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MANIFESTO PÚBLICO
PELA HUMANIZAÇÃO DO PARTO E DO NASCIMENTO
CIDADE DE NATAL - RN
As pessoas abaixo assinadas manifestam publicamente sua indignação
pela baixa qualidade dos serviços de assistência ao parto e ao
nascimento nos setores público e privado oferecidos pelos profissionais da
área – Obstetras, Pediatras, Anestesistas, Neonatologistas,
Enfermeiros e Técnicos em Enfermagem – na cidade de Natal - RN.
As condutas técnicas e funcionais adotadas por esses profissionais
contrariam as melhores práticas recomendadas pelas instituições
científicas, nacionais e internacionais, e ignoram, na maioria dos casos,
as diretrizes, orientações e os manuais editados pelo Ministério da
Saúde.
De forma reiterada, gestantes, puérperas, familiares, testemunhas
hospitalares e mesmo, profissionais da área, conscientes da
conduta temerária desses profissionais, relatam situações de
violência obstétrica por parte da equipe de assistência, tanto da rede
pública quanto da rede privada de atenção, apoio e assistência.
A inserção de novas técnicas de realização do parto, apoiadas
exclusivamente no amplo aparato tecnológico disponível, gera
expressivo número de intervenções desnecessárias para mães e bebês,
sendo que, na maioria dos casos, o uso de muitas delas, até recentemente,
não conta com o necessário e adequado embasamento científico
quanto à sua eficácia e segurança (DINIZ & CHACHAM, 2006).
As evidências científicas atualizadas mostram que quanto menos se
intervém em um parto normal, melhor para mãe e bebê. As
intervenções no processo do parto e do nascimento devem ter uma razão
relevante para se justificarem, e não devem ser adotadas como
procedimentos de rotina nos partos. As práticas adotadas nas
maternidades estão incluídas no campo de observação e controle das
políticas vinculadas à saúde pública e de direitos humanos (DINIZ &
CHACHAM, 2006).
A violência contra a parturiente, de natureza institucional, reiterada, tem
acontecido em um meio profissional onde o parto é tratado de forma
medicalocêntrica e hospitalocêntrica, onde a parturiente é tratada
de maneira autoritária e desumana, e em um ambiente onde não há
testemunhas isentas que possam inibir tais procedimentos.
1
A equipe de assistência ao parto mantém-se, curiosamente, silente e,
mesmo, indiferente, quanto aos atos reiterados de violência
obstétrica ali cometidos. Violência obstétrica é qualquer ato de violência
contra a mãe e o bebê. Violência obstétrica é violência contra a mulher. Em
2007 a Organização das Nações Unidas (ONU) reconheceu a violência contra
a mulher como uma violação dos direitos humanos em seu documento
“Declaração sobre a Eliminação da Violência Contra as Mulheres” (CPMI,
2013).
Agressão verbal, ordens opressoras para que a parturiente silencie
durante as contrações, separação da mãe e bebê por horas,
proibição quanto à escolha da posição para parir, são alguns
exemplos de práticas que desrespeitam os direitos da gestante
preconizados pelo Ministério da Saúde e Organização Mundial de
Saúde, e que fazem parte da rotina das maternidades e são classificadas
como atos de violência obstétrica.
Além de o ambiente hospitalar não estar preparado estruturalmente, a
equipe tem realizado condutas contrárias ao parto humanizado. Em 2011,
uma pesquisa feita pelo Fundação Perseu Abramo entrevistou cerca de
mil e novecentas mulheres em todo o Brasil das quais 25%
sofreram algum tipo de violência durante seus partos. O achado
dessa pesquisa é coerente com relatos encontrados no documentário de
2012 “Violência Obstétrica: a voz das brasileiras”, com o dossiê de 2012
“Violência no parto em Minas Gerais” dentre outros relatos de movimentos
de mulheres pelo Brasil.
É direito da gestante ter um parto humanizado e uma assistência de
qualidade, conforme consta na Cartilha de Direito da Gestante do
Ministério da Saúde (2011) e no Guia da Gestante e do Bebê da
UNICEF (2010).
A Organização Mundial da Saúde reconhece como parte dos Direitos
Humanos a parturiente ter autonomia, autoridade e apoio às
escolhas feitas por ela. Diariamente essas escolhas são desrespeitadas
nas maternidades públicas e privadas de nosso município.
No setor privado não há um controle quanto às taxas de cesárea.
Acredita-se que cheguem aos 90%, muito aquém do limiar dos 15%
recomendados pela Organização Mundial da Saúde.
A cesárea eletiva tem sido associada a elevação da taxa de
prematuridade iatrogênica e outras complicações maternas e
neonatais (DINIZ & CHACHAM, 2006).
Atualmente um grande número de mulheres da rede privada peregrina
em busca de um obstetra que acompanhe um parto natural sem
intervenções, e é sempre proposto (determinado), contrariando todas
2
as diretrizes dos organismos nacionais e internacionais de saúde, agendar
uma data para o nascimento.
Esse tipo de conduta é contra o que vem mostrando estudos científicos.
Desde 2011 o Ministério da Saúde com a estratégia da Rede Cegonha
busca implementar a atenção humanizada ao parto e nascimento,
incentivando os partos normais, devido à preocupação existente quanto ao
elevado índice de cesárea no Brasil.
O temerário e injustificado protocolo de cuidados com o recém-nascido
imposto pelas maternidades inclui as seguintes práticas, entre outras:
 separação imediata para esfregar a sua delicada pele com
panos grossos;
 aspirá-los por todos os orifícios;
 ministrar vitamina K;
 apresentar à mãe por alguns minutos e encaminhar estes mesmos
bebês aos berçários para serem mantidos em berços aquecidos por
muito tempo e onde ainda é oferecido leite artificial para o bebê
sem o consentimento da mãe e sem atentar para o impacto negativo
que isso tem no estabelecimento do aleitamento materno;
Esses protocolos vão contra o que preconiza o Ministério da Saúde em
seu documento intitulado “Atenção à saúde do Recém-Nascido”, e a
Organização Pan Americana de Saúde, no documento “Práticas
integradas de atenção ao parto, benéficas para a saúde de mães e
crianças”, ambos publicados em 2011, que recomenda, entre outras
condutas, as que assegurem a proteção e humanização do parto:
 o contato pele a pele;
 o estímulo a amamentação na primeira hora de vida;
 o alojamento conjunto imediato;
 a realização da avaliação do recém-nascido no colo da mãe,
fortalecendo, dessa forma, de imediato, o vínculo entre mãe e bebê;
 o clampeamento tardio do cordão umbilical
Abaixo estão elucidadas condutas consideradas pela Organização Mundial
da Saúde como sendo de violência obstétrica e que causam um
sofrimento desnecessário para mãe e bebê (apud CUNHA, 2012):
1. Cesariana sem indicação clínica e/ou sob falsos pretextos, tais como:
3
• Circular de cordão (não importa quantas);
• Trabalho de parto prolongado (esse tempo é individual, não há padrões,
bastando mãe e bebê estarem em boas condições);
• Expulsivo prolongado (existe apenas uma média, não um tempo exato
para
esta fase);
• Pós-datismo (nos anos 70 esperava-se até 42 semanas, hoje às 40 – ou
menos - a criança é extraída do ventre materno sob esta alegação, muitas
vezes prematuramente por erro de suposição de data). As diretrizes do MS e
da OMS são de induzir ou ter uma conduta expectativa com monitoramento
fetal;
• Pressão alta;
• Bacia "muito estreita" (não é possível medir sem prova de trabalho de
parto);
• Bebê "muito grande" (os ossos e tecidos da mãe se movem para a
passagem da criança);
• Cesárea anterior (o risco de ruptura da cicatriz uterina é idêntico a de
quem
nunca teve cirurgias antes);
• Primigesta com mais de 35 anos;
• Primigesta adolescente;
• HPV, verrugas genitais, miomas, cistos;
• Pouco ou muito líquido amniótico;
• Problema de hemorróidas, dentre outros.
Ou realizar cesariana sem indicação precisa por pressa da equipe ou
descrença na capacidade da mulher. A mulher que é submetida a uma
cesariana sem indicações clínicas precisas está sendo exposta a três vezes
mais riscos de contrair infecção, ter hemorragia, problemas decorrentes da
analgesia, dificuldades na amamentação, dentre outros, e seu bebê a riscos
decorrentes da prematuridade iatrogênica, tais como baixo peso, problemas
respiratórios, icterícia grave;
4
2. Episiotomia de rotina: incisão cirúrgica realizada no períneo para
aumentar a
abertura da vagina. Constitui, por si só, uma laceração de segundo grau,
quando uma laceração espontânea poderia nem ocorrer (mais de 60% dos
casos). A revisão de Thacker e Banta, publicada em 1983 demonstrou, além
da inexistência de evidências da eficácia dessa prática, evidências
consideráveis dos riscos associados ao procedimento: dor, edema, infecção,
hematoma, dispareunia e rigidez do períneo. A não realização de
episiotomia de rotina está associada a manutenção da integridade do
períneo (nenhuma lesão) em aproximadamente 60% dos partos e aumento
do trauma no períneo anterior (região da vulva acima da vagina), porém os
traumas anteriores são menos danosos que os traumas posteriores
(CARROLI e MIGNINI, 2009; AMORIM, 2012).
3. Exames de toque abusivos: o exame de toque é um dos mais invasivos
procedimentos de todo o trabalho de parto, sendo realizado muitas vezes de
forma frequente, dolorosa e por muitos profissionais sem pedir sequer
licença à mulher. A OMS recomenda que o exame vaginal seja realizado com
intervalo mínimo de quatro horas, com a mulher em decúbito lateral
esquerdo e jamais durante as contrações;
4. Descolamento de membranas sem prévia discussão e autorização da
gestante: consiste em afastar a bolsa amniótica do útero através da
dilatação existente, descarregando hormônios que podem desencadear,
pródromos prolongados, dor e sangramentos (AMORIM, 2012).
5. Restringir a escolha do local de parto: segundo a OMS o “fornecimento de
assistência obstétrica no nível mais periférico onde o parto for viável e
seguro e
onde a mulher se sentir segura e confiante” é uma conduta claramente útil
e que deveria ser encorajada;
6. Proibir o acompanhante de livre escolha da escolha da mulher: uma
mulher não deve ser deixada sozinha em nenhuma das fases do trabalho de
parto, parto e pós-parto. As instituições e profissionais de saúde devem
respeitar a escolha da mulher quanto ao acompanhante durante trabalho de
parto e parto.
Revisão sistemática da biblioteca Cochrane que incluiu 16 estudos e um
total de 13.391 mulheres evidenciou que o suporte contínuo intra-parto
contribui para:
• Discreta redução do tempo do trabalho de parto;
• Maior probabilidade de vivenciar partos naturais espontâneos;
• Maior satisfação com as vivências de parto;
5
• Menor necessidade de uso de analgesia (HODNETT; et al., 2010).
7. Desrespeitar o direito da mulher à privacidade: permitir a entrada de
pessoas não autorizadas no local do parto, restringido a privacidade e
causando constrangimento à mulher. Deixar a mulher exposta fisicamente.
A Lei do Acompanhante é constantemente desrespeitada, algumas vezes,
alegando-se que a presença de outra pessoa pode constranger outra
parturiente numa enfermaria ou nos biombos contíguos ao bloco cirúrgico.
Outras vezes, consideram que a Lei do Acompanhante diz respeito apenas
ao período expulsivo, deixando a mulher sozinha durante o trabalho de
parto e, mais ainda, no período pós-parto, na sala de observação.
8. Negar métodos de alívio da dor: consiste em privar a mulher de métodos
não farmacológicos para alívio da dor ou se negar a aplicar analgesia,
quando solicitado;
9. Realizar intervenções/procedimentos sem o conhecimento e
consentimento da mulher: é direito da mulher ser informada dos riscos e
benefícios das intervenções, bem como de suas indicações, antes de sua
realização;
10. Restrição à deambulação e liberdade de movimentos;
11. Estabelecer limites rígidos de tempo para a duração das fases do
trabalho de parto e parto;
12. Praticar violência verbal (mandar calar a boca, xingar, humilhar, usar
termos pejorativos, ameaçar), desconcentrar e desencorajar a parturiente: o
parto é um evento fisiológico e para acontecer é necessário que a mulher
esteja em um ambiente tranquilo, acolhedor, com uma equipe que a
respeite. A falta de privacidade é comum em alguns hospitais, sobretudo em
hospitais universitários que as mulheres são usadas para o aprendizado da
prática. A prática de violência verbal é corriqueira nos serviços de saúde no
Brasil e atrapalha o processo fisiológico do parto, pois eleva os níveis de
adrenalina que bloqueiam a liberação da ocitocina natural, o hormônio
responsável pelas contrações uterinas;
13. Usar rotineiramente soro com ocitocina sintética para
indução/aceleração do trabalho de parto e parto: a ocitocina é um hormônio
produzido pelo corpo humano e que provoca contrações uterinas. Existe
também a versão sintética utilizada para induzir ou acelerar um parto,
procedimento descrito pela OMS como “condutas claramente prejudiciais ou
ineficazes e que deveriam ser eliminadas”. A infusão intravenosa e sem
bomba e sem monitoramento continuo do bem estar fetal que possibilita a
aplicação de ocitocina e outros medicamentos, é procedimento de rotina no
trabalho de parto na maioria das instituições hospitalares.
14. Direcionamento de puxos: "faça força agora", "força comprida", etc;
6
15. Manobra de Valsalva: orientar a mulher a "trincar os dentes e fazer
força";
16. Obrigar a mulher a ficar em decúbito dorsal: Vários estudos mostram
que, durante a primeira fase do trabalho do parto, a posição supina (deitada
de costas) afeta o fluxo de sangue no útero. O peso do útero pode causar
compressão da aorta-cava e o fluxo de sangue reduzido pode comprometer
a condição fetal. A posição supina também pode diminuir a intensidade das
contrações. Não obstante, esta é posição mais comum utilizada por facilitar
o trabalho do profissional. O uso rotineiro da posição de litotomia com ou
sem estribos durante o trabalho de parto não é recomendado pela OMS.
Revisão sistemática da biblioteca Cochrane de 20 estudos com 6.135
mulheres identificou que as posições verticalizadas ou a posição lateral
associaram-se com redução da duração do período expulsivo do parto,
redução nas anormalidades da frequência cardíaca fetal, bem como redução
de relatos de dor grave e episiotomias. Foi observado, no entanto, maior
perda de sangue estimada (acima de 500 mL), porém sem repercussões
clínicas consideráveis. A conclusão dos revisores é que as mulheres devem
parir na posição que lhes for mais confortável, com o balanço das
evidências a favor das posições não-supinas. (GUPTA e HOFMEYER, 2010);
17. Manobra de Kristeller: procedimento PROSCRITO e proibido em diversos
países,consiste em empurrar o fundo do útero, ou seja, fazer pressão de
qualquer intensidade sobre a barriga da mulher para empurrar o bebê. Bebe
nasce chocado devido ao desrespeito do tempo de descida sendo ela
acelerada, justificando uso do oxigênio neonatal e a cascata de
intervenções. Dentre os riscos associados a esta manobra estão:
• Trauma perineal
• Trauma nos esfíncteres anais
• Ruptura uterina
• Danos e paralisia nos nervos do bebê
• Danos cerebrais ao bebê
18. Não permitir o nascimento espontâneo do bebê: realizar fórceps e vácuo
de rotina e/ou sem autorização da mulher, levando a tocotraumatismos e
piores escores de Apgar (nota dada ao bebê no primeiro minuto e no quinto
minuto de vida e que serve para avaliar sua vitalidade);
19. Clampeamento precoce do cordão umbilical: consiste em clampear e
cortar o cordão umbilical imediatamente após o nascimento. Aguardar o
corte do cordão umbilical por no mínimo de 3 minutos, além de permitir a
adequada adaptação metabólica do recém-nascido, permite um maior
7
aporte de ferro associado a menores taxas de anemia até o sexto mês de
vida (MS, 2011)
20. Afastar o bebê saudável da mãe: entregar um bebê vigoroso ao
neonatologista para secar e aquecer, afastando-o da mãe: estudos
comprovam que a temperatura corporal no recém-nascido é em média um
grau mais elevada no colo de sua mãe do que no berço aquecido, e que a
amamentação na primeira hora de vida favorece a pega correta (e portando
o sucesso da amamentação), além de colonizar o bebê com as bactérias da
mãe, ajudando-o a criar resistência. Revisão sistemática da biblioteca
Cochrane que incluiu 34 estudos totalizando 2.177 mulheres e bebês
identificou que os bebês que foram colocados em contato pele a pele com
suas mães nas primeiras horas de vida apresentaram menos choro nos
primeiros meses de vida, amamentaram mais e as mães interagiram mais
com o bebê, por meio de toques amorosos e carinhosos (MOORE; et al.,
2010). E ainda, manter bebês saudáveis em berçários nas primeira horas de
vida ou durante todo o período de internação. A RDC 36 de 2008 e muitos
outros documentos científicos orientam: “O serviço deve garantir a adoção
de alojamento conjunto desde o nascimento”, sem separação para
observação;
21. Aspirar as vias aéreas do recém-nascido como rotina para pesquisar
atresia de coanas, atresia de esôfago e ânus imperfurado: um diagnóstico
observacional para recém-nascidos normais e saudáveis é suficiente,
evitando, dentre outras complicações, perfurações e edemas de mucosa
(Ministério da Saúde, 2010). O contato íntimo, pele a pele, da mãe com o
bebê após o nascimento (momento em que o recém-nascido está em estado
de vigília) diminui o estresse do bebê, facilita o vínculo entre mãe e bebê e
aumenta as chances de sucesso na amamentação. Não obstante, muitos
bebês quando nascem apenas são mostrados a suas mães e levados para o
berçário onde permanecem durante as primeiras horas de vida.
22. Passar sonda de rotina no recém-nascido para pesquisar atresia de
coanas, atresia de esôfago e ânus imperfurado.
23. Fazer qualquer procedimento com o recém-nascido sem
conhecimento/consentimento dos pais: oferecer bicos, chupetas,
mamadeiras com leite artificial para o recém-nascido, dar banho, aplicar
vacinas e vitaminas, aplicar nitrato de prata ou erytromycina nos olhos do
bebê rotineiramente (protocolo que precisa ser revisado, pois visa a redução
das infecções oftálmicas mesmo em filhos de mães não infectadas). A
avaliação deve ocorrer no quarto na presença dos familiares, pois o bebê
saudável não deve ficar afastado da mãe (MS, 2011)
24. Realizar tração do cordão e massagens para agilizar o parto da placenta:
associada a dor e riscos de hemorragia e infecção puerperal;
8
25. Revisar manualmente a cavidade uterina como rotina: descrita como
uma “conduta frequentemente utilizada de modo inadequado” pela OMS.
RELATOS
Seguem abaixo trechos de relatos de mulheres que passaram por situação
de violência obstétrica nas maternidades do município do Natal.
“Minha barriga estava enorme, a mobilidade de uma grávida às 41 semanas
de gestação não é lá essas coisas. Enfim, tentei virar de lado e não consegui
sozinha. Estava com medo de cair daquela maca estreita. Pedi ajuda à
técnica em enfermagem, me virei e ele começou a palpar minha coluna. Ele
não ficou feliz, murmurava algo como – “a coluna dela é muito ruim de
achar” – e aí minha adrenalina disparou. Eu já tinha pavor de ter que passar
por uma cesárea, tinha mais medo ainda da anestesia da cesárea, e ainda
um cara esquisito daquele falava que minha coluna era ruim? Ele furou
uma, duas, resmungou, três e finalmente na quarta vez ele conseguiu achar
o que queria e a anestesia pegou. Lembro vagamente que mandaram meu
marido entrar, colocaram um pano na minha frente, amarraram meu braço
esquerdo com um soro e o braço direito com um aparelho de pressão e eu
fiquei deitada ali como Jesus na cruz, pedindo ajuda de anjo da guarda,
Deus, minhas ancestrais, todo mundo que eu lembrasse para que
enfrentasse aquele momento do melhor jeito possível. Estava me sentindo
como um pedaço de carne qualquer em um açougue. [...]Mas naquele dia
da cirurgia, havia feito uma ultra que mostrava líquido amniótico com nível
5.8. Logo que saí de lá levei o exame para a obstetra que me acompanhava
e ela disse que por eu querer muito um parto normal ela iria tentar a
indução. Colocou a primeira ampola e dali a 6 horas eu voltaria a encontrá-
la para ver como estavam as contrações. Bom, é importante dizer que eu
estava com contrações irregulares havia mais de uma semana, dilatação de
2 cm e colo grosso. Ficamos esperando, mas tinha chegado no limite dela.
Eu sabia que se esperássemos poderia entrar em trabalho de parto de fato.
E que estar a uma semana com a mesma dilatação não significava nada
porque o trabalho de parto poderia engatar a qualquer momento. Sabia
também que 5.8 de líquido não era, pelas evidências científicas, indicação
de cesárea. Mas ela disse naquela manhã que iria esperar no máximo até a
manhã seguinte. Colocamos a primeira ampola pela manhã e quando voltei
no final da tarde, as contrações não tinham engatado e a dilatação estava
do mesmo jeito. Foi então que ela me disse: Agora a minha conduta é
cesárea. Engoli uma bola gigante de medo e tristeza. Voltando ao centro
cirúrgico após as milhões de aspirações, peso, medidas e etc, ela colocou
ele por 3 segundos no máximo no bico do meu peito pra ver se ele sugava.
É óbvio que não sugou. Ele nem devia estar entendendo o que tava
acontecendo ali. Mas a pressa era grande e a sensibilidade, pouca. Ela
ensaiou embrulhar ele e levá-lo. Meu marido pediu para segurar nosso filho.
Ele pediu. Acho que ela não teria entregue se não tivesse pedido. Tamanha
9
falta de noção essa. O filho acaba de nascer e você já quer levá-lo pro
berçário? Nananinanão. Enfim, nosso bebê passou algum tempo no colo
dele e depois ele PEDIU para que colocassem perto de mim. E aí meu
coração se apertou muito e eu engoli um puta choro de desespero por não
poder envolvê-lo em meus braços como eu queria, pegá-lo no colo, porque
ninguém veio desamarrar meus braços. A pediatra o colocou ao lado do
meu rosto e como um cachorro, que lambe a cria depois que nasce, eu
passei meu nariz e meu rosto em sua bochecha várias vezes e só dizia que
eu o amava muito. Depois saíram pediatra, meu marido e nosso bebê.
Então, enquanto me fechavam, eu tentei conversar algo, e então a obstetra
disse que daquele jeito eu ia ficar cheia de gases (pelo visto isso deveria ser
óbvio pra mim, mas eu não sabia disso) e logo em seguida alguém disse:
“Tá achando que tá na terapia é?” Meus olhos lacrimejaram. Então quando
abri os olhos senti uma coceira enorme. Nos olhos e na boca. Muito
angustiante. Pedi para alguém vir coçar meus olhos porque estava
insuportável e então alguém disse: tira o aparelho de pressão do braço dela
pra ela coçar. OI? Na hora de abraçar meu filho não pode mas pra coçar o
olho e não incomodar ninguém aí pode desamarrar o braço? COMO É ISSO
MINHA GENTE? E a tristeza me consumia. Eu percebi que estava ficando
meio grogue. Foi quando notei que estava sozinha na sala com a técnica em
enfermagem. Achei que ela deveria estar fazendo algum curativo. Fiquei
calada. Então uma enfermeira entrou e começou a dar uma bronca nela.
Não entendi direito aquilo, na verdade só depois que a memória veio inteira:
ela estava tirando pelos encravados da minha virilha. Sem pedir
autorização, sem cogitar que ali estava uma pessoa. Após a bronca, ela se
retirou. Mais uma vez confirmei: ali eu era tratada como pedaço de carne.
Só lembro que depois acordei na sala de recuperação me tremendo muito
mais do que no início da cirurgia. [...] Um sentimento de impotência. Meu
marido me disse que no berçário tinham dado leite artificial pra ele, mesmo
ele pedindo para não dar. Disseram que era protocolo do hospital. Nos dias
seguintes foi muito ruim. A recuperação de uma cirurgia desse porte é pra
ser levada a sério. E ainda tivemos dificuldades com a amamentação. Senti
por 15 dias dor na coluna da anestesia. Não conseguia ninar meu bebê. Não
conseguia dar banho nele. Não conseguia tirar e colocá-lo na cama.” G.V.C.,
24 anos
"O anestesista se posicionou sobre a minha barriga e me orientou a fazer
força quando ele desse a ordem. Na primeira vez ele me disse pra fazer
força em baixo e não na garganta. Eu mal sabia onde devia fazer força. Foi
aí que ele começou a espremer a minha barriga pra baixo (hoje sei que se
tratava do famigerado kristeller). Em mais uns minutos, Giane nasceu. Quis
tocá-la, quis abraçá-la mas ela foi me apresentada de longe e levada ao
berçário onde só retornou pra mim, quase quatro horas depois. Nas
finalizações, a obstetra, muito orgulhosa suturava a episiotomia como se
fosse uma obra de arte. Chamou meu marido e apontou “olha aqui o seu
pontinho. Vai ficar tudo bem apertadinho. Uma virgem pra você”. E todos
10
caíram na risada. A vergonha caiu sobre mim. E essa episiotomia com esse
pontinho, de fato, me tornaram uma nova mulher. Fiquei por quase dois
anos sentindo dores e desconforto durante as relações." M.R.V.B., 34 anos
“No Centro cirurgico, minutos antes do expulsivo, a técnica em enfermagem
insistiu em amarrar minhas pernas, pouco tempo depois, irritada por eu não
permitir, gritou comigo ordenando que eu me calasse na hora do expulsivo.
Com pleno controle do parto, gritei mais alto, extasiada de felicidade. Ela se
retirou. [...] Na hora do nascimento quis amamentar de imediato, com livre
demanda, na primeira hora. Meu sonho estava acontecendo, minha bebê
linda me olhava enquanto sugava em um momento mágico... Que durou 10
minutos. A pediatra logo interrompe: "preciso pesar e medir". Pedi mais um
pouquinho de tempo e ela retrucou afirmando que seu eu me negasse a
entregar o bebê a direção seria comunicada e meu bebê sairia da
maternidade sem a Declaração de Nascido Vivo (DNV). Eu não estava me
negando, eu não queria discutir, eu estava em paz e feliz pedindo apenas
educadamente para amamentar. ” JNSL, 30
“Todos os parabéns, claro, foram para a figura do médico – que permitiu
uma 'cesárea humanizada'. Depois fiquei bem grogue e apaguei. Só acordei
no quarto com o L. já do meu lado. Marido disse que ele deve ter ficado
umas 2 horas lá no bercinho, em exibição, para a família. Ele foi submetido,
desde o inicio, aos procedimentos de rotina da Promater, sim. Só me dei
conta agora disso! Se sofri violência obstétrica? Claro. Daquelas bem
clássicas – sutis e silenciosas! Também só me dei conta disso agora! (...)
Grau de satisfação: com certeza traumático (maquiado de “é isso M., aceite,
engula”)." M.V., 28 anos
REINVIDICAÇÕES
Nós utilizamos como base as reivindicações da ONG “Parto do
Princípio” - que é uma Rede Nacional de Mulheres que apoia a
maternidade ativa, o empoderamento e a autonomia da mulher
além de desenvolverem um trabalho pela melhoria na assistência
ao pré-natal, parto e puerpério – para compor as reivindicações
importantes para mudar a realidade do parto e do nascimento em
Natal.
1) ACOMPANHANTE NO PARTO
Garantir o cumprimento da Lei do Acompanhante no parto (Lei
Federal 11.108/05)
Faz-se necessária a fiscalização do cumprimento da Lei do Acompanhante
(Lei Federal 11.108/05) e da RDC 36 da ANVISA, que garantem a presença
de um acompanhante de livre escolha da mulher no pré-parto, parto e pós-
parto imediato, independentemente de o nascimento ocorrer por cesárea ou
11
parto normal.
É de atribuição da Vigilância Sanitária fiscalizar, advertir e multar o
descumprimento da RDC 36. A presença de um acompanhante promove
uma série de benefícios à saúde da mãe e do bebê, conforme comprovado
por inúmeros estudos científicos. Impedir a presença do acompanhante é
mais do que o descumprimento da Lei.
1.1)Apoiar a adequação imediata dos hospitais e maternidades para
acolher parturientes com seus acompanhantes
A legislação vigente desde 2005 estabeleceu período de 6 meses para que
os serviços se adequassem à Lei do Acompanhante. Contudo, em vez de
realizar as adaptações necessárias, mesmo diante dos recursos
governamentais disponibilizados, os hospitais persistentemente se limitam a
alegar falta de estrutura para receber os acompanhantes de escolha das
parturientes.
Destaca-se que os serviços podem recorrer a alternativas de baixo custo,
como divisórias de eucatex, para preservar a privacidade de parturientes
em enfermarias coletivas. Além das suítes para parto normal, com modelo
estabelecido pela estratégia da Rede Cegonha do Ministério da Saúde.
1.2)Garantir a adequação da nova Resolução Normativa da Agência
Nacional de Saúde Suplementar à Portaria nº 2.418/05 no que se
refere ao tempo de cobertura do acompanhante da parturiente, de
acordo com a Lei Federal nº 11.108/05 (Lei do Acompanhante)
A ANS divulgou a redação da nova Resolução Normativa que contempla os
procedimentos de cobertura obrigatória pelos planos de saúde. Segundo
essa nova redação, ainda não há obrigatoriedade de cobertura das
despesas do acompanhante conforme previsto pela Portaria nº 2.418/05,
que regulamenta a Lei do Acompanhante. Assim, as mulheres atendidas por
plano de saúde permanecem vulneráveis quanto ao seu direito a um
acompanhante de livre escolha, seja pela cobrança de taxa adicional para
que o acompanhante possa permanecer com a mulher (contratando serviço
diferenciado), seja pela limitação de tempo para a permanência do
acompanhante.
2)EDUCAÇÃO PRÉ-NATAL
2.1)Apoiar e fomentar de grupos de apoio a gestantes em todas as
unidades de saúde
A gestante bem informada tem maior responsabilidade sobre a sua saúde e
a saúde do bebê. As informações sobre o processo gestacional são
fornecidas de modo insuficiente pelos serviços obstétricos atuais. Os grupos
de apoio a gestantes podem ser uma alternativa para realizar educação pré-
natal e pós-natal, podem ser um apoio ao empoderamento feminino,
incentivar o parto normal, podem fornecer apoio ao enfrentamento das
12
inúmeras mudanças psicossociais que as mulheres experimentam em seu
corpo e em sua vida durante a gestação, prevenção do desmame precoce, e
prevenção da depressão pós-parto entre outras psicopatologias do
puerpério.
Dessa forma, ela se torna apta a participar ativamente do processo de
gestação e parto, colaborando com a equipe médica, reduzindo as
peregrinações pelas maternidades durante a fase latente do trabalho de
parto, reduzindo o tempo de internação hospitalar. O preparo das gestantes
também gera confiança, conhecimento e maior satisfação da mulher com o
atendimento obstétrico e ao processo de nascimento de seu bebê.
Os grupos de gestantes com educação perinatal são também uma
estratégia para reduzir a vulnerabilidade das grávidas às cesáreas
realizadas por conveniência médica, por conferirem maior equilíbrio à
relação entre paciente e profissional de saúde e também por
desmistificarem o processo de parturição.
3)ASSISTÊNCIA AO PARTO
3.1)Promover medidas para o enfrentamento da violência
institucional na assistência ao período reprodutivo
Segundo pesquisas, 25% das mulheres relatam alguma forma de violência
na atenção ao parto. São humilhações, ofensas, ameaças e mesmo
agressões físicas. Podemos constatar isso nos relatos aqui expostos.
Exigimos o fim da violência institucional na assistência ao período
reprodutivo, que ocorre tanto no setor público como no setor privado. Uma
divulgação mais eficaz do centro de denúncia se faz necessária para
mapear a violência que vem acontecendo em nosso município.
3.2)Garantir atenção humanizada e baseada em evidências nos
serviços de assistência à gestação, ao parto, nascimento e
puerpério conforme preconizado pela Organização Mundial de
Saúde
Reivindicamos incentivo à implantação de atenção humanizada e com base
em evidências científicas nos serviços de assistência à gestação, ao parto,
nascimento, e puerpério, conforme o preconizado pela Organização Mundial
de Saúde, com princípios reiterados pela Rede pela Humanização do Parto e
Nascimento (ReHuNa) e presentes na Rede Cegonha do Ministério da Saúde.
Promover cursos de atualização científica dos profissionais para que seja
mais acessível aliar prática com evidência científica.
3.3)Garantir a abolição da episiotomia de rotina (“pique”),
conforme preconizado pela Organização Mundial de Saúde e
Ministério da Saúde
Desde a década de 1980, há evidência científica sólida que recomenda a
abolição da episiotomia de rotina. Contudo, o corte no períneo, também
13
conhecido como “pique”, continua a ser realizado rotineiramente na
assistência ao parto normal, sem qualquer indicação médica, sem aviso
prévio à mulher e sem seu consentimento. É tido pela grande maioria dos
profissionais como um procedimento que deve ser realizado. Muitas vezes o
corte na vulva e/ou sua sutura são realizados sem anestesia. Trata-se de
lesão corporal grave e desrespeito à integridade e autonomia da mulher.
São necessários:
- atualização obrigatória e urgente dos profissionais e acadêmicos quanto às
indicações baseadas em evidências;
- combate à “episiotomia didática”;
- intervenções educativas através das secretarias de saúde.
3.4) Garantir que a assistência ao parto não seja prejudicial à
mulher e ao bebê
O Ministério da Saúde reconhece que há práticas que são adotadas
incorretamente na assistência ao parto. Porém, mulheres continuam sendo
vítimas desses procedimentos:
-Utilização rotineira de soro com ocitocina
-Rompimento artificial rotineiro da bolsa das águas
-Empurrar a barriga, subir em cima da barriga da mulher durante o parto,
“manobra de Kristeller”
-Episiotomia de rotina
-Restrição da posição para o parto, obrigar a mulher a ficar deitada para o
parto para comodidade do médico
-Cesárea sem indicação real baseada em evidências científicas
*A posição de decúbito dorsal prejudica a dinâmica do parto, prejudica a
saúde da mãe e prejudica principalmente a oxigenação do bebê, conforme
atestam inúmeras pesquisas científicas.
A Organização Mundial da Saúde recomenda que a mulher permaneça em
posições verticalizadas para o trabalho de parto e parto, com liberdade para
se movimentar e mudar de posição. Porém, mulheres continuam sendo
obrigadas a deitar-se de barriga para cima para dar à luz, posição
desfavorável à fisiologia do parto.
3.5)Apoiar e incentivar a capacitação de doulas comunitárias
voluntárias
As doulas dão apoio físico e emocional às mulheres durante o parto e
pesquisas científicas indicam que sua presença é benéfica à evolução do
parto fisiológico. A doula comunitária voluntária é uma estratégia adotada
14
em várias cidades do país para melhorar a experiência de parto, os
resultados perinatais e também para realizar o controle social. É
comprovado cientificamente que a presença de uma doula diminui o índice
de cesárea.
3.6)Apoiar e incentivar o trabalho de enfermeiras obstetras e
obstetrizes na assistência ao parto normal de risco habitual em
hospitais e maternidades
As enfermeiras obstetras e obstetrizes são profissionais de nível superior,
com capacitação para assistência e manejo do parto normal de gestantes
de baixo risco. Essas profissionais podem oferecer atendimento de
qualidade e segurança e, por sua formação focalizada no processo
fisiológico do parto, constituem boa estratégia para favorecer o parto
normal e reduzir a ocorrência de cesarianas desnecessárias. Essas
profissionais estão aptas a identificar problemas de progressão no trabalho
de parto e parto, assim como a necessidade de intervenção por médico
obstetra. Diversos países desenvolvidos possuem um modelo
descentralizado da figura médica e do hospital de assistência ao parto, com
a presença de enfermeiras obstetras/obstetrizes no acompanhamento dos
partos de gestantes de baixo risco.
3.7)Apoiar e incentivar a construção e funcionamento de Centros de
Parto Normal: (re)abertura do diálogo e participação das mulheres
Os Centros de Parto Normal são modelos de serviços de assistência ao parto
mais adequados às gestações de baixo risco, adotados com sucesso em
vários países e em algumas cidades do Brasil. Apesar de serem apoiados
pelo programa federal Rede Cegonha, as discussões sobre a criação e o
funcionamento desses centros foram emudecidas pelo corporativismo
médico.
É necessário (re)abrir o diálogo sobre os Centros de Parto Normal, em
sintonia com a Estratégia Saúde da Família, com:
- promoção de seminários com o relato de experiências brasileiras de
Centros de Parto Normal;
- promoção e divulgação de pesquisas nacionais e internacionais a respeito
dos resultados perinatais dos Centros de Parto Normal, bem como da
satisfação das mulheres atendidas nesses serviços;
- apoio e incentivo à participação de profissionais de saúde e suas
respectivas classes, como as de Enfermagem, Obstetrícia e Serviço Social.
4)POLÍTICAS
4.1)Promover políticas efetivas para redução do índice de cesáreas
desnecessáreas (sem real indicação médica), considerando as
cesáreas por conveniência médica
De acordo com o mais recente relatório da UNICEF, o Brasil possui a maior
15
taxa de cesáreas do mundo. É necessário e urgente adotar estratégias
efetivas para reduzir o índice de cesáreas desnecessárias. A cesárea é uma
cirurgia de médio a grande porte. Submeter mulheres a cirurgias
desnecessárias é uma violação do direito à saúde e à integridade corporal.
São necessários:
- capacitação e atualização de médicos e enfermeiros para realizarem
assistência e manejo do parto normal com qualidade e segurança;
- atenção às orientações da OMS e Ministério da Saúde quanto ao manejo do
parto;
– punição de profissionais que realizem a cesárea eletiva. Pesquisas
mostram uma associação do aumento da cesárea eletiva com a
prematuridade iatrogênica, desconforto respiratório, dentre outras
complicações.
4.2)Estimular a participação das mulheres na definição e
fiscalização de políticas de saúde da mulher, fomentando o controle
social
Criação de fóruns com a comunidade local a partir da territorialização
utilizada pela Estratégia Saúde da Família no município.
São necessários:
- capacitação dos agentes de saúde da família para promoção e divulgação
dos fóruns, com a participação da população e de outros profissionais
(assistentes de saúde, médicos, enfermeiros, gestores);
- desenvolvimento de estratégias de controle social;
- acompanhamento realizado através de visitas das mulheres à maternidade
ou hospital de referência, entrevistas com mães e profissionais sobre
possíveis queixas e demandas.
4.3)Garantir a implementação da Instrução Normativa nº 2 de 2008
da ANVISA, que estabelece indicadores para a avaliação dos
Serviços de Atenção Obstétrica e Neonatal
A Instrução Normativa estabelece indicadores para a avaliação dos Serviços
de Atenção Obstétrica e Neonatal que seriam divulgados no site da ANVISA.
Porém, esses indicadores não estão sendo divulgados. A tabulação e
divulgação desses índices são de extrema importância para a elaboração de
políticas para melhoria da assistência à saúde da mulher.
Indicadores: taxa de cesárea, taxa de episiotomia, taxa de partos com
acompanhante, taxa de mortalidade neonatal precoce, taxa de infecção
puerperal relacionada a partos normais e cesáreas.
5)DIVERSIDADE
5.1)Garantir a adequação à diversidade étnica e cultural na
assistência à saúde da mulher, especificamente na assistência ao
16
parto e nascimento
Algumas adequações simples já foram adotadas no interior de São Paulo
para assistência ao parto de Guaranis (Resolução SS 72/08). É possível
realizar assistência de qualidade respeitando a cultura de indígenas,
ciganas e quilombolas.
De acordo com a Lei Federal nº 9.836/1999, adequações devem ser
realizadas para o atendimento às populações indígenas.
*Igualdade e respeito à diversidade
Somente em algumas cidades do Estado de São Paulo as indígenas pode m
ter sua dieta adequada às suas tradições, podem ser acompanhadas pela
parteira de sua comunidade em um sistema colaborativo com o médico
assistente, e podem levar a placenta para casa. Em outras regiões do país,
o modelo hospitalar é imposto não respeitando a diversidade étnica e
cultural.
6)TRABALHO e LICENÇA-MATERNIDADE
6.1)Articular com o Congresso Nacional e com a Presidenta a
aprovação da legislação que aumenta para 180 dias a licença-
maternidade (PEC 00515/2010)
De acordo com a Organização Mundial da Saúde e o Ministério da Saúde, os
bebês devem ser amamentados exclusivamente por 6 meses. Porém, a
licença-maternidade só contempla 120 dias (4 meses), deixando as
mulheres no dilema entre a maternidade e o trabalho.
Introduzir outros alimentos à dieta do bebê antes dos seis meses é fator que
diminui sua imunidade e gera doenças - o que de certa forma, prejudica a
trabalhadora duplamente: tanto em sua vida profissional quanto no papel de
mãe.
6.2)Garantir a licença-maternidade estendida para trabalhadoras
mães de bebês prematuros extremos
Mães de bebês prematuros precisam votar ao trabalho depois de 4 meses
de licença maternidade, contribuindo para os altos índices de mortalidade
infantil. O bebê prematuro tem maior risco de adoecer e morrer. O Estado
arca com os custos de internações, medicamentos e ainda não equipararam
a licença para mães e bebês prematuros.
6.3)Encaminhar projeto de lei ao Legislativo para ampliação do
período do regime de exercícios domiciliares a partir do oitavo mês
e durante os seis primeiros meses após o parto para estudantes
(alteração no texto da Lei Federal nº 6.202/1975).
De acordo com a Organização Mundial de Saúde e o Ministério da Saúde, a
orientação é que a amamentação seja exclusiva pelos primeiros seis meses.
17
Atualmente, de acordo com a Lei Federal 6.202/1975, as estudantes têm
direito ao regime de exercícios domiciliares a partir do oitavo mês de
gestação e durante os três primeiros meses após o parto.
Faz-se necessário garantir que o amparo à gestante estudante seja coerente
com as orientações do Ministério da Saúde para que toda estudante possa
decidir amamentar seu bebê até os seis meses.
6.4)Encaminhar projeto de lei ao Legislativo para ampliação do
período de estabilidade de cinco meses para doze meses após o
parto (Ato das Disposições Constitucionais Transitórias, artigo 10º,
inciso II, alínea b)
Faz-se necessário promover a proteção das mulheres em situação de
vulnerabilidade no período pós-licença maternidade.
Garantir a estabilidade da mulher durante o primeiro ano de seu bebê é
uma estratégia para apoiar a maternidade, que é um trabalho que a mulher
realiza para a sociedade.
6.5)Elaborar estratégias para o enfrentamento da discriminação
contra mulheres que retornam da licença-maternidade, contra
mulheres com filhos ou que desejam ter filhos.
Trabalhadoras que retornam ao trabalho depois do fim da licença-
maternidade são assediadas moralmente com mudanças de rotina e/ou
local de trabalho induzindo a demissão “voluntária”.
Referências
AGENCIA NACIONAL DE VIGILANCIA SANITARIA. RDC 36. Diário oficial da
União, 25 de julho de 2013.
AMORIM, Melania. Estudando a gravidez prolongada. Disponível em: <
http://estudamelania.blogspot.com.br/2012/08/estudando-gravidez-
prolongada.html >2012
CUNHA, Eliana. Violência no parto em Minas Gerais: denúncia à Comissão de
Direitos Humanos da Assembleia Legislativa. 2012.
UNICEF. Guia da gestante e do bebê, 2010.
MINISTÉRIO DA SAÚDE. Direitos da Gestante, 2011.
18
MINISTÉRIO DA SAÚDE. Atenção à saúde do recém-nascido: guia para os
profissionais de saúde – cuidados gerais. Brasília, 2011
MINISTÉRIO DA SAÚDE. Rede Cegonha, 2011.
ORGANIZAÇÃO PANAMERICANA DE SAÚDE. Práticas integradas de atenção
ao parto, benéficas para a saúde de mães e crianças. Brasília, 2011.
DINIZ, Simone G.; CHACHAM, Alessandra S. O “corte por cima” e o “corte
por baixo”: o abuso de cesáreas e episiotomias em São Paulo. Questões de
Saúde Reprodutiva, v.1, n.1, p. 80-91, 2006. Disponível em:
<http://www.mulheres.org.br/revistarhm/revista_rhm1/revista1/80-91.pdf>.
Acesso em: 26/02/2013.
FRANZON, Ana Carolina Arruda; SENA, Ligia Moreiras. Teste da violência
obstétrica: divulgação dos resultados. Disponível em:
<http://www.cientistaqueviroumae.com.br/2012/05/teste-da-violencia-
obstetrica.html>. Acesso em: 26/02/2013.
Dossiê Parirás com Dor. ONG Parto do Princípio, 2012.
Documentário Violência Obstétrica: a voz das Brasileiras, 2012. Disponível
em: <http://www.youtube.com/watch?v=eg0uvonF25M>
Mulheres e Gênero nos Espaços Públicos e Privados. Fundação Perseu
Abramo/Sesc. São Paulo, 2011.
Violência no parto em Minas Gerais: denúncia à Comissão de Direitos
Humanos da Assembleia Legislativa. 2012.
SENADO FEDERAL. Comissão Parlamentar mista de inquérito (CPMI),
Relatório Final. Brasília, 2013.
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Manifesto por partos humanizados

  • 1. MANIFESTO PÚBLICO PELA HUMANIZAÇÃO DO PARTO E DO NASCIMENTO CIDADE DE NATAL - RN As pessoas abaixo assinadas manifestam publicamente sua indignação pela baixa qualidade dos serviços de assistência ao parto e ao nascimento nos setores público e privado oferecidos pelos profissionais da área – Obstetras, Pediatras, Anestesistas, Neonatologistas, Enfermeiros e Técnicos em Enfermagem – na cidade de Natal - RN. As condutas técnicas e funcionais adotadas por esses profissionais contrariam as melhores práticas recomendadas pelas instituições científicas, nacionais e internacionais, e ignoram, na maioria dos casos, as diretrizes, orientações e os manuais editados pelo Ministério da Saúde. De forma reiterada, gestantes, puérperas, familiares, testemunhas hospitalares e mesmo, profissionais da área, conscientes da conduta temerária desses profissionais, relatam situações de violência obstétrica por parte da equipe de assistência, tanto da rede pública quanto da rede privada de atenção, apoio e assistência. A inserção de novas técnicas de realização do parto, apoiadas exclusivamente no amplo aparato tecnológico disponível, gera expressivo número de intervenções desnecessárias para mães e bebês, sendo que, na maioria dos casos, o uso de muitas delas, até recentemente, não conta com o necessário e adequado embasamento científico quanto à sua eficácia e segurança (DINIZ & CHACHAM, 2006). As evidências científicas atualizadas mostram que quanto menos se intervém em um parto normal, melhor para mãe e bebê. As intervenções no processo do parto e do nascimento devem ter uma razão relevante para se justificarem, e não devem ser adotadas como procedimentos de rotina nos partos. As práticas adotadas nas maternidades estão incluídas no campo de observação e controle das políticas vinculadas à saúde pública e de direitos humanos (DINIZ & CHACHAM, 2006). A violência contra a parturiente, de natureza institucional, reiterada, tem acontecido em um meio profissional onde o parto é tratado de forma medicalocêntrica e hospitalocêntrica, onde a parturiente é tratada de maneira autoritária e desumana, e em um ambiente onde não há testemunhas isentas que possam inibir tais procedimentos. 1
  • 2. A equipe de assistência ao parto mantém-se, curiosamente, silente e, mesmo, indiferente, quanto aos atos reiterados de violência obstétrica ali cometidos. Violência obstétrica é qualquer ato de violência contra a mãe e o bebê. Violência obstétrica é violência contra a mulher. Em 2007 a Organização das Nações Unidas (ONU) reconheceu a violência contra a mulher como uma violação dos direitos humanos em seu documento “Declaração sobre a Eliminação da Violência Contra as Mulheres” (CPMI, 2013). Agressão verbal, ordens opressoras para que a parturiente silencie durante as contrações, separação da mãe e bebê por horas, proibição quanto à escolha da posição para parir, são alguns exemplos de práticas que desrespeitam os direitos da gestante preconizados pelo Ministério da Saúde e Organização Mundial de Saúde, e que fazem parte da rotina das maternidades e são classificadas como atos de violência obstétrica. Além de o ambiente hospitalar não estar preparado estruturalmente, a equipe tem realizado condutas contrárias ao parto humanizado. Em 2011, uma pesquisa feita pelo Fundação Perseu Abramo entrevistou cerca de mil e novecentas mulheres em todo o Brasil das quais 25% sofreram algum tipo de violência durante seus partos. O achado dessa pesquisa é coerente com relatos encontrados no documentário de 2012 “Violência Obstétrica: a voz das brasileiras”, com o dossiê de 2012 “Violência no parto em Minas Gerais” dentre outros relatos de movimentos de mulheres pelo Brasil. É direito da gestante ter um parto humanizado e uma assistência de qualidade, conforme consta na Cartilha de Direito da Gestante do Ministério da Saúde (2011) e no Guia da Gestante e do Bebê da UNICEF (2010). A Organização Mundial da Saúde reconhece como parte dos Direitos Humanos a parturiente ter autonomia, autoridade e apoio às escolhas feitas por ela. Diariamente essas escolhas são desrespeitadas nas maternidades públicas e privadas de nosso município. No setor privado não há um controle quanto às taxas de cesárea. Acredita-se que cheguem aos 90%, muito aquém do limiar dos 15% recomendados pela Organização Mundial da Saúde. A cesárea eletiva tem sido associada a elevação da taxa de prematuridade iatrogênica e outras complicações maternas e neonatais (DINIZ & CHACHAM, 2006). Atualmente um grande número de mulheres da rede privada peregrina em busca de um obstetra que acompanhe um parto natural sem intervenções, e é sempre proposto (determinado), contrariando todas 2
  • 3. as diretrizes dos organismos nacionais e internacionais de saúde, agendar uma data para o nascimento. Esse tipo de conduta é contra o que vem mostrando estudos científicos. Desde 2011 o Ministério da Saúde com a estratégia da Rede Cegonha busca implementar a atenção humanizada ao parto e nascimento, incentivando os partos normais, devido à preocupação existente quanto ao elevado índice de cesárea no Brasil. O temerário e injustificado protocolo de cuidados com o recém-nascido imposto pelas maternidades inclui as seguintes práticas, entre outras:  separação imediata para esfregar a sua delicada pele com panos grossos;  aspirá-los por todos os orifícios;  ministrar vitamina K;  apresentar à mãe por alguns minutos e encaminhar estes mesmos bebês aos berçários para serem mantidos em berços aquecidos por muito tempo e onde ainda é oferecido leite artificial para o bebê sem o consentimento da mãe e sem atentar para o impacto negativo que isso tem no estabelecimento do aleitamento materno; Esses protocolos vão contra o que preconiza o Ministério da Saúde em seu documento intitulado “Atenção à saúde do Recém-Nascido”, e a Organização Pan Americana de Saúde, no documento “Práticas integradas de atenção ao parto, benéficas para a saúde de mães e crianças”, ambos publicados em 2011, que recomenda, entre outras condutas, as que assegurem a proteção e humanização do parto:  o contato pele a pele;  o estímulo a amamentação na primeira hora de vida;  o alojamento conjunto imediato;  a realização da avaliação do recém-nascido no colo da mãe, fortalecendo, dessa forma, de imediato, o vínculo entre mãe e bebê;  o clampeamento tardio do cordão umbilical Abaixo estão elucidadas condutas consideradas pela Organização Mundial da Saúde como sendo de violência obstétrica e que causam um sofrimento desnecessário para mãe e bebê (apud CUNHA, 2012): 1. Cesariana sem indicação clínica e/ou sob falsos pretextos, tais como: 3
  • 4. • Circular de cordão (não importa quantas); • Trabalho de parto prolongado (esse tempo é individual, não há padrões, bastando mãe e bebê estarem em boas condições); • Expulsivo prolongado (existe apenas uma média, não um tempo exato para esta fase); • Pós-datismo (nos anos 70 esperava-se até 42 semanas, hoje às 40 – ou menos - a criança é extraída do ventre materno sob esta alegação, muitas vezes prematuramente por erro de suposição de data). As diretrizes do MS e da OMS são de induzir ou ter uma conduta expectativa com monitoramento fetal; • Pressão alta; • Bacia "muito estreita" (não é possível medir sem prova de trabalho de parto); • Bebê "muito grande" (os ossos e tecidos da mãe se movem para a passagem da criança); • Cesárea anterior (o risco de ruptura da cicatriz uterina é idêntico a de quem nunca teve cirurgias antes); • Primigesta com mais de 35 anos; • Primigesta adolescente; • HPV, verrugas genitais, miomas, cistos; • Pouco ou muito líquido amniótico; • Problema de hemorróidas, dentre outros. Ou realizar cesariana sem indicação precisa por pressa da equipe ou descrença na capacidade da mulher. A mulher que é submetida a uma cesariana sem indicações clínicas precisas está sendo exposta a três vezes mais riscos de contrair infecção, ter hemorragia, problemas decorrentes da analgesia, dificuldades na amamentação, dentre outros, e seu bebê a riscos decorrentes da prematuridade iatrogênica, tais como baixo peso, problemas respiratórios, icterícia grave; 4
  • 5. 2. Episiotomia de rotina: incisão cirúrgica realizada no períneo para aumentar a abertura da vagina. Constitui, por si só, uma laceração de segundo grau, quando uma laceração espontânea poderia nem ocorrer (mais de 60% dos casos). A revisão de Thacker e Banta, publicada em 1983 demonstrou, além da inexistência de evidências da eficácia dessa prática, evidências consideráveis dos riscos associados ao procedimento: dor, edema, infecção, hematoma, dispareunia e rigidez do períneo. A não realização de episiotomia de rotina está associada a manutenção da integridade do períneo (nenhuma lesão) em aproximadamente 60% dos partos e aumento do trauma no períneo anterior (região da vulva acima da vagina), porém os traumas anteriores são menos danosos que os traumas posteriores (CARROLI e MIGNINI, 2009; AMORIM, 2012). 3. Exames de toque abusivos: o exame de toque é um dos mais invasivos procedimentos de todo o trabalho de parto, sendo realizado muitas vezes de forma frequente, dolorosa e por muitos profissionais sem pedir sequer licença à mulher. A OMS recomenda que o exame vaginal seja realizado com intervalo mínimo de quatro horas, com a mulher em decúbito lateral esquerdo e jamais durante as contrações; 4. Descolamento de membranas sem prévia discussão e autorização da gestante: consiste em afastar a bolsa amniótica do útero através da dilatação existente, descarregando hormônios que podem desencadear, pródromos prolongados, dor e sangramentos (AMORIM, 2012). 5. Restringir a escolha do local de parto: segundo a OMS o “fornecimento de assistência obstétrica no nível mais periférico onde o parto for viável e seguro e onde a mulher se sentir segura e confiante” é uma conduta claramente útil e que deveria ser encorajada; 6. Proibir o acompanhante de livre escolha da escolha da mulher: uma mulher não deve ser deixada sozinha em nenhuma das fases do trabalho de parto, parto e pós-parto. As instituições e profissionais de saúde devem respeitar a escolha da mulher quanto ao acompanhante durante trabalho de parto e parto. Revisão sistemática da biblioteca Cochrane que incluiu 16 estudos e um total de 13.391 mulheres evidenciou que o suporte contínuo intra-parto contribui para: • Discreta redução do tempo do trabalho de parto; • Maior probabilidade de vivenciar partos naturais espontâneos; • Maior satisfação com as vivências de parto; 5
  • 6. • Menor necessidade de uso de analgesia (HODNETT; et al., 2010). 7. Desrespeitar o direito da mulher à privacidade: permitir a entrada de pessoas não autorizadas no local do parto, restringido a privacidade e causando constrangimento à mulher. Deixar a mulher exposta fisicamente. A Lei do Acompanhante é constantemente desrespeitada, algumas vezes, alegando-se que a presença de outra pessoa pode constranger outra parturiente numa enfermaria ou nos biombos contíguos ao bloco cirúrgico. Outras vezes, consideram que a Lei do Acompanhante diz respeito apenas ao período expulsivo, deixando a mulher sozinha durante o trabalho de parto e, mais ainda, no período pós-parto, na sala de observação. 8. Negar métodos de alívio da dor: consiste em privar a mulher de métodos não farmacológicos para alívio da dor ou se negar a aplicar analgesia, quando solicitado; 9. Realizar intervenções/procedimentos sem o conhecimento e consentimento da mulher: é direito da mulher ser informada dos riscos e benefícios das intervenções, bem como de suas indicações, antes de sua realização; 10. Restrição à deambulação e liberdade de movimentos; 11. Estabelecer limites rígidos de tempo para a duração das fases do trabalho de parto e parto; 12. Praticar violência verbal (mandar calar a boca, xingar, humilhar, usar termos pejorativos, ameaçar), desconcentrar e desencorajar a parturiente: o parto é um evento fisiológico e para acontecer é necessário que a mulher esteja em um ambiente tranquilo, acolhedor, com uma equipe que a respeite. A falta de privacidade é comum em alguns hospitais, sobretudo em hospitais universitários que as mulheres são usadas para o aprendizado da prática. A prática de violência verbal é corriqueira nos serviços de saúde no Brasil e atrapalha o processo fisiológico do parto, pois eleva os níveis de adrenalina que bloqueiam a liberação da ocitocina natural, o hormônio responsável pelas contrações uterinas; 13. Usar rotineiramente soro com ocitocina sintética para indução/aceleração do trabalho de parto e parto: a ocitocina é um hormônio produzido pelo corpo humano e que provoca contrações uterinas. Existe também a versão sintética utilizada para induzir ou acelerar um parto, procedimento descrito pela OMS como “condutas claramente prejudiciais ou ineficazes e que deveriam ser eliminadas”. A infusão intravenosa e sem bomba e sem monitoramento continuo do bem estar fetal que possibilita a aplicação de ocitocina e outros medicamentos, é procedimento de rotina no trabalho de parto na maioria das instituições hospitalares. 14. Direcionamento de puxos: "faça força agora", "força comprida", etc; 6
  • 7. 15. Manobra de Valsalva: orientar a mulher a "trincar os dentes e fazer força"; 16. Obrigar a mulher a ficar em decúbito dorsal: Vários estudos mostram que, durante a primeira fase do trabalho do parto, a posição supina (deitada de costas) afeta o fluxo de sangue no útero. O peso do útero pode causar compressão da aorta-cava e o fluxo de sangue reduzido pode comprometer a condição fetal. A posição supina também pode diminuir a intensidade das contrações. Não obstante, esta é posição mais comum utilizada por facilitar o trabalho do profissional. O uso rotineiro da posição de litotomia com ou sem estribos durante o trabalho de parto não é recomendado pela OMS. Revisão sistemática da biblioteca Cochrane de 20 estudos com 6.135 mulheres identificou que as posições verticalizadas ou a posição lateral associaram-se com redução da duração do período expulsivo do parto, redução nas anormalidades da frequência cardíaca fetal, bem como redução de relatos de dor grave e episiotomias. Foi observado, no entanto, maior perda de sangue estimada (acima de 500 mL), porém sem repercussões clínicas consideráveis. A conclusão dos revisores é que as mulheres devem parir na posição que lhes for mais confortável, com o balanço das evidências a favor das posições não-supinas. (GUPTA e HOFMEYER, 2010); 17. Manobra de Kristeller: procedimento PROSCRITO e proibido em diversos países,consiste em empurrar o fundo do útero, ou seja, fazer pressão de qualquer intensidade sobre a barriga da mulher para empurrar o bebê. Bebe nasce chocado devido ao desrespeito do tempo de descida sendo ela acelerada, justificando uso do oxigênio neonatal e a cascata de intervenções. Dentre os riscos associados a esta manobra estão: • Trauma perineal • Trauma nos esfíncteres anais • Ruptura uterina • Danos e paralisia nos nervos do bebê • Danos cerebrais ao bebê 18. Não permitir o nascimento espontâneo do bebê: realizar fórceps e vácuo de rotina e/ou sem autorização da mulher, levando a tocotraumatismos e piores escores de Apgar (nota dada ao bebê no primeiro minuto e no quinto minuto de vida e que serve para avaliar sua vitalidade); 19. Clampeamento precoce do cordão umbilical: consiste em clampear e cortar o cordão umbilical imediatamente após o nascimento. Aguardar o corte do cordão umbilical por no mínimo de 3 minutos, além de permitir a adequada adaptação metabólica do recém-nascido, permite um maior 7
  • 8. aporte de ferro associado a menores taxas de anemia até o sexto mês de vida (MS, 2011) 20. Afastar o bebê saudável da mãe: entregar um bebê vigoroso ao neonatologista para secar e aquecer, afastando-o da mãe: estudos comprovam que a temperatura corporal no recém-nascido é em média um grau mais elevada no colo de sua mãe do que no berço aquecido, e que a amamentação na primeira hora de vida favorece a pega correta (e portando o sucesso da amamentação), além de colonizar o bebê com as bactérias da mãe, ajudando-o a criar resistência. Revisão sistemática da biblioteca Cochrane que incluiu 34 estudos totalizando 2.177 mulheres e bebês identificou que os bebês que foram colocados em contato pele a pele com suas mães nas primeiras horas de vida apresentaram menos choro nos primeiros meses de vida, amamentaram mais e as mães interagiram mais com o bebê, por meio de toques amorosos e carinhosos (MOORE; et al., 2010). E ainda, manter bebês saudáveis em berçários nas primeira horas de vida ou durante todo o período de internação. A RDC 36 de 2008 e muitos outros documentos científicos orientam: “O serviço deve garantir a adoção de alojamento conjunto desde o nascimento”, sem separação para observação; 21. Aspirar as vias aéreas do recém-nascido como rotina para pesquisar atresia de coanas, atresia de esôfago e ânus imperfurado: um diagnóstico observacional para recém-nascidos normais e saudáveis é suficiente, evitando, dentre outras complicações, perfurações e edemas de mucosa (Ministério da Saúde, 2010). O contato íntimo, pele a pele, da mãe com o bebê após o nascimento (momento em que o recém-nascido está em estado de vigília) diminui o estresse do bebê, facilita o vínculo entre mãe e bebê e aumenta as chances de sucesso na amamentação. Não obstante, muitos bebês quando nascem apenas são mostrados a suas mães e levados para o berçário onde permanecem durante as primeiras horas de vida. 22. Passar sonda de rotina no recém-nascido para pesquisar atresia de coanas, atresia de esôfago e ânus imperfurado. 23. Fazer qualquer procedimento com o recém-nascido sem conhecimento/consentimento dos pais: oferecer bicos, chupetas, mamadeiras com leite artificial para o recém-nascido, dar banho, aplicar vacinas e vitaminas, aplicar nitrato de prata ou erytromycina nos olhos do bebê rotineiramente (protocolo que precisa ser revisado, pois visa a redução das infecções oftálmicas mesmo em filhos de mães não infectadas). A avaliação deve ocorrer no quarto na presença dos familiares, pois o bebê saudável não deve ficar afastado da mãe (MS, 2011) 24. Realizar tração do cordão e massagens para agilizar o parto da placenta: associada a dor e riscos de hemorragia e infecção puerperal; 8
  • 9. 25. Revisar manualmente a cavidade uterina como rotina: descrita como uma “conduta frequentemente utilizada de modo inadequado” pela OMS. RELATOS Seguem abaixo trechos de relatos de mulheres que passaram por situação de violência obstétrica nas maternidades do município do Natal. “Minha barriga estava enorme, a mobilidade de uma grávida às 41 semanas de gestação não é lá essas coisas. Enfim, tentei virar de lado e não consegui sozinha. Estava com medo de cair daquela maca estreita. Pedi ajuda à técnica em enfermagem, me virei e ele começou a palpar minha coluna. Ele não ficou feliz, murmurava algo como – “a coluna dela é muito ruim de achar” – e aí minha adrenalina disparou. Eu já tinha pavor de ter que passar por uma cesárea, tinha mais medo ainda da anestesia da cesárea, e ainda um cara esquisito daquele falava que minha coluna era ruim? Ele furou uma, duas, resmungou, três e finalmente na quarta vez ele conseguiu achar o que queria e a anestesia pegou. Lembro vagamente que mandaram meu marido entrar, colocaram um pano na minha frente, amarraram meu braço esquerdo com um soro e o braço direito com um aparelho de pressão e eu fiquei deitada ali como Jesus na cruz, pedindo ajuda de anjo da guarda, Deus, minhas ancestrais, todo mundo que eu lembrasse para que enfrentasse aquele momento do melhor jeito possível. Estava me sentindo como um pedaço de carne qualquer em um açougue. [...]Mas naquele dia da cirurgia, havia feito uma ultra que mostrava líquido amniótico com nível 5.8. Logo que saí de lá levei o exame para a obstetra que me acompanhava e ela disse que por eu querer muito um parto normal ela iria tentar a indução. Colocou a primeira ampola e dali a 6 horas eu voltaria a encontrá- la para ver como estavam as contrações. Bom, é importante dizer que eu estava com contrações irregulares havia mais de uma semana, dilatação de 2 cm e colo grosso. Ficamos esperando, mas tinha chegado no limite dela. Eu sabia que se esperássemos poderia entrar em trabalho de parto de fato. E que estar a uma semana com a mesma dilatação não significava nada porque o trabalho de parto poderia engatar a qualquer momento. Sabia também que 5.8 de líquido não era, pelas evidências científicas, indicação de cesárea. Mas ela disse naquela manhã que iria esperar no máximo até a manhã seguinte. Colocamos a primeira ampola pela manhã e quando voltei no final da tarde, as contrações não tinham engatado e a dilatação estava do mesmo jeito. Foi então que ela me disse: Agora a minha conduta é cesárea. Engoli uma bola gigante de medo e tristeza. Voltando ao centro cirúrgico após as milhões de aspirações, peso, medidas e etc, ela colocou ele por 3 segundos no máximo no bico do meu peito pra ver se ele sugava. É óbvio que não sugou. Ele nem devia estar entendendo o que tava acontecendo ali. Mas a pressa era grande e a sensibilidade, pouca. Ela ensaiou embrulhar ele e levá-lo. Meu marido pediu para segurar nosso filho. Ele pediu. Acho que ela não teria entregue se não tivesse pedido. Tamanha 9
  • 10. falta de noção essa. O filho acaba de nascer e você já quer levá-lo pro berçário? Nananinanão. Enfim, nosso bebê passou algum tempo no colo dele e depois ele PEDIU para que colocassem perto de mim. E aí meu coração se apertou muito e eu engoli um puta choro de desespero por não poder envolvê-lo em meus braços como eu queria, pegá-lo no colo, porque ninguém veio desamarrar meus braços. A pediatra o colocou ao lado do meu rosto e como um cachorro, que lambe a cria depois que nasce, eu passei meu nariz e meu rosto em sua bochecha várias vezes e só dizia que eu o amava muito. Depois saíram pediatra, meu marido e nosso bebê. Então, enquanto me fechavam, eu tentei conversar algo, e então a obstetra disse que daquele jeito eu ia ficar cheia de gases (pelo visto isso deveria ser óbvio pra mim, mas eu não sabia disso) e logo em seguida alguém disse: “Tá achando que tá na terapia é?” Meus olhos lacrimejaram. Então quando abri os olhos senti uma coceira enorme. Nos olhos e na boca. Muito angustiante. Pedi para alguém vir coçar meus olhos porque estava insuportável e então alguém disse: tira o aparelho de pressão do braço dela pra ela coçar. OI? Na hora de abraçar meu filho não pode mas pra coçar o olho e não incomodar ninguém aí pode desamarrar o braço? COMO É ISSO MINHA GENTE? E a tristeza me consumia. Eu percebi que estava ficando meio grogue. Foi quando notei que estava sozinha na sala com a técnica em enfermagem. Achei que ela deveria estar fazendo algum curativo. Fiquei calada. Então uma enfermeira entrou e começou a dar uma bronca nela. Não entendi direito aquilo, na verdade só depois que a memória veio inteira: ela estava tirando pelos encravados da minha virilha. Sem pedir autorização, sem cogitar que ali estava uma pessoa. Após a bronca, ela se retirou. Mais uma vez confirmei: ali eu era tratada como pedaço de carne. Só lembro que depois acordei na sala de recuperação me tremendo muito mais do que no início da cirurgia. [...] Um sentimento de impotência. Meu marido me disse que no berçário tinham dado leite artificial pra ele, mesmo ele pedindo para não dar. Disseram que era protocolo do hospital. Nos dias seguintes foi muito ruim. A recuperação de uma cirurgia desse porte é pra ser levada a sério. E ainda tivemos dificuldades com a amamentação. Senti por 15 dias dor na coluna da anestesia. Não conseguia ninar meu bebê. Não conseguia dar banho nele. Não conseguia tirar e colocá-lo na cama.” G.V.C., 24 anos "O anestesista se posicionou sobre a minha barriga e me orientou a fazer força quando ele desse a ordem. Na primeira vez ele me disse pra fazer força em baixo e não na garganta. Eu mal sabia onde devia fazer força. Foi aí que ele começou a espremer a minha barriga pra baixo (hoje sei que se tratava do famigerado kristeller). Em mais uns minutos, Giane nasceu. Quis tocá-la, quis abraçá-la mas ela foi me apresentada de longe e levada ao berçário onde só retornou pra mim, quase quatro horas depois. Nas finalizações, a obstetra, muito orgulhosa suturava a episiotomia como se fosse uma obra de arte. Chamou meu marido e apontou “olha aqui o seu pontinho. Vai ficar tudo bem apertadinho. Uma virgem pra você”. E todos 10
  • 11. caíram na risada. A vergonha caiu sobre mim. E essa episiotomia com esse pontinho, de fato, me tornaram uma nova mulher. Fiquei por quase dois anos sentindo dores e desconforto durante as relações." M.R.V.B., 34 anos “No Centro cirurgico, minutos antes do expulsivo, a técnica em enfermagem insistiu em amarrar minhas pernas, pouco tempo depois, irritada por eu não permitir, gritou comigo ordenando que eu me calasse na hora do expulsivo. Com pleno controle do parto, gritei mais alto, extasiada de felicidade. Ela se retirou. [...] Na hora do nascimento quis amamentar de imediato, com livre demanda, na primeira hora. Meu sonho estava acontecendo, minha bebê linda me olhava enquanto sugava em um momento mágico... Que durou 10 minutos. A pediatra logo interrompe: "preciso pesar e medir". Pedi mais um pouquinho de tempo e ela retrucou afirmando que seu eu me negasse a entregar o bebê a direção seria comunicada e meu bebê sairia da maternidade sem a Declaração de Nascido Vivo (DNV). Eu não estava me negando, eu não queria discutir, eu estava em paz e feliz pedindo apenas educadamente para amamentar. ” JNSL, 30 “Todos os parabéns, claro, foram para a figura do médico – que permitiu uma 'cesárea humanizada'. Depois fiquei bem grogue e apaguei. Só acordei no quarto com o L. já do meu lado. Marido disse que ele deve ter ficado umas 2 horas lá no bercinho, em exibição, para a família. Ele foi submetido, desde o inicio, aos procedimentos de rotina da Promater, sim. Só me dei conta agora disso! Se sofri violência obstétrica? Claro. Daquelas bem clássicas – sutis e silenciosas! Também só me dei conta disso agora! (...) Grau de satisfação: com certeza traumático (maquiado de “é isso M., aceite, engula”)." M.V., 28 anos REINVIDICAÇÕES Nós utilizamos como base as reivindicações da ONG “Parto do Princípio” - que é uma Rede Nacional de Mulheres que apoia a maternidade ativa, o empoderamento e a autonomia da mulher além de desenvolverem um trabalho pela melhoria na assistência ao pré-natal, parto e puerpério – para compor as reivindicações importantes para mudar a realidade do parto e do nascimento em Natal. 1) ACOMPANHANTE NO PARTO Garantir o cumprimento da Lei do Acompanhante no parto (Lei Federal 11.108/05) Faz-se necessária a fiscalização do cumprimento da Lei do Acompanhante (Lei Federal 11.108/05) e da RDC 36 da ANVISA, que garantem a presença de um acompanhante de livre escolha da mulher no pré-parto, parto e pós- parto imediato, independentemente de o nascimento ocorrer por cesárea ou 11
  • 12. parto normal. É de atribuição da Vigilância Sanitária fiscalizar, advertir e multar o descumprimento da RDC 36. A presença de um acompanhante promove uma série de benefícios à saúde da mãe e do bebê, conforme comprovado por inúmeros estudos científicos. Impedir a presença do acompanhante é mais do que o descumprimento da Lei. 1.1)Apoiar a adequação imediata dos hospitais e maternidades para acolher parturientes com seus acompanhantes A legislação vigente desde 2005 estabeleceu período de 6 meses para que os serviços se adequassem à Lei do Acompanhante. Contudo, em vez de realizar as adaptações necessárias, mesmo diante dos recursos governamentais disponibilizados, os hospitais persistentemente se limitam a alegar falta de estrutura para receber os acompanhantes de escolha das parturientes. Destaca-se que os serviços podem recorrer a alternativas de baixo custo, como divisórias de eucatex, para preservar a privacidade de parturientes em enfermarias coletivas. Além das suítes para parto normal, com modelo estabelecido pela estratégia da Rede Cegonha do Ministério da Saúde. 1.2)Garantir a adequação da nova Resolução Normativa da Agência Nacional de Saúde Suplementar à Portaria nº 2.418/05 no que se refere ao tempo de cobertura do acompanhante da parturiente, de acordo com a Lei Federal nº 11.108/05 (Lei do Acompanhante) A ANS divulgou a redação da nova Resolução Normativa que contempla os procedimentos de cobertura obrigatória pelos planos de saúde. Segundo essa nova redação, ainda não há obrigatoriedade de cobertura das despesas do acompanhante conforme previsto pela Portaria nº 2.418/05, que regulamenta a Lei do Acompanhante. Assim, as mulheres atendidas por plano de saúde permanecem vulneráveis quanto ao seu direito a um acompanhante de livre escolha, seja pela cobrança de taxa adicional para que o acompanhante possa permanecer com a mulher (contratando serviço diferenciado), seja pela limitação de tempo para a permanência do acompanhante. 2)EDUCAÇÃO PRÉ-NATAL 2.1)Apoiar e fomentar de grupos de apoio a gestantes em todas as unidades de saúde A gestante bem informada tem maior responsabilidade sobre a sua saúde e a saúde do bebê. As informações sobre o processo gestacional são fornecidas de modo insuficiente pelos serviços obstétricos atuais. Os grupos de apoio a gestantes podem ser uma alternativa para realizar educação pré- natal e pós-natal, podem ser um apoio ao empoderamento feminino, incentivar o parto normal, podem fornecer apoio ao enfrentamento das 12
  • 13. inúmeras mudanças psicossociais que as mulheres experimentam em seu corpo e em sua vida durante a gestação, prevenção do desmame precoce, e prevenção da depressão pós-parto entre outras psicopatologias do puerpério. Dessa forma, ela se torna apta a participar ativamente do processo de gestação e parto, colaborando com a equipe médica, reduzindo as peregrinações pelas maternidades durante a fase latente do trabalho de parto, reduzindo o tempo de internação hospitalar. O preparo das gestantes também gera confiança, conhecimento e maior satisfação da mulher com o atendimento obstétrico e ao processo de nascimento de seu bebê. Os grupos de gestantes com educação perinatal são também uma estratégia para reduzir a vulnerabilidade das grávidas às cesáreas realizadas por conveniência médica, por conferirem maior equilíbrio à relação entre paciente e profissional de saúde e também por desmistificarem o processo de parturição. 3)ASSISTÊNCIA AO PARTO 3.1)Promover medidas para o enfrentamento da violência institucional na assistência ao período reprodutivo Segundo pesquisas, 25% das mulheres relatam alguma forma de violência na atenção ao parto. São humilhações, ofensas, ameaças e mesmo agressões físicas. Podemos constatar isso nos relatos aqui expostos. Exigimos o fim da violência institucional na assistência ao período reprodutivo, que ocorre tanto no setor público como no setor privado. Uma divulgação mais eficaz do centro de denúncia se faz necessária para mapear a violência que vem acontecendo em nosso município. 3.2)Garantir atenção humanizada e baseada em evidências nos serviços de assistência à gestação, ao parto, nascimento e puerpério conforme preconizado pela Organização Mundial de Saúde Reivindicamos incentivo à implantação de atenção humanizada e com base em evidências científicas nos serviços de assistência à gestação, ao parto, nascimento, e puerpério, conforme o preconizado pela Organização Mundial de Saúde, com princípios reiterados pela Rede pela Humanização do Parto e Nascimento (ReHuNa) e presentes na Rede Cegonha do Ministério da Saúde. Promover cursos de atualização científica dos profissionais para que seja mais acessível aliar prática com evidência científica. 3.3)Garantir a abolição da episiotomia de rotina (“pique”), conforme preconizado pela Organização Mundial de Saúde e Ministério da Saúde Desde a década de 1980, há evidência científica sólida que recomenda a abolição da episiotomia de rotina. Contudo, o corte no períneo, também 13
  • 14. conhecido como “pique”, continua a ser realizado rotineiramente na assistência ao parto normal, sem qualquer indicação médica, sem aviso prévio à mulher e sem seu consentimento. É tido pela grande maioria dos profissionais como um procedimento que deve ser realizado. Muitas vezes o corte na vulva e/ou sua sutura são realizados sem anestesia. Trata-se de lesão corporal grave e desrespeito à integridade e autonomia da mulher. São necessários: - atualização obrigatória e urgente dos profissionais e acadêmicos quanto às indicações baseadas em evidências; - combate à “episiotomia didática”; - intervenções educativas através das secretarias de saúde. 3.4) Garantir que a assistência ao parto não seja prejudicial à mulher e ao bebê O Ministério da Saúde reconhece que há práticas que são adotadas incorretamente na assistência ao parto. Porém, mulheres continuam sendo vítimas desses procedimentos: -Utilização rotineira de soro com ocitocina -Rompimento artificial rotineiro da bolsa das águas -Empurrar a barriga, subir em cima da barriga da mulher durante o parto, “manobra de Kristeller” -Episiotomia de rotina -Restrição da posição para o parto, obrigar a mulher a ficar deitada para o parto para comodidade do médico -Cesárea sem indicação real baseada em evidências científicas *A posição de decúbito dorsal prejudica a dinâmica do parto, prejudica a saúde da mãe e prejudica principalmente a oxigenação do bebê, conforme atestam inúmeras pesquisas científicas. A Organização Mundial da Saúde recomenda que a mulher permaneça em posições verticalizadas para o trabalho de parto e parto, com liberdade para se movimentar e mudar de posição. Porém, mulheres continuam sendo obrigadas a deitar-se de barriga para cima para dar à luz, posição desfavorável à fisiologia do parto. 3.5)Apoiar e incentivar a capacitação de doulas comunitárias voluntárias As doulas dão apoio físico e emocional às mulheres durante o parto e pesquisas científicas indicam que sua presença é benéfica à evolução do parto fisiológico. A doula comunitária voluntária é uma estratégia adotada 14
  • 15. em várias cidades do país para melhorar a experiência de parto, os resultados perinatais e também para realizar o controle social. É comprovado cientificamente que a presença de uma doula diminui o índice de cesárea. 3.6)Apoiar e incentivar o trabalho de enfermeiras obstetras e obstetrizes na assistência ao parto normal de risco habitual em hospitais e maternidades As enfermeiras obstetras e obstetrizes são profissionais de nível superior, com capacitação para assistência e manejo do parto normal de gestantes de baixo risco. Essas profissionais podem oferecer atendimento de qualidade e segurança e, por sua formação focalizada no processo fisiológico do parto, constituem boa estratégia para favorecer o parto normal e reduzir a ocorrência de cesarianas desnecessárias. Essas profissionais estão aptas a identificar problemas de progressão no trabalho de parto e parto, assim como a necessidade de intervenção por médico obstetra. Diversos países desenvolvidos possuem um modelo descentralizado da figura médica e do hospital de assistência ao parto, com a presença de enfermeiras obstetras/obstetrizes no acompanhamento dos partos de gestantes de baixo risco. 3.7)Apoiar e incentivar a construção e funcionamento de Centros de Parto Normal: (re)abertura do diálogo e participação das mulheres Os Centros de Parto Normal são modelos de serviços de assistência ao parto mais adequados às gestações de baixo risco, adotados com sucesso em vários países e em algumas cidades do Brasil. Apesar de serem apoiados pelo programa federal Rede Cegonha, as discussões sobre a criação e o funcionamento desses centros foram emudecidas pelo corporativismo médico. É necessário (re)abrir o diálogo sobre os Centros de Parto Normal, em sintonia com a Estratégia Saúde da Família, com: - promoção de seminários com o relato de experiências brasileiras de Centros de Parto Normal; - promoção e divulgação de pesquisas nacionais e internacionais a respeito dos resultados perinatais dos Centros de Parto Normal, bem como da satisfação das mulheres atendidas nesses serviços; - apoio e incentivo à participação de profissionais de saúde e suas respectivas classes, como as de Enfermagem, Obstetrícia e Serviço Social. 4)POLÍTICAS 4.1)Promover políticas efetivas para redução do índice de cesáreas desnecessáreas (sem real indicação médica), considerando as cesáreas por conveniência médica De acordo com o mais recente relatório da UNICEF, o Brasil possui a maior 15
  • 16. taxa de cesáreas do mundo. É necessário e urgente adotar estratégias efetivas para reduzir o índice de cesáreas desnecessárias. A cesárea é uma cirurgia de médio a grande porte. Submeter mulheres a cirurgias desnecessárias é uma violação do direito à saúde e à integridade corporal. São necessários: - capacitação e atualização de médicos e enfermeiros para realizarem assistência e manejo do parto normal com qualidade e segurança; - atenção às orientações da OMS e Ministério da Saúde quanto ao manejo do parto; – punição de profissionais que realizem a cesárea eletiva. Pesquisas mostram uma associação do aumento da cesárea eletiva com a prematuridade iatrogênica, desconforto respiratório, dentre outras complicações. 4.2)Estimular a participação das mulheres na definição e fiscalização de políticas de saúde da mulher, fomentando o controle social Criação de fóruns com a comunidade local a partir da territorialização utilizada pela Estratégia Saúde da Família no município. São necessários: - capacitação dos agentes de saúde da família para promoção e divulgação dos fóruns, com a participação da população e de outros profissionais (assistentes de saúde, médicos, enfermeiros, gestores); - desenvolvimento de estratégias de controle social; - acompanhamento realizado através de visitas das mulheres à maternidade ou hospital de referência, entrevistas com mães e profissionais sobre possíveis queixas e demandas. 4.3)Garantir a implementação da Instrução Normativa nº 2 de 2008 da ANVISA, que estabelece indicadores para a avaliação dos Serviços de Atenção Obstétrica e Neonatal A Instrução Normativa estabelece indicadores para a avaliação dos Serviços de Atenção Obstétrica e Neonatal que seriam divulgados no site da ANVISA. Porém, esses indicadores não estão sendo divulgados. A tabulação e divulgação desses índices são de extrema importância para a elaboração de políticas para melhoria da assistência à saúde da mulher. Indicadores: taxa de cesárea, taxa de episiotomia, taxa de partos com acompanhante, taxa de mortalidade neonatal precoce, taxa de infecção puerperal relacionada a partos normais e cesáreas. 5)DIVERSIDADE 5.1)Garantir a adequação à diversidade étnica e cultural na assistência à saúde da mulher, especificamente na assistência ao 16
  • 17. parto e nascimento Algumas adequações simples já foram adotadas no interior de São Paulo para assistência ao parto de Guaranis (Resolução SS 72/08). É possível realizar assistência de qualidade respeitando a cultura de indígenas, ciganas e quilombolas. De acordo com a Lei Federal nº 9.836/1999, adequações devem ser realizadas para o atendimento às populações indígenas. *Igualdade e respeito à diversidade Somente em algumas cidades do Estado de São Paulo as indígenas pode m ter sua dieta adequada às suas tradições, podem ser acompanhadas pela parteira de sua comunidade em um sistema colaborativo com o médico assistente, e podem levar a placenta para casa. Em outras regiões do país, o modelo hospitalar é imposto não respeitando a diversidade étnica e cultural. 6)TRABALHO e LICENÇA-MATERNIDADE 6.1)Articular com o Congresso Nacional e com a Presidenta a aprovação da legislação que aumenta para 180 dias a licença- maternidade (PEC 00515/2010) De acordo com a Organização Mundial da Saúde e o Ministério da Saúde, os bebês devem ser amamentados exclusivamente por 6 meses. Porém, a licença-maternidade só contempla 120 dias (4 meses), deixando as mulheres no dilema entre a maternidade e o trabalho. Introduzir outros alimentos à dieta do bebê antes dos seis meses é fator que diminui sua imunidade e gera doenças - o que de certa forma, prejudica a trabalhadora duplamente: tanto em sua vida profissional quanto no papel de mãe. 6.2)Garantir a licença-maternidade estendida para trabalhadoras mães de bebês prematuros extremos Mães de bebês prematuros precisam votar ao trabalho depois de 4 meses de licença maternidade, contribuindo para os altos índices de mortalidade infantil. O bebê prematuro tem maior risco de adoecer e morrer. O Estado arca com os custos de internações, medicamentos e ainda não equipararam a licença para mães e bebês prematuros. 6.3)Encaminhar projeto de lei ao Legislativo para ampliação do período do regime de exercícios domiciliares a partir do oitavo mês e durante os seis primeiros meses após o parto para estudantes (alteração no texto da Lei Federal nº 6.202/1975). De acordo com a Organização Mundial de Saúde e o Ministério da Saúde, a orientação é que a amamentação seja exclusiva pelos primeiros seis meses. 17
  • 18. Atualmente, de acordo com a Lei Federal 6.202/1975, as estudantes têm direito ao regime de exercícios domiciliares a partir do oitavo mês de gestação e durante os três primeiros meses após o parto. Faz-se necessário garantir que o amparo à gestante estudante seja coerente com as orientações do Ministério da Saúde para que toda estudante possa decidir amamentar seu bebê até os seis meses. 6.4)Encaminhar projeto de lei ao Legislativo para ampliação do período de estabilidade de cinco meses para doze meses após o parto (Ato das Disposições Constitucionais Transitórias, artigo 10º, inciso II, alínea b) Faz-se necessário promover a proteção das mulheres em situação de vulnerabilidade no período pós-licença maternidade. Garantir a estabilidade da mulher durante o primeiro ano de seu bebê é uma estratégia para apoiar a maternidade, que é um trabalho que a mulher realiza para a sociedade. 6.5)Elaborar estratégias para o enfrentamento da discriminação contra mulheres que retornam da licença-maternidade, contra mulheres com filhos ou que desejam ter filhos. Trabalhadoras que retornam ao trabalho depois do fim da licença- maternidade são assediadas moralmente com mudanças de rotina e/ou local de trabalho induzindo a demissão “voluntária”. Referências AGENCIA NACIONAL DE VIGILANCIA SANITARIA. RDC 36. Diário oficial da União, 25 de julho de 2013. AMORIM, Melania. Estudando a gravidez prolongada. Disponível em: < http://estudamelania.blogspot.com.br/2012/08/estudando-gravidez- prolongada.html >2012 CUNHA, Eliana. Violência no parto em Minas Gerais: denúncia à Comissão de Direitos Humanos da Assembleia Legislativa. 2012. UNICEF. Guia da gestante e do bebê, 2010. MINISTÉRIO DA SAÚDE. Direitos da Gestante, 2011. 18
  • 19. MINISTÉRIO DA SAÚDE. Atenção à saúde do recém-nascido: guia para os profissionais de saúde – cuidados gerais. Brasília, 2011 MINISTÉRIO DA SAÚDE. Rede Cegonha, 2011. ORGANIZAÇÃO PANAMERICANA DE SAÚDE. Práticas integradas de atenção ao parto, benéficas para a saúde de mães e crianças. Brasília, 2011. DINIZ, Simone G.; CHACHAM, Alessandra S. O “corte por cima” e o “corte por baixo”: o abuso de cesáreas e episiotomias em São Paulo. Questões de Saúde Reprodutiva, v.1, n.1, p. 80-91, 2006. Disponível em: <http://www.mulheres.org.br/revistarhm/revista_rhm1/revista1/80-91.pdf>. Acesso em: 26/02/2013. FRANZON, Ana Carolina Arruda; SENA, Ligia Moreiras. Teste da violência obstétrica: divulgação dos resultados. Disponível em: <http://www.cientistaqueviroumae.com.br/2012/05/teste-da-violencia- obstetrica.html>. Acesso em: 26/02/2013. Dossiê Parirás com Dor. ONG Parto do Princípio, 2012. Documentário Violência Obstétrica: a voz das Brasileiras, 2012. Disponível em: <http://www.youtube.com/watch?v=eg0uvonF25M> Mulheres e Gênero nos Espaços Públicos e Privados. Fundação Perseu Abramo/Sesc. São Paulo, 2011. Violência no parto em Minas Gerais: denúncia à Comissão de Direitos Humanos da Assembleia Legislativa. 2012. SENADO FEDERAL. Comissão Parlamentar mista de inquérito (CPMI), Relatório Final. Brasília, 2013. 19 19