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Mogi das Cruzes, 12 de dezembro de 2005.
Prezado irmão, Rev. Cláudio Marra,
Vai aí a tradução de Crítica Histórica da Bíblia. São 280 laudas. Aguardo novo livro para
tradução, caso seja possível. Obrigado.
Abraço fraternal.
Wadislau.
ETA LINNEMANN

CRÍTICA
HISTÓRICA
da Bíblia
METODOLOGIA
OU IDEOLOGIA?
Reflexões de
uma bultimanniana
que se tornou evangélica
Conteúdo
Introdução do tradutor para a língua inglesa
Prefácio
Introdução da autora
Parte 1
O Cristianismo e a Universidade Moderna
1. As Raízes Anticristãs da Universidade
2. Questões Pertinentes com Respeito à Universidade
3. O Antigo Israel e o Ocidente Moderno
4. A Educação Cristã no Nível Universitário
Excurso 1: Estudos Gerais para o Estudante Cristão
Excurso 2: A Confiabilidade do Pensamento
5. A Bíblia e o Homem Moderno
Parte 2
A Palavra de Deus e a Teologia Histórico-crítica
6. O Estudo da Teologia Histórico-crítica
7. A Fé da Teologia e a Teologia da Fé
8. A Mentalidade da Teologia Histórico-crítica
Excurso 3: Conselho Falso e Verdadeiro
9. Teologia Histórico-crítica e Teologia Evangélica
10. A Palavra de Deus
Índice de assuntos
Índice de textos da Escritura
Introdução do tradutor para a língua inglesa

Este livro apresenta um desafio para o leitor – e uma ameaça. Em novembro de
1988, quando apresentei uma dissertação sobre Eta Linnemann num encontro de
profissionais, discutindo sua contribuição ao estudo do Novo Testamento e sua atual visão
tal como expressa neste livro, quatro editores demonstraram interesse em publicá-lo. Essa é
uma indicação, creio, do alto grau de apelo e relevância do estudo da Dra. Linnemann.
Uma das razões para isso é que há uma fascinante dimensão pessoal que dá
profundidade e pungência a este livro. Linnemann lança um forte protesto contra as
tendências e métodos de uma disciplina que conhece muito bem, de dentro para fora. Ela
não dá tiros à distância. Antes, foi uma estudante receptiva de alguns dos pensadores
verdadeiramente seminais da erudição alemã do século 20 no que diz respeito ao estudo do
Novo Testamento: Bultmann, Fuchs, Gotarten e Ebeling. Mais tarde, afiliada a sociedade
profissional de pesquisa do Novo Testamento de maior prestígio mundial, ela fez par com
muitos outros de igual estatura.
O que levaria alguém a renunciar a tais conquistas? Por que alguém literalmente
lançaria no lixo todos os livros e artigos que teria labutado arduamente para ver publicados?
Por que alguém abriria mão de uma cadeira no sistema universitário da Alemanha
Ocidental para servir, no final das contas, como professora-missionária na Indonésia? Este
livro fornece ao menos os aspectos gerais das respostas a essas intrigantes perguntas.
Contudo, a apresentação de Linnemann vai além do ângulo do interesse humano.
Sua trajetória pessoal, em última instância, é veículo para ponderações sobre a história,
métodos e resultados daquilo que ela chama justificadamente de teologia histórico-crítica.
Aqui, talvez, resida a significância maior das reflexões de Linnemann.
Nesse ponto o leitor encontrará também o desafio do livro, um repto que se estende
a diversos níveis. No primeiro nível o leitor não-alemão encontrará seções lidando com
uma situação que provavelmente lhe parecerá alheia. Isso é especialmente verdadeiro em
relação ao capítulo 4 e aos dois excursos seguintes. Neles, Linnemann lida com a
necessidade, a possibilidade e os passos básicos para a formação de escolas cristãs de nível
universitário na Alemanha Ocidental.
Não se trata de não haver faculdades de Bíblia na Europa Ocidental de língua
alemã; qualquer um pode encontrá-las em localidades da Alemanha Ocidental ou na Suíça
tais como Adelshofen, Beatenberg, Brake, Seeheim, Wiedenest, Wölmersen e Wuppertal,
para citar algumas. Antes, trata-se de que essas faculdades de Bíblia não oferecem
treinamento em nível acadêmico superior equivalente ao da educação oferecida pelas
faculdades teológicas das universidades governamentais. Esses institutos bíblicos também
não gozam do mesmo reconhecimento oficial dado às escolas estatais. Aquilo que os
leitores americanos assumem como certo – a existência de dúzias de faculdades cristãs de
artes liberais e de universidades cristãs, pelo menos nominalmente – não ocorre no país
mais familiar a Linnemann, a Alemanha Ocidental. Linnemann, e muitos outros, sente que
o monopólio das universidades estatais alemãs, com respeito ao treinamento de pastores,
professores de religião, teólogos e acadêmicos da Bíblia, tem tido efeitos negativos e
mesmo desastrosos nos últimos duzentos anos.
Conquanto a situação que motiva Linnemenn possa a princípio parecer estranha a
muitos leitores, seus comentários não são de modo nenhum irrelevantes para a América,
onde faculdades cristãs plenamente reconhecidas são fatos da vida.∗ As questões de que ela
Para o leitor brasileiro a argumentação de Linnemann tem significado especial, pois em anos recentes, cursos
de teologia, sob diversos nomes, podem ser reconhecidos pelo estado. Entretanto, muitos seminários
teológicos continuam sem reconhecimento quer porque não preenchem os requisitos oficiais quer porque
muitos seguimentos eclesiásticos preferem manter a educação teológica de seus pastores distante da
ingerência do estado.

trata – o que é realmente educação cristã de nível superior? E como os cristãos podem obtêla mais efetiva e biblicamente num mundo dominado por instituições acadêmicas
fundamentalmente ateístas? – são freqüentemente levantadas em faculdades cristãs da
América, as quais não são tão reacionárias para se preocupar com a assimilação do ensino
contemporâneo, nem tão complacentemente sofisticadas para não entender o quanto sua
cosmovisão cede terreno para um Zeitgeist (espírito dos tempos) anticristão.
Num segundo nível, alguns leitores acharão o livro desafiador porque estão
familiarizados com a história das idéias que Linnemann critica. Especialmente no capítulo
1, como também em outro pontos, o leitor encontrará um largo espectro de pensadores,
talvez um número maior do que o esperado num livro escrito por alguém treinado
principalmente em crítica do Novo Testamento. Alguns leitores verão isso como sinal de
fraqueza, perguntando por quê Linnemann não se atém à disciplina na qual ela tem
indubitável perícia. A natureza de suas reflexões, entretanto, requerem que ela levante os
olhos, e os de seus leitores, para além do confinamento de uma disciplina acadêmica em
particular. A discussão de Linnemann é de longo alcance a fim de abranger suas
preocupações e aquilo que podemos chamar de seu fardo. Aqueles que questionam,
digamos, a relevância de Goethe para a moderna hermenêutica (veja capítulo 1), poderão
consultar Jaroslav Pelikan, o qual vê no Fausto, de Goethe “a clássica dramatização das
relações negativa e positiva entre ‘a doutrina cristã e a cultura moderna’”.1 Se Linnemann
errou em sua tentativa de fazer uma análise da relação entre o método científico e
interpretação bíblica no contexto da história das idéias, ela está em boa companhia.
Num terceiro nível, aquilo que temos chamado de fardo de Linnemann, também
representará um desafio, se não uma pedra de tropeço, para alguns. Deliberadamente,
Linnemann não escreveu aqui um tratado acadêmico formal,2 mas, sim, um Buβruf – um
chamado ao arrependimento. Isso poderá desapontar aqueles que desejam um tratamento
expositivo de conteúdo acadêmico mais sutil e de tom mais suave. Tais leitores terão de ler
as obras seqüentes de Linnemann. Talvez este livro desagrade aqueles que não gostam do
tom de pregação, especialmente quando isso parecer lhes ser dirigido e acompanhado por
um volumoso revestimento de textos das Escrituras citados por Linnemann.
O propósito aqui não é o de justificar a maneira de expressão escolhida por
Linnemann, mas será bom manter em mente algumas considerações a fim de que a
impaciência com a forma não impeça uma contemplação sóbria do conteúdo:
Primeiro, o leitor deve se lembrar que o tom ocasionalmente zeloso é perfeitamente
compreensível, dada a natureza monstruosa e o escopo do engano contra o qual Linnemann
se vê combatendo. Mesmo que os tempos apresentassem apenas a metade do perigo que
Linnemann vislumbra, ela teria sido negligente se economizasse palavras ou ficasse
limitada a tons mais suaves. Outros escritores na história do pensamento cristão também
entenderam que erros drásticos requerem expressões mais fortes.
Segundo, deve-se manter em mente as circunstâncias da conversão de Linnemann e
os anos precedentes daquilo que ela enxerga agora como falso ensino (ver sua Introdução).
Sem dúvida, em dias passados, ela instou com seus estudantes, com entusiasmo e
convicção, que a Bíblia continha muitos erros, que milagres jamais seriam possíveis, e que
somente a metodologia crítica “científica” seria capaz de apresentar um parecer verídico
responsável sobre o significado do texto bíblico. Seria irrealista paras os leitores esperar
que Linnemann exibisse menos vigor na promulgação da verdade do que demonstrou na
propagação do erro; isso seria hipocrisia de sua parte.
Terceiro, é no mínimo possível que Linnemann corretamente afirme que o presente
mal na teologia Ocidental – que pode não estar inteiramente desconectado dos prementes
dilemas da sociedade Ocidental em geral – necessite de arrependimento, não meramente de
mais pesquisa, diálogo ou reflexão crítica. No seu chamado ao arrependimento, vale a pena
notar que ela prega somente aquilo que pessoalmente pratica. Se Linnemann
desencaminhou-se ao escolher o arrependimento (e uma postura comprometida com a
Palavra de Deus escrita e com o Messias) como parte integrante da recuperação da direção
espiritual e moral num mundo profundamente atribulado, uma vez mais ela encontra
numerosa companhia profética na história da proclamação judaico-cristã.
Quarto, os leitores que considerarem excessivo o uso da Escritura em alguns pontos
poderão se gabar de conhecer tão bem a Bíblia a ponto de achar redundantes as suas
citações. Uma leitura extra de textos familiares não fará nenhum mal, e talvez traga à vista
alguns tesouros no novo cenário em que Linnemann os aplica. Se houve um tempo em que
o público ocidental conhecia a Bíblia intimamente, esse tempo já se foi. Para muitos
leitores, os textos que Linnemann cita não serão familiares. Isso é certamente verdadeiro
para a audiência européia que Linnemann tinha em mente em primeiro lugar ao escrever
sua obra.
Esses são alguns fatores, então, que vale a pena considerar quanto ao tom da obra de
Linnemann. Até mesmo se alguém encontrar exceções aqui e ali, tal consideração pode
auxiliar na argumentação construtiva ordenada.
Um quatro nível de desafio pode ser a representação geralmente tenebrosa que
Linnemann faz do presente estado da academia bíblica, e sua drástica prescrição para a
mudança. Não estaria ela exagerando?
É importante ter em mente que seu quadro referencial primário é a Alemanha
Ocidental e seu sistema universitário. Aqueles que são familiarizados com o contexto e sua
contrapartida na América do Norte poderão atestar a veracidade de sua tese geral de que a
pesquisa bíblica e teológica é buscada com muita freqüência sob os auspícios do ateísmo.
Isso quer dizer que não é mais o Deus vivo e verdadeiro, bem como sua Palavra revelada, a
Bíblia, que marcam o ponto focal da reflexão teológica. No mundo moderno, como
Linnemann corretamente observa, Deus não pode ser conhecido, e a revelação em sua
definição tradicional não pode mais ser aceitável ou válida. O foco da teologia é, antes, a
experiência humana da maneira definida pelas teorias da moderna ciência social, filosofia,
historiografia e outras disciplinas “científicas”. “Deus”, da maneira como entendido pelo
pensamento cristão ortodoxo histórico, é sistematicamente descartado em qualquer
consideração, e substituído pela autoconsciência humana e por forças puramente imanentes;
como é colocado pelos textos de teologia histórica, a antropologia toma o lugar da teologia.
Dado a esse ambiente, intimamente conhecido por Linnemann em virtude de seu
anterior compromisso com ele, ela tende, compreensivelmente, a apresentar seu caso em
termos radicais. Conquanto algumas afirmações possam ser mais aplicáveis ao cenário
europeu, dever-se-ia notar que a mesma regra se aplica fora do mundo relativamente
pequeno da academia evangélica da América do Norte. Muito, na verdade a maior parte, da
pesquisa teológica e bíblica procede sob suposições que não são alinhadas ao entendimento
cristão ortodoxo histórico sobre Deus, o homem, e suas relações da maneira descrita na
Bíblia.
Portanto, a avaliação um tanto severa que Linnemann faz sobre a presente situação e
sua prescrição radical para a mudança pode ser de suma importância para o cenário do novo
mundo. Muito do que ela diz certamente se aplica à erudição e instituições não-evangélicas
– que treinam grande parte dos pastores e educadores teológicos no continente americano.
E isso tem relevância direta para a comunidade evangélica de pelos menos duas maneiras:
Primeiro, a erudição evangélica é indubitavelmente influenciada pelo mundo
acadêmico ateísta que Linnemann descreve. Tem-se presumido, freqüentemente, que isso
tenha efeito benigno. Contanto que os evangélicos mantenham corações piedosos e vidas
justas, aquilo que passa em suas cabeças, ou aquilo que propõem como sendo teoria crítica,
têm importância secundária. Isso, porém, é uma visão míope das coisas. Os efeitos da
erudição ateísta, de fato, não são sempre benignos como prontamente se observa na
confusão moral rompante hoje nas igrejas cujos líderes e membros têm sido por décadas
doutrinados por tal erudição. Os próprios liberais têm expressado desencantamento com o
Deus que têm pregado, e alguns têm até mesmo conclamado a um retorno para “uma visão
biblicamente informada” sobre Deus, igreja e mundo.3
Segundo, os evangélicos não podem ser complacentes quanto a onde sua própria
academia, influenciada como está pela academia mundana em geral, os está levando. Não
poucas vozes têm se levantado em recentes anos – podendo-se lembrar de Francis
Schaeffer, Carl F. H. Henry e James D. Hunter4 – que expressam a convicção de que o
evangelicalismo está, por assim dizer, vivendo com tempo emprestado e se desviando para
uma direção não-saudável.5 A educação cristã superior desempenha um papel estratégico
aqui, para o bem e para o mal. Sobretudo, alega-se plausivelmente que até mesmo a
educação evangélica está, se não em crise, pelo menos não longe disso.6 Em termos mais
populares, poucos líderes evangélicos teriam a coragem de afirmar que o atual estado moral
das igrejas teologicamente conservadoras e sua liderança estejam acima de reprovação. Em
tal situação, o diagnóstico e o prognóstico de Linnemann têm valor primordial,
conclamando os evangélicos a considerar seus rumos diante da atual escalada do mal até
proporções fatais – assumindo, é claro, que ainda não seja muito tarde.
Revisores e leitores críticos em geral também encontrarão muita coisa perturbadora
naquilo que se segue, e alguns até mesmo discordarão peremptoriamente. Contudo, eles
certamente encontrarão muita coisa, também, que reconhecerão absolutamente verdadeira e
que estimulará proveitosa reflexão na vida de estudantes, professores, líderes de igreja e
pessoas em geral que buscam a verdade.
Minha gratidão a Allan Fisher, Linda Triemstra e Paul Ingram, da Baker Book
House, pelo seu interesse e apoio editorial, e à Dra. Linnemann pela sua diligência,
prontidão e graça na supervisão desta tradução. Ambigüidades e infelicidades na expressão
que ainda restem deverão ser atribuídas ao tradutor e não à autora.
Robert W. Yarbrough
Wheaton College
Wheaton, Illinois
5 de julho de 1989
Prefácio

Não escrevi este livro sozinha; muitos amigos leais trabalharam comigo por meio de
orações. Sobretudo, desejo mencionar minha igreja em Leer, Alemanha Ocidental,
especialmente o irmão Hans-Peter Grabe, que serve como líder da congregação. Ele não
apenas realizou a obra de intercessão diante de Deus, mas por meio dos seus reiterados
encorajamentos, contribuiu para a germinação do livro. Devo agradecer também a meus
colegas da agência missionária Christus für Dich (“Cristo para Você”) e à minha irmã em
Cristo Gertrud Scholz, que oraram pelo livro e prestaram valiosa assistência na revisão.
Acrescentando, devo mencionar minha igreja em Odenwald, Alemanha Ocidental,
seu líder, Erling Eichholz, e o círculo de oração liderado pela irmã Elisabeth Hettinger.
Agradecimentos são devidos também às minha irmãs no Senhor Lilot Schöler e Ruth
Parasic e meu irmãos Gerhard Ullrichs e Martin Shwarz.
Meus agradecimentos a todos eles e ao grupo de oração em Hänssler-Verlag, e a
todos cujos nomes não mencionei. Sou grata a Friedrich Hänssler por aceitar de boa
vontade este livro para publicação.
Quero agradecer também ao Dr. R. Yarbrough, o qual fez um excelente trabalho de
tradução, e a Baker Book House, que se dispôs a tornar o livro disponível aos leitores de
língua inglesa.
Dra. Eta Linnemann
Batu, Indonésia
1 de Junho de 1989
Introdução da autora

“Por que você diz ‘Não!’ à teologia histórico-crítica?” Tenho sido confrontada com
essa questão, e desejo declarar logo de início: Meu “Não!” à teologia histórico-crítica vem
do meu “Sim!” ao meu maravilhoso Senhor e Salvador Jesus Cristo e à gloriosa redenção
que ele realizou por mim no Gólgota.
Como aluna de Rudolf Bultmann e Ernst Fuchs, bem como de Friedrich Gogarten e
Gerhard Ebeling, tive os melhores professores que a teologia histórico-crítica pôde me
oferecer. Não me saí mal em outros aspectos também. Meu primeiro livro veio a ser um
best-seller. Tornei-me professora de teologia e educação religiosa na Universidade Técnica
de Brauschweig, na Alemanha Ocidental. Depois de preencher os rigorosos requerimentos
para a livre docência universitária,7 fui agraciada com o título de professor honorário de
Novo Testamento na faculdade de teologia da Universidade Phillips, em Marburg,
Alemanha Ocidental. Fui arrolada na Sociedade para Estudos do Novo Testamento. Tive a
satisfação de receber um crescente grau de reconhecimento da parte de meus colegas.
Intelectualmente confortável com a teologia histórico-crítica, estava profundamente
convencida de que prestava serviço a Deus por meio do meu trabalho teológico e que
contribuía para a proclamação do evangelho. Depois, contudo, baseada em diversas
observações, descobertas e resultante autoconsciência, fui forçada a admitir duas coisas que
eu não desejava: (1) nenhuma “verdade” poderia emergir deste “trabalho científico sobre o
texto bíblico”, e (2) tal labor não serve à proclamação do evangelho. À época, isso era
apenas um entendimento prático resultante de experiências que eu não mais podia negar.
Desde então, Deus por meio de sua graça e Palavra tem-me dado uma compreensão mais
profunda das dimensões teóricas dessa teologia. Em vez de ser baseada na Palavra de Deus,
ela se funda em filosofias que ousaram definir a verdade, de maneira que a Palavra de Deus
foi excluída como fonte de tal verdade. Essas filosofias simplesmente pressupuseram que o
homem não poderia ter nenhum conhecimento válido sobre o Deus da Bíblia, o Criador do
céu e da terra, o Pai de nosso Salvador e Senhor Jesus Cristo.
Hoje entendo que o caráter monopólico e a influência mundial da teologia históricocrítica foram sinais do julgamento de Deus (Rm 1.18-32). Deus o predisse em sua Palavra:
“Pois haverá tempo em que não suportarão a sã doutrina; pelo contrário, cercar-se-ão de
mestres segundo as suas próprias cobiças, como que sentindo coceira nos ouvidos” (2 Tm
4.3). Ele prometeu também enviar “a operação do erro, para darem crédito à mentira” (2 Ts
2.11). Deus não está morto, nem resignado. Ele reina, e já está exercendo juízo sobre os
que o declaram morto ou afirmam que ele é um falso deus que nada faz, bem ou mal.
Hoje sei que devo esses insights iniciais aos efeitos primários da graça de Deus. A
princípio, entretanto, aquilo que entendi levou-me a uma profunda desilusão. Reagi
desviando-me para vícios que amainavam minha miséria. Tornei-me escrava da televisão e
caí num crescente estado de dependência alcoólica. Minha amarga experiência pessoal
finalmente convenceu-me da verdade da declaração bíblica: “Quem acha a sua vida perdêla-á” (Mt 10.39). A essa altura, Deus conduziu-me a cristãos vibrantes que conheciam
pessoalmente a Jesus como Senhor e Salvador. Ouvi seus testemunhos daquilo que Deus
havia feito em suas vidas. Finalmente, Deus mesmo falou ao meu coração por meio das
palavras de irmãos cristãos. Pela graça e pelo amor de Deus eu confiei minha vida a Jesus.
Ele imediatamente tomou minha vida em sua mão salvadora e começou a
transformá-la radicalmente. Meus vícios destrutivos foram substituídos por fome e sede de
sua Palavra e pela comunhão com outros cristãos. Fui capacitada para reconhecer
claramente o pecado como sendo pecado em vez de meramente desculpar-me por eles
como era meu hábito anteriormente. Ainda me lembro da deliciosa alegria que senti pela
primeira vez em que contemplei o branco como branco e o preto como preto; os dois
deixaram de se misturar num cinza indistinguível.
Cerca de um mês após ter confiado minha vida a Jesus, Deus convenceu-me de que
suas promessas eram reais. Ouvi um relato de um missionário da Wycliffe (tradutores da
Bíblia) que servia no Nepal. Ele relatou que enquanto estava fora, seu ajudante no estudo
lingüístico recém-convertido havia sido lançado na prisão, pois era ilegal torna-se cristão
no Nepal. Contou também o que esse novo cristão disse em seu julgamento. Ouvindo o
relato das palavras do ajudante lingüístico, ficou claro para mim que ele jamais teria dado
tal resposta, baseado em sua própria habilidade. Marcos 13.9-11 surgiu ante meus olhos8 –
uma passagem que já havia observado apenas com interesse acadêmico – e não tive
alternativa senão admitir que ali estava um cumprimento dessa promessa.
De repente, fui convencida de que as promessas de Deus eram reais, que Deus é um
Deus vivo, e que ele reina. “Pois ele falou, e tudo se fez; ele ordenou, e tudo passou a
existir” (Sl 33.9). Tudo o que ouvi por meio de testemunhos em meses recentes fez sentido
naquele momento. Tomei consciência da estultícia que é, dado o que Deus está fazendo
hoje, sustentar que os milagres relatados no Novo Testamento jamais ocorreram. De pronto,
ficou claro para mim que meu ensino era um caso de cego guiando cegos. Arrependi-me da
maneira como havia enganado meus alunos.
Um mês depois, sozinha no meu quarto e à parte de qualquer influência de outros
sobre mim, vi-me enfrentando uma significativa decisão. Continuaria a controlar a Bíblia
com o meu intelecto ou permitiria que meu pensamento fosse transformado pelo Espírito
Santo? João 3.16 aclarou minha decisão, pois eu havia recentemente experimentado a
verdade desse versículo. Minha vida agora consistia daquilo que Deus havia feito por mim
e pelo mundo todo – ele tinha dado o seu próprio Filho amado. Eu não poderia varrer esse
versículo para o lado como se fosse uma afirmativa descomprometida e sem sentido
teológico de um escritor mais ou menos gnóstico.9 A fé pode descansar nas firme promessa
de Deus; os princípios teológicos especulativos são de mero interesse acadêmico.
Pela graça de Deus, eu experimentei Jesus como aquele cujo nome está acima de
todos os nomes. Foi-me permitido entender que Jesus é o Filho de Deus, nascido de uma
virgem. Ele é o Messias e o Filho do Homem; tais títulos não lhe são meramente conferidos
por deliberação humana. Reconheci, primeiro mentalmente, mas depois, de uma maneira
experimental, vital, que a Sagrada Escritura é inspirada.
Não por causa de um discurso humano, mas por causa do testemunho do Espírito
Santo ao meu coração, eu tenho o claro entendimento de que meu perverso ensino de
outrora era pecado. Ao mesmo tempo, estou contente e grata que esse pecado tenha sido
perdoado porque Jesus o carregou na cruz.
Esta é a razão de eu dizer “Não!” à teologia histórico-crítica. Considero tudo o que
ensinei e escrevi antes de confiar minha vida a Jesus como refugo. Desejo usar esta
oportunidade para dizer que lancei fora meus dois livros, Gleichnisse Jesu...10 e Studien zur
Pasionsgeschichte, juntamente com minhas contribuições a periódicos, antologias, e
Festschriften.11 Qualquer desses escritos em minha posse, eu joguei no lixo com minhas
próprias mãos, em 1978. Peço sinceramente que você faça o mesmo com qualquer deles
que você tenha em sua estante.
Dra. Eta Linnemann
Professora (aposentada)
5 de Julho de 1985
Parte 1

O Cristianismo e
a Universidade Moderna
1
As Raízes Anticristãs da Universidade

A universidade, como um fenômeno da cultura Ocidental, foi desde o princípio uma
instituição pagã. “A universidade em Atenas foi fechada por causa de seu caráter pagão (em
529 a.C.)”.12 O restabelecimento da universidade na Alta Idade Média, no final do século
12 ocorreu em junção com o renovado interesse em aspectos da cultura pagã como seu
principal objeto de estudo.
O corpus juris civilis (corpo de legislação civil) foi o objeto de estudo ao redor do
qual a primeira universitas magistrorum et scholarium (universidade de professores e
estudantes) reuniu-se em Bolonha, Itália. Esse códice de lei continha regulamentos
sancionados na era cristã, mas, como um todo, compunha-se de uma coleção de leis
derivadas dos tempos pagãos pré-cristãos.
Os escritos de Aristóteles – filósofo pagão – foi o objeto de estudo que levou a
fundação da segunda universidade, em Paris.
A razão para a extensa autonomia dessa nova forma de instituição reside num interesse
científico espontâneo, um imenso desejo de saber e entender em nome da verdade, o
qual se dispunha ao risco do conflito a fim de atingir seu alvo. Decidiu-se em Bolonha,
sem autorização ou sanção oficial, estudar o código legal do imperador romano
Justiniano, que havia sido desconsiderado por 500 anos e que não estava em vigor em
lugar algum. Em Paris, a atenção foi focalizada sobre os escritos filosóficos naturais e
metafísicos de Aristóteles, então disponíveis pela primeira vez na tradução latina, e que
estavam sob suspeição de heresia.13
Escolasticismo
O escolasticismo incumbiu-se de “colocar o novo conhecimento racional em
concordância com os artigos de fé”14 – um esforço que marcou o tom para todas as
asserções teológicas da Alta e da Baixa Idade Média. Isso, porém, provocou uma decisão
pesada e fatal! Em vez de levar em conta que todos os tesouros e conhecimentos estão
ocultos em Cristo (Cl 2.3), assumiu-se que o homem precisa da sabedoria mundana do
paganismo juntamente com a Palavra de Deus a fim de produzir real progresso intelectual.
A Palavra de Deus foi reduzida a somente um de dois pontos focais para determinar
sabedoria e conhecimento. A Bíblia passou a ser considerada como autoridade apenas nas
áreas referentes à redenção e à vida cristã. Aristóteles, em contraste, tornou-se a fonte para
todo conhecimento válido do mundo, isto é, para o âmbito das ciências naturais, análise
social, etc. A partir daí, em outras palavras, a Palavra de Deus não foi mais considerada
como confiável para essas áreas do conhecimento. Mais tarde, a filosofia aristotélica seria
substituída pelas ciência recém desenvolvidas que rapidamente denunciaram os erros
cosmológicos de Aristóteles com referência à Palavra de Deus.
Esse apelo inicial às tradições e escritos da Antigüidade pagã, já na Idade Média,
conduziu à institucionalização da tendência à autonomia como parte da essência formativa
da universidade. A Sagrada Escritura continuava tendo autoridade; ainda se faziam
tentativas de aproximar a sabedoria do paganismo com a intenção de trazer “o novo
conhecimento racional à concordância com os artigos de fé”.15 A teologia era a rainha, e a
filosofia era declarada sua serviçal. Contudo, não demorou muito para que a mentalidade
pagã, tida como serviçal na recém fundada universidade, assumisse a autoridade soberana.
A antiga rainha, certamente, manteve alguns direitos civis atraentes por mais algumas
centenas de anos.
Humanismo
Nos primórdios do pensamento moderno, foi tomada temerária decisão, levada a
cabo pelas forças da liderança intelectual, de se circundar a Palavra de Deus e buscar
direção, alternativamente, na Antigüidade pagã. O humanismo tomou a decisão de fazer do
homem a medida de todas as coisas. Essa foi uma renúncia definitiva em relação a Deus,
ainda que o humanismo freqüentemente adotasse uma postura completamente piedosa e
balbuciasse constantemente a Palavra de Deus. Aquilo que se falava a respeito de Deus não
provinha mais da Palavra revelada de Deus, mas sim do espírito humano, cada vez mais
distanciado desta Palavra.
Isso já se mostra claro na concepção de Pico della Mirandola sobre o valor da
humanidade, concepção esta que predominou sobre todo o humanismo: “Deus colocou o
homem no meio do mundo sem que lhe desse um lugar seguro, sem uma identidade
distintiva, sem uma função especial, conquanto todas essas coisas fossem asseguradas ao
restante das criaturas. O homem não foi criado terreno nem celeste; ele pode se degenerar
numa besta fera, ele pode ascender aos céus; tudo depende só e inteiramente de sua
vontade. É garantido ao homem obter o que ele deseja, ser aquilo que ele quiser ser.”16
Não nos deixemos enganar pela aparente piedade dessas palavras! O que é dito aqui
está em plena contradição com a Palavra de Deus. Não o homem, mas Jesus é o centro da
criação:
Este é a imagem do Deus invisível, o primogênito de toda a criação; pois, nele,
foram criadas todas as coisas, nos céus e sobre a terra, as visíveis e as invisíveis,
sejam tronos, sejam soberanias, quer principados, quer potestades. Tudo foi criado
por meio dele e para ele. Ele é antes de todas as coisas. Nele, tudo subsiste. Ele é a
cabeça do corpo, da igreja. Ele é o princípio, o primogênito de entre os mortos, para
em todas as coisas ter a primazia, porque aprouve a Deus que, nele, residisse toda a
plenitude e que, havendo feito a paz pelo sangue da sua cruz, por meio dele,
reconciliasse consigo mesmo todas as coisas, quer sobre a terra, quer nos céus. (Cl
1.15-20.)
A afirmação de Pico, de que “tudo depende só e inteiramente de sua vontade” e que
a humanidade pode “ascender aos céus”, não é de modo nenhum verdadeira. “Pois, não
depende de quem quer ou de quem corre, mas de usar Deus a sua misericórdia” (Rm 9.16).
A Palavra de Deus declara: “E não há salvação em nenhum outro; porque abaixo do céu
não existe nenhum outro nome, dado entre os homens, pelo qual importa que sejamos
salvos” (At 4.12); “Eu sou o caminho, e a verdade, e a vida; ninguém vem ao Pai senão por
mim” (Jo 14.6); “Ninguém pode vir a mim se o Pai, que me enviou, não o trouxer; e eu o
ressuscitarei no último dia“ (Jo 6.44).
Se o humanismo vê a Antigüidade clássica como o padrão absoluto ao qual o
cristianismo deve se conformar, como presumido por Laurentius Valla, ou se assume uma
posição crítica tanto em relação à Antigüidade, quanto no que diz respeito ao cristianismo,
como defendido por Erasmo de Roterdã – ambas as visões permanecem em contradição à
revelação de Deus. Até mesmo em sua forma mais positiva, o cristianismo sob a influência
do humanismo se degenera em “uma religião iluminada cujo propósito é transmitir os
valores da civilização humanista, atingindo seu clímax na etiqueta e moralidade, na ciência
e cultura”.17
O humanismo rejeita reconhecer Deus e tomar conhecimento de como ele se revela
em sua Palavra. No humanismo, a viva fé cristã se deteriora simplesmente em
“cristianismo” que, por sua vez, é mais uma “religião” – a qual, é claro, compara-se com
todas as outras existentes. “A religião se torna uma província dentre as outras diversas áreas
da cultura. E proporcionalmente à quantidade de áreas independentes que existirem, nessa
medida existirão os muitos padrões pelos quais a religião será mensurada.”18
A Palavra de Deus não é mais o padrão no humanismo, mas, antes, ela é julgada
pelos padrões da cultura humanista. Dessa maneira, a cultura – o produto do espírito
humano criado – substituiu a revelação de Deus, o Criador. A fé em Deus, o Criador e
Redentor, foi pervertida numa subdivisão da cultura e da vida do espírito humano. Em
conseqüência disso, o homem agora considera a Palavra de Deus apenas como um produto
da atividade desse espírito humano. À religião é aquinhoada com aquilo que
Schleiermacher denominaria mais tarde de “província piedosa na alma” e de dentro de tais
limites ela deve operar. A violação desses limites foi, a partir de então, severamente punida.
Quando a carne assume soberania absoluta, como ocorreu nesse caso, ela se opõe a cada
manifestação viva do Espírito.
Do humanismo, pode-se dizer:
Há basicamente uma coisa que obriga o homem, a veritas (verdade); e ela é sempre
uma, ainda que assuma diversas formas. “Conquanto os sistemas dos pensadores
pagãos e cristãos pareçam divergir um do outro”, afirmou Pico, “eles são
basicamente derivados da única e mesma verdade”. O próprio Iluminismo, de forma
severa, tornou relativas todas as religiões, de qualquer forma mais radical. A ética
do cristianismo foi trazida a esse processo relativista.19
O humanismo, portanto, atribui a condição de verdade a todo produto que venha do
pensamento e criatividade humanos. O único padrão que o homem ainda possuía foi dessa
maneira feito relativo. 20 Foram dadas então rédeas soltas à subjetividade relativista do
homem, a qual por si mesmo era incapaz de fornecer fundamento real para julgamentos e
métodos. Agora, sem julgamentos ou métodos, não poderia haver mais comunicação dentro
da comunidade científica. Contudo, deve-se observar que os sistemas baseados na ciência e
na cultura não têm, sob premissas humanistas, nenhuma base real, antes são fundados sobre
nada mais do que arranjos e concordâncias.
Segundo essa aproximação, tudo o é ostensivamente verdadeiro e válido se a si
mesmo se demonstra como tal com base em sua qualidade inerente. De fato, nada pode ser
considerado verdadeiro e culturalmente válido a menos que seja reconhecido pelas forças
dominantes que moldam a ciência e a cultura, por aquilo que chamamos de indústria da
cultura e da ciência.21 Os métodos da ciência e os sistemas de avaliação culturais proveram
um habitat seguro para a humanidade fora da verdade da revelação. Esse habitat, porém,
que podemos associar à Torre de Babel projetada para reunir a humanidade, não previne a
fragmentação e dispersão do pensamento e da vida humana, antes, é sua causa. A
dissidência erguida dentro do sistema é uma característica da indústria da cultura.
É inegável que sejam feitos acordos para tornar possíveis as operações em
andamento, mas como é que eles são feitos? Autoridades e líderes de tendências surgem,
não com base na qualidade de seus trabalhos, mas sim em imponderáveis que nada tem a
ver com o valor da obra.22 Dinâmicas de grupo desempenham papel decisivo aqui, e o
resultado é uma infra-estrutura de tradição nas disciplinas científicas e na indústria da
cultura. As ciências ostensivamente “independentes” são guiadas pelas suas próprias
tradições, e a liberdade somente é assegurada ao indivíduo na medida em que o trabalho
dessa pessoa puder ser integrado à estrutura tradicional da disciplina. 23
A genuína liberdade de pensamento só existe onde houver verdade, e a verdade está
presente apenas em conexão com aquele que é o caminho, a verdade e a vida (Jo 14.6). Há
verdade somente existe em Jesus. No humanismo, a verdade é substituída pelo
reconhecimento, um prestígio envolvido na conferência e aceitação de honrarias. Esse
empreendimento é, sem dúvidas, sujeito a manipulação.24
O Iluminismo
Em comparação com o aspecto intelectual anticristão do humanismo, o Iluminismo
não traz nenhuma coisa nova. Apenas assenta as condições para a execução da agenda
humanista.
Quando Francis Bacon decretou que “cada verdade (é) encontrada indutivamente”,25
ele reproduziu o estabelecimento do homem como a medida de todas as coisas
metodologicamente possíveis. Ao mesmo tempo, as Sagradas Escrituras foram excluídas
como a fonte da verdade. Consistentemente com essa perspectiva, ele separou totalmente “o
âmbito da razão do âmbito da fé e da religião”26 e definiu a fé como sacrificium intellectus,
a capitulação da tentativa de entendimento.
Hobbes, que semelhantemente fez uma separação entre fé e pensamento, relegou a
questão da fé “ao âmbito inverificável e paradoxal dos absurdos e contradições.”27 Ele
afirmou: “Não há conceito no entendimento humano que não surja, antes de tudo, total ou
parcialmente, dos órgãos dos sentidos.”28
Dessa maneira, não apenas os fundamentos da alta crítica da Bíblia foram lançados
– pois Hobbes já a havia iniciado – mas o ponto de partida do ateísmo também foi
igualmente fixado. Spinoza, Descartes, Kant – para citar só alguns deles – apenas
declararam mais precisamente o que já havia sido estabelecido nos primeiros estágios do
Iluminismo.
Idealismo germânico
As idéias surgidas no humanismo atingiram sua maturidade no idealismo
germânico. O sistema educacional se tornou ainda mais arraigado à imagem do homem
conforme o ensino da Antigüidade clássica. O maçom Wilhelm von Humboldt
desempenhou um papel estratégico nesse sentido.29
A filosofia do Iluminismo, que coroa suas conquistas em Kant, tomou forma na
literatura. Autores alemães do início do período Romântico, tais como Lessing, Schiller e
Goethe, por assim dizer, recriaram a humanidade à imagem do quadro derivado dessa
filosofia. Por meio da “inspiração poética”30, seus personagens literários tomaram formas
vívidas e convincentes. Tornaram-se protótipos do indivíduo moderno; por meio de sanção
oficial e de larga distribuição desses escritos em currículos escolares, um “linha modelar”
totalmente nova de pessoa foi produzida em massa, como novos carros, idênticos ao
protótipo projetado, produzidos na linha de montagem. Depois, aquilo que foi absorvido na
escola por meio de vívidos conceitos, foi ainda, com a assistência inestimável e efetiva do
teatro, transformado em pensamento abstrato pela universidade.
A filosofia de Hegel tomou forma no ensino de história e permeou cada sala de aula
– juntamente com os pensamentos de Lessing sobre a Educação da Raça Humana e Idéias
para uma Filosofia da História da Humanidade, de Herder. Isso facilitou a aceitação dos
descendentes de Hegel, Marx e Engels, os quais por sua vez pavimentaram o caminho para
a escola de Frankfurt. Surgiu uma historiografia científica que primeiro excluía Deus como
um agente ativo no processo histórico mediante a introdução de “um deus das filosofias”
que portava consciência de si mesmo de maneira imanente no curso da história. Esse
pseudo-deus logo se tornou supérfluo, mas serviu para eliminar a possibilidade de um Deus
real e sua atividade presente na história humana. Dessa maneira, veio a existir uma
“ciência” histórica totalmente ateísta.
Os comentários acima bastam para dar um esboço da história das idéias – esboço
que pode apenas lançar uns poucos raios de luz. Estou cônscia de que a apresentação das
conexões é provisional e que muito foi passado por cima. Isso se deve tanto ao tempo
quanto a limitações pessoais. Material suplementar está certamente à disposição na
literatura evangélica que não tive ainda a oportunidade de consultar. O leitor assim
inclinado é encorajado a completar o que tenho esboçado para enriquecimento de seu
conhecimento pessoal de informação relevante. Obviamente, eu agradeceria referências a
tais informações.31
Intencionalmente, passei por cima da questão da relação da Reforma e da ortodoxia
protestante com o humanismo. Não examinei também a conexão entre o pietismo e o
Iluminismo. Muito material têm sido escrito nessas áreas. No que se refere à universidade,
é o humanismo e o Iluminismo, e não a Reforma e o pietismo, que tem provado exercer
influência unilateral de longa duração.
Não é meu propósito realizar um debate acadêmico. Quero antes demonstrar como
esse segmento da história e suas conseqüências se mostram à luz da Palavra de Deus. Quero
também emitir um chamado ao arrependimento, de longa data já em débito. Não escrevo
para um público acadêmico, mas para todos aqueles dispostos a serem admoestados pela
Palavra de Deus.
Para o propósito de levantar as questões mais pertinentes não é absolutamente
necessário investigar mais profundamente a história das idéias no Ocidente e suas
interconexões. Deve ficar estabelecido que: A sorte foi lançada...
•

Depois que a Idade Média recorreu à filosofia pagã como meio de obtenção da
orientação intelectual;

•

Depois que o humanismo declarou que o homem é a medida de todas as coisas;

•

Depois que o Iluminismo decidiu reconhecer como verdadeiro somente aquilo a que
se tem chegado de maneira indutiva;

•

Depois que a premissa inicial de Descartes recebeu aceitação, segundo a qual a
única possibilidade de verificação seria mediante a validade conferente da dúvida;

•

Depois que Lessing, em consonância com Reimarus, proclamou o “abismo” entre
“fatos contingentes da história” e “eternas verdades da razão” e tornou popular, por
meio de Nathan, o Sábio, a idéia de que ninguém pode dizer o que é a verdadeira fé;

•

Depois que Kant escreveu sua crítica da razão pura e que seu conceito de “Religião
nos Limites da Razão” começou a obter aceitação;

•

Depois que o Fausto de Göethe implantou em cada pessoa culta a idéia de que
“nossa visão é barrada... de ver a realidade espiritual” e aquilo que – segundo a
conversa entre Fausto e Gretchen – alguém poderia pensar sobre religião;
•

Depois que Schleiermacher esboçou as conseqüências da crítica da razão, de Kant, e
tentou fundamentar a fé na experiência religiosa humana em vez de na revelação
divina;

•

Depois que Semler estabeleceu o ponto de partida na crítica da Bíblia, como
resultado da filosofia do Iluminismo, e tal ponto de partida começou a obter
aceitação na exegese bíblica; e

•

Quando uma historiografia ateísta foi estabelecida..

Os elementos acima alistados adquiriram a condição de ponto de partida intelectual
obrigatório entre os eruditos e se tornaram determinante para a universidade. A princípio
saudada como “a emancipação da imaturidade do homem, pela qual ele próprio era
culpado”32 e nascido juntamente com um otimismo contumaz, após a I Guerra Mundial,
este ponto de partida intelectual veio a ser entendido mais e mais como o destino necessário
do curso da reflexão humana. De uma maneira ou de outra, esse ponto de partida foi e
continua sendo visto como necessário e inescapável, e conseqüentemente defendido com
veemência – com a assistência da influência, recursos financeiros e poder político.
Na universidade, que desde o início foi uma instituição anticristã, logo não haveria
espaço para o pensamento baseado consistentemente na revelação de Deus na sua Palavra.33
A Era da Tecnologia
A educação técnica se encontrou certamente tão oposta ao ideal educacional da
universidade de Humboldt34 que se tornou necessária a fundação de alguns centros
educacionais alternativos. Entretanto, o ponto de partida intelectual da tecnologia estava tão
baseado no Iluminismo em cada um de seus aspectos como o conceito de educação
humanista idealista. Em ambos os casos, Deus foi metodologicamente excluído desde o
início, até mesmo por pesquisadores cuja piedade pessoal era inquestionável. Dessa
maneira, a tecnologia e a educação finalmente entraram em concordância, uma vez que o
sucesso da tecnologia não podia mais ser ignorado. O sucesso do ponto de partida
intelectual ateísta na tecnologia parecia dar sua confirmação definitiva. E essa aparente
confirmação estigmatizou toda objeção com a pecha de estultícia.
Seria possível fazer oposição ao pensamento que produz as máquinas que usamos
diariamente, que organiza o sistema de transporte, que fornece o aquecimento central e a
corrente elétrica sem os quais a vida moderna seria aparentemente impossível?
Hoje em dia é martelado em toda escola de ensino fundamental que não é possível
se opor ao pensamento moderno, que “não vivemos hoje na Idade Média, graças a Deus!” e
que até mesmo “estilos de vida alternativos” somente são possíveis à sombra do
desenvolvimento tecnológico.
Todo estudante que ingressa na universidade tem de aceitar o jugo do ponto de
partida intelectual ateísta como uma necessidade inescapável. Esse é um jugo que faz
dobrar cruelmente aquele que o carrega, e é colocado sobre o estudante à parte de sua
escolha consciente, por meio do objetivo de se completar o curso do estudo em um campo
privilegiado – campo dominado pelo ponto de partida ateísta. Mesmo o cristão que
freqüenta a universidade recai sob esse jugo. É-lhe permitido, é claro, manter a fé na vida
privada, em meio aqueles ao seu redor que vejam a fé de maneira favorável, ou com ironia,
ou que talvez compartilhem as mesmas convicções. Entretanto, ele é proibido de reter o
Deus vivo e seu Filho Jesus Cristo em seu pensamento acadêmico, ou de lhe conceder
qualquer função material nesse sentido.35 Assim, ele retém Jesus em seu sentimento, mas
nega-o diariamente em seu pensamento, pois esse pensamento segue os princípios ateístas
anticristãos.36
O caráter monopólico dos centros de educação fundados no ateísmo resulta em que
a totalidade das conquistas técnicas seja creditada à conta do pensamento “científico”
ateísta. As pessoas se comportam como fez Israel, quando seu povo pensou que recebia lã e
linho, grãos e vinho de Baal, em vez de ser grato ao Criador dessas coisas (Os 2.1-13).
Contudo, as pessoas não atinam para a realidade dos efeitos negativos que acompanham as
descobertas positivas dessa ciência. Não enfrentam as conseqüências da lei do pecado que
continua presente quando alguém toma parte nesse câmbio científico.
Em todos os lugares, hoje, esse pensamento baseado na impiedade gera fruto que
podemos constatar como amargo. Em todas as áreas da vida o homem tenta hoje ser o
capitão do seu próprio navio. Enquanto isso, o navio está fora de controle e muitas pessoas
vivem num estado de perplexidade desesperada.
A despeito de todo o progresso que a medicina tem feito, ela ainda não debelou a
doença. Na verdade, algumas doenças parecem ter sido vencidas, e outras, parecem estar
prestes a perder o terror que retinham. Porém, outras doenças irrompem e se espalham.
Vista em sua totalidade, a humanidade dificilmente pode ser considerada como mais
saudável; pode ser vista apenas como mais dependente dos médicos e da medicina.
Conquanto a mortalidade infantil venha sendo vencida, agora o aborto e a esterilização
tomam lugar na linha de montagem da moda. Dificilmente uma droga prescrita deixa de
causar muitos efeitos colaterais negativos.
O progresso tecnológico traz consigo a destruição do meio ambiente numa extensão
desconhecida na história humana. Esforços são centralizados na descoberta de meios de
destruição (armas atômicas, biológicas e químicas) com o propósito de aniquilar pessoas e
nações inteiras. Sem nosso jactancioso progresso tecnológico, isso tudo seria inimaginável.
Um grande número de novas armas químicas está armazenado em arsenais à espera de uso
eventual. Até o presente, só os poucos cujas ocupações o requerem, têm conhecimento de
alguma coisa delas.
A despeito de todo desenvolvimento nas ciências biológicas e agrícolas, a nutrição
da humanidade não está assegurada. Agora que a humanidade, mediante sua interferência,
destruiu o equilíbrio biológico, temos de atentar ao contra-ataque dos seus efeitos,
geralmente usando venenos que trazem ainda maior dano. A possibilidade de engenharia
genética, um dos resultados do progresso na pesquisa, tem suas vantagens na área da
criação de gado, mas também traz um potencial de corrupção para a humanidade. A
sociologia, a mais jovem das ciências, conquanto seja considerada como meio para tratar e
solver males sociais, foi e tem sido usada largamente para destruir os laços sociais naturais.
No lugar da projetada “maturidade” da pessoa pensante, vemos a sociedade
moderna apadrinhada pela tirania dos especialistas. Até mesmo nas áreas mais básicas,
permite-se que a vida da pessoa moderna “livre” seja ditada por especialistas, os quais, com
base na sua perícia ou especialidade (que eles, em geral, não têm demonstrado ser válida
em sua própria vida pessoal), tornam-se “autoridades”. No lugar de um Livro, cujo
conteúdo é sabedoria de Deus, e pelo qual o homem moderno não quer ser instruído, temos
os muitos livros mutuamente contraditórios que reivindicam validade para si mesmos com
base em serem “científicos”.
A educação sexual pública “baseada na ciência” padroniza e corrompe o
comportamento sexual por meio da destruição do senso natural de vergonha.
Os especialistas são chamados a falar sobre quantos filhos uma pessoa pode ter
(“Dois é o bastante!”), e reivindicam a si a “autoridade” para decidir como esses filhos
devem ser criados. Pais pobres e a sociedade colhem os frutos amargos dessa criação,
enquanto os especialistas, nesse ínterim, já há muito progrediram para novas teorias sobre
criação de filhos.
Estatísticas “cientificamente garantidas” e pesquisas de opinião pública que os
especialistas produzem com abundância determinam o estilo de vida moderna – estilo de
vida que, geralmente, só pode ser descrito em termos de comportamento viciogênico guiado
pelo princípio do prazer.
Todos esses fatores, considerados em conjunto, leva-nos a uma homogeneização
mundial sem precedentes em relação ao pensamento e ao comportamento. O
comportamento alternativo é desencorajado; há pressão para a conformação com as normas
sociais emergentes. Da projetada e jactada “maturidade” do homem, não há nenhum traço!
“Sapere aude! Tenha a coragem de confiar em seu próprio entendimento!” foi o
moto do Iluminismo. Foi isso que Kant declarou em sua publicação de 1784, What Is
Enlightenment? Sapere aude! já estava implicitamente propagado pelo humanismo. Sapere
aude! – essa foi a resolução de não mais aceitar a revelação, mas substituí-la pela
autoridade arbitrária da razão. Sapere aude! – essa foi a decisão feita pela “impiedade e
perversão dos homens que detêm a verdade pela injustiça” (Rm 1.18).
Deus respondeu a tal decisão com seu julgamento:
A ira de Deus se revela do céu contra toda impiedade e perversão dos homens que
detêm a verdade pela injustiça; porquanto o que de Deus se pode conhecer é manifesto
entre eles, porque Deus lhes manifestou. Porque os atributos invisíveis de Deus, assim o
seu eterno poder, como também a sua própria divindade, claramente se reconhecem,
desde o princípio do mundo, sendo percebidos por meio das coisas que foram criadas.
Tais homens são, por isso, indesculpáveis; porquanto, tendo conhecimento de Deus, não
o glorificaram como Deus, nem lhe deram graças; antes, se tornaram nulos em seus
próprios raciocínios, obscurecendo-se-lhes o coração insensato. Inculcando-se por
sábios, tornaram-se loucos...(Rm 1.18-22)
Aquilo que se aplica aos pagãos que só podem apreender a revelação de Deus na
criação aplica-se em maior grau àquele que foi conscientizado da revelação de Deus no seu
Filho. “Inculcando-se por sábios, tornaram-se loucos”. A história dos últimos quinhentos
anos em todas as suas facetas – a história política tanto quanto a intelectual, a história da
tecnologia tanto quanto a da teologia – dá claro testemunho da ira da qual Deus nos
libertou.
Em vista da impiedade temerária com a qual temos nos comprometido, essa história
testemunha da abundante graça e da paciência sofredora de Deus. “As misericórdias do
Senhor são a causa de não sermos consumidos.” (Lm 3.22).
O presente estado de coisas é realmente deplorável. A que terrível impiedade (mas
de respeitável aparência) nós nos permitimos ser sugados! Por mais de quinhentos anos, nós
agora nos ajoelhamos ante uma cultura e ciência que foi anticristã desde o início.
Permitimo-nos ser convencidos de que pensamento e criatividade são possíveis somente
dentro dessa infraestrutura.37 Dessa maneira, nós calcamos aos pés o dom de nosso Pai
Celestial, seu Filho amado, em quem ele nos assegurou todas as riquezas da sabedoria e do
conhecimento (veja Cl 2.3).
Década após década, século após século, o cristianismo tem aceitado esse sacrilégio
e se tornado mais e mais profundamente envolvido nele. Que bondade, que paciência e que
misericórdia Deus tem nos demonstrado! Ao mesmo tempo em que a luz do evangelho
começou a brilhar uma vez mais, a civilização que vislumbrou seus raios se tornou para a
iniqüidade – e Deus se pôs ao lado dela e a susteve com grande amor através dos séculos
passados! Quão grande é a obra completa do Gólgota, cujas correntes de bênçãos fluem até
mesmo sobre os séculos mais recentes!
Não obstante: “Hoje, se ouvirdes a sua voz, não endureçais o coração” (Sl 95.7-8).
Retornemos finalmente Àquele que nos criou. À parte da obra salvadora de Deus
consumada quando ele deu seu Filho pelos nossos pecados na cruz do Gólgota, ele nos teria
consignado à eterna separação e à agonia do mar de fogo por causa de nossa participação
no sacrilégio de tal iniqüidade. E isso é o que ele fará, se não buscarmos refúgio em Jesus
como nosso Salvador.
2
Questões Pertinentes com Respeito à Universidade
O longo tempo transcorrido durante o qual a cultura e a ciência ateísta e anti-cristã
se espalharam e obtiveram influência mundial no “Ocidente cristão” nos tornou indiferentes
a essa monstruosidade. É difícil, para nós, ter uma perspectiva crítica sobre algo
estabelecido há séculos e que parece auto-evidente. É difícil reconhecer que a história das
idéias no Ocidente, abarcando mais de quinhentos anos, seja um terrível e pecaminoso erro.
Nós a vemos, juntamente com seu impacto internacional, como um estado de coisas
estabelecido – um dogma intelectual moderno a ser mantido, que identificamos como fato
inerente com poder normativo para o nosso pensamento. Aquilo que de fato existe é
confundido e identificado com aquilo que deveria existir. O fatual assume mais peso do que
o normativo e, de fato, torna-se normativo.
Além disso, somos tão marcados por essas forças culturais e educacionais que
somente podemos nos libertar delas pela graça de nosso Pai celeste, pelo sangue do nosso
Salvador, Jesus Cristo, e pela lavagem de água da Palavra de Deus. Consideramos que a
obtenção de uma educação moderna seja uma conquista, pois ela nos habilitou a alcançar o
ponto em que estamos. Aceitamos a sabedoria convencional que pensamento e criatividade
são possíveis apenas dentro dessa infraestrutura.
Mesmo que alguém esteja disposto a nos ouvir, levantam-se questões sobre as
asserções do capítulo anterior. Essas questões não são facilmente dissipadas.
Esse Esboço Histórico É Acurado?
Esse delineamento resumido da história das idéias não seria apenas uma descrição
simplista que deixa de fazer justiça à realidade?
Realmente, nem o humanismo, nem o Iluminismo em seus primórdios,
conscientemente implementaram uma quebra com a fé cristã. Houve no máximo a
percepção de uma cônscia posição contra o ensino da igreja. Até mesmo o idealismo, de
modo algum, pode ser considerado um repúdio total ao cristianismo. Assim, podemos falar
de pessoas que foram não-cristãs sem que tivessem sido conscientemente anticristãs. 38
Pode-se achar nomenclatura cristã em filosofias desde Pico della Mirandola, Bacon,
Hobbes e Descartes, até Kant, Goethe, e Hegel. A tendência geral da sociedade era ainda
cristã. Não era permitido ao ateísmo cru, que este levantasse a sua cabeça hedionda. Até
mesmo Lessing se curvou à pressão social, ainda que seus escritos insinuassem que ele teria
preferido agir de maneira diferente. Semler declarou expressamente que suas idéias não se
destinavam ao povo, mas apenas à inteligentsia, à época, um grupo bem pequeno.
Estamos lidando aqui com um processo gradual de infiltração. A natureza anticristã
dessa visão é revelada primariamente em sua contradição à Palavra de Deus. É anticristã e
ateísta, no sentido de que negligencia Deus, o Pai de nosso Senhor Jesus Cristo, até mesmo
quando piedosamente balbucia a palavra Deus. Seu deus não é Aquele que se revelou na
Palavra, mas, antes, o deus dos filósofos, a quem é atribuído aquilo que o espírito humano
imagina. Em meados do século 19, esse pensamento era em geral bastante piedoso, ainda
que essa piedade aparecesse com cada vez menor freqüência. A natureza humana rebelde
que Paulo chama “carne” (gr., sarx; veja Rm 8.5-8) ascendeu ao poder, apresentando-se
primeiramente como “carne” piedosa.
Segundo, essa visão da natureza anticristã se torna evidente na medida em que o
estudo da Bíblia e da natureza metodologicamente descarta Deus. A Palavra de Deus como
a fonte de todo o conhecimento é posta de lado.
O pensamento no Ocidente foi des-cristianizado mais ou menos como uma lagarta
da borboleta que é devorada de dentro para fora depois que a vespa ichneumonídea deposita
nela os seus ovos; os ovos eclodem em larvas que se nutrem do seu hospedeiro. A forma
externa da lagarta permanece intacta por algum tempo até que seja finalmente destruída.
Poder-se-ia comparar o processo com a maneira como uma casa de madeira é
consumida pelos cupins. As vigas que sustentam a casa são destruídas de maneira
acobertada até que, plenamente enfraquecida, a casa colapsa.
Semelhantemente, estamos vendo no pensamento moderno os resultados daquilo
que aconteceu de forma encoberta por longo tempo. É criada a falsa impressão de que a fé
cristã chegou ao fim. O que realmente acontece é que uma corrente de ideologia, que foi
anticristã desde o início, finalmente tomou seu curso. Essa ideologia, a princípio, mesclavase com a fé cristã; mas no curso de seu refinamento ela rejeitou a fé cristã como
essencialmente incompatível.
A ilusão de que a fé cristã é obsoleta surge somente porque muitos cristãos
identificam sua fé com essa ideologia se apresenta no final do processo. Não reconhecem
que o caráter anticristão já estava ali desde o início. A fé cristã, enquanto isso, permaneceu
protegida pela graça de Deus – houve sempre os “sete mil” que não dobraram os joelhos
diante de Baal (Rm 11.4-5). Sempre houve, todavia, pessoas as quais Paulo descreve como
“não... muitos sábios segundo a carne, nem muitos poderosos, nem muitos de nobre
nascimento” (1 Co 1.26). Além disso, a fé cristã foi impedida de se desenvolver nos centros
acadêmicos de ensino nos quais a noção de ciência concebida de forma ateísta manteve
influência monopólica. O acesso a esse mundo foi restrito no sentido de que poucos entram
nele sem negar a fé.
A situação contemporânea ficou mais confusa devido à mistura sincretista do
cristianismo como noções alheias a ele. Contudo, pela graça de Deus, nós podemos agora
ver tudo isso de modo claro. Que usemos essa hora de graça para renunciar ao sincretismo
pecaminoso e em nome de Jesus estabelecer um novo princípio. “Lavrai para vós outros
campo novo e não semeeis entre espinhos” (Jr 4.3).
Não Devemos Permanecer no Mundo?
O resultado do capítulo 1 não é irrelevante, uma vez que a universidade obviamente
também é “o mundo”? Afinal de contas, Jesus não requer que sejamos tirados do mundo,
mas que sejamos preservados nele (Jo 17.15).
Inicialmente esse argumento parece razoável, mais ainda assim deve-se fazer uma
distinção crucial. Se faço compras de alimentos no mundo, o que compro e como é
simplesmente consumido e digerido; isso não entra em contato com meu pensamento. Se
compro sapatos de um ateu ou pagão, os sapatos apenas tocam meus pés, não meu ser
interior. Se trabalho na linha de montagem de uma fábrica, talvez tenha de ouvir conversas
vulgares ou blasfemas ao meu redor, mas não sou compelido a absorver tais profanidades
em minha mente. Se me assento a uma escrivaninha em um escritório de administração,
tenho de dar atenção a leis e regulamentos, mas tais restrições não alteram minha
personalidade. A universidade, em contraste, é onde o pensamento é alterado e alinhado
com o mundo.
Desde que a sociedade iluminista rejeitou a realidade da Queda (Gn 3), juntamente
com a resultante depravação humana e a necessidade de redenção, a humanidade tem
tentado retratar o pensamento como se fosse uma capacidade neutra, objetiva e efetiva.
Tudo aquilo que parece se conformar com as leis da lógica é automaticamente correto e
confiável, contanto que se restrinja de maneira monística àquilo que é visível e imanente.
Essa convicção de neutralidade, objetividade e a universalidade do pensamento científico é
defendido na universidade, onde se assume que o verdadeiro “pensamento” tem de ser
“cientificamente baseado”, assim, limitada às auto-restrições desse monismo. Noutras
palavras, as ciências que podem ser estudadas numa universidade, cada qual em seu
respectivo domínio, reivindicam exclusiva validade para o pensamento humano.
Mediante essa estridente advocacia da validade exclusiva, os estudantes que querem
aprender a pensar são tragados pelo processo mundial de secularização. São, como já foi
sugerido, alinhados com o mundo. Entretanto, a Palavra de Deus nos admoesta: “E não vos
conformeis com este século, mas transformai-vos pela renovação da vossa mente, para que
experimenteis qual seja a boa, agradável e perfeita vontade de Deus” (Rm 12.2). Aquilo
que absorvemos por meio do nosso pensamento forma o tipo de pessoa que nos tornamos.
O dito: “Diga-me com quem andas e eu te direi quem és” reconhece essa suposição. É
possível que eu despenda oito ou nove horas por dia em modos de pensamento baseados em
premissas ateístas anticristãs sem ser profundamente influenciado?
O pensamento científico certamente tem a aparência de neutralidade. Tal
pensamento metodologicamente exclui Deus e assim assegura que ele nada tenha a ver com
a construção de máquinas, desenvolvimento de produtos químicos que protegem as plantas
de doenças, interpretação de poemas e determinação de datas históricas. No entanto, é
precisamente essa reivindicação de neutralidade, essa metodológica exclusão de Deus, que
se coloca em contradição com a Sua Palavra. Tal aproximação é ateísta e anticristã.
Se adoto esse tipo de aproximação, reduzo Deus a um fenômeno periférico, seja
essa minha intenção ou não. Sem que perceba, desprezo grandes porções da sua Palavra a
cada dia, e brevemente fico apenas com um deus bem pequeno, relevante apenas para
minha vida privada, um deus que não pode me apoiar quando me pressionarem os sérios
problemas da vida. Essa minimalização, porém, não ocorre por causa de uma limitação de
Deus; antes, ocorre por causa da maneira como eu confino o espaço do reino de Deus.
Colhemos aquilo que semeamos (Gl 6.7), e essa verdade se aplica também à nossa vida
intelectual.
A pesquisa cristã, em contraste, se esforça para depender de Deus na seleção do
objeto de estudo, nos meios adotados para o estudo, e nos motivos para o estudo. Tenta
confiar em Deus a cada passo. Tal pesquisa não pode “ser autônoma e desimpedidamente
subjetiva; antes, tem de ter seu ponto de referência e confirmação direta ou indiretamente
colocado na Escritura”.39 O mundo pode não concordar com essa confiança, mas pode
partilhar dos frutos desse labor.

O que dizer sobre os Cristãos nas Universidades?
Alguém poderia levantar outra objeção ao capítulo anterior: Nem todos que
ensinaram ou ensinam e/ou estudam nas instituições descritas são ímpios separados de
Deus. Entre eles sempre houve e há muitos que são “sábios e nobres”. De fato, muitos
foram e são filhos de Deus que fazem brilhar seu testemunho por Jesus. Tudo o que você
tem dito sobre a universidade não consiste em colocar sob julgamento pessoas que têm
trabalhado segundo seu melhor conhecimento, com consciência limpa e com a maior
dedicação? Não é arrogância atacá-los dessa forma?
Respondo que não é minha intenção atacar qualquer pessoa. A Palavra de Deus nos
admoesta: “Portanto, nada julgueis antes do tempo, até que venha o Senhor, o qual não
somente trará à plena luz as coisas ocultas das trevas, mas também manifestará os desígnios
dos corações; e, então, cada um receberá o seu louvor da parte de Deus” (1 Co 4.5).
Não estou tentando pressionar os filhos de Deus nem acusá-los de permanecer nos
seus cargos. Enquanto a universidade mantiver seu monopólio, parece que os filhos de
Deus terão de encontrar seu lugar nela debaixo da liderança de Deus. Cada um é chamado a
um sério auto-exame diante do Senhor, pois “Quem és tu que julgas o servo alheio? Para o
seu próprio senhor está em pé ou cai” (Rm 14.4 a). Minha crítica se aplica à instituição da
universidade e à institucionalização da indústria da cultura e da ciência. A crítica não é
dirigida a indivíduos, mas contra um sistema. Devemos esclarecer nossa relação com esse
sistema; precisamos examinar a nós mesmos. Queremos continuar a nos identificar com ele,
expondo-nos às suas influências tal como o fizemos no passado? A Palavra de Deus é clara
a esse respeito: “Não vos ponhais em jugo desigual com os incrédulos; porquanto que
sociedade pode haver entre a justiça e a iniqüidade? Ou que comunhão, da luz com as
trevas? Que harmonia, entre Cristo e o Maligno? Ou que união, do crente com o
incrédulo?” (2 Co 6.14-15).
Ou para citar um escritor recente:
As falsas estruturas conceituais humanas, “sua filosofia e vãs sutilezas, conforme a
tradição dos homens” (Cl 2.8) e “toda altivez que se levante contra o conhecimento de
Deus” (2 Co 10.5) são como a poluição perigosa dos reservatórios de água que servem
nossas casas. Elas iludem e destroem indiscriminadamente, especialmente em nossa
cultura, a qual trocou seu antigo fundamento pelos do humanismo e do materialismo. A
mídia e o mundo da academia têm se unido, de uma ou de outra forma, ao pensamento
humanista, de forma que seria correto afixar o termo “humanista” ao título de cada
disciplina científica. Deveriam, os membros dessas disciplinas, que sabem de suas
obrigações para com a Bíblia, apenas se assentar passivamente e abandonar o campo
sem oferecer resistência? 40
Muito do Trabalho Científico Não Tem Sido Útil?
Um quarto agrupamento de respostas ao capítulo anterior segue esta linha:
Certamente, nem tudo que tem resultado do trabalho científico em anos recentes é ruim.
Você não admite que muita coisa deveria ser considerada útil?
Concordo plenamente. Falamos antes sobre as duas faces ou lados da ciência. Deus,
em sua fidelidade, paciência e misericórdia continua a assegurar suas bênçãos; pela sua
graça, ele concedeu muita coisa benéfica e de utilidade durante todos esses séculos de erro
pecaminoso. Entretanto, devido a tal erro pecaminoso, coisas boas têm sido corrompidas e
transformadas em coisas danosas e destrutivas. Talvez fosse interessante traçar o curso do
pecado, graça e julgamento nas particulares disciplinas, mas não é essa a minha tarefa.
Farei alguns comentários exploratórios sobre esse assunto no excurso 2.
O que deveríamos fazer agora? Podemos, no final das contas, fazer alguma coisa, ou
temos de simplesmente lamentar os séculos de erro e nos purificarmos espiritualmente?
Podemos fazer surgir, como por encanto, novos centros de ensino? Que forma eles
deveriam ter? Essas são as questões que ocuparão nossa atenção no capítulo 4.
“É realmente concebível que Deus, nosso Senhor, que reina Todo-poderoso, tenha
feito vistas grossas e permitido que séculos de erros se desenvolvessem dessa maneira?
Podemos acolher seriamente a noção de que ele escolheu não intervir enquanto gerações
após gerações serviram como enganados enganadores? Não deveríamos considerar aquilo
que passou e que está aí como aquilo que deveria ser?” A Palavra de Deus nos dá a resposta
a tais questões, as quais exploraremos no capítulo 3.
3
O Antigo Israel e o Ocidente Moderno
A Palavra de Deus, escrita para nossa instrução, não nos deixa tentando adivinhar
uma solução concernente à questão levantada no final do capítulo 2. Ela nos dá
conhecimento e iluminação quanto à maneira que as coisas realmente são.
Um Paralelo com a História de Israel
Os monstruosos desenvolvimentos que temos traçado do curso da História das
Idéias no, assim chamado, Ocidente cristão têm um terrível paralelo na história do povo de
Israel, no arranjo dos bezerros de ouro em Betel e Dã. Israel dividiu-se em dois reinos, Judá
e Benjamim ao sul, e ao norte, as outras dez tribos. Essa divisão havia sido a reação de
Deus ao pecado de Salomão. O rei Salomão havia provocado a Deus permitindo que
templos fossem erguidos aos falsos deuses de suas mulheres estrangeiras. Essa iniqüidade
acrescia-se erro já cometido, a saber, selar casamentos com propósitos políticos, em
rebeldia contra as prescrições de Deus. Deus mesmo havia predito seu julgamento para
Salomão; ocorreria logo após a sua morte. Enquanto Salomão ainda estava vivo, o profeta
Aias informou Jeroboão ele se tornaria rei sobre as dez tribos.
Jeroboão se tornou rei das tribos do norte pela graça de Deus e conforme a vontade
de Deus – e o mesmo Jeroboão caiu da graça de Deus e carregou consigo o povo que lhe
havia sido confiado:
Disse Jeroboão consigo: Agora, tornará o reino para a casa de Davi. Se este povo
subir para fazer sacrifícios na Casa do Senhor, em Jerusalém, o coração dele se
tornará a seu senhor, a Roboão, rei de Judá; e me matarão e tornarão a ele, ao rei de
Judá. Pelo que o rei, tendo tomado conselhos, fez dois bezerros de ouro; e disse ao
povo: Basta de subirdes a Jerusalém; vês aqui teus deuses, ó Israel, que te fizeram
subir da terra do Egito! Pôs um em Betel e o outro, em Dã. E isso se tornou em
pecado, pois que o povo ia até Dã, cada um para adorar o bezerro. Jeroboão fez
também santuários nos altos e, dentre o povo, constituiu sacerdotes que não eram
dos filhos de Levi. No décimo quinto dia do oitavo mês, escolhido a seu bel-prazer,
subiu ele ao altar que fizera em Betel e ordenou uma festa para os filhos de Israel;
subiu para queimar incenso. (1 Reis 12.26-31, 33)
Embora um profeta de Judá lhe falasse junto ao altar em Betel e tornasse conhecidos
os julgamentos por meio de diversos sinais, “Jeroboão ainda não deixou o seu mau
caminho; antes, de entre o povo tornou a constituir sacerdotes para lugares altos; a quem
queria, consagrava para sacerdote dos lugares altos” (1 Re 13.33).
Com a instalação dos “bezerros de ouro” em Israel por razões políticas, o pecado da
apostasia foi institucionalizado. A inspiração para isso veio de fora de Israel, de lugares em
que o boi era considerado como símbolo de poder. Tal pecado já tinha tradição: Aarão tinha
forjado anteriormente a imagem de um bezerro. O pecado estabelece precedentes e
(des)encaminha para a imitação. O julgamento do pecado de Aarão e dos filhos de Israel
aos pés do Sinai teve lugar há não muitos séculos antes. Não tivesse Moisés intervindo,
todo o povo teria sido aniquilado. Ainda assim, Moisés acionou uma punição por causa do
pecado, na qual 3.000 homens perderam suas vidas.
Esse pecado tinha sido expressamente declarado como pecado. Era de conhecimento
comum ao tempo de Jeroboão – mas quão rapidamente isso foi esquecido! Poucos séculos
antes de Jeroboão, os levitas ficaram ao lado de Moisés quando Aarão procurou instituir
ídolos para adoração. Ao tempo de Jeroboão, o profeta que o confrontou junto ao altar em
Betel, onde a idolatria tinha sido institucionalizada, não achou nenhuma pessoa que ficasse
abertamente ao seu lado. Estaria, o povo de Israel, a esta altura, já corrompido por permitir
que o pecado de Salomão ficasse sem confrontação? Teria o povo permitido que o brilho
que Salomão trouxera a Israel os cegasse? Estaria o povo contente com o simples gozo da
prosperidade que o reinado de Salomão lhes ocasionara? “Eram, pois, os de Judá e Israel
muitos, numerosos como a areia que está ao pé do mar; comiam, bebiam e se alegravam.
Dominava Salomão sobre todos os reinos desde o Eufrates até à terra dos filisteus e até à
fronteira do Egito; os quais pagavam tributo e serviram a Salomão todos os dias da sua
vida” (1 Re 4.20-21).
Jeroboão fez uso de uma mentira: “Vês aqui teus deuses, ó Israel, que te fizeram
subir da terra do Egito!” Ele postou deuses estranhos em Israel. Enganou o povo. O povo
simples dificilmente detectaria o engano; esse povo tomou as palavras mentirosas do rei
pelo seu valor nominal. Deixaram de ver através do engano. Muitos israelitas bravos e
sinceros de coração sacrificaram em Betel ou Dã sem perceberem que as ofertas sacrificais
nesses lugares eram uma abominação ao Senhor!
Aqueles que estavam em posição de melhor conhecimento – e deveria haver alguns
deles em Israel – preferiram manter seu conforto. Nenhum abriu a boca e se colocou em
defesa da honra do Senhor. Todos consentiram – por causa do medo? Por causa da
preguiça? Por causa da apatia? Não havia uma pessoa que buscasse a Deus, nem um sequer
(veja Rm 3.11-18)? Quão horrendo é o caráter humano, até mesmo do velho profeta (1 Re
13! Ao custo da vida do jovem profeta, por cuja morte foi grandemente responsável, ele
confirmou que a profecia era genuína. Porém, o chamado ao arrependimento não
prosperou. Aquilo que ele sabia permaneceu como uma peça inútil de conhecimento oculto
para ele e seus filhos. Não resultou num chamado ao arrependimento que poderia ter
incendido a disposição para uma reviravolta radical.
Jeroboão assumiu o papel de governante confiável. Ele fingiu estar preocupado com
o povo quando, de fato, sua única preocupação era apenas com sua soberania (“Basta de
subirdes a Jerusalém”). Ele usou em seu favor a tendência carnal para a preguiça. Em todos
os sentidos, ele estava disposto a apoiar as inclinações da carne; nos santuários sagrados,
cada tendência pecaminosa religiosamente dourada foi permitida, e todos os que tinham o
desejo de se apresentar nesse papel, foram feitos sacerdotes. A carne pecadora e “piedosa”
foi estimulada a se desenvolver sem obstáculos.
Desenvolvimentos no Ocidente desde a Idade Média
Os padrões bíblicos falam por si mesmo, mas eu gostaria de chamar a atenção para
diversas observações que caracterizam os desenvolvimentos desde a Idade Média (veja o
capítulo 1) e que fazem paralelo com os relatos do Antigo Testamento há pouco
considerados:
Primeiro, houve poucos – talvez a princípio apenas um – que conscientemente tomaram a
decisão de não considerar mais a Palavra de Deus como normativa. Sua condição
social conferiu peso à decisão; isso implica que as pessoas já estavam até certo
ponto secularizadas e, por isso, consideram essas pessoas em vez de Deus. Uma
pessoa, ou a ínfima maioria, se torna a instigadora da tendência.
Segundo, a tendência sempre presente para a carne e para o pecado foi fortalecida e recebeu
legitimidade por causa da liderança seguida. Essa tendência foi estimulada a
desenvolver-se sem quaisquer obstáculos. O padrão tornou-se a vida segundo as
tendência carnais em vez da vida dirigida pelo Espírito. A carne, em sua hostilidade
a Deus, foi estabelecida e institucionalizada.
Terceiro, uma vez que a vida carnal foi declarada como “normal”, uma sedutora
contracorrente foi acionada. Assegurou-se a cada indivíduo fazer de si mesmo o que
quer que queira. Aquilo que, a princípio, tornava-se possível por permissão oficial e
assistência, logo se transformou num direito esperado, como quando no tempo de
Jeroboão pessoas desqualificadas eram ordenadas sacerdotes. Cada um poderia
fazer o que quisesse na medida de suas habilidades e meios disponíveis. A questão
sobre aquilo que Deus tinha em mente não era mais relevante. O homem decidia
seus objetivos de vida de maneira autônoma, sem consultar a Deus. Qualquer um
que não se conformasse com tal padrão sofreria grande pressão.
Quarto, a tendência foi orientada pelo interesse daqueles que estavam no poder.
Primeiramente, eram os príncipes que anelavam o prestígio trazido por uma
universidade em seus territórios e que esperavam se beneficiar dessa aquisição.
Hoje, o prestigio nacional continua a desempenhar um papel, embora interesses
econômicos exerçam papel mais influente; tais interesses têm poder para determinar
o conteúdo do currículo. Isso pode ser percebido se levarmos em conta o tipo de
instrução matemática introduzido já nas escolas de ensino fundamental. No mesmo
sentido, tudo é calculado para inculcar a cosmovisão humanista e a “tolerância” que
permeia a cada um seu próprio desejo e deixa que cada um seja abençoado como lhe
agrada.
“Was nicht verboten ist, ist erlaubt
Fragt hier keiner, was einer glaubt.”41
Essa é a tolerância militante contra qualquer pessoa que não se permita ser
pressionada para encaixar no molde desejável para o cidadão do futuro império
mundial unificado.
Quinto, a tendência busca um monopólio institucional e se torna fator condicionante.
Aquilo que esse monopólio considera como “factual” vem a ter força normativa.42
De maneira circular, o mesmo monopólio fornece álibi à tendência ímpia por meio
da participação de muitos que a promovem e, assim, criam uma aura de instituição
legitimada. Fazem isso com a melhor das intenções e porque aparentemente não têm
outra opção.
Sexto, aquele que se compromete com essa instituição não mais vê essas coisas do ponto de
vista de Deus. Sua percepção de Deus assume uma qualidade acentuadamente
refratária.
Sétimo, A visão de Deus acerca dessa instituição é que ela participa do pecado.
4
A Educação Cristã no Nível Universitário
Uma educação acadêmica que seja cristã em projeto – não apenas de nome, mas em
autêntica obediência ao nosso Senhor e Salvador Jesus Cristo – somente poderá ser
estabelecida em consciente dissociação da moderna universidade européia e sua história,
incluindo as emanações histórias como as que tomaram forma na América, África e Ásia.
Isso significa também dissociação da prática de instituições em que o ponto de partida
intelectual anticristão seja confrontado somente com uma apresentação basicamente
evangélica.
Não será suficiente que professores e estudantes sejam cristãos e que comecem suas
atividades com oração. O conteúdo das atividades tem de ser fundamentalmente
transformado desde o alicerce. Áreas inteiras de indagação terão de ser fundadas na Palavra
de Deus. “A Bíblia provê a infraestrutura para a indagação intelectual. Sem essa
infraestrutura toda ciência será um empreendimento estulto.”43
O empreendimento de colocar à disposição centros de educação de nível
universitário que sejam leiais à Bíblia certamente sofrerá objeções críticas. Até mesmo
observadores simpatizantes expressão mal-entendidos tais como: “Será um objetivo
realmente manejável?” ou “Com o que se pareceria tal coisa, se é que seja realmente
necessária?” Consideremos então essas e outras objeções e questionamentos.
Objeções a uma Educação Cristã
A primeira objeção certamente fará referência à inevitabilidade do resultado dos
desenvolvimentos históricos. Seremos acusados de fazer tentativas inúteis para retornar à
Idade Média. Um retorno à Idade Média, entretanto, não seria bastante para nós, pois a
teologia desse período, como já foi visto, coloca a filosofia pagã de Aristóteles como uma
segunda fonte de influência do neoplatonismo cuja presença então já se fazia sentir.
Ser-nos-á declarado a impossibilidade de fazer voltar atrás as rodas da história e que
teremos de tratar com as condições que encontramos hoje. Duas coisas podem ser ditas
quanto a isso.
Primeiro esse tipo de conversa é baseado em puro engano uma vez que personifica e
atribui poder à história. Esse pode que é inerente a Deus – porque ele governa e dirige os
destinos dos povos – retirado dele e dado à história, a qual assume o governo como se fosse
um sujeito impessoal. A freqüentemente invocada roda da história parece ser uma
modificação da roda de renascimentos, a qual é um conceito familiar nas religiões budista e
hindu.
Segundo não é de modo nenhum nossa intenção a de voltar atrás ou colocarmo-nos
contra o desenvolvimento histórico. Antes, queremos nos tornar para o Deus vivo, nosso
Criador e Pai de nosso Senhor e Salvador Jesus Cristo. Queremos adentrar em sua luz em
toda esfera do pensamento, incluindo educação, cultura e ciência, para que ele nos perdoe e
mos instrua. Ele foi quem fez a promessa segura de que concederia sabedoria àquele que
lhe pedisse (Tg 1.5). Certamente, ele não nos negará a graça para um novo começo.
Outra objeção é a de que, dado os altos custos, não haveria como pagar a fundação
de centros de educação de nível universitário leais à Bíblia – centros que ofereceriam
educação em todo o espectro das disciplinas acadêmicas e que realizariam as pesquisas
essencial para levar a cabo a empreitada. O projeto é desprezado como não-realista devido
à presunção de que é impossível levantar os fundos para a construção e equipamento desses
centros. Seria impossível de se levantar os fundos imensos necessários para a pesquisa. A
isso se pode dizer o seguinte:
Uma universidade cristã digna do nome colocar-se-ia sob a direção de Deus com
respeito à questão daquilo que deveria investigar. Isso aliaria um pouco o custo de muitas
áreas dispendiosas que foram iniciadas em oposição à vontade de Deus e que contribuem
somente para a glorificação do homem. A dinâmica subjacente a este ponto na universidade
é a competição. Isso tem dado origem a um grande número de estabelecimentos e
instituições similares. Faculdades leais à Bíblia não teriam necessidade de duplicação de
serviços. A investigação cristã da criação tem seu ponto de partida na Palavra de Deus. Isso
evita muita apalpadela no escuro que resulta numa série de dispendiosos experimentos. A
erudição cristã – no sentido de realmente buscar a honra de Deus – é dirigida pelo Espírito
de Deus. Ele pode conduzir diretamente a meios eficientes e econômicos de investigação.
Para ser mais sucinto, a objeção assume como certas as condições hoje correntes na
universidade e não leva em conta os fatores especiais que poderiam afetar uma faculdade
leal à Bíblia.
Além disso, deve-se considerar que todos os recursos vêm das mãos do Criador. Ele
certamente não negará sua bênção a um empreendimento que começa com o retorno das
pessoas a ele com a determinação de que não mais serão cúmplices de seus pecados
passados. Tudo é realmente uma questão de bênção de Deus. Basta considerar as
instituições cristãs que vieram à existência anteriormente (escolas primárias e secundárias,
centros de estudo e faculdades cristãs) para ver quão maravilhosamente nosso Pai dos céus
as manteve e cuidou dos seus caminhos. Na verdade, não lhe faltam meios.
Um outra objeção que certamente deverá ser levantada: Há total carência de pessoal
requerido para o estabelecimento de faculdades, que mantenha o nível universitário e a
lealdade à Bíblia, e que cubra satisfatoriamente todas as disciplinas. Pelo contrário, percebo
com surpresa e gratidão a Deus que nosso Pai dos céus já tem preparado pessoas nas
diversas disciplinas. Ele tem habilitado muitas pessoas para esse empreendimento, as quais
também já tem se pronunciado sobre esse conjunto de questões que ora levanto. Realmente,
Deus tem preservado, em todas as disciplinas, um ou mais dos “sete mil... que não se
dobraram a Baal” (1 Re 19.18).
Mesmo que a princípio não seja possível reunir o número de professores necessários
para uma única faculdade leal à Bíblia, pelo menos teria sido iniciado o processo de
multiplicação de pensadores com mente semelhante. Professores com credenciais
acadêmicas adequadas poderiam ser habilitados para subseqüentes faculdades leais à
Bíblia. Além disso, parte da informação poderia ser passada usando as possibilidades da
multimídia.44
O centro de educação leal à Bíblia não tem de saltar de pronto à existência. É
possível se iniciar o programa educacional previsto através de medidas preliminares tais
como um ano de estudo introdutório antes da ir para a faculdade em outro lugar. Isso
poderá motivar os professores e dar-lhe uma oportunidade para avaliar suas áreas de
especialidade à luz da Palavra de Deus.
Estruturando a Educação Cristã
Prestando serviço ao Corpo de Cristo
Um centro de educação leal à Bíblia deveria ser entendido como uma prestação de
serviço ao e no corpo de Cristo. O trabalho e a vida tanto dos que estudam quanto dos que
ensinam deveriam ser determinados pelo princípio fundamental do discipulado. Isso
envolve:
•

Atenção dedicada à Palavra de Deus (lealdade e meditação diária em relação à
Palavra de Deus);

•

Prática da Palavra (imitação de Cristo, andança na luz e santificação);
•

Testemunho de Cristo;

•

Disposição para o arrependimento;

•

Disposição para servir;

•

Participação na vida cristã corporativa (responsabilidade mútua na comunhão, dar e
receber comunhão, encorajamento e admoestação fraternais, juntamente com a
intercessão e o interesse mútuo);

•

Disposição para trabalhar sob direção de outros;

•

Orientação da vida sob direção de Deus;

•

Aguardo na presença do Senhor.

Deve-se presumir que os professores exibirão tais qualidades segundo graus pessoais de
maturidade espiritual. Quanto aos estudantes, o centro de educação leal à Bíblia participa
da comissão dada por Jesus: “Ide, portanto, fazei discípulos de todas as nações ...
ensinando-os a guardar todas as coisas que vos tenho ordenado” (Mt 28.19-20).
Ser um discípulo de Cristo num ambiente acadêmico não pode ser aprendido
meramente antes da experiência educacional, mas tem de ser parte da educação. Por isso,
tal instrução não pode simplesmente servir aos interesses da competência profissional. Tem
de manter diante de si o objetivo de ajudar os estudantes a crescer na emulação de Cristo.
Da mesma maneira, terá de manter a comunhão cristã, da qual a responsabilidade
corporativa cotidiana é uma necessidade incondicional, por dois ou três anos, pelo menos.
Um ano apenas é um período muito curto para produzir o impacto necessário.
Colocando a Palavra de Deus no Centro
Uma vez reconhecido que a Palavra de Deus é o fundamento de toda a educação, os
estudantes, sem considerar diferentes especialidade, deveriam receber um bom
embasamento na Palavra. Isso inclui tanto a informação sobre a Bíblia quanto o
entendimento sistemático daquilo que a Bíblia ensina. A apresentação sistemática do que a
Bíblia ensina deveria cobrir áreas tais como o plano de Deus para a salvação, uma
apreensão plena dos conceitos bíblicos básicos, e fundamentos de uma hermenêutica
realmente bíblica.
Junto com a informação sobre a Bíblia e com o entendimento sistemático daquilo
que a Bíblia ensina, os estudantes deveriam ser ensinados sobre as bases bíblicas para todas
as áreas de estudo. Isso seria requerido de todos os estudantes, com especialização
adequada a cada disciplina em particular.
Nem Teologia nem Filosofia Fundacional•
Recomendo que se evite a inclusão da teologia como assunto básico. O próprio
conceito de teologia, em minha opinião, traz exagerada conotação de sistemas
humanamente concebidos. Isso poderia facilmente orientar os estudantes na direção errada.
Eles não deveriam ser instruídos em construtos teológicos; deveriam, antes, tornarem-se
arraigados de maneira mais profunda e larga na própria Palavra de Deus, a qual provê a
infraestrutura cognitiva para o trabalho em particulares disciplinas.
A filosofia, semelhantemente, parece-me problemática como objeto basilar, até
mesmo quando existe a tentativa de atribui-se novo conteúdo transformando-a em uma
teoria cristã da ciência. Em longo prazo a tendência básica dessa disciplina em sua
concepção original acabará mostrando suas cores verdadeiras.
Haveria um espaço legítimo para a filosofia num centro de educação leal à Bíblia?
A filosofia tal como tem sido ensinada na universidade tem diversos aspectos. A ênfase
Nota do trad. para o português: O termo fundacional é um neologismo necessário para diferenciar do termo
“fundamental”. Para um estudo sobre o assunto, ver Davi Charles Gomes, “A Suposta Morte da
Epistemologia e o Colapso do Fundacionalismo Clássico”, Fides Reformata, Centro Presbiteriano de PósGraduação Andrew Jumper, Vol. V., No. 2, Julho-Dezembro 2000, os. 115-42.

repousa na história da filosofia – a escolha, avaliação e vista geral dos vários sistemas
filosóficos. Menor ênfase é dada ao novo sistema filosófico que emerge dessa história,
tanto como aplicação da visão geral dessa disciplina quanto (raramente) como resultado de
um novo ponto de partida genuinamente original. Outros aspectos da disciplina incluem os
fundamentos filosóficos da ética assim como os de áreas particulares, tal como filosofia da
arte e da história.
Uma filosofia cristã é uma contradição de termos. Nós, cristãos, não devemos nos
entregar à busca da sabedoria e da verdade por causa do amor à sabedoria humana. Deus se
nos revelou em seu Filho e em sua Palavra. A busca da verdade que vá além da Palavra de
Deus implica em pecado. Revolver antigas e novas filosofias para coletar lascas úteis de
verdade e de conhecimento é uma empreitada duvidosa; a busca acaba abandonando as
fontes de águas vivas e construindo cisternas rotas que não retêm água (Jr 2.13).
A história da filosofia é a história da sabedoria humana pela qual o homem suprime
a verdade de Deus em favor da injustiça (Rm 1.18). Ela deve ser avaliada espiritualmente à
luz da Palavra de Deus. Tal análise da história da filosofia é certamente uma área essencial
de estudo numa universidade cristã. Não deveria, entretanto, ser estabelecida como
disciplina distinta, mas como parte de uma área maior de crítica (veja no subtítulo que se
segue). Se não for assim, haverá o perigo de uma desastrosa mudança de ênfase. A filosofia
é transformada outra vez em um fim em si mesma, e surgem os filósofos “cristãos”. Devido
ao compreensível compromisso ao assunto que representam, seus professores se dispõem
então a legitimar a filosofia “cristã”. Seu zelo e exemplo levam outras pessoas a se desviar
da simplicidade da Palavra de Deus, para as arrogantes estruturas do pensamento humano.
Submeter a história da filosofia à área da crítica protege os professores e os estudantes.
É certo que os pais da igreja, tal como Agostinho, usaram o pensamento filosófico.
Não deveríamos, no entanto, considera-los como exemplos encorajadores a serem
emulados, mas, antes, advertências para sermos vigilantes no sentido de que não
abandonemos a fonte de águas vivas. Vejo como infeliz a declaração de Agostinho, em De
doctrina christiana, de que os cristãos podem usar o espectro das ciências pagãs da maneira
como os israelitas usaram os valores egípcios. Deve-se observar de passagem que essas
mesmas riquezas foram provavelmente o material de que foram feitos os bezerros de outro,
no Sinai. Infelizmente, os bezerros de ouro do cristianismo foram feitos das riquezas das
filosofias pagãs.
Fazendo a Crítica Fundacional
“Porém o homem espiritual julga todas as coisas, mas ele mesmo não é julgado por
ninguém” (1 Co 2.15). “Ou não sabeis que os santos hão de julgar o mundo? Ora, se o
mundo deverá ser julgado por vós, sois, acaso, indignos de julgar as coisas mínimas? Não
sabeis que havemos de julgar os próprios anjos? Quanto mais as coisas desta vida!” (1 Co
6.2-3).
Em face do ataque movido por este mundo, nós, cristãos, temos de adotar uma
postura defensiva na área da crença cristã; temos apelado à apologética. Seria mais
interessante, entretanto, assumir uma posição de crítica baseada na Palavra de Deus com
respeito ao mundo que confrontamos. Desde de o surgimento do humanismo, costumamos
a ter nossa fé criticada em cada canto do ensino acadêmico. Deveríamos considerar, desta
vez, aquilo que a Palavra de Deus tem a dizer sobre essas áreas acadêmicas. Afinal, em
algumas situações, a melhor defesa é o ataque. Sobretudo, dessa maneira evitaremos nos
encontrar exatamente nos mesmos passos que o mundo. Não seremos culpados de esconder
do mundo a Palavra clara que fomos comissionados para proclamar.
Pela graça de Deus, temos visto mais e mais sinais dessa clara proclamação baseada
na Palavra de Deus. Autores tais como Francis Schaeffer e Arthur Ernest Wilder podem ser
citados como exemplos populares, e publicações em séries como Wort und Wissen, Wissen
und Leben, e Tagesfragen seguem a mesma linha.45
Em contraste, a apologética se propõe a lidar com ataques diretos à Palavra de
Deus. Tem uma função primariamente defensiva. Podemos vê-la como uma disciplina
incluída o título mais abrangente da crítica, embora seja preferível discuti-la em conexão
com cada particular área de estudo sob ataque.
Proponho uma organização do âmbito intelectual da crítica da maneira como
esquematizada na fig. 4.1:46
Fig. 4.1 O Âmbito Intelectual da Crítica





Crítica da
Filosofia
(Philosophie)



Crítica da
Arte
(Künste)



Crítica das
tendências
intelectuais
coetâneas
(Zeitsrömugen)



Crítica da
Apologética
(Apologetik)



Crítica das Ciências
(Wissenschaften)
a) Crítica geral e crítica das
filosofias da ciência
b) Princípios, teses
particulares ou resultados
de relevância especial
c) c) Crítica das particulares
disciplinas científicas

Crítica das
Heresias
(Härsien)



Crítica do pecado
em evidência na
vida coetânea
(Zeitsünden)
Ex.: promiscuidade,
aborto,
homossexualismo,
ocultismo

Projetando Cursos para Enriquecer Ministérios Estudantis
Uma vez que a faculdade é reconhecida como uma organização de serviço, os
cursos de estudo devem se alinhar aos objetivos dos futuros ministérios dos estudantes. O
estudo formal se coloca a serviço da auto-realização e do desenvolvimento harmônico da
personalidade; objetiva antes facilitar o melhor preparo para o ministério à frente.
Espera-se dos estudantes que concentrem seus esforços em seu trabalho, o que se
expressa em estudo disciplinado e eficiente.
Unindo Teoria e Prática, Estudo e Ministério
Planejar o curso do estudante com vistas ao futuro ministério implica
inevitavelmente uma constante mistura de teoria e práxis. Isso não ocorre apenas por causa
do tipo de serviço para o qual estudante se prepara para realizar, mas também porque o
estudante já foi chamado para o serviço do Senhor. Atividades missionárias e
oportunidades normais para o ministério cristão devem estar firmemente embutidas no
curso de estudo.
Avaliando Mais do que Desempenho Acadêmico
Precisamos apresentar, em algum lugar, o que temos feito e por algum tempo no
instituto Bíblico, em Batu, Indonésia, onde leciono na época deste escrito: Os estudantes
são avaliados não somente na base de seu desempenho acadêmico, mas em vista de sua
maturidade espiritual e da qualidade de seu serviço espiritual.
Organizando uma Instituição Cristã
Não se deve esperar que uma instituição educacional leal à Bíblia seja plenamente
estabelecida de um só passo. O plano deveria ser o de alcançar o objetivo por meio de
estágios. No sentido dessa finalidade, diversas questões fundamentais já têm sido discutidas
e colocadas, e diversas aproximações têm sido mencionadas.
Já existem centros isolados de educação teológica.47
Já existem também instituições em que os estudantes podem buscar um ano de
estudo concentrado de um ponto de vista cristão, antes de entrarem na universidade
secular.48 Há planos em execução, na Holanda, para uma universidade completa. Preocuparse-á primeiro com as disciplinas que tem sido especialmente atacadas pela moderna
cosmovisão anticristã, e desenvolverá de início programas nas áreas de teologia, jornalismo
e pedagogia. Vem também da Holanda uma observação útil com respeito ao custo das
várias disciplinas. Aqueles que puderem ser estabelecidas mais economicamente deverão
ter preferência no desenvolvimento inicial.49
À luz dessas várias observações, talvez a seguinte estratégia para uma seqüência de
ação se mostre funcional:
Primeiro estágio de desenvolvimento: um ano de estudo básico para estudantes de todas as
disciplinas. Parte do conteúdo de estudo seria geral, parte especificamente relacionada a
particulares disciplinas.
Segundo estágio de desenvolvimento: educação teológica. Além do estudo básico, ocorreria
o treinamento teológico para preparar estudantes como pastores, evangelistas, missionários
e professores de religião de nível primário e secundário.50 Poderia haver também
treinamento de professores de nível primário e, ainda, teorias educacionais sociais,
jornalismo e possivelmente instrução básica em música eclesiástica.
Terceiro estágio de desenvolvimento: treinamento de professores. No nível secundário, tal
treinamento poderia compreender disciplinas inteiras em áreas tais como lingüística,
estudos religiosos (incluindo religiões mundiais e fenomenologia da religião), direito e
economia.
Quarto estágio de desenvolvimento: cursos de extensão. Seriam incluídos programas tais
como ciências naturais, medicina e farmácia.
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Crítica histórica revisão

  • 1. Mogi das Cruzes, 12 de dezembro de 2005. Prezado irmão, Rev. Cláudio Marra, Vai aí a tradução de Crítica Histórica da Bíblia. São 280 laudas. Aguardo novo livro para tradução, caso seja possível. Obrigado. Abraço fraternal. Wadislau.
  • 2. ETA LINNEMANN CRÍTICA HISTÓRICA da Bíblia METODOLOGIA OU IDEOLOGIA? Reflexões de uma bultimanniana que se tornou evangélica
  • 3. Conteúdo Introdução do tradutor para a língua inglesa Prefácio Introdução da autora Parte 1 O Cristianismo e a Universidade Moderna 1. As Raízes Anticristãs da Universidade 2. Questões Pertinentes com Respeito à Universidade 3. O Antigo Israel e o Ocidente Moderno 4. A Educação Cristã no Nível Universitário Excurso 1: Estudos Gerais para o Estudante Cristão Excurso 2: A Confiabilidade do Pensamento 5. A Bíblia e o Homem Moderno Parte 2 A Palavra de Deus e a Teologia Histórico-crítica 6. O Estudo da Teologia Histórico-crítica 7. A Fé da Teologia e a Teologia da Fé 8. A Mentalidade da Teologia Histórico-crítica Excurso 3: Conselho Falso e Verdadeiro 9. Teologia Histórico-crítica e Teologia Evangélica 10. A Palavra de Deus Índice de assuntos Índice de textos da Escritura
  • 4. Introdução do tradutor para a língua inglesa Este livro apresenta um desafio para o leitor – e uma ameaça. Em novembro de 1988, quando apresentei uma dissertação sobre Eta Linnemann num encontro de profissionais, discutindo sua contribuição ao estudo do Novo Testamento e sua atual visão tal como expressa neste livro, quatro editores demonstraram interesse em publicá-lo. Essa é uma indicação, creio, do alto grau de apelo e relevância do estudo da Dra. Linnemann. Uma das razões para isso é que há uma fascinante dimensão pessoal que dá profundidade e pungência a este livro. Linnemann lança um forte protesto contra as tendências e métodos de uma disciplina que conhece muito bem, de dentro para fora. Ela não dá tiros à distância. Antes, foi uma estudante receptiva de alguns dos pensadores verdadeiramente seminais da erudição alemã do século 20 no que diz respeito ao estudo do Novo Testamento: Bultmann, Fuchs, Gotarten e Ebeling. Mais tarde, afiliada a sociedade profissional de pesquisa do Novo Testamento de maior prestígio mundial, ela fez par com muitos outros de igual estatura. O que levaria alguém a renunciar a tais conquistas? Por que alguém literalmente lançaria no lixo todos os livros e artigos que teria labutado arduamente para ver publicados? Por que alguém abriria mão de uma cadeira no sistema universitário da Alemanha Ocidental para servir, no final das contas, como professora-missionária na Indonésia? Este livro fornece ao menos os aspectos gerais das respostas a essas intrigantes perguntas. Contudo, a apresentação de Linnemann vai além do ângulo do interesse humano. Sua trajetória pessoal, em última instância, é veículo para ponderações sobre a história, métodos e resultados daquilo que ela chama justificadamente de teologia histórico-crítica. Aqui, talvez, resida a significância maior das reflexões de Linnemann.
  • 5. Nesse ponto o leitor encontrará também o desafio do livro, um repto que se estende a diversos níveis. No primeiro nível o leitor não-alemão encontrará seções lidando com uma situação que provavelmente lhe parecerá alheia. Isso é especialmente verdadeiro em relação ao capítulo 4 e aos dois excursos seguintes. Neles, Linnemann lida com a necessidade, a possibilidade e os passos básicos para a formação de escolas cristãs de nível universitário na Alemanha Ocidental. Não se trata de não haver faculdades de Bíblia na Europa Ocidental de língua alemã; qualquer um pode encontrá-las em localidades da Alemanha Ocidental ou na Suíça tais como Adelshofen, Beatenberg, Brake, Seeheim, Wiedenest, Wölmersen e Wuppertal, para citar algumas. Antes, trata-se de que essas faculdades de Bíblia não oferecem treinamento em nível acadêmico superior equivalente ao da educação oferecida pelas faculdades teológicas das universidades governamentais. Esses institutos bíblicos também não gozam do mesmo reconhecimento oficial dado às escolas estatais. Aquilo que os leitores americanos assumem como certo – a existência de dúzias de faculdades cristãs de artes liberais e de universidades cristãs, pelo menos nominalmente – não ocorre no país mais familiar a Linnemann, a Alemanha Ocidental. Linnemann, e muitos outros, sente que o monopólio das universidades estatais alemãs, com respeito ao treinamento de pastores, professores de religião, teólogos e acadêmicos da Bíblia, tem tido efeitos negativos e mesmo desastrosos nos últimos duzentos anos. Conquanto a situação que motiva Linnemenn possa a princípio parecer estranha a muitos leitores, seus comentários não são de modo nenhum irrelevantes para a América, onde faculdades cristãs plenamente reconhecidas são fatos da vida.∗ As questões de que ela Para o leitor brasileiro a argumentação de Linnemann tem significado especial, pois em anos recentes, cursos de teologia, sob diversos nomes, podem ser reconhecidos pelo estado. Entretanto, muitos seminários teológicos continuam sem reconhecimento quer porque não preenchem os requisitos oficiais quer porque muitos seguimentos eclesiásticos preferem manter a educação teológica de seus pastores distante da ingerência do estado. 
  • 6. trata – o que é realmente educação cristã de nível superior? E como os cristãos podem obtêla mais efetiva e biblicamente num mundo dominado por instituições acadêmicas fundamentalmente ateístas? – são freqüentemente levantadas em faculdades cristãs da América, as quais não são tão reacionárias para se preocupar com a assimilação do ensino contemporâneo, nem tão complacentemente sofisticadas para não entender o quanto sua cosmovisão cede terreno para um Zeitgeist (espírito dos tempos) anticristão. Num segundo nível, alguns leitores acharão o livro desafiador porque estão familiarizados com a história das idéias que Linnemann critica. Especialmente no capítulo 1, como também em outro pontos, o leitor encontrará um largo espectro de pensadores, talvez um número maior do que o esperado num livro escrito por alguém treinado principalmente em crítica do Novo Testamento. Alguns leitores verão isso como sinal de fraqueza, perguntando por quê Linnemann não se atém à disciplina na qual ela tem indubitável perícia. A natureza de suas reflexões, entretanto, requerem que ela levante os olhos, e os de seus leitores, para além do confinamento de uma disciplina acadêmica em particular. A discussão de Linnemann é de longo alcance a fim de abranger suas preocupações e aquilo que podemos chamar de seu fardo. Aqueles que questionam, digamos, a relevância de Goethe para a moderna hermenêutica (veja capítulo 1), poderão consultar Jaroslav Pelikan, o qual vê no Fausto, de Goethe “a clássica dramatização das relações negativa e positiva entre ‘a doutrina cristã e a cultura moderna’”.1 Se Linnemann errou em sua tentativa de fazer uma análise da relação entre o método científico e interpretação bíblica no contexto da história das idéias, ela está em boa companhia. Num terceiro nível, aquilo que temos chamado de fardo de Linnemann, também representará um desafio, se não uma pedra de tropeço, para alguns. Deliberadamente, Linnemann não escreveu aqui um tratado acadêmico formal,2 mas, sim, um Buβruf – um
  • 7. chamado ao arrependimento. Isso poderá desapontar aqueles que desejam um tratamento expositivo de conteúdo acadêmico mais sutil e de tom mais suave. Tais leitores terão de ler as obras seqüentes de Linnemann. Talvez este livro desagrade aqueles que não gostam do tom de pregação, especialmente quando isso parecer lhes ser dirigido e acompanhado por um volumoso revestimento de textos das Escrituras citados por Linnemann. O propósito aqui não é o de justificar a maneira de expressão escolhida por Linnemann, mas será bom manter em mente algumas considerações a fim de que a impaciência com a forma não impeça uma contemplação sóbria do conteúdo: Primeiro, o leitor deve se lembrar que o tom ocasionalmente zeloso é perfeitamente compreensível, dada a natureza monstruosa e o escopo do engano contra o qual Linnemann se vê combatendo. Mesmo que os tempos apresentassem apenas a metade do perigo que Linnemann vislumbra, ela teria sido negligente se economizasse palavras ou ficasse limitada a tons mais suaves. Outros escritores na história do pensamento cristão também entenderam que erros drásticos requerem expressões mais fortes. Segundo, deve-se manter em mente as circunstâncias da conversão de Linnemann e os anos precedentes daquilo que ela enxerga agora como falso ensino (ver sua Introdução). Sem dúvida, em dias passados, ela instou com seus estudantes, com entusiasmo e convicção, que a Bíblia continha muitos erros, que milagres jamais seriam possíveis, e que somente a metodologia crítica “científica” seria capaz de apresentar um parecer verídico responsável sobre o significado do texto bíblico. Seria irrealista paras os leitores esperar que Linnemann exibisse menos vigor na promulgação da verdade do que demonstrou na propagação do erro; isso seria hipocrisia de sua parte. Terceiro, é no mínimo possível que Linnemann corretamente afirme que o presente mal na teologia Ocidental – que pode não estar inteiramente desconectado dos prementes
  • 8. dilemas da sociedade Ocidental em geral – necessite de arrependimento, não meramente de mais pesquisa, diálogo ou reflexão crítica. No seu chamado ao arrependimento, vale a pena notar que ela prega somente aquilo que pessoalmente pratica. Se Linnemann desencaminhou-se ao escolher o arrependimento (e uma postura comprometida com a Palavra de Deus escrita e com o Messias) como parte integrante da recuperação da direção espiritual e moral num mundo profundamente atribulado, uma vez mais ela encontra numerosa companhia profética na história da proclamação judaico-cristã. Quarto, os leitores que considerarem excessivo o uso da Escritura em alguns pontos poderão se gabar de conhecer tão bem a Bíblia a ponto de achar redundantes as suas citações. Uma leitura extra de textos familiares não fará nenhum mal, e talvez traga à vista alguns tesouros no novo cenário em que Linnemann os aplica. Se houve um tempo em que o público ocidental conhecia a Bíblia intimamente, esse tempo já se foi. Para muitos leitores, os textos que Linnemann cita não serão familiares. Isso é certamente verdadeiro para a audiência européia que Linnemann tinha em mente em primeiro lugar ao escrever sua obra. Esses são alguns fatores, então, que vale a pena considerar quanto ao tom da obra de Linnemann. Até mesmo se alguém encontrar exceções aqui e ali, tal consideração pode auxiliar na argumentação construtiva ordenada. Um quatro nível de desafio pode ser a representação geralmente tenebrosa que Linnemann faz do presente estado da academia bíblica, e sua drástica prescrição para a mudança. Não estaria ela exagerando? É importante ter em mente que seu quadro referencial primário é a Alemanha Ocidental e seu sistema universitário. Aqueles que são familiarizados com o contexto e sua contrapartida na América do Norte poderão atestar a veracidade de sua tese geral de que a
  • 9. pesquisa bíblica e teológica é buscada com muita freqüência sob os auspícios do ateísmo. Isso quer dizer que não é mais o Deus vivo e verdadeiro, bem como sua Palavra revelada, a Bíblia, que marcam o ponto focal da reflexão teológica. No mundo moderno, como Linnemann corretamente observa, Deus não pode ser conhecido, e a revelação em sua definição tradicional não pode mais ser aceitável ou válida. O foco da teologia é, antes, a experiência humana da maneira definida pelas teorias da moderna ciência social, filosofia, historiografia e outras disciplinas “científicas”. “Deus”, da maneira como entendido pelo pensamento cristão ortodoxo histórico, é sistematicamente descartado em qualquer consideração, e substituído pela autoconsciência humana e por forças puramente imanentes; como é colocado pelos textos de teologia histórica, a antropologia toma o lugar da teologia. Dado a esse ambiente, intimamente conhecido por Linnemann em virtude de seu anterior compromisso com ele, ela tende, compreensivelmente, a apresentar seu caso em termos radicais. Conquanto algumas afirmações possam ser mais aplicáveis ao cenário europeu, dever-se-ia notar que a mesma regra se aplica fora do mundo relativamente pequeno da academia evangélica da América do Norte. Muito, na verdade a maior parte, da pesquisa teológica e bíblica procede sob suposições que não são alinhadas ao entendimento cristão ortodoxo histórico sobre Deus, o homem, e suas relações da maneira descrita na Bíblia. Portanto, a avaliação um tanto severa que Linnemann faz sobre a presente situação e sua prescrição radical para a mudança pode ser de suma importância para o cenário do novo mundo. Muito do que ela diz certamente se aplica à erudição e instituições não-evangélicas – que treinam grande parte dos pastores e educadores teológicos no continente americano. E isso tem relevância direta para a comunidade evangélica de pelos menos duas maneiras:
  • 10. Primeiro, a erudição evangélica é indubitavelmente influenciada pelo mundo acadêmico ateísta que Linnemann descreve. Tem-se presumido, freqüentemente, que isso tenha efeito benigno. Contanto que os evangélicos mantenham corações piedosos e vidas justas, aquilo que passa em suas cabeças, ou aquilo que propõem como sendo teoria crítica, têm importância secundária. Isso, porém, é uma visão míope das coisas. Os efeitos da erudição ateísta, de fato, não são sempre benignos como prontamente se observa na confusão moral rompante hoje nas igrejas cujos líderes e membros têm sido por décadas doutrinados por tal erudição. Os próprios liberais têm expressado desencantamento com o Deus que têm pregado, e alguns têm até mesmo conclamado a um retorno para “uma visão biblicamente informada” sobre Deus, igreja e mundo.3 Segundo, os evangélicos não podem ser complacentes quanto a onde sua própria academia, influenciada como está pela academia mundana em geral, os está levando. Não poucas vozes têm se levantado em recentes anos – podendo-se lembrar de Francis Schaeffer, Carl F. H. Henry e James D. Hunter4 – que expressam a convicção de que o evangelicalismo está, por assim dizer, vivendo com tempo emprestado e se desviando para uma direção não-saudável.5 A educação cristã superior desempenha um papel estratégico aqui, para o bem e para o mal. Sobretudo, alega-se plausivelmente que até mesmo a educação evangélica está, se não em crise, pelo menos não longe disso.6 Em termos mais populares, poucos líderes evangélicos teriam a coragem de afirmar que o atual estado moral das igrejas teologicamente conservadoras e sua liderança estejam acima de reprovação. Em tal situação, o diagnóstico e o prognóstico de Linnemann têm valor primordial, conclamando os evangélicos a considerar seus rumos diante da atual escalada do mal até proporções fatais – assumindo, é claro, que ainda não seja muito tarde.
  • 11. Revisores e leitores críticos em geral também encontrarão muita coisa perturbadora naquilo que se segue, e alguns até mesmo discordarão peremptoriamente. Contudo, eles certamente encontrarão muita coisa, também, que reconhecerão absolutamente verdadeira e que estimulará proveitosa reflexão na vida de estudantes, professores, líderes de igreja e pessoas em geral que buscam a verdade. Minha gratidão a Allan Fisher, Linda Triemstra e Paul Ingram, da Baker Book House, pelo seu interesse e apoio editorial, e à Dra. Linnemann pela sua diligência, prontidão e graça na supervisão desta tradução. Ambigüidades e infelicidades na expressão que ainda restem deverão ser atribuídas ao tradutor e não à autora. Robert W. Yarbrough Wheaton College Wheaton, Illinois 5 de julho de 1989
  • 12. Prefácio Não escrevi este livro sozinha; muitos amigos leais trabalharam comigo por meio de orações. Sobretudo, desejo mencionar minha igreja em Leer, Alemanha Ocidental, especialmente o irmão Hans-Peter Grabe, que serve como líder da congregação. Ele não apenas realizou a obra de intercessão diante de Deus, mas por meio dos seus reiterados encorajamentos, contribuiu para a germinação do livro. Devo agradecer também a meus colegas da agência missionária Christus für Dich (“Cristo para Você”) e à minha irmã em Cristo Gertrud Scholz, que oraram pelo livro e prestaram valiosa assistência na revisão. Acrescentando, devo mencionar minha igreja em Odenwald, Alemanha Ocidental, seu líder, Erling Eichholz, e o círculo de oração liderado pela irmã Elisabeth Hettinger. Agradecimentos são devidos também às minha irmãs no Senhor Lilot Schöler e Ruth Parasic e meu irmãos Gerhard Ullrichs e Martin Shwarz. Meus agradecimentos a todos eles e ao grupo de oração em Hänssler-Verlag, e a todos cujos nomes não mencionei. Sou grata a Friedrich Hänssler por aceitar de boa vontade este livro para publicação. Quero agradecer também ao Dr. R. Yarbrough, o qual fez um excelente trabalho de tradução, e a Baker Book House, que se dispôs a tornar o livro disponível aos leitores de língua inglesa. Dra. Eta Linnemann Batu, Indonésia 1 de Junho de 1989
  • 13. Introdução da autora “Por que você diz ‘Não!’ à teologia histórico-crítica?” Tenho sido confrontada com essa questão, e desejo declarar logo de início: Meu “Não!” à teologia histórico-crítica vem do meu “Sim!” ao meu maravilhoso Senhor e Salvador Jesus Cristo e à gloriosa redenção que ele realizou por mim no Gólgota. Como aluna de Rudolf Bultmann e Ernst Fuchs, bem como de Friedrich Gogarten e Gerhard Ebeling, tive os melhores professores que a teologia histórico-crítica pôde me oferecer. Não me saí mal em outros aspectos também. Meu primeiro livro veio a ser um best-seller. Tornei-me professora de teologia e educação religiosa na Universidade Técnica de Brauschweig, na Alemanha Ocidental. Depois de preencher os rigorosos requerimentos para a livre docência universitária,7 fui agraciada com o título de professor honorário de Novo Testamento na faculdade de teologia da Universidade Phillips, em Marburg, Alemanha Ocidental. Fui arrolada na Sociedade para Estudos do Novo Testamento. Tive a satisfação de receber um crescente grau de reconhecimento da parte de meus colegas. Intelectualmente confortável com a teologia histórico-crítica, estava profundamente convencida de que prestava serviço a Deus por meio do meu trabalho teológico e que contribuía para a proclamação do evangelho. Depois, contudo, baseada em diversas observações, descobertas e resultante autoconsciência, fui forçada a admitir duas coisas que eu não desejava: (1) nenhuma “verdade” poderia emergir deste “trabalho científico sobre o texto bíblico”, e (2) tal labor não serve à proclamação do evangelho. À época, isso era apenas um entendimento prático resultante de experiências que eu não mais podia negar. Desde então, Deus por meio de sua graça e Palavra tem-me dado uma compreensão mais profunda das dimensões teóricas dessa teologia. Em vez de ser baseada na Palavra de Deus,
  • 14. ela se funda em filosofias que ousaram definir a verdade, de maneira que a Palavra de Deus foi excluída como fonte de tal verdade. Essas filosofias simplesmente pressupuseram que o homem não poderia ter nenhum conhecimento válido sobre o Deus da Bíblia, o Criador do céu e da terra, o Pai de nosso Salvador e Senhor Jesus Cristo. Hoje entendo que o caráter monopólico e a influência mundial da teologia históricocrítica foram sinais do julgamento de Deus (Rm 1.18-32). Deus o predisse em sua Palavra: “Pois haverá tempo em que não suportarão a sã doutrina; pelo contrário, cercar-se-ão de mestres segundo as suas próprias cobiças, como que sentindo coceira nos ouvidos” (2 Tm 4.3). Ele prometeu também enviar “a operação do erro, para darem crédito à mentira” (2 Ts 2.11). Deus não está morto, nem resignado. Ele reina, e já está exercendo juízo sobre os que o declaram morto ou afirmam que ele é um falso deus que nada faz, bem ou mal. Hoje sei que devo esses insights iniciais aos efeitos primários da graça de Deus. A princípio, entretanto, aquilo que entendi levou-me a uma profunda desilusão. Reagi desviando-me para vícios que amainavam minha miséria. Tornei-me escrava da televisão e caí num crescente estado de dependência alcoólica. Minha amarga experiência pessoal finalmente convenceu-me da verdade da declaração bíblica: “Quem acha a sua vida perdêla-á” (Mt 10.39). A essa altura, Deus conduziu-me a cristãos vibrantes que conheciam pessoalmente a Jesus como Senhor e Salvador. Ouvi seus testemunhos daquilo que Deus havia feito em suas vidas. Finalmente, Deus mesmo falou ao meu coração por meio das palavras de irmãos cristãos. Pela graça e pelo amor de Deus eu confiei minha vida a Jesus. Ele imediatamente tomou minha vida em sua mão salvadora e começou a transformá-la radicalmente. Meus vícios destrutivos foram substituídos por fome e sede de sua Palavra e pela comunhão com outros cristãos. Fui capacitada para reconhecer claramente o pecado como sendo pecado em vez de meramente desculpar-me por eles
  • 15. como era meu hábito anteriormente. Ainda me lembro da deliciosa alegria que senti pela primeira vez em que contemplei o branco como branco e o preto como preto; os dois deixaram de se misturar num cinza indistinguível. Cerca de um mês após ter confiado minha vida a Jesus, Deus convenceu-me de que suas promessas eram reais. Ouvi um relato de um missionário da Wycliffe (tradutores da Bíblia) que servia no Nepal. Ele relatou que enquanto estava fora, seu ajudante no estudo lingüístico recém-convertido havia sido lançado na prisão, pois era ilegal torna-se cristão no Nepal. Contou também o que esse novo cristão disse em seu julgamento. Ouvindo o relato das palavras do ajudante lingüístico, ficou claro para mim que ele jamais teria dado tal resposta, baseado em sua própria habilidade. Marcos 13.9-11 surgiu ante meus olhos8 – uma passagem que já havia observado apenas com interesse acadêmico – e não tive alternativa senão admitir que ali estava um cumprimento dessa promessa. De repente, fui convencida de que as promessas de Deus eram reais, que Deus é um Deus vivo, e que ele reina. “Pois ele falou, e tudo se fez; ele ordenou, e tudo passou a existir” (Sl 33.9). Tudo o que ouvi por meio de testemunhos em meses recentes fez sentido naquele momento. Tomei consciência da estultícia que é, dado o que Deus está fazendo hoje, sustentar que os milagres relatados no Novo Testamento jamais ocorreram. De pronto, ficou claro para mim que meu ensino era um caso de cego guiando cegos. Arrependi-me da maneira como havia enganado meus alunos. Um mês depois, sozinha no meu quarto e à parte de qualquer influência de outros sobre mim, vi-me enfrentando uma significativa decisão. Continuaria a controlar a Bíblia com o meu intelecto ou permitiria que meu pensamento fosse transformado pelo Espírito Santo? João 3.16 aclarou minha decisão, pois eu havia recentemente experimentado a verdade desse versículo. Minha vida agora consistia daquilo que Deus havia feito por mim
  • 16. e pelo mundo todo – ele tinha dado o seu próprio Filho amado. Eu não poderia varrer esse versículo para o lado como se fosse uma afirmativa descomprometida e sem sentido teológico de um escritor mais ou menos gnóstico.9 A fé pode descansar nas firme promessa de Deus; os princípios teológicos especulativos são de mero interesse acadêmico. Pela graça de Deus, eu experimentei Jesus como aquele cujo nome está acima de todos os nomes. Foi-me permitido entender que Jesus é o Filho de Deus, nascido de uma virgem. Ele é o Messias e o Filho do Homem; tais títulos não lhe são meramente conferidos por deliberação humana. Reconheci, primeiro mentalmente, mas depois, de uma maneira experimental, vital, que a Sagrada Escritura é inspirada. Não por causa de um discurso humano, mas por causa do testemunho do Espírito Santo ao meu coração, eu tenho o claro entendimento de que meu perverso ensino de outrora era pecado. Ao mesmo tempo, estou contente e grata que esse pecado tenha sido perdoado porque Jesus o carregou na cruz. Esta é a razão de eu dizer “Não!” à teologia histórico-crítica. Considero tudo o que ensinei e escrevi antes de confiar minha vida a Jesus como refugo. Desejo usar esta oportunidade para dizer que lancei fora meus dois livros, Gleichnisse Jesu...10 e Studien zur Pasionsgeschichte, juntamente com minhas contribuições a periódicos, antologias, e Festschriften.11 Qualquer desses escritos em minha posse, eu joguei no lixo com minhas próprias mãos, em 1978. Peço sinceramente que você faça o mesmo com qualquer deles que você tenha em sua estante. Dra. Eta Linnemann Professora (aposentada) 5 de Julho de 1985
  • 17. Parte 1 O Cristianismo e a Universidade Moderna
  • 18. 1 As Raízes Anticristãs da Universidade A universidade, como um fenômeno da cultura Ocidental, foi desde o princípio uma instituição pagã. “A universidade em Atenas foi fechada por causa de seu caráter pagão (em 529 a.C.)”.12 O restabelecimento da universidade na Alta Idade Média, no final do século 12 ocorreu em junção com o renovado interesse em aspectos da cultura pagã como seu principal objeto de estudo. O corpus juris civilis (corpo de legislação civil) foi o objeto de estudo ao redor do qual a primeira universitas magistrorum et scholarium (universidade de professores e estudantes) reuniu-se em Bolonha, Itália. Esse códice de lei continha regulamentos sancionados na era cristã, mas, como um todo, compunha-se de uma coleção de leis derivadas dos tempos pagãos pré-cristãos. Os escritos de Aristóteles – filósofo pagão – foi o objeto de estudo que levou a fundação da segunda universidade, em Paris. A razão para a extensa autonomia dessa nova forma de instituição reside num interesse científico espontâneo, um imenso desejo de saber e entender em nome da verdade, o qual se dispunha ao risco do conflito a fim de atingir seu alvo. Decidiu-se em Bolonha, sem autorização ou sanção oficial, estudar o código legal do imperador romano Justiniano, que havia sido desconsiderado por 500 anos e que não estava em vigor em lugar algum. Em Paris, a atenção foi focalizada sobre os escritos filosóficos naturais e metafísicos de Aristóteles, então disponíveis pela primeira vez na tradução latina, e que estavam sob suspeição de heresia.13 Escolasticismo O escolasticismo incumbiu-se de “colocar o novo conhecimento racional em concordância com os artigos de fé”14 – um esforço que marcou o tom para todas as asserções teológicas da Alta e da Baixa Idade Média. Isso, porém, provocou uma decisão pesada e fatal! Em vez de levar em conta que todos os tesouros e conhecimentos estão
  • 19. ocultos em Cristo (Cl 2.3), assumiu-se que o homem precisa da sabedoria mundana do paganismo juntamente com a Palavra de Deus a fim de produzir real progresso intelectual. A Palavra de Deus foi reduzida a somente um de dois pontos focais para determinar sabedoria e conhecimento. A Bíblia passou a ser considerada como autoridade apenas nas áreas referentes à redenção e à vida cristã. Aristóteles, em contraste, tornou-se a fonte para todo conhecimento válido do mundo, isto é, para o âmbito das ciências naturais, análise social, etc. A partir daí, em outras palavras, a Palavra de Deus não foi mais considerada como confiável para essas áreas do conhecimento. Mais tarde, a filosofia aristotélica seria substituída pelas ciência recém desenvolvidas que rapidamente denunciaram os erros cosmológicos de Aristóteles com referência à Palavra de Deus. Esse apelo inicial às tradições e escritos da Antigüidade pagã, já na Idade Média, conduziu à institucionalização da tendência à autonomia como parte da essência formativa da universidade. A Sagrada Escritura continuava tendo autoridade; ainda se faziam tentativas de aproximar a sabedoria do paganismo com a intenção de trazer “o novo conhecimento racional à concordância com os artigos de fé”.15 A teologia era a rainha, e a filosofia era declarada sua serviçal. Contudo, não demorou muito para que a mentalidade pagã, tida como serviçal na recém fundada universidade, assumisse a autoridade soberana. A antiga rainha, certamente, manteve alguns direitos civis atraentes por mais algumas centenas de anos. Humanismo Nos primórdios do pensamento moderno, foi tomada temerária decisão, levada a cabo pelas forças da liderança intelectual, de se circundar a Palavra de Deus e buscar direção, alternativamente, na Antigüidade pagã. O humanismo tomou a decisão de fazer do homem a medida de todas as coisas. Essa foi uma renúncia definitiva em relação a Deus,
  • 20. ainda que o humanismo freqüentemente adotasse uma postura completamente piedosa e balbuciasse constantemente a Palavra de Deus. Aquilo que se falava a respeito de Deus não provinha mais da Palavra revelada de Deus, mas sim do espírito humano, cada vez mais distanciado desta Palavra. Isso já se mostra claro na concepção de Pico della Mirandola sobre o valor da humanidade, concepção esta que predominou sobre todo o humanismo: “Deus colocou o homem no meio do mundo sem que lhe desse um lugar seguro, sem uma identidade distintiva, sem uma função especial, conquanto todas essas coisas fossem asseguradas ao restante das criaturas. O homem não foi criado terreno nem celeste; ele pode se degenerar numa besta fera, ele pode ascender aos céus; tudo depende só e inteiramente de sua vontade. É garantido ao homem obter o que ele deseja, ser aquilo que ele quiser ser.”16 Não nos deixemos enganar pela aparente piedade dessas palavras! O que é dito aqui está em plena contradição com a Palavra de Deus. Não o homem, mas Jesus é o centro da criação: Este é a imagem do Deus invisível, o primogênito de toda a criação; pois, nele, foram criadas todas as coisas, nos céus e sobre a terra, as visíveis e as invisíveis, sejam tronos, sejam soberanias, quer principados, quer potestades. Tudo foi criado por meio dele e para ele. Ele é antes de todas as coisas. Nele, tudo subsiste. Ele é a cabeça do corpo, da igreja. Ele é o princípio, o primogênito de entre os mortos, para em todas as coisas ter a primazia, porque aprouve a Deus que, nele, residisse toda a plenitude e que, havendo feito a paz pelo sangue da sua cruz, por meio dele, reconciliasse consigo mesmo todas as coisas, quer sobre a terra, quer nos céus. (Cl 1.15-20.) A afirmação de Pico, de que “tudo depende só e inteiramente de sua vontade” e que a humanidade pode “ascender aos céus”, não é de modo nenhum verdadeira. “Pois, não depende de quem quer ou de quem corre, mas de usar Deus a sua misericórdia” (Rm 9.16). A Palavra de Deus declara: “E não há salvação em nenhum outro; porque abaixo do céu não existe nenhum outro nome, dado entre os homens, pelo qual importa que sejamos
  • 21. salvos” (At 4.12); “Eu sou o caminho, e a verdade, e a vida; ninguém vem ao Pai senão por mim” (Jo 14.6); “Ninguém pode vir a mim se o Pai, que me enviou, não o trouxer; e eu o ressuscitarei no último dia“ (Jo 6.44). Se o humanismo vê a Antigüidade clássica como o padrão absoluto ao qual o cristianismo deve se conformar, como presumido por Laurentius Valla, ou se assume uma posição crítica tanto em relação à Antigüidade, quanto no que diz respeito ao cristianismo, como defendido por Erasmo de Roterdã – ambas as visões permanecem em contradição à revelação de Deus. Até mesmo em sua forma mais positiva, o cristianismo sob a influência do humanismo se degenera em “uma religião iluminada cujo propósito é transmitir os valores da civilização humanista, atingindo seu clímax na etiqueta e moralidade, na ciência e cultura”.17 O humanismo rejeita reconhecer Deus e tomar conhecimento de como ele se revela em sua Palavra. No humanismo, a viva fé cristã se deteriora simplesmente em “cristianismo” que, por sua vez, é mais uma “religião” – a qual, é claro, compara-se com todas as outras existentes. “A religião se torna uma província dentre as outras diversas áreas da cultura. E proporcionalmente à quantidade de áreas independentes que existirem, nessa medida existirão os muitos padrões pelos quais a religião será mensurada.”18 A Palavra de Deus não é mais o padrão no humanismo, mas, antes, ela é julgada pelos padrões da cultura humanista. Dessa maneira, a cultura – o produto do espírito humano criado – substituiu a revelação de Deus, o Criador. A fé em Deus, o Criador e Redentor, foi pervertida numa subdivisão da cultura e da vida do espírito humano. Em conseqüência disso, o homem agora considera a Palavra de Deus apenas como um produto da atividade desse espírito humano. À religião é aquinhoada com aquilo que Schleiermacher denominaria mais tarde de “província piedosa na alma” e de dentro de tais
  • 22. limites ela deve operar. A violação desses limites foi, a partir de então, severamente punida. Quando a carne assume soberania absoluta, como ocorreu nesse caso, ela se opõe a cada manifestação viva do Espírito. Do humanismo, pode-se dizer: Há basicamente uma coisa que obriga o homem, a veritas (verdade); e ela é sempre uma, ainda que assuma diversas formas. “Conquanto os sistemas dos pensadores pagãos e cristãos pareçam divergir um do outro”, afirmou Pico, “eles são basicamente derivados da única e mesma verdade”. O próprio Iluminismo, de forma severa, tornou relativas todas as religiões, de qualquer forma mais radical. A ética do cristianismo foi trazida a esse processo relativista.19 O humanismo, portanto, atribui a condição de verdade a todo produto que venha do pensamento e criatividade humanos. O único padrão que o homem ainda possuía foi dessa maneira feito relativo. 20 Foram dadas então rédeas soltas à subjetividade relativista do homem, a qual por si mesmo era incapaz de fornecer fundamento real para julgamentos e métodos. Agora, sem julgamentos ou métodos, não poderia haver mais comunicação dentro da comunidade científica. Contudo, deve-se observar que os sistemas baseados na ciência e na cultura não têm, sob premissas humanistas, nenhuma base real, antes são fundados sobre nada mais do que arranjos e concordâncias. Segundo essa aproximação, tudo o é ostensivamente verdadeiro e válido se a si mesmo se demonstra como tal com base em sua qualidade inerente. De fato, nada pode ser considerado verdadeiro e culturalmente válido a menos que seja reconhecido pelas forças dominantes que moldam a ciência e a cultura, por aquilo que chamamos de indústria da cultura e da ciência.21 Os métodos da ciência e os sistemas de avaliação culturais proveram um habitat seguro para a humanidade fora da verdade da revelação. Esse habitat, porém, que podemos associar à Torre de Babel projetada para reunir a humanidade, não previne a fragmentação e dispersão do pensamento e da vida humana, antes, é sua causa. A dissidência erguida dentro do sistema é uma característica da indústria da cultura.
  • 23. É inegável que sejam feitos acordos para tornar possíveis as operações em andamento, mas como é que eles são feitos? Autoridades e líderes de tendências surgem, não com base na qualidade de seus trabalhos, mas sim em imponderáveis que nada tem a ver com o valor da obra.22 Dinâmicas de grupo desempenham papel decisivo aqui, e o resultado é uma infra-estrutura de tradição nas disciplinas científicas e na indústria da cultura. As ciências ostensivamente “independentes” são guiadas pelas suas próprias tradições, e a liberdade somente é assegurada ao indivíduo na medida em que o trabalho dessa pessoa puder ser integrado à estrutura tradicional da disciplina. 23 A genuína liberdade de pensamento só existe onde houver verdade, e a verdade está presente apenas em conexão com aquele que é o caminho, a verdade e a vida (Jo 14.6). Há verdade somente existe em Jesus. No humanismo, a verdade é substituída pelo reconhecimento, um prestígio envolvido na conferência e aceitação de honrarias. Esse empreendimento é, sem dúvidas, sujeito a manipulação.24 O Iluminismo Em comparação com o aspecto intelectual anticristão do humanismo, o Iluminismo não traz nenhuma coisa nova. Apenas assenta as condições para a execução da agenda humanista. Quando Francis Bacon decretou que “cada verdade (é) encontrada indutivamente”,25 ele reproduziu o estabelecimento do homem como a medida de todas as coisas metodologicamente possíveis. Ao mesmo tempo, as Sagradas Escrituras foram excluídas como a fonte da verdade. Consistentemente com essa perspectiva, ele separou totalmente “o âmbito da razão do âmbito da fé e da religião”26 e definiu a fé como sacrificium intellectus, a capitulação da tentativa de entendimento.
  • 24. Hobbes, que semelhantemente fez uma separação entre fé e pensamento, relegou a questão da fé “ao âmbito inverificável e paradoxal dos absurdos e contradições.”27 Ele afirmou: “Não há conceito no entendimento humano que não surja, antes de tudo, total ou parcialmente, dos órgãos dos sentidos.”28 Dessa maneira, não apenas os fundamentos da alta crítica da Bíblia foram lançados – pois Hobbes já a havia iniciado – mas o ponto de partida do ateísmo também foi igualmente fixado. Spinoza, Descartes, Kant – para citar só alguns deles – apenas declararam mais precisamente o que já havia sido estabelecido nos primeiros estágios do Iluminismo. Idealismo germânico As idéias surgidas no humanismo atingiram sua maturidade no idealismo germânico. O sistema educacional se tornou ainda mais arraigado à imagem do homem conforme o ensino da Antigüidade clássica. O maçom Wilhelm von Humboldt desempenhou um papel estratégico nesse sentido.29 A filosofia do Iluminismo, que coroa suas conquistas em Kant, tomou forma na literatura. Autores alemães do início do período Romântico, tais como Lessing, Schiller e Goethe, por assim dizer, recriaram a humanidade à imagem do quadro derivado dessa filosofia. Por meio da “inspiração poética”30, seus personagens literários tomaram formas vívidas e convincentes. Tornaram-se protótipos do indivíduo moderno; por meio de sanção oficial e de larga distribuição desses escritos em currículos escolares, um “linha modelar” totalmente nova de pessoa foi produzida em massa, como novos carros, idênticos ao protótipo projetado, produzidos na linha de montagem. Depois, aquilo que foi absorvido na escola por meio de vívidos conceitos, foi ainda, com a assistência inestimável e efetiva do teatro, transformado em pensamento abstrato pela universidade.
  • 25. A filosofia de Hegel tomou forma no ensino de história e permeou cada sala de aula – juntamente com os pensamentos de Lessing sobre a Educação da Raça Humana e Idéias para uma Filosofia da História da Humanidade, de Herder. Isso facilitou a aceitação dos descendentes de Hegel, Marx e Engels, os quais por sua vez pavimentaram o caminho para a escola de Frankfurt. Surgiu uma historiografia científica que primeiro excluía Deus como um agente ativo no processo histórico mediante a introdução de “um deus das filosofias” que portava consciência de si mesmo de maneira imanente no curso da história. Esse pseudo-deus logo se tornou supérfluo, mas serviu para eliminar a possibilidade de um Deus real e sua atividade presente na história humana. Dessa maneira, veio a existir uma “ciência” histórica totalmente ateísta. Os comentários acima bastam para dar um esboço da história das idéias – esboço que pode apenas lançar uns poucos raios de luz. Estou cônscia de que a apresentação das conexões é provisional e que muito foi passado por cima. Isso se deve tanto ao tempo quanto a limitações pessoais. Material suplementar está certamente à disposição na literatura evangélica que não tive ainda a oportunidade de consultar. O leitor assim inclinado é encorajado a completar o que tenho esboçado para enriquecimento de seu conhecimento pessoal de informação relevante. Obviamente, eu agradeceria referências a tais informações.31 Intencionalmente, passei por cima da questão da relação da Reforma e da ortodoxia protestante com o humanismo. Não examinei também a conexão entre o pietismo e o Iluminismo. Muito material têm sido escrito nessas áreas. No que se refere à universidade, é o humanismo e o Iluminismo, e não a Reforma e o pietismo, que tem provado exercer influência unilateral de longa duração.
  • 26. Não é meu propósito realizar um debate acadêmico. Quero antes demonstrar como esse segmento da história e suas conseqüências se mostram à luz da Palavra de Deus. Quero também emitir um chamado ao arrependimento, de longa data já em débito. Não escrevo para um público acadêmico, mas para todos aqueles dispostos a serem admoestados pela Palavra de Deus. Para o propósito de levantar as questões mais pertinentes não é absolutamente necessário investigar mais profundamente a história das idéias no Ocidente e suas interconexões. Deve ficar estabelecido que: A sorte foi lançada... • Depois que a Idade Média recorreu à filosofia pagã como meio de obtenção da orientação intelectual; • Depois que o humanismo declarou que o homem é a medida de todas as coisas; • Depois que o Iluminismo decidiu reconhecer como verdadeiro somente aquilo a que se tem chegado de maneira indutiva; • Depois que a premissa inicial de Descartes recebeu aceitação, segundo a qual a única possibilidade de verificação seria mediante a validade conferente da dúvida; • Depois que Lessing, em consonância com Reimarus, proclamou o “abismo” entre “fatos contingentes da história” e “eternas verdades da razão” e tornou popular, por meio de Nathan, o Sábio, a idéia de que ninguém pode dizer o que é a verdadeira fé; • Depois que Kant escreveu sua crítica da razão pura e que seu conceito de “Religião nos Limites da Razão” começou a obter aceitação; • Depois que o Fausto de Göethe implantou em cada pessoa culta a idéia de que “nossa visão é barrada... de ver a realidade espiritual” e aquilo que – segundo a conversa entre Fausto e Gretchen – alguém poderia pensar sobre religião;
  • 27. • Depois que Schleiermacher esboçou as conseqüências da crítica da razão, de Kant, e tentou fundamentar a fé na experiência religiosa humana em vez de na revelação divina; • Depois que Semler estabeleceu o ponto de partida na crítica da Bíblia, como resultado da filosofia do Iluminismo, e tal ponto de partida começou a obter aceitação na exegese bíblica; e • Quando uma historiografia ateísta foi estabelecida.. Os elementos acima alistados adquiriram a condição de ponto de partida intelectual obrigatório entre os eruditos e se tornaram determinante para a universidade. A princípio saudada como “a emancipação da imaturidade do homem, pela qual ele próprio era culpado”32 e nascido juntamente com um otimismo contumaz, após a I Guerra Mundial, este ponto de partida intelectual veio a ser entendido mais e mais como o destino necessário do curso da reflexão humana. De uma maneira ou de outra, esse ponto de partida foi e continua sendo visto como necessário e inescapável, e conseqüentemente defendido com veemência – com a assistência da influência, recursos financeiros e poder político. Na universidade, que desde o início foi uma instituição anticristã, logo não haveria espaço para o pensamento baseado consistentemente na revelação de Deus na sua Palavra.33 A Era da Tecnologia A educação técnica se encontrou certamente tão oposta ao ideal educacional da universidade de Humboldt34 que se tornou necessária a fundação de alguns centros educacionais alternativos. Entretanto, o ponto de partida intelectual da tecnologia estava tão baseado no Iluminismo em cada um de seus aspectos como o conceito de educação humanista idealista. Em ambos os casos, Deus foi metodologicamente excluído desde o início, até mesmo por pesquisadores cuja piedade pessoal era inquestionável. Dessa
  • 28. maneira, a tecnologia e a educação finalmente entraram em concordância, uma vez que o sucesso da tecnologia não podia mais ser ignorado. O sucesso do ponto de partida intelectual ateísta na tecnologia parecia dar sua confirmação definitiva. E essa aparente confirmação estigmatizou toda objeção com a pecha de estultícia. Seria possível fazer oposição ao pensamento que produz as máquinas que usamos diariamente, que organiza o sistema de transporte, que fornece o aquecimento central e a corrente elétrica sem os quais a vida moderna seria aparentemente impossível? Hoje em dia é martelado em toda escola de ensino fundamental que não é possível se opor ao pensamento moderno, que “não vivemos hoje na Idade Média, graças a Deus!” e que até mesmo “estilos de vida alternativos” somente são possíveis à sombra do desenvolvimento tecnológico. Todo estudante que ingressa na universidade tem de aceitar o jugo do ponto de partida intelectual ateísta como uma necessidade inescapável. Esse é um jugo que faz dobrar cruelmente aquele que o carrega, e é colocado sobre o estudante à parte de sua escolha consciente, por meio do objetivo de se completar o curso do estudo em um campo privilegiado – campo dominado pelo ponto de partida ateísta. Mesmo o cristão que freqüenta a universidade recai sob esse jugo. É-lhe permitido, é claro, manter a fé na vida privada, em meio aqueles ao seu redor que vejam a fé de maneira favorável, ou com ironia, ou que talvez compartilhem as mesmas convicções. Entretanto, ele é proibido de reter o Deus vivo e seu Filho Jesus Cristo em seu pensamento acadêmico, ou de lhe conceder qualquer função material nesse sentido.35 Assim, ele retém Jesus em seu sentimento, mas nega-o diariamente em seu pensamento, pois esse pensamento segue os princípios ateístas anticristãos.36
  • 29. O caráter monopólico dos centros de educação fundados no ateísmo resulta em que a totalidade das conquistas técnicas seja creditada à conta do pensamento “científico” ateísta. As pessoas se comportam como fez Israel, quando seu povo pensou que recebia lã e linho, grãos e vinho de Baal, em vez de ser grato ao Criador dessas coisas (Os 2.1-13). Contudo, as pessoas não atinam para a realidade dos efeitos negativos que acompanham as descobertas positivas dessa ciência. Não enfrentam as conseqüências da lei do pecado que continua presente quando alguém toma parte nesse câmbio científico. Em todos os lugares, hoje, esse pensamento baseado na impiedade gera fruto que podemos constatar como amargo. Em todas as áreas da vida o homem tenta hoje ser o capitão do seu próprio navio. Enquanto isso, o navio está fora de controle e muitas pessoas vivem num estado de perplexidade desesperada. A despeito de todo o progresso que a medicina tem feito, ela ainda não debelou a doença. Na verdade, algumas doenças parecem ter sido vencidas, e outras, parecem estar prestes a perder o terror que retinham. Porém, outras doenças irrompem e se espalham. Vista em sua totalidade, a humanidade dificilmente pode ser considerada como mais saudável; pode ser vista apenas como mais dependente dos médicos e da medicina. Conquanto a mortalidade infantil venha sendo vencida, agora o aborto e a esterilização tomam lugar na linha de montagem da moda. Dificilmente uma droga prescrita deixa de causar muitos efeitos colaterais negativos. O progresso tecnológico traz consigo a destruição do meio ambiente numa extensão desconhecida na história humana. Esforços são centralizados na descoberta de meios de destruição (armas atômicas, biológicas e químicas) com o propósito de aniquilar pessoas e nações inteiras. Sem nosso jactancioso progresso tecnológico, isso tudo seria inimaginável. Um grande número de novas armas químicas está armazenado em arsenais à espera de uso
  • 30. eventual. Até o presente, só os poucos cujas ocupações o requerem, têm conhecimento de alguma coisa delas. A despeito de todo desenvolvimento nas ciências biológicas e agrícolas, a nutrição da humanidade não está assegurada. Agora que a humanidade, mediante sua interferência, destruiu o equilíbrio biológico, temos de atentar ao contra-ataque dos seus efeitos, geralmente usando venenos que trazem ainda maior dano. A possibilidade de engenharia genética, um dos resultados do progresso na pesquisa, tem suas vantagens na área da criação de gado, mas também traz um potencial de corrupção para a humanidade. A sociologia, a mais jovem das ciências, conquanto seja considerada como meio para tratar e solver males sociais, foi e tem sido usada largamente para destruir os laços sociais naturais. No lugar da projetada “maturidade” da pessoa pensante, vemos a sociedade moderna apadrinhada pela tirania dos especialistas. Até mesmo nas áreas mais básicas, permite-se que a vida da pessoa moderna “livre” seja ditada por especialistas, os quais, com base na sua perícia ou especialidade (que eles, em geral, não têm demonstrado ser válida em sua própria vida pessoal), tornam-se “autoridades”. No lugar de um Livro, cujo conteúdo é sabedoria de Deus, e pelo qual o homem moderno não quer ser instruído, temos os muitos livros mutuamente contraditórios que reivindicam validade para si mesmos com base em serem “científicos”. A educação sexual pública “baseada na ciência” padroniza e corrompe o comportamento sexual por meio da destruição do senso natural de vergonha. Os especialistas são chamados a falar sobre quantos filhos uma pessoa pode ter (“Dois é o bastante!”), e reivindicam a si a “autoridade” para decidir como esses filhos devem ser criados. Pais pobres e a sociedade colhem os frutos amargos dessa criação,
  • 31. enquanto os especialistas, nesse ínterim, já há muito progrediram para novas teorias sobre criação de filhos. Estatísticas “cientificamente garantidas” e pesquisas de opinião pública que os especialistas produzem com abundância determinam o estilo de vida moderna – estilo de vida que, geralmente, só pode ser descrito em termos de comportamento viciogênico guiado pelo princípio do prazer. Todos esses fatores, considerados em conjunto, leva-nos a uma homogeneização mundial sem precedentes em relação ao pensamento e ao comportamento. O comportamento alternativo é desencorajado; há pressão para a conformação com as normas sociais emergentes. Da projetada e jactada “maturidade” do homem, não há nenhum traço! “Sapere aude! Tenha a coragem de confiar em seu próprio entendimento!” foi o moto do Iluminismo. Foi isso que Kant declarou em sua publicação de 1784, What Is Enlightenment? Sapere aude! já estava implicitamente propagado pelo humanismo. Sapere aude! – essa foi a resolução de não mais aceitar a revelação, mas substituí-la pela autoridade arbitrária da razão. Sapere aude! – essa foi a decisão feita pela “impiedade e perversão dos homens que detêm a verdade pela injustiça” (Rm 1.18). Deus respondeu a tal decisão com seu julgamento: A ira de Deus se revela do céu contra toda impiedade e perversão dos homens que detêm a verdade pela injustiça; porquanto o que de Deus se pode conhecer é manifesto entre eles, porque Deus lhes manifestou. Porque os atributos invisíveis de Deus, assim o seu eterno poder, como também a sua própria divindade, claramente se reconhecem, desde o princípio do mundo, sendo percebidos por meio das coisas que foram criadas. Tais homens são, por isso, indesculpáveis; porquanto, tendo conhecimento de Deus, não o glorificaram como Deus, nem lhe deram graças; antes, se tornaram nulos em seus próprios raciocínios, obscurecendo-se-lhes o coração insensato. Inculcando-se por sábios, tornaram-se loucos...(Rm 1.18-22) Aquilo que se aplica aos pagãos que só podem apreender a revelação de Deus na criação aplica-se em maior grau àquele que foi conscientizado da revelação de Deus no seu
  • 32. Filho. “Inculcando-se por sábios, tornaram-se loucos”. A história dos últimos quinhentos anos em todas as suas facetas – a história política tanto quanto a intelectual, a história da tecnologia tanto quanto a da teologia – dá claro testemunho da ira da qual Deus nos libertou. Em vista da impiedade temerária com a qual temos nos comprometido, essa história testemunha da abundante graça e da paciência sofredora de Deus. “As misericórdias do Senhor são a causa de não sermos consumidos.” (Lm 3.22). O presente estado de coisas é realmente deplorável. A que terrível impiedade (mas de respeitável aparência) nós nos permitimos ser sugados! Por mais de quinhentos anos, nós agora nos ajoelhamos ante uma cultura e ciência que foi anticristã desde o início. Permitimo-nos ser convencidos de que pensamento e criatividade são possíveis somente dentro dessa infraestrutura.37 Dessa maneira, nós calcamos aos pés o dom de nosso Pai Celestial, seu Filho amado, em quem ele nos assegurou todas as riquezas da sabedoria e do conhecimento (veja Cl 2.3). Década após década, século após século, o cristianismo tem aceitado esse sacrilégio e se tornado mais e mais profundamente envolvido nele. Que bondade, que paciência e que misericórdia Deus tem nos demonstrado! Ao mesmo tempo em que a luz do evangelho começou a brilhar uma vez mais, a civilização que vislumbrou seus raios se tornou para a iniqüidade – e Deus se pôs ao lado dela e a susteve com grande amor através dos séculos passados! Quão grande é a obra completa do Gólgota, cujas correntes de bênçãos fluem até mesmo sobre os séculos mais recentes! Não obstante: “Hoje, se ouvirdes a sua voz, não endureçais o coração” (Sl 95.7-8). Retornemos finalmente Àquele que nos criou. À parte da obra salvadora de Deus consumada quando ele deu seu Filho pelos nossos pecados na cruz do Gólgota, ele nos teria
  • 33. consignado à eterna separação e à agonia do mar de fogo por causa de nossa participação no sacrilégio de tal iniqüidade. E isso é o que ele fará, se não buscarmos refúgio em Jesus como nosso Salvador.
  • 34. 2 Questões Pertinentes com Respeito à Universidade O longo tempo transcorrido durante o qual a cultura e a ciência ateísta e anti-cristã se espalharam e obtiveram influência mundial no “Ocidente cristão” nos tornou indiferentes a essa monstruosidade. É difícil, para nós, ter uma perspectiva crítica sobre algo estabelecido há séculos e que parece auto-evidente. É difícil reconhecer que a história das idéias no Ocidente, abarcando mais de quinhentos anos, seja um terrível e pecaminoso erro. Nós a vemos, juntamente com seu impacto internacional, como um estado de coisas estabelecido – um dogma intelectual moderno a ser mantido, que identificamos como fato inerente com poder normativo para o nosso pensamento. Aquilo que de fato existe é confundido e identificado com aquilo que deveria existir. O fatual assume mais peso do que o normativo e, de fato, torna-se normativo. Além disso, somos tão marcados por essas forças culturais e educacionais que somente podemos nos libertar delas pela graça de nosso Pai celeste, pelo sangue do nosso Salvador, Jesus Cristo, e pela lavagem de água da Palavra de Deus. Consideramos que a obtenção de uma educação moderna seja uma conquista, pois ela nos habilitou a alcançar o ponto em que estamos. Aceitamos a sabedoria convencional que pensamento e criatividade são possíveis apenas dentro dessa infraestrutura. Mesmo que alguém esteja disposto a nos ouvir, levantam-se questões sobre as asserções do capítulo anterior. Essas questões não são facilmente dissipadas. Esse Esboço Histórico É Acurado? Esse delineamento resumido da história das idéias não seria apenas uma descrição simplista que deixa de fazer justiça à realidade?
  • 35. Realmente, nem o humanismo, nem o Iluminismo em seus primórdios, conscientemente implementaram uma quebra com a fé cristã. Houve no máximo a percepção de uma cônscia posição contra o ensino da igreja. Até mesmo o idealismo, de modo algum, pode ser considerado um repúdio total ao cristianismo. Assim, podemos falar de pessoas que foram não-cristãs sem que tivessem sido conscientemente anticristãs. 38 Pode-se achar nomenclatura cristã em filosofias desde Pico della Mirandola, Bacon, Hobbes e Descartes, até Kant, Goethe, e Hegel. A tendência geral da sociedade era ainda cristã. Não era permitido ao ateísmo cru, que este levantasse a sua cabeça hedionda. Até mesmo Lessing se curvou à pressão social, ainda que seus escritos insinuassem que ele teria preferido agir de maneira diferente. Semler declarou expressamente que suas idéias não se destinavam ao povo, mas apenas à inteligentsia, à época, um grupo bem pequeno. Estamos lidando aqui com um processo gradual de infiltração. A natureza anticristã dessa visão é revelada primariamente em sua contradição à Palavra de Deus. É anticristã e ateísta, no sentido de que negligencia Deus, o Pai de nosso Senhor Jesus Cristo, até mesmo quando piedosamente balbucia a palavra Deus. Seu deus não é Aquele que se revelou na Palavra, mas, antes, o deus dos filósofos, a quem é atribuído aquilo que o espírito humano imagina. Em meados do século 19, esse pensamento era em geral bastante piedoso, ainda que essa piedade aparecesse com cada vez menor freqüência. A natureza humana rebelde que Paulo chama “carne” (gr., sarx; veja Rm 8.5-8) ascendeu ao poder, apresentando-se primeiramente como “carne” piedosa. Segundo, essa visão da natureza anticristã se torna evidente na medida em que o estudo da Bíblia e da natureza metodologicamente descarta Deus. A Palavra de Deus como a fonte de todo o conhecimento é posta de lado.
  • 36. O pensamento no Ocidente foi des-cristianizado mais ou menos como uma lagarta da borboleta que é devorada de dentro para fora depois que a vespa ichneumonídea deposita nela os seus ovos; os ovos eclodem em larvas que se nutrem do seu hospedeiro. A forma externa da lagarta permanece intacta por algum tempo até que seja finalmente destruída. Poder-se-ia comparar o processo com a maneira como uma casa de madeira é consumida pelos cupins. As vigas que sustentam a casa são destruídas de maneira acobertada até que, plenamente enfraquecida, a casa colapsa. Semelhantemente, estamos vendo no pensamento moderno os resultados daquilo que aconteceu de forma encoberta por longo tempo. É criada a falsa impressão de que a fé cristã chegou ao fim. O que realmente acontece é que uma corrente de ideologia, que foi anticristã desde o início, finalmente tomou seu curso. Essa ideologia, a princípio, mesclavase com a fé cristã; mas no curso de seu refinamento ela rejeitou a fé cristã como essencialmente incompatível. A ilusão de que a fé cristã é obsoleta surge somente porque muitos cristãos identificam sua fé com essa ideologia se apresenta no final do processo. Não reconhecem que o caráter anticristão já estava ali desde o início. A fé cristã, enquanto isso, permaneceu protegida pela graça de Deus – houve sempre os “sete mil” que não dobraram os joelhos diante de Baal (Rm 11.4-5). Sempre houve, todavia, pessoas as quais Paulo descreve como “não... muitos sábios segundo a carne, nem muitos poderosos, nem muitos de nobre nascimento” (1 Co 1.26). Além disso, a fé cristã foi impedida de se desenvolver nos centros acadêmicos de ensino nos quais a noção de ciência concebida de forma ateísta manteve influência monopólica. O acesso a esse mundo foi restrito no sentido de que poucos entram nele sem negar a fé.
  • 37. A situação contemporânea ficou mais confusa devido à mistura sincretista do cristianismo como noções alheias a ele. Contudo, pela graça de Deus, nós podemos agora ver tudo isso de modo claro. Que usemos essa hora de graça para renunciar ao sincretismo pecaminoso e em nome de Jesus estabelecer um novo princípio. “Lavrai para vós outros campo novo e não semeeis entre espinhos” (Jr 4.3). Não Devemos Permanecer no Mundo? O resultado do capítulo 1 não é irrelevante, uma vez que a universidade obviamente também é “o mundo”? Afinal de contas, Jesus não requer que sejamos tirados do mundo, mas que sejamos preservados nele (Jo 17.15). Inicialmente esse argumento parece razoável, mais ainda assim deve-se fazer uma distinção crucial. Se faço compras de alimentos no mundo, o que compro e como é simplesmente consumido e digerido; isso não entra em contato com meu pensamento. Se compro sapatos de um ateu ou pagão, os sapatos apenas tocam meus pés, não meu ser interior. Se trabalho na linha de montagem de uma fábrica, talvez tenha de ouvir conversas vulgares ou blasfemas ao meu redor, mas não sou compelido a absorver tais profanidades em minha mente. Se me assento a uma escrivaninha em um escritório de administração, tenho de dar atenção a leis e regulamentos, mas tais restrições não alteram minha personalidade. A universidade, em contraste, é onde o pensamento é alterado e alinhado com o mundo. Desde que a sociedade iluminista rejeitou a realidade da Queda (Gn 3), juntamente com a resultante depravação humana e a necessidade de redenção, a humanidade tem tentado retratar o pensamento como se fosse uma capacidade neutra, objetiva e efetiva. Tudo aquilo que parece se conformar com as leis da lógica é automaticamente correto e confiável, contanto que se restrinja de maneira monística àquilo que é visível e imanente.
  • 38. Essa convicção de neutralidade, objetividade e a universalidade do pensamento científico é defendido na universidade, onde se assume que o verdadeiro “pensamento” tem de ser “cientificamente baseado”, assim, limitada às auto-restrições desse monismo. Noutras palavras, as ciências que podem ser estudadas numa universidade, cada qual em seu respectivo domínio, reivindicam exclusiva validade para o pensamento humano. Mediante essa estridente advocacia da validade exclusiva, os estudantes que querem aprender a pensar são tragados pelo processo mundial de secularização. São, como já foi sugerido, alinhados com o mundo. Entretanto, a Palavra de Deus nos admoesta: “E não vos conformeis com este século, mas transformai-vos pela renovação da vossa mente, para que experimenteis qual seja a boa, agradável e perfeita vontade de Deus” (Rm 12.2). Aquilo que absorvemos por meio do nosso pensamento forma o tipo de pessoa que nos tornamos. O dito: “Diga-me com quem andas e eu te direi quem és” reconhece essa suposição. É possível que eu despenda oito ou nove horas por dia em modos de pensamento baseados em premissas ateístas anticristãs sem ser profundamente influenciado? O pensamento científico certamente tem a aparência de neutralidade. Tal pensamento metodologicamente exclui Deus e assim assegura que ele nada tenha a ver com a construção de máquinas, desenvolvimento de produtos químicos que protegem as plantas de doenças, interpretação de poemas e determinação de datas históricas. No entanto, é precisamente essa reivindicação de neutralidade, essa metodológica exclusão de Deus, que se coloca em contradição com a Sua Palavra. Tal aproximação é ateísta e anticristã. Se adoto esse tipo de aproximação, reduzo Deus a um fenômeno periférico, seja essa minha intenção ou não. Sem que perceba, desprezo grandes porções da sua Palavra a cada dia, e brevemente fico apenas com um deus bem pequeno, relevante apenas para minha vida privada, um deus que não pode me apoiar quando me pressionarem os sérios
  • 39. problemas da vida. Essa minimalização, porém, não ocorre por causa de uma limitação de Deus; antes, ocorre por causa da maneira como eu confino o espaço do reino de Deus. Colhemos aquilo que semeamos (Gl 6.7), e essa verdade se aplica também à nossa vida intelectual. A pesquisa cristã, em contraste, se esforça para depender de Deus na seleção do objeto de estudo, nos meios adotados para o estudo, e nos motivos para o estudo. Tenta confiar em Deus a cada passo. Tal pesquisa não pode “ser autônoma e desimpedidamente subjetiva; antes, tem de ter seu ponto de referência e confirmação direta ou indiretamente colocado na Escritura”.39 O mundo pode não concordar com essa confiança, mas pode partilhar dos frutos desse labor. O que dizer sobre os Cristãos nas Universidades? Alguém poderia levantar outra objeção ao capítulo anterior: Nem todos que ensinaram ou ensinam e/ou estudam nas instituições descritas são ímpios separados de Deus. Entre eles sempre houve e há muitos que são “sábios e nobres”. De fato, muitos foram e são filhos de Deus que fazem brilhar seu testemunho por Jesus. Tudo o que você tem dito sobre a universidade não consiste em colocar sob julgamento pessoas que têm trabalhado segundo seu melhor conhecimento, com consciência limpa e com a maior dedicação? Não é arrogância atacá-los dessa forma? Respondo que não é minha intenção atacar qualquer pessoa. A Palavra de Deus nos admoesta: “Portanto, nada julgueis antes do tempo, até que venha o Senhor, o qual não somente trará à plena luz as coisas ocultas das trevas, mas também manifestará os desígnios dos corações; e, então, cada um receberá o seu louvor da parte de Deus” (1 Co 4.5).
  • 40. Não estou tentando pressionar os filhos de Deus nem acusá-los de permanecer nos seus cargos. Enquanto a universidade mantiver seu monopólio, parece que os filhos de Deus terão de encontrar seu lugar nela debaixo da liderança de Deus. Cada um é chamado a um sério auto-exame diante do Senhor, pois “Quem és tu que julgas o servo alheio? Para o seu próprio senhor está em pé ou cai” (Rm 14.4 a). Minha crítica se aplica à instituição da universidade e à institucionalização da indústria da cultura e da ciência. A crítica não é dirigida a indivíduos, mas contra um sistema. Devemos esclarecer nossa relação com esse sistema; precisamos examinar a nós mesmos. Queremos continuar a nos identificar com ele, expondo-nos às suas influências tal como o fizemos no passado? A Palavra de Deus é clara a esse respeito: “Não vos ponhais em jugo desigual com os incrédulos; porquanto que sociedade pode haver entre a justiça e a iniqüidade? Ou que comunhão, da luz com as trevas? Que harmonia, entre Cristo e o Maligno? Ou que união, do crente com o incrédulo?” (2 Co 6.14-15). Ou para citar um escritor recente: As falsas estruturas conceituais humanas, “sua filosofia e vãs sutilezas, conforme a tradição dos homens” (Cl 2.8) e “toda altivez que se levante contra o conhecimento de Deus” (2 Co 10.5) são como a poluição perigosa dos reservatórios de água que servem nossas casas. Elas iludem e destroem indiscriminadamente, especialmente em nossa cultura, a qual trocou seu antigo fundamento pelos do humanismo e do materialismo. A mídia e o mundo da academia têm se unido, de uma ou de outra forma, ao pensamento humanista, de forma que seria correto afixar o termo “humanista” ao título de cada disciplina científica. Deveriam, os membros dessas disciplinas, que sabem de suas obrigações para com a Bíblia, apenas se assentar passivamente e abandonar o campo sem oferecer resistência? 40 Muito do Trabalho Científico Não Tem Sido Útil? Um quarto agrupamento de respostas ao capítulo anterior segue esta linha: Certamente, nem tudo que tem resultado do trabalho científico em anos recentes é ruim. Você não admite que muita coisa deveria ser considerada útil?
  • 41. Concordo plenamente. Falamos antes sobre as duas faces ou lados da ciência. Deus, em sua fidelidade, paciência e misericórdia continua a assegurar suas bênçãos; pela sua graça, ele concedeu muita coisa benéfica e de utilidade durante todos esses séculos de erro pecaminoso. Entretanto, devido a tal erro pecaminoso, coisas boas têm sido corrompidas e transformadas em coisas danosas e destrutivas. Talvez fosse interessante traçar o curso do pecado, graça e julgamento nas particulares disciplinas, mas não é essa a minha tarefa. Farei alguns comentários exploratórios sobre esse assunto no excurso 2. O que deveríamos fazer agora? Podemos, no final das contas, fazer alguma coisa, ou temos de simplesmente lamentar os séculos de erro e nos purificarmos espiritualmente? Podemos fazer surgir, como por encanto, novos centros de ensino? Que forma eles deveriam ter? Essas são as questões que ocuparão nossa atenção no capítulo 4. “É realmente concebível que Deus, nosso Senhor, que reina Todo-poderoso, tenha feito vistas grossas e permitido que séculos de erros se desenvolvessem dessa maneira? Podemos acolher seriamente a noção de que ele escolheu não intervir enquanto gerações após gerações serviram como enganados enganadores? Não deveríamos considerar aquilo que passou e que está aí como aquilo que deveria ser?” A Palavra de Deus nos dá a resposta a tais questões, as quais exploraremos no capítulo 3.
  • 42. 3 O Antigo Israel e o Ocidente Moderno A Palavra de Deus, escrita para nossa instrução, não nos deixa tentando adivinhar uma solução concernente à questão levantada no final do capítulo 2. Ela nos dá conhecimento e iluminação quanto à maneira que as coisas realmente são. Um Paralelo com a História de Israel Os monstruosos desenvolvimentos que temos traçado do curso da História das Idéias no, assim chamado, Ocidente cristão têm um terrível paralelo na história do povo de Israel, no arranjo dos bezerros de ouro em Betel e Dã. Israel dividiu-se em dois reinos, Judá e Benjamim ao sul, e ao norte, as outras dez tribos. Essa divisão havia sido a reação de Deus ao pecado de Salomão. O rei Salomão havia provocado a Deus permitindo que templos fossem erguidos aos falsos deuses de suas mulheres estrangeiras. Essa iniqüidade acrescia-se erro já cometido, a saber, selar casamentos com propósitos políticos, em rebeldia contra as prescrições de Deus. Deus mesmo havia predito seu julgamento para Salomão; ocorreria logo após a sua morte. Enquanto Salomão ainda estava vivo, o profeta Aias informou Jeroboão ele se tornaria rei sobre as dez tribos. Jeroboão se tornou rei das tribos do norte pela graça de Deus e conforme a vontade de Deus – e o mesmo Jeroboão caiu da graça de Deus e carregou consigo o povo que lhe havia sido confiado: Disse Jeroboão consigo: Agora, tornará o reino para a casa de Davi. Se este povo subir para fazer sacrifícios na Casa do Senhor, em Jerusalém, o coração dele se tornará a seu senhor, a Roboão, rei de Judá; e me matarão e tornarão a ele, ao rei de Judá. Pelo que o rei, tendo tomado conselhos, fez dois bezerros de ouro; e disse ao povo: Basta de subirdes a Jerusalém; vês aqui teus deuses, ó Israel, que te fizeram subir da terra do Egito! Pôs um em Betel e o outro, em Dã. E isso se tornou em pecado, pois que o povo ia até Dã, cada um para adorar o bezerro. Jeroboão fez também santuários nos altos e, dentre o povo, constituiu sacerdotes que não eram dos filhos de Levi. No décimo quinto dia do oitavo mês, escolhido a seu bel-prazer,
  • 43. subiu ele ao altar que fizera em Betel e ordenou uma festa para os filhos de Israel; subiu para queimar incenso. (1 Reis 12.26-31, 33) Embora um profeta de Judá lhe falasse junto ao altar em Betel e tornasse conhecidos os julgamentos por meio de diversos sinais, “Jeroboão ainda não deixou o seu mau caminho; antes, de entre o povo tornou a constituir sacerdotes para lugares altos; a quem queria, consagrava para sacerdote dos lugares altos” (1 Re 13.33). Com a instalação dos “bezerros de ouro” em Israel por razões políticas, o pecado da apostasia foi institucionalizado. A inspiração para isso veio de fora de Israel, de lugares em que o boi era considerado como símbolo de poder. Tal pecado já tinha tradição: Aarão tinha forjado anteriormente a imagem de um bezerro. O pecado estabelece precedentes e (des)encaminha para a imitação. O julgamento do pecado de Aarão e dos filhos de Israel aos pés do Sinai teve lugar há não muitos séculos antes. Não tivesse Moisés intervindo, todo o povo teria sido aniquilado. Ainda assim, Moisés acionou uma punição por causa do pecado, na qual 3.000 homens perderam suas vidas. Esse pecado tinha sido expressamente declarado como pecado. Era de conhecimento comum ao tempo de Jeroboão – mas quão rapidamente isso foi esquecido! Poucos séculos antes de Jeroboão, os levitas ficaram ao lado de Moisés quando Aarão procurou instituir ídolos para adoração. Ao tempo de Jeroboão, o profeta que o confrontou junto ao altar em Betel, onde a idolatria tinha sido institucionalizada, não achou nenhuma pessoa que ficasse abertamente ao seu lado. Estaria, o povo de Israel, a esta altura, já corrompido por permitir que o pecado de Salomão ficasse sem confrontação? Teria o povo permitido que o brilho que Salomão trouxera a Israel os cegasse? Estaria o povo contente com o simples gozo da prosperidade que o reinado de Salomão lhes ocasionara? “Eram, pois, os de Judá e Israel muitos, numerosos como a areia que está ao pé do mar; comiam, bebiam e se alegravam.
  • 44. Dominava Salomão sobre todos os reinos desde o Eufrates até à terra dos filisteus e até à fronteira do Egito; os quais pagavam tributo e serviram a Salomão todos os dias da sua vida” (1 Re 4.20-21). Jeroboão fez uso de uma mentira: “Vês aqui teus deuses, ó Israel, que te fizeram subir da terra do Egito!” Ele postou deuses estranhos em Israel. Enganou o povo. O povo simples dificilmente detectaria o engano; esse povo tomou as palavras mentirosas do rei pelo seu valor nominal. Deixaram de ver através do engano. Muitos israelitas bravos e sinceros de coração sacrificaram em Betel ou Dã sem perceberem que as ofertas sacrificais nesses lugares eram uma abominação ao Senhor! Aqueles que estavam em posição de melhor conhecimento – e deveria haver alguns deles em Israel – preferiram manter seu conforto. Nenhum abriu a boca e se colocou em defesa da honra do Senhor. Todos consentiram – por causa do medo? Por causa da preguiça? Por causa da apatia? Não havia uma pessoa que buscasse a Deus, nem um sequer (veja Rm 3.11-18)? Quão horrendo é o caráter humano, até mesmo do velho profeta (1 Re 13! Ao custo da vida do jovem profeta, por cuja morte foi grandemente responsável, ele confirmou que a profecia era genuína. Porém, o chamado ao arrependimento não prosperou. Aquilo que ele sabia permaneceu como uma peça inútil de conhecimento oculto para ele e seus filhos. Não resultou num chamado ao arrependimento que poderia ter incendido a disposição para uma reviravolta radical. Jeroboão assumiu o papel de governante confiável. Ele fingiu estar preocupado com o povo quando, de fato, sua única preocupação era apenas com sua soberania (“Basta de subirdes a Jerusalém”). Ele usou em seu favor a tendência carnal para a preguiça. Em todos os sentidos, ele estava disposto a apoiar as inclinações da carne; nos santuários sagrados, cada tendência pecaminosa religiosamente dourada foi permitida, e todos os que tinham o
  • 45. desejo de se apresentar nesse papel, foram feitos sacerdotes. A carne pecadora e “piedosa” foi estimulada a se desenvolver sem obstáculos. Desenvolvimentos no Ocidente desde a Idade Média Os padrões bíblicos falam por si mesmo, mas eu gostaria de chamar a atenção para diversas observações que caracterizam os desenvolvimentos desde a Idade Média (veja o capítulo 1) e que fazem paralelo com os relatos do Antigo Testamento há pouco considerados: Primeiro, houve poucos – talvez a princípio apenas um – que conscientemente tomaram a decisão de não considerar mais a Palavra de Deus como normativa. Sua condição social conferiu peso à decisão; isso implica que as pessoas já estavam até certo ponto secularizadas e, por isso, consideram essas pessoas em vez de Deus. Uma pessoa, ou a ínfima maioria, se torna a instigadora da tendência. Segundo, a tendência sempre presente para a carne e para o pecado foi fortalecida e recebeu legitimidade por causa da liderança seguida. Essa tendência foi estimulada a desenvolver-se sem quaisquer obstáculos. O padrão tornou-se a vida segundo as tendência carnais em vez da vida dirigida pelo Espírito. A carne, em sua hostilidade a Deus, foi estabelecida e institucionalizada. Terceiro, uma vez que a vida carnal foi declarada como “normal”, uma sedutora contracorrente foi acionada. Assegurou-se a cada indivíduo fazer de si mesmo o que quer que queira. Aquilo que, a princípio, tornava-se possível por permissão oficial e assistência, logo se transformou num direito esperado, como quando no tempo de Jeroboão pessoas desqualificadas eram ordenadas sacerdotes. Cada um poderia fazer o que quisesse na medida de suas habilidades e meios disponíveis. A questão sobre aquilo que Deus tinha em mente não era mais relevante. O homem decidia
  • 46. seus objetivos de vida de maneira autônoma, sem consultar a Deus. Qualquer um que não se conformasse com tal padrão sofreria grande pressão. Quarto, a tendência foi orientada pelo interesse daqueles que estavam no poder. Primeiramente, eram os príncipes que anelavam o prestígio trazido por uma universidade em seus territórios e que esperavam se beneficiar dessa aquisição. Hoje, o prestigio nacional continua a desempenhar um papel, embora interesses econômicos exerçam papel mais influente; tais interesses têm poder para determinar o conteúdo do currículo. Isso pode ser percebido se levarmos em conta o tipo de instrução matemática introduzido já nas escolas de ensino fundamental. No mesmo sentido, tudo é calculado para inculcar a cosmovisão humanista e a “tolerância” que permeia a cada um seu próprio desejo e deixa que cada um seja abençoado como lhe agrada. “Was nicht verboten ist, ist erlaubt Fragt hier keiner, was einer glaubt.”41 Essa é a tolerância militante contra qualquer pessoa que não se permita ser pressionada para encaixar no molde desejável para o cidadão do futuro império mundial unificado. Quinto, a tendência busca um monopólio institucional e se torna fator condicionante. Aquilo que esse monopólio considera como “factual” vem a ter força normativa.42 De maneira circular, o mesmo monopólio fornece álibi à tendência ímpia por meio da participação de muitos que a promovem e, assim, criam uma aura de instituição legitimada. Fazem isso com a melhor das intenções e porque aparentemente não têm outra opção.
  • 47. Sexto, aquele que se compromete com essa instituição não mais vê essas coisas do ponto de vista de Deus. Sua percepção de Deus assume uma qualidade acentuadamente refratária. Sétimo, A visão de Deus acerca dessa instituição é que ela participa do pecado.
  • 48. 4 A Educação Cristã no Nível Universitário Uma educação acadêmica que seja cristã em projeto – não apenas de nome, mas em autêntica obediência ao nosso Senhor e Salvador Jesus Cristo – somente poderá ser estabelecida em consciente dissociação da moderna universidade européia e sua história, incluindo as emanações histórias como as que tomaram forma na América, África e Ásia. Isso significa também dissociação da prática de instituições em que o ponto de partida intelectual anticristão seja confrontado somente com uma apresentação basicamente evangélica. Não será suficiente que professores e estudantes sejam cristãos e que comecem suas atividades com oração. O conteúdo das atividades tem de ser fundamentalmente transformado desde o alicerce. Áreas inteiras de indagação terão de ser fundadas na Palavra de Deus. “A Bíblia provê a infraestrutura para a indagação intelectual. Sem essa infraestrutura toda ciência será um empreendimento estulto.”43 O empreendimento de colocar à disposição centros de educação de nível universitário que sejam leiais à Bíblia certamente sofrerá objeções críticas. Até mesmo observadores simpatizantes expressão mal-entendidos tais como: “Será um objetivo realmente manejável?” ou “Com o que se pareceria tal coisa, se é que seja realmente necessária?” Consideremos então essas e outras objeções e questionamentos. Objeções a uma Educação Cristã A primeira objeção certamente fará referência à inevitabilidade do resultado dos desenvolvimentos históricos. Seremos acusados de fazer tentativas inúteis para retornar à Idade Média. Um retorno à Idade Média, entretanto, não seria bastante para nós, pois a
  • 49. teologia desse período, como já foi visto, coloca a filosofia pagã de Aristóteles como uma segunda fonte de influência do neoplatonismo cuja presença então já se fazia sentir. Ser-nos-á declarado a impossibilidade de fazer voltar atrás as rodas da história e que teremos de tratar com as condições que encontramos hoje. Duas coisas podem ser ditas quanto a isso. Primeiro esse tipo de conversa é baseado em puro engano uma vez que personifica e atribui poder à história. Esse pode que é inerente a Deus – porque ele governa e dirige os destinos dos povos – retirado dele e dado à história, a qual assume o governo como se fosse um sujeito impessoal. A freqüentemente invocada roda da história parece ser uma modificação da roda de renascimentos, a qual é um conceito familiar nas religiões budista e hindu. Segundo não é de modo nenhum nossa intenção a de voltar atrás ou colocarmo-nos contra o desenvolvimento histórico. Antes, queremos nos tornar para o Deus vivo, nosso Criador e Pai de nosso Senhor e Salvador Jesus Cristo. Queremos adentrar em sua luz em toda esfera do pensamento, incluindo educação, cultura e ciência, para que ele nos perdoe e mos instrua. Ele foi quem fez a promessa segura de que concederia sabedoria àquele que lhe pedisse (Tg 1.5). Certamente, ele não nos negará a graça para um novo começo. Outra objeção é a de que, dado os altos custos, não haveria como pagar a fundação de centros de educação de nível universitário leais à Bíblia – centros que ofereceriam educação em todo o espectro das disciplinas acadêmicas e que realizariam as pesquisas essencial para levar a cabo a empreitada. O projeto é desprezado como não-realista devido à presunção de que é impossível levantar os fundos para a construção e equipamento desses centros. Seria impossível de se levantar os fundos imensos necessários para a pesquisa. A isso se pode dizer o seguinte:
  • 50. Uma universidade cristã digna do nome colocar-se-ia sob a direção de Deus com respeito à questão daquilo que deveria investigar. Isso aliaria um pouco o custo de muitas áreas dispendiosas que foram iniciadas em oposição à vontade de Deus e que contribuem somente para a glorificação do homem. A dinâmica subjacente a este ponto na universidade é a competição. Isso tem dado origem a um grande número de estabelecimentos e instituições similares. Faculdades leais à Bíblia não teriam necessidade de duplicação de serviços. A investigação cristã da criação tem seu ponto de partida na Palavra de Deus. Isso evita muita apalpadela no escuro que resulta numa série de dispendiosos experimentos. A erudição cristã – no sentido de realmente buscar a honra de Deus – é dirigida pelo Espírito de Deus. Ele pode conduzir diretamente a meios eficientes e econômicos de investigação. Para ser mais sucinto, a objeção assume como certas as condições hoje correntes na universidade e não leva em conta os fatores especiais que poderiam afetar uma faculdade leal à Bíblia. Além disso, deve-se considerar que todos os recursos vêm das mãos do Criador. Ele certamente não negará sua bênção a um empreendimento que começa com o retorno das pessoas a ele com a determinação de que não mais serão cúmplices de seus pecados passados. Tudo é realmente uma questão de bênção de Deus. Basta considerar as instituições cristãs que vieram à existência anteriormente (escolas primárias e secundárias, centros de estudo e faculdades cristãs) para ver quão maravilhosamente nosso Pai dos céus as manteve e cuidou dos seus caminhos. Na verdade, não lhe faltam meios. Um outra objeção que certamente deverá ser levantada: Há total carência de pessoal requerido para o estabelecimento de faculdades, que mantenha o nível universitário e a lealdade à Bíblia, e que cubra satisfatoriamente todas as disciplinas. Pelo contrário, percebo com surpresa e gratidão a Deus que nosso Pai dos céus já tem preparado pessoas nas
  • 51. diversas disciplinas. Ele tem habilitado muitas pessoas para esse empreendimento, as quais também já tem se pronunciado sobre esse conjunto de questões que ora levanto. Realmente, Deus tem preservado, em todas as disciplinas, um ou mais dos “sete mil... que não se dobraram a Baal” (1 Re 19.18). Mesmo que a princípio não seja possível reunir o número de professores necessários para uma única faculdade leal à Bíblia, pelo menos teria sido iniciado o processo de multiplicação de pensadores com mente semelhante. Professores com credenciais acadêmicas adequadas poderiam ser habilitados para subseqüentes faculdades leais à Bíblia. Além disso, parte da informação poderia ser passada usando as possibilidades da multimídia.44 O centro de educação leal à Bíblia não tem de saltar de pronto à existência. É possível se iniciar o programa educacional previsto através de medidas preliminares tais como um ano de estudo introdutório antes da ir para a faculdade em outro lugar. Isso poderá motivar os professores e dar-lhe uma oportunidade para avaliar suas áreas de especialidade à luz da Palavra de Deus. Estruturando a Educação Cristã Prestando serviço ao Corpo de Cristo Um centro de educação leal à Bíblia deveria ser entendido como uma prestação de serviço ao e no corpo de Cristo. O trabalho e a vida tanto dos que estudam quanto dos que ensinam deveriam ser determinados pelo princípio fundamental do discipulado. Isso envolve: • Atenção dedicada à Palavra de Deus (lealdade e meditação diária em relação à Palavra de Deus); • Prática da Palavra (imitação de Cristo, andança na luz e santificação);
  • 52. • Testemunho de Cristo; • Disposição para o arrependimento; • Disposição para servir; • Participação na vida cristã corporativa (responsabilidade mútua na comunhão, dar e receber comunhão, encorajamento e admoestação fraternais, juntamente com a intercessão e o interesse mútuo); • Disposição para trabalhar sob direção de outros; • Orientação da vida sob direção de Deus; • Aguardo na presença do Senhor. Deve-se presumir que os professores exibirão tais qualidades segundo graus pessoais de maturidade espiritual. Quanto aos estudantes, o centro de educação leal à Bíblia participa da comissão dada por Jesus: “Ide, portanto, fazei discípulos de todas as nações ... ensinando-os a guardar todas as coisas que vos tenho ordenado” (Mt 28.19-20). Ser um discípulo de Cristo num ambiente acadêmico não pode ser aprendido meramente antes da experiência educacional, mas tem de ser parte da educação. Por isso, tal instrução não pode simplesmente servir aos interesses da competência profissional. Tem de manter diante de si o objetivo de ajudar os estudantes a crescer na emulação de Cristo. Da mesma maneira, terá de manter a comunhão cristã, da qual a responsabilidade corporativa cotidiana é uma necessidade incondicional, por dois ou três anos, pelo menos. Um ano apenas é um período muito curto para produzir o impacto necessário. Colocando a Palavra de Deus no Centro Uma vez reconhecido que a Palavra de Deus é o fundamento de toda a educação, os estudantes, sem considerar diferentes especialidade, deveriam receber um bom
  • 53. embasamento na Palavra. Isso inclui tanto a informação sobre a Bíblia quanto o entendimento sistemático daquilo que a Bíblia ensina. A apresentação sistemática do que a Bíblia ensina deveria cobrir áreas tais como o plano de Deus para a salvação, uma apreensão plena dos conceitos bíblicos básicos, e fundamentos de uma hermenêutica realmente bíblica. Junto com a informação sobre a Bíblia e com o entendimento sistemático daquilo que a Bíblia ensina, os estudantes deveriam ser ensinados sobre as bases bíblicas para todas as áreas de estudo. Isso seria requerido de todos os estudantes, com especialização adequada a cada disciplina em particular. Nem Teologia nem Filosofia Fundacional• Recomendo que se evite a inclusão da teologia como assunto básico. O próprio conceito de teologia, em minha opinião, traz exagerada conotação de sistemas humanamente concebidos. Isso poderia facilmente orientar os estudantes na direção errada. Eles não deveriam ser instruídos em construtos teológicos; deveriam, antes, tornarem-se arraigados de maneira mais profunda e larga na própria Palavra de Deus, a qual provê a infraestrutura cognitiva para o trabalho em particulares disciplinas. A filosofia, semelhantemente, parece-me problemática como objeto basilar, até mesmo quando existe a tentativa de atribui-se novo conteúdo transformando-a em uma teoria cristã da ciência. Em longo prazo a tendência básica dessa disciplina em sua concepção original acabará mostrando suas cores verdadeiras. Haveria um espaço legítimo para a filosofia num centro de educação leal à Bíblia? A filosofia tal como tem sido ensinada na universidade tem diversos aspectos. A ênfase Nota do trad. para o português: O termo fundacional é um neologismo necessário para diferenciar do termo “fundamental”. Para um estudo sobre o assunto, ver Davi Charles Gomes, “A Suposta Morte da Epistemologia e o Colapso do Fundacionalismo Clássico”, Fides Reformata, Centro Presbiteriano de PósGraduação Andrew Jumper, Vol. V., No. 2, Julho-Dezembro 2000, os. 115-42. 
  • 54. repousa na história da filosofia – a escolha, avaliação e vista geral dos vários sistemas filosóficos. Menor ênfase é dada ao novo sistema filosófico que emerge dessa história, tanto como aplicação da visão geral dessa disciplina quanto (raramente) como resultado de um novo ponto de partida genuinamente original. Outros aspectos da disciplina incluem os fundamentos filosóficos da ética assim como os de áreas particulares, tal como filosofia da arte e da história. Uma filosofia cristã é uma contradição de termos. Nós, cristãos, não devemos nos entregar à busca da sabedoria e da verdade por causa do amor à sabedoria humana. Deus se nos revelou em seu Filho e em sua Palavra. A busca da verdade que vá além da Palavra de Deus implica em pecado. Revolver antigas e novas filosofias para coletar lascas úteis de verdade e de conhecimento é uma empreitada duvidosa; a busca acaba abandonando as fontes de águas vivas e construindo cisternas rotas que não retêm água (Jr 2.13). A história da filosofia é a história da sabedoria humana pela qual o homem suprime a verdade de Deus em favor da injustiça (Rm 1.18). Ela deve ser avaliada espiritualmente à luz da Palavra de Deus. Tal análise da história da filosofia é certamente uma área essencial de estudo numa universidade cristã. Não deveria, entretanto, ser estabelecida como disciplina distinta, mas como parte de uma área maior de crítica (veja no subtítulo que se segue). Se não for assim, haverá o perigo de uma desastrosa mudança de ênfase. A filosofia é transformada outra vez em um fim em si mesma, e surgem os filósofos “cristãos”. Devido ao compreensível compromisso ao assunto que representam, seus professores se dispõem então a legitimar a filosofia “cristã”. Seu zelo e exemplo levam outras pessoas a se desviar da simplicidade da Palavra de Deus, para as arrogantes estruturas do pensamento humano. Submeter a história da filosofia à área da crítica protege os professores e os estudantes.
  • 55. É certo que os pais da igreja, tal como Agostinho, usaram o pensamento filosófico. Não deveríamos, no entanto, considera-los como exemplos encorajadores a serem emulados, mas, antes, advertências para sermos vigilantes no sentido de que não abandonemos a fonte de águas vivas. Vejo como infeliz a declaração de Agostinho, em De doctrina christiana, de que os cristãos podem usar o espectro das ciências pagãs da maneira como os israelitas usaram os valores egípcios. Deve-se observar de passagem que essas mesmas riquezas foram provavelmente o material de que foram feitos os bezerros de outro, no Sinai. Infelizmente, os bezerros de ouro do cristianismo foram feitos das riquezas das filosofias pagãs. Fazendo a Crítica Fundacional “Porém o homem espiritual julga todas as coisas, mas ele mesmo não é julgado por ninguém” (1 Co 2.15). “Ou não sabeis que os santos hão de julgar o mundo? Ora, se o mundo deverá ser julgado por vós, sois, acaso, indignos de julgar as coisas mínimas? Não sabeis que havemos de julgar os próprios anjos? Quanto mais as coisas desta vida!” (1 Co 6.2-3). Em face do ataque movido por este mundo, nós, cristãos, temos de adotar uma postura defensiva na área da crença cristã; temos apelado à apologética. Seria mais interessante, entretanto, assumir uma posição de crítica baseada na Palavra de Deus com respeito ao mundo que confrontamos. Desde de o surgimento do humanismo, costumamos a ter nossa fé criticada em cada canto do ensino acadêmico. Deveríamos considerar, desta vez, aquilo que a Palavra de Deus tem a dizer sobre essas áreas acadêmicas. Afinal, em algumas situações, a melhor defesa é o ataque. Sobretudo, dessa maneira evitaremos nos encontrar exatamente nos mesmos passos que o mundo. Não seremos culpados de esconder do mundo a Palavra clara que fomos comissionados para proclamar.
  • 56. Pela graça de Deus, temos visto mais e mais sinais dessa clara proclamação baseada na Palavra de Deus. Autores tais como Francis Schaeffer e Arthur Ernest Wilder podem ser citados como exemplos populares, e publicações em séries como Wort und Wissen, Wissen und Leben, e Tagesfragen seguem a mesma linha.45 Em contraste, a apologética se propõe a lidar com ataques diretos à Palavra de Deus. Tem uma função primariamente defensiva. Podemos vê-la como uma disciplina incluída o título mais abrangente da crítica, embora seja preferível discuti-la em conexão com cada particular área de estudo sob ataque. Proponho uma organização do âmbito intelectual da crítica da maneira como esquematizada na fig. 4.1:46 Fig. 4.1 O Âmbito Intelectual da Crítica   Crítica da Filosofia (Philosophie)  Crítica da Arte (Künste)  Crítica das tendências intelectuais coetâneas (Zeitsrömugen)  Crítica da Apologética (Apologetik)  Crítica das Ciências (Wissenschaften) a) Crítica geral e crítica das filosofias da ciência b) Princípios, teses particulares ou resultados de relevância especial c) c) Crítica das particulares disciplinas científicas Crítica das Heresias (Härsien)  Crítica do pecado em evidência na vida coetânea (Zeitsünden) Ex.: promiscuidade, aborto, homossexualismo, ocultismo Projetando Cursos para Enriquecer Ministérios Estudantis Uma vez que a faculdade é reconhecida como uma organização de serviço, os cursos de estudo devem se alinhar aos objetivos dos futuros ministérios dos estudantes. O estudo formal se coloca a serviço da auto-realização e do desenvolvimento harmônico da personalidade; objetiva antes facilitar o melhor preparo para o ministério à frente.
  • 57. Espera-se dos estudantes que concentrem seus esforços em seu trabalho, o que se expressa em estudo disciplinado e eficiente. Unindo Teoria e Prática, Estudo e Ministério Planejar o curso do estudante com vistas ao futuro ministério implica inevitavelmente uma constante mistura de teoria e práxis. Isso não ocorre apenas por causa do tipo de serviço para o qual estudante se prepara para realizar, mas também porque o estudante já foi chamado para o serviço do Senhor. Atividades missionárias e oportunidades normais para o ministério cristão devem estar firmemente embutidas no curso de estudo. Avaliando Mais do que Desempenho Acadêmico Precisamos apresentar, em algum lugar, o que temos feito e por algum tempo no instituto Bíblico, em Batu, Indonésia, onde leciono na época deste escrito: Os estudantes são avaliados não somente na base de seu desempenho acadêmico, mas em vista de sua maturidade espiritual e da qualidade de seu serviço espiritual. Organizando uma Instituição Cristã Não se deve esperar que uma instituição educacional leal à Bíblia seja plenamente estabelecida de um só passo. O plano deveria ser o de alcançar o objetivo por meio de estágios. No sentido dessa finalidade, diversas questões fundamentais já têm sido discutidas e colocadas, e diversas aproximações têm sido mencionadas. Já existem centros isolados de educação teológica.47 Já existem também instituições em que os estudantes podem buscar um ano de estudo concentrado de um ponto de vista cristão, antes de entrarem na universidade secular.48 Há planos em execução, na Holanda, para uma universidade completa. Preocuparse-á primeiro com as disciplinas que tem sido especialmente atacadas pela moderna
  • 58. cosmovisão anticristã, e desenvolverá de início programas nas áreas de teologia, jornalismo e pedagogia. Vem também da Holanda uma observação útil com respeito ao custo das várias disciplinas. Aqueles que puderem ser estabelecidas mais economicamente deverão ter preferência no desenvolvimento inicial.49 À luz dessas várias observações, talvez a seguinte estratégia para uma seqüência de ação se mostre funcional: Primeiro estágio de desenvolvimento: um ano de estudo básico para estudantes de todas as disciplinas. Parte do conteúdo de estudo seria geral, parte especificamente relacionada a particulares disciplinas. Segundo estágio de desenvolvimento: educação teológica. Além do estudo básico, ocorreria o treinamento teológico para preparar estudantes como pastores, evangelistas, missionários e professores de religião de nível primário e secundário.50 Poderia haver também treinamento de professores de nível primário e, ainda, teorias educacionais sociais, jornalismo e possivelmente instrução básica em música eclesiástica. Terceiro estágio de desenvolvimento: treinamento de professores. No nível secundário, tal treinamento poderia compreender disciplinas inteiras em áreas tais como lingüística, estudos religiosos (incluindo religiões mundiais e fenomenologia da religião), direito e economia. Quarto estágio de desenvolvimento: cursos de extensão. Seriam incluídos programas tais como ciências naturais, medicina e farmácia.