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Infecção urinária na criança
Teresa Campos*, Patrícia Mendes**, José Maio***
* Interna do Internato Complementar de Pediatria do Hospital Distrital de Faro
** Assistente Hospitalar de Pediatria do Hospital Distrital de Faro
*** Chefe de Serviço e Director do Serviço de Pediatria do Hospital Distrital de Faro
A infecção urinária é uma das infecções bacterianas mais comuns na idade pediátrica. A
importância do seu diagnóstico, tratamento e seguimento deve-se ao facto de se poder
associar a malformações nefro-urológicas e a cicatrizes renais potencialmente responsáveis
por morbilidade significativa a longo prazo.
Infecção urinária, criança, urocultura, antibiótico, investigação
The urinary tract infection is one of the most common bacterial infection in childhood. The
importance of a correct diagnosis, treatment and follow-up is the possibility of association
with anatomic abnormalities of the urinary tract and occurrence of renal scars potentially
responsible for long-term morbidity.
Urinary tract infection, children, urine culture, antibiotic, investigation
Resumo
Summary
Palavras-chave:
Key-words:
Artigos de Revisão
Correspondência:
–
Patrícia Mendes
UCIN Serviço de
Pediatria
Hospital Distrital de Faro
Rua Leão Penedo
8000 FARO
E-mail:
patimendes@gmail.com
Introdução
A infecção urinária (IU) é uma patologia relativa-
mente frequente na criança. Pode envolver o tracto
urinário superior (infecção urinária alta ou pielonefrite
aguda – PNA) ou o inferior (infecção urinária baixa ou
cistite).
A importância da IU na criança vai muito além de ser
causa frequente de doença aguda, pois para além de
constituir um sinal da existência de possível malforma-
ção do aparelho urinário, pode também resultar em
lesão renal permanente (cicatriz renal), causa de mor-
bilidade a longo prazo como hipertensão arterial e
insuficiência renal crónica.
É por isso essencial o diagnóstico correcto de IU, a
instituição precoce de terapêutica e a orientação da
criança para investigação posterior apropriada.
Manifestações clínicas
Os sintomas e sinais clássicos de IU baixa (disúria,
polaquiúria, urgência) ou alta (febre com calafrio, vómi-
tos, dor lombar com sinal de Murphy renal positivo) não
estão, muitas vezes, presentes na idade pediátrica.
Quanto mais nova a criança mais inespecificos e va-
riados podem ser as manifestações de uma IU. Assim, na
criança mais jovem o sinal mais frequente de IU é a febre.
Estudos demonstraram uma prevalência de IU de 3 a 5%
em lactentes febris (<1ano) mesmo naqueles que apa-
rentemente apresentavam outra causa para a febre
como infecção respiratória alta, otite ou gastroenterite .
As manifestações neste grupo etário são inespecíficas
como recusa alimentar, má progressão ponderal, irritabi-
lidade ou letargia, vómitos, diarreia, dor abdominal, mau
odor na urina, podendo no recém-nascido (RN) manifes-
(1)
Acta Urológica 2006, 23; 4: 19-23
www.apurologia.pt
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tar-se apenas como uma icterícia prolongada. Assim a IU
deve ser sempre considerada em qualquer criança me-
nor de 2 anos com febre de etiologia não esclarecida.
A criança mais velha e o adolescente apresentam os
sinais e sintomas típicos de IU como os do adulto, sendo
também possível, com mais fiabilidade do que na criança
pequena, localizar a IU ao tracto superior ou inferior ba-
seando-se na clínica. A cistite apresenta-se com disúria,
polaquiúria, urgência miccional, hematúria podendo
também mais raramente manifestar-se como enurese
secundária. A PNA frequentemente cursa com sintomas
gerais importantes como febre alta, mau estado geral,
anorexia, náuseas e vómitos. A dor lombar pode estar
presente mas a sua ausência não exclui o envolvimento
do tracto urinário superior.
Apesar da maior especificidade dos sintomas nas
crianças maiores, nem todas as crianças com disúria tem
uma IU. A urina muito concentrada, a vulvovaginite, cor-
po estranho, parasitoses intestinais e a utilização de irri-
tantes locais podem acompanhar-se de disúria.
A incidência da IU na criança não está bem definida
mas é reconhecidamente a segunda infecção bacteriana
mais frequente na idade pediátrica depois das infecções
respiratórias. A IU é mais frequente no sexo feminino
em todas as idades excepto nos primeiros três meses de
vida em que predominam no sexo masculino. Estudos
suecos estimam uma incidência cumulativa aos 2 anos de
idade de 2.2% no sexo masculino e de 2.1% no sexo
feminino. Estudos ingleses mostraram valores seme-
lhantes que sobem para 2.8% no sexo masculino e 8.2%
no sexo feminino até aos 7 anos e para 3.6% e 11.3%
respectivamente até aos16 anos.
A UI resulta da proliferação de bactérias no tracto
urinário que é habitualmente estéril. A maioria ocorre
por via ascendente (ou retrógrada) a partir da área peri-
uretral por bactérias da flora intestinal. A afluência de
bactérias para a uretra e bexiga pode ocorrer mas são
eliminadas espontaneamente sem produzir UI. A inter-
acção entre factores de virulência do agente infectante e
das características do hospedeiro vai determinar a sus-
ceptibilidade individual a IU.
Factores de virulência bacteriana conhecidos são os
pili ou fimbriae P presentes nas estirpes uropatogénicas
(2)
(3)
(4)
(5)
Prevalência da IU
Etiopatogenia da IU
da e que promovem a aderência e pro-
gressão através do tracto urinário.
As características do hospedeiro são diversas:
1) Factores perineais ou uretrais – rapazes não cir-
cuncisados têm um risco de IU no 1º ano de vida de
3 a 15 vezes superior aos circuncisados, por maior
colonização periuretral. Também a uretra mais
curta representa um factor de risco responsável
pela maior incidência de IU no sexo feminino depois
do 1º ano de vida.
2) Factores vesicais – o esvaziamento frequente e
completo da bexiga, promovendo a eliminação de
bactérias representa um papel importante na pre-
venção da IU. Vários tipos de disfunção vesical estão
associados a IU recorrentes: bexiga neurogénica,
instabilidade vesical, micções infrequentes resultan-
do distensão vesical e resíduo pós-miccional.
3) Refluxo vesico-uretral (RVU) – É a anomalia mais
frequentemente encontrada nas crianças com IU,
em que a urina reflui via retrógrada da bexiga para o
tracto urinário superior facilitando assim a progres-
são de bactérias até ao parênquima renal. Estima-se
que 30 a 50% das crianças com uma 1ª IU sejam
portadoras de RVU . Trata-se de uma doença con-
génita, em que as crianças com história familiar de
RVU têm um risco 20 a 50 vezes superior de tam-
bém ter RVU . A gravidade do RVU é designada
por graus de I a V, podendo ser unilateral ou bilateral.
O risco de PNA e de cicatrizes renais está relacio-
nado com a presença e a gravidade do RVU. A his-
tória natural de RVU tende a resolução espontânea
principalmente os de baixo grau.
4) Obstrução do tracto urinário: Válvulas da uretra
posterior ou síndroma de junção pielo-ureteral pro-
vocam distensão do tracto urinário e estase da urina
com risco aumentado de IU.
O principal agente etiológico é a ,
sendo responsável por cerca de 85% das IU e por se-
quência o e a , sendo estes três agentes
responsáveis por 95% das IU.
Perante a suspeita clínica são essenciais os exames
complementares de diagnóstico, nomeadamente exa-
me sumário da urina e urocultura. A presença de coló-
nias de um determinado microorganismo numa amostra
de urina colhida de forma asséptica confirma o diagnós-
tico. No entanto, as características particulares da idade
pediátrica colocam algumas dificuldades na colheita uri-
Escherichia coli
Escherichia coli
Proteus Klebsiellla
(6)
(7,8)
(8,9)
Confirmação laboratorial da IU
Teresa Campos, Patrícia Mendes, José Maio Acta Urológica 2006, 23; 4: 19-23
www.apurologia.pt
21
na por isso a interpretação do crescimento bacteriano
está dependente do método de colheita utilizado.
O “ ” para a colheita de urina na criança
é a punção suprapúbica. No entanto, tratando-se de um
método invasivo, é na prática reservada para os recém-
nascidos e lactentes com urocultura prévia duvidosa.
Neste caso qualquer número de colónias é significativa.
A colheita por algaliação é o segundo melhor método,
sendo o exame cultural considerado positivo perante a
presença de = 10 UFC/ml. Na criança maior, com con-
trolo esfíncteriano estabelecido, a colheita é feita por
jacto médio. A colheita por saco colector é uma escolha
para as crianças sem controlo de esfíncteres, mas apre-
senta uma alta taxa de contaminação. O saco colector
deve ser retirado imediatamente após a micção e não
deverá estar colocado mais de 30 minutos. A presença
de = 10 UFC/ml é diagnóstica, para ambas.
É fundamental que a recolha de urina para urocul-
tura respeite as condições correctas de colheita, de
transporte para o laboratório, devendo ser rapidamente
cultivada ou refrigerada a 4ºC até à sementeira.
Os testes rápidos de diagnóstico são utilizados para
identificar as crianças que devem iniciar antibioticotera-
pia. O exame sumário de urina (urina tipo II) é sugestivo
de IU perante leucócito esterase (LE) positivo (tira rea-
gente que detecta as enzimas- esterases libertadas pelos
leucócitos destruídos) e nitritos positivos, apresentando
uma especificidade de 99% e sensibilidade de 73% .
O exame microscópico do sedimento urinário permite
visualizar leucocitúria (valorizável para valores = 10 leu-
cócitos/mm ) e piúria. Podem ainda estar presentes he-
matúria e proteinúria.
A presença de parâmetros de infecção bacteriana no
sangue (leucocitose com neutrofilia e proteína C reac-
tiva positiva) são sugestivos de PNA.
O tratamento da IU não deve ser protelado pois a
precocidade na eliminação da infecção é essencial para
reduzir o risco de lesão renal Inicia-se, então, antibio-
ticoterapia empírica que logo que possível será ajustada
de acordo com o teste de sensibilidade aos antibióticos
(TSA). A escolha deve ter em conta as características do
hospedeiro (idade e presença de uropatia), o tipo de
infecção urinária, alta ou baixa, e o conhecimento dos
agentes mais frequentes e sensibilidade aos antibióticos
de cada região.
Devem ser internados para efectuar terapêutica
endovenosa todos os RN, PNA em lactentes com me-
gold-standard
3
5
(10)
3
(2).
Tratamento da IU
nos de 6 meses ou crianças com compromisso impor-
tante do estado geral, com via oral não mantida, ou
incapacidade parental para cumprimento de terapêutica
e aqueles com nefrouropatia conhecida. A terapêutica
parentérica passará a terapêutica oral após conheci-
mento do TSA e/ou após 48 horas de apirexia e melhoria
clínica.
De acordo com a Secção de Nefrologia Pediátrica da
Sociedade Portuguesa de Pediatria a escolha do antibió-
tico sugerida é a seguinte :
a) RN: ampicilina + gentamicina
b) lactente com menos de 3 meses e crianças com
nefrouropatia conhecida: cefuroxime + gentami-
cina
c) restantes crianças:
A duração total de tratamento deve ser de 7 a 10
dias, para cistite e PNA, respectivamente.
Em todas as crianças com IU confirmada deve pro-
ceder-se a investigação imagiológica. O objectivo da
investigação é identificar as crianças com anomalias
estruturais do tracto urinário ou predisposição para IU
de repetição e aquelas com eventuais cicatrizes renais.
Os exames imagiológicos mais úteis na avaliação
destas crianças são:
(11)
– PNA em internamento: cefuroxime; em ambu-
latório: cefalosporina de 2ª (cefuroxime axetil) ou 3ª
geração (cefixime ou ceftibuteno)
– Cistite: cefalosporina de 1ª ou 2ªgeração (cefra-
doxil, cefradina, cefaclor, cefratrizina)
Ecografia renal e vesical que permite avaliar a
anatomia dos rins e bexiga e pode ser realizada na
fase aguda ou posteriormente;
Cintigrafia renal (CG) com DMSA: revela a exis-
tência de cicatrizes renais e avalia função renal rela-
tiva. Deve ser realizada cerca de 6 meses após a
infecção para que lesões de fase aguda não sejam
confundidas com lesões permanentes.
Cistouretrografia retrógrada miccional (CUM)
ou gamacistografia directa: ambos identificam as
crianças com refluxo vesico-ureteral. A primeira im-
plica uma dose consideravelmente superior de
radiação mas apenas a primeira permite o estudo da
uretra, essencial nos rapazes para exclusão de válvu-
las da uretra posterior. Habitualmente a realização
destes exames é protelada para 4 semanas após a
infecção (pela possibilidade de RVU transitório por
inflamação) embora não seja consensual.
Investigação
•
•
•
(12)
Infecção urinária na criançaActa Urológica 2006, 23; 4: 19-23
www.apurologia.pt
22
Protocolo de investigação
Prevenção
Crianças < 5 anos
Crianças = 5 anos
: Ecografia renal
CUM 1 mês após a IU
CG com DMSA 6 meses após
a IU
: 1ª PNA - Ecografia renal; CG
com DMSA após 6 meses
1ª Cistite – Ecografia renal
Se alterações ecográficas, presença de cicatrizes
renais na CG ou 2ª IU deve ser pesquisado RVU (CUM
ou gamacistografia)
Existem autores que preconizam protocolos menos
invasivos, nomeadamente no grupo etário de 1 aos 4
anos de idade em que reservam a realização da CUM
para as crianças que se constata a presença de cicatrizes
renais, as que têm história familiar de RVU ou após a 2ª
IU. No entanto, para serem seguros, as crianças devem
ser mantidas sob vigilância rigorosa e de um alto grau de
suspeição para eventuais IU subsequentes quer da parte
das famílias, quer dos cuidados de saúde, pelo menos até
aos 4 anos.
Todas as crianças com menos de 5 anos após a 1ª IU
e após terminar a terapêutica da IU devem iniciar qui-
mioprofilaxia. O objectivo da profilaxia é evitar a recor-
rência da IU que pode ocorrer em cerca de um terço das
crianças do sexo feminino e é mais raro no sexo mascu-
lino.
A profilaxia da IU deve ser mantida enquanto a
criança aguarda a realização dos exames do protocolo
de investigação e por um período de pelo menos 6
meses (período em que existe maior risco de recor-
rência da IU).
A profilaxia pode ser feita com trimetropim, cotri-
moxazol ou nitrofurantoína (esta última não disponível
em suspensão em Portugal).
As indicações para manter a profilaxia por um pe-
ríodo mais prolongado são: a presença de RVU,
presença de cicatrizes renais na ausência de RVU, IU
recorrentes (>3 por ano) mesmo na ausência de RVU,
lesões obstrutivas do tracto urinário até à sua resolu-
ção.
(13,14)
Prognóstico
Conclusão
Bibliografia
Após uma PNA, ocorre lesão renal permanente em
10 a 40% dos casos O risco de cicatriz renal é maior
nas crianças até 1 ano de idade, naquelas em houve atra-
so no início da antibioticoterapia, nas crianças portado-
ras de RVU principalmente o de grau elevado, nas lesões
obstrutivas e nas PNA recorrentes.
As cicatrizes renais representam um risco de hiper-
tensão arterial e de diminuição do débito de filtrado
glomerular no jovem adulto principalmente se bilaterais
e nas mais extensas. Está ainda descrita a associação a
pré-eclâmpsia e parto pretermo em mulheres grávidas.
As cicatrizes renais se extensas podem ser causa de
insuficiência renal crónica a longo prazo.
Desta forma está recomendado que as crianças com
cicatrizes renais tenham a sua tensão arterial monito-
rizada para toda a vida.
A UI é uma entidade nosológica que, pela sua fre-
quência e possíveis complicações a médio e longo prazo,
constitui uma preocupação importante para o Pediatra.
Neste sentido é crucial a suspeição clínica e investigação
adequada. Salienta-se a importância de uma colheita
asséptica para obviar sobrediagnósticos.
.(15)
(3,16)
(17,8)
(18,19)
(14)
(14)
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men with or withouth renal scarring and urinary infections
in childhood. BMJ 1990; 300: 840-844
st
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Infecção urinária na criança: diagnóstico e tratamento

  • 1. 19 Infecção urinária na criança Teresa Campos*, Patrícia Mendes**, José Maio*** * Interna do Internato Complementar de Pediatria do Hospital Distrital de Faro ** Assistente Hospitalar de Pediatria do Hospital Distrital de Faro *** Chefe de Serviço e Director do Serviço de Pediatria do Hospital Distrital de Faro A infecção urinária é uma das infecções bacterianas mais comuns na idade pediátrica. A importância do seu diagnóstico, tratamento e seguimento deve-se ao facto de se poder associar a malformações nefro-urológicas e a cicatrizes renais potencialmente responsáveis por morbilidade significativa a longo prazo. Infecção urinária, criança, urocultura, antibiótico, investigação The urinary tract infection is one of the most common bacterial infection in childhood. The importance of a correct diagnosis, treatment and follow-up is the possibility of association with anatomic abnormalities of the urinary tract and occurrence of renal scars potentially responsible for long-term morbidity. Urinary tract infection, children, urine culture, antibiotic, investigation Resumo Summary Palavras-chave: Key-words: Artigos de Revisão Correspondência: – Patrícia Mendes UCIN Serviço de Pediatria Hospital Distrital de Faro Rua Leão Penedo 8000 FARO E-mail: patimendes@gmail.com Introdução A infecção urinária (IU) é uma patologia relativa- mente frequente na criança. Pode envolver o tracto urinário superior (infecção urinária alta ou pielonefrite aguda – PNA) ou o inferior (infecção urinária baixa ou cistite). A importância da IU na criança vai muito além de ser causa frequente de doença aguda, pois para além de constituir um sinal da existência de possível malforma- ção do aparelho urinário, pode também resultar em lesão renal permanente (cicatriz renal), causa de mor- bilidade a longo prazo como hipertensão arterial e insuficiência renal crónica. É por isso essencial o diagnóstico correcto de IU, a instituição precoce de terapêutica e a orientação da criança para investigação posterior apropriada. Manifestações clínicas Os sintomas e sinais clássicos de IU baixa (disúria, polaquiúria, urgência) ou alta (febre com calafrio, vómi- tos, dor lombar com sinal de Murphy renal positivo) não estão, muitas vezes, presentes na idade pediátrica. Quanto mais nova a criança mais inespecificos e va- riados podem ser as manifestações de uma IU. Assim, na criança mais jovem o sinal mais frequente de IU é a febre. Estudos demonstraram uma prevalência de IU de 3 a 5% em lactentes febris (<1ano) mesmo naqueles que apa- rentemente apresentavam outra causa para a febre como infecção respiratória alta, otite ou gastroenterite . As manifestações neste grupo etário são inespecíficas como recusa alimentar, má progressão ponderal, irritabi- lidade ou letargia, vómitos, diarreia, dor abdominal, mau odor na urina, podendo no recém-nascido (RN) manifes- (1) Acta Urológica 2006, 23; 4: 19-23 www.apurologia.pt
  • 2. 20 tar-se apenas como uma icterícia prolongada. Assim a IU deve ser sempre considerada em qualquer criança me- nor de 2 anos com febre de etiologia não esclarecida. A criança mais velha e o adolescente apresentam os sinais e sintomas típicos de IU como os do adulto, sendo também possível, com mais fiabilidade do que na criança pequena, localizar a IU ao tracto superior ou inferior ba- seando-se na clínica. A cistite apresenta-se com disúria, polaquiúria, urgência miccional, hematúria podendo também mais raramente manifestar-se como enurese secundária. A PNA frequentemente cursa com sintomas gerais importantes como febre alta, mau estado geral, anorexia, náuseas e vómitos. A dor lombar pode estar presente mas a sua ausência não exclui o envolvimento do tracto urinário superior. Apesar da maior especificidade dos sintomas nas crianças maiores, nem todas as crianças com disúria tem uma IU. A urina muito concentrada, a vulvovaginite, cor- po estranho, parasitoses intestinais e a utilização de irri- tantes locais podem acompanhar-se de disúria. A incidência da IU na criança não está bem definida mas é reconhecidamente a segunda infecção bacteriana mais frequente na idade pediátrica depois das infecções respiratórias. A IU é mais frequente no sexo feminino em todas as idades excepto nos primeiros três meses de vida em que predominam no sexo masculino. Estudos suecos estimam uma incidência cumulativa aos 2 anos de idade de 2.2% no sexo masculino e de 2.1% no sexo feminino. Estudos ingleses mostraram valores seme- lhantes que sobem para 2.8% no sexo masculino e 8.2% no sexo feminino até aos 7 anos e para 3.6% e 11.3% respectivamente até aos16 anos. A UI resulta da proliferação de bactérias no tracto urinário que é habitualmente estéril. A maioria ocorre por via ascendente (ou retrógrada) a partir da área peri- uretral por bactérias da flora intestinal. A afluência de bactérias para a uretra e bexiga pode ocorrer mas são eliminadas espontaneamente sem produzir UI. A inter- acção entre factores de virulência do agente infectante e das características do hospedeiro vai determinar a sus- ceptibilidade individual a IU. Factores de virulência bacteriana conhecidos são os pili ou fimbriae P presentes nas estirpes uropatogénicas (2) (3) (4) (5) Prevalência da IU Etiopatogenia da IU da e que promovem a aderência e pro- gressão através do tracto urinário. As características do hospedeiro são diversas: 1) Factores perineais ou uretrais – rapazes não cir- cuncisados têm um risco de IU no 1º ano de vida de 3 a 15 vezes superior aos circuncisados, por maior colonização periuretral. Também a uretra mais curta representa um factor de risco responsável pela maior incidência de IU no sexo feminino depois do 1º ano de vida. 2) Factores vesicais – o esvaziamento frequente e completo da bexiga, promovendo a eliminação de bactérias representa um papel importante na pre- venção da IU. Vários tipos de disfunção vesical estão associados a IU recorrentes: bexiga neurogénica, instabilidade vesical, micções infrequentes resultan- do distensão vesical e resíduo pós-miccional. 3) Refluxo vesico-uretral (RVU) – É a anomalia mais frequentemente encontrada nas crianças com IU, em que a urina reflui via retrógrada da bexiga para o tracto urinário superior facilitando assim a progres- são de bactérias até ao parênquima renal. Estima-se que 30 a 50% das crianças com uma 1ª IU sejam portadoras de RVU . Trata-se de uma doença con- génita, em que as crianças com história familiar de RVU têm um risco 20 a 50 vezes superior de tam- bém ter RVU . A gravidade do RVU é designada por graus de I a V, podendo ser unilateral ou bilateral. O risco de PNA e de cicatrizes renais está relacio- nado com a presença e a gravidade do RVU. A his- tória natural de RVU tende a resolução espontânea principalmente os de baixo grau. 4) Obstrução do tracto urinário: Válvulas da uretra posterior ou síndroma de junção pielo-ureteral pro- vocam distensão do tracto urinário e estase da urina com risco aumentado de IU. O principal agente etiológico é a , sendo responsável por cerca de 85% das IU e por se- quência o e a , sendo estes três agentes responsáveis por 95% das IU. Perante a suspeita clínica são essenciais os exames complementares de diagnóstico, nomeadamente exa- me sumário da urina e urocultura. A presença de coló- nias de um determinado microorganismo numa amostra de urina colhida de forma asséptica confirma o diagnós- tico. No entanto, as características particulares da idade pediátrica colocam algumas dificuldades na colheita uri- Escherichia coli Escherichia coli Proteus Klebsiellla (6) (7,8) (8,9) Confirmação laboratorial da IU Teresa Campos, Patrícia Mendes, José Maio Acta Urológica 2006, 23; 4: 19-23 www.apurologia.pt
  • 3. 21 na por isso a interpretação do crescimento bacteriano está dependente do método de colheita utilizado. O “ ” para a colheita de urina na criança é a punção suprapúbica. No entanto, tratando-se de um método invasivo, é na prática reservada para os recém- nascidos e lactentes com urocultura prévia duvidosa. Neste caso qualquer número de colónias é significativa. A colheita por algaliação é o segundo melhor método, sendo o exame cultural considerado positivo perante a presença de = 10 UFC/ml. Na criança maior, com con- trolo esfíncteriano estabelecido, a colheita é feita por jacto médio. A colheita por saco colector é uma escolha para as crianças sem controlo de esfíncteres, mas apre- senta uma alta taxa de contaminação. O saco colector deve ser retirado imediatamente após a micção e não deverá estar colocado mais de 30 minutos. A presença de = 10 UFC/ml é diagnóstica, para ambas. É fundamental que a recolha de urina para urocul- tura respeite as condições correctas de colheita, de transporte para o laboratório, devendo ser rapidamente cultivada ou refrigerada a 4ºC até à sementeira. Os testes rápidos de diagnóstico são utilizados para identificar as crianças que devem iniciar antibioticotera- pia. O exame sumário de urina (urina tipo II) é sugestivo de IU perante leucócito esterase (LE) positivo (tira rea- gente que detecta as enzimas- esterases libertadas pelos leucócitos destruídos) e nitritos positivos, apresentando uma especificidade de 99% e sensibilidade de 73% . O exame microscópico do sedimento urinário permite visualizar leucocitúria (valorizável para valores = 10 leu- cócitos/mm ) e piúria. Podem ainda estar presentes he- matúria e proteinúria. A presença de parâmetros de infecção bacteriana no sangue (leucocitose com neutrofilia e proteína C reac- tiva positiva) são sugestivos de PNA. O tratamento da IU não deve ser protelado pois a precocidade na eliminação da infecção é essencial para reduzir o risco de lesão renal Inicia-se, então, antibio- ticoterapia empírica que logo que possível será ajustada de acordo com o teste de sensibilidade aos antibióticos (TSA). A escolha deve ter em conta as características do hospedeiro (idade e presença de uropatia), o tipo de infecção urinária, alta ou baixa, e o conhecimento dos agentes mais frequentes e sensibilidade aos antibióticos de cada região. Devem ser internados para efectuar terapêutica endovenosa todos os RN, PNA em lactentes com me- gold-standard 3 5 (10) 3 (2). Tratamento da IU nos de 6 meses ou crianças com compromisso impor- tante do estado geral, com via oral não mantida, ou incapacidade parental para cumprimento de terapêutica e aqueles com nefrouropatia conhecida. A terapêutica parentérica passará a terapêutica oral após conheci- mento do TSA e/ou após 48 horas de apirexia e melhoria clínica. De acordo com a Secção de Nefrologia Pediátrica da Sociedade Portuguesa de Pediatria a escolha do antibió- tico sugerida é a seguinte : a) RN: ampicilina + gentamicina b) lactente com menos de 3 meses e crianças com nefrouropatia conhecida: cefuroxime + gentami- cina c) restantes crianças: A duração total de tratamento deve ser de 7 a 10 dias, para cistite e PNA, respectivamente. Em todas as crianças com IU confirmada deve pro- ceder-se a investigação imagiológica. O objectivo da investigação é identificar as crianças com anomalias estruturais do tracto urinário ou predisposição para IU de repetição e aquelas com eventuais cicatrizes renais. Os exames imagiológicos mais úteis na avaliação destas crianças são: (11) – PNA em internamento: cefuroxime; em ambu- latório: cefalosporina de 2ª (cefuroxime axetil) ou 3ª geração (cefixime ou ceftibuteno) – Cistite: cefalosporina de 1ª ou 2ªgeração (cefra- doxil, cefradina, cefaclor, cefratrizina) Ecografia renal e vesical que permite avaliar a anatomia dos rins e bexiga e pode ser realizada na fase aguda ou posteriormente; Cintigrafia renal (CG) com DMSA: revela a exis- tência de cicatrizes renais e avalia função renal rela- tiva. Deve ser realizada cerca de 6 meses após a infecção para que lesões de fase aguda não sejam confundidas com lesões permanentes. Cistouretrografia retrógrada miccional (CUM) ou gamacistografia directa: ambos identificam as crianças com refluxo vesico-ureteral. A primeira im- plica uma dose consideravelmente superior de radiação mas apenas a primeira permite o estudo da uretra, essencial nos rapazes para exclusão de válvu- las da uretra posterior. Habitualmente a realização destes exames é protelada para 4 semanas após a infecção (pela possibilidade de RVU transitório por inflamação) embora não seja consensual. Investigação • • • (12) Infecção urinária na criançaActa Urológica 2006, 23; 4: 19-23 www.apurologia.pt
  • 4. 22 Protocolo de investigação Prevenção Crianças < 5 anos Crianças = 5 anos : Ecografia renal CUM 1 mês após a IU CG com DMSA 6 meses após a IU : 1ª PNA - Ecografia renal; CG com DMSA após 6 meses 1ª Cistite – Ecografia renal Se alterações ecográficas, presença de cicatrizes renais na CG ou 2ª IU deve ser pesquisado RVU (CUM ou gamacistografia) Existem autores que preconizam protocolos menos invasivos, nomeadamente no grupo etário de 1 aos 4 anos de idade em que reservam a realização da CUM para as crianças que se constata a presença de cicatrizes renais, as que têm história familiar de RVU ou após a 2ª IU. No entanto, para serem seguros, as crianças devem ser mantidas sob vigilância rigorosa e de um alto grau de suspeição para eventuais IU subsequentes quer da parte das famílias, quer dos cuidados de saúde, pelo menos até aos 4 anos. Todas as crianças com menos de 5 anos após a 1ª IU e após terminar a terapêutica da IU devem iniciar qui- mioprofilaxia. O objectivo da profilaxia é evitar a recor- rência da IU que pode ocorrer em cerca de um terço das crianças do sexo feminino e é mais raro no sexo mascu- lino. A profilaxia da IU deve ser mantida enquanto a criança aguarda a realização dos exames do protocolo de investigação e por um período de pelo menos 6 meses (período em que existe maior risco de recor- rência da IU). A profilaxia pode ser feita com trimetropim, cotri- moxazol ou nitrofurantoína (esta última não disponível em suspensão em Portugal). As indicações para manter a profilaxia por um pe- ríodo mais prolongado são: a presença de RVU, presença de cicatrizes renais na ausência de RVU, IU recorrentes (>3 por ano) mesmo na ausência de RVU, lesões obstrutivas do tracto urinário até à sua resolu- ção. (13,14) Prognóstico Conclusão Bibliografia Após uma PNA, ocorre lesão renal permanente em 10 a 40% dos casos O risco de cicatriz renal é maior nas crianças até 1 ano de idade, naquelas em houve atra- so no início da antibioticoterapia, nas crianças portado- ras de RVU principalmente o de grau elevado, nas lesões obstrutivas e nas PNA recorrentes. As cicatrizes renais representam um risco de hiper- tensão arterial e de diminuição do débito de filtrado glomerular no jovem adulto principalmente se bilaterais e nas mais extensas. Está ainda descrita a associação a pré-eclâmpsia e parto pretermo em mulheres grávidas. As cicatrizes renais se extensas podem ser causa de insuficiência renal crónica a longo prazo. Desta forma está recomendado que as crianças com cicatrizes renais tenham a sua tensão arterial monito- rizada para toda a vida. A UI é uma entidade nosológica que, pela sua fre- quência e possíveis complicações a médio e longo prazo, constitui uma preocupação importante para o Pediatra. Neste sentido é crucial a suspeição clínica e investigação adequada. Salienta-se a importância de uma colheita asséptica para obviar sobrediagnósticos. .(15) (3,16) (17,8) (18,19) (14) (14) 1. Shaw KN., Gorelick MH., McGwan KL., et al. Prevalence of UTI in febrile young children in the emergency depart- ment. Pediatrics 1998; 102: 596-601 2. AAP, Committee on Quality Improvment, Subcommittee on Urinary Tact Infection: Practice parameter: the diagno- sis, treatment, and evaluation on the inicial urinary tract infection in febrile infants and young children. Pediatrics 1999; 103: 843-852 3. Cavagnro F. Infeccion urinaria en la infância. Rev Child Infect 2005; 22 (2): 161-168 4. Jakobsson B., Ebsjorner E., Hansson S. Minimun incidence and diagnostic rate if first urinary tract infection. Pediatrics 1999; 104: 222-226 5. Colthard M., Lambert H., Keir M. Ocurrence of renal scar after their first referral for urinary tract infection. BMJ 1997; 315: 918-919 6. Wiswellte. The prepuce, urinary tract infections, and the consequences. Pediatrics 2000; 105 (4): 860-862 7. Alper BS., Curry SH. Urinary tract Infection in Children. Am Fam Phy 2005; 72 (12): 2483-2488 Teresa Campos, Patrícia Mendes, José Maio Acta Urológica 2006, 23; 4: 19-23 www.apurologia.pt
  • 5. 23 8. Jacobson S., Hansson S., Jakobsson B. Vesico-ureteric reflux: ocurrence and long-term risks. Acta Paediatr Suppl 1999; 431: 22-23 9. Scott J., Swallow V., Colthard M., Lambert H., Lee R. Screening of nexborn babies for familial ureteric reflux. Lancet 1997; 350: 356-400 10. Gorelick MH, Shaw KN. Clinical decision rule to identify young febrile children at risk for UTI. Arch Paediatr Adolesc Med 2000; 154: 386-390. 11. Simão C., Ribeiro M. V., Neto A. Anibioticoterapia empíri- ca na infecção urinária na criança. Acta Pediátrica Portu- guesa 2002; 33 (2): 129-130 12. MacDonald A., Scranton M., Gillespie R., Mahajan V., Edwards G. Voiding cystourethrograms and urinary tract infections: how long to wait? Pediatrics 2000; 105: 851- -852 13. Diagnosing urinary tract infection under fives. Effective Health Care 2004; 8 (6): 1-12 14. Lambert H, Coulthard M. The child with urinary tract infection pediatric. In: R. J. Postlethwaite. Clinical Paedia- tric Nephrology. 3ªed. Oxford: Oxford University Press; 2003: 197-225 15. Beetz R. May we go on with antibacterial prophylaxis for urinary tract infections? Pediatr Nephrol 2006; 21(1): 5-13 16. Christensen A.M., Shaw K. Urinary trat infection in childhood. In: Louis M.Bell, editor. Pediatric Nephrology and Urology- The requesites in pediatrics. 1 ed. Philadel- phia: Elsevier Mosby; 2004: 317-325 17. Goonasekera C., Dillon M. Reflux nephopathy and hyper- tension. J Hum Hypertens 1998; 12: 497-504 18. Jungers P., Houillien P., Chauveau D., Choukroun G., Moy- not A., Skhiri H., et al. Pregnancy in women with reflux nephropathy. Kidney Int 1996; 50: 593-599 19. Martinell J., Jodal V., Lindin-Janson G. Pregnancies in wo- men with or withouth renal scarring and urinary infections in childhood. BMJ 1990; 300: 840-844 st Infecção urinária na criançaActa Urológica 2006, 23; 4: 19-23 www.apurologia.pt