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Ano 9 - Out/Nov/Dezembro/2003 3
Prezado (a) leitor (a).
A atualização continuada é fundamental para a boa prática médica. A Sociedade Brasileira de Pediatria sabe que
os pediatras brasileiros querem se manter atualizados.
A publicação “Correios da SBP” tem por objetivo oferecer tópicos recentes e comentados de assuntos de interesse
geral a todos os sócios quites da SBP. Também, os diversos números de “Correios da SBP” divulgam consensos dos
Departamentos Científicos da SBP através dos Documentos Científicos.
Correios da SBP, Jornal de Pediatria e PRONAP são veículos impressos de atualização constante dos sócios.
Paralelamente às publicações impressas, há material de educação médica continuada através do site da SBP e
pela Internet.
Espera-se que, dessa forma, os sócios da SBP possam ter os seus anseios correspondidos.
Renato S. ProcianoyRenato S. ProcianoyRenato S. ProcianoyRenato S. ProcianoyRenato S. Procianoy
Diretor de Publicações Científicas da SBP
DDDDDeclínio da doença pneumocócica invasivaeclínio da doença pneumocócica invasivaeclínio da doença pneumocócica invasivaeclínio da doença pneumocócica invasivaeclínio da doença pneumocócica invasiva
após a introdução da vacina pneumocócicaapós a introdução da vacina pneumocócicaapós a introdução da vacina pneumocócicaapós a introdução da vacina pneumocócicaapós a introdução da vacina pneumocócica
conjugadaconjugadaconjugadaconjugadaconjugada
Whitney CG, Farley MM, Hadler J, Harrison LH,
Bennett NM, Lynfield R et al
N Engl J Med 2003;348:1737-46 ......................................5
Manejo da insuficiência cardíacaManejo da insuficiência cardíacaManejo da insuficiência cardíacaManejo da insuficiência cardíacaManejo da insuficiência cardíaca
na criançana criançana criançana criançana criança
Dr. Jorge Yussef Afiune .....................................................7
Normas para prescrição de contracepçãoNormas para prescrição de contracepçãoNormas para prescrição de contracepçãoNormas para prescrição de contracepçãoNormas para prescrição de contracepção
na adolescênciana adolescênciana adolescênciana adolescênciana adolescência
Departamento Cientifico de Adolescência da SBP
Federação Brasileira das Sociedades de
Ginecologia e Obstetrícia - FEBRASGO ........................ 13
ÍNDICE
EDITORIAL
CORREIOS DA SBP - Diretor de publicações: Dr. Renato Soibelmann Procianoy - Coordenador do PRONAP: Dr. João Coriolano Rego Barros - Coordenador dos
Correios: Dr. Antonio Carlos Pastorino - Coordenador Documentação Científica: Dr. Paulo de Jesus Hartmann Nader - Conselho Editorial: Darci Vieira da Silva
Bonetto, Elsa Regina Justo Giugliani, Charles Kirov Naspitz, Délio José Kipper, Edmundo Clarindo Oliveira, Valéria Maria Bezerra Silva Luna, Ana Maria Cavalcanti e Silva, José Hugo
Lins Pessoa, Bernardo Gontijo, Durval Damiani, Luciana Rodrigues da Silva, Marcos José Burle de Aguiar, Regina Célia de Menezes Succi, Eleonora Moreira Lima, Cléa Rodrigues
Leone, Magda Lahorgue Nunes, Fernando José de Nobrega, Mara Albonei Dudeque Pianovski, Moacyr Saffer, Jayme Murahovschi, Clemax Couto Sant’anna, Flávio Roberto
Sztajnbok, Jorge Harada, Eric Yehuda Schussel, José Américo de Campos, Cléa Maria Pires Ruffier, Paulo Ramos David João. - Comitê Executivo: Dr. Claudio Leone, Dr. Clóvis
Artur Almeida da Silva, Dra. Heloisa Helena de Souza Marques, Dra. Lúcia Ferro Bricks, Dra. Marta Miranda Leal, Dr. Mário Cícero Falcão, Dra. Luiza Helena Falleiros R.
Carvalho, Dra. Valdenise Martins Laurindo Tuma Calil - PRONAP / SBP – Programa Nacional de Educação Continuada em Pediatria – Rua Augusta, 1939 - 5º
andar - sala 53 – Cerqueira César – São Paulo – SP – CEP: 01413-000 – Fone: (11) 3068-8595 – Fax: (11) 3081-6892 – E-mail: sbpsp@iprediamail.com.br Colaboraram
neste número: Dr.EitanNBerezin, Dr. Jorge Yussef Afiune, Dr. Luís C. Rey, Dr. Ary Lopes Cardoso, Dra. Marilisa Stenghel Fróes e Souza, Dra. Lucia Ferro Bricks. Revisor deste
número: Dr. Antonio Carlos Pastorino. As opiniões expressas são da responsabilidade exclusiva dos autores e comentadores, não refletindo obrigatoriamente a
posição da Sociedade Brasileira de Pediatria. Tire suas dúvidas, faça suas críticas e sugestões aos editores sobre os artigos aqui publicados, pelo e-mail:
sbpsp@iprediamail.com.br Criação, Diagramação e Produção Gráfica: Atha Comunicação & Editora – Rua Machado Bittencourt, 190 - 4o
andar Conj. 410 – Cep:
04044-000 – São Paulo – SP – Tel: (11) 5087-9502 - Fax: (11) 5579-5308 – E-mail: 1atha@uol.com.br.
Eventos adversos a drogas em criançasEventos adversos a drogas em criançasEventos adversos a drogas em criançasEventos adversos a drogas em criançasEventos adversos a drogas em crianças
hospitalizadas em hospital universitáriohospitalizadas em hospital universitáriohospitalizadas em hospital universitáriohospitalizadas em hospital universitáriohospitalizadas em hospital universitário
da Noruega.da Noruega.da Noruega.da Noruega.da Noruega.
Buajordet I, Wesenberg F, Brors O, Langslet A
Acta Paediatr 2002; 91:88-94 ....................................... 15
Efeito da suplementação de zinco noEfeito da suplementação de zinco noEfeito da suplementação de zinco noEfeito da suplementação de zinco noEfeito da suplementação de zinco no
desenvolvimento e crescimento dedesenvolvimento e crescimento dedesenvolvimento e crescimento dedesenvolvimento e crescimento dedesenvolvimento e crescimento de
crianças chilenas.crianças chilenas.crianças chilenas.crianças chilenas.crianças chilenas.
Castillo-Duran C, Perales CG, Hertrampf ED, Marin VB,
Rivera FA, Icaza G.
J Pediatr 2001; 138:229-35 ........................................... 21
VVVVVacinações na infância e risco de asmaacinações na infância e risco de asmaacinações na infância e risco de asmaacinações na infância e risco de asmaacinações na infância e risco de asma
DeStefano F, Gu D, Kramarz P, Truman BI,
Iademarco MF, Mullooly JP et al.
Pediatr Infect Dis J 2002; 21: 498-504 ......................... 25
Ano 9 - Out/Nov/Dezembro/20034
PRESIDENTE:
Lincoln Marcelo Silveira Freire
10
VICE-PRESIDENTE:
Dioclécio Campos Júnior
20
VICE-PRESIDENTE:
João Cândido de Souza Borges
SECRETÁRIO GERAL:
Eduardo da Silva Vaz
10
SECRETÁRIO:
Vera Lúcia Queiroz Bomfim Pereira
20
SECRETÁRIO:
Marisa Bicalho P. Rodrigues
30
SECRETÁRIO:
Fernando Filizzola de Mattos
1O
DIRETOR FINANCEIRO:
Carlindo de Souza Machado e Silva Filho
2O
DIRETOR FINANCEIRO:
Ana Maria Seguro Meyge
DIRETORIA DE PATRIMÔNIO:
Mário José Ventura Marques
COORDENADOR DO SELO:
Claudio Leone
COORDENADOR DE INFORMÁTICA:
Eduardo Carlos Tavares
CONSELHO ACADÊMICO:
PRESIDENTE:
Reinaldo Menezes Martins
SECRETÁRIO:
Nelson Grisard
CONSELHO FISCAL:
Raimunda Nazaré Monteiro Lustosa
Sara Lopes Valentim
Nilzete Liberato Bresolin
ASSESSORIAS DA PRESIDÊNCIA:
Pedro Celiny Ramos Garcia
Fernando Antônio Santos Werneck
Claudio Leone
Luciana Rodrigues Silva
Nelson de Carvalho Assis Barros
Reinaldo Menezes Martins
DIRETORIA 2001/2003DIRETORIA 2001/2003DIRETORIA 2001/2003DIRETORIA 2001/2003DIRETORIA 2001/2003
DIRETORIA DE QUALIFICAÇÃO
E CERTIFICAÇÃO PROFISSIONAL:
Clóvis Francisco Constantino
COORDENADOR DO CEXTEP:
Hélcio Villaça Simões
COORDENADOR DA ÁREA DE ATUAÇÃO:
José Hugo Lins Pessoa
COORDENADOR DA RECERTIFICAÇÃO:
José Martins Filho
DIRETOR DE RELAÇÕES INTERNACIONAIS:
Fernando José de Nóbrega
REPRESENTANTES:
ALAPE: Mário Santoro Jr.
AAP: Conceição Aparecida de M. Segre
IPA: Sérgio Augusto Cabral
MERCOSUL: Remaclo Fischer Júnior
DIRETOR DOS DEPARTAMENTOS CIENTÍFICOS:
Nelson Augusto Rosário Filho
DIRETORIA DE CURSOS E EVENTOS:
Dirceu Solé
COORDENADOR DA REANIMAÇÃO NEONATAL:
José Orleans da Costa
COORDENADOR DA REANIMAÇÃO PEDIÁTRICA:
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COORDENADOR DOS SERÕES:
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CENTRO DE TREINAMENTO EM SERVIÇOS:
COORDENADOR:
Mário Cícero Falcão
COORDENADOR DOS CONGRESSOS E EVENTOS:
Álvaro Machado Neto
COORDENADOR DO CIRAPS:
Maria Odete Esteves Hilário
DIRETORIA DE ENSINO E PESQUISA:
Lícia Maria Oliveira Moreira
COORDENADORA DA GRADUAÇÃO:
Rosana Fiorini Puccini
RESIDÊNCIA E ESTÁGIO-CREDENCIAMENTO:
COORDENADORA:
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RESIDÊNCIA E ESTÁGIO - PROGRAMAS:
COORDENADOR:
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COORDENADOR DA PÓS - GRADUAÇÃO:
Francisco José Penna
COORDENADOR DA PESQUISA:
Marco Antônio Barbieri
DIRETORIA DE PUBLICAÇÕES DA SBP:
DIRETOR DE PUBLICAÇÕES:
Renato Soibelmann Procianoy
DIRETOR DO JORNAL DE PEDIATRIA:
Renato Soibelmann Procianoy
COORDENADOR DO PRONAP:
João Coriolano Rego Barros
COORDENADOR DOS CORREIOS DA SBP:
Antonio Carlos Pastorino
DOCUMENTOS CIENTÍFICOS:
COORDENADOR:
Paulo de Jesus H. Nader
CENTRO DE INFORMAÇÕES CIENTÍFICAS:
COORDENADOR:
Ércio Amaro de Oliveira Filho
DIRETORIA DE BENEFÍCIOS E PREVIDÊNCIA:
Guilherme Mariz Maia
DIRETOR DE DEFESA PROFISSIONAL:
Mário Lavorato da Rocha
DIRETORIA DA PROMOÇÃO SOCIAL DA
CRIANÇA E DO ADOLESCENTE:
João de Melo Régis Filho
PROMOÇÃO DE CAMPANHAS:
COORDENADORA:
Rachel Niskier Sanchez
DEFESA DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE:
COORDENADORA:
Célia Maria Stolze Silvany
COMISSÃO DE SINDICÂNCIA:
COORDENADORES:
Euze Márcio Souza Carvalho
José Gonçalves Sobrinho
Rossiclei de Souza Pinheiro
Antônio Rubens Alvarenga
Mariângela de Medeiros Barbosa
Ano 9 - Out/Nov/Dezembro/2003 5
INTRODUÇÃO
No início do ano 2000 foi liberada nos Estados Unidos uma
vacina pneumocócica conjugada abrangendo sete sorotipos.
Estavacinafoiaprimeiravacinaliberadacomeficáciapromisso-
ra para faixa etária pediátrica. Após a liberação nos Estados
Unidos houve a recomendação para uso da vacina em toda a
populaçãoinfantilnaquelepaís.
MÉTODOS
Foramavaliadosdadospopulacionaisoriundosdeinvestiga-
ção dos Centros de Controle de Doenças dos Estados Unidos
paraverificaralteraçõesnaprevalênciadadoençapneumocóci-
ca. A definição de casos foi baseada no isolamento do
S.pneumoniae de locais normalmente estéreis como sangue,
líquidocéfalo-raquídeo,líquidopleural,líquidoarticularepunção
de ouvido médio. Para isto foram analisados os dados de labo-
ratórios para o isolamento deste agente que abrangiam uma
populaçãoestimadade16milhõesdepessoas,incluindo433.591
crianças menores de 2anos e 652.551 entre os dois e quatro
anos de idade. Esta avaliação foi realizada entre 1998 e 2001.
RESULTADOS
As taxas de doença pneumocócica invasiva nos anos de
1998,1999,2000e2001foramrespectivamentede24,2–24,4–
21,2 e 17,3 casos/100.000 habitantes, com diminuição de 24,3
casospor100.000habitantes,emmédia,em1998e1999para
17,3por100.000em2001.
Omaiordeclíniodadoençaocorreuemcriançasmenoresde
doisanosdeidadeemquehouveumaquedade69%em2001
(188/100.000para59/100.000,p<0,001).Nestegrupodepaci-
entesocoeficientedeincidênciadadoençacausadaporsoroti-
posincluídosnavacinaesorotiposrelacionadoscaiuem78%e
em 50%, respectivamente. A queda nas taxas da doença este-
ve também presente em adultos onde houve uma queda de
32% para adultos entre 20 e 39 anos de idade (11,2/100.000
para7,6/100.000),8%emadultosentre40e64anos(21,5/100.000
para 19,7/100.000) e de 18% para adultos acima de 65 anos
(60,1/100.000para49,5/100.000).Aincidênciadeinfecçõescau-
sadas por S. pneumoniae resistente à penicilina diminuiu em
35%(6,3/100.000em1999para4,1/100.000em2001).
A figura 1 abaixo mostra a evolução das taxas de doença
pneumocócicaemrelaçãoàidade,eaonúmerodecasosdiag-
nosticados. O impacto da vacina foi bastante importante na re-
dução de taxas de doença em crianças abaixo de dois anos.
Declínio da doença pneumocócica invasiva após a
introdução da vacina pneumocócica conjugada.
Decline in invasive pneumococcal disease after the introduction of
protein-polysaccharide conjugate vaccine
Whitney CG, Farley MM, Hadler J, Harrison LH,
Bennett NM, Lynfield R et al.
N Engl J Med 2003;348:1737-46
INFECTOLOGIA PEDIÁTRICA
COMENTÁRIOS
OS.pneumoniaeéabactériamaisassociadacomotitemé-
dia, meningites e pneumonia. Mais de 1 milhão de crianças
morrem antes de cinco anos devido a infecções bacterianas
FFFFFigura 1:igura 1:igura 1:igura 1:igura 1: Taxas de doença pneumocócica invasiva em me-
nores de 5 anos, de acordo com a idade e o ano.
Ano 9 - Out/Nov/Dezembro/20036
associadascomopneumococo. Asinfecçõesqueocorremem
crianças pequenas são as que acarretam a maior letalidade e
maiormorbidade,poisestascriançasapresentampoucacapa-
cidade de reação imunológica.
Na realidade existem diversas cepas deS.pneumoniae dife-
rentes que se distinguem uma das outras através da cápsula
poliribossacarídicaque envolvea bactéria.Asua tipageméreali-
zadaatravésdereaçõesdeaglutinaçãodacápsulaeclassificada
atravésdenúmeroeletras(ex.sorotipos1, 6B,14entreoutros).
A cápsula bacteriana permite que o pneumococo evite a
fagocitose realizada pelos leucócitos e possa eventualmente
atingiracorrentesangüíneaouosistemanervosocentral.Atu-
almentemaisde90sorotiposdiferentesdepneumococosfo-
ramidentificadosemtodoomundosendoqueosmaisimpor-
tantes no Brasil são o 1, 5, 6, 14, 19 e 23F. Estes sorotipos são
responsáveis por 75% das infecções invasiva em nosso país.
Esta bactéria ganhou maior importância nos últimos anos
principalmentecomosurgimentodecepasresistentes.
Colonização de Nasofaringe- O evento inicial
Lactentes,criançaseadultossãoportadoresnasaisdepneu-
mococo.Abactériapodepersistirpormesesnoepitélionasal.O
índice de portadores pode atingir até 45% em alguns locais. No
nosso meio um estudo realizado em S. Paulo detectou 35% de
portadoresdenasofaringe emcrianças.Emestudosrealizados
com acompanhamento longitudinal em crianças desde o nasci-
mento,observou-sequetodasascriançassecolonizampelopneu-
mococoaomenosumavezduranteaprimeirainfância.
Afloradanasofaringeéprovavelmenteomaiorsítiodeaqui-
siçãodebactériaspatogênicasdotratorespiratóriosuperior.Di-
versos estudos vêm confirmando a relação entre colonização
nasofaríngeaeriscodedesenvolverinfecçãodotratorespiratório
(especialmente otite média aguda) e doença invasiva.
Do estado de portador para a Infecção
O risco da progressão do estado de portador, isto é da
colonização, para a doença é maior no período de um mês
após a colonização por nova cepa da bactéria. As crianças
de menor faixa etária tem maior probabilidade de apresen-
tar otite média aguda do que aquelas colonizadas em idade
mais velha. Os fatores que permitem a progressão da colo-
nização da nasofaringe para infecção clínica são bastante
complexos. A infecção viral pode ser um fator desencade-
ante da infecção bacteriana através da inibição da fagocito-
se. Uma vez conhecendo-se o fato que a infecção bacteria-
na inicia-se pela colonização de nasofaringe, torna-se rele-
vante o fato que uso de vacinas pneumocócicas conjugadas
podem inibir a colonização bacteriana.
COMENTÁRIOS SOBRE O ESTUDO
Noiniciodoano2000foiliberadanosEstadosUnidosavaci-
na pneumocócica conjugada abrangendo sete sorotipos. Esta
vacina foi a primeira vacina liberada com eficácia promissora.
Após a liberação nos Estados Unidos houve a recomendação
para uso da vacina em toda a população infantil naquele país.
A principal dúvida em relação a esta vacina é que, apesar de
existiremcercade90sorotiposdepneumococo,estavacinapro-
tegesomenteparasetesorotipos.Estefatopodefazercomqueo
efeitodavacinaemdiversasregiõesdomundosetornevariável
emfunçãodadistribuiçãoregionaldosdiferentessorotipos.Outro
fato a ser considerado é a possível substituição de sorotipos na
nasofaringeporoutrossorotiposnãoincluídosnavacina.
A vacina neste estudo mostrou uma grande eficiência na
diminuiçãodaincidênciadedoenças,particularmenteemcrian-
ças abaixo de dois anos.
Umachadorelevantedesteestudofoiaavaliaçãodoimpac-
to da vacina em outras faixas de idade que não receberam a
vacina. Este efeito é possível devido ao conceito de imunidade
de rebanho, uma vez que a vacina diminui a colonização de
nasofaringe e, conseqüentemente a transmissão da do-
ença para contactantes de pacientes colonizados.
Em nosso país, a doença pneumocócica é muito importan-
te. Os dados do Centro de Vigilância Epidemiológico para me-
ningites indicam cerca de 450 casos por ano, com 25% de
letalidade, além de alta taxa de seqüelas graves, com
um número ainda maior de pneumonias graves.
Aimportânciadadoençajustificaousodavacina,aindaque
a proteção conferida pela mesma não supere 65% dos soroti-
pos isolados em nosso meio.
Tradução e Comentários:
DrEitanNBerezin
BrandileoneMC,deAndradeAL,DiFabioJL,GuerraML, Aus-
trianR.Appropriatenessofapneumococcalconjugatevaccine
inBrazil:potentialimpactofageandclinicaldiagnosis,withem-
phasisonmeningitis. JInfectDis2003;187:1206-12.
BerezinEN,CarvalhoLH,LopesCR,SanajottaAT,Brandileone
MC, Menegatti S et al. Meningite pneumocócica na infância:
característicasclinicas,sorotiposmaisprevalenteseprognós-
tico. J Pediatr (Rio J) 2002; 78:19-23.
Dagan R, Melamed R, Muallem M, Piglansky L, Greenberg D,
AbramsonOetal.Reductionofnasopharyngealcarriageofpneu-
mococciduringthesecondyearoflifebyaheptavalentconjugate
pneumococcalvaccine.JInfectDis1996;174:1271-8.
Referências Bibliográficas
Ano 9 - Out/Nov/Dezembro/2003 7
1.INTRODUÇÃO
ApráticadaCardiologiaPediátricaestáintimamenteligada
à cirurgia cardíaca, especialmente a partir dos anos 70, quan-
donovastécnicasdecirculaçãoextra-corpóreaeparadacircu-
latóriacomhipotermiaprofundapermitiramacorreçãodecar-
diopatias ainda mais complexas.
Osdefeitoscardíacoscongênitostêmsidotradicionalmentede-
finidoscomoalteraçõeshemodinâmicasdecorrentesdeanormali-
dadesanatômicas.Aintervençãocirúrgicaofereceuoqueseimagi-
noutratardasoluçãotantoparaasobrecargahemodinâmica,quan-
toparaodéficitdeoxigenação.Apossibilidadedacorreçãoanatô-
micaoufisiológicareforçouomodelohemodinâmicocomoúnica
opçãoterapêutica.Algunstermoscomopré-carga,pós-cargaeino-
tropismofizerameaindafazempartedovocabuláriodiário.Noen-
tanto,aspectosrelacionadosaoremodelamentomiocárdicoecardi-
orreparação foram desconsiderados, pois a insuficiência cardíaca
eravistacomoumaalteraçãodecurtaevolução.
Noentanto,comoaumentodamorbidadeedamortalidadeno
pósoperatóriotardio,notou-sequeemalgunscasos,acirurgiaofere-
ciaapenasacorreçãopaliativa.Osprocedimentoscirúrgicosidealiza-
dosparacorreçãodedefeitosanatômicospodemlevaràinsuficiência
cardíaca por complicações precoces e tardias. As arritmias podem
piorarafunçãocardíacadepacientessubmetidosamúltiplasinterven-
çõescirúrgicas.
Estaéumacomplicaçãotardiaindesejávelemprocedimentos
cirúrgicoscomoporexemplonaoperaçãodeSenningouMustard,
realizadaparaatransposiçãodasgrandesartérias,ounacorreção
totaldaTetralogiadeFallotouaindanacirurgiadeFontanparacora-
çõesuniventriculares.Adilataçãodoventrículodireitocomdisfun-
ção sistólica e diastólica é uma complicação tardia comum nos
casosdemúltiplasintervençõesparareconstruçãodaviadesaída
doventrículodireito.Aagressãoventricularestárelacionadaàexpo-
siçãodoventrículoaumaduplasobrecargaporobstruçãoeregur-
gitaçãoeoconseqüentedesenvolvimentodehipertrofiaefibrose.A
necessidadedeváriascirurgiasexpõeomiocárdioàlesãorepetida
deisquemiaereperfusão.Acredita-sequeoisolamentodoretorno
venosohepáticodacirculaçãopulmonarnoscasosdacirurgiade
Glennbidirecionalpredispõeaodesenvolvimentodefístulaartério-
venosapulmonar.Estascomunicaçõesanormaiscontribuempara
umasobrecargadevolumeedilataçãodoventrículoúnico.
Manejo da insuficiência cardíaca na criança
Comoaumentoprogressivodonúmerodepacientespediátri-
coscominsuficiênciacardíacacrônica,ficaclaroqueocontrolehe-
modinâmico e anatômico como única forma de abordagem tera-
pêuticanãoésuficientepararealidadeatual.Ainsuficiênciacardíaca
resulta,assim,dainteraçãodefatoreshemodinâmicos,neurohumo-
raisecelulares.Asíndromedainsuficiênciacardíacacrônica,éuma
condiçãodedisfunçãocardíacaedosistemacirculatório,caracteri-
zadapordeterioraçãosilenciosaeprogressivasecundáriaàstentati-
vaspersistentesdoorganismoemrestabeleceroequilíbrio.
Aprogressãodadoençaéresultadodiretodaaçãodospróprios
mecanismosresponsáveispelarecuperaçãodahomeostase.Asín-
dromedainsuficiênciacardíacaagudasedesenvolveemdecorrên-
cia de uma lesão miocárdica ou de uma mudança na sobrecarga
cardíaca, causando um desequilíbrio entre os mecanismos com-
pensatórioseafunçãomiocárdica,levandoaumsúbitodesbalanço
homeostáticoeconseqüentesurgimentodossintomas.Éimportan-
teobservarqueessasdefiniçõessurgemdeconceitosmaistradici-
onais,baseadosnaleideofertaedemandametabólica.Atualmen-
te,ograndedesafionotratamentodainsuficiênciacardíacatemsido
amelhoradascondiçõeshemodinâmicaseclínicasconjuntamente
comapreservaçãoeremodelamento domiocárdio.
Apresentaremos a seguir os princípios gerais farmacológicos e
fisiológicos necessários para o atendimento do paciente pediátrico
cominsuficiênciacardíaca(IC)compensadaoudescompensada.
2.FISIOPATOLOGIAEMANIFESTAÇÕESCLÍNICAS
Ainsuficiênciacardíacanapopulaçãopediátricapodeserdivi-
didaemtrêsperíodosclínicos:
1)perinatal
2)lactentejovem
3)infânciaeadolescência
Enquantoochoquecardiogênicoéumaapresentaçãoclínica
freqüentenoperíodoperinatal,criançaseadolescentesapresen-
tamsintomasrelacionadosàdeterioraçãocrônicadafunçãocardí-
aca como resultado de lesões anatômicas não corrigidas ou de
cirurgiapaliativaprévia.
2.1- O período perinatal.
Ainsuficiênciacardíacanoperíodoperinataléconsideradauma
DEPARTAMENTO DE CARDIOLOGIA
DOCUMENTO CIENTÍFICO
Dr. Jorge Yussef Afiune*
Ano 9 - Out/Nov/Dezembro/20038
manifestaçãoclínicapoucocomum,enquantoqueochoquecardio-
gênicopordisfunçãomiocárdicaprimáriaousecundáriaéumaapre-
sentaçãofreqüente.Estadistinçãoéimportanteporqueotratamento
dasduascondiçõesédiferente.Nochoquecardiogênico,aestabiliza-
çãocirculatóriaéaprioridade,enquantonaIC,otratamentodeveser
direcionadoporobjetivoseresultadosalongoprazo.Orecémnascido
emchoquepodemelhorarclinicamenteeevoluirparaumquadrode
IC compensada. Por outro lado, a falha da terapêutica clínica ou da
evolução para IC compensada são indicativas da necessidade de
intervençãocirúrgicaoudecateterismointervencionista.Comoexem-
plo, pode-se citar a estenose valvar aórtica crítica, ou a estenose da
valvapulmonar,síndromedahipoplasiadecoraçãoesquerdoouain-
daadrenagemanômalatotaldeveiaspulmonaresobstrutiva.
2.2- Lactentes jovens.
Pacientes que apresentam lesões com grande shunt da es-
querdaparaadireita,comoporexemplo,ascardiopatiastipoCIV,
desenvolvemICagudaoudescompensadaapósadiminuiçãoda
resistênciavascularpulmonareconseqüentehiperfluxopulmonar.
Odébitocardíacosistêmicoficacomprometido,determinandoa
ativaçãodosistemanervososimpáticoedosistemarenina-angio-
tensina-aldosterona(RAA),iniciandoassimaretençãodesódioe
água,econsequentementeossinaisesintomasclínicosdeIC.
Iniciando-seotratamento,ocorreoremodelamentocompen-
satórioeapós-cargamiocárdicasenormaliza,sendoconsiderado
omarcodetransiçãoparaumafasecrônicaoudeICcompensa-
da.Noentanto,emalgunscasos,ocustometabólicoétãoaltoa
pontodeafetarocrescimentoadequado.Estebaixoganhopônde-
ro-estatural é considerado como falha no tratamento clínico e é
indicativo da necessidade de intervenção cirúrgica precoce em
algumas situações.
É importante salientar que a necessidade de se manter o canal
arterialpérvioparaumshuntdireita-esquerda,ouparaumacirculação
em paralelo (Transposição das grandes artérias), ou por uma lesão
obstrutiva(Atresiapulmonar),transformaasituaçãoemfisiologiade
shuntesquerda-direita. Demonstra-se,portanto,queohiperfluxopul-
monareainsuficiênciacardíacatambémpodemocorrernaslesões
“cianogênicas”.
Algunspacientesqueevoluemcomchoquenoperíodoperina-
talpodemapresentarmelhorasignificativadossintomas,permitin-
doaretiradadosuporteparenteral.Estegrupodepacientesatinge
a homeostase com um nível de ativação do sistema RAA inicial-
mente mais alto. Com o início do remodelamento e desenvolvi-
mentodahipertrofia,ostressmiocárdicodiminui.Acriançapassa
de um estado de choque cardiogênico para a descompensação
aguda,efinalmenteatingeacompensaçãocrônica.
Duranteapassagemporestestrêsestágiosclínicos,oobje-
tivo terapêutico deve mudar. Na fase inicial, a preservação do
fluxosangüíneoadequadoéoobjetivoprincipaleamanutenção
dodébitocardíacoapropriadocomdrogasinotrópicaspotentes
sefaznecessário.
Duranteafasederesolução,osobjetivosalongoprazodevem
serpriorizados:
1)sintomasdopaciente;
2)remodelamentomiocárdico;
3) ativação do sistema RAA;
4)mudançasnamicroestruturacelular;
5)necessidadedeintervençãocirúrgicafutura.
2.3- Infância e adolescência
Nesta fase, além das causas gerais de IC durante a infância e
adolescência, deve-se acrescentar a morbidade pós operatória. A
insuficiênciacardíacapréoperatóriapode resultarda:
1)evoluçãonaturaldedefeitoscongênitosnãocorrigidoscirurgi-
camente(porexemplocomunicaçãointerventricular,defeitodosep-
toatrioventricular,estenoseaórtica,estenosepulmonar)
2)doençassistêmicascomohipertensãopulmonarouhiperten-
sãoarterialsistêmica,doençasdocolágeno,cardiomiopatiasidio-
páticasousecundárias
3)arritmias
No paciente em pós operatório, observa-se que a IC, em algu-
massituações,éconseqüênciaoucomplicaçãodaprópriatentativa
de solucionar o problema. A dilatação e a hipertrofia de ventrículo
direito são complicações freqüentes das cirurgias realizadas para
aliviaraobstruçãodaviadesaídadoventrículodireito(porexemplo
Tetralogia de Fallot ou estenose pulmonar valvar crítica) ou para re-
construçãodaviadesaída(atresiapulmonar,troncoarterialcomum).
Estima-se que 4-15% dos pacientes com Tetralogia de Fallot
necessitemdereoperação.Ainsuficiênciapulmonarresidualseve-
raapóscorreçãototaldeTetralogiadeFallottemsidorelacionadaa
arritmiaseàintolerânciaaoexercício.
Ospacientescomsíndromedehipoplasia docoraçãoesquer-
do e fisiologia de ventrículo único têm uma sobrevida em cinco
anos de 81% após o terceiro estágio cirúrgico. No entanto, a pro-
gressãodadisfunçãomiocárdicacontinuaaserumproblemanes-
te grupo de pacientes. As anormalidades da valva mitral e defeito
doseptoatrioventricularpodemresultareminsuficiênciaouesteno-
se mitral residual e uma necessidade de re-intervenção cirúrgica
posterior.
Essessãoalgunsexemplosquesalientamacronicidadequefre-
qüentementeseassociaàcorreçãocirúrgicadosdefeitoscongênitos.
Em alguns casos, existe um substrato anatômico já presente
aonascimento,noentanto,suasmanifestaçõesclínicassóapare-
cemduranteoacompanhamentoevolutivo(ventrículodireitoarrit-
mogênico,WolfParkinsonWhite,síndromedoQTlongo).Pacientes
queapresentaramdoençadeKawasakioufebrereumáticapodem
evoluircomcomplicaçõestardiasoudescompensaçõespelalesão
cardíacaprévia(aneurismaouestenosedecoronárias,estenoseou
regurgitaçãovalvar).
3.MANEJO DA IC
OmanejoatualdaICnãoincluiapenasanormalizaçãododébito
cardíacoemelhoradossintomas.Outrosaspectosfisiopatológicos,
comoaestimulaçãoneuroendócrina,oremodelamentodosmiócitos
Ano 9 - Out/Nov/Dezembro/2003 9
eainteraçãotecidoconectivo/miócitotambémdevemserconside-
radosnoplanejamentodotratamentodaICcompensada.
Anormalizaçãodoestadohemodinâmicopermanececomo
principal objetivo do tratamento da fase aguda de descompen-
saçãodaIC.Entretanto,estaestratégiaalongoprazopodedeter-
minar um aumento nas taxas de morbidade e mortalidade. As
terapêuticasquevisamamelhorahemodinâmica,incluemouso
dedrogasqueutilizamosreceptoresbetaadrenérgicosouindire-
tamenteativamosmecanismoscompensatóriosneuroendócri-
noseautócrino-parácrinos.Essasformasdetratamento,apesar
deeficazesemmelhorarossintomase aperformancemiocárdi-
capodem,alongoprazo,comprometeromiocárdiopeloefeito
tóxicodireto,responsávelpelanecroseeapoptosealémde“do-
wnregulation”(feed-backnegativo)dosreceptoresbetaadrenér-
gicos,remodelamentomiocárdico,crescimentointersticialede-
pleçãodeenergia.
Evidênciasdemonstraramqueotratamentodeanormalidades
neuroendócrinas tem efeito benéfico na história natural da IC. Os
inibidores da enzima conversora de angiotensina (ECA) e os beta
bloqueadoresretardamouatérevertemoprocessoderemodela-
mento.Alémdisso,apesardeparecerparadoxal,osbetabloquea-
dorespodemmelhorardemaneirasignificativaafunçãocardíacaa
longoprazo.ApesardosinibidoresdaECAseremresponsáveispor
diminuiçãosignificativadamorbidadeedamortalidade,seusuces-
soaindanãoestácompleto.Recentementetemsidosupostoque o
“escape” da aldosterona no tratamento com inibidor da ECA seja
responsávelporseusucessoparcial.EmpacientescomIC,aaldos-
terona é responsável pela retenção de sódio, pela resistência ao
diurético, pela produção de colágeno e progressão da disfunção
diastólica.Oestudodenominado“RandomizedAldactoneEvaluati-
onStudy(RALESPilotstudy)” tempesquisadoessesaspectosem
adultos através da associação da espironolactona (antagonista do
receptordaaldosterona)aotratamentoconvencionaldaIC.
3.1- IC descompensada (aguda):
A vasoconstrição periférica e a retenção de sódio e água na
insuficiência cardíaca, marcam a mudança nas prioridades circu-
latórias e o início da descompensação. As tentativas do sistema
nervosoautônomoedosistemaRAAemnormalizarodébitocar-
díaco, determinam um aumento na pré e pós carga ventricular.
Essasalteraçõessãoresponsáveispeloaparecimentodaconges-
tão venosa sistêmica e pulmonar e dos sintomas. Uma série de
mecanismoscompensatóriosresponsáveispeloremodelamento
ehipertrofiamiocárdicossãoativadossimultaneamente.
Eventualmente,umnovoestadodehomeostaseéatingidocom
novascondiçõeshemodinâmicas,normalizandoostressmiocárdi-
co.Opacienteinicia,então,afasedeICcompensadaoucrônica.
Os objetivos do tratamento da IC aguda descompensada
incluem a normalização das condições hemodinâmicas e a
melhora dos sintomas através de ações na pré carga, pós
carga, relaxamento e contratilidade miocárdica. As principais
drogasutilizadasincluemosdiuréticos,inotrópicos,inodilata-
doresevasodilatadores.
3.2- IC compensada (crônica):
Apesar dos avanços cirúrgicos, da indicação precoce e da
melhoradaproteçãomiocárdica,amorbidadeemortalidadeper-
manecemaltasparaalgumaslesõescardíacascongênitas.Aex-
periênciainicialdaMayoCliniccomacirurgiadeFontanmostrava
que 16,5% dos pacientes apresentavam os mesmos sintomas
pré-operatóriose35,8%foramaóbitoouevoluíramcompiorados
sintomas.Apesardamortalidadeterdiminuídonosúltimosanos,
a morbidade permanece sendo um grande problema nessa po-
pulação. Pacientes com atresia pulmonar ou estenose pulmonar
crítica ao nascimento, que serão submetidos a múltiplas trocas
valvares durante o acompanhamento, podem apresentar disfun-
çãoventricularmanifestadaatravésdeintolerânciaaoexercícioou
arritmias ventriculares. O remodelamento do ventrículo direito é
conseqüênciadeperíodosprolongadosdeobstruçãoe/ouregurgi-
taçãodanovavalvapulmonar.
Oremodelamentodoventrículodireitotambémocorrenasci-
rurgiasdetrocaatrial(OperaçãodeSenning/Mustard).Asarritmias
atriais aumentam de forma significativa a morbidade tardia. Ape-
sarda“correção”hemodinâmicanessespacientes,aprogressão
dadoençapersiste.
Sabe-sequeemalgunscasos,aintervençãocirúrgicaéapenaspali-
ativa,sendo,portanto,inevitávelaprogressãolenta,porémcompensada
dadoença. OpacienteemICcompensadanãosofreapenasdaaltera-
çãohemodinâmica.Aexperiênciadospacientesadultosdemonstrou
queofatodenãointervirnaprevençãodoremodelamentomiocárdico
acarretaemumaumentosignificativodamorbidadeedamortalidade.
OmanejodaICcrônicaemcriançasnecessitadeumaaborda-
gemplanejadaeintegrada. Otratamentodeveserindividualizado,
baseadonaidadedacriança,nodiagnósticocardiológicoespecí-
ficoenaslesõesassociadas.Otratamentoatualdeveserdirecio-
nado para a recuperação do equilíbrio neurohumoral autócrino e
parácrino,responsáveispelaprogressãoinexoráveldadoença.Os
agentesutilizadosparaessepropósitosão:osinibidoresdaECA,
osbetabloqueadores,aDigoxina,osbloqueadoresdereceptores
daangiotensinaeosantagonistasdaaldosterona.
4-FARMACOLOGIA DA IC
4.1 Diuréticos
Os diuréticos são a droga de escolha para o tratamento da IC
descompensada ou aguda. São responsáveis pela melhora dos
sintomasedascondiçõeshemodinâmicasdospacientescomcon-
gestãopulmonaresistêmica,peloaumentodarespostadavascu-
laturaperiféricaaosinotrópicos,vasodilatadoreseinibidoresdaECA.
Através da diminuição da pré-carga, há uma diminuição do
stressdaparedeventricularquefuncionacomoumpotenteestí-
muloparaoremodelamentomiocárdico.Noentanto,têmpouco
Ano 9 - Out/Nov/Dezembro/200310
efeito nos pacientes que não apresentam sintomas de conges-
tão. Na realidade, pela sua contribuição à ativação do sistema
neurohumoral,seuusoestárelativamentecontraindicadonessas
circunstâncias.OdiuréticoidealparaotratamentodaICnãodeve-
riaterefeitonosistemaRAA.Osinibidoresneutrosdaendopepti-
daseestãosendoestudadosatualmentepoisapresentamefeito
diuréticoedeproteçãomiocárdica.Pacientestratadoscomessas
drogas,demonstraramdiminuiçãodaconcentraçãodaaldostero-
naedosníveisdepressãodeenchimentoventricular.Infelizmen-
te, a tolerância à droga surge precocemente e a presença de
substâncias vasoconstritoras circulantes sugere a presença de
mecanismoscompensatóriosneurohumorais.
4.2 Inotrópicos e inodilatadores
Aregulaçãodocálciointracelulartempapelcrucialnacontratili-
dadecardíaca.Apósadespolarizaçãocelular,ocálcioficadisponí-
velatravésdoscanaisdecálcioedaliberaçãodoretículosarcoplas-
mático. Osíonscálcioseligamàtroponina,facilitandoainteração
entreactinaemiosinaeconseqüentegeraçãodeforçaecontração.
Duranteorelaxamento,ocálciodeveretornaraoretículosarcoplas-
máticoousairdacélula.Algunsdossítioscelularesexploradospara
regulaçãodocálciointracelularsão:
1) via do AMP cíclico (AMPc);
2)trocadesódioecálcio;
3)sensibilizaçãodasproteínascontráteispelocálcio;
4) ativação dos canais de sódio.
VistoqueafosforilaçãodeproteínasviaAMPcéodenomina-
dor comum de várias drogas, os inotrópicospodemserclassi-
ficadosemdependentesdoAMPcenãodependentesdeAMPc.
OsagentesdependentesdoAMPc podemagiratravésdaestimu-
laçãodereceptoresbeta(Dobutamina,epinefrina,norepinefrina)ou
atravésdainibiçãodaenzimafosfodiesterase(Amrinone,Milrinone).
Estas drogas dependentes do AMPc reduzem o stress de
parede através do aumento da contratilidade e da vasodilatação
periférica. As drogas que atuam nos receptores beta têm um
papelbemdefinidonotratamentodochoquecardiogênicoeda
IC descompensada.
Osinibidoresdafosfodiesterase(amrinoneemilrinone)sãoinodila-
tadores que atuam na fosfodiesterase III, enzima responsável pela
inativaçãodoAMPcíclico.OAmrinoneeoMilrinonesãoasdrogas
atualmenteaprovadasparaaplicaçãoclínicanosEstadosUnidos.Os
inibidoresdafosfodiesterasesãoprimariamentevasodilatadoresque
atuam na musculatura lisa vascular aumentando os níveis de GMP
cíclicointracelular.Oefeitopositivonacontratilidaderesultadamelhora
dascondiçõesdepóscargaedacinéticadocálciointramiocitário.Foi
demonstradoqueessasdrogaspossuemumefeitoinotrópico mais
potentecomumcustoenergéticomuitomenor.Osprincipaisefeitos
colateraissãohipotensãoarterialsistêmica,arritmiasetrombocitopenia
(especialmentecomoamrinone).Temsidodemonstradoaindaquea
administraçãodestasdrogasemrecémnascidosésegura.
A estimulação prolongada de receptores adrenérgicos tem
umefeitodeletériopotencialdeaumentaroconsumodeoxigênio,
oremodelamentomiocárdico eanecrosecelular.Oaumentodo
cálciointracelularétambémresponsávelporumaumentodaarrit-
mogênese. Estudos conduzidos em adultos comprovam que o
usoprolongadodessasdrogas,aumentaamorbidadeeamorta-
lidadealongoprazo.Essesdadospoderiamserfacilmenteextra-
polados para população pediátrica que apresentam IC compen-
sada de longa duração, como por exemplo, os pacientes com
fisiologiauniventricular(ventrículoúnico).
As drogas independentes do AMP cíclico atuam através
do aumento do sódio intracelular (promovendo a troca com
cálcio através dos canais de sódio/cálcio, como p.ex: Digoxi-
na), através da ativação dos canais de sódio (vesnarinone) ou
aindadoaumentodasensibilidadedomiofilamentoaocálcio
(pimobendan). Pode ser questionado se essas drogas apre-
sentam algum papel no tratamento do choque cardiogênico
ou IC descompensada pela sua meia vida longa. Vale lem-
brar,entretanto,quepacientescomimportante“downregula-
tion” ou não acoplamento dos receptores beta, a resposta às
catecolaminas pode estar diminuída. Além disso, as drogas
independentes do AMP cíclico podem aumentar o inotropis-
mocombaixocustoenergético.
A Digoxina é a droga mais antiga e talvez a mais utilizada no
tratamentodaIC.Suasdesvantagensincluemamargemterapêutica
estreita,oriscodearritmiasporintoxicaçãoeopequenoefeitoinotrópi-
co.Essadrogareconquistouespaçonapopulaçãoadultapelassuas
característicasinibitóriasneurohumoraiseseuefeitopositivonataxa
de morbidade e de mortalidade. Nos casos agudos, a capacidade
da Digoxina em restaurar a função cardíaca pode ter um impacto
positivo na função diastólica e servir como um agente de transição
paraasdrogasinotrópicasmaispotentes.OVesnarinoneéuminotró-
picoquecausaativaçãodoscanaisdesódio,bloqueiodoscanaisde
cálcio,aumentonacorrentedecálcioediscretainibiçãodafosfodies-
terase. Nosadultos,avesnarinonereduziuamortalidadeembaixas
doses (60mg) mas teve efeito reverso em altas doses (120mg). O
Pimobendan é um sensibilizador de cálcio que também apresenta
propriedades de inibição da fosfodiesterase. Uma das preocupa-
ções quanto a esse grupo de drogas é quanto a possibilidade de
causaranormalidadesderelaxamentopelaafinidadedatroponinaC
pelo cálcio. Em estudos na população adulta, essa droga demons-
trou um perfil hemodinâmico favorável e melhorou a qualidade de
vida.Ossensibilizadoresdecálcioapresentamumaumentodaafini-
dadepelocálciocomdosesmenoreseinibiçãodafosfodiesterase
comdoseselevadas.Essaclassededrogasnãofoiaindaadequada-
menteestudadaemcrianças.
4.3 Vasodilatadores
Osvasodilatadoresconstituemumgrupodedrogasheterogê-
neocomdiferentesmecanismoselocaisdeação.Oresultadofinal
comuméorelaxamentovasculare,portanto,reduçãodapóscarga,
pré carga e da pressão arterial. A terapêutica vasodilatadora tem
sidoutilizadatantoemcriançascomoemadultosparaaumentaro
débito cardíaco. No entanto, os vasodilatadores podem ser dividi-
dosnosqueproduzemativaçãoneurohormonaleremodelamento
miocárdico(hidralazina,prazosin,nitroglicerina,nitroprussiatoeini-
Ano 9 - Out/Nov/Dezembro/2003 11
bidoresdafosfodiesterase)eosqueproduzemefeitosbloqueado-
res da resposta do sistema nervoso simpático e sistema RAA
(inibidores da ECA e beta bloqueadores).
Os vasodilatadores são usados de rotina no manejo da IC na
faixa etária pediátrica. Eles atuam nos vasos de resistência ou de
capacitância. Tem indicação clara nas lesões regurgitantes sistê-
micas (insuficiência aórtica ou mitral), nas quais comprovou-se a
melhora do débito cardíaco pela redução da fração regurgitante.
Nopósoperatórioimediatodecirurgiacardíaca,ocontrolerigoroso
dapressãoarterialeamanipulaçãodaprécargaepóscargasão
necessáriosparamaximizarodébitocardíaco.
O nitroprussiato e a nitroglicerina foram utilizados para essa
função,porém,oMilrinoneeoAmrinonetornaram-seasdrogasde
escolha pela sua propriedade inotrópica adicional. Quando é ne-
cessário um controle mais fino e rápido da pressão arterial, as
drogasdemeiavidamaiscurta,comoonitroprussiato,permane-
cemcomoprimeiraopção.
Os inibidores da ECA e os beta bloqueadores de terceira
geração são os agentes de escolha quando a redução a longo
prazo da pós carga e o controle da pressão arterial são neces-
sários,peloseubenefícioadicionaldemodulaçãoneurohumo-
ralederemodelamentomiocárdico.
Paraotratamentoprolongado,outrosvasodilatadoressãoindi-
cadosnapresençadeangioedemainduzidopeloinibidordaECA
ou quando há diminuição severa da função cardíaca, contraindi-
candoousodebetabloqueador.
4.4 Moduladores Neurohumorais
4.4.1 Digoxina
Napopulaçãoadulta,otratamentoprolongadocomDigoxina
acarreta uma melhora dos sintomas, aumenta a tolerância ao
exercícioediminuioriscodepioraclínica.Temsidodemonstrado
queaDigoxinaproduzefeitosneurohumoraisfavoráveis,indepen-
dentedasmudançashemodinâmicas.Essesefeitossãoobserva-
dos antes do aparecimento do efeito inotrópico. Os glicosídeos
cardíacosaumentamarespostadosbaroreceptoresparassimpá-
ticos cardíacos e arteriais o que, por outro lado, diminui a ação
simpática central. Os efeitos neurohumorais da Digoxina não fo-
ram estudados em crianças, porém, seus efeitos benéficos no
tratamentodaICporhiperfluxopulmonar(CIV,PCA,etc)emlacten-
tes com contratilidade miocárdica normal sugere que a modula-
çãoneurohumoralpossaocorrertambémnapopulaçãopediátrica.
4.4.2 Inibidores da ECA
Todososvasodilatadoressãocapazesdereduziraimpedânciae,
portanto, a pós-carga. No entanto, somente os inibidores da ECA
demonstraramreduçãodamortalidadeapósousoprolongadoem
adultos.Seusefeitossãoproduzidosporpelomenos3mecanismos:
1)inibiçãodaenzimaconversoradeangiotensina(transforma
angiotensinaIemangiotensinaII);
2)inibiçãodadegradação dabradicininaquepromoveorela-
xamentovascularereduçãodapós-carga;
3)inibiçãodaliberaçãodenorepinefrinapelasterminaçõesner-
vosas simpáticas.
Napopulaçãoadulta,osinibidoresdaECAdeterminammelhora
clínica,aumentodasobrevidaereduçãodamortalidade.Postula-seque
estesefeitosbenéficossejamumaconseqüênciadosefeitossalutares
nomiocárdioedainibiçãodosmecanismoscompensatórios.
Os inibidores da ECA não só previnem o surgimento, mas
podemreverterafibrosemiocárdicapormaladaptação.Oefeito
noprocessoderemodelamentomiocárdicotornaessencialouso
deinibidordaECAnotratamentodaIC.
Existemdiversosestudosnapopulaçãoadulta,porémemcri-
anças,nãohárelatosdeprojetoscontrolados,prospectivoseran-
domizados. No entanto, os relatos de crianças com cardiopatia
congênita tipo shunt esquerda/direita ou cardiomiopatia dilatada
submetidas ao tratamento com inibidor da ECA, demonstraram
umarespostaclínicaehemodinâmicafavorável.
4.4.3 Betabloqueadores
ComaexpansãodosconhecimentossobreIC,novasformasde
tratamentosurgiram,àsvezescontroversasedesafiadoras.Astenta-
tivasdemodularasrespostasneurohumoraislevaramàincorporação
dosbetabloqueadoresnotratamentodaICcomresultadosfavoráveis.
Os betabloqueadores melhoram a contratilidade miocárdica
atravésdemudançasbiológicasnomiócito,aumentama fração
deejeçãoereduzemovolumeventricular.Osefeitosdosbetablo-
queadoresnoremodelamentomiocárdicodevemestarrelaciona-
dosàinibiçãodosistemaRAA,inibiçãodaliberaçãodeendotelina
ereduçãodostressdaparedeventricular.
Aatividadeaumentadadosistemanervosoautônomoemcrian-
ças com IC foi recentemente comprovada e o seu uso terapêutico
demonstroumelhoraclínicaedafunçãoventricularcomsupressão
dos níveis de RAA e norepinefrina. A melhora da função ventricular
ocorrelentamente,muitasvezesdemorameses.Podecausarinicial-
menteumapioradossintomaspeloefeitoinotrópiconegativo.Esse
efeitoémaiscomumcomosbetabloqueadoresdeprimeiraesegun-
dageração(Propranolol,Metoprolol).Osdeterceirageração,Bucindo-
loleCarvedilol,tempropriedadesvasodilatadorasquepodemsuperar
essaslimitaçõespeloseuperfilhemodinâmicomaisfavorável.
4.4.4 Antagonistas do receptor da angiotensina
Foram identificadas duas classes principais de receptores da
angiotensinaII,chamadasdeAT1eAT2.Amaioriadosefeitosda
angiotensinaIIémediadopelosreceptoresAT1.Essesreceptores
atuamnadiferenciaçãoecrescimentocelular,tônusvascularelibe-
raçãodavasopressinaarginina.
Emumestudoconduzidonapopulaçãoadulta,foidemonstra-
doqueoLosartan,umantagonistadereceptorAT1,ésuperiorao
Ano 9 - Out/Nov/Dezembro/200312
CaptoprilnotratamentodaIC.OLosartanapresentoumelhorefeito
em todas as causas de mortalidade, com menos efeitos colate-
raisemelhoradesãoaotratamento.Noentanto,nãohouvediferen-
ça nas internações ou óbito por IC entre os dois grupos. Não há
relatosdeestudosdessasmedicaçõesnapopulaçãoinfantil.Os
bloqueadoresdereceptoresdaangiotensinaconstituemumaboa
alternativa aos inibidores da ECA quando há efeitos colaterais in-
desejadoscomotosseeangioedema.
4.4.5. Antagonistas da aldosterona
OtecidoconectivocardíacorespondeàangiotensinaIIcircu-
lante e à aldosterona. A ação da aldosterona é específica nos
fibroblastos,semafetaromiocárdio.Oaumentodocolágenoas-
sociado com a estimulação da aldosterona, determina uma au-
mentonasfibrasde colágenotipoI.
OaumentodocolágenotipoIcausaumadiminuiçãodacompla-
cênciaventriculareconseqüentedisfunçãodiastólica.Existemdados
quesugeremqueaaldosteronapodeatrapalharotratamentocomos
inibidoresdaECA.Esseefeitoéresponsávelpelaretençãodesódioe
resistênciaaotratamentodiurético,perdadepotássioemagnésio,pro-
duçãodecolágenomiocárdico,progressãodadisfunçãomiocárdicae
liberaçãodenorepinefrina.Asconseqüênciasdobloqueiodosefeitos
daaldosteronanaICestãosendoestudadas.O“RandomizedAldacto-
ne Evaluation Study” (estudo RALES Pilot) está pesquisando esses
aspectosatravésdoestudodosefeitosdaassociaçãodoAldactoneà
terapiaconvencionaldaICnoadulto.
4.5 NUTRIÇÃO
UmdosaspectosmaisimportantesnomanejodaICemcrian-
çastalvezsejaanutrição.Nospacientesqueaguardamcirurgiapalia-
tivaoucorretivaequenãoapresentamganhoponderaladequado,a
falhadotratamentoclínicodeveserconsideradaeconstituiumadas
indicaçõesdecirurgiaprecoce.
Obaixoganhoponderaléumdossintomasprincipaisentreos
lactentescomICcrônica.Resultadademandaenergéticaaumenta-
daedoaportecalóricoinadequado.Estascriançastêmumaneces-
sidadecalóricamédiadeaproximadamente150Kcal/Kgpordiapara
atingirumganhodepesoadequado.Pelanecessidadederestrição
hídricaeusodediuréticos,adensidadecalóricadafórmulalácteaou
leitematernomuitasvezestemqueseraumentadaematé30Kcal/oz
ouatémaisemalgunscasos.Aoaumentaroconteúdocalóricodo
leite,pode-seaumentaroquocienterespiratório,desdequetodasas
caloriassejamadicionadasnaformadepolímerodeglicose.
Esseaspectodeveserconsideradocuidadosamentepoises-
ses pacientes desenvolvem com facilidade alcalose metabólica
hipoclorêmica pelo uso de diurético e o efeito combinado pode
levaràventilaçãoinadequadaouperdadecaloriaspelousoexces-
sivodamusculaturarespiratória.
COMENTÁRIOS FINAIS
Comoaprofundamentodoconhecimentosobreafisiopatolo-
gia da IC, surgem novas formas de tratamento. Os objetivos do
tratamento não incluem, atualmente, apenas a estabilização
hemodinâmicaemelhoradossintomas.Narealidade,oenfo-
quedaintervençãofarmacológicatemsidonasalteraçõesmais
sutis. Foram discutidas algumas das novas drogas utilizadas
notratamentodaIC,comoosbeta-bloqueadores,bloqueado-
resdaangiotensinaedaaldosteronaesensoresdecálcio.Foi
comentado também sobre o maior conhecimento sobre dro-
gas antigas e tradicionais como a Digoxina. Entre as novas
drogasetratamentosemestudo,inclui-seosmoduladoresda
respostaàcitocinina,oantagonistadoreceptordaendotelina,
os bloqueadores de canal de cálcio tipo T, a combinação dos
inibidores da ECA com bloqueadores de receptor da angio-
tensina, o antagonista da renina e os moduladores neuro-hu-
morais. A maioria dessas drogas está sendo submetida a
testesemadultosesabe-semuitopoucosobresuaaplicação
em crianças. Além disso, estudos em andamento tentam de-
monstrarseousodebeta-bloqueadoréapropriadoparapaci-
entes com IC avançada. A maioria desses estudos usa a re-
dução da mortalidade como resultado principal. No entanto,
seria mesmo um objetivo válido em crianças? Durante a se-
gunda metade desse século, experimentou-se um desenvol-
vimentoexplosivodetécnicasdecirurgiacardiovascularinfan-
til. Atualmente todas as cardiopatias congênitas podem ser
tratadascomcirurgiaspaliativasoudefinitivas.Nestesentido,
a história natural da Cardiologia Pediátrica e da IC na faixa
etáriapediátricamudoudrasticamente.Adiminuiçãodamor-
talidadenãodeveserconsideradacomoúnicoobjetivoprinci-
pal nesse novo grupo de pacientes. Na realidade, a qualidade
devidadeveriaserconsideradaemprimeirolugarassimcomo
omanejotardiodospacientespediátricoscomIC.Seriamuito
importanteconduzirestudosmulticêntricossimilares,emlar-
ga escala, que enfoquem especialmente a população pediá-
trica. Estudos comparativos das diferentes formas de trata-
mento(farmacológicoecirúrgico)sãoimprescindíveis.
*DoutoremMedicinapelaFaculdadedeMedicinadaUniversi-
dadedeSãoPaulo-FMUSP
MédicoAssistentedaUnidadedeTerapiaIntensivaCardiológica
PediátricaedoSetordeEcocardiografiaPediátricadoInstitutodoCora-
çãodaFaculdadedeMedicinadaUniversidadedeSãoPaulo-FMUSP
AuslenderM,ArtmanM.Overviewofthe managementofpediatric
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Referências Bibliográficas
Ano 9 - Out/Nov/Dezembro/2003 13
Devido ao crescente risco que envolve a atividade
sexual desprotegida e ao numero cada vez maior de
adolescentes iniciando precocemente a vida sexual, o
pediatra precisa estar preparado para a abordagem
desse tema durante o atendimento dos jovens. Constitui
grande desafio a adequada orientação sexual, que
implica em enfatizar a importância da sexualidade
responsável, da afetividade e da participação da família
e da escola nesse processo contínuo de educação. Para
tanto, é necessário que o profissional tenha também
conhecimento sobre os métodos contraceptivos, bem
como sobre os aspectos éticos que envolvem a
prescrição dos mesmos.
O adolescente tem direita a educação sexual, ao acesso
a informação sobre contracepção e a confidencialidade
sobre sua atividade sexual e prescrição de métodos con-
traceptivos. Ele tem, ainda, independentemente da ida-
de, o direito à privacidade; ou seja, de ser atendido so-
zinho, em espaço privado de consulta. Deve-se lembrar
que a privacidade não esta obrigatoriamente relaciona-
da à confidencialidade.
O sigilo médico é um direito garantido e reconhecido
pelo artigo 103 do Código de Ética Medica, segundo o
qual “É vetado ao médico revelar segredo profissional
referente a paciente menor de idade, inclusive a seus
pais ou responsáveis legais, desde que o menor tenha
capacidade de avaliar seu problema e de conduzir-se
por seus próprios meios para solucioná-lo, salvo quando
a não revelação possa acarretar danos ao paciente”. A
consciência desse direito implica em reconhecer a
autonomia e individualidade do adolescente,
estimulando a responsabilidade com sua própria saúde.
Entretanto,emdeterminadassituações,consideradasde
exceção, como de déficit intelectual importante, distúrbios
psiquiátricos, desejo do adolescente de não ser atendido
sozinho, entre outros, a confidencialidade e a privacidade,
que constituem o sigilo profissional, deverão ser rompidas.
Nos casos em que haja referência explícita ou suspeita de
abuso sexual, o profissional está obrigado a notificar ao
Conselho Tutelar, de acordo com a Lei Federal 8069/90, ou
a Vara da Infância e Juventude, como determina o Estatuto
da Criança e Adolescente. Face à complexidade dessas
situações, recomenda-se a discussão dos casos em equipe
multidisciplinar, de forma a avaliar a conduta, bem como o
momento mais adequado para notificação.
É importante ressaltar que a garantia de
confidencialidade e privacidade favorecem a abordagem
de temas delicados como sexualidade, uso abusivo de
drogas, violência, entre outras situações. Destacamos,
ainda, a importância do ginecologista e pediatra, durante
o atendimento dos jovens, não imporem seus valores
morais e/ou religiosos.
Ciente da relevância do papel do pediatra e
ginecologista na proteção do adolescente, a Sociedade
Brasileira de Pediatria e a Federação Brasileira das
Sociedades de Ginecologia e Obstetrícia propõem as
seguintes recomendações com relação à prescrição de
métodos contraceptivos para adolescentes:
•Deve ser respeitado o direito do adolescente de ser
atendido sozinho, em um espaço privado de consulta.
O direito à privacidade também deve ser garantido
DOCUMENTO CIENTÍFICO
DEPARTAMENTO DE ADOLESCÊNCIA
Normas para prescrição de contracepção na
adolescência.
Coordenação*
Ano 9 - Out/Nov/Dezembro/200314
durante o exame físico.
• O pediatra e ginecologista devem aproveitar as
oportunidades de contato com adolescentes e/ou suas
famílias para promover a reflexão e a divulgação de
informações sobre temas relacionados à sexualidade e
à saúde reprodutiva, tais como: namoro, relação de
gênero, atividade sexual, contracepção (incluindo
contracepção de emergência), uso de condom,
prevenção de DST/AIDS, entre outros. Estas orientações
devem ser adequadas às necessidades e demandas de
cada adolescente e às características de cada
comunidade.
• Quando o adolescente desejar a presença de um
acompanhante, este direito deve ser respeitado. É
importante que o ginecologista e o pediatra possam
avaliar as situações em que a presença de um
responsável se faça necessária, como nos déficits
intelectuais importantes, distúrbios psiquiátricos e outros
distúrbios que levem à perda da capacidade crítica.
• O relato de violência requer a quebra de sigilo
devido à obrigatoriedade de notificação aos Conselhos
Tutelares, como determina o Estatuto da Criança e do
Adolescente. Face à complexidade dessas situações,
recomenda-se a discussão dos casos em equipe
multidisciplinar, de forma a avaliar a conduta, bem como
o momento mais adequado para a notificação.
• O pediatra e o ginecologista podem disponibilizar
preservativos para os adolescentes, desde que estes
tenham consciência dos aspectos que envolvem a sua
saúde e a sua vida.
• O pediatra e o ginecologista devem orientar sobre
todos os métodos anticoncepcionais, suas indicações,
eficiência e prováveis efeitos colaterais.
• O pediatra e o ginecologista podem prescrever
anticoncepcional hormonal oral para adolescentes desde
que tenham consciência dos aspectos que envolvem a
sua saúde e a sua vida.
• O pediatra e o ginecologista devem oferecer
contracepção de emergência, com critérios e cuidados,
por ser um recurso de exceção, às adolescentes expostas
ao risco iminente de gravidez, nas seguintes situações:
1. Não estar usando qualquer método contraceptivo;
2. Falha do método contraceptivo utilizado (falha no
uso do condom, esquecimento de tomar a pílula, etc.);
3. Abuso sexual.
Observação:
a) a contracepção de emergência não é considerada
um método abortivo, conforme as evidências cientificas
demonstram.
b) deixar de oferecer a contracepção de emergência
nas situações em que está indicada, pode ser
considerada uma violação do direito do paciente, uma
vez que este deve ser informado a respeito das
precauções essenciais. O ato médico não implica em
poder excepcional sobre a vida ou a saúde do paciente.
O pediatra e ginecologista devem esclarecer que a
contracepção de emergência não e um método
contraceptivo regular, aproveitando a ocasião para
orientar quanto às possibilidades de contracepção
regular.
A relação sexual em menores de catorze anos, para
ser considerada violência presumida, depende da
queixa (Código Penal, artigo 224 e 225), ou seja, se a
adolescente não apresentar queixa de violência
permanece o direito à privacidade, à orientação e à
prescrição de contraceptivos.
*
Departamento Cientifico de Adolescência da SBP
Federação Brasileira das Sociedades de Ginecologia
e Obstetrícia - FEBRASGO
ATENÇÃO
As publicações da Revista Correios da SBPRevista Correios da SBPRevista Correios da SBPRevista Correios da SBPRevista Correios da SBP
estão disponíveis no site:
wwwwwwwwwwwwwww.sbp.com.br.sbp.com.br.sbp.com.br.sbp.com.br.sbp.com.br (Educação Médica Continuada).
Ano 9 - Out/Nov/Dezembro/2003 15
INTRODUÇÃO
A Agência Européia de Avaliação de Produtos Medici-
nais (EMEA) liberou recentemente diretrizes para se con-
duzir ensaios clínicos em crianças, onde afirma que “pa-
cientes pediátricos devem receber medicamentos ade-
quadamente avaliados para sua utilização”. Ainda que o
desenvolvimento de drogas pediátricas exista há anos,
uma grande quantidade de fármacos utilizados não fo-
ram testados por pesquisa com delineamento moderno
tanto para posologia e dose quanto para tolerância. Entre
25 e 55% das prescrições utilizadas em hospitais são de
drogas não licenciadas ou cujo uso pediátrico não consta
em bula, sendo a dose geralmente uma correlação linear
(em mg/kg) da dose do adulto.
Segundo definição da Organização Mundial da Saúde
(OMS, 1972) uma Reação Adversa a Drogas (RAD)Reação Adversa a Drogas (RAD)Reação Adversa a Drogas (RAD)Reação Adversa a Drogas (RAD)Reação Adversa a Drogas (RAD) é
uma resposta nociva e indesejável a uma droga, nas do-
ses normalmente utilizadas no ser humano para profila-
xia, diagnóstico ou tratamento de uma doença, ou ainda
para modificação da função fisiológica. Reações adver-
sas a drogas ocorrem em 2 a 71% dos pacientes, varian-
do com a patologia clínica e os métodos utilizados. Hos-
pitalizações por RADs podem variar de 0,2 a 22%. Desde
a década passada, tem havido um interesse crescente
no monitoramento de RADs como medida de segurança
da qualidade do tratamento medicamentoso. Neste as-
pecto, é importante não somente observar as RADs con-
vencionais, como também monitorizar danos preveníveis
causados por erros no uso de medicamentos. O termo
preferido atualmente é Evento Adverso a Droga (EAD)Evento Adverso a Droga (EAD)Evento Adverso a Droga (EAD)Evento Adverso a Droga (EAD)Evento Adverso a Droga (EAD),
definido como “um dano resultante de intervenção médi-
ca relacionada a uma droga”. Isto inclui tanto as RADs
tradicionais quanto danos causados por erros de medica-
ção (erros de prescrição, administração e dispensa de
drogas). Nenhum estudo de RAD ou EAD em crianças foi
realizado na Noruega. O objetivo deste estudo é assim,
de investigar e determinar a freqüência, gravidade e ca-
racterísticas dos EADs em crianças admitidas em enfer-
maria de Pediatria de Hospital Universitário, estudar as
intervenções terapêuticas necessárias no manejo dos
EADs e estudar a identificação e notificação de EADs.
METODOLOGIA
O monitoramento intensivo de EADs foi conduzido du-
rante cinco meses (fevereiro a julho de 1996) na Unidade
de Pediatria do Hospital Universitário de Ullevaal, Oslo,
que conta com 900 leitos. O estudo incluiu crianças de
zero a dezesseis anos de idade, hospitalizadas em duas
enfermarias de pediatria geral (42 leitos). A enfermaria
neonatal foi excluída, mas 84 crianças menores de três
meses foram incluídas. Como a unidade não possuía
serviço de cirurgia pediátrica, diversos pacientes neces-
sitando de atenção cirúrgica foram removidos tempora-
riamente para a unidade cirúrgica, e também foram in-
cluídos no estudo. Também fora incluídos os EADs cau-
sados por drogas prescritas durante as últimas duas
semanas anteriores à admissão, EADs causadores de
hospitalização e EADs após a alta causados por drogas
introduzidas no hospital.
Para este estudo, foi definido como EAD um dano ou
sintoma suspeito de ter sido precipitado por intervenções
médicas relacionadas com o tratamento medicamento-
so. A definição inclui, além das RADs, intoxicações por
erro de medicação e abuso de drogas.
Buajordet I, Wesenberg F, Brors O, Langslet A
Acta Paediatr 2002; 91:88-94
Eventos adversos a drogas em crianças hospitalizadas
em hospital universitário da Noruega.
Adverse drug events in children during hospitalization and after discharge
in Norvegian university hospital
SEGURANÇA INFANTIL
Ano 9 - Out/Nov/Dezembro/200316
As informações sobre EAD foram coletadas de duas
formas:
1)Notificação espontânea de EADs tanto por clínicos
como pelos pais. Um pesquisador visitou a enfermaria
diariamente durante o período do estudo questionando
sobre possíveis EADs. Os pais foram solicitados a preen-
cher um formulário sobre possíveis EAD ocorridos nas duas
semanas prévias a admissão, durante a hospitalização e
até duas semanas após a alta.
2)Revisão de prontuários médicos: o farmacêutico re-
alizou levantamento dos prontuários médicos (dados la-
boratoriais, evolução clínica diária dos clínicos e da enfer-
magem e dados sobre exposição a drogas), para eventos
adversos que poderiam estar relacionados a drogas.
A avaliação da causalidade foi realizada por um far-
macêutico, utilizando um algorítmo descrito em 1981 por
Naranjo et al. Um evento adverso grave foi definido como
qualquer ocorrência indesejável que em qualquer dose
resultasse em morte, necessidade de hospitalização ou
prolongamento da hospitalização atual, ou ainda em inca-
pacidade total, parcial ou acarretasse risco de vida. A
suspeita de EAD foi confirmada por um farmacêutico clí-
nico e discutida com os médicos pediatras.
As EADs foram codificadas em banco de dados utili-
zando a Terminologia de Reações Adversas da OMS (WHO-
ART). As drogas foram agrupadas de acordo com a classi-
ficação Anatômica-Terapêutica-Clínica (ATC) da OMS.
RESULTADOS
Dados demográficos:Dados demográficos:Dados demográficos:Dados demográficos:Dados demográficos:
Nos cinco meses do estudo, ocorreram 1102 admis-
sões das quais 183 foram excluídas por insuficiência
de dados, sendo 919 admissões incluídas na pesqui-
sa. Alguns dos pacientes tinham mais de uma admis-
são durante o período (média de 1,4 admissões, varia-
ção de 1-12). Logo, 665 pacientes foram incluídos - 300
do sexo feminino (45%) e 365 do sexo masculino (55%),
com idade entre 0-16 anos (média: 2,7 anos). Os resul-
tados são referentes aos 579 participantes tratados com
medicamentos. A maioria das hospitalizações foi cau-
sada por problemas respiratórios, do sistema nervoso
central (SNC), gastrointestinal ou por neoplasias; 41%
(271/665) dos diagnósticos na alta apresentavam algum
tipo de infecção: trato respiratório 31% (207/665), das
quais 151 eram infecções agudas do trato respiratório
superior, a maioria por vírus respiratório sincicial (RSV)
(até dois anos de idade), e 54 eram pneumonia. Gas-
troenterites ocorreram em 3% (18/665), infecções do
trato urinário em 2% (16/665) e infecções diversas em
5% (30/665). Crianças com várias hospitalizações eram,
sobretudo pacientes oncológicos com internamento pro-
gramado para quimioterapia ou por complicações cau-
sadas pelo tratamento quimioterápico.
EADs - FEADs - FEADs - FEADs - FEADs - Freqüência, gravidade e característicasreqüência, gravidade e característicasreqüência, gravidade e característicasreqüência, gravidade e característicasreqüência, gravidade e características
Das 579 crianças tratadas com medicamentos, 165
(28%) apresentaram pelo menos um sintoma considera-
do EAD e 11% crianças tiveram EADs graves (Tabela 1 e
NNNNNooooo
de EADs (%)de EADs (%)de EADs (%)de EADs (%)de EADs (%) NNNNNooooo
de pacientes com EADs (%)de pacientes com EADs (%)de pacientes com EADs (%)de pacientes com EADs (%)de pacientes com EADs (%)
(n= 414) (n= 579)
RADs 407 (98) 161 (28)
Sobredose 7 (2) 4 (<1)
Ocorrência de EADs
Na admissão 75 (18) 39 (7)
Durante a hospitalização 246 (59) 105 (18)
Após a alta 112 (27) 54 (9)
Gravidade
Eventos graves 79 (19) 61 (11)
Eventos não-graves 335 (81) 101 (17)
Intervenções
Sem intervenção 232 (56) 71 (12)
Uso de droga adicional 97 (23) 45 (8)
Interrupção 51 (12) 37 (6)
Redução da dose 19 (5) 12 (2)
Outros 15 (4) -
RADRADRADRADRAD: Reação Adversa a Droga EADEADEADEADEAD: Evento Adverso a Droga
TTTTTabela 1abela 1abela 1abela 1abela 1. Freqüência de eventos adversos a drogas (EADs), gravidade e intervenção.
Ano 9 - Out/Nov/Dezembro/200318
Fig 1). No total, 414 eventos adversos foram julgados como
associados a drogas - 78% prováveis e 22% possíveis,
sendo 19% EADs graves. Reações adversas reais repre-
sentaram 98% de todos os eventos suspeitos. Sete even-
tos (em 4 pacientes) foram associados a superdosagens.
Dos 414 eventos, os mais freqüentes foram distúrbios
do SNC (28%), sobretudo por antiasmáticos, e distúrbios
gastrointestinais (27%) e cutâneos (11%), sobretudo por
drogas anti-infecciosas e citotóxicas. Dessa forma 13%
dos pacientes (76/579) sofreram reações gastrointestinais,
12% (72/579) reações do SNC, 7% (43/579) reações cutâ-
neas, 5% (27/579) reações generalizadas como febre, e
4% (24/579) reações hematológicas. Na admissão, 18%
dos pacientes apresentavam EADs e 6% (53/919) das in-
ternações foram motivadas por EAD, a maioria por rea-
ções hematológicas após tratamento com drogas citotó-
xicas e por complicações de vacinação. Durante a hospi-
talização, 18% dos pacientes sofreram 59% dos EADs e
após a alta 9% dos pacientes sofreram 27% dos EADs.
A quimioterapia anticancerosa causou EADs em to-
dos os pacientes tratados com tais drogas, anti-infeccio-
sos em 19%, antiasmáticos em 15% e drogas afetando o
SNC em 10% dos pacientes tratados.
Intervenções motivadas pelos EADs
Intervenções foram realizadas em 44% dos EADs: 23%
foram tratados com uma ou diversas drogas adicionais,
sendo a maioria prescrita para distúrbios por terapia cito-
tóxica, como antiemético, antibióticos para suspeita de
infecção e transfusões em sangramento/ trombocitopenia
por depressão da medula óssea, ou analgésicos para
estomatite. De 27 crianças em tratamento de câncer, 24
(89%) utilizaram pelo menos uma droga adicional para
EADs por drogas citotóxicas. A droga suspeita de causar
EAD foi descontinuada em 12% dos eventos, e a dose foi
reduzida em 5%.
Detecção e notificação dos EADs
Seis por cento (23/414) dos eventos foram relatados
por clínicos no protocolo do estudo, enquanto que os pais
referiram outros 13% (52/414), sobretudo reações do SNC
(30), gastrointestinais (9) e cutâneas (4). Reações do SNC
foram geralmente relacionadas com beta2-agonistas ou
corticosteróides. Nenhum dos eventos foi notificado ao
sistema de notificação espontânea nacional.
O prontuário médico dos pacientes foi a principal fon-
te dos eventos detectados como podendo estar associa-
dos ao uso de drogas. Os EADs descritos pelos clínicos
em suas anotações diárias foram na maioria eventos ne-
cessitando alguma intervenção, como modificação de do-
ses, interrupção de drogas suspeitas, prescrição de nova
droga para tratar o EAD ou demanda de exames para
posteriormente poder confirmar o evento. Em suas anota-
ções diárias, a enfermagem descreveu eventos como ná-
usea/vômitos, diarréia, rash cutâneo, problemas no local
de punções, reações do SNC e arritmia cardíaca. Dezoito
por cento (73/414) dos EADs ocorridos no hospital foram
mencionados nas anotações de alta.
DISCUSSÃO
A detecção de 18% EADs durante a permanência hos-
pitalar (28% se incluída a pré e pós-hospitalização imedi-
atas) por monitoramento intensivo está de acordo com
estudos por métodos similares. A maioria dos pesquisa-
dores examinaram RADs durante a hospitalização e en-
contraram incidências variando de 1,73% a 56%. As ca-
suísticas e os delineamentos de estudos similares a este,
mostraram uma freqüência de RADs durante a hospitali-
zação de 13,7 a 16,8%.
Freqüência das admissões relacionadas com EADs
Os achados de 6% das admissões terem sido causa-
das por EADs (ou 5% causados por RAD segundo a clas-
sificação da OMS) está em conformidade com relatos an-
teriores. A freqüência de admissões relacionadas a EADs
depende do tipo de pacientes estudados. Martinez-Mir et
al. relataram que as RADs causaram 4,3% das hospitali-
zações, mas não incluíram pacientes oncológicos ou in-
fectados pelo HIV na casuística. Mitchell et al. encontra-
ram 0,2% das admissões causadas por RADs em uma
unidade de terapia intensiva neonatal, 2% na clínica pedi-
átrica geral e 22% entre crianças com câncer. Em nosso
estudo, 42% (22/53) dos internamentos relacionados a
EADs foram motivados por terapia anticancerosa. Mais
surpreendente foram os 17% (9/53) dos internamentos por
EADs motivados por vacinas, a maioria delas sendo dif-
teria-tétano-pertussis e sarampo-caxumba-rubéola.
Características dos EAD
Neste estudo, as reações do SNC foram tão freqüen-
tes quanto as gastrointestinais, provavelmente devido às
Ano 9 - Out/Nov/Dezembro/2003 19
patologias tratadas, às drogas utilizadas e à participação
dos pais nas notificações. As reações do SNC neste es-
tudo foram mais freqüentes do que aquelas descritas nas
bulas de produtos antiasmáticos.
Reações gastrointestinais também foram freqüentes,
e causadas, sobretudo por drogas anti-infecciosas. Rea-
ções cutâneas foram menos freqüentes do que geralmente
notificado no sistema nacional de notificação espontânea,
em geral tão freqüentes quanto as gastrointestinais. De-
zenove por cento das EADs foram graves, a maioria sen-
do conseqüência de quimioterapia antineoplásica.
Não avaliamos o grau de prevenção dos eventos, mas
percebemos que algumas reações dose-dependentes
eram esperadas para se obter o efeito clínico desejado,
como as reações hematológicas durante a terapia anti-
cancerosa e as reações do SNC durante tratamento com
corticosteróides. Em conseqüência, algumas drogas com-
plementares foram prescritas para tratar EADs. Neste
estudo, 24% dos eventos foram tratados com drogas
adicionais que, por sua vez, causaram outros EADs em
oito crianças.
Notificação e detecção dos EADs
A notificação pelos clínicos de prováveis EADs foi bai-
xa, mesmo durante o estudo na enfermaria; isto indica
que outros métodos além da notificação espontânea de-
vem ser utilizados. Apesar da falta de iniciativa em notifi-
car EADs, os clínicos descreveram os eventos mais gra-
ves e complicados em suas evoluções, enquanto que os
eventos leves a moderados foram referidos nas anotações
de enfermagem. Os sintomas foram, no entanto, raramen-
te referidos como EADs ou RADs associados a alguma
droga em particular.
Dos EADs detectados, 11% (os mais graves), necessi-
taram de exames laboratoriais, como depressão da medu-
la óssea, toxicidade hepática e altas concentrações séri-
cas de drogas como antiepilépticos, digoxina ou teofilina.
Para uma visão completa do conjunto dos EADs em
grupos de pacientes, é necessária a metodologia de mo-
nitoramento intensivo. No entanto, esta técnica é bastan-
te demorada e de baixo custo/efetividade, é pouco reco-
mendada como rotina, como nos programas de verifica-
ção da qualidade da atenção da saúde. A notificação dos
pais parece ser importante, em particular quando se es-
tudam as reações adversas do SNC em crianças.
Prescrição de medicamentos
Sendo a enfermaria de um hospital de referência, o
grupo de crianças participantes foi heterogêneo. Entre
zero a dois anos as doenças respiratórias predominaram,
pois de janeiro a junho, ocorre a maioria das infecções
pelo vírus respiratório sincicial, que pode ser grave, mas
causa somente alguns dias de hospitalização. Em gru-
pos de maior idade, predominou a hospitalização para
tratamento quimioterápico ou controle de remissão.
Conseqüentemente, as drogas mais prescritas foram
aquelas para tratamento de doenças respiratórias, tais
como paracetamol, salbutamol e adrenalina racêmica
(42% das crianças tratadas com drogas), que não está
mais licenciada na Noruega, mas foi utilizada por muitos
anos na prática pediátrica. Outra droga prescrita, mas não
licenciada, foi o hidrato de cloral, produto de eficácia clí-
nica mal documentada, administrada como sedativo a 3%
dos pacientes. O midazolam, prescrito em 11% das cri-
anças, está licenciado, mas não em aplicação intranasal
como utilizado na enfermaria de pediatria. Como as dro-
gas não licenciadas não carecem dos requisitos de docu-
mentação clínica, monografia do produto ou bulas, os
conhecimentos dos profissionais de saúde sobre o perfil
das EADs podem ser insuficientes para garantir a quali-
dade ideal do tratamento medicamentoso. Tal uso, tanto
quanto possível, deveria ser reconsiderado e estudos con-
duzidos para dar suporte ao licenciamento de drogas es-
senciais.
CONCLUSÕES
O monitoramento de crianças hospitalizadas mostrou
que 28% delas foram alvo de EADs: 7% na admissão,
18% durante a estadia e 9% após a alta. Durante a hospi-
talização, excluindo-se a terapia antineoplásica, os EADs
foram essencialmente reações leves a moderadas gas-
trointestinais, do SNC e reações cutâneas associadas a
drogas anti-infecciosas e antiasmáticas. As reações do
SNC foram mais freqüentes do que esperadas no trata-
mento antiasmático e deveriam ser mais investigadas. A
triagem de prontuários clínicos foi a principal fonte de ob-
servação dos eventos relacionados a drogas, onde os clí-
nicos descreveram sobretudo os eventos que requeriam
intervenção no tratamento medicamentoso, enquanto que
a enfermagem descreveu as reações menos graves. Ë
recomendado que tanto a enfermagem quanto os pais
deveriam tomar parte nos estudos de investigação dos
EADs em crianças, especialmente quando forem estuda-
das reações do SNC.
COMENTÁRIOS
Eventos adversos a drogas são causas importantes
de hospitalização, co-morbidade e mortalidade. Consti-
tui a 4a
ou 6a
causa de morte entre pacientes hospitaliza-
Ano 9 - Out/Nov/Dezembro/200320
dos. Mais importante, é que entre 30 e 60% deles são
preveníveis. As estimativas de incidência variam com a
metodologia empregada, nível de complexidade do servi-
ço, as patologias prevalentes e ainda das definições utili-
zadas de EAD e Reação Adversa a Droga (RAD).
O EAD pode ser classificado como:
a) gravegravegravegravegrave - morte ou risco de vida; incapacitação, ou
limitação persistente ou extrema da atividade; necessi-
dade de intervenção médica/terapêutica significativa; hos-
pitalização provável ou possível;
b) moderadomoderadomoderadomoderadomoderado - incapacidade suficiente para causar
alteração parcial das atividades habituais; intervenção mé-
dica/terapêutica mínima ou nenhuma;
c) leveleveleveleveleve - desconforto ou incômodo facilmente tolerado;
sem necessidade de intervenção médica/terapêutica;
Os estudos bem delineados (ensaios clínicos con-
trolados, duplo-cegos e randomizados) pré-marketing,
conduzidos pela indústria farmacêutica sobre RADs,
concentram-se geralmente em adultos. Ensaios clíni-
cos pós-marketing podem ser realizados conforme o
interesse comercial e clínico (surgimento de novas in-
dicações, indícios de eventos adversos graves, drogas
essenciais ou de ampla utilização em Pediatria). No en-
tanto, os ensaios clínicos controlados têm característi-
cas que dificultam seriamente a detecção de EAD: o
limitado número de participantes (EADs raros ou inco-
muns não detectáveis), o curto período de exposição
(EADs tardios ou latentes, por acúmulo da droga ou por
uso crônico são indetectáveis), e o tipo de participante
(co-morbidades, distintas faixas etárias, variações ge-
néticas, formas severas, medicações simultâneas cau-
sam EADs indetectáveis por ensaios clínicos).
O monitoramento dos EADs em serviço (hospitalar e
ambulatorial) é importante para avaliar o efeito das dro-
gas em pacientes diferentes, em maior número e por
períodos maiores do que aqueles nos quais a droga foi
testada nas fases I-IV dos estudos pré-marketing. Em
países desenvolvidos, o monitoramento dos eventos ad-
versos em serviço faz parte da vigilância da qualidade
da atenção médica, ao supervisionar, junto com as RADs,
aspectos como o grau de prevenção de EADs, a valida-
de da indicação, prescrição, posologia e modo de ad-
ministração da droga.
Osestudos(nãocontrolados)sobrecausalidadeemEADs
em serviço devem utilizar critérios claros e precisos, capa-
zes de garantir objetividade (reprodutibilidade) e confiabili-
dade das conclusões. Diversos métodos foram desenvolvi-
dos, como o de Naranjo et al utilizado neste estudo. Trata-se
de um sistema de pontuação (escore), que analisa o grau
de associação entre o EAD e determinada droga.
Podemos observar os seguintes graus de associação:
a) causalidade definidacausalidade definidacausalidade definidacausalidade definidacausalidade definida - associação temporal níti-
da com a droga, sem nenhuma outra causa possível;
b) causalidade provávelcausalidade provávelcausalidade provávelcausalidade provávelcausalidade provável - associação temporal nítida;
melhora clínica após a retirada da droga, nenhuma justifica-
tiva adequada para a atual situação clínica do paciente;
c) causalidade possívelcausalidade possívelcausalidade possívelcausalidade possívelcausalidade possível - associação temporal
menos clara, outras etiologias possíveis;
d) nenhuma causalidadenenhuma causalidadenenhuma causalidadenenhuma causalidadenenhuma causalidade - sem associação tempo-
ral entre o evento e a droga; relacionada a etiologias di-
versas como outras drogas, condições concomitantes ou
situação clínica prévia.
Muitas drogas utilizadas não possuem ensaios controla-
dos e randomizados sobre dose e eficácia em crianças, cujas
indicações ficam “off-label” ou seja, sem menção no bulário.
Seria desejável, assim como ocorre com as Comissões
de Controle das Infecções Hospitalares, que as unidades
hospitalares constituíssem equipes de monitoramento dos
EADs, tanto para controle das reações preveníveis quanto
para monitorar a qualidade da atenção médica dispensada.
Tradução e Comentários:
Dr. Luís C. Rey
Gill AM, Leach HJ, Hughes J, Barker C, Nunn AJ, Choona-
ra I. Adverse drug reactions in a paediatric intensive care
unit. Acta Paediatr 1995; 84:438-41.
Lazarou J, Pomerantz BH, Corey PN. Incidence of adverse
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Referências Bibliográficas
Ano 9 - Out/Nov/Dezembro/2003 21
INTRODUÇÃO
Embora nos últimos 20 anos tenha ocorrido um
declínio na prevalência da desnutrição no Chile, as
deficiências de micronutrientes ainda persistem nas
crianças desse país. Estudos experimentais e preli-
minares sugerem que a deficiência de zinco provo-
ca efeitos clínicos em crianças, com impacto nega-
tivo no crescimento, na imunidade e no desenvolvi-
mento psicomotor. Potencialmente, a suplementação
de zinco pode melhorar o crescimento e o desenvol-
vimento das crianças que estão em risco de defici-
ência.
OBJETIVO
Avaliar o efeito da suplementação de zinco sobre o
crescimento e desenvolvimento na infância.
MÉTODOS E MATERIAIS
Foram selecionados 150 recém-nascidos de termo, de
baixo nível socioeconômico, com peso do nascimento
maior que 2300g. Foram excluídos aqueles com doenças
ou malformações. Todas as mães envolvidas no estudo
eram alfabetizadas, não faziam uso de drogas, e tinham
idades que variavam de 18 a 40 anos.
O estudo foi duplo-cego, randomizado e as crianças
foram acompanhadas desde o nascimento até os 12 me-
ses. Dois grupos foram formados:
· GS· GS· GS· GS· GS - Grupo SuplementadoGrupo SuplementadoGrupo SuplementadoGrupo SuplementadoGrupo Suplementado: recebeu 5mg/dia de
zinco oral, na forma de sulfato e
· GP· GP· GP· GP· GP - Grupo PlaceboGrupo PlaceboGrupo PlaceboGrupo PlaceboGrupo Placebo: recebeu placebo de lactose.
Os grupos foram semelhantes quanto às característi-
cas maternas, peso ao nascimento, ambiente domiciliar
e capacidade de interação com a mãe.
NUTRIÇÃO
Efeito da suplementação de zinco no desenvolvimento e
crescimento de crianças chilenas.
Effect of zinc supplementation on development and growth of Chilean
infants
Apenas 112 recém-nascidos foram seguidos até os doze
meses de vida.
Todos foram amamentados no seio materno, tendo re-
cebido como suplemento ou após o desmame, leite de
vaca a 7,5%, com 1,5% de óleo e 5% de açúcar, até os
três meses de vida, ou leite de vaca, com 5% de açúcar e
3% de cereais após os quatro meses de vida. Os alimen-
tos sólidos (sopa de legumes, óleo vegetal, carne ou fran-
go) e a suplementação de Ferro oral (1-2 mg/kg/ dia) fo-
ram introduzidos após cinco meses de vida.
As medidas antropométricas foram obtidas mensal-
mente: peso, estatura e perímetro cefálico.
A escala de Bayley II para lactentes (1993) foi utilizada
por psicólogos treinados para avaliar o desenvolvimento
aos seis e aos doze meses de vida. Esta escala permite
a determinação de diferentes níveis do desenvolvimento
mental e psicomotor pelos chamados “Índice de Desen-
volvimento Mental” (IDM) e o “Índice de Desenvolvimento
Psicomotor” (IDP).
Foram aplicados, também, testes de análise qualitati-
va de aspectos do comportamento através do escalona-
mento da atenção, da orientação, de um “fator de quali-
dade motora” e de um “fator de regulação emocional”.
Tecnicamente, o “fator de qualidade motora” dá um
valor na escala para os movimentos de coordenação
motora fina e/ou grosseira, para a o controle do movi-
mento, para a hipotonicidade ou a hipertonicidade mus-
cular, para a hiperatividade, para os movimentos len-
tos, atrasados, ou frenéticos e ainda para os possíveis
Castillo-Duran C, Perales CG, Hertrampf ED,
Marin VB, Rivera FA, Icaza G
J Pediatr 2001; 138:229-35.
Ano 9 - Out/Nov/Dezembro/200322
tremores. O “fator de regulação emocional” caracteri-
za a afetividade do lactente, a adaptabilidade e a coo-
peração.
Os escores obtidos para cada fator, permitiram que
fossem delimitadas três categorias de situações: nor-
mal, questionável ou em risco.
Aos dez meses de vida, foi avaliada a qualidade da
estimulação em casa. Foi incluída uma avaliação de fa-
tores maternos (resposta da mãe às solicitações ou ne-
cessidades do lactente) e de fatores dos lactentes (for-
ma de expressão).
Foram obtidas amostras de cabelo para a análise do
zinco; e amostras de sangue para medida da hemoglobi-
na na admissão, aos seis e aos doze meses. Foram ex-
cluídos do estudo os lactentes anêmicos (Hb < 10,5 g/
dL) e aqueles que não receberam semanalmente pelo
menos 50% do suplemento prescrito.
A análise estatística foi obtida por análise de variân-
cia, ANOVA, qui-quadrado,e teste t. Para avaliar o efeito
da suplementação de zinco sobre as variáveis estudadas
foi realizada uma análise de regressão múltipla aos seis e
aos doze meses. Foram feitas correlações de Pearson para
IDM, IDP e fator de qualidade motora.
RESULTADOS
Não houve efeito da suplementação oral de zinco quanto
aos parâmetros: peso, estatura e P/E, até doze meses,
controlando as diferenças sexuais e a amamentação.
A concentração de zinco no cabelo esteve semelhante
entre os grupos no início, aos seis meses e aos doze
meses de vida, não apresentando elevações no período
de estudo.
Não se observaram diferenças entre os grupos quanto
à estimulação em casa, à relação com a mãe, e ao fator
de regulação emocional.
As médias de “Índice de Desenvolvimento Psicomo-
tor” (IDP) e de Índice de Desenvolvimento Mental “(IDM)
foram semelhantes (IDP= GS: 84,5 ± 11,5 vs GP: 87,5 ±
9,9 e IDM= GS: 90,9 ± 10,5 vs GP: 88,9 ± 9,1).
Entretanto encontraram-se diferenças na proporção
de lactentes com escore < 100 para o IDM (GS: 42
em 57; menor que GP: 46 em 52) (p <0,05) aos doze
meses de vida.
O fator de qualidade motora também revelou uma
menor proporção de lactentes com escore baixo (< per-
centil 11) no GS tanto aos 6meses (GS: 2 em 57; menor
que GP: 8 em 52; p = 0,04), quanto aos 12 meses de
vida (GS: 2 em 57 vs GP: 6 em 52) (p = 0,08).
As médias dos escores para o fator de qualidade
motora estiveram efetivamente mais elevadas no GS
somente aos 12 meses de vida (GS: 31,9± 2,8 vs GP:
30,8± 2,9, p< 0,05).
O Fator de qualidade motora, avaliado aos 6 meses
de vida pela análise de regressão múltipla, foi influen-
ciado apenas pelo peso ao nascimento (p = 0,0009) e
aos 12 meses de vida pela suplementação de zinco
oral (p = 0,037).
DISCUSSÃO
É fato plenamente reconhecido que o comprometimen-
to da motricidade na criança, pode depender de deficiên-
cias nutricionais (ferro, por exemplo, causando distúrbios
neuromotores). O “fator de qualidade motora” relacionou-
se com o peso aos 6 meses de vida. Isso levanta a possi-
bilidade de que o efeito da suplementação de zinco pos-
sa se manifestar somente nos recém-nascidos com bai-
xo peso ao nascimento. Estudos experimentais demons-
tram os efeitos da deficiência de zinco induzida durante
os períodos críticos do desenvolvimento neurológico, re-
fletindo no comportamento e na atividade locomotora es-
pontânea dos animais. Isso justifica o interesse pelo es-
tudo da suplementação precoce de zinco em crianças.
A escala de Bayley ainda não foi validada na América
Latina. Fatores socioculturais podem explicar os baixos
valores encontrados nos dois grupos estudados em rela-
ção á população de referência. A aplicação dos testes
utilizados neste estudo ainda está em discussão, pois
não existem estudos de acompanhamento no primeiro ano
de vida desta nova edição da escala de Bayley (II). Entre-
tanto, ela é um instrumento comum para avaliação do de-
senvolvimento neuropsicomotor e isso não invalidaria o
estudo, já que as diferenças foram mantidas em ambos
os grupos estudados.
Embora diversos estudos experimentais tenham de-
monstrado que a deficiência de zinco induzida, leva a pre-
juízos motores na atividade espontânea, na atenção e na
memória, os poucos estudos em humanos apresentam
resultados conflitantes. Existe grande dificuldade na ob-
tenção de dados e na análise dos mesmos.
Nesse estudo não se observaram diferenças no
crescimento e no peso entre as crianças suplementa-
das com zinco oral durante doze meses. Mesmo as-
sim, não se pode excluir que diferenças venham a
ocorrer após essa idade.
Ano 9 - Out/Nov/Dezembro/2003 23
É possível que o desenvolvimento neuromotor seja mais
sensível às deficiências de zinco que o crescimento. Su-
põe-se que os lactentes dos países em desenvolvimento,
após o desmame, estejam expostos às deficiências de
zinco. Eles recebem cerca de 750ml/dia de leite de vaca
e duas refeições de sólidos, pobres em alimentos fres-
cos por dia. Estima-se que recebam cerca de 2,4 a 2,6
mg/dia de zinco, um consumo abaixo daquele recomen-
dado pelo National Council Recommended Daily Allowan-
ce (RDA), que recomenda 5mg/dia de zinco.
Nesse estudo, as concentrações de zinco foram obtidas
do cabelo. Esse método mostrou-se pouco sensível para
detectar variações marginais de zinco nos lactentes estuda-
dos (ambos os grupos tiveram médias semelhantes, sem
variação após suplementação oral, durante doze meses).
Caso existissem métodos laboratorialmente mais precisos
para separar os lactentes que apresentassem uma deficiên-
cia de zinco definida, os estudos de suplementação oral
poderiam mostrar melhores evidências do benefício.
Ainda no presente estudo, foram excluídas as anemi-
as, que poderiam causar alterações no desenvolvimento
neuropsicomotor, confundindo as deficiências decorren-
tes de diferentes minerais. Da mesma forma, foram ex-
cluídos os problemas com a oferta excessiva de ferro,
que poderia competir na absorção intestinal com o zinco,
oferecido fora do período das refeições. Observa-se que
a relação ferro:zinco maior do que 2:1 em adultos limita
a absorção de zinco: este efeito é superado quando se
oferta o suplemento durante as refeições.
Outros fatores que podem confundir a avaliação da
deficiência de zinco no desenvolvimento neuropsicomo-
tor incluem o baixo peso ao nascimento, a pobreza, o baixo
tempo de amamentação, a desnutrição energético-protéi-
ca e a deprivação social.
Novos estudos, que possam avaliar por períodos mais
longos os efeitos da deficiência de zinco no desenvolvi-
mento neuropsicomotor, como aqueles já realizados em
relação à deficiência do ferro, poderão ser desenvolvidos.
CONCLUSÕES
A suplementação de zinco diária aos lactentes duran-
te o período de um ano pode ser benéfica para o desen-
volvimento mental e a qualidade do comportamento mo-
tor em lactentes sadios, nascidos a termo.
COMENTÁRIOS
Os micronutrientes participam como cofatores de uma
série de processos metabólicos vitais, de forma análoga
às vitaminas. O zinco faz parte da atividade de metaloen-
zimas. As reações com substratos hormonais, ácidos gra-
xos e a transcrição protéica dependem desse metal. Por-
tanto a zincemia corpórea tem relação com a função imu-
nológica, a permeabilidade de membranas ao transporte
de sódio, o balanço nitrogenado, a maturação sexual, o
paladar e a adaptação ao escuro.
Suaimportâncianutricionaltorna-seclaraapartirdadescri-
çãodeadolescentescomretardodecrescimentoedamatura-
ção sexual, que responderam à administração de zinco oral.
Embora esse metal esteja largamente distribuído na
natureza, ele tem excelente biodisponibilidade no leite ma-
terno, nos frutos do mar e nas carnes. Nos vegetais tem
baixa biodisponibilidade pela presença de fitatos.
Atualmente as fórmulas infantis, os cereais mati-
nais e as formulações para nutrição enteral e parente-
ral são acrescidas de zinco. Considerando-se que os
lactentes dos países em desenvolvimento estão sujei-
tos ao desmame precoce, seguido de oferta de leite
de vaca e de sopas pobres em carnes, geralmente à
base de vegetais não frescos, é possível supor que
esses lactentes possam desenvolver carência desse
mineral. Acrescentem-se as freqüentes intercorrênci-
as a que estão sujeitos, aumentando as perdas e di-
minuindo a absorção do mesmo (infecções em geral,
diarréias agudas e crônicas).
A excreção do zinco, principalmente intestinal, está au-
mentada nas diarréias agudas, nas síndromes de má-ab-
sorção, e nas situações onde o metabolismo está aumenta-
do: hemoglobinopatias, cardiopatias, queimaduras exten-
sas, cirurgias e traumas. Um aumento da necessidade do
mineral também ocorre nas situações de crescimento rápi-
do, como na recuperação nutricional, ou no crescimento do
recém-nascido de muito baixo peso, exigindo reposições.
A expressão clínica da deficiência grave de zinco en-
contra-seevidentenaacrodermatiteenteropática,umacausa
rara de má-absorção congênita do metal. Lesões periorifi-
ciais, com hiperemia, descamação, além de anorexia, adi-
namia, alopécia, diarréia, atraso na maturação sexual e no
crescimento são descritos nesta doença. Infelizmente, os
sinais clínicos são inespecíficos nas deficiências leves ou
moderadas, dependendo das condições nutricionais e clí-
nicas do organismo. Alterações no apetite, na velocidade
de crescimento, no número de infecções podem ser con-
seqüências da hipozincemia marginal.
Até o momento existem muitas limitações na aferição
do zinco corpóreo. As concentrações plasmáticas estão
em relativa homeostase, estando diminuídas apenas nas
graves deficiências. As concentrações no cabelo refletem
situações crônicas, e mostraram pouca sensibilidade no
Ano 9 - Out/Nov/Dezembro/200324
estudo em questão.
A simples suplementação de zinco alimentar, diária,
tem sido aceita para estudos em crianças de países em
desenvolvimento, havendo controvérsias quanto ao efeito
no aumento da velocidade de crescimento, do peso, ou
na diminuição do número de infecções. Estudos recen-
tes sugerem a recuperação mais rápida na diarréia agu-
da em desnutridos, permitindo um “catch up” precoce, e
garantindo melhor estado nutricional após recuperação.
Poucos estudos referentes ao desenvolvimento neuropsi-
comotor foram efetuados em crianças. A maioria foi feita
em situações experimentais, onde se encontram algumas
evidências de comprometimento na atividade em geral,
pela deficiência do metal.
No estudo em questão, não houve diferenças signifi-
cativas quanto ao crescimento, ao peso, nem quanto aos
escores de desenvolvimento mental e psicológico. As
medidas durante o período de administração permanece-
ram inalteradas em ambos os grupos.
Entretanto, diferentes médias entre os grupos foram
encontradas na avaliação do fator de qualidade motora
aos doze meses de vida. Embora tenham ocorrido dife-
renças estatisticamente significantes, os números são
bastante próximos. Assim a análise de regressão múlti-
pla ajuda a avaliar o valor desses resultados. Dada a difi-
culdade de mensuração de fatores psicomotores, emoci-
onais e de estimulação em tão baixa idade, fica difícil
concluir sobre a eficácia real da suplementação.
As avaliações estatísticas de outras variáveis (menor
proporção de crianças com escores baixos para o fator
de qualidade motora) podem confundir o leitor. Nesses
pontos, as diferenças estatísticas encontradas foram pe-
quenas e de difícil valorização.
Nota-se ainda que os lactentes estudados não desen-
volveram sinais de desnutrição em ambos os grupos, nem
apresentaram diferenças quanto ao número de infecções
no período. Portanto os sinais de deficiência de zinco nos
grupos estudados deveriam ser muito sutis.
É preciso considerar ainda que a escala de Bayley,
embora de uso corrente, não foi validada na América La-
tina, e isso pode explicar os baixos valores encontrados
nos grupos estudados.
Outros fatores de confusão como a administração
de ferro, evitando a anemia, mas supostamente dimi-
nuindo a absorção do zinco, devem ser considerados
(mesmo considerando-se que o ferro recomendado di-
ário não foi excessivo). Embora a administração de zin-
co diária tenha sido orientada dentro da RDA (5mg/dia),
há que se considerar os riscos do excesso de zinco,
tóxico ao organismo, nos estudos que orientam a su-
plementação oral. O excesso de zinco no organismo
pode causar diarréia, vômitos, letargia, deficiência de
cobre, com anemia e depressão do HDL plasmático.
Novos estudos, melhorando as condições para aferi-
ção do estado de zinco no organismo, facilitarão a sele-
ção dos grupos e avaliação da suplementação oral diária.
A observação do desenvolvimento em longos períodos
(>12 meses) também poderá esclarecer melhor esse re-
sultado encontrado.
Tradução e comentários:
Dr. Ary Lopes Cardoso
Dra. Marilisa Stenghel Fróes e Souza
Bhuta ZA, Black RE, Brown KH, Gaedner JM, Gora S, Hidayat
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Referências Bibliográficas
Jornal da SBP 2003
Jornal da SBP 2003

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Jornal da SBP 2003

  • 1. Ano 9 - Out/Nov/Dezembro/2003 3 Prezado (a) leitor (a). A atualização continuada é fundamental para a boa prática médica. A Sociedade Brasileira de Pediatria sabe que os pediatras brasileiros querem se manter atualizados. A publicação “Correios da SBP” tem por objetivo oferecer tópicos recentes e comentados de assuntos de interesse geral a todos os sócios quites da SBP. Também, os diversos números de “Correios da SBP” divulgam consensos dos Departamentos Científicos da SBP através dos Documentos Científicos. Correios da SBP, Jornal de Pediatria e PRONAP são veículos impressos de atualização constante dos sócios. Paralelamente às publicações impressas, há material de educação médica continuada através do site da SBP e pela Internet. Espera-se que, dessa forma, os sócios da SBP possam ter os seus anseios correspondidos. Renato S. ProcianoyRenato S. ProcianoyRenato S. ProcianoyRenato S. ProcianoyRenato S. Procianoy Diretor de Publicações Científicas da SBP DDDDDeclínio da doença pneumocócica invasivaeclínio da doença pneumocócica invasivaeclínio da doença pneumocócica invasivaeclínio da doença pneumocócica invasivaeclínio da doença pneumocócica invasiva após a introdução da vacina pneumocócicaapós a introdução da vacina pneumocócicaapós a introdução da vacina pneumocócicaapós a introdução da vacina pneumocócicaapós a introdução da vacina pneumocócica conjugadaconjugadaconjugadaconjugadaconjugada Whitney CG, Farley MM, Hadler J, Harrison LH, Bennett NM, Lynfield R et al N Engl J Med 2003;348:1737-46 ......................................5 Manejo da insuficiência cardíacaManejo da insuficiência cardíacaManejo da insuficiência cardíacaManejo da insuficiência cardíacaManejo da insuficiência cardíaca na criançana criançana criançana criançana criança Dr. Jorge Yussef Afiune .....................................................7 Normas para prescrição de contracepçãoNormas para prescrição de contracepçãoNormas para prescrição de contracepçãoNormas para prescrição de contracepçãoNormas para prescrição de contracepção na adolescênciana adolescênciana adolescênciana adolescênciana adolescência Departamento Cientifico de Adolescência da SBP Federação Brasileira das Sociedades de Ginecologia e Obstetrícia - FEBRASGO ........................ 13 ÍNDICE EDITORIAL CORREIOS DA SBP - Diretor de publicações: Dr. Renato Soibelmann Procianoy - Coordenador do PRONAP: Dr. João Coriolano Rego Barros - Coordenador dos Correios: Dr. Antonio Carlos Pastorino - Coordenador Documentação Científica: Dr. Paulo de Jesus Hartmann Nader - Conselho Editorial: Darci Vieira da Silva Bonetto, Elsa Regina Justo Giugliani, Charles Kirov Naspitz, Délio José Kipper, Edmundo Clarindo Oliveira, Valéria Maria Bezerra Silva Luna, Ana Maria Cavalcanti e Silva, José Hugo Lins Pessoa, Bernardo Gontijo, Durval Damiani, Luciana Rodrigues da Silva, Marcos José Burle de Aguiar, Regina Célia de Menezes Succi, Eleonora Moreira Lima, Cléa Rodrigues Leone, Magda Lahorgue Nunes, Fernando José de Nobrega, Mara Albonei Dudeque Pianovski, Moacyr Saffer, Jayme Murahovschi, Clemax Couto Sant’anna, Flávio Roberto Sztajnbok, Jorge Harada, Eric Yehuda Schussel, José Américo de Campos, Cléa Maria Pires Ruffier, Paulo Ramos David João. - Comitê Executivo: Dr. Claudio Leone, Dr. Clóvis Artur Almeida da Silva, Dra. Heloisa Helena de Souza Marques, Dra. Lúcia Ferro Bricks, Dra. Marta Miranda Leal, Dr. Mário Cícero Falcão, Dra. Luiza Helena Falleiros R. Carvalho, Dra. Valdenise Martins Laurindo Tuma Calil - PRONAP / SBP – Programa Nacional de Educação Continuada em Pediatria – Rua Augusta, 1939 - 5º andar - sala 53 – Cerqueira César – São Paulo – SP – CEP: 01413-000 – Fone: (11) 3068-8595 – Fax: (11) 3081-6892 – E-mail: sbpsp@iprediamail.com.br Colaboraram neste número: Dr.EitanNBerezin, Dr. Jorge Yussef Afiune, Dr. Luís C. Rey, Dr. Ary Lopes Cardoso, Dra. Marilisa Stenghel Fróes e Souza, Dra. Lucia Ferro Bricks. Revisor deste número: Dr. Antonio Carlos Pastorino. As opiniões expressas são da responsabilidade exclusiva dos autores e comentadores, não refletindo obrigatoriamente a posição da Sociedade Brasileira de Pediatria. Tire suas dúvidas, faça suas críticas e sugestões aos editores sobre os artigos aqui publicados, pelo e-mail: sbpsp@iprediamail.com.br Criação, Diagramação e Produção Gráfica: Atha Comunicação & Editora – Rua Machado Bittencourt, 190 - 4o andar Conj. 410 – Cep: 04044-000 – São Paulo – SP – Tel: (11) 5087-9502 - Fax: (11) 5579-5308 – E-mail: 1atha@uol.com.br. Eventos adversos a drogas em criançasEventos adversos a drogas em criançasEventos adversos a drogas em criançasEventos adversos a drogas em criançasEventos adversos a drogas em crianças hospitalizadas em hospital universitáriohospitalizadas em hospital universitáriohospitalizadas em hospital universitáriohospitalizadas em hospital universitáriohospitalizadas em hospital universitário da Noruega.da Noruega.da Noruega.da Noruega.da Noruega. Buajordet I, Wesenberg F, Brors O, Langslet A Acta Paediatr 2002; 91:88-94 ....................................... 15 Efeito da suplementação de zinco noEfeito da suplementação de zinco noEfeito da suplementação de zinco noEfeito da suplementação de zinco noEfeito da suplementação de zinco no desenvolvimento e crescimento dedesenvolvimento e crescimento dedesenvolvimento e crescimento dedesenvolvimento e crescimento dedesenvolvimento e crescimento de crianças chilenas.crianças chilenas.crianças chilenas.crianças chilenas.crianças chilenas. Castillo-Duran C, Perales CG, Hertrampf ED, Marin VB, Rivera FA, Icaza G. J Pediatr 2001; 138:229-35 ........................................... 21 VVVVVacinações na infância e risco de asmaacinações na infância e risco de asmaacinações na infância e risco de asmaacinações na infância e risco de asmaacinações na infância e risco de asma DeStefano F, Gu D, Kramarz P, Truman BI, Iademarco MF, Mullooly JP et al. Pediatr Infect Dis J 2002; 21: 498-504 ......................... 25
  • 2. Ano 9 - Out/Nov/Dezembro/20034 PRESIDENTE: Lincoln Marcelo Silveira Freire 10 VICE-PRESIDENTE: Dioclécio Campos Júnior 20 VICE-PRESIDENTE: João Cândido de Souza Borges SECRETÁRIO GERAL: Eduardo da Silva Vaz 10 SECRETÁRIO: Vera Lúcia Queiroz Bomfim Pereira 20 SECRETÁRIO: Marisa Bicalho P. Rodrigues 30 SECRETÁRIO: Fernando Filizzola de Mattos 1O DIRETOR FINANCEIRO: Carlindo de Souza Machado e Silva Filho 2O DIRETOR FINANCEIRO: Ana Maria Seguro Meyge DIRETORIA DE PATRIMÔNIO: Mário José Ventura Marques COORDENADOR DO SELO: Claudio Leone COORDENADOR DE INFORMÁTICA: Eduardo Carlos Tavares CONSELHO ACADÊMICO: PRESIDENTE: Reinaldo Menezes Martins SECRETÁRIO: Nelson Grisard CONSELHO FISCAL: Raimunda Nazaré Monteiro Lustosa Sara Lopes Valentim Nilzete Liberato Bresolin ASSESSORIAS DA PRESIDÊNCIA: Pedro Celiny Ramos Garcia Fernando Antônio Santos Werneck Claudio Leone Luciana Rodrigues Silva Nelson de Carvalho Assis Barros Reinaldo Menezes Martins DIRETORIA 2001/2003DIRETORIA 2001/2003DIRETORIA 2001/2003DIRETORIA 2001/2003DIRETORIA 2001/2003 DIRETORIA DE QUALIFICAÇÃO E CERTIFICAÇÃO PROFISSIONAL: Clóvis Francisco Constantino COORDENADOR DO CEXTEP: Hélcio Villaça Simões COORDENADOR DA ÁREA DE ATUAÇÃO: José Hugo Lins Pessoa COORDENADOR DA RECERTIFICAÇÃO: José Martins Filho DIRETOR DE RELAÇÕES INTERNACIONAIS: Fernando José de Nóbrega REPRESENTANTES: ALAPE: Mário Santoro Jr. AAP: Conceição Aparecida de M. Segre IPA: Sérgio Augusto Cabral MERCOSUL: Remaclo Fischer Júnior DIRETOR DOS DEPARTAMENTOS CIENTÍFICOS: Nelson Augusto Rosário Filho DIRETORIA DE CURSOS E EVENTOS: Dirceu Solé COORDENADOR DA REANIMAÇÃO NEONATAL: José Orleans da Costa COORDENADOR DA REANIMAÇÃO PEDIÁTRICA: Paulo Roberto Antonacci Carvalho COORDENADOR DOS SERÕES: Edmar de Azambuja Salles CENTRO DE TREINAMENTO EM SERVIÇOS: COORDENADOR: Mário Cícero Falcão COORDENADOR DOS CONGRESSOS E EVENTOS: Álvaro Machado Neto COORDENADOR DO CIRAPS: Maria Odete Esteves Hilário DIRETORIA DE ENSINO E PESQUISA: Lícia Maria Oliveira Moreira COORDENADORA DA GRADUAÇÃO: Rosana Fiorini Puccini RESIDÊNCIA E ESTÁGIO-CREDENCIAMENTO: COORDENADORA: Cleide Enoir P. Trindade RESIDÊNCIA E ESTÁGIO - PROGRAMAS: COORDENADOR: Aloísio Prado Marra COORDENADOR DA PÓS - GRADUAÇÃO: Francisco José Penna COORDENADOR DA PESQUISA: Marco Antônio Barbieri DIRETORIA DE PUBLICAÇÕES DA SBP: DIRETOR DE PUBLICAÇÕES: Renato Soibelmann Procianoy DIRETOR DO JORNAL DE PEDIATRIA: Renato Soibelmann Procianoy COORDENADOR DO PRONAP: João Coriolano Rego Barros COORDENADOR DOS CORREIOS DA SBP: Antonio Carlos Pastorino DOCUMENTOS CIENTÍFICOS: COORDENADOR: Paulo de Jesus H. Nader CENTRO DE INFORMAÇÕES CIENTÍFICAS: COORDENADOR: Ércio Amaro de Oliveira Filho DIRETORIA DE BENEFÍCIOS E PREVIDÊNCIA: Guilherme Mariz Maia DIRETOR DE DEFESA PROFISSIONAL: Mário Lavorato da Rocha DIRETORIA DA PROMOÇÃO SOCIAL DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE: João de Melo Régis Filho PROMOÇÃO DE CAMPANHAS: COORDENADORA: Rachel Niskier Sanchez DEFESA DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE: COORDENADORA: Célia Maria Stolze Silvany COMISSÃO DE SINDICÂNCIA: COORDENADORES: Euze Márcio Souza Carvalho José Gonçalves Sobrinho Rossiclei de Souza Pinheiro Antônio Rubens Alvarenga Mariângela de Medeiros Barbosa
  • 3. Ano 9 - Out/Nov/Dezembro/2003 5 INTRODUÇÃO No início do ano 2000 foi liberada nos Estados Unidos uma vacina pneumocócica conjugada abrangendo sete sorotipos. Estavacinafoiaprimeiravacinaliberadacomeficáciapromisso- ra para faixa etária pediátrica. Após a liberação nos Estados Unidos houve a recomendação para uso da vacina em toda a populaçãoinfantilnaquelepaís. MÉTODOS Foramavaliadosdadospopulacionaisoriundosdeinvestiga- ção dos Centros de Controle de Doenças dos Estados Unidos paraverificaralteraçõesnaprevalênciadadoençapneumocóci- ca. A definição de casos foi baseada no isolamento do S.pneumoniae de locais normalmente estéreis como sangue, líquidocéfalo-raquídeo,líquidopleural,líquidoarticularepunção de ouvido médio. Para isto foram analisados os dados de labo- ratórios para o isolamento deste agente que abrangiam uma populaçãoestimadade16milhõesdepessoas,incluindo433.591 crianças menores de 2anos e 652.551 entre os dois e quatro anos de idade. Esta avaliação foi realizada entre 1998 e 2001. RESULTADOS As taxas de doença pneumocócica invasiva nos anos de 1998,1999,2000e2001foramrespectivamentede24,2–24,4– 21,2 e 17,3 casos/100.000 habitantes, com diminuição de 24,3 casospor100.000habitantes,emmédia,em1998e1999para 17,3por100.000em2001. Omaiordeclíniodadoençaocorreuemcriançasmenoresde doisanosdeidadeemquehouveumaquedade69%em2001 (188/100.000para59/100.000,p<0,001).Nestegrupodepaci- entesocoeficientedeincidênciadadoençacausadaporsoroti- posincluídosnavacinaesorotiposrelacionadoscaiuem78%e em 50%, respectivamente. A queda nas taxas da doença este- ve também presente em adultos onde houve uma queda de 32% para adultos entre 20 e 39 anos de idade (11,2/100.000 para7,6/100.000),8%emadultosentre40e64anos(21,5/100.000 para 19,7/100.000) e de 18% para adultos acima de 65 anos (60,1/100.000para49,5/100.000).Aincidênciadeinfecçõescau- sadas por S. pneumoniae resistente à penicilina diminuiu em 35%(6,3/100.000em1999para4,1/100.000em2001). A figura 1 abaixo mostra a evolução das taxas de doença pneumocócicaemrelaçãoàidade,eaonúmerodecasosdiag- nosticados. O impacto da vacina foi bastante importante na re- dução de taxas de doença em crianças abaixo de dois anos. Declínio da doença pneumocócica invasiva após a introdução da vacina pneumocócica conjugada. Decline in invasive pneumococcal disease after the introduction of protein-polysaccharide conjugate vaccine Whitney CG, Farley MM, Hadler J, Harrison LH, Bennett NM, Lynfield R et al. N Engl J Med 2003;348:1737-46 INFECTOLOGIA PEDIÁTRICA COMENTÁRIOS OS.pneumoniaeéabactériamaisassociadacomotitemé- dia, meningites e pneumonia. Mais de 1 milhão de crianças morrem antes de cinco anos devido a infecções bacterianas FFFFFigura 1:igura 1:igura 1:igura 1:igura 1: Taxas de doença pneumocócica invasiva em me- nores de 5 anos, de acordo com a idade e o ano.
  • 4. Ano 9 - Out/Nov/Dezembro/20036 associadascomopneumococo. Asinfecçõesqueocorremem crianças pequenas são as que acarretam a maior letalidade e maiormorbidade,poisestascriançasapresentampoucacapa- cidade de reação imunológica. Na realidade existem diversas cepas deS.pneumoniae dife- rentes que se distinguem uma das outras através da cápsula poliribossacarídicaque envolvea bactéria.Asua tipageméreali- zadaatravésdereaçõesdeaglutinaçãodacápsulaeclassificada atravésdenúmeroeletras(ex.sorotipos1, 6B,14entreoutros). A cápsula bacteriana permite que o pneumococo evite a fagocitose realizada pelos leucócitos e possa eventualmente atingiracorrentesangüíneaouosistemanervosocentral.Atu- almentemaisde90sorotiposdiferentesdepneumococosfo- ramidentificadosemtodoomundosendoqueosmaisimpor- tantes no Brasil são o 1, 5, 6, 14, 19 e 23F. Estes sorotipos são responsáveis por 75% das infecções invasiva em nosso país. Esta bactéria ganhou maior importância nos últimos anos principalmentecomosurgimentodecepasresistentes. Colonização de Nasofaringe- O evento inicial Lactentes,criançaseadultossãoportadoresnasaisdepneu- mococo.Abactériapodepersistirpormesesnoepitélionasal.O índice de portadores pode atingir até 45% em alguns locais. No nosso meio um estudo realizado em S. Paulo detectou 35% de portadoresdenasofaringe emcrianças.Emestudosrealizados com acompanhamento longitudinal em crianças desde o nasci- mento,observou-sequetodasascriançassecolonizampelopneu- mococoaomenosumavezduranteaprimeirainfância. Afloradanasofaringeéprovavelmenteomaiorsítiodeaqui- siçãodebactériaspatogênicasdotratorespiratóriosuperior.Di- versos estudos vêm confirmando a relação entre colonização nasofaríngeaeriscodedesenvolverinfecçãodotratorespiratório (especialmente otite média aguda) e doença invasiva. Do estado de portador para a Infecção O risco da progressão do estado de portador, isto é da colonização, para a doença é maior no período de um mês após a colonização por nova cepa da bactéria. As crianças de menor faixa etária tem maior probabilidade de apresen- tar otite média aguda do que aquelas colonizadas em idade mais velha. Os fatores que permitem a progressão da colo- nização da nasofaringe para infecção clínica são bastante complexos. A infecção viral pode ser um fator desencade- ante da infecção bacteriana através da inibição da fagocito- se. Uma vez conhecendo-se o fato que a infecção bacteria- na inicia-se pela colonização de nasofaringe, torna-se rele- vante o fato que uso de vacinas pneumocócicas conjugadas podem inibir a colonização bacteriana. COMENTÁRIOS SOBRE O ESTUDO Noiniciodoano2000foiliberadanosEstadosUnidosavaci- na pneumocócica conjugada abrangendo sete sorotipos. Esta vacina foi a primeira vacina liberada com eficácia promissora. Após a liberação nos Estados Unidos houve a recomendação para uso da vacina em toda a população infantil naquele país. A principal dúvida em relação a esta vacina é que, apesar de existiremcercade90sorotiposdepneumococo,estavacinapro- tegesomenteparasetesorotipos.Estefatopodefazercomqueo efeitodavacinaemdiversasregiõesdomundosetornevariável emfunçãodadistribuiçãoregionaldosdiferentessorotipos.Outro fato a ser considerado é a possível substituição de sorotipos na nasofaringeporoutrossorotiposnãoincluídosnavacina. A vacina neste estudo mostrou uma grande eficiência na diminuiçãodaincidênciadedoenças,particularmenteemcrian- ças abaixo de dois anos. Umachadorelevantedesteestudofoiaavaliaçãodoimpac- to da vacina em outras faixas de idade que não receberam a vacina. Este efeito é possível devido ao conceito de imunidade de rebanho, uma vez que a vacina diminui a colonização de nasofaringe e, conseqüentemente a transmissão da do- ença para contactantes de pacientes colonizados. Em nosso país, a doença pneumocócica é muito importan- te. Os dados do Centro de Vigilância Epidemiológico para me- ningites indicam cerca de 450 casos por ano, com 25% de letalidade, além de alta taxa de seqüelas graves, com um número ainda maior de pneumonias graves. Aimportânciadadoençajustificaousodavacina,aindaque a proteção conferida pela mesma não supere 65% dos soroti- pos isolados em nosso meio. Tradução e Comentários: DrEitanNBerezin BrandileoneMC,deAndradeAL,DiFabioJL,GuerraML, Aus- trianR.Appropriatenessofapneumococcalconjugatevaccine inBrazil:potentialimpactofageandclinicaldiagnosis,withem- phasisonmeningitis. JInfectDis2003;187:1206-12. BerezinEN,CarvalhoLH,LopesCR,SanajottaAT,Brandileone MC, Menegatti S et al. Meningite pneumocócica na infância: característicasclinicas,sorotiposmaisprevalenteseprognós- tico. J Pediatr (Rio J) 2002; 78:19-23. Dagan R, Melamed R, Muallem M, Piglansky L, Greenberg D, AbramsonOetal.Reductionofnasopharyngealcarriageofpneu- mococciduringthesecondyearoflifebyaheptavalentconjugate pneumococcalvaccine.JInfectDis1996;174:1271-8. Referências Bibliográficas
  • 5. Ano 9 - Out/Nov/Dezembro/2003 7 1.INTRODUÇÃO ApráticadaCardiologiaPediátricaestáintimamenteligada à cirurgia cardíaca, especialmente a partir dos anos 70, quan- donovastécnicasdecirculaçãoextra-corpóreaeparadacircu- latóriacomhipotermiaprofundapermitiramacorreçãodecar- diopatias ainda mais complexas. Osdefeitoscardíacoscongênitostêmsidotradicionalmentede- finidoscomoalteraçõeshemodinâmicasdecorrentesdeanormali- dadesanatômicas.Aintervençãocirúrgicaofereceuoqueseimagi- noutratardasoluçãotantoparaasobrecargahemodinâmica,quan- toparaodéficitdeoxigenação.Apossibilidadedacorreçãoanatô- micaoufisiológicareforçouomodelohemodinâmicocomoúnica opçãoterapêutica.Algunstermoscomopré-carga,pós-cargaeino- tropismofizerameaindafazempartedovocabuláriodiário.Noen- tanto,aspectosrelacionadosaoremodelamentomiocárdicoecardi- orreparação foram desconsiderados, pois a insuficiência cardíaca eravistacomoumaalteraçãodecurtaevolução. Noentanto,comoaumentodamorbidadeedamortalidadeno pósoperatóriotardio,notou-sequeemalgunscasos,acirurgiaofere- ciaapenasacorreçãopaliativa.Osprocedimentoscirúrgicosidealiza- dosparacorreçãodedefeitosanatômicospodemlevaràinsuficiência cardíaca por complicações precoces e tardias. As arritmias podem piorarafunçãocardíacadepacientessubmetidosamúltiplasinterven- çõescirúrgicas. Estaéumacomplicaçãotardiaindesejávelemprocedimentos cirúrgicoscomoporexemplonaoperaçãodeSenningouMustard, realizadaparaatransposiçãodasgrandesartérias,ounacorreção totaldaTetralogiadeFallotouaindanacirurgiadeFontanparacora- çõesuniventriculares.Adilataçãodoventrículodireitocomdisfun- ção sistólica e diastólica é uma complicação tardia comum nos casosdemúltiplasintervençõesparareconstruçãodaviadesaída doventrículodireito.Aagressãoventricularestárelacionadaàexpo- siçãodoventrículoaumaduplasobrecargaporobstruçãoeregur- gitaçãoeoconseqüentedesenvolvimentodehipertrofiaefibrose.A necessidadedeváriascirurgiasexpõeomiocárdioàlesãorepetida deisquemiaereperfusão.Acredita-sequeoisolamentodoretorno venosohepáticodacirculaçãopulmonarnoscasosdacirurgiade Glennbidirecionalpredispõeaodesenvolvimentodefístulaartério- venosapulmonar.Estascomunicaçõesanormaiscontribuempara umasobrecargadevolumeedilataçãodoventrículoúnico. Manejo da insuficiência cardíaca na criança Comoaumentoprogressivodonúmerodepacientespediátri- coscominsuficiênciacardíacacrônica,ficaclaroqueocontrolehe- modinâmico e anatômico como única forma de abordagem tera- pêuticanãoésuficientepararealidadeatual.Ainsuficiênciacardíaca resulta,assim,dainteraçãodefatoreshemodinâmicos,neurohumo- raisecelulares.Asíndromedainsuficiênciacardíacacrônica,éuma condiçãodedisfunçãocardíacaedosistemacirculatório,caracteri- zadapordeterioraçãosilenciosaeprogressivasecundáriaàstentati- vaspersistentesdoorganismoemrestabeleceroequilíbrio. Aprogressãodadoençaéresultadodiretodaaçãodospróprios mecanismosresponsáveispelarecuperaçãodahomeostase.Asín- dromedainsuficiênciacardíacaagudasedesenvolveemdecorrên- cia de uma lesão miocárdica ou de uma mudança na sobrecarga cardíaca, causando um desequilíbrio entre os mecanismos com- pensatórioseafunçãomiocárdica,levandoaumsúbitodesbalanço homeostáticoeconseqüentesurgimentodossintomas.Éimportan- teobservarqueessasdefiniçõessurgemdeconceitosmaistradici- onais,baseadosnaleideofertaedemandametabólica.Atualmen- te,ograndedesafionotratamentodainsuficiênciacardíacatemsido amelhoradascondiçõeshemodinâmicaseclínicasconjuntamente comapreservaçãoeremodelamento domiocárdio. Apresentaremos a seguir os princípios gerais farmacológicos e fisiológicos necessários para o atendimento do paciente pediátrico cominsuficiênciacardíaca(IC)compensadaoudescompensada. 2.FISIOPATOLOGIAEMANIFESTAÇÕESCLÍNICAS Ainsuficiênciacardíacanapopulaçãopediátricapodeserdivi- didaemtrêsperíodosclínicos: 1)perinatal 2)lactentejovem 3)infânciaeadolescência Enquantoochoquecardiogênicoéumaapresentaçãoclínica freqüentenoperíodoperinatal,criançaseadolescentesapresen- tamsintomasrelacionadosàdeterioraçãocrônicadafunçãocardí- aca como resultado de lesões anatômicas não corrigidas ou de cirurgiapaliativaprévia. 2.1- O período perinatal. Ainsuficiênciacardíacanoperíodoperinataléconsideradauma DEPARTAMENTO DE CARDIOLOGIA DOCUMENTO CIENTÍFICO Dr. Jorge Yussef Afiune*
  • 6. Ano 9 - Out/Nov/Dezembro/20038 manifestaçãoclínicapoucocomum,enquantoqueochoquecardio- gênicopordisfunçãomiocárdicaprimáriaousecundáriaéumaapre- sentaçãofreqüente.Estadistinçãoéimportanteporqueotratamento dasduascondiçõesédiferente.Nochoquecardiogênico,aestabiliza- çãocirculatóriaéaprioridade,enquantonaIC,otratamentodeveser direcionadoporobjetivoseresultadosalongoprazo.Orecémnascido emchoquepodemelhorarclinicamenteeevoluirparaumquadrode IC compensada. Por outro lado, a falha da terapêutica clínica ou da evolução para IC compensada são indicativas da necessidade de intervençãocirúrgicaoudecateterismointervencionista.Comoexem- plo, pode-se citar a estenose valvar aórtica crítica, ou a estenose da valvapulmonar,síndromedahipoplasiadecoraçãoesquerdoouain- daadrenagemanômalatotaldeveiaspulmonaresobstrutiva. 2.2- Lactentes jovens. Pacientes que apresentam lesões com grande shunt da es- querdaparaadireita,comoporexemplo,ascardiopatiastipoCIV, desenvolvemICagudaoudescompensadaapósadiminuiçãoda resistênciavascularpulmonareconseqüentehiperfluxopulmonar. Odébitocardíacosistêmicoficacomprometido,determinandoa ativaçãodosistemanervososimpáticoedosistemarenina-angio- tensina-aldosterona(RAA),iniciandoassimaretençãodesódioe água,econsequentementeossinaisesintomasclínicosdeIC. Iniciando-seotratamento,ocorreoremodelamentocompen- satórioeapós-cargamiocárdicasenormaliza,sendoconsiderado omarcodetransiçãoparaumafasecrônicaoudeICcompensa- da.Noentanto,emalgunscasos,ocustometabólicoétãoaltoa pontodeafetarocrescimentoadequado.Estebaixoganhopônde- ro-estatural é considerado como falha no tratamento clínico e é indicativo da necessidade de intervenção cirúrgica precoce em algumas situações. É importante salientar que a necessidade de se manter o canal arterialpérvioparaumshuntdireita-esquerda,ouparaumacirculação em paralelo (Transposição das grandes artérias), ou por uma lesão obstrutiva(Atresiapulmonar),transformaasituaçãoemfisiologiade shuntesquerda-direita. Demonstra-se,portanto,queohiperfluxopul- monareainsuficiênciacardíacatambémpodemocorrernaslesões “cianogênicas”. Algunspacientesqueevoluemcomchoquenoperíodoperina- talpodemapresentarmelhorasignificativadossintomas,permitin- doaretiradadosuporteparenteral.Estegrupodepacientesatinge a homeostase com um nível de ativação do sistema RAA inicial- mente mais alto. Com o início do remodelamento e desenvolvi- mentodahipertrofia,ostressmiocárdicodiminui.Acriançapassa de um estado de choque cardiogênico para a descompensação aguda,efinalmenteatingeacompensaçãocrônica. Duranteapassagemporestestrêsestágiosclínicos,oobje- tivo terapêutico deve mudar. Na fase inicial, a preservação do fluxosangüíneoadequadoéoobjetivoprincipaleamanutenção dodébitocardíacoapropriadocomdrogasinotrópicaspotentes sefaznecessário. Duranteafasederesolução,osobjetivosalongoprazodevem serpriorizados: 1)sintomasdopaciente; 2)remodelamentomiocárdico; 3) ativação do sistema RAA; 4)mudançasnamicroestruturacelular; 5)necessidadedeintervençãocirúrgicafutura. 2.3- Infância e adolescência Nesta fase, além das causas gerais de IC durante a infância e adolescência, deve-se acrescentar a morbidade pós operatória. A insuficiênciacardíacapréoperatóriapode resultarda: 1)evoluçãonaturaldedefeitoscongênitosnãocorrigidoscirurgi- camente(porexemplocomunicaçãointerventricular,defeitodosep- toatrioventricular,estenoseaórtica,estenosepulmonar) 2)doençassistêmicascomohipertensãopulmonarouhiperten- sãoarterialsistêmica,doençasdocolágeno,cardiomiopatiasidio- páticasousecundárias 3)arritmias No paciente em pós operatório, observa-se que a IC, em algu- massituações,éconseqüênciaoucomplicaçãodaprópriatentativa de solucionar o problema. A dilatação e a hipertrofia de ventrículo direito são complicações freqüentes das cirurgias realizadas para aliviaraobstruçãodaviadesaídadoventrículodireito(porexemplo Tetralogia de Fallot ou estenose pulmonar valvar crítica) ou para re- construçãodaviadesaída(atresiapulmonar,troncoarterialcomum). Estima-se que 4-15% dos pacientes com Tetralogia de Fallot necessitemdereoperação.Ainsuficiênciapulmonarresidualseve- raapóscorreçãototaldeTetralogiadeFallottemsidorelacionadaa arritmiaseàintolerânciaaoexercício. Ospacientescomsíndromedehipoplasia docoraçãoesquer- do e fisiologia de ventrículo único têm uma sobrevida em cinco anos de 81% após o terceiro estágio cirúrgico. No entanto, a pro- gressãodadisfunçãomiocárdicacontinuaaserumproblemanes- te grupo de pacientes. As anormalidades da valva mitral e defeito doseptoatrioventricularpodemresultareminsuficiênciaouesteno- se mitral residual e uma necessidade de re-intervenção cirúrgica posterior. Essessãoalgunsexemplosquesalientamacronicidadequefre- qüentementeseassociaàcorreçãocirúrgicadosdefeitoscongênitos. Em alguns casos, existe um substrato anatômico já presente aonascimento,noentanto,suasmanifestaçõesclínicassóapare- cemduranteoacompanhamentoevolutivo(ventrículodireitoarrit- mogênico,WolfParkinsonWhite,síndromedoQTlongo).Pacientes queapresentaramdoençadeKawasakioufebrereumáticapodem evoluircomcomplicaçõestardiasoudescompensaçõespelalesão cardíacaprévia(aneurismaouestenosedecoronárias,estenoseou regurgitaçãovalvar). 3.MANEJO DA IC OmanejoatualdaICnãoincluiapenasanormalizaçãododébito cardíacoemelhoradossintomas.Outrosaspectosfisiopatológicos, comoaestimulaçãoneuroendócrina,oremodelamentodosmiócitos
  • 7. Ano 9 - Out/Nov/Dezembro/2003 9 eainteraçãotecidoconectivo/miócitotambémdevemserconside- radosnoplanejamentodotratamentodaICcompensada. Anormalizaçãodoestadohemodinâmicopermanececomo principal objetivo do tratamento da fase aguda de descompen- saçãodaIC.Entretanto,estaestratégiaalongoprazopodedeter- minar um aumento nas taxas de morbidade e mortalidade. As terapêuticasquevisamamelhorahemodinâmica,incluemouso dedrogasqueutilizamosreceptoresbetaadrenérgicosouindire- tamenteativamosmecanismoscompensatóriosneuroendócri- noseautócrino-parácrinos.Essasformasdetratamento,apesar deeficazesemmelhorarossintomase aperformancemiocárdi- capodem,alongoprazo,comprometeromiocárdiopeloefeito tóxicodireto,responsávelpelanecroseeapoptosealémde“do- wnregulation”(feed-backnegativo)dosreceptoresbetaadrenér- gicos,remodelamentomiocárdico,crescimentointersticialede- pleçãodeenergia. Evidênciasdemonstraramqueotratamentodeanormalidades neuroendócrinas tem efeito benéfico na história natural da IC. Os inibidores da enzima conversora de angiotensina (ECA) e os beta bloqueadoresretardamouatérevertemoprocessoderemodela- mento.Alémdisso,apesardeparecerparadoxal,osbetabloquea- dorespodemmelhorardemaneirasignificativaafunçãocardíacaa longoprazo.ApesardosinibidoresdaECAseremresponsáveispor diminuiçãosignificativadamorbidadeedamortalidade,seusuces- soaindanãoestácompleto.Recentementetemsidosupostoque o “escape” da aldosterona no tratamento com inibidor da ECA seja responsávelporseusucessoparcial.EmpacientescomIC,aaldos- terona é responsável pela retenção de sódio, pela resistência ao diurético, pela produção de colágeno e progressão da disfunção diastólica.Oestudodenominado“RandomizedAldactoneEvaluati- onStudy(RALESPilotstudy)” tempesquisadoessesaspectosem adultos através da associação da espironolactona (antagonista do receptordaaldosterona)aotratamentoconvencionaldaIC. 3.1- IC descompensada (aguda): A vasoconstrição periférica e a retenção de sódio e água na insuficiência cardíaca, marcam a mudança nas prioridades circu- latórias e o início da descompensação. As tentativas do sistema nervosoautônomoedosistemaRAAemnormalizarodébitocar- díaco, determinam um aumento na pré e pós carga ventricular. Essasalteraçõessãoresponsáveispeloaparecimentodaconges- tão venosa sistêmica e pulmonar e dos sintomas. Uma série de mecanismoscompensatóriosresponsáveispeloremodelamento ehipertrofiamiocárdicossãoativadossimultaneamente. Eventualmente,umnovoestadodehomeostaseéatingidocom novascondiçõeshemodinâmicas,normalizandoostressmiocárdi- co.Opacienteinicia,então,afasedeICcompensadaoucrônica. Os objetivos do tratamento da IC aguda descompensada incluem a normalização das condições hemodinâmicas e a melhora dos sintomas através de ações na pré carga, pós carga, relaxamento e contratilidade miocárdica. As principais drogasutilizadasincluemosdiuréticos,inotrópicos,inodilata- doresevasodilatadores. 3.2- IC compensada (crônica): Apesar dos avanços cirúrgicos, da indicação precoce e da melhoradaproteçãomiocárdica,amorbidadeemortalidadeper- manecemaltasparaalgumaslesõescardíacascongênitas.Aex- periênciainicialdaMayoCliniccomacirurgiadeFontanmostrava que 16,5% dos pacientes apresentavam os mesmos sintomas pré-operatóriose35,8%foramaóbitoouevoluíramcompiorados sintomas.Apesardamortalidadeterdiminuídonosúltimosanos, a morbidade permanece sendo um grande problema nessa po- pulação. Pacientes com atresia pulmonar ou estenose pulmonar crítica ao nascimento, que serão submetidos a múltiplas trocas valvares durante o acompanhamento, podem apresentar disfun- çãoventricularmanifestadaatravésdeintolerânciaaoexercícioou arritmias ventriculares. O remodelamento do ventrículo direito é conseqüênciadeperíodosprolongadosdeobstruçãoe/ouregurgi- taçãodanovavalvapulmonar. Oremodelamentodoventrículodireitotambémocorrenasci- rurgiasdetrocaatrial(OperaçãodeSenning/Mustard).Asarritmias atriais aumentam de forma significativa a morbidade tardia. Ape- sarda“correção”hemodinâmicanessespacientes,aprogressão dadoençapersiste. Sabe-sequeemalgunscasos,aintervençãocirúrgicaéapenaspali- ativa,sendo,portanto,inevitávelaprogressãolenta,porémcompensada dadoença. OpacienteemICcompensadanãosofreapenasdaaltera- çãohemodinâmica.Aexperiênciadospacientesadultosdemonstrou queofatodenãointervirnaprevençãodoremodelamentomiocárdico acarretaemumaumentosignificativodamorbidadeedamortalidade. OmanejodaICcrônicaemcriançasnecessitadeumaaborda- gemplanejadaeintegrada. Otratamentodeveserindividualizado, baseadonaidadedacriança,nodiagnósticocardiológicoespecí- ficoenaslesõesassociadas.Otratamentoatualdeveserdirecio- nado para a recuperação do equilíbrio neurohumoral autócrino e parácrino,responsáveispelaprogressãoinexoráveldadoença.Os agentesutilizadosparaessepropósitosão:osinibidoresdaECA, osbetabloqueadores,aDigoxina,osbloqueadoresdereceptores daangiotensinaeosantagonistasdaaldosterona. 4-FARMACOLOGIA DA IC 4.1 Diuréticos Os diuréticos são a droga de escolha para o tratamento da IC descompensada ou aguda. São responsáveis pela melhora dos sintomasedascondiçõeshemodinâmicasdospacientescomcon- gestãopulmonaresistêmica,peloaumentodarespostadavascu- laturaperiféricaaosinotrópicos,vasodilatadoreseinibidoresdaECA. Através da diminuição da pré-carga, há uma diminuição do stressdaparedeventricularquefuncionacomoumpotenteestí- muloparaoremodelamentomiocárdico.Noentanto,têmpouco
  • 8. Ano 9 - Out/Nov/Dezembro/200310 efeito nos pacientes que não apresentam sintomas de conges- tão. Na realidade, pela sua contribuição à ativação do sistema neurohumoral,seuusoestárelativamentecontraindicadonessas circunstâncias.OdiuréticoidealparaotratamentodaICnãodeve- riaterefeitonosistemaRAA.Osinibidoresneutrosdaendopepti- daseestãosendoestudadosatualmentepoisapresentamefeito diuréticoedeproteçãomiocárdica.Pacientestratadoscomessas drogas,demonstraramdiminuiçãodaconcentraçãodaaldostero- naedosníveisdepressãodeenchimentoventricular.Infelizmen- te, a tolerância à droga surge precocemente e a presença de substâncias vasoconstritoras circulantes sugere a presença de mecanismoscompensatóriosneurohumorais. 4.2 Inotrópicos e inodilatadores Aregulaçãodocálciointracelulartempapelcrucialnacontratili- dadecardíaca.Apósadespolarizaçãocelular,ocálcioficadisponí- velatravésdoscanaisdecálcioedaliberaçãodoretículosarcoplas- mático. Osíonscálcioseligamàtroponina,facilitandoainteração entreactinaemiosinaeconseqüentegeraçãodeforçaecontração. Duranteorelaxamento,ocálciodeveretornaraoretículosarcoplas- máticoousairdacélula.Algunsdossítioscelularesexploradospara regulaçãodocálciointracelularsão: 1) via do AMP cíclico (AMPc); 2)trocadesódioecálcio; 3)sensibilizaçãodasproteínascontráteispelocálcio; 4) ativação dos canais de sódio. VistoqueafosforilaçãodeproteínasviaAMPcéodenomina- dor comum de várias drogas, os inotrópicospodemserclassi- ficadosemdependentesdoAMPcenãodependentesdeAMPc. OsagentesdependentesdoAMPc podemagiratravésdaestimu- laçãodereceptoresbeta(Dobutamina,epinefrina,norepinefrina)ou atravésdainibiçãodaenzimafosfodiesterase(Amrinone,Milrinone). Estas drogas dependentes do AMPc reduzem o stress de parede através do aumento da contratilidade e da vasodilatação periférica. As drogas que atuam nos receptores beta têm um papelbemdefinidonotratamentodochoquecardiogênicoeda IC descompensada. Osinibidoresdafosfodiesterase(amrinoneemilrinone)sãoinodila- tadores que atuam na fosfodiesterase III, enzima responsável pela inativaçãodoAMPcíclico.OAmrinoneeoMilrinonesãoasdrogas atualmenteaprovadasparaaplicaçãoclínicanosEstadosUnidos.Os inibidoresdafosfodiesterasesãoprimariamentevasodilatadoresque atuam na musculatura lisa vascular aumentando os níveis de GMP cíclicointracelular.Oefeitopositivonacontratilidaderesultadamelhora dascondiçõesdepóscargaedacinéticadocálciointramiocitário.Foi demonstradoqueessasdrogaspossuemumefeitoinotrópico mais potentecomumcustoenergéticomuitomenor.Osprincipaisefeitos colateraissãohipotensãoarterialsistêmica,arritmiasetrombocitopenia (especialmentecomoamrinone).Temsidodemonstradoaindaquea administraçãodestasdrogasemrecémnascidosésegura. A estimulação prolongada de receptores adrenérgicos tem umefeitodeletériopotencialdeaumentaroconsumodeoxigênio, oremodelamentomiocárdico eanecrosecelular.Oaumentodo cálciointracelularétambémresponsávelporumaumentodaarrit- mogênese. Estudos conduzidos em adultos comprovam que o usoprolongadodessasdrogas,aumentaamorbidadeeamorta- lidadealongoprazo.Essesdadospoderiamserfacilmenteextra- polados para população pediátrica que apresentam IC compen- sada de longa duração, como por exemplo, os pacientes com fisiologiauniventricular(ventrículoúnico). As drogas independentes do AMP cíclico atuam através do aumento do sódio intracelular (promovendo a troca com cálcio através dos canais de sódio/cálcio, como p.ex: Digoxi- na), através da ativação dos canais de sódio (vesnarinone) ou aindadoaumentodasensibilidadedomiofilamentoaocálcio (pimobendan). Pode ser questionado se essas drogas apre- sentam algum papel no tratamento do choque cardiogênico ou IC descompensada pela sua meia vida longa. Vale lem- brar,entretanto,quepacientescomimportante“downregula- tion” ou não acoplamento dos receptores beta, a resposta às catecolaminas pode estar diminuída. Além disso, as drogas independentes do AMP cíclico podem aumentar o inotropis- mocombaixocustoenergético. A Digoxina é a droga mais antiga e talvez a mais utilizada no tratamentodaIC.Suasdesvantagensincluemamargemterapêutica estreita,oriscodearritmiasporintoxicaçãoeopequenoefeitoinotrópi- co.Essadrogareconquistouespaçonapopulaçãoadultapelassuas característicasinibitóriasneurohumoraiseseuefeitopositivonataxa de morbidade e de mortalidade. Nos casos agudos, a capacidade da Digoxina em restaurar a função cardíaca pode ter um impacto positivo na função diastólica e servir como um agente de transição paraasdrogasinotrópicasmaispotentes.OVesnarinoneéuminotró- picoquecausaativaçãodoscanaisdesódio,bloqueiodoscanaisde cálcio,aumentonacorrentedecálcioediscretainibiçãodafosfodies- terase. Nosadultos,avesnarinonereduziuamortalidadeembaixas doses (60mg) mas teve efeito reverso em altas doses (120mg). O Pimobendan é um sensibilizador de cálcio que também apresenta propriedades de inibição da fosfodiesterase. Uma das preocupa- ções quanto a esse grupo de drogas é quanto a possibilidade de causaranormalidadesderelaxamentopelaafinidadedatroponinaC pelo cálcio. Em estudos na população adulta, essa droga demons- trou um perfil hemodinâmico favorável e melhorou a qualidade de vida.Ossensibilizadoresdecálcioapresentamumaumentodaafini- dadepelocálciocomdosesmenoreseinibiçãodafosfodiesterase comdoseselevadas.Essaclassededrogasnãofoiaindaadequada- menteestudadaemcrianças. 4.3 Vasodilatadores Osvasodilatadoresconstituemumgrupodedrogasheterogê- neocomdiferentesmecanismoselocaisdeação.Oresultadofinal comuméorelaxamentovasculare,portanto,reduçãodapóscarga, pré carga e da pressão arterial. A terapêutica vasodilatadora tem sidoutilizadatantoemcriançascomoemadultosparaaumentaro débito cardíaco. No entanto, os vasodilatadores podem ser dividi- dosnosqueproduzemativaçãoneurohormonaleremodelamento miocárdico(hidralazina,prazosin,nitroglicerina,nitroprussiatoeini-
  • 9. Ano 9 - Out/Nov/Dezembro/2003 11 bidoresdafosfodiesterase)eosqueproduzemefeitosbloqueado- res da resposta do sistema nervoso simpático e sistema RAA (inibidores da ECA e beta bloqueadores). Os vasodilatadores são usados de rotina no manejo da IC na faixa etária pediátrica. Eles atuam nos vasos de resistência ou de capacitância. Tem indicação clara nas lesões regurgitantes sistê- micas (insuficiência aórtica ou mitral), nas quais comprovou-se a melhora do débito cardíaco pela redução da fração regurgitante. Nopósoperatórioimediatodecirurgiacardíaca,ocontrolerigoroso dapressãoarterialeamanipulaçãodaprécargaepóscargasão necessáriosparamaximizarodébitocardíaco. O nitroprussiato e a nitroglicerina foram utilizados para essa função,porém,oMilrinoneeoAmrinonetornaram-seasdrogasde escolha pela sua propriedade inotrópica adicional. Quando é ne- cessário um controle mais fino e rápido da pressão arterial, as drogasdemeiavidamaiscurta,comoonitroprussiato,permane- cemcomoprimeiraopção. Os inibidores da ECA e os beta bloqueadores de terceira geração são os agentes de escolha quando a redução a longo prazo da pós carga e o controle da pressão arterial são neces- sários,peloseubenefícioadicionaldemodulaçãoneurohumo- ralederemodelamentomiocárdico. Paraotratamentoprolongado,outrosvasodilatadoressãoindi- cadosnapresençadeangioedemainduzidopeloinibidordaECA ou quando há diminuição severa da função cardíaca, contraindi- candoousodebetabloqueador. 4.4 Moduladores Neurohumorais 4.4.1 Digoxina Napopulaçãoadulta,otratamentoprolongadocomDigoxina acarreta uma melhora dos sintomas, aumenta a tolerância ao exercícioediminuioriscodepioraclínica.Temsidodemonstrado queaDigoxinaproduzefeitosneurohumoraisfavoráveis,indepen- dentedasmudançashemodinâmicas.Essesefeitossãoobserva- dos antes do aparecimento do efeito inotrópico. Os glicosídeos cardíacosaumentamarespostadosbaroreceptoresparassimpá- ticos cardíacos e arteriais o que, por outro lado, diminui a ação simpática central. Os efeitos neurohumorais da Digoxina não fo- ram estudados em crianças, porém, seus efeitos benéficos no tratamentodaICporhiperfluxopulmonar(CIV,PCA,etc)emlacten- tes com contratilidade miocárdica normal sugere que a modula- çãoneurohumoralpossaocorrertambémnapopulaçãopediátrica. 4.4.2 Inibidores da ECA Todososvasodilatadoressãocapazesdereduziraimpedânciae, portanto, a pós-carga. No entanto, somente os inibidores da ECA demonstraramreduçãodamortalidadeapósousoprolongadoem adultos.Seusefeitossãoproduzidosporpelomenos3mecanismos: 1)inibiçãodaenzimaconversoradeangiotensina(transforma angiotensinaIemangiotensinaII); 2)inibiçãodadegradação dabradicininaquepromoveorela- xamentovascularereduçãodapós-carga; 3)inibiçãodaliberaçãodenorepinefrinapelasterminaçõesner- vosas simpáticas. Napopulaçãoadulta,osinibidoresdaECAdeterminammelhora clínica,aumentodasobrevidaereduçãodamortalidade.Postula-seque estesefeitosbenéficossejamumaconseqüênciadosefeitossalutares nomiocárdioedainibiçãodosmecanismoscompensatórios. Os inibidores da ECA não só previnem o surgimento, mas podemreverterafibrosemiocárdicapormaladaptação.Oefeito noprocessoderemodelamentomiocárdicotornaessencialouso deinibidordaECAnotratamentodaIC. Existemdiversosestudosnapopulaçãoadulta,porémemcri- anças,nãohárelatosdeprojetoscontrolados,prospectivoseran- domizados. No entanto, os relatos de crianças com cardiopatia congênita tipo shunt esquerda/direita ou cardiomiopatia dilatada submetidas ao tratamento com inibidor da ECA, demonstraram umarespostaclínicaehemodinâmicafavorável. 4.4.3 Betabloqueadores ComaexpansãodosconhecimentossobreIC,novasformasde tratamentosurgiram,àsvezescontroversasedesafiadoras.Astenta- tivasdemodularasrespostasneurohumoraislevaramàincorporação dosbetabloqueadoresnotratamentodaICcomresultadosfavoráveis. Os betabloqueadores melhoram a contratilidade miocárdica atravésdemudançasbiológicasnomiócito,aumentama fração deejeçãoereduzemovolumeventricular.Osefeitosdosbetablo- queadoresnoremodelamentomiocárdicodevemestarrelaciona- dosàinibiçãodosistemaRAA,inibiçãodaliberaçãodeendotelina ereduçãodostressdaparedeventricular. Aatividadeaumentadadosistemanervosoautônomoemcrian- ças com IC foi recentemente comprovada e o seu uso terapêutico demonstroumelhoraclínicaedafunçãoventricularcomsupressão dos níveis de RAA e norepinefrina. A melhora da função ventricular ocorrelentamente,muitasvezesdemorameses.Podecausarinicial- menteumapioradossintomaspeloefeitoinotrópiconegativo.Esse efeitoémaiscomumcomosbetabloqueadoresdeprimeiraesegun- dageração(Propranolol,Metoprolol).Osdeterceirageração,Bucindo- loleCarvedilol,tempropriedadesvasodilatadorasquepodemsuperar essaslimitaçõespeloseuperfilhemodinâmicomaisfavorável. 4.4.4 Antagonistas do receptor da angiotensina Foram identificadas duas classes principais de receptores da angiotensinaII,chamadasdeAT1eAT2.Amaioriadosefeitosda angiotensinaIIémediadopelosreceptoresAT1.Essesreceptores atuamnadiferenciaçãoecrescimentocelular,tônusvascularelibe- raçãodavasopressinaarginina. Emumestudoconduzidonapopulaçãoadulta,foidemonstra- doqueoLosartan,umantagonistadereceptorAT1,ésuperiorao
  • 10. Ano 9 - Out/Nov/Dezembro/200312 CaptoprilnotratamentodaIC.OLosartanapresentoumelhorefeito em todas as causas de mortalidade, com menos efeitos colate- raisemelhoradesãoaotratamento.Noentanto,nãohouvediferen- ça nas internações ou óbito por IC entre os dois grupos. Não há relatosdeestudosdessasmedicaçõesnapopulaçãoinfantil.Os bloqueadoresdereceptoresdaangiotensinaconstituemumaboa alternativa aos inibidores da ECA quando há efeitos colaterais in- desejadoscomotosseeangioedema. 4.4.5. Antagonistas da aldosterona OtecidoconectivocardíacorespondeàangiotensinaIIcircu- lante e à aldosterona. A ação da aldosterona é específica nos fibroblastos,semafetaromiocárdio.Oaumentodocolágenoas- sociado com a estimulação da aldosterona, determina uma au- mentonasfibrasde colágenotipoI. OaumentodocolágenotipoIcausaumadiminuiçãodacompla- cênciaventriculareconseqüentedisfunçãodiastólica.Existemdados quesugeremqueaaldosteronapodeatrapalharotratamentocomos inibidoresdaECA.Esseefeitoéresponsávelpelaretençãodesódioe resistênciaaotratamentodiurético,perdadepotássioemagnésio,pro- duçãodecolágenomiocárdico,progressãodadisfunçãomiocárdicae liberaçãodenorepinefrina.Asconseqüênciasdobloqueiodosefeitos daaldosteronanaICestãosendoestudadas.O“RandomizedAldacto- ne Evaluation Study” (estudo RALES Pilot) está pesquisando esses aspectosatravésdoestudodosefeitosdaassociaçãodoAldactoneà terapiaconvencionaldaICnoadulto. 4.5 NUTRIÇÃO UmdosaspectosmaisimportantesnomanejodaICemcrian- çastalvezsejaanutrição.Nospacientesqueaguardamcirurgiapalia- tivaoucorretivaequenãoapresentamganhoponderaladequado,a falhadotratamentoclínicodeveserconsideradaeconstituiumadas indicaçõesdecirurgiaprecoce. Obaixoganhoponderaléumdossintomasprincipaisentreos lactentescomICcrônica.Resultadademandaenergéticaaumenta- daedoaportecalóricoinadequado.Estascriançastêmumaneces- sidadecalóricamédiadeaproximadamente150Kcal/Kgpordiapara atingirumganhodepesoadequado.Pelanecessidadederestrição hídricaeusodediuréticos,adensidadecalóricadafórmulalácteaou leitematernomuitasvezestemqueseraumentadaematé30Kcal/oz ouatémaisemalgunscasos.Aoaumentaroconteúdocalóricodo leite,pode-seaumentaroquocienterespiratório,desdequetodasas caloriassejamadicionadasnaformadepolímerodeglicose. Esseaspectodeveserconsideradocuidadosamentepoises- ses pacientes desenvolvem com facilidade alcalose metabólica hipoclorêmica pelo uso de diurético e o efeito combinado pode levaràventilaçãoinadequadaouperdadecaloriaspelousoexces- sivodamusculaturarespiratória. COMENTÁRIOS FINAIS Comoaprofundamentodoconhecimentosobreafisiopatolo- gia da IC, surgem novas formas de tratamento. Os objetivos do tratamento não incluem, atualmente, apenas a estabilização hemodinâmicaemelhoradossintomas.Narealidade,oenfo- quedaintervençãofarmacológicatemsidonasalteraçõesmais sutis. Foram discutidas algumas das novas drogas utilizadas notratamentodaIC,comoosbeta-bloqueadores,bloqueado- resdaangiotensinaedaaldosteronaesensoresdecálcio.Foi comentado também sobre o maior conhecimento sobre dro- gas antigas e tradicionais como a Digoxina. Entre as novas drogasetratamentosemestudo,inclui-seosmoduladoresda respostaàcitocinina,oantagonistadoreceptordaendotelina, os bloqueadores de canal de cálcio tipo T, a combinação dos inibidores da ECA com bloqueadores de receptor da angio- tensina, o antagonista da renina e os moduladores neuro-hu- morais. A maioria dessas drogas está sendo submetida a testesemadultosesabe-semuitopoucosobresuaaplicação em crianças. Além disso, estudos em andamento tentam de- monstrarseousodebeta-bloqueadoréapropriadoparapaci- entes com IC avançada. A maioria desses estudos usa a re- dução da mortalidade como resultado principal. No entanto, seria mesmo um objetivo válido em crianças? Durante a se- gunda metade desse século, experimentou-se um desenvol- vimentoexplosivodetécnicasdecirurgiacardiovascularinfan- til. Atualmente todas as cardiopatias congênitas podem ser tratadascomcirurgiaspaliativasoudefinitivas.Nestesentido, a história natural da Cardiologia Pediátrica e da IC na faixa etáriapediátricamudoudrasticamente.Adiminuiçãodamor- talidadenãodeveserconsideradacomoúnicoobjetivoprinci- pal nesse novo grupo de pacientes. Na realidade, a qualidade devidadeveriaserconsideradaemprimeirolugarassimcomo omanejotardiodospacientespediátricoscomIC.Seriamuito importanteconduzirestudosmulticêntricossimilares,emlar- ga escala, que enfoquem especialmente a população pediá- trica. Estudos comparativos das diferentes formas de trata- mento(farmacológicoecirúrgico)sãoimprescindíveis. *DoutoremMedicinapelaFaculdadedeMedicinadaUniversi- dadedeSãoPaulo-FMUSP MédicoAssistentedaUnidadedeTerapiaIntensivaCardiológica PediátricaedoSetordeEcocardiografiaPediátricadoInstitutodoCora- çãodaFaculdadedeMedicinadaUniversidadedeSãoPaulo-FMUSP AuslenderM,ArtmanM.Overviewofthe managementofpediatric heartfailure.ProgPediatrCardiol 2000;11:231-41 AuslenderM.Pathophysiologyofpediatricheartfailure.ProgPedia- trCardiol 2000;11:175-84 Gheorghiade M, Benatar D,Konstam MA, Stoukides CA, Bonow RO.Pharmacotherapyforsystolicdysfunction:areviewofrandomi- zedclinicaltrials.AmJ Cardiol1997;80:14H-27H O’ConnorCM,GattisWA,SwedbergK.Currentandnovelpharma- cologic approaches in advanced heart failure. Am Heart J 1998; 135:S249-63. Referências Bibliográficas
  • 11. Ano 9 - Out/Nov/Dezembro/2003 13 Devido ao crescente risco que envolve a atividade sexual desprotegida e ao numero cada vez maior de adolescentes iniciando precocemente a vida sexual, o pediatra precisa estar preparado para a abordagem desse tema durante o atendimento dos jovens. Constitui grande desafio a adequada orientação sexual, que implica em enfatizar a importância da sexualidade responsável, da afetividade e da participação da família e da escola nesse processo contínuo de educação. Para tanto, é necessário que o profissional tenha também conhecimento sobre os métodos contraceptivos, bem como sobre os aspectos éticos que envolvem a prescrição dos mesmos. O adolescente tem direita a educação sexual, ao acesso a informação sobre contracepção e a confidencialidade sobre sua atividade sexual e prescrição de métodos con- traceptivos. Ele tem, ainda, independentemente da ida- de, o direito à privacidade; ou seja, de ser atendido so- zinho, em espaço privado de consulta. Deve-se lembrar que a privacidade não esta obrigatoriamente relaciona- da à confidencialidade. O sigilo médico é um direito garantido e reconhecido pelo artigo 103 do Código de Ética Medica, segundo o qual “É vetado ao médico revelar segredo profissional referente a paciente menor de idade, inclusive a seus pais ou responsáveis legais, desde que o menor tenha capacidade de avaliar seu problema e de conduzir-se por seus próprios meios para solucioná-lo, salvo quando a não revelação possa acarretar danos ao paciente”. A consciência desse direito implica em reconhecer a autonomia e individualidade do adolescente, estimulando a responsabilidade com sua própria saúde. Entretanto,emdeterminadassituações,consideradasde exceção, como de déficit intelectual importante, distúrbios psiquiátricos, desejo do adolescente de não ser atendido sozinho, entre outros, a confidencialidade e a privacidade, que constituem o sigilo profissional, deverão ser rompidas. Nos casos em que haja referência explícita ou suspeita de abuso sexual, o profissional está obrigado a notificar ao Conselho Tutelar, de acordo com a Lei Federal 8069/90, ou a Vara da Infância e Juventude, como determina o Estatuto da Criança e Adolescente. Face à complexidade dessas situações, recomenda-se a discussão dos casos em equipe multidisciplinar, de forma a avaliar a conduta, bem como o momento mais adequado para notificação. É importante ressaltar que a garantia de confidencialidade e privacidade favorecem a abordagem de temas delicados como sexualidade, uso abusivo de drogas, violência, entre outras situações. Destacamos, ainda, a importância do ginecologista e pediatra, durante o atendimento dos jovens, não imporem seus valores morais e/ou religiosos. Ciente da relevância do papel do pediatra e ginecologista na proteção do adolescente, a Sociedade Brasileira de Pediatria e a Federação Brasileira das Sociedades de Ginecologia e Obstetrícia propõem as seguintes recomendações com relação à prescrição de métodos contraceptivos para adolescentes: •Deve ser respeitado o direito do adolescente de ser atendido sozinho, em um espaço privado de consulta. O direito à privacidade também deve ser garantido DOCUMENTO CIENTÍFICO DEPARTAMENTO DE ADOLESCÊNCIA Normas para prescrição de contracepção na adolescência. Coordenação*
  • 12. Ano 9 - Out/Nov/Dezembro/200314 durante o exame físico. • O pediatra e ginecologista devem aproveitar as oportunidades de contato com adolescentes e/ou suas famílias para promover a reflexão e a divulgação de informações sobre temas relacionados à sexualidade e à saúde reprodutiva, tais como: namoro, relação de gênero, atividade sexual, contracepção (incluindo contracepção de emergência), uso de condom, prevenção de DST/AIDS, entre outros. Estas orientações devem ser adequadas às necessidades e demandas de cada adolescente e às características de cada comunidade. • Quando o adolescente desejar a presença de um acompanhante, este direito deve ser respeitado. É importante que o ginecologista e o pediatra possam avaliar as situações em que a presença de um responsável se faça necessária, como nos déficits intelectuais importantes, distúrbios psiquiátricos e outros distúrbios que levem à perda da capacidade crítica. • O relato de violência requer a quebra de sigilo devido à obrigatoriedade de notificação aos Conselhos Tutelares, como determina o Estatuto da Criança e do Adolescente. Face à complexidade dessas situações, recomenda-se a discussão dos casos em equipe multidisciplinar, de forma a avaliar a conduta, bem como o momento mais adequado para a notificação. • O pediatra e o ginecologista podem disponibilizar preservativos para os adolescentes, desde que estes tenham consciência dos aspectos que envolvem a sua saúde e a sua vida. • O pediatra e o ginecologista devem orientar sobre todos os métodos anticoncepcionais, suas indicações, eficiência e prováveis efeitos colaterais. • O pediatra e o ginecologista podem prescrever anticoncepcional hormonal oral para adolescentes desde que tenham consciência dos aspectos que envolvem a sua saúde e a sua vida. • O pediatra e o ginecologista devem oferecer contracepção de emergência, com critérios e cuidados, por ser um recurso de exceção, às adolescentes expostas ao risco iminente de gravidez, nas seguintes situações: 1. Não estar usando qualquer método contraceptivo; 2. Falha do método contraceptivo utilizado (falha no uso do condom, esquecimento de tomar a pílula, etc.); 3. Abuso sexual. Observação: a) a contracepção de emergência não é considerada um método abortivo, conforme as evidências cientificas demonstram. b) deixar de oferecer a contracepção de emergência nas situações em que está indicada, pode ser considerada uma violação do direito do paciente, uma vez que este deve ser informado a respeito das precauções essenciais. O ato médico não implica em poder excepcional sobre a vida ou a saúde do paciente. O pediatra e ginecologista devem esclarecer que a contracepção de emergência não e um método contraceptivo regular, aproveitando a ocasião para orientar quanto às possibilidades de contracepção regular. A relação sexual em menores de catorze anos, para ser considerada violência presumida, depende da queixa (Código Penal, artigo 224 e 225), ou seja, se a adolescente não apresentar queixa de violência permanece o direito à privacidade, à orientação e à prescrição de contraceptivos. * Departamento Cientifico de Adolescência da SBP Federação Brasileira das Sociedades de Ginecologia e Obstetrícia - FEBRASGO ATENÇÃO As publicações da Revista Correios da SBPRevista Correios da SBPRevista Correios da SBPRevista Correios da SBPRevista Correios da SBP estão disponíveis no site: wwwwwwwwwwwwwww.sbp.com.br.sbp.com.br.sbp.com.br.sbp.com.br.sbp.com.br (Educação Médica Continuada).
  • 13. Ano 9 - Out/Nov/Dezembro/2003 15 INTRODUÇÃO A Agência Européia de Avaliação de Produtos Medici- nais (EMEA) liberou recentemente diretrizes para se con- duzir ensaios clínicos em crianças, onde afirma que “pa- cientes pediátricos devem receber medicamentos ade- quadamente avaliados para sua utilização”. Ainda que o desenvolvimento de drogas pediátricas exista há anos, uma grande quantidade de fármacos utilizados não fo- ram testados por pesquisa com delineamento moderno tanto para posologia e dose quanto para tolerância. Entre 25 e 55% das prescrições utilizadas em hospitais são de drogas não licenciadas ou cujo uso pediátrico não consta em bula, sendo a dose geralmente uma correlação linear (em mg/kg) da dose do adulto. Segundo definição da Organização Mundial da Saúde (OMS, 1972) uma Reação Adversa a Drogas (RAD)Reação Adversa a Drogas (RAD)Reação Adversa a Drogas (RAD)Reação Adversa a Drogas (RAD)Reação Adversa a Drogas (RAD) é uma resposta nociva e indesejável a uma droga, nas do- ses normalmente utilizadas no ser humano para profila- xia, diagnóstico ou tratamento de uma doença, ou ainda para modificação da função fisiológica. Reações adver- sas a drogas ocorrem em 2 a 71% dos pacientes, varian- do com a patologia clínica e os métodos utilizados. Hos- pitalizações por RADs podem variar de 0,2 a 22%. Desde a década passada, tem havido um interesse crescente no monitoramento de RADs como medida de segurança da qualidade do tratamento medicamentoso. Neste as- pecto, é importante não somente observar as RADs con- vencionais, como também monitorizar danos preveníveis causados por erros no uso de medicamentos. O termo preferido atualmente é Evento Adverso a Droga (EAD)Evento Adverso a Droga (EAD)Evento Adverso a Droga (EAD)Evento Adverso a Droga (EAD)Evento Adverso a Droga (EAD), definido como “um dano resultante de intervenção médi- ca relacionada a uma droga”. Isto inclui tanto as RADs tradicionais quanto danos causados por erros de medica- ção (erros de prescrição, administração e dispensa de drogas). Nenhum estudo de RAD ou EAD em crianças foi realizado na Noruega. O objetivo deste estudo é assim, de investigar e determinar a freqüência, gravidade e ca- racterísticas dos EADs em crianças admitidas em enfer- maria de Pediatria de Hospital Universitário, estudar as intervenções terapêuticas necessárias no manejo dos EADs e estudar a identificação e notificação de EADs. METODOLOGIA O monitoramento intensivo de EADs foi conduzido du- rante cinco meses (fevereiro a julho de 1996) na Unidade de Pediatria do Hospital Universitário de Ullevaal, Oslo, que conta com 900 leitos. O estudo incluiu crianças de zero a dezesseis anos de idade, hospitalizadas em duas enfermarias de pediatria geral (42 leitos). A enfermaria neonatal foi excluída, mas 84 crianças menores de três meses foram incluídas. Como a unidade não possuía serviço de cirurgia pediátrica, diversos pacientes neces- sitando de atenção cirúrgica foram removidos tempora- riamente para a unidade cirúrgica, e também foram in- cluídos no estudo. Também fora incluídos os EADs cau- sados por drogas prescritas durante as últimas duas semanas anteriores à admissão, EADs causadores de hospitalização e EADs após a alta causados por drogas introduzidas no hospital. Para este estudo, foi definido como EAD um dano ou sintoma suspeito de ter sido precipitado por intervenções médicas relacionadas com o tratamento medicamento- so. A definição inclui, além das RADs, intoxicações por erro de medicação e abuso de drogas. Buajordet I, Wesenberg F, Brors O, Langslet A Acta Paediatr 2002; 91:88-94 Eventos adversos a drogas em crianças hospitalizadas em hospital universitário da Noruega. Adverse drug events in children during hospitalization and after discharge in Norvegian university hospital SEGURANÇA INFANTIL
  • 14. Ano 9 - Out/Nov/Dezembro/200316 As informações sobre EAD foram coletadas de duas formas: 1)Notificação espontânea de EADs tanto por clínicos como pelos pais. Um pesquisador visitou a enfermaria diariamente durante o período do estudo questionando sobre possíveis EADs. Os pais foram solicitados a preen- cher um formulário sobre possíveis EAD ocorridos nas duas semanas prévias a admissão, durante a hospitalização e até duas semanas após a alta. 2)Revisão de prontuários médicos: o farmacêutico re- alizou levantamento dos prontuários médicos (dados la- boratoriais, evolução clínica diária dos clínicos e da enfer- magem e dados sobre exposição a drogas), para eventos adversos que poderiam estar relacionados a drogas. A avaliação da causalidade foi realizada por um far- macêutico, utilizando um algorítmo descrito em 1981 por Naranjo et al. Um evento adverso grave foi definido como qualquer ocorrência indesejável que em qualquer dose resultasse em morte, necessidade de hospitalização ou prolongamento da hospitalização atual, ou ainda em inca- pacidade total, parcial ou acarretasse risco de vida. A suspeita de EAD foi confirmada por um farmacêutico clí- nico e discutida com os médicos pediatras. As EADs foram codificadas em banco de dados utili- zando a Terminologia de Reações Adversas da OMS (WHO- ART). As drogas foram agrupadas de acordo com a classi- ficação Anatômica-Terapêutica-Clínica (ATC) da OMS. RESULTADOS Dados demográficos:Dados demográficos:Dados demográficos:Dados demográficos:Dados demográficos: Nos cinco meses do estudo, ocorreram 1102 admis- sões das quais 183 foram excluídas por insuficiência de dados, sendo 919 admissões incluídas na pesqui- sa. Alguns dos pacientes tinham mais de uma admis- são durante o período (média de 1,4 admissões, varia- ção de 1-12). Logo, 665 pacientes foram incluídos - 300 do sexo feminino (45%) e 365 do sexo masculino (55%), com idade entre 0-16 anos (média: 2,7 anos). Os resul- tados são referentes aos 579 participantes tratados com medicamentos. A maioria das hospitalizações foi cau- sada por problemas respiratórios, do sistema nervoso central (SNC), gastrointestinal ou por neoplasias; 41% (271/665) dos diagnósticos na alta apresentavam algum tipo de infecção: trato respiratório 31% (207/665), das quais 151 eram infecções agudas do trato respiratório superior, a maioria por vírus respiratório sincicial (RSV) (até dois anos de idade), e 54 eram pneumonia. Gas- troenterites ocorreram em 3% (18/665), infecções do trato urinário em 2% (16/665) e infecções diversas em 5% (30/665). Crianças com várias hospitalizações eram, sobretudo pacientes oncológicos com internamento pro- gramado para quimioterapia ou por complicações cau- sadas pelo tratamento quimioterápico. EADs - FEADs - FEADs - FEADs - FEADs - Freqüência, gravidade e característicasreqüência, gravidade e característicasreqüência, gravidade e característicasreqüência, gravidade e característicasreqüência, gravidade e características Das 579 crianças tratadas com medicamentos, 165 (28%) apresentaram pelo menos um sintoma considera- do EAD e 11% crianças tiveram EADs graves (Tabela 1 e NNNNNooooo de EADs (%)de EADs (%)de EADs (%)de EADs (%)de EADs (%) NNNNNooooo de pacientes com EADs (%)de pacientes com EADs (%)de pacientes com EADs (%)de pacientes com EADs (%)de pacientes com EADs (%) (n= 414) (n= 579) RADs 407 (98) 161 (28) Sobredose 7 (2) 4 (<1) Ocorrência de EADs Na admissão 75 (18) 39 (7) Durante a hospitalização 246 (59) 105 (18) Após a alta 112 (27) 54 (9) Gravidade Eventos graves 79 (19) 61 (11) Eventos não-graves 335 (81) 101 (17) Intervenções Sem intervenção 232 (56) 71 (12) Uso de droga adicional 97 (23) 45 (8) Interrupção 51 (12) 37 (6) Redução da dose 19 (5) 12 (2) Outros 15 (4) - RADRADRADRADRAD: Reação Adversa a Droga EADEADEADEADEAD: Evento Adverso a Droga TTTTTabela 1abela 1abela 1abela 1abela 1. Freqüência de eventos adversos a drogas (EADs), gravidade e intervenção.
  • 15. Ano 9 - Out/Nov/Dezembro/200318 Fig 1). No total, 414 eventos adversos foram julgados como associados a drogas - 78% prováveis e 22% possíveis, sendo 19% EADs graves. Reações adversas reais repre- sentaram 98% de todos os eventos suspeitos. Sete even- tos (em 4 pacientes) foram associados a superdosagens. Dos 414 eventos, os mais freqüentes foram distúrbios do SNC (28%), sobretudo por antiasmáticos, e distúrbios gastrointestinais (27%) e cutâneos (11%), sobretudo por drogas anti-infecciosas e citotóxicas. Dessa forma 13% dos pacientes (76/579) sofreram reações gastrointestinais, 12% (72/579) reações do SNC, 7% (43/579) reações cutâ- neas, 5% (27/579) reações generalizadas como febre, e 4% (24/579) reações hematológicas. Na admissão, 18% dos pacientes apresentavam EADs e 6% (53/919) das in- ternações foram motivadas por EAD, a maioria por rea- ções hematológicas após tratamento com drogas citotó- xicas e por complicações de vacinação. Durante a hospi- talização, 18% dos pacientes sofreram 59% dos EADs e após a alta 9% dos pacientes sofreram 27% dos EADs. A quimioterapia anticancerosa causou EADs em to- dos os pacientes tratados com tais drogas, anti-infeccio- sos em 19%, antiasmáticos em 15% e drogas afetando o SNC em 10% dos pacientes tratados. Intervenções motivadas pelos EADs Intervenções foram realizadas em 44% dos EADs: 23% foram tratados com uma ou diversas drogas adicionais, sendo a maioria prescrita para distúrbios por terapia cito- tóxica, como antiemético, antibióticos para suspeita de infecção e transfusões em sangramento/ trombocitopenia por depressão da medula óssea, ou analgésicos para estomatite. De 27 crianças em tratamento de câncer, 24 (89%) utilizaram pelo menos uma droga adicional para EADs por drogas citotóxicas. A droga suspeita de causar EAD foi descontinuada em 12% dos eventos, e a dose foi reduzida em 5%. Detecção e notificação dos EADs Seis por cento (23/414) dos eventos foram relatados por clínicos no protocolo do estudo, enquanto que os pais referiram outros 13% (52/414), sobretudo reações do SNC (30), gastrointestinais (9) e cutâneas (4). Reações do SNC foram geralmente relacionadas com beta2-agonistas ou corticosteróides. Nenhum dos eventos foi notificado ao sistema de notificação espontânea nacional. O prontuário médico dos pacientes foi a principal fon- te dos eventos detectados como podendo estar associa- dos ao uso de drogas. Os EADs descritos pelos clínicos em suas anotações diárias foram na maioria eventos ne- cessitando alguma intervenção, como modificação de do- ses, interrupção de drogas suspeitas, prescrição de nova droga para tratar o EAD ou demanda de exames para posteriormente poder confirmar o evento. Em suas anota- ções diárias, a enfermagem descreveu eventos como ná- usea/vômitos, diarréia, rash cutâneo, problemas no local de punções, reações do SNC e arritmia cardíaca. Dezoito por cento (73/414) dos EADs ocorridos no hospital foram mencionados nas anotações de alta. DISCUSSÃO A detecção de 18% EADs durante a permanência hos- pitalar (28% se incluída a pré e pós-hospitalização imedi- atas) por monitoramento intensivo está de acordo com estudos por métodos similares. A maioria dos pesquisa- dores examinaram RADs durante a hospitalização e en- contraram incidências variando de 1,73% a 56%. As ca- suísticas e os delineamentos de estudos similares a este, mostraram uma freqüência de RADs durante a hospitali- zação de 13,7 a 16,8%. Freqüência das admissões relacionadas com EADs Os achados de 6% das admissões terem sido causa- das por EADs (ou 5% causados por RAD segundo a clas- sificação da OMS) está em conformidade com relatos an- teriores. A freqüência de admissões relacionadas a EADs depende do tipo de pacientes estudados. Martinez-Mir et al. relataram que as RADs causaram 4,3% das hospitali- zações, mas não incluíram pacientes oncológicos ou in- fectados pelo HIV na casuística. Mitchell et al. encontra- ram 0,2% das admissões causadas por RADs em uma unidade de terapia intensiva neonatal, 2% na clínica pedi- átrica geral e 22% entre crianças com câncer. Em nosso estudo, 42% (22/53) dos internamentos relacionados a EADs foram motivados por terapia anticancerosa. Mais surpreendente foram os 17% (9/53) dos internamentos por EADs motivados por vacinas, a maioria delas sendo dif- teria-tétano-pertussis e sarampo-caxumba-rubéola. Características dos EAD Neste estudo, as reações do SNC foram tão freqüen- tes quanto as gastrointestinais, provavelmente devido às
  • 16. Ano 9 - Out/Nov/Dezembro/2003 19 patologias tratadas, às drogas utilizadas e à participação dos pais nas notificações. As reações do SNC neste es- tudo foram mais freqüentes do que aquelas descritas nas bulas de produtos antiasmáticos. Reações gastrointestinais também foram freqüentes, e causadas, sobretudo por drogas anti-infecciosas. Rea- ções cutâneas foram menos freqüentes do que geralmente notificado no sistema nacional de notificação espontânea, em geral tão freqüentes quanto as gastrointestinais. De- zenove por cento das EADs foram graves, a maioria sen- do conseqüência de quimioterapia antineoplásica. Não avaliamos o grau de prevenção dos eventos, mas percebemos que algumas reações dose-dependentes eram esperadas para se obter o efeito clínico desejado, como as reações hematológicas durante a terapia anti- cancerosa e as reações do SNC durante tratamento com corticosteróides. Em conseqüência, algumas drogas com- plementares foram prescritas para tratar EADs. Neste estudo, 24% dos eventos foram tratados com drogas adicionais que, por sua vez, causaram outros EADs em oito crianças. Notificação e detecção dos EADs A notificação pelos clínicos de prováveis EADs foi bai- xa, mesmo durante o estudo na enfermaria; isto indica que outros métodos além da notificação espontânea de- vem ser utilizados. Apesar da falta de iniciativa em notifi- car EADs, os clínicos descreveram os eventos mais gra- ves e complicados em suas evoluções, enquanto que os eventos leves a moderados foram referidos nas anotações de enfermagem. Os sintomas foram, no entanto, raramen- te referidos como EADs ou RADs associados a alguma droga em particular. Dos EADs detectados, 11% (os mais graves), necessi- taram de exames laboratoriais, como depressão da medu- la óssea, toxicidade hepática e altas concentrações séri- cas de drogas como antiepilépticos, digoxina ou teofilina. Para uma visão completa do conjunto dos EADs em grupos de pacientes, é necessária a metodologia de mo- nitoramento intensivo. No entanto, esta técnica é bastan- te demorada e de baixo custo/efetividade, é pouco reco- mendada como rotina, como nos programas de verifica- ção da qualidade da atenção da saúde. A notificação dos pais parece ser importante, em particular quando se es- tudam as reações adversas do SNC em crianças. Prescrição de medicamentos Sendo a enfermaria de um hospital de referência, o grupo de crianças participantes foi heterogêneo. Entre zero a dois anos as doenças respiratórias predominaram, pois de janeiro a junho, ocorre a maioria das infecções pelo vírus respiratório sincicial, que pode ser grave, mas causa somente alguns dias de hospitalização. Em gru- pos de maior idade, predominou a hospitalização para tratamento quimioterápico ou controle de remissão. Conseqüentemente, as drogas mais prescritas foram aquelas para tratamento de doenças respiratórias, tais como paracetamol, salbutamol e adrenalina racêmica (42% das crianças tratadas com drogas), que não está mais licenciada na Noruega, mas foi utilizada por muitos anos na prática pediátrica. Outra droga prescrita, mas não licenciada, foi o hidrato de cloral, produto de eficácia clí- nica mal documentada, administrada como sedativo a 3% dos pacientes. O midazolam, prescrito em 11% das cri- anças, está licenciado, mas não em aplicação intranasal como utilizado na enfermaria de pediatria. Como as dro- gas não licenciadas não carecem dos requisitos de docu- mentação clínica, monografia do produto ou bulas, os conhecimentos dos profissionais de saúde sobre o perfil das EADs podem ser insuficientes para garantir a quali- dade ideal do tratamento medicamentoso. Tal uso, tanto quanto possível, deveria ser reconsiderado e estudos con- duzidos para dar suporte ao licenciamento de drogas es- senciais. CONCLUSÕES O monitoramento de crianças hospitalizadas mostrou que 28% delas foram alvo de EADs: 7% na admissão, 18% durante a estadia e 9% após a alta. Durante a hospi- talização, excluindo-se a terapia antineoplásica, os EADs foram essencialmente reações leves a moderadas gas- trointestinais, do SNC e reações cutâneas associadas a drogas anti-infecciosas e antiasmáticas. As reações do SNC foram mais freqüentes do que esperadas no trata- mento antiasmático e deveriam ser mais investigadas. A triagem de prontuários clínicos foi a principal fonte de ob- servação dos eventos relacionados a drogas, onde os clí- nicos descreveram sobretudo os eventos que requeriam intervenção no tratamento medicamentoso, enquanto que a enfermagem descreveu as reações menos graves. Ë recomendado que tanto a enfermagem quanto os pais deveriam tomar parte nos estudos de investigação dos EADs em crianças, especialmente quando forem estuda- das reações do SNC. COMENTÁRIOS Eventos adversos a drogas são causas importantes de hospitalização, co-morbidade e mortalidade. Consti- tui a 4a ou 6a causa de morte entre pacientes hospitaliza-
  • 17. Ano 9 - Out/Nov/Dezembro/200320 dos. Mais importante, é que entre 30 e 60% deles são preveníveis. As estimativas de incidência variam com a metodologia empregada, nível de complexidade do servi- ço, as patologias prevalentes e ainda das definições utili- zadas de EAD e Reação Adversa a Droga (RAD). O EAD pode ser classificado como: a) gravegravegravegravegrave - morte ou risco de vida; incapacitação, ou limitação persistente ou extrema da atividade; necessi- dade de intervenção médica/terapêutica significativa; hos- pitalização provável ou possível; b) moderadomoderadomoderadomoderadomoderado - incapacidade suficiente para causar alteração parcial das atividades habituais; intervenção mé- dica/terapêutica mínima ou nenhuma; c) leveleveleveleveleve - desconforto ou incômodo facilmente tolerado; sem necessidade de intervenção médica/terapêutica; Os estudos bem delineados (ensaios clínicos con- trolados, duplo-cegos e randomizados) pré-marketing, conduzidos pela indústria farmacêutica sobre RADs, concentram-se geralmente em adultos. Ensaios clíni- cos pós-marketing podem ser realizados conforme o interesse comercial e clínico (surgimento de novas in- dicações, indícios de eventos adversos graves, drogas essenciais ou de ampla utilização em Pediatria). No en- tanto, os ensaios clínicos controlados têm característi- cas que dificultam seriamente a detecção de EAD: o limitado número de participantes (EADs raros ou inco- muns não detectáveis), o curto período de exposição (EADs tardios ou latentes, por acúmulo da droga ou por uso crônico são indetectáveis), e o tipo de participante (co-morbidades, distintas faixas etárias, variações ge- néticas, formas severas, medicações simultâneas cau- sam EADs indetectáveis por ensaios clínicos). O monitoramento dos EADs em serviço (hospitalar e ambulatorial) é importante para avaliar o efeito das dro- gas em pacientes diferentes, em maior número e por períodos maiores do que aqueles nos quais a droga foi testada nas fases I-IV dos estudos pré-marketing. Em países desenvolvidos, o monitoramento dos eventos ad- versos em serviço faz parte da vigilância da qualidade da atenção médica, ao supervisionar, junto com as RADs, aspectos como o grau de prevenção de EADs, a valida- de da indicação, prescrição, posologia e modo de ad- ministração da droga. Osestudos(nãocontrolados)sobrecausalidadeemEADs em serviço devem utilizar critérios claros e precisos, capa- zes de garantir objetividade (reprodutibilidade) e confiabili- dade das conclusões. Diversos métodos foram desenvolvi- dos, como o de Naranjo et al utilizado neste estudo. Trata-se de um sistema de pontuação (escore), que analisa o grau de associação entre o EAD e determinada droga. Podemos observar os seguintes graus de associação: a) causalidade definidacausalidade definidacausalidade definidacausalidade definidacausalidade definida - associação temporal níti- da com a droga, sem nenhuma outra causa possível; b) causalidade provávelcausalidade provávelcausalidade provávelcausalidade provávelcausalidade provável - associação temporal nítida; melhora clínica após a retirada da droga, nenhuma justifica- tiva adequada para a atual situação clínica do paciente; c) causalidade possívelcausalidade possívelcausalidade possívelcausalidade possívelcausalidade possível - associação temporal menos clara, outras etiologias possíveis; d) nenhuma causalidadenenhuma causalidadenenhuma causalidadenenhuma causalidadenenhuma causalidade - sem associação tempo- ral entre o evento e a droga; relacionada a etiologias di- versas como outras drogas, condições concomitantes ou situação clínica prévia. Muitas drogas utilizadas não possuem ensaios controla- dos e randomizados sobre dose e eficácia em crianças, cujas indicações ficam “off-label” ou seja, sem menção no bulário. Seria desejável, assim como ocorre com as Comissões de Controle das Infecções Hospitalares, que as unidades hospitalares constituíssem equipes de monitoramento dos EADs, tanto para controle das reações preveníveis quanto para monitorar a qualidade da atenção médica dispensada. Tradução e Comentários: Dr. Luís C. Rey Gill AM, Leach HJ, Hughes J, Barker C, Nunn AJ, Choona- ra I. Adverse drug reactions in a paediatric intensive care unit. Acta Paediatr 1995; 84:438-41. Lazarou J, Pomerantz BH, Corey PN. Incidence of adverse drug reactions in hospitalized patients: a meta-analysis of prospective studies. JAMA 1998; 279:1200-5. Mitchell AA, Lacouture PG, Sheehan JE, Kauffman RE, Shapiro S. Adverse drug reactions in children leading to hospital admission. Pediatrics 1988; 82:24-9. Naranjo CA, Busto U, Sellers EM, Sandor P, Ruiz I, Roberts EA et al. A method for estimating the probability of adverse drug reactions. Clin Pharmacol Ther 1981; 30:239-45. ‘t Jong GW, Vulto AG, de Hoog M, Schimmel KJ, Tibboel D, van den Anker JN. Unapproved and off-label use of dru- gs in a children`s hospital. N Engl J Med 2000; 343:1125. Turner S, Nunn AJ, Fielding K, Choonara I. Adverse drug reactions to unlicensed and off-label drugs on paediatric wards: a prospective study. Acta Paediatr 1999; 88:965-8. Referências Bibliográficas
  • 18. Ano 9 - Out/Nov/Dezembro/2003 21 INTRODUÇÃO Embora nos últimos 20 anos tenha ocorrido um declínio na prevalência da desnutrição no Chile, as deficiências de micronutrientes ainda persistem nas crianças desse país. Estudos experimentais e preli- minares sugerem que a deficiência de zinco provo- ca efeitos clínicos em crianças, com impacto nega- tivo no crescimento, na imunidade e no desenvolvi- mento psicomotor. Potencialmente, a suplementação de zinco pode melhorar o crescimento e o desenvol- vimento das crianças que estão em risco de defici- ência. OBJETIVO Avaliar o efeito da suplementação de zinco sobre o crescimento e desenvolvimento na infância. MÉTODOS E MATERIAIS Foram selecionados 150 recém-nascidos de termo, de baixo nível socioeconômico, com peso do nascimento maior que 2300g. Foram excluídos aqueles com doenças ou malformações. Todas as mães envolvidas no estudo eram alfabetizadas, não faziam uso de drogas, e tinham idades que variavam de 18 a 40 anos. O estudo foi duplo-cego, randomizado e as crianças foram acompanhadas desde o nascimento até os 12 me- ses. Dois grupos foram formados: · GS· GS· GS· GS· GS - Grupo SuplementadoGrupo SuplementadoGrupo SuplementadoGrupo SuplementadoGrupo Suplementado: recebeu 5mg/dia de zinco oral, na forma de sulfato e · GP· GP· GP· GP· GP - Grupo PlaceboGrupo PlaceboGrupo PlaceboGrupo PlaceboGrupo Placebo: recebeu placebo de lactose. Os grupos foram semelhantes quanto às característi- cas maternas, peso ao nascimento, ambiente domiciliar e capacidade de interação com a mãe. NUTRIÇÃO Efeito da suplementação de zinco no desenvolvimento e crescimento de crianças chilenas. Effect of zinc supplementation on development and growth of Chilean infants Apenas 112 recém-nascidos foram seguidos até os doze meses de vida. Todos foram amamentados no seio materno, tendo re- cebido como suplemento ou após o desmame, leite de vaca a 7,5%, com 1,5% de óleo e 5% de açúcar, até os três meses de vida, ou leite de vaca, com 5% de açúcar e 3% de cereais após os quatro meses de vida. Os alimen- tos sólidos (sopa de legumes, óleo vegetal, carne ou fran- go) e a suplementação de Ferro oral (1-2 mg/kg/ dia) fo- ram introduzidos após cinco meses de vida. As medidas antropométricas foram obtidas mensal- mente: peso, estatura e perímetro cefálico. A escala de Bayley II para lactentes (1993) foi utilizada por psicólogos treinados para avaliar o desenvolvimento aos seis e aos doze meses de vida. Esta escala permite a determinação de diferentes níveis do desenvolvimento mental e psicomotor pelos chamados “Índice de Desen- volvimento Mental” (IDM) e o “Índice de Desenvolvimento Psicomotor” (IDP). Foram aplicados, também, testes de análise qualitati- va de aspectos do comportamento através do escalona- mento da atenção, da orientação, de um “fator de quali- dade motora” e de um “fator de regulação emocional”. Tecnicamente, o “fator de qualidade motora” dá um valor na escala para os movimentos de coordenação motora fina e/ou grosseira, para a o controle do movi- mento, para a hipotonicidade ou a hipertonicidade mus- cular, para a hiperatividade, para os movimentos len- tos, atrasados, ou frenéticos e ainda para os possíveis Castillo-Duran C, Perales CG, Hertrampf ED, Marin VB, Rivera FA, Icaza G J Pediatr 2001; 138:229-35.
  • 19. Ano 9 - Out/Nov/Dezembro/200322 tremores. O “fator de regulação emocional” caracteri- za a afetividade do lactente, a adaptabilidade e a coo- peração. Os escores obtidos para cada fator, permitiram que fossem delimitadas três categorias de situações: nor- mal, questionável ou em risco. Aos dez meses de vida, foi avaliada a qualidade da estimulação em casa. Foi incluída uma avaliação de fa- tores maternos (resposta da mãe às solicitações ou ne- cessidades do lactente) e de fatores dos lactentes (for- ma de expressão). Foram obtidas amostras de cabelo para a análise do zinco; e amostras de sangue para medida da hemoglobi- na na admissão, aos seis e aos doze meses. Foram ex- cluídos do estudo os lactentes anêmicos (Hb < 10,5 g/ dL) e aqueles que não receberam semanalmente pelo menos 50% do suplemento prescrito. A análise estatística foi obtida por análise de variân- cia, ANOVA, qui-quadrado,e teste t. Para avaliar o efeito da suplementação de zinco sobre as variáveis estudadas foi realizada uma análise de regressão múltipla aos seis e aos doze meses. Foram feitas correlações de Pearson para IDM, IDP e fator de qualidade motora. RESULTADOS Não houve efeito da suplementação oral de zinco quanto aos parâmetros: peso, estatura e P/E, até doze meses, controlando as diferenças sexuais e a amamentação. A concentração de zinco no cabelo esteve semelhante entre os grupos no início, aos seis meses e aos doze meses de vida, não apresentando elevações no período de estudo. Não se observaram diferenças entre os grupos quanto à estimulação em casa, à relação com a mãe, e ao fator de regulação emocional. As médias de “Índice de Desenvolvimento Psicomo- tor” (IDP) e de Índice de Desenvolvimento Mental “(IDM) foram semelhantes (IDP= GS: 84,5 ± 11,5 vs GP: 87,5 ± 9,9 e IDM= GS: 90,9 ± 10,5 vs GP: 88,9 ± 9,1). Entretanto encontraram-se diferenças na proporção de lactentes com escore < 100 para o IDM (GS: 42 em 57; menor que GP: 46 em 52) (p <0,05) aos doze meses de vida. O fator de qualidade motora também revelou uma menor proporção de lactentes com escore baixo (< per- centil 11) no GS tanto aos 6meses (GS: 2 em 57; menor que GP: 8 em 52; p = 0,04), quanto aos 12 meses de vida (GS: 2 em 57 vs GP: 6 em 52) (p = 0,08). As médias dos escores para o fator de qualidade motora estiveram efetivamente mais elevadas no GS somente aos 12 meses de vida (GS: 31,9± 2,8 vs GP: 30,8± 2,9, p< 0,05). O Fator de qualidade motora, avaliado aos 6 meses de vida pela análise de regressão múltipla, foi influen- ciado apenas pelo peso ao nascimento (p = 0,0009) e aos 12 meses de vida pela suplementação de zinco oral (p = 0,037). DISCUSSÃO É fato plenamente reconhecido que o comprometimen- to da motricidade na criança, pode depender de deficiên- cias nutricionais (ferro, por exemplo, causando distúrbios neuromotores). O “fator de qualidade motora” relacionou- se com o peso aos 6 meses de vida. Isso levanta a possi- bilidade de que o efeito da suplementação de zinco pos- sa se manifestar somente nos recém-nascidos com bai- xo peso ao nascimento. Estudos experimentais demons- tram os efeitos da deficiência de zinco induzida durante os períodos críticos do desenvolvimento neurológico, re- fletindo no comportamento e na atividade locomotora es- pontânea dos animais. Isso justifica o interesse pelo es- tudo da suplementação precoce de zinco em crianças. A escala de Bayley ainda não foi validada na América Latina. Fatores socioculturais podem explicar os baixos valores encontrados nos dois grupos estudados em rela- ção á população de referência. A aplicação dos testes utilizados neste estudo ainda está em discussão, pois não existem estudos de acompanhamento no primeiro ano de vida desta nova edição da escala de Bayley (II). Entre- tanto, ela é um instrumento comum para avaliação do de- senvolvimento neuropsicomotor e isso não invalidaria o estudo, já que as diferenças foram mantidas em ambos os grupos estudados. Embora diversos estudos experimentais tenham de- monstrado que a deficiência de zinco induzida, leva a pre- juízos motores na atividade espontânea, na atenção e na memória, os poucos estudos em humanos apresentam resultados conflitantes. Existe grande dificuldade na ob- tenção de dados e na análise dos mesmos. Nesse estudo não se observaram diferenças no crescimento e no peso entre as crianças suplementa- das com zinco oral durante doze meses. Mesmo as- sim, não se pode excluir que diferenças venham a ocorrer após essa idade.
  • 20. Ano 9 - Out/Nov/Dezembro/2003 23 É possível que o desenvolvimento neuromotor seja mais sensível às deficiências de zinco que o crescimento. Su- põe-se que os lactentes dos países em desenvolvimento, após o desmame, estejam expostos às deficiências de zinco. Eles recebem cerca de 750ml/dia de leite de vaca e duas refeições de sólidos, pobres em alimentos fres- cos por dia. Estima-se que recebam cerca de 2,4 a 2,6 mg/dia de zinco, um consumo abaixo daquele recomen- dado pelo National Council Recommended Daily Allowan- ce (RDA), que recomenda 5mg/dia de zinco. Nesse estudo, as concentrações de zinco foram obtidas do cabelo. Esse método mostrou-se pouco sensível para detectar variações marginais de zinco nos lactentes estuda- dos (ambos os grupos tiveram médias semelhantes, sem variação após suplementação oral, durante doze meses). Caso existissem métodos laboratorialmente mais precisos para separar os lactentes que apresentassem uma deficiên- cia de zinco definida, os estudos de suplementação oral poderiam mostrar melhores evidências do benefício. Ainda no presente estudo, foram excluídas as anemi- as, que poderiam causar alterações no desenvolvimento neuropsicomotor, confundindo as deficiências decorren- tes de diferentes minerais. Da mesma forma, foram ex- cluídos os problemas com a oferta excessiva de ferro, que poderia competir na absorção intestinal com o zinco, oferecido fora do período das refeições. Observa-se que a relação ferro:zinco maior do que 2:1 em adultos limita a absorção de zinco: este efeito é superado quando se oferta o suplemento durante as refeições. Outros fatores que podem confundir a avaliação da deficiência de zinco no desenvolvimento neuropsicomo- tor incluem o baixo peso ao nascimento, a pobreza, o baixo tempo de amamentação, a desnutrição energético-protéi- ca e a deprivação social. Novos estudos, que possam avaliar por períodos mais longos os efeitos da deficiência de zinco no desenvolvi- mento neuropsicomotor, como aqueles já realizados em relação à deficiência do ferro, poderão ser desenvolvidos. CONCLUSÕES A suplementação de zinco diária aos lactentes duran- te o período de um ano pode ser benéfica para o desen- volvimento mental e a qualidade do comportamento mo- tor em lactentes sadios, nascidos a termo. COMENTÁRIOS Os micronutrientes participam como cofatores de uma série de processos metabólicos vitais, de forma análoga às vitaminas. O zinco faz parte da atividade de metaloen- zimas. As reações com substratos hormonais, ácidos gra- xos e a transcrição protéica dependem desse metal. Por- tanto a zincemia corpórea tem relação com a função imu- nológica, a permeabilidade de membranas ao transporte de sódio, o balanço nitrogenado, a maturação sexual, o paladar e a adaptação ao escuro. Suaimportâncianutricionaltorna-seclaraapartirdadescri- çãodeadolescentescomretardodecrescimentoedamatura- ção sexual, que responderam à administração de zinco oral. Embora esse metal esteja largamente distribuído na natureza, ele tem excelente biodisponibilidade no leite ma- terno, nos frutos do mar e nas carnes. Nos vegetais tem baixa biodisponibilidade pela presença de fitatos. Atualmente as fórmulas infantis, os cereais mati- nais e as formulações para nutrição enteral e parente- ral são acrescidas de zinco. Considerando-se que os lactentes dos países em desenvolvimento estão sujei- tos ao desmame precoce, seguido de oferta de leite de vaca e de sopas pobres em carnes, geralmente à base de vegetais não frescos, é possível supor que esses lactentes possam desenvolver carência desse mineral. Acrescentem-se as freqüentes intercorrênci- as a que estão sujeitos, aumentando as perdas e di- minuindo a absorção do mesmo (infecções em geral, diarréias agudas e crônicas). A excreção do zinco, principalmente intestinal, está au- mentada nas diarréias agudas, nas síndromes de má-ab- sorção, e nas situações onde o metabolismo está aumenta- do: hemoglobinopatias, cardiopatias, queimaduras exten- sas, cirurgias e traumas. Um aumento da necessidade do mineral também ocorre nas situações de crescimento rápi- do, como na recuperação nutricional, ou no crescimento do recém-nascido de muito baixo peso, exigindo reposições. A expressão clínica da deficiência grave de zinco en- contra-seevidentenaacrodermatiteenteropática,umacausa rara de má-absorção congênita do metal. Lesões periorifi- ciais, com hiperemia, descamação, além de anorexia, adi- namia, alopécia, diarréia, atraso na maturação sexual e no crescimento são descritos nesta doença. Infelizmente, os sinais clínicos são inespecíficos nas deficiências leves ou moderadas, dependendo das condições nutricionais e clí- nicas do organismo. Alterações no apetite, na velocidade de crescimento, no número de infecções podem ser con- seqüências da hipozincemia marginal. Até o momento existem muitas limitações na aferição do zinco corpóreo. As concentrações plasmáticas estão em relativa homeostase, estando diminuídas apenas nas graves deficiências. As concentrações no cabelo refletem situações crônicas, e mostraram pouca sensibilidade no
  • 21. Ano 9 - Out/Nov/Dezembro/200324 estudo em questão. A simples suplementação de zinco alimentar, diária, tem sido aceita para estudos em crianças de países em desenvolvimento, havendo controvérsias quanto ao efeito no aumento da velocidade de crescimento, do peso, ou na diminuição do número de infecções. Estudos recen- tes sugerem a recuperação mais rápida na diarréia agu- da em desnutridos, permitindo um “catch up” precoce, e garantindo melhor estado nutricional após recuperação. Poucos estudos referentes ao desenvolvimento neuropsi- comotor foram efetuados em crianças. A maioria foi feita em situações experimentais, onde se encontram algumas evidências de comprometimento na atividade em geral, pela deficiência do metal. No estudo em questão, não houve diferenças signifi- cativas quanto ao crescimento, ao peso, nem quanto aos escores de desenvolvimento mental e psicológico. As medidas durante o período de administração permanece- ram inalteradas em ambos os grupos. Entretanto, diferentes médias entre os grupos foram encontradas na avaliação do fator de qualidade motora aos doze meses de vida. Embora tenham ocorrido dife- renças estatisticamente significantes, os números são bastante próximos. Assim a análise de regressão múlti- pla ajuda a avaliar o valor desses resultados. Dada a difi- culdade de mensuração de fatores psicomotores, emoci- onais e de estimulação em tão baixa idade, fica difícil concluir sobre a eficácia real da suplementação. As avaliações estatísticas de outras variáveis (menor proporção de crianças com escores baixos para o fator de qualidade motora) podem confundir o leitor. Nesses pontos, as diferenças estatísticas encontradas foram pe- quenas e de difícil valorização. Nota-se ainda que os lactentes estudados não desen- volveram sinais de desnutrição em ambos os grupos, nem apresentaram diferenças quanto ao número de infecções no período. Portanto os sinais de deficiência de zinco nos grupos estudados deveriam ser muito sutis. É preciso considerar ainda que a escala de Bayley, embora de uso corrente, não foi validada na América La- tina, e isso pode explicar os baixos valores encontrados nos grupos estudados. Outros fatores de confusão como a administração de ferro, evitando a anemia, mas supostamente dimi- nuindo a absorção do zinco, devem ser considerados (mesmo considerando-se que o ferro recomendado di- ário não foi excessivo). Embora a administração de zin- co diária tenha sido orientada dentro da RDA (5mg/dia), há que se considerar os riscos do excesso de zinco, tóxico ao organismo, nos estudos que orientam a su- plementação oral. O excesso de zinco no organismo pode causar diarréia, vômitos, letargia, deficiência de cobre, com anemia e depressão do HDL plasmático. Novos estudos, melhorando as condições para aferi- ção do estado de zinco no organismo, facilitarão a sele- ção dos grupos e avaliação da suplementação oral diária. A observação do desenvolvimento em longos períodos (>12 meses) também poderá esclarecer melhor esse re- sultado encontrado. Tradução e comentários: Dr. Ary Lopes Cardoso Dra. Marilisa Stenghel Fróes e Souza Bhuta ZA, Black RE, Brown KH, Gaedner JM, Gora S, Hidayat A et al...... Prevention of diarrhea and pneumonia by zinc sup- plementationinchildrenindevelopingcountries:pooledanaly- sis of randomized controlled trials. Zinc Investigators Colla- borative Group. J Pediatr 1999;135:689-97. Brown KH, Peerson JM, Rivera J, Allen LH. Effect of supple- mental zinc on the growth and serum zinc concentrations of prepubertal children: a meta-analysis of randomized contro- lled trials. Am J Clin Nutr 2002;75:1062-71. Chevalier P, Sevilla R, Zalles L, Sejas E, Belmonte G, Parent G et al. Immuno-nutritional recovery of children with severe malnutrition. Sante 1996;6: 201-8. Hambidge MK. Zinc and diarrhea. Acta Paediatr 1992; 381( suppl): 82-6. Kalinyanak K. Nutrition on sickle-cell anemia. In: Ekvall SW, editor. Pediatric Nutrition in Chronic diseases and Develo- pmental Disorders. Oxford University Press, UK, 1993.p. 289-292. Krebs NF, Hambidge KM. Trace elements in Human Nutriti- on. In: Walker WA, Watkins JB, editors. Nutrition in Pedia- trics. BC Decker Inc. Publisher; 1997. p. 112. Prasad AS. Zinc deficiency in man. In: Hambidge KM, Ni- chols BL, editors. Zinc and copper in clinical Medicine. New York:Spectrum Publications; 1978. p. 1-14. Roy SK, Tomkins AM, Akramuzzaman SM; Behrens RH, Haider R, Mahalanabis D et al. Randomized controlled trial of zinc supplementation in malnourished Bangladeshi chil- dren with acute diarrhoea. Arch Dis Child 1997; 77: 196-200. Referências Bibliográficas