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Ciclos Hidrológicos; Amazônia-Homem-Mundo


                                                 O CICLO HIDROLÓGICO; AMAZÔNIA-
                                                 HOMEM-MUNDO



                                                                               *Marcílio de Freitas
                                                                ** Walter Esteves de Castro Júnior




                                                 RESUMO
                                                     Este artigo apresenta vários cenários sobre o
                                                 ciclo hidrológico e suas articulações com o ciclo de
                                                 calor na Amazônia e em âmbito planetário. Enfatiza
                                                 os elementos explicativos e compreensivos acerca
                                                 das propriedades físicas e químicas da molécula
                                                 de água – unidade básica deste ciclo - e de sua
                                                 participação em processos atmosféricos de médio
                                                 e longo alcances. Faz uma síntese sobre a relação
                                                 do ciclo hidrológico e o clima na bacia amazônica
                                                 com diversas projeções e tendências em escala
                                                 mundial.       Finalmente,       ele    apresenta
                                                 problematizações sobre os atuais modelos
                                                 hidrológicos e sobre um conjunto de princípios e
                                                 uma agenda para as políticas públicas mundiais
                                                 acerca do uso, da proteção e do gerenciamento dos
                                                 mananciais de águas.
                                                     Palavras chave: Amazônia-ciclo hidrológico;
                                                 Amazônia-processos atmosféricos; Amazônia-
                                                 efeito estufa; Amazônia-socioecologia




                                                 CONSIDERAÇÕES PRELIMINARES
                                                     Quais são as principais características e a
                                                 importância do ciclo hidrológico na Amazônia, região
                                                 que constitui a principal reserva mundial de recursos
                                                 hídricos? Como a Amazônia se insere no balanço
                                                 hidrológico global? Qual é a relação da molécula da
                                                 água com o efeito estufa? Quais são os nexos entre
                                                 clima e ciclo hidrológico na Amazônia? Como o ciclo
                                                 hidrológico se articula com o ciclo de calor na região
                                                 amazônica? Estas são questões de interesse que
                                                 analisaremos ao longo deste texto.



T&C Amazônia, Ano IV, Número 9, Agosto de 2006                                                     59
Ciclos Hidrológicos; Amazônia-Homem-Mundo


                                                                  resultando num período de precessão com período
                                                                  de 21.000 anos.
                                                                      A conjugação dos efeitos decorrentes da
NO QUE SE REFERE AO AQUECIMENTO                                   dinâmica desses dois fatores, variação da inclinação
TERRESTRE                                                         do eixo de rotação da Terra e o seu movimento de
    A dinâmica do ciclo hidrológico resulta de um                 precessão, são determinantes nas possíveis
complexo acoplamento de fatores mecânicos,                        configurações mecânicas associadas à recepção
eletromagnéticos, termodinâmicos, químicos e                      da energia solar pelo sistema terra-atmosfera. Um
biológicos, entrelaçados entre si, em diferentes                  caso típico são as variações das estações anuais
escalas espacial e temporal, em forma não linear.                 decorrentes do movimento de rotação da Terra em
Um elemento imprescindível na configuração                        torno do Sol e da inclinação de seu eixo.
mecânica deste ciclo é a energia solar, de natureza                   O Sol emite uma quantidade de 9x10 4cal/
eletromagnética, que alcança a Terra. O que                       min.cm2 2 e de acordo com a Lei de Conservação
justifica, neste contexto, a relevância das                       de Energia, esta quantidade de energia, que
informações que se seguem.                                        permanece constante para qualquer distância
    A Terra, planeta do sistema solar, ocupa uma                  computada a partir do mesmo, é distribuída
posição favorável à recepção da radiação solar,                   isotropicamente em todas as direções do espaço.
agente indispensável na regulação climática e na                  A energia solar que alcança o topo da atmosfera
manutenção dos processos vitais à existência da                   para uma distância média entre o Sol e a Terra
vida. O seu deslocamento em torno do Sol e sua                    denomina-se constante solar, e possui um valor
simultânea rotação em torno de seu eixo são os                    dado por S = 1,94cal/min.cm 2 . Das ondas
fatores determinantes para a quantidade de energia                luminosas que transportam esta energia,
solar que alcança o sistema terra-atmosfera (Liou,                aproximadamente 50% possuem comprimentos de
1980; Paltridge e Platt, 1976; Kondratyev, 1969;                  ondas maiores que os correspondentes ao espectro
McCartney, 1976).                                                 visível (0,4 a 0,7?m; 1 ?m = 10-6m); 40% situam-se
    Existem 2 parâmetros que influenciam a                        no espectro visível e os 10% restante na região
variação da órbita terrestre em torno do Sol: a                   anterior ao visível. Após esta radiação ingressar na
trajetória da Terra em torno do Sol é do tipo elíptica,           atmosfera, ela é submetida a múltiplos processos
com uma excentricidade média de cerca de 0,017,                   de espalhamento e absorção pelos diversos
e com o seu eixo de rotação fazendo um ângulo de                  constituintes atmosféricos, permanentes e variáveis,
inclinação de 23,5o com a reta normal ao plano da                 com uma fração da mesma gerando os processos
elíptica. Este ângulo varia ciclicamente até 1,5o num             evaporativos na superfície terrestre (Sagan, 1999).
período de aproximadamente 4.000 anos;                                Os padrões das configurações climáticas
• devido à atração gravitacional de outros planetas               resultam de desequilíbrios dinâmicos de naturezas
sobre a Terra, existe um lento mais contínuo                      mecânica, termodinâmica e química sendo
movimento, denominado precessão,1 em direção                      originados pelas interações entre a radiação solar,
oeste dos pontos equinociais ao longo da elipse.                  os solos (incluindo a biota), as águas e as camadas
Em desdobramento, quando a Terra encontra-se                      atmosféricas. A distribuição não-uniforme dessa
mais próxima do Sol, os intervalos de tempo                       radiação solar sobre a superfície terrestre possibilita
avançam cerca de 25 minutos em cada ano,                          a existência de um fluxo vertical contínuo de vapor


1
  Movimento com geometria cônica similar ao realizado pelo eixo de simetria de um pião girante que se move em torno de um
    eixo vertical.
2
  1 cal (caloria) é a quantidade de calor necessária para elevar a temperatura de 1 grama (1 g) de água de 14,5oC para 15,5oC.




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Ciclos Hidrológicos; Amazônia-Homem-Mundo


de água para a média e alta atmosfera, enquanto        imprescindível para o desencadeamento de vários
as forças mecânicas, entre regiões atmosféricas        processos atmosféricos em escala planetária.
com diferentes pressões, asseguram, continua e
periodicamente, o transporte de grandes
quantidades desse vapor de água para os locais de
altas latitudes através de complexas circulações       O CICLO HIDROLÓGICO PLANETÁRIO:
meridionais.                                           PROJEÇÕES NUMÉRICAS
    Em geral, fluxos mais intensos de energia solar        O processo periódico de circulação da água, em
incidem sobre as regiões tropicais, com o ar mais      diferentes fases, da atmosfera aos oceanos e aos
quente e úmido dessas regiões ascendendo e             solos, e à atmosfera novamente, denomina-se ciclo
liberando calor latente (com o correspondente          hidrológico.
aumento em sua densidade), e circulando em                 Anualmente, evaporam-se em torno de 380.000
direções norte e sul e descendo gradualmente em        quilômetros cúbicos de água da Terra, sendo
direção à superfície terrestre através de uma célula   320.000 quilômetros cúbicos provenientes dos
de circulação atmosférica.                             oceanos e o restante, 60.000, oriundos dos rios,
    Enquanto o ar tropical se aquece intensificando    lagos e das superfícies dos continentes. Após esta
a sua umidificação, nas regiões de maior latitude      massa de água ser armazenada na atmosfera, ela
têm-se uma incidência de raios solares em direções     precipita-se em forma de chuva ou neve, não
mais inclinadas em relação à direção vertical à        uniformemente sobre o globo terrestre. Uma maior
superfície terrestre, diminuindo o aquecimento         quantidade retorna para os oceanos, sendo que
dessa superfície o que a deixa mais fria. O ar em      aproximadamente, 96.000 quilômetros cúbicos caem
contato com estas superfícies também se torna frio     sobre as superfícies dos continentes suficientes para
e mais denso, e como ele contém poucas moléculas       cobrir o Brasil com uma profundidade de 11,3 metros.
de vapor de água, após dias ou semanas de              Parte dessa água escorre diretamente sobre as
imobilidade devido à prevalência de condições          superfícies sólidas para os rios e posteriormente,
climáticas associadas à vigência de alta pressão       em diferentes escalas temporais, são transportadas
atmosférica,        começa         a     mover-se,     até os oceanos. Outra parte, após absorver em torno
preferencialmente, em direção às regiões de baixas     de 540 calorias de energia solar por grama de água,
latitudes. Em desdobramento, têm-se                    evapora-se, retornando para a atmosfera. O restante
deslocamentos das duas massas de ar em sentidos        de água precipitada, infiltra-se nos solos
opostos; a polar, fria, densa e seca, e a tropical,    desempenhando papel imprescindível na
quente e úmida. À medida que a massa polar             manutenção dos processos físico-químico-
desloca-se para latitudes mais baixas ela se adere     biológicos vitais para a vida vegetal assim como na
à superfície terrestre, deslizando por baixo do ar     formação de reservatórios e rios subterrâneos,
quente que avança, fazendo com que este se eleve       retroalimentando, rápida ou lentamente, os cursos
para uma região onde predomina temperaturas mais       e as fontes superficiais de águas (Davis e Day,
baixas que as dos trópicos. Nestas condições, as       1961).
moléculas de água evaporadas das regiões tropicais         A presença de grandes quantidades de água
agregam-se em torno de pequenas partículas             líquida é uma das características mais importantes
denominadas aerossóis e se condensam, com cada         do planeta Terra, distinguindo-o dos demais planetas
grama de água condensada liberando                     do sistema solar; o transporte e a distribuição de
aproximadamente 500 calorias para o ar vizinho.        água constituem um fator fundamental em sua
Este calor que o vapor de água transporta para         estabilidade climática. A existência de diferentes
regiões situadas em grandes latitudes é                temperaturas e pressões na atmosfera e na



T&C Amazônia, Ano IV, Número 9, Agosto de 2006                                                          61
Ciclos Hidrológicos; Amazônia-Homem-Mundo



superfície terrestres possibilita a constante mudança        contida na atmosfera retorna à superfície por meio
de fase da água, entre os estados sólido, líquido e          de precipitações (Hartmann, 1994).
gasoso, criando as condições necessárias para a                   A quantidade de água transportada por
existência da vida no planeta (Graedel e Crutzen,            intermédio do ciclo hidrológico a cada ano, entra
1993).                                                       na atmosfera através da evaporação e da
    O ciclo hidrológico é um produto integrado do            evapotranspiração, e retorna à superfície através da
clima e dos atributos biogeofísicos da superfície            precipitação. Uma vez na atmosfera, o vapor de água
terrestre e, simultaneamente, exerce uma influência          pode ser transportado horizontalmente e
sobre o clima que transcende as interações entre             verticalmente por
a umidade atmosférica, a precipitação e o                    grandes distâncias através da circulação geral da
escorrimento superficial (Hartmann, 1994). Este              atmosfera. Estes movimentos do vapor de água são
ciclo é a principal fonte de calor para a atmosfera,         críticos para o balanço de água em áreas terrestres,
liberado em forma de calor latente, principalmente           pois aproximadamente 1/3 da precipitação que cai
nos trópicos, através da condensação da umidade              sobre estas áreas é água que foi evaporada nos
atmosférica na formação das nuvens.                          oceanos e transportada para estas regiões através
    A Terra contém um volume de água em torno de             da atmosfera. O excesso de precipitação sobre a
1,35x1018m3, sendo que cerca de 97% deste volume             evaporação nas áreas terrestres tem como resultado
encontra-se nos oceanos (Tabela 1). Os continentes           o retorno da água aos oceanos por meio dos rios e
armazenam 33,6x1015m3 com destaque para as                   seus tributários (idem, 1994).
regiões do Ártico e da Antártida. A atmosfera contém              Como ilustrado na Tabela 1, a quantidade de
0,013x1015m3 o que representa centésimos de                  água existente na terra/atmosfera corresponde a
milésimos do conteúdo da água de todo o sistema              uma lâmina de água com altura de aproxi-
climático terrestre ou aproximadamente 0,001% do             madamente 2.730m na superfície da Terra, a maior
total,3 e que corresponde a uma lâmina uniforme de           parte nos oceanos. Como toda a água contida na
água com 2,5cm de altura por toda a superfície               atmosfera fornece uma lâmina de 2,5cm, então uma
terrestre, ou seja, aproximadamente 1 parte em 105.          molécula de água deve permanecer um longo tempo
Para cada cem mil moléculas de água que existem              dentro dos oceanos, de uma camada de gelo, ou
na Terra (em quaisquer de seus estados físicos),             dentro de um aqüífero subterrâneo, até fazer sua
apenas uma molécula, encontra-se na atmosfera                breve excursão na atmosfera.
(Peixoto et al., 1990).                                           O vapor de água é o único constituinte
    Como anualmente precipita-se na superfície               atmosférico que pode mudar de estado em
terrestre uma quantidade de água equivalente a uma           condições naturais sendo, portanto, o componente
lâmina de água com 100cm de altura, distribuída              que apresenta maiores variações espaciais e
uniformemente sobre toda a superfície da Terra, são          temporais. As suas mudanças de fase são
necessárias 40 precipitações de toda a água contida          acompanhadas por liberação ou absorção de calor
na atmosfera por ano para se obter este valor.               latente que, associadas com o transporte de vapor
Portanto, em média, a cada 9 dias, toda a água               de água pela circulação atmosférica, atuam na
                                                             distribuição do calor sobre o planeta.




3
     De acordo com a Tabela 1 o valor correto é 0,0009% .




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Ciclos Hidrológicos; Amazônia-Homem-Mundo



              Tabela 1 – Quantidade de água na Terra. Adaptada de Hartmann (1994), p.12.




A MOLÉCULA DA ÁGUA; PROPRIEDADES E                                 quando o sólido está completamente liqüefeito ou
EFEITO ESTUFA                                                      o líquido totalmente vaporizado, o calor é absorvido
    Em comparação com outras substâncias, a                        sem produzir nenhuma mudança na temperatura
água tem uma extraordinária capacidade térmica,4                   da substância. O valor desta medida de calor,
podendo absorver uma grande quantidade de calor                    denominada “calor latente”, depende da substância
sem apreciáveis variações de temperatura.                          considerada.
Associados com essa característica da água estão,                      Tratando-se da água, no ponto de fusão, uma
os seus calores latentes, de fusão e de evaporação,                grama (1g) de água absorve 79,7 calorias (cal) sem
igualmente anômalos, características que lhe                       aumento de temperatura, enquanto durar o processo
atribuem um relevante papel sobre as temperaturas                  de fusão. No ponto de vaporização, o grama de água
na superfície terrestre. A energia absorvida pela água             absorve 539,4 calorias antes da temperatura
permanece estocada, sendo liberada em forma de                     aumentar novamente.
calor quando a temperatura ambiente diminui.                           Sob o ponto de vista mecânico, uma molécula
    Na região amazônica, a alta disponibilidade de                 pode utilizar a energia armazenada em três formas
vapor de água na atmosfera faz com que a variação                  distintas. A energia que é utilizada pela molécula
da amplitude térmica entre o dia e a noite, devido                 para assegurar os seus movimentos translacionais,
ao ciclo diurno de aquecimento e resfriamento, seja                recebe o nome de energia translacional e possibilita
pequena (em torno de 10oC), enquanto em áreas                      informações acerca do grau de agitação molecular
desérticas, onde há pouca quantidade de vapor de                   do sistema.5 Da mesma forma, a fração da energia
água na atmosfera, as diferenças de temperatura                    que possibilita às moléculas girarem em torno de
entre o dia e a noite podem alcançar 40oC (ou mais).               seus eixos, recebe o nome de energia rotacional,
    Quando a temperatura de uma substância sólida                  sendo, em geral, muito menor que a energia
é elevada até o ponto de fusão ou quando uma                       translacional. As moléculas, também podem vibrar,
substância líquida encontra-se no ponto de ebulição,               com um gasto de energia vibracional da mesma
ocorre uma transição durante a qual, as duas fases,                ordem da translacional.
sólida e líquida, ou, líquida e vapor, coexistem.                      Nos processos físicos de interação da radiação
Durante esse intervalo de tempo, que termina                       solar com a matéria, ocorre absorção e/ou



4
    A capacidade térmica é o grau de medida da quantidade de calor que deve ser fornecido a um elemento (substância) para elevar
     sua temperatura de uma unidade.
5
    A energia de translação (K), denominada energia cinética, em geral, está associada ao movimento dos corpos ou das molécu-
     las. Para uma temperatura T = 30oC, típica de regiões tropicais, a energia translacional de uma molécula de vapor de água
     assume um valor aproximado de K = 1,48 x 10-23calorias.



T&C Amazônia, Ano IV, Número 9, Agosto de 2006                                                                              63
Ciclos Hidrológicos; Amazônia-Homem-Mundo



espalhamento da mesma. A absorção e a emissão             50% , 15% e 10% do total desse efeito. Como a
de energia se fazem presentes quando os átomos            concentração do CO2 tem aumentado desde o início
ou moléculas sofrem transições de um estado               da revolução industrial devido ao crescente uso de
energético eletrônico para outro. Em geral, as            combustíveis de origem fóssil, os especialistas têm
transições possíveis são determinadas por regras          associado o aumento da emissão de CO2 com
de seleção que dependem de diversos fatores em            projeções analíticas que prevêem um planeta mais
escala atômica. As transições vibracionais e              quente no futuro.
rotacionais das moléculas da água ocorrem na              A questão central que consiste em determinar a
região espectral do infravermelho. Esta é a razão         relação exata entre a ação humana e a elevação
do vapor de água ser o principal constituinte             do aquecimento médio da Terra, tem sido motivo
atmosférico absorvedor das radiações infravermelha        de muita controvérsia. Os cenários projetados
(ou termal) própria das radiações solar (ondas curtas)    mostram que aumentos, da ordem de 1 a 2oC, na
e das emitidas pela superfície terrestre (ondas           temperatura média do planeta mudariam os atuais
longas); por esta razão, apesar de sua pequena            padrões de circulação, alterando as estações de
quantidade na atmosfera, o vapor de água é o              chuva e estiagem e impactando vários setores
responsável por aproximadamente metade do efeito          produtivos, em especial, toda a matriz agrícola,
estufa natural presente nessa região.                     através de mudanças no ciclo hidrológico.
    O efeito estufa natural é responsável pela                A evaporação da água a partir da superfície da
elevação da temperatura na superfície da Terra            Terra é responsável por metade do resfriamento da
acima da temperatura de equilíbrio radiativo; o           superfície, contrabalançando o aquecimento por
balanço energético envolvendo a radiação solar            absorção de radiação solar. Quando o vapor de água
recebida pelo planeta com aquela irradiada pela sua       ascende na atmosfera ele eventualmente se
superfície em forma de radiação infravermelha, prevê      condensa e precipita com a energia liberada durante
uma temperatura terrestre efetiva de -18oC. Nesta         a condensação do vapor de água contribuindo para
temperatura toda superfície da Terra estaria coberta      os sistemas de circulação atmosféricos.
de gelo. Entretanto, constata-se que a temperatura            A água também pode alterar a capacidade de
média na superfície da Terra é 33oC mais alta, ou         reflexão de calor de uma superfície (albedo) pela
seja, 15oC. Essa diferença se deve ao efeito estufa       deposição de neve e gelo (que possuem um albedo
natural e resulta da presença na atmosfera de             grande), influenciando o total de energia disponível
gases denominados gases-estufa (gases                     para os processos bióticos e abióticos. Por
atmosféricos com concentrações variáveis), que            exemplo, durante uma era glacial, período em que
são transparentes à radiação de ondas curtas              uma parte da superfície terrestre fica coberta por
provenientes do Sol, mas absorvem (e reemitem)            camadas de gelo, há uma diminuição do total de
radiação de ondas longas emitidas pela superfície         energia disponível na superfície devido ao aumento
terrestre. Portanto, a atmosfera atua como um             do albedo.
termostato, regulando o calor que a superfície
terrestre recebe e emite.
    Os principais gases-estufa são o dióxido de
carbono (CO2), o metano (CH4), o vapor de água, o
óxido nitroso (N 2 O), o ozônio (O 3 ), os                ELEMENTOS DO CICLO HIDROLÓGICO NA
clorofluorcarbonetos (CFCs) e outros gases                AMAZÔNIA
derivados de processos naturais e/ou                         O desenvolvimento do ecossistema amazônico
antropogênicos, com destaques para o CO2, o CH4           resulta da história geológica e do clima entrelaçada
e o vapor de água, responsáveis, em ordem, por            à ação cultural dos povos que milenarmente ocupam


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Ciclos Hidrológicos; Amazônia-Homem-Mundo


essa região. A Amazônia abriga o sistema fluvial             20 metros (Mertis et al., 1996, In: Filizola et al.,
mais extenso e de maior massa líquida da Terra,              2002). Experimentos mais recentes também
sendo coberta pela maior floresta pluvial tropical. É        comprovam que durante o período de águas altas,
delimitada ao norte e ao sul, respectivamente, pelos         as larguras médias deste Rio variam de 1 km em
maciços das Guianas e do Brasil Central; a oeste             Tabatinga a 7km em Almeirim (Pará) para
pela jovem Cordilheira dos Andes, e aberta a leste           profundidades que variam de 30 metros (Tefé –
onde é acessível a plena entrada dos ventos alísios.         Amazonas) até 100 metros em Itacoatiara
     O rio Amazonas, principal hidrovia da região,           (Amazonas) (Guyot et al., 1998, In: Filizola et al.,
drena mais de 7 milhões de km2 de terras e possui            2002). Filizola e colaboradores (2002) também
uma vazão anual média de cerca de 176 milhões de             registraram as amplitudes das cotas máximas e
litros por segundo (176.000m3/s), o que lhe confere          mínimas do Solimões-Amazonas, encontrando um
a posição de maior rio em volume de água da Terra,           valor de 12 metros em Terezinha (fronteira Peru-
superando o rio Congo na África (o segundo rio em            Brasil), 15 metros em Manacapuru (cerca de 94 km
volume de água) em cerca de quatro vezes, o rio              de Manaus) e finalmente 3 metros em Macapá (foz
Mississipi umas dez vezes, e as quedas de Niágara            do Amazonas).
em 28 vezes. Na época das águas baixas, o                        Os ventos alísios que trazem para a região
Amazonas conduz para o mar cerca de 100 milhões              amazônica o vapor de água proveniente do oceano
de litros por segundo (100.000m3/s); na época das            Atlântico têm barreiras naturais especialmente no
enchentes, mais de trezentos milhões de litros por           semicírculo andino, o que impõe a precipitação do
segundo (300.000m3/s) (Sioli, 1991). Como ilustração         vapor de água através de chuva ou de neve. Assim,
tem-se que a vazão média do rio Amazonas                     as características geomorfológicas e a existência
representa 176.000 caixas de água de 1.000 litros            de fatores regionais que contribuem para a
que seriam enchidas a cada segundo. Como o                   interceptação dos ventos quentes e úmidos da
consumo mundial anual de água em 1995 foi 3.000              circulação geral da atmosfera e da Zona de
quilômetros cúbicos, cerca de 1.370 litros por               Convergência Intertropical 6, resultaram numa
pessoa e por dia (Shiklomanov, 2000, p. 121), esta           tendência ecológica que explicam a existência de
mesma vazão do rio Amazonas é suficiente para                um clima quente e úmido na Amazônia possibilitando
suprir as necessidades básicas de abastecimento              o desenvolvimento de uma floresta equatorial (Salati
de mais de 6,6 bilhões de pessoas, número de                 e Ribeiro, 1979).
pessoas maior que a atual população mundial,                     A Região Amazônica é uma das regiões de mais
incluindo nessas projeções o gasto de água com a             altos índices pluviométricos do planeta, com totais
agricultura. Ou ainda, a vazão do rio Amazonas em            médios da ordem de 2200 mm/ano – 1mm/dia
1 segundo é suficiente para suprir o consumo diário          corresponde à queda de 1 litro de água por dia em
de uma cidade com cerca de 128.470 habitantes.               cada metro quadrado da região em questão. Isto
    Constata-se que as larguras médias do Rio                representa um volume total de água na forma líquida
Amazonas, medidas durante o período de águas                 de aproximadamente 12.000 trilhões de litros
baixas, passam de 2km, próximo à fronteira do Peru           (12x1012m3) que a bacia amazônica recebe a cada
com o Brasil, para mais de 4km, próximo à Óbidos             ano, resultando na maior bacia hidrográfica do
(Estado do Pará); e as profundidades médias                  mundo, que representa 16-20% da água doce na
correspondentes, variam progressivamente de 10 a             fase líquida na superfície do planeta. A água doce




6
    Zona de Convergência Intertropical é um mecanismo meteorológico responsável pela máxima precipitação sobre as áreas
     costeiras da Amazônia.



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Ciclos Hidrológicos; Amazônia-Homem-Mundo


constitui somente 2,95%, aproximadamente, do                   do rio Amazonas da ordem de 176 milhões de litros
volume total de água sobre a Terra sendo que 3/4               por segundo (176.000m3/s), o que representa uma
deste total estão nos glaciares e calotas de gelo              perda total de água pela rede fluvial de cerca de
(Postel et al., 1996).                                         5.500 trilhões de litros por ano (5,5x1012m3/ano,
    Para efeito de comparação, a precipitação média            conclui-se que o restante da água, 6.500 trilhões
em regiões continentais é de cerca de 800 mm/                  de litros (6,5x1012m3/ano), deve retornar à atmosfera
ano, a qual se reparte em quantidades                          na forma de vapor. A origem primária do vapor de
correspondentes ao escoamento (? 315-320 mm/                   água é o oceano Atlântico, com os ventos alísios
ano) e à evapo-transpiração (? 485-480 mm/ano).                transportando este vapor para essa região. Diversos
Sobre as regiões oceânicas, a precipitação média               estudos têm indicado que há uma recirculação do
é de 1.270 mm/ano resultando numa precipitação                 vapor de água na região, sendo que provavelmente
média anual sobre o globo terrestre, igual a cerca             50% das precipitações são devidas a esse
de 1.100 mm/ano.                                               mecanismo, o que coloca a cobertura vegetal como
    Os estudos registram grandes variabilidades nos            tendo um papel relevante no total observado de
índices pluviométricos locais, com situações                   precipitação. As plantas que no passado foram
peculiares. As análises feitas por Marajó (1992, p.            selecionadas e se desenvolveram em função das
37-38), referindo-se à cidade de Belém, capital do             condições iniciais do ecossistema em evolução, no
Estado do Pará, relatam que as medidas realizadas              presente são partes integrantes fundamentais para
em 1856, já confirmavam, à época, que a antiga                 o equilíbrio hidrológico estabelecido, fornecendo
regularidade das chuvas no estado do Pará, tão                 através da evapotranspiração os outros 50% de vapor
repetida por muitos escritores, não mais existia.              necessários para gerar o atual nível de precipitação
Continuando, Marajó (idem), afirma: “... eu tive               (Salati e Ribeiro, 1979). A baixa declividade da
ocasião de marcar no dia 21 de Dezembro de 1856,               planície amazônica, 1-2 cm.km-1 (Filizola et al., 2002)
em uma só pancada de água, uma coluna de 66mm;                 contribuiu para a retenção de água nesta região,
e no dia 6 de março de 1857, em uma só pancada                 criando as condições necessárias para a
que durou das 6 da manhã á 1 da tarde sem                      emergência de um ciclo hidrológico entrelaçado com
interrupção, uma coluna de 102mm.” (Freitas e Castro,          todos os demais ciclos biogeoquímicos existentes
2004)                                                          na mesma, matriciando a vida em forma pujante,
    Ainda são polêmicos os modelos que descrevem               complexa e integrada em diversas escalas espaciais
os processos físico-químico-biológicos que                     e temporais, do local ao mundial.
explicam os mecanismos de formação, transporte                     O ciclo hidrológico na bacia amazônica é
e reciclagem de vapor de água na bacia amazônica,              fortemente influenciado pelos sistemas atmosféricos
assim como o grau de importância dos                           que afetam a região, principalmente por aqueles que
ecossistemas amazônicos nas configurações                      causam a convecção e precipitação associada.
climáticas local, regional e mundial.                          Molion (1993), classificou os sistemas dinâmicos
    No que se refere à pluviosidade regional, como             que influenciam a precipitação na Amazônia em
o total de água que precipita na bacia amazônica               cinco escalas espaciais: 1) Sistemas de grande
em forma de chuva é da ordem de 12.000 trilhões                escala (ou escala continental), como a Zona de
de litros por ano (12x1012m3/ano), e sendo a vazão             Convergência Intertropical (ZCIT), o ramo ascendente




7
     A célula atmosférica de Hadley circula no sentido norte-sul e a de Walke rno sentido leste-oeste formando a circulação
     geral de Hadley-Walker.
8
      Alta da Bolívia é um fenômeno atmosférico que ocorre na região do antiplano boliviano que interfere na distribuição
     espacial e temporal da precipitação na região amazônica.



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da célula de circulação de Hadley-Walker7 e a Alta      aerossóis na estratosfera, associados com as
da Bolívia8; 2) Sistemas de escala sinótica, como a     erupções vulcânicas, durante a estação chuvosa na
formação de aglomerados convectivos associados          Amazônia, tem dificultado a verificação desta
com as frentes frias, com extensão da ordem de          hipótese (Molion, 1993).
1.000km; 3) Sistemas sub-sinóticos, formados                Estudos mais recentes têm enfatizado a questão
principalmente pelos aglomerados de nuvens              das alterações irreversíveis sobre o ciclo hidrológico
cúmulo-nimbos associados às linhas de                   provocadas pelo desmatamento. A disponibilidade
instabilidade e extensão da ordem de 500km; 4)          de água é importante para a manutenção da floresta
Sistemas de mesoescala, como os aglomerados             e nos processos de reciclagens. Modelagens
de nuvens cúmulo-nimbos da ordem de 100km de            analíticas e experimentos sobre aspectos do ciclo
extensão; e, 5) Sistemas de pequena escala, como        hidrológico na bacia amazônica comprovam e têm
uma célula isolada de nuvem cúmulo-nimbo com            reafirmado que 50% da precipitação nesta região é
extensão em torno de 1km.                               de origem local, sendo 40% devido ao processo de
    Um dos mecanismos que tem origem em                 transpiração da biomassa viva acima do solo e à
regiões distantes da Amazônia e que influenciam a       evaporação no solo, e os demais 10% devido à
precipitação na região é o fenômeno El Niño. Durante    evaporação da água interceptada pela floresta (Salati,
o El Niño ocorre um aumento dos fluxos de calor         1987; Ubarana, 1993).
sensível e de vapor de água (calor latente) da              Um aspecto importante do ciclo da água em
superfície do oceano Pacífico equatorial para a         florestas, é o que se refere ao retorno de nutrientes
atmosfera provocando mudanças nos processos de          ao solo através de precipitações. Experimentos
circulação atmosférica com impactos nos índices         mostram que um fluxo anual de 166kg/hectare de
de precipitação em várias regiões do planeta,           nutrientes é transportado pela precipitação até aos
inclusive na Amazônia. Moura e Shukla (1981)            solos na floresta de Oak-Hickory, Estados Unidos
discutem sobre um mecanismo que pode causar             da América. Deste total, a precipitação direta
modificações no ciclo hidrológico na Amazônia e         contribui com 38%, a precipitação-sob-dossel com
que também se origina no oceano Atlântico. Quando       35%, e o escorrimento ao longo dos troncos com
a temperatura à superfície do mar está acima da         27% do total (Rolfe et al., 1978). Estes valores devem
média no Atlântico Norte e abaixo da média no           ser maximizados em regiões tropicais, em especial,
Atlântico Sul, e a ZCIT encontra-se mais ao norte       naquelas com coberturas vegetais de grande porte,
de sua posição normal, resulta uma redução na           como na Amazônia.
precipitação nas porções central e leste da                 Em geral, existem três tipos de modelos
Amazônia.                                               hidrológicos: 1) os fundamentados nos princípios
    Os bloqueios atmosféricos que ocorrem em            da mecânica; 2) os conceitualmente simples e que
alguns anos no sul da América do Sul (à sudeste         se baseiam em arranjos e articulações teóricas que
do Pacífico e à sudeste da América do Sul), podem       expressam tendências gerais dos diversos
impedir o avanço das frentes frias vindas do sul do     elementos constituintes do mesmo, e, 3) os modelos
continente e que eventualmente alcançam a               tipo “box”, que dependem de dados de entrada e de
Amazônia, ocasionando redução de precipitação           saída para a calibração dos parâmetros assim como
nessa região.                                           para a determinação de sua própria estrutura e
    Uma outra hipótese refere-se à influência remota    consistência teórica interna (Dooge, 1982).
da possível relação entre os aumentos de                    Por outro lado, diversas dificuldades permeiam
precipitação e a presença de aerossóis vulcânicos       a construção desses modelos hidrológicos, dentre
na estratosfera sobre as regiões de baixas latitudes.   as quais destacamos: 1) Problemas de escalas
A ausência de medidas das concentrações de              espacial e temporal. Muitas vezes faz-se necessário



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Ciclos Hidrológicos; Amazônia-Homem-Mundo



modelar a dinâmica hidrológica associada às              pessoas vivem fora de seus países; 900 milhões
variações temporais de minutos, horas, dias,             são subempregadas; 150 milhões estão
semanas, anos e longos tempos, e às variações            desempregadas e 250 milhões de crianças em idade
espaciais de um sítio, uma região, um continente,        escolar estão trabalhando (Gómez, 2000). Este é o
e em escala global; 2) Dificuldades metodológicas        quadro social forjado e cristalizado pelo processo
associadas a interdisciplinaridade e ao                  de globalização, liderado pelos conglomerados
entrelaçamento entre os diversos mecanismos físico-      econômicos e pela hegemonia política dos países
químico-biológico envolvidos na dinâmica não linear,     desenvolvidos do mundo ocidental. Em nível mundial
desse ciclo; e finalmente, 3) A ausência de bancos       86% do consumo privado total é privilégio de 20%
de dados mais amplos e consistentes.                     da população humana, e os 15 principais países
                                                         exportadores em 2000, liderados pelos Estados
                                                         Unidos da América do Norte (12,3%), foram
                                                         responsáveis por 71,8% das exportações mundiais
ÁGUA E POLÍTICAS SOCIOECONÔMICAS                         realizadas em 2000.
MUNDIAIS E AMAZÔNIA                                          Neste contexto a democratização e o uso
    A desigualdade social exacerbada e a                 racional da água constitui um dos principais
depreciação exacerbada dos recursos da natureza          problemas do século 21. Na Conferência
constituem questões que tensionam os processos           Internacional sobre Água e Ambiente realizada em
civilizatórios em curso. A rapidez em que o              Dublin, em 26-31 de janeiro de 1992, construiu-se
capitalismo intensifica a precarização socioecológica    uma Agenda sócio-ecológica mundial baseada nos
nas regiões periféricas compromete sua própria           princípios de que: a água fresca é finita e essencial
dinâmica.                                                para a vida; o manejo e o uso da água devem ser
    A síntese dos indicadores sociais mundiais no        feitos em forma coletiva; a água é um bem público
ano 2000 é uma referência emblemática: 1,3 bilhão        insubstituível em todos as dimensões econômicas
de pessoas não tem acesso a água potável; mais           e sociais da humanidade. Esta Agenda estabeleceu
de 5 milhões de pessoas morrem anualmente devido         a necessidade de: viabilizar o acesso à água, comida
às doenças provocadas pela água imprópria ao             e condições sanitárias adequadas a mais de ¼ da
consumo; 1 bilhão de pessoas habitam em moradias         humanidade que ainda não dispõe desses serviços;
precárias; 100 milhões não tem moradia; 790              garantir proteção a amplo setor da população
milhões de pessoas passam fome e não dispõem             mundial que se encontra sujeito aos desastres
de segurança alimentar; 2 bilhões de pessoas estão       naturais, decorrentes do ciclo da água; criar
anêmicas com insuficiência alimentar; 35 mil             condições para a conservação e a eliminação do
crianças morrem diariamente por carências                desperdício da água; construir as condições técnicas
alimentares; 880 milhões não tem acesso aos              para a realização do desenvolvimento sustentável
serviços de saúde; 2,6 bilhões não tem saneamento        em ambientes urbano e rural; proteger os sistemas
básico e 2 bilhões não tem acesso à eletricidade. A      aquáticos e garantir o suprimento adequado ao meio
morbidez deste quadro intensifica-se quando              rural e às produções agrícolas; resolver os conflitos
considera-se que: 1,2 bilhão de pessoas vivem com        locais, regionais e internacionais por causa das
menos de 1 dólar por dia; 1 bilhão de pessoas não        fontes e dos suprimentos de água; e, formar recursos
podem satisfazer suas necessidades básicas de            humanos para a realização de estudos avançados
consumo; mais de 850 milhões são analfabetas;            sobre o adequado uso, conservação e manejo da
27% das crianças em idade escolar não estudam            água pelas diferentes comunidades e sociedades
por falta de escola, das quais 260 milhões não tem       (dhwr@gateway.wmo.ch, 2002).
acesso à educação primária; 145 milhões de


68                                                      T&C Amazônia, Ano IV, Número 9, Agosto de 2006
Ciclos Hidrológicos; Amazônia-Homem-Mundo


    A existência de cerca de 16-20% da água doce                243-288. Edited by P. S. Eagleson;
mundial em superfície sólida na bacia amazônica e               Cambridge University Press, Cambridge.
de uma área próxima de 1,2x106km2, periódica ou          Filizola, N.; Guyot, J., L.; Molinier, M., Guimarães,
permanentemente coberta por água nessa região,                  V., Oliveira, E.; Freitas, M., A. (2002) Carac-
a credencia como estratégica nas políticas mundiais             terização Hidrológica da Bacia Amazônica,
do ciclo hidrológico. As projeções de um                        In: Rivas, A. & Freitas, C., E., C. “Amazônia
crescimento do consumo mundial anual de água,                   uma perspectiva interdisciplinar, pp. 33-53,
de 3.000 quilômetros cúbicos em 1995 para mais                  Manaus, Brasil.
de 5.000 quilômetros cúbicos em 2025 (Shiklomanov,       Freitas, M.; Castro Jr., W., E. (2004) Amazônia e
2000, p. 121), fortalece a importância geopolítica              Desenvolvimento Sustentável. Editora Vozes,
da Amazônia.                                                    Petrópolis, RJ.
    Contraditoriamente, o acesso a água potável          Gómez, J., A., C. (novembro de 2000) Educación
ainda constitui uma utopia para ampla parcela das               Ambiental, Desarrollo y Pobreza: Estrategias
populações amazônicas. Recentemente o Prefeito                  para “outra” globalización, in: Reunión Inter-
de Manaus, Serafim Corrêa, em debate público sobre              nacional de Expertos en Educación Ambiental
os problemas de abastecimento de água nesta                     ? nuevas propustas para la acción, p. 367-
cidade afirmou que: “...cerca de 15% da população               391;Santiago de Compostela,Espanha.
(aproximadamente 250 mil habitantes) não recebem         Graedel, T., E.; Crutzen, P., J. (1993) Atmospheric
água em casa; 230 mil recebem por menos de 12                   Change: An Earth System Perspective. W.
horas diárias; mais de 90% da população (1.440.000              H. Freeman and Company. New York, USA,
de pessoas) não têm tratamento de esgoto, e o preço             446 p.
da água é elevado...” (Alves, 02/08/2006).               Guyot J.L., Pantoja Filizola N., Santos Guimarães
    A história dos estudos da inter-relação dos                 V. 1996. Quarta campanha de medição de
ecossistemas amazônicos com o ciclo hidrológico                 vazão e amostragem de água e sedimentos
e do papel social da água, em escala local, regional            na bacia do rio Solimões e no rio Amazonas.
e planetário, ainda é muito recente. Este é um                  Publ. HiBAm, Brasília, 61 p.
                                                         Hartmann, D., L. (1994) Global Physical Climatology.
                                                                Academic Press. New York, USA, 408 p.
trabalho para várias gerações.                           Kondratyev, K., Y., A. (1969) Radiation in the Atmos-
                                                                phere. Academic Press, New York,912 p.
                                                         Liou, Kuo-Nan (1980) In Introduction to Atmospheric
BIBLIOGRAFIA                                                    Radiation. Academic Press, New York, 392p.
Alves, R. (02/08/2006) Prefeito responsabiliza Ama-      Marajó, J., C., G., A., Barão (1992) As Regiões Ama-
       zonino pelo fracasso do sistema de água, In:             zônicas, Estudos chorographicos dos Esta-
       Diário do Amazonas, Caderno: Cidades, p.1,               dos do Gram Pará e Amazonas, p. 37-38.
       Manaus.                                                  Secretaria de Cultura do Estado do Pará,
Davis, K., S.; Day, J., A. (1961) A ÁGUA, ESPELHO               Belém, 404 p.
       DA CIÊNCIA; 213 p. Traduzido por José Ban-        McCartney, E., J. (1976) Optics of the Atmosphere
       tim Duarte, Fundação Brasileira para o desen-            – Scattering by Molecules and Particles, 408
       volvimento do Ensino de Ciências, EDART                  p. John Wiley & Sons, USA.
       São Paulo.                                        Mertes L.A.K., Dunne T., Martinelli L.A. 1996.
Dooge, J., K., I. (1982) Parametrization of Hydrologic          Channel floodplain geomorphology along the
       Process. In: Land surfaceprocesses in                    Solimões - Amazon river, Brazil. Geological
       atmospheric general circulation models, p.               Society of America Bulletin, 108 : 1089-1107.



T&C Amazônia, Ano IV, Número 9, Agosto de 2006                                                             69
Ciclos Hidrológicos; Amazônia-Homem-Mundo


        Molion, L., C., B. (1993) Amazonia Rainfall         Ubarana, V., N. (1994) EXPERIMENTOS OBSER-
        and its Variability. In: Hydrology and Water             VACIONAIS E MODELAGEM DAS PERDAS
        Manegement in the Humid Tropics, p. 99-111.              POR INTERCEPTAÇÃO DA PRECIPITAÇÃO
Bonell, M.; Hufschmidt, M., M.; Gladwell, J., S.                 NA FLORESTA AMAZÔNICA. Dissertação
        (Eds.). International Hydrology Series.                  apresentada no Programa de Mestrado em
Cambridge University Press, England. Moura, A.,                  Meteorologia do     InstItuto de Pesquisas
        D.; Shukla, J. (1981). On the dynamics of                Espaciais, São José dos Campos, SP.
        droughts in northeast Brazil:
Observations, theory and numerical experiments              World Meteorological Organization,
        with a general circulation model. Journal of        <dhwr@gateway.wmo.ch>.
        the Atmosferic Science, v. 38, p. 2633-2675.
        Paltridge, G., W.; Platt, C., M., R. (1976) Ra-
        diative Process in Meteorology and Climato-
        logy. Elsevier Scientific Publishing Company,
        Amsterdam, 318 p.                                      *Marcílio de Freitas é Professor da
Peixoto, J., P.; Oort, A., H. (1990) LE CYCLE DE            Universidade Federal do Amazonas e Diretor do
        L’EAU ET LE CLIMATE; LA RECHERCHE,                  Centro de Estudos Superiores do Trópico Úmido da
        v. 2, p. 570-579; France. Postel, S., L.; Daily,    Universidade do Estado do Amazonas
        G., C.; Ehrlich, P., R. (1996) Human appro-         (mafreitas@uea.edu.br).
        priation of renewabel fresh water. Science, v.         **Walter Esteves de Castro Júnior é Professor
        271, p. 785-788.                                    do Depto. de Física da Universidade Federal do
Rolfe, G., L.; Arnol, L., E. (1978) Nutrient fluxes in      Amazonas (westeves@fua.edu.br)
        precipitation , throughfall and stemflow in na
        Oak-Hickory Forest; Water Resouces Bulle-
        tim, 14: 1220-1226.
Sagan, C. (1999) Bilhões e Bilhões - Reflexões
        sobre vida e morte na virada do milênio, p.
        61-62. Traduzido por Rosaura Eichemberg,
        Companhia das Letras, São Paulo.
Salati, E. (1987) The forest and hydrological cycle.
        In: The geophysiology of Amazonia: vegeta-
        tion and climate interactions, p. 273-296.
        Dickinson, R.E. (ed.). John Wiley & Sons,
        New York, USA.
________; Ribeiro, M., N., G. (1979) Floresta e cli-
        ma. Supl. Acta Amazonica v. 9, n. 4, p.273-
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Shiklomanov, I. (2000) Prospective de l’eau à
        l’horizon 2025, In: Les clés du XXI siècle, p.
        121, coletânea organizada por Jérôme Bindé,
        Unesco/Seuil, Paris, França.
Sioli, H. (1991) Amazônia: fundamentos da ecologia
        da maior região de florestas tropicais. 3a Edi-
        ção. Editora Vozes. Petrópolis, Rio de Ja-
        neiro, 72 p.


70                                                         T&C Amazônia, Ano IV, Número 9, Agosto de 2006

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Ch amazonia

  • 1. Ciclos Hidrológicos; Amazônia-Homem-Mundo O CICLO HIDROLÓGICO; AMAZÔNIA- HOMEM-MUNDO *Marcílio de Freitas ** Walter Esteves de Castro Júnior RESUMO Este artigo apresenta vários cenários sobre o ciclo hidrológico e suas articulações com o ciclo de calor na Amazônia e em âmbito planetário. Enfatiza os elementos explicativos e compreensivos acerca das propriedades físicas e químicas da molécula de água – unidade básica deste ciclo - e de sua participação em processos atmosféricos de médio e longo alcances. Faz uma síntese sobre a relação do ciclo hidrológico e o clima na bacia amazônica com diversas projeções e tendências em escala mundial. Finalmente, ele apresenta problematizações sobre os atuais modelos hidrológicos e sobre um conjunto de princípios e uma agenda para as políticas públicas mundiais acerca do uso, da proteção e do gerenciamento dos mananciais de águas. Palavras chave: Amazônia-ciclo hidrológico; Amazônia-processos atmosféricos; Amazônia- efeito estufa; Amazônia-socioecologia CONSIDERAÇÕES PRELIMINARES Quais são as principais características e a importância do ciclo hidrológico na Amazônia, região que constitui a principal reserva mundial de recursos hídricos? Como a Amazônia se insere no balanço hidrológico global? Qual é a relação da molécula da água com o efeito estufa? Quais são os nexos entre clima e ciclo hidrológico na Amazônia? Como o ciclo hidrológico se articula com o ciclo de calor na região amazônica? Estas são questões de interesse que analisaremos ao longo deste texto. T&C Amazônia, Ano IV, Número 9, Agosto de 2006 59
  • 2. Ciclos Hidrológicos; Amazônia-Homem-Mundo resultando num período de precessão com período de 21.000 anos. A conjugação dos efeitos decorrentes da NO QUE SE REFERE AO AQUECIMENTO dinâmica desses dois fatores, variação da inclinação TERRESTRE do eixo de rotação da Terra e o seu movimento de A dinâmica do ciclo hidrológico resulta de um precessão, são determinantes nas possíveis complexo acoplamento de fatores mecânicos, configurações mecânicas associadas à recepção eletromagnéticos, termodinâmicos, químicos e da energia solar pelo sistema terra-atmosfera. Um biológicos, entrelaçados entre si, em diferentes caso típico são as variações das estações anuais escalas espacial e temporal, em forma não linear. decorrentes do movimento de rotação da Terra em Um elemento imprescindível na configuração torno do Sol e da inclinação de seu eixo. mecânica deste ciclo é a energia solar, de natureza O Sol emite uma quantidade de 9x10 4cal/ eletromagnética, que alcança a Terra. O que min.cm2 2 e de acordo com a Lei de Conservação justifica, neste contexto, a relevância das de Energia, esta quantidade de energia, que informações que se seguem. permanece constante para qualquer distância A Terra, planeta do sistema solar, ocupa uma computada a partir do mesmo, é distribuída posição favorável à recepção da radiação solar, isotropicamente em todas as direções do espaço. agente indispensável na regulação climática e na A energia solar que alcança o topo da atmosfera manutenção dos processos vitais à existência da para uma distância média entre o Sol e a Terra vida. O seu deslocamento em torno do Sol e sua denomina-se constante solar, e possui um valor simultânea rotação em torno de seu eixo são os dado por S = 1,94cal/min.cm 2 . Das ondas fatores determinantes para a quantidade de energia luminosas que transportam esta energia, solar que alcança o sistema terra-atmosfera (Liou, aproximadamente 50% possuem comprimentos de 1980; Paltridge e Platt, 1976; Kondratyev, 1969; ondas maiores que os correspondentes ao espectro McCartney, 1976). visível (0,4 a 0,7?m; 1 ?m = 10-6m); 40% situam-se Existem 2 parâmetros que influenciam a no espectro visível e os 10% restante na região variação da órbita terrestre em torno do Sol: a anterior ao visível. Após esta radiação ingressar na trajetória da Terra em torno do Sol é do tipo elíptica, atmosfera, ela é submetida a múltiplos processos com uma excentricidade média de cerca de 0,017, de espalhamento e absorção pelos diversos e com o seu eixo de rotação fazendo um ângulo de constituintes atmosféricos, permanentes e variáveis, inclinação de 23,5o com a reta normal ao plano da com uma fração da mesma gerando os processos elíptica. Este ângulo varia ciclicamente até 1,5o num evaporativos na superfície terrestre (Sagan, 1999). período de aproximadamente 4.000 anos; Os padrões das configurações climáticas • devido à atração gravitacional de outros planetas resultam de desequilíbrios dinâmicos de naturezas sobre a Terra, existe um lento mais contínuo mecânica, termodinâmica e química sendo movimento, denominado precessão,1 em direção originados pelas interações entre a radiação solar, oeste dos pontos equinociais ao longo da elipse. os solos (incluindo a biota), as águas e as camadas Em desdobramento, quando a Terra encontra-se atmosféricas. A distribuição não-uniforme dessa mais próxima do Sol, os intervalos de tempo radiação solar sobre a superfície terrestre possibilita avançam cerca de 25 minutos em cada ano, a existência de um fluxo vertical contínuo de vapor 1 Movimento com geometria cônica similar ao realizado pelo eixo de simetria de um pião girante que se move em torno de um eixo vertical. 2 1 cal (caloria) é a quantidade de calor necessária para elevar a temperatura de 1 grama (1 g) de água de 14,5oC para 15,5oC. 60 T&C Amazônia, Ano IV, Número 9, Agosto de 2006
  • 3. Ciclos Hidrológicos; Amazônia-Homem-Mundo de água para a média e alta atmosfera, enquanto imprescindível para o desencadeamento de vários as forças mecânicas, entre regiões atmosféricas processos atmosféricos em escala planetária. com diferentes pressões, asseguram, continua e periodicamente, o transporte de grandes quantidades desse vapor de água para os locais de altas latitudes através de complexas circulações O CICLO HIDROLÓGICO PLANETÁRIO: meridionais. PROJEÇÕES NUMÉRICAS Em geral, fluxos mais intensos de energia solar O processo periódico de circulação da água, em incidem sobre as regiões tropicais, com o ar mais diferentes fases, da atmosfera aos oceanos e aos quente e úmido dessas regiões ascendendo e solos, e à atmosfera novamente, denomina-se ciclo liberando calor latente (com o correspondente hidrológico. aumento em sua densidade), e circulando em Anualmente, evaporam-se em torno de 380.000 direções norte e sul e descendo gradualmente em quilômetros cúbicos de água da Terra, sendo direção à superfície terrestre através de uma célula 320.000 quilômetros cúbicos provenientes dos de circulação atmosférica. oceanos e o restante, 60.000, oriundos dos rios, Enquanto o ar tropical se aquece intensificando lagos e das superfícies dos continentes. Após esta a sua umidificação, nas regiões de maior latitude massa de água ser armazenada na atmosfera, ela têm-se uma incidência de raios solares em direções precipita-se em forma de chuva ou neve, não mais inclinadas em relação à direção vertical à uniformemente sobre o globo terrestre. Uma maior superfície terrestre, diminuindo o aquecimento quantidade retorna para os oceanos, sendo que dessa superfície o que a deixa mais fria. O ar em aproximadamente, 96.000 quilômetros cúbicos caem contato com estas superfícies também se torna frio sobre as superfícies dos continentes suficientes para e mais denso, e como ele contém poucas moléculas cobrir o Brasil com uma profundidade de 11,3 metros. de vapor de água, após dias ou semanas de Parte dessa água escorre diretamente sobre as imobilidade devido à prevalência de condições superfícies sólidas para os rios e posteriormente, climáticas associadas à vigência de alta pressão em diferentes escalas temporais, são transportadas atmosférica, começa a mover-se, até os oceanos. Outra parte, após absorver em torno preferencialmente, em direção às regiões de baixas de 540 calorias de energia solar por grama de água, latitudes. Em desdobramento, têm-se evapora-se, retornando para a atmosfera. O restante deslocamentos das duas massas de ar em sentidos de água precipitada, infiltra-se nos solos opostos; a polar, fria, densa e seca, e a tropical, desempenhando papel imprescindível na quente e úmida. À medida que a massa polar manutenção dos processos físico-químico- desloca-se para latitudes mais baixas ela se adere biológicos vitais para a vida vegetal assim como na à superfície terrestre, deslizando por baixo do ar formação de reservatórios e rios subterrâneos, quente que avança, fazendo com que este se eleve retroalimentando, rápida ou lentamente, os cursos para uma região onde predomina temperaturas mais e as fontes superficiais de águas (Davis e Day, baixas que as dos trópicos. Nestas condições, as 1961). moléculas de água evaporadas das regiões tropicais A presença de grandes quantidades de água agregam-se em torno de pequenas partículas líquida é uma das características mais importantes denominadas aerossóis e se condensam, com cada do planeta Terra, distinguindo-o dos demais planetas grama de água condensada liberando do sistema solar; o transporte e a distribuição de aproximadamente 500 calorias para o ar vizinho. água constituem um fator fundamental em sua Este calor que o vapor de água transporta para estabilidade climática. A existência de diferentes regiões situadas em grandes latitudes é temperaturas e pressões na atmosfera e na T&C Amazônia, Ano IV, Número 9, Agosto de 2006 61
  • 4. Ciclos Hidrológicos; Amazônia-Homem-Mundo superfície terrestres possibilita a constante mudança contida na atmosfera retorna à superfície por meio de fase da água, entre os estados sólido, líquido e de precipitações (Hartmann, 1994). gasoso, criando as condições necessárias para a A quantidade de água transportada por existência da vida no planeta (Graedel e Crutzen, intermédio do ciclo hidrológico a cada ano, entra 1993). na atmosfera através da evaporação e da O ciclo hidrológico é um produto integrado do evapotranspiração, e retorna à superfície através da clima e dos atributos biogeofísicos da superfície precipitação. Uma vez na atmosfera, o vapor de água terrestre e, simultaneamente, exerce uma influência pode ser transportado horizontalmente e sobre o clima que transcende as interações entre verticalmente por a umidade atmosférica, a precipitação e o grandes distâncias através da circulação geral da escorrimento superficial (Hartmann, 1994). Este atmosfera. Estes movimentos do vapor de água são ciclo é a principal fonte de calor para a atmosfera, críticos para o balanço de água em áreas terrestres, liberado em forma de calor latente, principalmente pois aproximadamente 1/3 da precipitação que cai nos trópicos, através da condensação da umidade sobre estas áreas é água que foi evaporada nos atmosférica na formação das nuvens. oceanos e transportada para estas regiões através A Terra contém um volume de água em torno de da atmosfera. O excesso de precipitação sobre a 1,35x1018m3, sendo que cerca de 97% deste volume evaporação nas áreas terrestres tem como resultado encontra-se nos oceanos (Tabela 1). Os continentes o retorno da água aos oceanos por meio dos rios e armazenam 33,6x1015m3 com destaque para as seus tributários (idem, 1994). regiões do Ártico e da Antártida. A atmosfera contém Como ilustrado na Tabela 1, a quantidade de 0,013x1015m3 o que representa centésimos de água existente na terra/atmosfera corresponde a milésimos do conteúdo da água de todo o sistema uma lâmina de água com altura de aproxi- climático terrestre ou aproximadamente 0,001% do madamente 2.730m na superfície da Terra, a maior total,3 e que corresponde a uma lâmina uniforme de parte nos oceanos. Como toda a água contida na água com 2,5cm de altura por toda a superfície atmosfera fornece uma lâmina de 2,5cm, então uma terrestre, ou seja, aproximadamente 1 parte em 105. molécula de água deve permanecer um longo tempo Para cada cem mil moléculas de água que existem dentro dos oceanos, de uma camada de gelo, ou na Terra (em quaisquer de seus estados físicos), dentro de um aqüífero subterrâneo, até fazer sua apenas uma molécula, encontra-se na atmosfera breve excursão na atmosfera. (Peixoto et al., 1990). O vapor de água é o único constituinte Como anualmente precipita-se na superfície atmosférico que pode mudar de estado em terrestre uma quantidade de água equivalente a uma condições naturais sendo, portanto, o componente lâmina de água com 100cm de altura, distribuída que apresenta maiores variações espaciais e uniformemente sobre toda a superfície da Terra, são temporais. As suas mudanças de fase são necessárias 40 precipitações de toda a água contida acompanhadas por liberação ou absorção de calor na atmosfera por ano para se obter este valor. latente que, associadas com o transporte de vapor Portanto, em média, a cada 9 dias, toda a água de água pela circulação atmosférica, atuam na distribuição do calor sobre o planeta. 3 De acordo com a Tabela 1 o valor correto é 0,0009% . 62 T&C Amazônia, Ano IV, Número 9, Agosto de 2006
  • 5. Ciclos Hidrológicos; Amazônia-Homem-Mundo Tabela 1 – Quantidade de água na Terra. Adaptada de Hartmann (1994), p.12. A MOLÉCULA DA ÁGUA; PROPRIEDADES E quando o sólido está completamente liqüefeito ou EFEITO ESTUFA o líquido totalmente vaporizado, o calor é absorvido Em comparação com outras substâncias, a sem produzir nenhuma mudança na temperatura água tem uma extraordinária capacidade térmica,4 da substância. O valor desta medida de calor, podendo absorver uma grande quantidade de calor denominada “calor latente”, depende da substância sem apreciáveis variações de temperatura. considerada. Associados com essa característica da água estão, Tratando-se da água, no ponto de fusão, uma os seus calores latentes, de fusão e de evaporação, grama (1g) de água absorve 79,7 calorias (cal) sem igualmente anômalos, características que lhe aumento de temperatura, enquanto durar o processo atribuem um relevante papel sobre as temperaturas de fusão. No ponto de vaporização, o grama de água na superfície terrestre. A energia absorvida pela água absorve 539,4 calorias antes da temperatura permanece estocada, sendo liberada em forma de aumentar novamente. calor quando a temperatura ambiente diminui. Sob o ponto de vista mecânico, uma molécula Na região amazônica, a alta disponibilidade de pode utilizar a energia armazenada em três formas vapor de água na atmosfera faz com que a variação distintas. A energia que é utilizada pela molécula da amplitude térmica entre o dia e a noite, devido para assegurar os seus movimentos translacionais, ao ciclo diurno de aquecimento e resfriamento, seja recebe o nome de energia translacional e possibilita pequena (em torno de 10oC), enquanto em áreas informações acerca do grau de agitação molecular desérticas, onde há pouca quantidade de vapor de do sistema.5 Da mesma forma, a fração da energia água na atmosfera, as diferenças de temperatura que possibilita às moléculas girarem em torno de entre o dia e a noite podem alcançar 40oC (ou mais). seus eixos, recebe o nome de energia rotacional, Quando a temperatura de uma substância sólida sendo, em geral, muito menor que a energia é elevada até o ponto de fusão ou quando uma translacional. As moléculas, também podem vibrar, substância líquida encontra-se no ponto de ebulição, com um gasto de energia vibracional da mesma ocorre uma transição durante a qual, as duas fases, ordem da translacional. sólida e líquida, ou, líquida e vapor, coexistem. Nos processos físicos de interação da radiação Durante esse intervalo de tempo, que termina solar com a matéria, ocorre absorção e/ou 4 A capacidade térmica é o grau de medida da quantidade de calor que deve ser fornecido a um elemento (substância) para elevar sua temperatura de uma unidade. 5 A energia de translação (K), denominada energia cinética, em geral, está associada ao movimento dos corpos ou das molécu- las. Para uma temperatura T = 30oC, típica de regiões tropicais, a energia translacional de uma molécula de vapor de água assume um valor aproximado de K = 1,48 x 10-23calorias. T&C Amazônia, Ano IV, Número 9, Agosto de 2006 63
  • 6. Ciclos Hidrológicos; Amazônia-Homem-Mundo espalhamento da mesma. A absorção e a emissão 50% , 15% e 10% do total desse efeito. Como a de energia se fazem presentes quando os átomos concentração do CO2 tem aumentado desde o início ou moléculas sofrem transições de um estado da revolução industrial devido ao crescente uso de energético eletrônico para outro. Em geral, as combustíveis de origem fóssil, os especialistas têm transições possíveis são determinadas por regras associado o aumento da emissão de CO2 com de seleção que dependem de diversos fatores em projeções analíticas que prevêem um planeta mais escala atômica. As transições vibracionais e quente no futuro. rotacionais das moléculas da água ocorrem na A questão central que consiste em determinar a região espectral do infravermelho. Esta é a razão relação exata entre a ação humana e a elevação do vapor de água ser o principal constituinte do aquecimento médio da Terra, tem sido motivo atmosférico absorvedor das radiações infravermelha de muita controvérsia. Os cenários projetados (ou termal) própria das radiações solar (ondas curtas) mostram que aumentos, da ordem de 1 a 2oC, na e das emitidas pela superfície terrestre (ondas temperatura média do planeta mudariam os atuais longas); por esta razão, apesar de sua pequena padrões de circulação, alterando as estações de quantidade na atmosfera, o vapor de água é o chuva e estiagem e impactando vários setores responsável por aproximadamente metade do efeito produtivos, em especial, toda a matriz agrícola, estufa natural presente nessa região. através de mudanças no ciclo hidrológico. O efeito estufa natural é responsável pela A evaporação da água a partir da superfície da elevação da temperatura na superfície da Terra Terra é responsável por metade do resfriamento da acima da temperatura de equilíbrio radiativo; o superfície, contrabalançando o aquecimento por balanço energético envolvendo a radiação solar absorção de radiação solar. Quando o vapor de água recebida pelo planeta com aquela irradiada pela sua ascende na atmosfera ele eventualmente se superfície em forma de radiação infravermelha, prevê condensa e precipita com a energia liberada durante uma temperatura terrestre efetiva de -18oC. Nesta a condensação do vapor de água contribuindo para temperatura toda superfície da Terra estaria coberta os sistemas de circulação atmosféricos. de gelo. Entretanto, constata-se que a temperatura A água também pode alterar a capacidade de média na superfície da Terra é 33oC mais alta, ou reflexão de calor de uma superfície (albedo) pela seja, 15oC. Essa diferença se deve ao efeito estufa deposição de neve e gelo (que possuem um albedo natural e resulta da presença na atmosfera de grande), influenciando o total de energia disponível gases denominados gases-estufa (gases para os processos bióticos e abióticos. Por atmosféricos com concentrações variáveis), que exemplo, durante uma era glacial, período em que são transparentes à radiação de ondas curtas uma parte da superfície terrestre fica coberta por provenientes do Sol, mas absorvem (e reemitem) camadas de gelo, há uma diminuição do total de radiação de ondas longas emitidas pela superfície energia disponível na superfície devido ao aumento terrestre. Portanto, a atmosfera atua como um do albedo. termostato, regulando o calor que a superfície terrestre recebe e emite. Os principais gases-estufa são o dióxido de carbono (CO2), o metano (CH4), o vapor de água, o óxido nitroso (N 2 O), o ozônio (O 3 ), os ELEMENTOS DO CICLO HIDROLÓGICO NA clorofluorcarbonetos (CFCs) e outros gases AMAZÔNIA derivados de processos naturais e/ou O desenvolvimento do ecossistema amazônico antropogênicos, com destaques para o CO2, o CH4 resulta da história geológica e do clima entrelaçada e o vapor de água, responsáveis, em ordem, por à ação cultural dos povos que milenarmente ocupam 64 T&C Amazônia, Ano IV, Número 9, Agosto de 2006
  • 7. Ciclos Hidrológicos; Amazônia-Homem-Mundo essa região. A Amazônia abriga o sistema fluvial 20 metros (Mertis et al., 1996, In: Filizola et al., mais extenso e de maior massa líquida da Terra, 2002). Experimentos mais recentes também sendo coberta pela maior floresta pluvial tropical. É comprovam que durante o período de águas altas, delimitada ao norte e ao sul, respectivamente, pelos as larguras médias deste Rio variam de 1 km em maciços das Guianas e do Brasil Central; a oeste Tabatinga a 7km em Almeirim (Pará) para pela jovem Cordilheira dos Andes, e aberta a leste profundidades que variam de 30 metros (Tefé – onde é acessível a plena entrada dos ventos alísios. Amazonas) até 100 metros em Itacoatiara O rio Amazonas, principal hidrovia da região, (Amazonas) (Guyot et al., 1998, In: Filizola et al., drena mais de 7 milhões de km2 de terras e possui 2002). Filizola e colaboradores (2002) também uma vazão anual média de cerca de 176 milhões de registraram as amplitudes das cotas máximas e litros por segundo (176.000m3/s), o que lhe confere mínimas do Solimões-Amazonas, encontrando um a posição de maior rio em volume de água da Terra, valor de 12 metros em Terezinha (fronteira Peru- superando o rio Congo na África (o segundo rio em Brasil), 15 metros em Manacapuru (cerca de 94 km volume de água) em cerca de quatro vezes, o rio de Manaus) e finalmente 3 metros em Macapá (foz Mississipi umas dez vezes, e as quedas de Niágara do Amazonas). em 28 vezes. Na época das águas baixas, o Os ventos alísios que trazem para a região Amazonas conduz para o mar cerca de 100 milhões amazônica o vapor de água proveniente do oceano de litros por segundo (100.000m3/s); na época das Atlântico têm barreiras naturais especialmente no enchentes, mais de trezentos milhões de litros por semicírculo andino, o que impõe a precipitação do segundo (300.000m3/s) (Sioli, 1991). Como ilustração vapor de água através de chuva ou de neve. Assim, tem-se que a vazão média do rio Amazonas as características geomorfológicas e a existência representa 176.000 caixas de água de 1.000 litros de fatores regionais que contribuem para a que seriam enchidas a cada segundo. Como o interceptação dos ventos quentes e úmidos da consumo mundial anual de água em 1995 foi 3.000 circulação geral da atmosfera e da Zona de quilômetros cúbicos, cerca de 1.370 litros por Convergência Intertropical 6, resultaram numa pessoa e por dia (Shiklomanov, 2000, p. 121), esta tendência ecológica que explicam a existência de mesma vazão do rio Amazonas é suficiente para um clima quente e úmido na Amazônia possibilitando suprir as necessidades básicas de abastecimento o desenvolvimento de uma floresta equatorial (Salati de mais de 6,6 bilhões de pessoas, número de e Ribeiro, 1979). pessoas maior que a atual população mundial, A Região Amazônica é uma das regiões de mais incluindo nessas projeções o gasto de água com a altos índices pluviométricos do planeta, com totais agricultura. Ou ainda, a vazão do rio Amazonas em médios da ordem de 2200 mm/ano – 1mm/dia 1 segundo é suficiente para suprir o consumo diário corresponde à queda de 1 litro de água por dia em de uma cidade com cerca de 128.470 habitantes. cada metro quadrado da região em questão. Isto Constata-se que as larguras médias do Rio representa um volume total de água na forma líquida Amazonas, medidas durante o período de águas de aproximadamente 12.000 trilhões de litros baixas, passam de 2km, próximo à fronteira do Peru (12x1012m3) que a bacia amazônica recebe a cada com o Brasil, para mais de 4km, próximo à Óbidos ano, resultando na maior bacia hidrográfica do (Estado do Pará); e as profundidades médias mundo, que representa 16-20% da água doce na correspondentes, variam progressivamente de 10 a fase líquida na superfície do planeta. A água doce 6 Zona de Convergência Intertropical é um mecanismo meteorológico responsável pela máxima precipitação sobre as áreas costeiras da Amazônia. T&C Amazônia, Ano IV, Número 9, Agosto de 2006 65
  • 8. Ciclos Hidrológicos; Amazônia-Homem-Mundo constitui somente 2,95%, aproximadamente, do do rio Amazonas da ordem de 176 milhões de litros volume total de água sobre a Terra sendo que 3/4 por segundo (176.000m3/s), o que representa uma deste total estão nos glaciares e calotas de gelo perda total de água pela rede fluvial de cerca de (Postel et al., 1996). 5.500 trilhões de litros por ano (5,5x1012m3/ano, Para efeito de comparação, a precipitação média conclui-se que o restante da água, 6.500 trilhões em regiões continentais é de cerca de 800 mm/ de litros (6,5x1012m3/ano), deve retornar à atmosfera ano, a qual se reparte em quantidades na forma de vapor. A origem primária do vapor de correspondentes ao escoamento (? 315-320 mm/ água é o oceano Atlântico, com os ventos alísios ano) e à evapo-transpiração (? 485-480 mm/ano). transportando este vapor para essa região. Diversos Sobre as regiões oceânicas, a precipitação média estudos têm indicado que há uma recirculação do é de 1.270 mm/ano resultando numa precipitação vapor de água na região, sendo que provavelmente média anual sobre o globo terrestre, igual a cerca 50% das precipitações são devidas a esse de 1.100 mm/ano. mecanismo, o que coloca a cobertura vegetal como Os estudos registram grandes variabilidades nos tendo um papel relevante no total observado de índices pluviométricos locais, com situações precipitação. As plantas que no passado foram peculiares. As análises feitas por Marajó (1992, p. selecionadas e se desenvolveram em função das 37-38), referindo-se à cidade de Belém, capital do condições iniciais do ecossistema em evolução, no Estado do Pará, relatam que as medidas realizadas presente são partes integrantes fundamentais para em 1856, já confirmavam, à época, que a antiga o equilíbrio hidrológico estabelecido, fornecendo regularidade das chuvas no estado do Pará, tão através da evapotranspiração os outros 50% de vapor repetida por muitos escritores, não mais existia. necessários para gerar o atual nível de precipitação Continuando, Marajó (idem), afirma: “... eu tive (Salati e Ribeiro, 1979). A baixa declividade da ocasião de marcar no dia 21 de Dezembro de 1856, planície amazônica, 1-2 cm.km-1 (Filizola et al., 2002) em uma só pancada de água, uma coluna de 66mm; contribuiu para a retenção de água nesta região, e no dia 6 de março de 1857, em uma só pancada criando as condições necessárias para a que durou das 6 da manhã á 1 da tarde sem emergência de um ciclo hidrológico entrelaçado com interrupção, uma coluna de 102mm.” (Freitas e Castro, todos os demais ciclos biogeoquímicos existentes 2004) na mesma, matriciando a vida em forma pujante, Ainda são polêmicos os modelos que descrevem complexa e integrada em diversas escalas espaciais os processos físico-químico-biológicos que e temporais, do local ao mundial. explicam os mecanismos de formação, transporte O ciclo hidrológico na bacia amazônica é e reciclagem de vapor de água na bacia amazônica, fortemente influenciado pelos sistemas atmosféricos assim como o grau de importância dos que afetam a região, principalmente por aqueles que ecossistemas amazônicos nas configurações causam a convecção e precipitação associada. climáticas local, regional e mundial. Molion (1993), classificou os sistemas dinâmicos No que se refere à pluviosidade regional, como que influenciam a precipitação na Amazônia em o total de água que precipita na bacia amazônica cinco escalas espaciais: 1) Sistemas de grande em forma de chuva é da ordem de 12.000 trilhões escala (ou escala continental), como a Zona de de litros por ano (12x1012m3/ano), e sendo a vazão Convergência Intertropical (ZCIT), o ramo ascendente 7 A célula atmosférica de Hadley circula no sentido norte-sul e a de Walke rno sentido leste-oeste formando a circulação geral de Hadley-Walker. 8 Alta da Bolívia é um fenômeno atmosférico que ocorre na região do antiplano boliviano que interfere na distribuição espacial e temporal da precipitação na região amazônica. 66 T&C Amazônia, Ano IV, Número 9, Agosto de 2006
  • 9. Ciclos Hidrológicos; Amazônia-Homem-Mundo da célula de circulação de Hadley-Walker7 e a Alta aerossóis na estratosfera, associados com as da Bolívia8; 2) Sistemas de escala sinótica, como a erupções vulcânicas, durante a estação chuvosa na formação de aglomerados convectivos associados Amazônia, tem dificultado a verificação desta com as frentes frias, com extensão da ordem de hipótese (Molion, 1993). 1.000km; 3) Sistemas sub-sinóticos, formados Estudos mais recentes têm enfatizado a questão principalmente pelos aglomerados de nuvens das alterações irreversíveis sobre o ciclo hidrológico cúmulo-nimbos associados às linhas de provocadas pelo desmatamento. A disponibilidade instabilidade e extensão da ordem de 500km; 4) de água é importante para a manutenção da floresta Sistemas de mesoescala, como os aglomerados e nos processos de reciclagens. Modelagens de nuvens cúmulo-nimbos da ordem de 100km de analíticas e experimentos sobre aspectos do ciclo extensão; e, 5) Sistemas de pequena escala, como hidrológico na bacia amazônica comprovam e têm uma célula isolada de nuvem cúmulo-nimbo com reafirmado que 50% da precipitação nesta região é extensão em torno de 1km. de origem local, sendo 40% devido ao processo de Um dos mecanismos que tem origem em transpiração da biomassa viva acima do solo e à regiões distantes da Amazônia e que influenciam a evaporação no solo, e os demais 10% devido à precipitação na região é o fenômeno El Niño. Durante evaporação da água interceptada pela floresta (Salati, o El Niño ocorre um aumento dos fluxos de calor 1987; Ubarana, 1993). sensível e de vapor de água (calor latente) da Um aspecto importante do ciclo da água em superfície do oceano Pacífico equatorial para a florestas, é o que se refere ao retorno de nutrientes atmosfera provocando mudanças nos processos de ao solo através de precipitações. Experimentos circulação atmosférica com impactos nos índices mostram que um fluxo anual de 166kg/hectare de de precipitação em várias regiões do planeta, nutrientes é transportado pela precipitação até aos inclusive na Amazônia. Moura e Shukla (1981) solos na floresta de Oak-Hickory, Estados Unidos discutem sobre um mecanismo que pode causar da América. Deste total, a precipitação direta modificações no ciclo hidrológico na Amazônia e contribui com 38%, a precipitação-sob-dossel com que também se origina no oceano Atlântico. Quando 35%, e o escorrimento ao longo dos troncos com a temperatura à superfície do mar está acima da 27% do total (Rolfe et al., 1978). Estes valores devem média no Atlântico Norte e abaixo da média no ser maximizados em regiões tropicais, em especial, Atlântico Sul, e a ZCIT encontra-se mais ao norte naquelas com coberturas vegetais de grande porte, de sua posição normal, resulta uma redução na como na Amazônia. precipitação nas porções central e leste da Em geral, existem três tipos de modelos Amazônia. hidrológicos: 1) os fundamentados nos princípios Os bloqueios atmosféricos que ocorrem em da mecânica; 2) os conceitualmente simples e que alguns anos no sul da América do Sul (à sudeste se baseiam em arranjos e articulações teóricas que do Pacífico e à sudeste da América do Sul), podem expressam tendências gerais dos diversos impedir o avanço das frentes frias vindas do sul do elementos constituintes do mesmo, e, 3) os modelos continente e que eventualmente alcançam a tipo “box”, que dependem de dados de entrada e de Amazônia, ocasionando redução de precipitação saída para a calibração dos parâmetros assim como nessa região. para a determinação de sua própria estrutura e Uma outra hipótese refere-se à influência remota consistência teórica interna (Dooge, 1982). da possível relação entre os aumentos de Por outro lado, diversas dificuldades permeiam precipitação e a presença de aerossóis vulcânicos a construção desses modelos hidrológicos, dentre na estratosfera sobre as regiões de baixas latitudes. as quais destacamos: 1) Problemas de escalas A ausência de medidas das concentrações de espacial e temporal. Muitas vezes faz-se necessário T&C Amazônia, Ano IV, Número 9, Agosto de 2006 67
  • 10. Ciclos Hidrológicos; Amazônia-Homem-Mundo modelar a dinâmica hidrológica associada às pessoas vivem fora de seus países; 900 milhões variações temporais de minutos, horas, dias, são subempregadas; 150 milhões estão semanas, anos e longos tempos, e às variações desempregadas e 250 milhões de crianças em idade espaciais de um sítio, uma região, um continente, escolar estão trabalhando (Gómez, 2000). Este é o e em escala global; 2) Dificuldades metodológicas quadro social forjado e cristalizado pelo processo associadas a interdisciplinaridade e ao de globalização, liderado pelos conglomerados entrelaçamento entre os diversos mecanismos físico- econômicos e pela hegemonia política dos países químico-biológico envolvidos na dinâmica não linear, desenvolvidos do mundo ocidental. Em nível mundial desse ciclo; e finalmente, 3) A ausência de bancos 86% do consumo privado total é privilégio de 20% de dados mais amplos e consistentes. da população humana, e os 15 principais países exportadores em 2000, liderados pelos Estados Unidos da América do Norte (12,3%), foram responsáveis por 71,8% das exportações mundiais ÁGUA E POLÍTICAS SOCIOECONÔMICAS realizadas em 2000. MUNDIAIS E AMAZÔNIA Neste contexto a democratização e o uso A desigualdade social exacerbada e a racional da água constitui um dos principais depreciação exacerbada dos recursos da natureza problemas do século 21. Na Conferência constituem questões que tensionam os processos Internacional sobre Água e Ambiente realizada em civilizatórios em curso. A rapidez em que o Dublin, em 26-31 de janeiro de 1992, construiu-se capitalismo intensifica a precarização socioecológica uma Agenda sócio-ecológica mundial baseada nos nas regiões periféricas compromete sua própria princípios de que: a água fresca é finita e essencial dinâmica. para a vida; o manejo e o uso da água devem ser A síntese dos indicadores sociais mundiais no feitos em forma coletiva; a água é um bem público ano 2000 é uma referência emblemática: 1,3 bilhão insubstituível em todos as dimensões econômicas de pessoas não tem acesso a água potável; mais e sociais da humanidade. Esta Agenda estabeleceu de 5 milhões de pessoas morrem anualmente devido a necessidade de: viabilizar o acesso à água, comida às doenças provocadas pela água imprópria ao e condições sanitárias adequadas a mais de ¼ da consumo; 1 bilhão de pessoas habitam em moradias humanidade que ainda não dispõe desses serviços; precárias; 100 milhões não tem moradia; 790 garantir proteção a amplo setor da população milhões de pessoas passam fome e não dispõem mundial que se encontra sujeito aos desastres de segurança alimentar; 2 bilhões de pessoas estão naturais, decorrentes do ciclo da água; criar anêmicas com insuficiência alimentar; 35 mil condições para a conservação e a eliminação do crianças morrem diariamente por carências desperdício da água; construir as condições técnicas alimentares; 880 milhões não tem acesso aos para a realização do desenvolvimento sustentável serviços de saúde; 2,6 bilhões não tem saneamento em ambientes urbano e rural; proteger os sistemas básico e 2 bilhões não tem acesso à eletricidade. A aquáticos e garantir o suprimento adequado ao meio morbidez deste quadro intensifica-se quando rural e às produções agrícolas; resolver os conflitos considera-se que: 1,2 bilhão de pessoas vivem com locais, regionais e internacionais por causa das menos de 1 dólar por dia; 1 bilhão de pessoas não fontes e dos suprimentos de água; e, formar recursos podem satisfazer suas necessidades básicas de humanos para a realização de estudos avançados consumo; mais de 850 milhões são analfabetas; sobre o adequado uso, conservação e manejo da 27% das crianças em idade escolar não estudam água pelas diferentes comunidades e sociedades por falta de escola, das quais 260 milhões não tem (dhwr@gateway.wmo.ch, 2002). acesso à educação primária; 145 milhões de 68 T&C Amazônia, Ano IV, Número 9, Agosto de 2006
  • 11. Ciclos Hidrológicos; Amazônia-Homem-Mundo A existência de cerca de 16-20% da água doce 243-288. Edited by P. S. Eagleson; mundial em superfície sólida na bacia amazônica e Cambridge University Press, Cambridge. de uma área próxima de 1,2x106km2, periódica ou Filizola, N.; Guyot, J., L.; Molinier, M., Guimarães, permanentemente coberta por água nessa região, V., Oliveira, E.; Freitas, M., A. (2002) Carac- a credencia como estratégica nas políticas mundiais terização Hidrológica da Bacia Amazônica, do ciclo hidrológico. As projeções de um In: Rivas, A. & Freitas, C., E., C. “Amazônia crescimento do consumo mundial anual de água, uma perspectiva interdisciplinar, pp. 33-53, de 3.000 quilômetros cúbicos em 1995 para mais Manaus, Brasil. de 5.000 quilômetros cúbicos em 2025 (Shiklomanov, Freitas, M.; Castro Jr., W., E. (2004) Amazônia e 2000, p. 121), fortalece a importância geopolítica Desenvolvimento Sustentável. Editora Vozes, da Amazônia. Petrópolis, RJ. Contraditoriamente, o acesso a água potável Gómez, J., A., C. (novembro de 2000) Educación ainda constitui uma utopia para ampla parcela das Ambiental, Desarrollo y Pobreza: Estrategias populações amazônicas. Recentemente o Prefeito para “outra” globalización, in: Reunión Inter- de Manaus, Serafim Corrêa, em debate público sobre nacional de Expertos en Educación Ambiental os problemas de abastecimento de água nesta ? nuevas propustas para la acción, p. 367- cidade afirmou que: “...cerca de 15% da população 391;Santiago de Compostela,Espanha. (aproximadamente 250 mil habitantes) não recebem Graedel, T., E.; Crutzen, P., J. (1993) Atmospheric água em casa; 230 mil recebem por menos de 12 Change: An Earth System Perspective. W. horas diárias; mais de 90% da população (1.440.000 H. Freeman and Company. New York, USA, de pessoas) não têm tratamento de esgoto, e o preço 446 p. da água é elevado...” (Alves, 02/08/2006). Guyot J.L., Pantoja Filizola N., Santos Guimarães A história dos estudos da inter-relação dos V. 1996. Quarta campanha de medição de ecossistemas amazônicos com o ciclo hidrológico vazão e amostragem de água e sedimentos e do papel social da água, em escala local, regional na bacia do rio Solimões e no rio Amazonas. e planetário, ainda é muito recente. Este é um Publ. HiBAm, Brasília, 61 p. Hartmann, D., L. (1994) Global Physical Climatology. Academic Press. New York, USA, 408 p. trabalho para várias gerações. Kondratyev, K., Y., A. (1969) Radiation in the Atmos- phere. Academic Press, New York,912 p. Liou, Kuo-Nan (1980) In Introduction to Atmospheric BIBLIOGRAFIA Radiation. Academic Press, New York, 392p. Alves, R. (02/08/2006) Prefeito responsabiliza Ama- Marajó, J., C., G., A., Barão (1992) As Regiões Ama- zonino pelo fracasso do sistema de água, In: zônicas, Estudos chorographicos dos Esta- Diário do Amazonas, Caderno: Cidades, p.1, dos do Gram Pará e Amazonas, p. 37-38. Manaus. Secretaria de Cultura do Estado do Pará, Davis, K., S.; Day, J., A. (1961) A ÁGUA, ESPELHO Belém, 404 p. DA CIÊNCIA; 213 p. Traduzido por José Ban- McCartney, E., J. (1976) Optics of the Atmosphere tim Duarte, Fundação Brasileira para o desen- – Scattering by Molecules and Particles, 408 volvimento do Ensino de Ciências, EDART p. John Wiley & Sons, USA. São Paulo. Mertes L.A.K., Dunne T., Martinelli L.A. 1996. Dooge, J., K., I. (1982) Parametrization of Hydrologic Channel floodplain geomorphology along the Process. In: Land surfaceprocesses in Solimões - Amazon river, Brazil. Geological atmospheric general circulation models, p. Society of America Bulletin, 108 : 1089-1107. T&C Amazônia, Ano IV, Número 9, Agosto de 2006 69
  • 12. Ciclos Hidrológicos; Amazônia-Homem-Mundo Molion, L., C., B. (1993) Amazonia Rainfall Ubarana, V., N. (1994) EXPERIMENTOS OBSER- and its Variability. In: Hydrology and Water VACIONAIS E MODELAGEM DAS PERDAS Manegement in the Humid Tropics, p. 99-111. POR INTERCEPTAÇÃO DA PRECIPITAÇÃO Bonell, M.; Hufschmidt, M., M.; Gladwell, J., S. NA FLORESTA AMAZÔNICA. Dissertação (Eds.). International Hydrology Series. apresentada no Programa de Mestrado em Cambridge University Press, England. Moura, A., Meteorologia do InstItuto de Pesquisas D.; Shukla, J. (1981). On the dynamics of Espaciais, São José dos Campos, SP. droughts in northeast Brazil: Observations, theory and numerical experiments World Meteorological Organization, with a general circulation model. Journal of <dhwr@gateway.wmo.ch>. the Atmosferic Science, v. 38, p. 2633-2675. Paltridge, G., W.; Platt, C., M., R. (1976) Ra- diative Process in Meteorology and Climato- logy. Elsevier Scientific Publishing Company, Amsterdam, 318 p. *Marcílio de Freitas é Professor da Peixoto, J., P.; Oort, A., H. (1990) LE CYCLE DE Universidade Federal do Amazonas e Diretor do L’EAU ET LE CLIMATE; LA RECHERCHE, Centro de Estudos Superiores do Trópico Úmido da v. 2, p. 570-579; France. Postel, S., L.; Daily, Universidade do Estado do Amazonas G., C.; Ehrlich, P., R. (1996) Human appro- (mafreitas@uea.edu.br). priation of renewabel fresh water. Science, v. **Walter Esteves de Castro Júnior é Professor 271, p. 785-788. do Depto. de Física da Universidade Federal do Rolfe, G., L.; Arnol, L., E. (1978) Nutrient fluxes in Amazonas (westeves@fua.edu.br) precipitation , throughfall and stemflow in na Oak-Hickory Forest; Water Resouces Bulle- tim, 14: 1220-1226. Sagan, C. (1999) Bilhões e Bilhões - Reflexões sobre vida e morte na virada do milênio, p. 61-62. Traduzido por Rosaura Eichemberg, Companhia das Letras, São Paulo. Salati, E. (1987) The forest and hydrological cycle. In: The geophysiology of Amazonia: vegeta- tion and climate interactions, p. 273-296. Dickinson, R.E. (ed.). John Wiley & Sons, New York, USA. ________; Ribeiro, M., N., G. (1979) Floresta e cli- ma. Supl. Acta Amazonica v. 9, n. 4, p.273- 296. Shiklomanov, I. (2000) Prospective de l’eau à l’horizon 2025, In: Les clés du XXI siècle, p. 121, coletânea organizada por Jérôme Bindé, Unesco/Seuil, Paris, França. Sioli, H. (1991) Amazônia: fundamentos da ecologia da maior região de florestas tropicais. 3a Edi- ção. Editora Vozes. Petrópolis, Rio de Ja- neiro, 72 p. 70 T&C Amazônia, Ano IV, Número 9, Agosto de 2006