo mundo primeiro. A gente nunca falaria
de intimidade e sexo com um estranho sem que eu
sentisse confiança nele”, recorda Wendel, mencionando
que “nunca o pessoal daqui da Funase me falou sobre
sexo ou sobre doenças”.
Dona Andréa, como gosta de ser chamada, disse sempre
ter preocupação com a prevenção, muito mais associado
a gravidez que à prevenção das DST/HIV/Aids, pois
devido a condição econômica da família, um filho
significaria mais custos que não poderiam ser suportados
pela baixa renda obtida com a venda de verduras na
feira. “Eu digo a ele sempre… mainha não empata que
você saia, mainha que quer você se previna”, diz a
comerciante Andrea da Silva Pereira, mãe de Wendel.
“Acho que o pessoal do Pé no Chão pode ajudar ele
com estas oficinas e acordar para os problemas da vida
que estão na rua”, disse a comerciante, que espera que
a situação seja passageira e única. “Espero um futuro
brilhante para o meu filho”, resume.
histórias
de vida
29. Diálogo, construção coletiva e ação 29
EMSTON GOMES FERREIRA
Foi em 1998 que o instrutor de garçon Emston
Gomes Ferreira foi convidado para ser Agente
Socioeducativo (ASE) em uma unidade de internação
para adolescentes em conflito com a lei, que
hoje é conhecida como Centro de Atendimento
Socioeducativo (CASE), localizado na cidade
de Abreu e Lima, Região Metropolitana do
Recife. Conta que com três meses após iniciar o
trabalho aconteceu uma das maiores rebeliões da
unidade, onde toda a estrutura foi destruída e os
adolescentes foram distribuídos para outros centros
de atendimento socieducativo.
Após quinze anos desenvolvendo atividades
educativas e de segurança para a Funase/PE,
assumiu o cargo de Coordenador de Segurança do
Centro de Internação Provisória (CENIP-Recife).
Emston, que serviu às forças armadas por alguns
anos, confessa que não possuía conhecimentos
prévios de como trabalhar com adolescentes em
privação de liberdade, aprendendo com os anos
de serviço e com os profissionais mais antigos
da entidade. Apesar de ter crescido em uma
comunidade periférica da capital pernambucana,
convivendo com diversas problemáticas sociais
disse nunca ter vivenciado com indivíduos em
contexto de violência. “Eu nunca soube identificar
uma droga, por exemplo. Aprendi com o tempo aqui
dentro a como lidar com os adolescentes e suas
experiências de vida”, relata Ferreira que orienta
o trabalho de 23 agentes socioeducativos entre
homens e mulheres no CENIP.
Devido a superlotação do Centro de Internação
Provisória, a quantidade de agentes socioeducativos
é insuficiente, direcionando a maioria para segurança
e cada vez menos para atividades lúdicas e
educativas. Emston Gomes relata que alguns ASEs
não estão preparados para trabalhar questões
sobre sexualidade e prevenção de doenças
transmitidas através do sexo (DST/HIV/Aids) com
os adolescentes internos. “Eu preciso usar a
linguagem deles para me aproximar e mostrar
para eles uma realidade. Falo que eles têm
que se prevenir e se cuidar, mas faço isso por
intuição”, fala o coordenador de segurança
lembrando ainda da dificuldade de realizar um
trabalho contínuo em uma casa de internação
provisória. “Aqui eles passam no máximo 45 dias.
Tem meninos que quando aprendemos o nome
deles já foram embora”, diz Gomes.
Para o agente, o adolescente quando chega na
FUNASE é a confirmação que todos os órgãos
e sociedade falharam e agora o Estado possui a
tutela deste jovem para reeduca-los e reinseri-
los na sociedade. Muitos vêm de contextos de
alta vulnerabilidade e com precárias condições
de vida. O contexto social em que vivem arrasta
os jovens para a criminalidade, violência e uso de
drogas. “O que falta para eles é oportunidades,
como a que tive, pois também venho de uma
família muito humilde”, explica. Emston, que
começou a trabalhar como ajudante de pedreiro,
afirma que sentia a necessidade de ir mais
adiante e buscou qualificar-se através de cursos
de contabilidade, informática. Atualmente é
aluno do primeiro ano do curso de Direito.
30. 30 Diálogo, construção coletiva e ação30 Todo mundo prevenido
Eu começo essa rima
Mostrando meu respeito
Trazendo informação
Tudo de um só jeito
A informação
É muito importante
Todo mundo tá aqui
Fazendo uma rima brilhante
Mostrando pra você
Uma rima bem legal
Pra todo mundo entender
De uma forma cultural
Que é importante
A gente se prevenir
E o preconceito
A gente tem que impedir
Quando se previne
Você se protege
Deixa as doenças para trás
E delas se esquece
Meu amigo me falou
Que vai sair com a vizinha
E eu falei para ele
Para usar camisinha
Porque com a camisinha
Você pode mandar ver
E não se preocupa
Em pegar HIV
Contra as DSTs
Todo mundo prevenido
Impedindo as doenças
Usando preservativo
E se você vacilou
Procure uma ajuda
Para buscar tratamento
Ou possivelmente a cura
Esse é o nosso recado
Direto do CENIP
Com sexo seguro
Todo mundo se previne
Rap da
Prevenção
(Jovens do CENIP)
32. Realização
AIDS Secretaria da
Criança e da
Juventude
nasemento Socioeducativo
AIDS Secretaria da
Criança e da
Juventude
FunaseFundação de Atendimento Socioeducativo
AIDS Secretaria da
Criança e da
Juventude
FunaseFundação de Atendimento Socioeducativo
AIDS Secretaria da
Criança e da
Juventude
FunaseFundação de Atendimento Socioeducativo