SlideShare una empresa de Scribd logo
1 de 4
Descargar para leer sin conexión
John Gray, nesta entrevista, fala de sua concepção sobre o progresso.
     Trata-se de um interessante ponto de vista, do qual muitas outras ideias participam.




O peso das ilusões
      Para o pensador inglês, a fé no progresso é uma ilusão, o homem não é dono de seu destino e os
      avanços científicos nada têm a ver com a ética.

Thereza Venturoli

O inglês John Gray, professor de pensamento europeu na London
School of Economics, de 57 anos, é homem de frases curtas e
categóricas, como "o conhecimento não nos torna livres" ou
"nenhum projeto político pode salvar a humanidade de sua condição
natural". Com afirmações como essas, ele declara, em seu mais
recente livro, Cachorros de Palha (Editora Record), seu ceticismo
com relação à tradição cultural do Ocidente. Gray acusa o
humanismo secular moderno, que embebe a filosofia, a política e a
ciência, de herdar do cristianismo a idéia – ilusória, segundo ele –
de que o homem tem papel central no universo. Para o autor, ao
contrário, o Homo sapiens não é mais do que uma espécie cuja
passagem pelo planeta é efêmera e cujo destino é selado pelas
mesmas leis naturais que regem as demais formas de vida.
Pessimismo? Segundo Gray, a mensagem do livro não é de
desespero, mas de libertação. Ele quer livrar o homem das ilusões que o fazem se sentir
responsável por "carregar a Terra sobre os ombros". Até porque não adiantaria nada.

Veja – Uma das teses centrais de seu livro Cachorros de Palha é a de que a crença no progresso é
uma ilusão. Mas não seria essa crença uma necessidade, digamos, darwiniana dos seres humanos
– um traço desenvolvido pela espécie por favorecer sua sobrevivência?
Gray – A crença no progresso não tem necessariamente uma razão evolutiva, não faz parte da
biologia humana, em absoluto. É algo que data do século XVIII, ou seja, de cerca de dois séculos
apenas. Afora aquelas que têm um sentimento religioso, as pessoas que acreditam em alguma
coisa hoje acreditam no progresso – e só no progresso. Para elas, as futuras gerações sempre
viverão melhor do que as anteriores, e a humanidade avança no conhecimento como avança na
ética e na política. Mas isso é um mito, uma ilusão nociva, porque muitas vezes nos cega para
grandes problemas e nos impede de perceber que, quando pensamos estar progredindo, na
verdade estamos regredindo.

Veja – Também na ciência o progresso é uma ilusão nociva?
Gray – Na ciência e na tecnologia o progresso é real, mas só faz aumentar o conhecimento e o
poder do homem, e esse poder pode ser usado tanto para os mais benignos objetivos quanto para
os mais desastrosos. Quando o conceito de progresso é aplicado à ética e à política, ele é uma
ilusão perigosa. Veja-se, por exemplo, o caso dos gregos e dos romanos antigos. É claro que eles
acreditavam no desenvolvimento de novas ferramentas. Mas eles não transferiam essa noção de
progresso técnico para a ética ou a política. É óbvio, também, que eles acreditavam no bem e no
mal, que as sociedades podiam ser melhores ou piores, e que a prosperidade é preferível à fome e
à pobreza. No entanto, para gregos e romanos, os jogos da ética e da política estavam sujeitos a
avanços e retrocessos. Ou seja, a história humana era cíclica, com diferentes períodos se
alternando, como ocorre na natureza.
Veja – O senhor discorda de qualquer pensamento que considere o homem como o centro do
universo. Mas é possível existir uma moral que não seja antropocêntrica?
Gray – Sim, é possível. Na verdade, na maior parte da história, a moralidade não foi
antropocêntrica – nem no budismo nem no taoísmo, por exemplo. O antropocentrismo é
característica do cristianismo e do humanismo secular – que nada mais é do que uma versão do
cristianismo sem Deus. Como qualquer outro animal, o homem também aspira ao bem-estar. E o
bem-estar humano é em muitos pontos similar ao bem-estar dos outros seres vivos. Eu sustento
que o homem é um animal como outro qualquer, produto do mundo natural e passível de ser
eliminado por mudanças ambientais, como ocorreu com muitas outras espécies no passado.

Veja – Se o homem é um animal como outro qualquer, como nossa espécie chegou a dominar o
mundo?
Gray – O homem é um sucesso evolutivo: desenvolveu uma linguagem sofisticada, uma incrível
capacidade de construir ferramentas e de registrar e transmitir uma memória cultural. Alguns
grandes primatas também detêm algumas dessas habilidades. A diferença é que nenhum deles
atingiu o nível alcançado pelos humanos. Some-se a essa habilidade uma extrema ferocidade –
que também não é característica única de nossa espécie – e temos aí as condições que permitiram
ao homem tornar-se a espécie dominante do planeta. Mas é um engano pensar que o homem
tenha conquistado a Terra. Somos a espécie dominante simplesmente porque eliminamos grande
parte da biosfera. E, ao fazermos isso, geramos condições pouco promissoras para nossa própria
sobrevivência. O poder que temos sobre o meio ambiente não nos dá o controle sobre ele. O
homem tem muito poder, a ponto de destruir a Amazônia, mas não o poder de recompor a mata
rapidamente. Ora, se você não tem o poder de redesenhar a biosfera, então não tem o controle
sobre o planeta. Assim, acho praticamente impossível que se concretize a previsão de que a
população humana chegue aos 8 ou 9 bilhões de pessoas daqui a cinqüenta ou sessenta anos,
vivendo em certo nível de prosperidade, sem que se desestabilize a ecologia do planeta. Calculo
que, daqui a um século, a população mundial terá encolhido bastante. E essa queda poderá se dar
de duas maneiras: uma seria pelo declínio da taxa de fertilidade, como já acontece em países como
Japão e Itália. Outra, por meio de guerras, doenças e pelos efeitos deletérios das mudanças
climáticas. Se eu tivesse de apostar, apostaria na segunda opção. Seja como for, o sucesso do
homem no planeta é real, mas extremamente precário e muito mais curto que o de outras espécies,
como os dinossauros, que dominaram o planeta por milhões e milhões de anos. Pode acabar muito
em breve.

Veja – As habilidades humanas sempre trazem conseqüências negativas, então?
Gray – Nem sempre. As habilidades do homem produziram, por exemplo, a anestesia. Quem
gostaria de tirar um dente como se tirava no início do século XIX, sem nenhuma anestesia? No
entanto, essas mesmas habilidades causaram guerras mais devastadoras, criaram novos tipos de
arma, e aumentaram nossa capacidade de cometer atrocidades numa escala jamais vista. E os
assassinatos em massa são um efeito colateral do progresso tecnológico. O homem sempre usou
as ferramentas que cria para abater seu semelhante, desde a pré-história. Mas o genocídio é uma
prática dos tempos modernos. Entre 1492 e 1990, ocorreram cerca de 36 genocídios, que ceifaram
de dezenas de milhares a dezenas de milhões de vidas. Só de 1950 até hoje, foram cerca de vinte
grandes matanças, ao menos três delas – em Bangladesh, Camboja e Ruanda – com mais de 1
milhão de vítimas. Não há dúvida de que os seres humanos herdaram esse comportamento
violento de alguns de seus parentes na linha evolutiva. Como o biólogo americano Edward O.
Wilson observou uma vez, se alguns de nossos primos babuínos tivessem acesso a armas
nucleares, o mundo já teria sido devastado há muito tempo.

Veja – O cientista americano Ray Kurzweil diz que o desenvolvimento tecnológico –
particularmente a biotecnologia, a nanotecnologia e a teoria da informação – trará um futuro
promissor para a espécie humana. Onde está a falha nessa idéia?
Gray – A falha está em pensar que esse progresso seja real. A ciência, no geral, chega mais perto
da verdade do mundo que outros sistemas de crença, e nós temos testemunhado seu sucesso
pragmático em aumentar o poder humano. Mas, do ponto de vista ético, o conhecimento é neutro,
desprovido de valor – pode tanto nos levar a realizações maravilhosas quanto atender a propósitos
terríveis. A ciência não é feitiçaria. Deixe-me dar um exemplo do que é a ilusão no poder científico:
na Califórnia, as pessoas contratam organizações para ter seu corpo congelado assim que
morrerem. Esperam voltar à vida quando a tecnologia assim o permitir, daqui a um século ou dois.
A ilusão não está em pensar que a tecnologia tornará isso possível – provavelmente tornará, um
dia. A ilusão está em não imaginar o que acontecerá nos próximos 100 ou 200 anos. Se a história
se repete em seus aspectos éticos e políticos, como eu acredito, haverá várias quebras nas bolsas
de valores, ataques terroristas, guerras civis, mudanças de regime e talvez até outras guerras
mundiais. Nesse processo, muita coisa vai mudar: o direito à propriedade poderá ser abandonado,
empresas quebrarão e governantes serão substituídos. É muito difícil que um contrato assinado
hoje com uma empresa californiana possa sobreviver aos próximos séculos. Em outras palavras,
mesmo que a tecnologia se desenvolva a ponto de levar o homem à imortalidade, as instituições e
a sociedade na qual vivemos não são imortais, um dia acabarão.

Veja – Então o limite para o progresso não está na ciência, mas na sociedade?
Gray – A ilusão está em não perceber que, por mais que o conhecimento avance, as instituições
impõem um limite. É completamente possível que a genética chegue à clonagem humana, talvez
não tão já, mas daqui a cinqüenta anos. Eu faço uma predição: se isso se realizar, a tecnologia
será usada por terroristas e organizações criminosas para criar seres humanos insensíveis à
piedade e à simpatia, e soldados ou assassinos que jamais precisem dormir. Não duvido que a
genética traga muitos benefícios para a humanidade, erradicando distúrbios, corrigindo deficiências
e curando doenças. Mas é claro que a genética pode, também, ser usada no desenvolvimento de
novas armas e na perpetração de mais genocídios.

Veja – Mas não foi sempre assim, a ciência e a tecnologia podendo ser usadas tanto para o bem
quanto para o mal?
Gray – Absolutamente, sim. Mas ainda não aprendemos a lição. Lembro-me de quando as pessoas
imaginavam que as fotocópias acabariam de vez com as falsificações. Mais tarde, o mesmo
ocorreu com as câmeras de vídeo. Tudo não passou de ilusão. Hoje acontece o mesmo: as
pessoas vêem a internet como um instrumento de liberação, mas ao mesmo tempo ela torna nossa
privacidade muito difícil. Tudo o que você faz eletronicamente pode ser monitorado. Eu repito: o
conhecimento não liberta o homem, apenas aumenta seu poder – um poder que pode ser usado
para o bem ou para o mal. Nesse ponto, sou um pessimista: o futuro da humanidade será igual a
seu passado, só que com mais conhecimento.

Veja – Se a felicidade e a salvação humanas não estão na ciência e na tecnologia, onde estão
elas?
Gray – A ciência não é essencial para a felicidade. Basta lembrar que milhões e milhões de
indivíduos têm vivido felizes ao longo de toda a história, mesmo sem acreditar no progresso. Na
essência, nosso sentimento de felicidade não é diferente do sentimento do homem que viveu no
Império Romano ou na Índia de Buda, cinco séculos antes de Cristo. Isso não mudou. A única coisa
que mudou foram o conhecimento e o poder humanos, que cresceram muito.

Veja – Qual o papel da religião hoje?
Gray – Acho que a religião tem um papel central na cultura humana. Não acredito que existam
religiões verdadeiras ou falsas – apenas as mais e as menos bonitas, ou as mais e as menos
esperançosas. Quem gosta de religião se aproxima mais da poesia do que da ciência. A religião
ocidental tem se intimidado por rivalizar com a ciência. Mas a ciência diz respeito ao poder, não dá
um sentido à vida – isso é função da religião. E precisamos de mitos, de ilusões. Nem todo o
avanço científico pode eliminar a religião, pois suas raízes não estão na ignorância, mas na
necessidade humana de buscar um sentido para as coisas. Prova disso é que, para muitas
pessoas, a ciência – com sua promessa de eterno progresso – torna-se ela mesma uma religião.
Veja – Os Estados Unidos, líderes mundiais em ciência e tecnologia, enfrentam hoje um
renascimento do fundamentalismo cristão, particularmente nos embates entre evolucionistas e
criacionistas. Como o senhor vê esse conflito?
Gray – O conflito entre ciência e religião é uma peculiaridade das culturas moldadas pelas
tradições ocidentais, que dão uma importância exagerada à fé nos assuntos do espírito. A briga
entre evolucionistas e criacionistas nos Estados Unidos é um modo com que o fundamentalismo
cristão resiste às implicações antiantropocêntricas da teoria da seleção natural do inglês Charles
Darwin. Esse conflito não acontece com a mesma intensidade nas culturas ligadas ao budismo e ao
taoísmo, por exemplo, que são religiões nas quais as práticas e as experiências místicas importam
mais do que a crença em si.

Veja – O senhor diria que existem religiões que conflitam menos com a ciência?
Gray – Religiões não-antropocêntricas, como o taoísmo, parecem mais próximas do mundo que
nos é apresentado pelo que há de mais avançado na ciência contemporânea. E, porque pregam
uma certa modéstia sobre o lugar dos seres humanos no esquema das coisas, essas religiões são
mais capazes de promover a felicidade. No entanto, recomendo também algumas filosofias
ocidentais, como o epicurismo. O grande poema A Natureza das Coisas, de Lucrécio, é um antigo
guia para viver feliz num mundo em que o homem não é a figura central.

Veja – Para o leitor, seu livro pode deixar um certo sabor de desesperança. Qual a saída? Ou não
há saída?
Gray – A mensagem central de Cachorros de Palha não é de desesperança, mas de libertação. O
que eu pretendo é sugerir ao leitor: leve sua vida da maneira mais bela e inteligente possível, pois o
destino da Terra não está sobre seus ombros. Na verdade, foi assim que viveu a maioria dos
milhões e milhões de seres humanos que já passaram pelo planeta. A necessidade de acreditar
que o futuro será melhor é uma ilusão. A felicidade não vem daí, mas de aceitar a nossa natureza
animal, que, ao contrário das crenças, é imutável.



Fonte: Revista Veja, Edição 1932 - 23 de novembro de 2005.

Más contenido relacionado

La actualidad más candente

A ciência e os seus limites
A ciência e os seus limitesA ciência e os seus limites
A ciência e os seus limites
mluisavalente
 
A propósito da utilização de células tronco embrionárias
A propósito da utilização de células tronco embrionáriasA propósito da utilização de células tronco embrionárias
A propósito da utilização de células tronco embrionárias
Thuane Sales
 
18 texto-argumentativo-exercc3adcios-gabriella-pni
18 texto-argumentativo-exercc3adcios-gabriella-pni18 texto-argumentativo-exercc3adcios-gabriella-pni
18 texto-argumentativo-exercc3adcios-gabriella-pni
Olivier Fausti Olivier
 
Auxiliar de biblioteca
Auxiliar de bibliotecaAuxiliar de biblioteca
Auxiliar de biblioteca
John Porangaba
 
Apostila de interpretação textual textos do blog parte 2
Apostila de interpretação textual textos do blog parte 2Apostila de interpretação textual textos do blog parte 2
Apostila de interpretação textual textos do blog parte 2
Antônio Fernandes
 

La actualidad más candente (11)

Neomalthusianismo
NeomalthusianismoNeomalthusianismo
Neomalthusianismo
 
O mundo rumo ao colapso total
O mundo rumo ao colapso totalO mundo rumo ao colapso total
O mundo rumo ao colapso total
 
A ciência e os seus limites
A ciência e os seus limitesA ciência e os seus limites
A ciência e os seus limites
 
Expressão lição-07 2016 - 2ºtrimestre
Expressão   lição-07 2016 - 2ºtrimestreExpressão   lição-07 2016 - 2ºtrimestre
Expressão lição-07 2016 - 2ºtrimestre
 
A propósito da utilização de células tronco embrionárias
A propósito da utilização de células tronco embrionáriasA propósito da utilização de células tronco embrionárias
A propósito da utilização de células tronco embrionárias
 
18 texto-argumentativo-exercc3adcios-gabriella-pni
18 texto-argumentativo-exercc3adcios-gabriella-pni18 texto-argumentativo-exercc3adcios-gabriella-pni
18 texto-argumentativo-exercc3adcios-gabriella-pni
 
Capitalismo, ciência, tecnologia e barbárie
Capitalismo, ciência, tecnologia e barbárieCapitalismo, ciência, tecnologia e barbárie
Capitalismo, ciência, tecnologia e barbárie
 
Auxiliar de biblioteca
Auxiliar de bibliotecaAuxiliar de biblioteca
Auxiliar de biblioteca
 
Apostila de interpretação textual textos do blog parte 2
Apostila de interpretação textual textos do blog parte 2Apostila de interpretação textual textos do blog parte 2
Apostila de interpretação textual textos do blog parte 2
 
Erika
ErikaErika
Erika
 
Paradigmas
ParadigmasParadigmas
Paradigmas
 

Destacado (7)

Pelicula
PeliculaPelicula
Pelicula
 
Tecnologia Educacional
Tecnologia EducacionalTecnologia Educacional
Tecnologia Educacional
 
Somos todos responsáveis
Somos todos  responsáveisSomos todos  responsáveis
Somos todos responsáveis
 
Apresentação Risulta
Apresentação RisultaApresentação Risulta
Apresentação Risulta
 
Programação
ProgramaçãoProgramação
Programação
 
ReuniãO PúBlicacom Analistase Investidores 2 T06
ReuniãO PúBlicacom Analistase Investidores 2 T06ReuniãO PúBlicacom Analistase Investidores 2 T06
ReuniãO PúBlicacom Analistase Investidores 2 T06
 
A FÉ DOS PAPAGAIOS-MANUEL CARLOS
A FÉ DOS PAPAGAIOS-MANUEL CARLOSA FÉ DOS PAPAGAIOS-MANUEL CARLOS
A FÉ DOS PAPAGAIOS-MANUEL CARLOS
 

Similar a O peso das ilusões

Cefet/Coltec Aula 6 Conjunções/Conectivos - Provas cefet
Cefet/Coltec Aula 6   Conjunções/Conectivos - Provas cefetCefet/Coltec Aula 6   Conjunções/Conectivos - Provas cefet
Cefet/Coltec Aula 6 Conjunções/Conectivos - Provas cefet
ProfFernandaBraga
 
COMO TORNAR REALIDADE A UTOPIA DA CONQUISTA DA IMORTALIDADE DOS SERES HUMANOS...
COMO TORNAR REALIDADE A UTOPIA DA CONQUISTA DA IMORTALIDADE DOS SERES HUMANOS...COMO TORNAR REALIDADE A UTOPIA DA CONQUISTA DA IMORTALIDADE DOS SERES HUMANOS...
COMO TORNAR REALIDADE A UTOPIA DA CONQUISTA DA IMORTALIDADE DOS SERES HUMANOS...
Faga1939
 
Michael crichton -_o_parque_dos_dinossauros
Michael crichton -_o_parque_dos_dinossaurosMichael crichton -_o_parque_dos_dinossauros
Michael crichton -_o_parque_dos_dinossauros
Erico Roman
 
O Parque dos Dinossauros - Michael Crichton
O Parque dos Dinossauros - Michael CrichtonO Parque dos Dinossauros - Michael Crichton
O Parque dos Dinossauros - Michael Crichton
Yuri Silva
 
DEUSES INDIGENAS E DEUSAS INDIGENAS.....
DEUSES INDIGENAS E DEUSAS INDIGENAS.....DEUSES INDIGENAS E DEUSAS INDIGENAS.....
DEUSES INDIGENAS E DEUSAS INDIGENAS.....
ls4231294
 
DEUSES INDIGENAS E DEUSAS INDIGENAS..pdf
DEUSES INDIGENAS E DEUSAS INDIGENAS..pdfDEUSES INDIGENAS E DEUSAS INDIGENAS..pdf
DEUSES INDIGENAS E DEUSAS INDIGENAS..pdf
ignaciosilva517
 
DEUSES INDIGENAS E DEUSAS INDIGENAS..pdf
DEUSES INDIGENAS E DEUSAS INDIGENAS..pdfDEUSES INDIGENAS E DEUSAS INDIGENAS..pdf
DEUSES INDIGENAS E DEUSAS INDIGENAS..pdf
carlos784vt
 
O colapso da ideia iluminista de progresso
O colapso da ideia iluminista de progressoO colapso da ideia iluminista de progresso
O colapso da ideia iluminista de progresso
Fernando Alcoforado
 

Similar a O peso das ilusões (20)

Bioética e manipulação genética
Bioética e manipulação genéticaBioética e manipulação genética
Bioética e manipulação genética
 
Sugestão Jornada 2008 Apocalipse E Os Problemas Humanos
Sugestão   Jornada 2008   Apocalipse E Os Problemas HumanosSugestão   Jornada 2008   Apocalipse E Os Problemas Humanos
Sugestão Jornada 2008 Apocalipse E Os Problemas Humanos
 
Artigo racismo sexismo e eugenia
Artigo racismo sexismo e eugeniaArtigo racismo sexismo e eugenia
Artigo racismo sexismo e eugenia
 
Conjunções provas cefet
Conjunções   provas cefetConjunções   provas cefet
Conjunções provas cefet
 
Cefet/Coltec Aula 6 Conjunções/Conectivos - Provas cefet
Cefet/Coltec Aula 6   Conjunções/Conectivos - Provas cefetCefet/Coltec Aula 6   Conjunções/Conectivos - Provas cefet
Cefet/Coltec Aula 6 Conjunções/Conectivos - Provas cefet
 
COMO TORNAR REALIDADE A UTOPIA DA CONQUISTA DA IMORTALIDADE DOS SERES HUMANOS...
COMO TORNAR REALIDADE A UTOPIA DA CONQUISTA DA IMORTALIDADE DOS SERES HUMANOS...COMO TORNAR REALIDADE A UTOPIA DA CONQUISTA DA IMORTALIDADE DOS SERES HUMANOS...
COMO TORNAR REALIDADE A UTOPIA DA CONQUISTA DA IMORTALIDADE DOS SERES HUMANOS...
 
Homo Deus; Uma Breve História do Amanhã teccogs17_resenha01.pdf
Homo Deus; Uma Breve História do Amanhã     teccogs17_resenha01.pdfHomo Deus; Uma Breve História do Amanhã     teccogs17_resenha01.pdf
Homo Deus; Uma Breve História do Amanhã teccogs17_resenha01.pdf
 
Michael crichton -_o_parque_dos_dinossauros
Michael crichton -_o_parque_dos_dinossaurosMichael crichton -_o_parque_dos_dinossauros
Michael crichton -_o_parque_dos_dinossauros
 
O Parque dos Dinossauros - Michael Crichton
O Parque dos Dinossauros - Michael CrichtonO Parque dos Dinossauros - Michael Crichton
O Parque dos Dinossauros - Michael Crichton
 
O fim da evolução humana artigo
O fim da evolução humana artigoO fim da evolução humana artigo
O fim da evolução humana artigo
 
DEUSES INDIGENAS E DEUSAS INDIGENAS.....
DEUSES INDIGENAS E DEUSAS INDIGENAS.....DEUSES INDIGENAS E DEUSAS INDIGENAS.....
DEUSES INDIGENAS E DEUSAS INDIGENAS.....
 
DEUSES INDIGENAS E DEUSAS INDIGENAS..pdf
DEUSES INDIGENAS E DEUSAS INDIGENAS..pdfDEUSES INDIGENAS E DEUSAS INDIGENAS..pdf
DEUSES INDIGENAS E DEUSAS INDIGENAS..pdf
 
DEUSES INDIGENAS E DEUSAS INDIGENAS..pdf
DEUSES INDIGENAS E DEUSAS INDIGENAS..pdfDEUSES INDIGENAS E DEUSAS INDIGENAS..pdf
DEUSES INDIGENAS E DEUSAS INDIGENAS..pdf
 
A degradação dos valores: o que restou da nossa cultura...
A degradação dos valores: o que restou da nossa cultura...A degradação dos valores: o que restou da nossa cultura...
A degradação dos valores: o que restou da nossa cultura...
 
Lei Do Progresso Palestra
Lei Do Progresso PalestraLei Do Progresso Palestra
Lei Do Progresso Palestra
 
Deus desafio para a ciência.pptx
Deus desafio para a ciência.pptxDeus desafio para a ciência.pptx
Deus desafio para a ciência.pptx
 
Ciência, tecnologia e bioética.pdf
Ciência, tecnologia e bioética.pdfCiência, tecnologia e bioética.pdf
Ciência, tecnologia e bioética.pdf
 
O colapso da ideia iluminista de progresso
O colapso da ideia iluminista de progressoO colapso da ideia iluminista de progresso
O colapso da ideia iluminista de progresso
 
Novo_Livro_Prof_Sousa_Lara-63555972 (1).docx
Novo_Livro_Prof_Sousa_Lara-63555972 (1).docxNovo_Livro_Prof_Sousa_Lara-63555972 (1).docx
Novo_Livro_Prof_Sousa_Lara-63555972 (1).docx
 
A transformação da essência da ação humana
A transformação da essência da ação humana A transformação da essência da ação humana
A transformação da essência da ação humana
 

Último

Considerando as pesquisas de Gallahue, Ozmun e Goodway (2013) os bebês até an...
Considerando as pesquisas de Gallahue, Ozmun e Goodway (2013) os bebês até an...Considerando as pesquisas de Gallahue, Ozmun e Goodway (2013) os bebês até an...
Considerando as pesquisas de Gallahue, Ozmun e Goodway (2013) os bebês até an...
azulassessoria9
 
Slide - SAEB. língua portuguesa e matemática
Slide - SAEB. língua portuguesa e matemáticaSlide - SAEB. língua portuguesa e matemática
Slide - SAEB. língua portuguesa e matemática
sh5kpmr7w7
 
Responde ou passa na HISTÓRIA - REVOLUÇÃO INDUSTRIAL - 8º ANO.pptx
Responde ou passa na HISTÓRIA - REVOLUÇÃO INDUSTRIAL - 8º ANO.pptxResponde ou passa na HISTÓRIA - REVOLUÇÃO INDUSTRIAL - 8º ANO.pptx
Responde ou passa na HISTÓRIA - REVOLUÇÃO INDUSTRIAL - 8º ANO.pptx
AntonioVieira539017
 
8 Aula de predicado verbal e nominal - Predicativo do sujeito
8 Aula de predicado verbal e nominal - Predicativo do sujeito8 Aula de predicado verbal e nominal - Predicativo do sujeito
8 Aula de predicado verbal e nominal - Predicativo do sujeito
tatianehilda
 
QUIZ ensino fundamental 8º ano revisão geral
QUIZ ensino fundamental 8º ano revisão geralQUIZ ensino fundamental 8º ano revisão geral
QUIZ ensino fundamental 8º ano revisão geral
AntonioVieira539017
 
A EDUCAÇÃO FÍSICA NO NOVO ENSINO MÉDIO: IMPLICAÇÕES E TENDÊNCIAS PROMOVIDAS P...
A EDUCAÇÃO FÍSICA NO NOVO ENSINO MÉDIO: IMPLICAÇÕES E TENDÊNCIAS PROMOVIDAS P...A EDUCAÇÃO FÍSICA NO NOVO ENSINO MÉDIO: IMPLICAÇÕES E TENDÊNCIAS PROMOVIDAS P...
A EDUCAÇÃO FÍSICA NO NOVO ENSINO MÉDIO: IMPLICAÇÕES E TENDÊNCIAS PROMOVIDAS P...
PatriciaCaetano18
 
Os editoriais, reportagens e entrevistas.pptx
Os editoriais, reportagens e entrevistas.pptxOs editoriais, reportagens e entrevistas.pptx
Os editoriais, reportagens e entrevistas.pptx
TailsonSantos1
 

Último (20)

Renascimento Cultural na Idade Moderna PDF
Renascimento Cultural na Idade Moderna PDFRenascimento Cultural na Idade Moderna PDF
Renascimento Cultural na Idade Moderna PDF
 
Considerando as pesquisas de Gallahue, Ozmun e Goodway (2013) os bebês até an...
Considerando as pesquisas de Gallahue, Ozmun e Goodway (2013) os bebês até an...Considerando as pesquisas de Gallahue, Ozmun e Goodway (2013) os bebês até an...
Considerando as pesquisas de Gallahue, Ozmun e Goodway (2013) os bebês até an...
 
Camadas da terra -Litosfera conteúdo 6º ano
Camadas da terra -Litosfera  conteúdo 6º anoCamadas da terra -Litosfera  conteúdo 6º ano
Camadas da terra -Litosfera conteúdo 6º ano
 
Aula 67 e 68 Robótica 8º ano Experimentando variações da matriz de Led
Aula 67 e 68 Robótica 8º ano Experimentando variações da matriz de LedAula 67 e 68 Robótica 8º ano Experimentando variações da matriz de Led
Aula 67 e 68 Robótica 8º ano Experimentando variações da matriz de Led
 
classe gramatical Substantivo apresentação..pptx
classe gramatical Substantivo apresentação..pptxclasse gramatical Substantivo apresentação..pptx
classe gramatical Substantivo apresentação..pptx
 
Slide - SAEB. língua portuguesa e matemática
Slide - SAEB. língua portuguesa e matemáticaSlide - SAEB. língua portuguesa e matemática
Slide - SAEB. língua portuguesa e matemática
 
Responde ou passa na HISTÓRIA - REVOLUÇÃO INDUSTRIAL - 8º ANO.pptx
Responde ou passa na HISTÓRIA - REVOLUÇÃO INDUSTRIAL - 8º ANO.pptxResponde ou passa na HISTÓRIA - REVOLUÇÃO INDUSTRIAL - 8º ANO.pptx
Responde ou passa na HISTÓRIA - REVOLUÇÃO INDUSTRIAL - 8º ANO.pptx
 
Monoteísmo, Politeísmo, Panteísmo 7 ANO2.pptx
Monoteísmo, Politeísmo, Panteísmo 7 ANO2.pptxMonoteísmo, Politeísmo, Panteísmo 7 ANO2.pptx
Monoteísmo, Politeísmo, Panteísmo 7 ANO2.pptx
 
Tema de redação - As dificuldades para barrar o casamento infantil no Brasil ...
Tema de redação - As dificuldades para barrar o casamento infantil no Brasil ...Tema de redação - As dificuldades para barrar o casamento infantil no Brasil ...
Tema de redação - As dificuldades para barrar o casamento infantil no Brasil ...
 
Aula 25 - A america espanhola - colonização, exploraçãp e trabalho (mita e en...
Aula 25 - A america espanhola - colonização, exploraçãp e trabalho (mita e en...Aula 25 - A america espanhola - colonização, exploraçãp e trabalho (mita e en...
Aula 25 - A america espanhola - colonização, exploraçãp e trabalho (mita e en...
 
Aula 1 - Psicologia Cognitiva, aula .ppt
Aula 1 - Psicologia Cognitiva, aula .pptAula 1 - Psicologia Cognitiva, aula .ppt
Aula 1 - Psicologia Cognitiva, aula .ppt
 
6ano variação linguística ensino fundamental.pptx
6ano variação linguística ensino fundamental.pptx6ano variação linguística ensino fundamental.pptx
6ano variação linguística ensino fundamental.pptx
 
8 Aula de predicado verbal e nominal - Predicativo do sujeito
8 Aula de predicado verbal e nominal - Predicativo do sujeito8 Aula de predicado verbal e nominal - Predicativo do sujeito
8 Aula de predicado verbal e nominal - Predicativo do sujeito
 
QUIZ ensino fundamental 8º ano revisão geral
QUIZ ensino fundamental 8º ano revisão geralQUIZ ensino fundamental 8º ano revisão geral
QUIZ ensino fundamental 8º ano revisão geral
 
Pesquisa Ação René Barbier Livro acadêmico
Pesquisa Ação René Barbier Livro  acadêmicoPesquisa Ação René Barbier Livro  acadêmico
Pesquisa Ação René Barbier Livro acadêmico
 
A EDUCAÇÃO FÍSICA NO NOVO ENSINO MÉDIO: IMPLICAÇÕES E TENDÊNCIAS PROMOVIDAS P...
A EDUCAÇÃO FÍSICA NO NOVO ENSINO MÉDIO: IMPLICAÇÕES E TENDÊNCIAS PROMOVIDAS P...A EDUCAÇÃO FÍSICA NO NOVO ENSINO MÉDIO: IMPLICAÇÕES E TENDÊNCIAS PROMOVIDAS P...
A EDUCAÇÃO FÍSICA NO NOVO ENSINO MÉDIO: IMPLICAÇÕES E TENDÊNCIAS PROMOVIDAS P...
 
Slides Lição 6, CPAD, As Nossas Armas Espirituais, 2Tr24.pptx
Slides Lição 6, CPAD, As Nossas Armas Espirituais, 2Tr24.pptxSlides Lição 6, CPAD, As Nossas Armas Espirituais, 2Tr24.pptx
Slides Lição 6, CPAD, As Nossas Armas Espirituais, 2Tr24.pptx
 
Apresentação ISBET Jovem Aprendiz e Estágio 2023.pdf
Apresentação ISBET Jovem Aprendiz e Estágio 2023.pdfApresentação ISBET Jovem Aprendiz e Estágio 2023.pdf
Apresentação ISBET Jovem Aprendiz e Estágio 2023.pdf
 
Os editoriais, reportagens e entrevistas.pptx
Os editoriais, reportagens e entrevistas.pptxOs editoriais, reportagens e entrevistas.pptx
Os editoriais, reportagens e entrevistas.pptx
 
LENDA DA MANDIOCA - leitura e interpretação
LENDA DA MANDIOCA - leitura e interpretaçãoLENDA DA MANDIOCA - leitura e interpretação
LENDA DA MANDIOCA - leitura e interpretação
 

O peso das ilusões

  • 1. John Gray, nesta entrevista, fala de sua concepção sobre o progresso. Trata-se de um interessante ponto de vista, do qual muitas outras ideias participam. O peso das ilusões Para o pensador inglês, a fé no progresso é uma ilusão, o homem não é dono de seu destino e os avanços científicos nada têm a ver com a ética. Thereza Venturoli O inglês John Gray, professor de pensamento europeu na London School of Economics, de 57 anos, é homem de frases curtas e categóricas, como "o conhecimento não nos torna livres" ou "nenhum projeto político pode salvar a humanidade de sua condição natural". Com afirmações como essas, ele declara, em seu mais recente livro, Cachorros de Palha (Editora Record), seu ceticismo com relação à tradição cultural do Ocidente. Gray acusa o humanismo secular moderno, que embebe a filosofia, a política e a ciência, de herdar do cristianismo a idéia – ilusória, segundo ele – de que o homem tem papel central no universo. Para o autor, ao contrário, o Homo sapiens não é mais do que uma espécie cuja passagem pelo planeta é efêmera e cujo destino é selado pelas mesmas leis naturais que regem as demais formas de vida. Pessimismo? Segundo Gray, a mensagem do livro não é de desespero, mas de libertação. Ele quer livrar o homem das ilusões que o fazem se sentir responsável por "carregar a Terra sobre os ombros". Até porque não adiantaria nada. Veja – Uma das teses centrais de seu livro Cachorros de Palha é a de que a crença no progresso é uma ilusão. Mas não seria essa crença uma necessidade, digamos, darwiniana dos seres humanos – um traço desenvolvido pela espécie por favorecer sua sobrevivência? Gray – A crença no progresso não tem necessariamente uma razão evolutiva, não faz parte da biologia humana, em absoluto. É algo que data do século XVIII, ou seja, de cerca de dois séculos apenas. Afora aquelas que têm um sentimento religioso, as pessoas que acreditam em alguma coisa hoje acreditam no progresso – e só no progresso. Para elas, as futuras gerações sempre viverão melhor do que as anteriores, e a humanidade avança no conhecimento como avança na ética e na política. Mas isso é um mito, uma ilusão nociva, porque muitas vezes nos cega para grandes problemas e nos impede de perceber que, quando pensamos estar progredindo, na verdade estamos regredindo. Veja – Também na ciência o progresso é uma ilusão nociva? Gray – Na ciência e na tecnologia o progresso é real, mas só faz aumentar o conhecimento e o poder do homem, e esse poder pode ser usado tanto para os mais benignos objetivos quanto para os mais desastrosos. Quando o conceito de progresso é aplicado à ética e à política, ele é uma ilusão perigosa. Veja-se, por exemplo, o caso dos gregos e dos romanos antigos. É claro que eles acreditavam no desenvolvimento de novas ferramentas. Mas eles não transferiam essa noção de progresso técnico para a ética ou a política. É óbvio, também, que eles acreditavam no bem e no mal, que as sociedades podiam ser melhores ou piores, e que a prosperidade é preferível à fome e à pobreza. No entanto, para gregos e romanos, os jogos da ética e da política estavam sujeitos a avanços e retrocessos. Ou seja, a história humana era cíclica, com diferentes períodos se alternando, como ocorre na natureza.
  • 2. Veja – O senhor discorda de qualquer pensamento que considere o homem como o centro do universo. Mas é possível existir uma moral que não seja antropocêntrica? Gray – Sim, é possível. Na verdade, na maior parte da história, a moralidade não foi antropocêntrica – nem no budismo nem no taoísmo, por exemplo. O antropocentrismo é característica do cristianismo e do humanismo secular – que nada mais é do que uma versão do cristianismo sem Deus. Como qualquer outro animal, o homem também aspira ao bem-estar. E o bem-estar humano é em muitos pontos similar ao bem-estar dos outros seres vivos. Eu sustento que o homem é um animal como outro qualquer, produto do mundo natural e passível de ser eliminado por mudanças ambientais, como ocorreu com muitas outras espécies no passado. Veja – Se o homem é um animal como outro qualquer, como nossa espécie chegou a dominar o mundo? Gray – O homem é um sucesso evolutivo: desenvolveu uma linguagem sofisticada, uma incrível capacidade de construir ferramentas e de registrar e transmitir uma memória cultural. Alguns grandes primatas também detêm algumas dessas habilidades. A diferença é que nenhum deles atingiu o nível alcançado pelos humanos. Some-se a essa habilidade uma extrema ferocidade – que também não é característica única de nossa espécie – e temos aí as condições que permitiram ao homem tornar-se a espécie dominante do planeta. Mas é um engano pensar que o homem tenha conquistado a Terra. Somos a espécie dominante simplesmente porque eliminamos grande parte da biosfera. E, ao fazermos isso, geramos condições pouco promissoras para nossa própria sobrevivência. O poder que temos sobre o meio ambiente não nos dá o controle sobre ele. O homem tem muito poder, a ponto de destruir a Amazônia, mas não o poder de recompor a mata rapidamente. Ora, se você não tem o poder de redesenhar a biosfera, então não tem o controle sobre o planeta. Assim, acho praticamente impossível que se concretize a previsão de que a população humana chegue aos 8 ou 9 bilhões de pessoas daqui a cinqüenta ou sessenta anos, vivendo em certo nível de prosperidade, sem que se desestabilize a ecologia do planeta. Calculo que, daqui a um século, a população mundial terá encolhido bastante. E essa queda poderá se dar de duas maneiras: uma seria pelo declínio da taxa de fertilidade, como já acontece em países como Japão e Itália. Outra, por meio de guerras, doenças e pelos efeitos deletérios das mudanças climáticas. Se eu tivesse de apostar, apostaria na segunda opção. Seja como for, o sucesso do homem no planeta é real, mas extremamente precário e muito mais curto que o de outras espécies, como os dinossauros, que dominaram o planeta por milhões e milhões de anos. Pode acabar muito em breve. Veja – As habilidades humanas sempre trazem conseqüências negativas, então? Gray – Nem sempre. As habilidades do homem produziram, por exemplo, a anestesia. Quem gostaria de tirar um dente como se tirava no início do século XIX, sem nenhuma anestesia? No entanto, essas mesmas habilidades causaram guerras mais devastadoras, criaram novos tipos de arma, e aumentaram nossa capacidade de cometer atrocidades numa escala jamais vista. E os assassinatos em massa são um efeito colateral do progresso tecnológico. O homem sempre usou as ferramentas que cria para abater seu semelhante, desde a pré-história. Mas o genocídio é uma prática dos tempos modernos. Entre 1492 e 1990, ocorreram cerca de 36 genocídios, que ceifaram de dezenas de milhares a dezenas de milhões de vidas. Só de 1950 até hoje, foram cerca de vinte grandes matanças, ao menos três delas – em Bangladesh, Camboja e Ruanda – com mais de 1 milhão de vítimas. Não há dúvida de que os seres humanos herdaram esse comportamento violento de alguns de seus parentes na linha evolutiva. Como o biólogo americano Edward O. Wilson observou uma vez, se alguns de nossos primos babuínos tivessem acesso a armas nucleares, o mundo já teria sido devastado há muito tempo. Veja – O cientista americano Ray Kurzweil diz que o desenvolvimento tecnológico – particularmente a biotecnologia, a nanotecnologia e a teoria da informação – trará um futuro promissor para a espécie humana. Onde está a falha nessa idéia? Gray – A falha está em pensar que esse progresso seja real. A ciência, no geral, chega mais perto da verdade do mundo que outros sistemas de crença, e nós temos testemunhado seu sucesso
  • 3. pragmático em aumentar o poder humano. Mas, do ponto de vista ético, o conhecimento é neutro, desprovido de valor – pode tanto nos levar a realizações maravilhosas quanto atender a propósitos terríveis. A ciência não é feitiçaria. Deixe-me dar um exemplo do que é a ilusão no poder científico: na Califórnia, as pessoas contratam organizações para ter seu corpo congelado assim que morrerem. Esperam voltar à vida quando a tecnologia assim o permitir, daqui a um século ou dois. A ilusão não está em pensar que a tecnologia tornará isso possível – provavelmente tornará, um dia. A ilusão está em não imaginar o que acontecerá nos próximos 100 ou 200 anos. Se a história se repete em seus aspectos éticos e políticos, como eu acredito, haverá várias quebras nas bolsas de valores, ataques terroristas, guerras civis, mudanças de regime e talvez até outras guerras mundiais. Nesse processo, muita coisa vai mudar: o direito à propriedade poderá ser abandonado, empresas quebrarão e governantes serão substituídos. É muito difícil que um contrato assinado hoje com uma empresa californiana possa sobreviver aos próximos séculos. Em outras palavras, mesmo que a tecnologia se desenvolva a ponto de levar o homem à imortalidade, as instituições e a sociedade na qual vivemos não são imortais, um dia acabarão. Veja – Então o limite para o progresso não está na ciência, mas na sociedade? Gray – A ilusão está em não perceber que, por mais que o conhecimento avance, as instituições impõem um limite. É completamente possível que a genética chegue à clonagem humana, talvez não tão já, mas daqui a cinqüenta anos. Eu faço uma predição: se isso se realizar, a tecnologia será usada por terroristas e organizações criminosas para criar seres humanos insensíveis à piedade e à simpatia, e soldados ou assassinos que jamais precisem dormir. Não duvido que a genética traga muitos benefícios para a humanidade, erradicando distúrbios, corrigindo deficiências e curando doenças. Mas é claro que a genética pode, também, ser usada no desenvolvimento de novas armas e na perpetração de mais genocídios. Veja – Mas não foi sempre assim, a ciência e a tecnologia podendo ser usadas tanto para o bem quanto para o mal? Gray – Absolutamente, sim. Mas ainda não aprendemos a lição. Lembro-me de quando as pessoas imaginavam que as fotocópias acabariam de vez com as falsificações. Mais tarde, o mesmo ocorreu com as câmeras de vídeo. Tudo não passou de ilusão. Hoje acontece o mesmo: as pessoas vêem a internet como um instrumento de liberação, mas ao mesmo tempo ela torna nossa privacidade muito difícil. Tudo o que você faz eletronicamente pode ser monitorado. Eu repito: o conhecimento não liberta o homem, apenas aumenta seu poder – um poder que pode ser usado para o bem ou para o mal. Nesse ponto, sou um pessimista: o futuro da humanidade será igual a seu passado, só que com mais conhecimento. Veja – Se a felicidade e a salvação humanas não estão na ciência e na tecnologia, onde estão elas? Gray – A ciência não é essencial para a felicidade. Basta lembrar que milhões e milhões de indivíduos têm vivido felizes ao longo de toda a história, mesmo sem acreditar no progresso. Na essência, nosso sentimento de felicidade não é diferente do sentimento do homem que viveu no Império Romano ou na Índia de Buda, cinco séculos antes de Cristo. Isso não mudou. A única coisa que mudou foram o conhecimento e o poder humanos, que cresceram muito. Veja – Qual o papel da religião hoje? Gray – Acho que a religião tem um papel central na cultura humana. Não acredito que existam religiões verdadeiras ou falsas – apenas as mais e as menos bonitas, ou as mais e as menos esperançosas. Quem gosta de religião se aproxima mais da poesia do que da ciência. A religião ocidental tem se intimidado por rivalizar com a ciência. Mas a ciência diz respeito ao poder, não dá um sentido à vida – isso é função da religião. E precisamos de mitos, de ilusões. Nem todo o avanço científico pode eliminar a religião, pois suas raízes não estão na ignorância, mas na necessidade humana de buscar um sentido para as coisas. Prova disso é que, para muitas pessoas, a ciência – com sua promessa de eterno progresso – torna-se ela mesma uma religião.
  • 4. Veja – Os Estados Unidos, líderes mundiais em ciência e tecnologia, enfrentam hoje um renascimento do fundamentalismo cristão, particularmente nos embates entre evolucionistas e criacionistas. Como o senhor vê esse conflito? Gray – O conflito entre ciência e religião é uma peculiaridade das culturas moldadas pelas tradições ocidentais, que dão uma importância exagerada à fé nos assuntos do espírito. A briga entre evolucionistas e criacionistas nos Estados Unidos é um modo com que o fundamentalismo cristão resiste às implicações antiantropocêntricas da teoria da seleção natural do inglês Charles Darwin. Esse conflito não acontece com a mesma intensidade nas culturas ligadas ao budismo e ao taoísmo, por exemplo, que são religiões nas quais as práticas e as experiências místicas importam mais do que a crença em si. Veja – O senhor diria que existem religiões que conflitam menos com a ciência? Gray – Religiões não-antropocêntricas, como o taoísmo, parecem mais próximas do mundo que nos é apresentado pelo que há de mais avançado na ciência contemporânea. E, porque pregam uma certa modéstia sobre o lugar dos seres humanos no esquema das coisas, essas religiões são mais capazes de promover a felicidade. No entanto, recomendo também algumas filosofias ocidentais, como o epicurismo. O grande poema A Natureza das Coisas, de Lucrécio, é um antigo guia para viver feliz num mundo em que o homem não é a figura central. Veja – Para o leitor, seu livro pode deixar um certo sabor de desesperança. Qual a saída? Ou não há saída? Gray – A mensagem central de Cachorros de Palha não é de desesperança, mas de libertação. O que eu pretendo é sugerir ao leitor: leve sua vida da maneira mais bela e inteligente possível, pois o destino da Terra não está sobre seus ombros. Na verdade, foi assim que viveu a maioria dos milhões e milhões de seres humanos que já passaram pelo planeta. A necessidade de acreditar que o futuro será melhor é uma ilusão. A felicidade não vem daí, mas de aceitar a nossa natureza animal, que, ao contrário das crenças, é imutável. Fonte: Revista Veja, Edição 1932 - 23 de novembro de 2005.