1. Fundamentos Epistemológicos da Medicina
5.4. Comprobabilidade
Científica
Luiz Salvador de Miranda-Sá Jr.
A comprobabilidade ou verificabilidade é a segunda exigência
levantada aqui, depois da especificidade, para caracterizar a
atividade científica. A comprobabilidade se refere aos aspectos
metodológicos da ciência.
A exigência de comprobabilidade da ciência se concretiza na
avaliação de uma atividade ou produção científica qualquer do
ponto de vista de sua metodologia e de seus outros recursos de
investigação.
Ao lado da especificidade, que é a primeira exigência para
caracterizar a ciência, a segunda exigência para caracterizar uma
prática ou informação científicas. coloca-se a necessidade chamada
de co m pr o b a bilida d e , que inclui os seguintes elementos básicos:
a comprobabilidade teórica (demonstração),
a comprobabilidade empírica (procedimentos teóricos e práticos de
verificação, comprovação) e
a refutabilidade (que inclui a necessidade de manter
permanentemente em atividade mecanismos, processos e
procedimentos que garantam a crítica permanente de seus
resultados e processos, garantindo sua a autocorreção.
Neste sentido amplo, a comprobabilidade científica se confunde
com a metodologia, a metódica, as técnicas e os procedimentos
técnicos empregados na ciência para investigar. No entanto, a
comproba- bilidade científica tem alcance muito maior que a
disciplina lógica dos métocos de investigação, tambem respeita aos
métodos lógicos e procedimentos de autoavaliação e autocorreção
de seus resultados.
De maneira supersimplificada, pode-se pretender que, depois que a
objetividade científica define o o quê se estuda cientificamente e o
para quê se procede à investigação científica, impõe- se saber o
co m o isto é realizado de forma confiável. A comprobabilidade
científica consiste na estruturação e na execução de procedimentos
teóricos e práticos que permitam saber co m o se obtém (ou se
obteve) o conhecimento científico e como se pode garantir a
1
2. confiabilidade e a validade dos procedimentos lógicos e práticos
envolvidos nessa atividade. Esta grande exigência para caracterizar
a atividade científica aqui se denomina princípio da
comprobabilidade científica.
Por princípio da comprobabilidade empírica deve-se entender que
toda atividade científica deve dispor (ou se fundamentar)
obrigatoriamente de um conjunto estruturado de procedimentos
lógicos, metodológicos e técnicos (quando for o caso), adequados a
seu objeto, capazes de atender às exigências da filosofia do
conhecimento para o rigor da investigação e que, por isto,
permitam a aferição de suas hipóteses na teoria e na prática. Não
há, nem pode haver ciência sem sua metodologia científica
específica (porque adequada a seu objeto) e subordinada a uma
determinada metodologia filosófica aceita naquele momento.
Este princípio, na verdade, se confunde com o princípio da
co m pr o b a bilidad e e m pírica , princípio da verificabilidad e ou princípio
da da falsicabilidad e (propostos por Popper) ainda que aqui,
pretenda- se alcance um tanto maior.
A comprobabilidade, enquanto usada como traço caracterizador e
distintivo da ciência, deve estar em absoluta interação com as
outras duas características da ciência (a especificidade e o grau de
sistematicidade), sendo enriquecida por elas e as enriquecendo.
É preciso examinar a extensão do significado do termo
m et o d ol o gi a .
O termo m et o d ol o gi a pode ser empregado na teoria da ciência com
dois significados distintos. Primeiro, a metodologia, como disciplina
filosófica , é o capítulo da Filosofia que estuda o método empregado
no conhecimento do mundo; e, em segundo lugar, emprega- se o
termo metodologia para desiggnar um componente das ciências, é
a dimensão da atividade científica que corporifica o princípio da
comprobabilidade empírica e estabelece os caminhos e meios para
a demonstração e a verificação das hipóteses.
Neste segundo sentido, parece melhor, denominar metódica,
reservando- se o metodologia para o ramo da filosofia. Quando,
então, tem- se a metodologia científica como um ramo da
metodologia filosófica. Na prática da investigação científica, quando
se aplicar os métodos científicos, talvez convenha diferenciar
m et o d ol o gi a (disciplina filosófica) de m et ó dic a (conjunto de
recursos metodológicos e técncicos usados em uma pesquisa)
porque esta diferenciação possibilita melhor entendimento do
tema.
Neste texto, procura- se denominar como m ét o d o à arquitetura
intelectual e lógica, teórica e abstrata do processo de investigação;
2
3. complementando- a, existe a m et ó dic a , como se denomina ao
conjunto de recursos (processos, técnicas, instrumentos e
procedimentos) práticos. A metódica reúne os procedimentos
concretos, as técnicas de investigação, além do emprego de
instrumentos. Metodologia e metódica são recursos científicos
complementares em permanente interação. Em sentido amplo,
denomina- se m ét o d o ao caminho usado para chegar a um lugar ou
atingir determinados fins. Em ciência, concebe-se o método como
elemento de importância crucial para a obtenção do conhecimento
científico. Tão importante que se confunde com a própria atividade
científica.
CIÊNCIA É EXPERIÊNCIA. NENHUMA CIÊNCIA É MELHOR QUE OS
MÉTODOS QUE EMPREGA. SÃO OS DOIS BROCARDOS QUE ASSINALAM
ESTA OPINIÃO.
A metodologia científica consiste na estruturação lógica dos
processos teóricos e práticos de verificação e comprovação das
proposições possíveis de uma atividade científica, sendo um dos
elementos mais essenciais de qualquer tipo de atividade cognitiva
que pretenda merecer estatuto de cientificidade, isto é, de
desfrutar estatuto de ciência.
Entre outros autores da epistemologia e da metodologia, KOPNIN
<pág. 232.> afirma que a metodologia e a metódica de uma
disciplina ou pesquisa científica devem reunir “ norm a s de açã o
padroniza d a s e hom o g ê n e a s ” especialmente estruturadas em
função de seu objeto e subordinadas aos objetivos da atividade
científica, em geral, e aos propósitos particulares daquele estudo
específico.
A comprobabilidade pode ser teórica ou prática (a
comprobabilidade prática também é chamada verificabilidade
ou comprobabilidade empírica de uma ciência factual) e decorre
das possibilidades metodológicas e técnicas de um ramo qualquer
do conhecimento para investigar cientificamente seu objeto e
concluir e generalizar sobre ele de modo confiável.
O método é o instrumento de organização lógica do pensamento
que se aplica a toda investigação inteligente, da filosofia ao
propósito prático mais limitado e imediato.
Uma técnica de investigação científica constitui um conjunto de
regras práticas ou procedimentos padronizados para atingir os
objeticos na verificação de uma hipótese científica.
Um procedimento técnico a conduta mais elementar de uma
técnica, o modo padronizado ou reconhecido como correto para
implementar uma técnica.
3
4. Como se viu, a primeira exigência para que o conhecimento acerca
de um certo campo da natureza ou um tipo específico de atividade
cognoscitiva possam ser considerados como científicos torna- se
necessária a satisfação do requisito de especificidade, com suas
duas dimensões: a ontológica e a gnosiológica. O conhecimento
científico deve ser comprovável (nas ciência fática) ou demostrável
(nas ciência formais), isto é possível de ser verificado.
Verificou- se no capítulo anterior que a ciência (entenda- se como o
conhecimento científico acumulado ou como uma atividade de
investigação científica) tem como pré-requisitos necessários a
definição de seu objeto e a constatação da possibilidade de estudo
objetivo. Como decorrência desta exigência, antes de serem
abordadas as questões metodológicas, impõe- se a necessidade de
se conhecer a clara proposição de sua finalidade, porque o
conhecimento do objetivo da investigação ou da informação é tão
importante para a estruturação metodológica quanto o
conhecimento do objeto.
Os métodos científicos podem ser agrupados em duas grandes
categorias: o método indutivo e o método dedutivo.
O método indutivo é aquele em que se emprega o recurso lógico-
psicológico da indução (o raciocínio indutivo) que consiste em
concluir acerca do caso geral a partir de casos específicos. A
indução se baseia na generalização de casos singulares
observados. A custa de observar corvos pretos, induziu-se que
todos os corvos são pretos.
O método dedutivo se fundamenta no recursos lógico-psicológico
da dedução (o raciocínio dedutivo que consiste em concluir sobre
casos particulares a partir do conhecimento do caso geral. Sabendo
que todos os corvos são pretos, se alguém pergunta qual a cor do
corvo de Poe, infere- se que é preto.
MÉTODOLOGIA E FILOSOFIA
Como acontece com a teoria do conhecimento e com a lógica, que
são outros capítulos da filosofia, a metodologia (principalmente a
metodologia científica) está tão profundamente entranhada no
conhecimento científico que chega a se confundir com ele. Para
muita gente, ciência é metodologia e toda metodologia correta é
científica. De fato, isto não é inteiramente verdadeiro, mas pode-se
muito bem afirmar que ciência é, ao menos em grande parte,
experiência; e experiência científica depende essencialmente de
seu método. Não pode haver ciência sem verificação (ou
comprovação pela observação ou experiência) e a verificação ou
comprovação científica consiste, fundamentalmente, no emprego
adequado da metodologia de investigação científica. Não há nem
4
5. pode haver ciência ou atividade científica sem metodologia
científica. No entanto, não é possível reduzir a ciência e a atividade
científica à sua metodologia. A ciência é muito mais que a
metodologia científica (como se pretende mostrar aqui).
O termo m ét o d o com qualquer dos seus significados e sentidos
deriva da noção de caminho correto para chegar a um lugar
determinado, o caminho a ser percorrido para ir de um lugar a
outro. Este significado de caminho impregna este conceito.
Enquanto procedimento intelectual comum, o termo método se
refere à maneira como se organiza o pensamento para atingir um
objetivo cognitivo, a organização racional dos dados do
pensamento para cocluir. Enquanto procedimento científico, o
método é reconhecido como o primeiro momento da investigação
científica adequada, a diretiz usada para obter um co-nhecimento
novo.
Todo conhecimento científica é estruturado, inicialmente, a partir
de sua metodologia. Enquanto a metodologia de que se originou
um certo conhecimento constitui sua melhor credencial de
cientificidade.
Pode-se definir m ét o d o como instrumento lógico do conhecimento
que facilita a compreensão da natureza e a intervenção humana
nela.
Por m et o d ol o gi a se denomina quase sempre o conjunto de
m ét o d o s ; ou o capítulo da Filosofia dedicado ao estud o do m ét o d o .
Uma vez que os métodos de uma ciência devem guardar relação
absoluta de dependência com seu objeto, o seu alcance enquanto
instrumento do conhecimento é definido, de um lado, pelos limites
do objeto estudado e, de outro, pelas suas próprias limitações
teóricas ou práticas para conhecer aquele objeto.
Quando se fala em m ét o d o filosófico , sempre se quer referir um
instrumental lógico de grande amplitude de abrangência que
possibilite estudar e o conhecer toda a natureza (e tudo o que
existe nela) da maneira mais confiável que for possível com os
recursos disponíveis naquela momento do conhecimento. Como o
objeto da filosofia é todo o mundo e tudo que acontece nele, sua
metodologia tem que abranger tudo o que existe.
Mais que qualquer outra atividade, é a contribuição que dá ao
método filosófico que caracteriza um filósofo moderno. Atualmente,
são chamados filósofos os grandes pensadores, aquelse que
produziram sistemas doutrinários capazes e modificar, de forma
mais ou menos importante, a visão do mundo que vigorava até
então.
5
6. Neste texto, como já se afirmou anteriormente em mais de uma
oportunidade, a palavra filosofia (e as que derivam dela) será
sempre empregada com significado preciso, como uma conc e p ç ã o
global da naturez a , da soci e d a d e , do pens a m e n t o , do univers o .
Uma visã o do mund o . Uma conc e p ç ã o do mund o , da qual dec orre
uma det er mina d a forma de conduta . Especialmente, uma certa
conduta cietífica.
E, como já se disse anteriormente e como ficou implícito na sua
definição, a filosofia tem como objeto o universo, a natureza, a
vida, o pensamento, o homem, o próprio conhecimento; enfim, tudo
o que existe, suas causas e o seu desenvolvimento. Mas estuda
este objeto como uma totalidade e uma unidade.
Por causa da dimensão totalizadora dada pela grande abrangência
da filosofia, o objeto da filosofia ultrapassa e contém o campo de
todas as ciências; abarca toda as ciências sem, contudo, pretender
substituí-las no estudo particular de sus objetos específicos; assim
pois, a filosofia pode ser considerada, a partir deste ponto de vista,
a mais global e a mais abrangente de todas as modalidades de
conhecimento, incluído aí, o senso comum e o conhecimento obtido
em todas as ciências simultaneamente.
Como o objeto da filosofia tem esta vasta extensão, análogamente,
o m ét o d o filosófico será um instrumento de conhecimento do
mundo considerado como totalidade, como premissa e resultado da
concepção do mundo que o emprega.
Tanto quanto acontece às ciências, o grau de desenvolvimento da
filosofia será tão maior, quanto mais eficiente, correta e adequada
for a metodologia que empregada nela. Analogamente, a
metodologia de qualquer ciência, será tão mais aperfeiçoada,
eficiente e adequada, quanto maior for o conhecimento acerca do
objeto e quanto mais desenvolvido for o sistema teórico no qual
aquela metodologia for engendrada.
Princípios Gnosiológicos da Ciência
Gnosiologia é o capítulo da filosofia que tem como objeto o
conhecimento, sobretudo sua estrutura e os procedimentos
objetivos e subjetivos empregados em sua obtenção. A gnosiologia
do conhecimento científico denomina- se episte m ol o gi a ou
cientologia, duas denominações para a disciplina filosófica que tem
o conhecimento científico por objeto. A prática científica, como
procedimento gnosiológico (instrumento do conhecimento
verdadeiro) está subordinado a uma série de princípios que vale a
pena conhecer. Tais princípios da gnosiologia científica são: 1
1
Bunge, M., Ciência e Desenvolvimento, Itatiaia/EDUSP, 1980.
6
7. 1. O conhecimento científico é factual e é elaborado combinando a
experiência sensível e a razão.
2. Todo processo de conhecer consiste em lidar com problemas
(identificá- los, apresentá- los e resolvê- los).
3. Toda solução proposta para resolver um problema só pode ser
tida como cientificamente aceitável se puder ser comprovada
objetivamente.
4. O conhecimento científico pode ser comprovado pela observação
ou pela experimentação, desde que tais procedimentos sejam
formulados, realizados e comprovados de modo aceitável naquele
momento da evolução científica.
5. Os processos mentais empregados durante a execução das
operações empíricas de verificação não devem influir sobre estas
operações ou os fatos que as compõem (principalmente sobre os
instrumentos de observação), nem sobre os resultados obtidos.
6. O conhecimento científico de ser considerado como parcial,
provisório, relativo<$FMesmo nos casos em que não for relativo,
isto não é possível de ser identificado. > e aperfeiçoável (porque,
mesmo se não o for, pois, pode não ser, não se pode saber qual
será este caso).
7. O conhecimento científico pode ser aperfeiçoado de modo
gradual pela acumulação gradativa de informações ou em saltos
(ou revoluçòes científicas) quando se alteram paradigmas.
8. O conhecimento científico quase sempre é indireto e simbólico.
9. O objetivo da ciência é descobrir as leis que regem as diferentes
manifestações da realidade para explicá-las, predizê-las e agir
modificando- as.
10. As melhores teorias científicas são as que combinam amplitude
e profundidade, assim como verdade (aproximada) e
compatibilidade com outras teorias em um mesmo campo de
pesquisa ou em campos afins. E os melhores dados são os que
permitem enriquecer ou por à prova as melhores teorias existentes,
ou estimulem pesquisas que possam produzir melhores teorias.
Métodos Filosóficos
Os métodos filosóficos , como já foi mencionado atrás, são
instrumentos lógicos do pensamento destinados a promover o
conhecimento do mundo em seu nível mais elevado de
generalização. São, portanto, maneiras organizar o pensamento em
busca do conhecimento que seja o mais amplo possível, porque já
7
8. se sabe que, enquanto o objeto de uma ciência se compõe de um
círculo mais ou menos restrito de objetos, a Filosofia abrange tudo
o que existe.
Os métodos filosóficos abarcam e ultrapassam os métodos de
investigação de todas as ciências sem que devam ser confundidos
com cada um deles em particular ou com uma simple soma deles
todos. Ao contrário dos métodos das ciências, que se restrigem a
seus objetos específicos (e, muitas vezes, a estratos particulares
deste objeto), os métodos filosóficos têm enorme escala de
abrangência, podendo ser empregados como norteadores da
metodologia do estudo científico de qualquer dimensão da
natureza; desde o campo específico de uma ciência em particular,
até o estudo de tudo o que existe, como na Filosofia.
No entanto, esta transposição das categorias gerais para os casos
particulares ou para entidades específicas deve ser feita com
extrema cautela para evitar a super-simplificação mecânica, muitas
vezes motivada pelos interesses ideológicos do operador; da
mesma maneira que não se deve transportar os achados científicos
de um nível para outro da natureza ou de uma ciência para outra.
Ainfluência do pensamento ou das crenças do operador de um
método nos resultados obtidos é um fator muito conhecido de
tendenciosidade .
A tendenciosidade em ciência é um fator de erro causado por
alguma coisa (objetiva ou subjetiva, individual ou cultural) que
dirige ou influi nos resultados de uma investigação.
Muito esquemáticamente (e de maneira não isenta de muita crítica,
principalmente por super-simplificação), é bastante possível sub-
dividir os métodos filosóficos em dois grandes grupos: o m ét o d o
dialético e os m ét o d o s não dialéticos , (que muitos filósofos
denominam m et afísicos , com este sentido de não dialéticos ).
Os métodos não dialéticos (que costuma ser chamados metafísicos,
porque foram empregados pela metafísica clássica) e o método
dialético representam etapas di-ferentes e progressivamente mais
aperfeiçoadas da evolução das possibilidade de organização do
pensamento filosófico e científico. Os raciocínios não dialéticos são
considerados pelos adeptos da dialética marxiana como maneiras
mais primitivas (pré-dialéticas) do homem utilizar seu pensamento
para resolver problemas lógicos mais gerais e desvendar os
segredos da natureza, da sociedade e de si mesmo.
O método filosófico dialético é aquele que, consoante o estado
atual do conhe-cimento filosofico realista e ao realismo científico,
parece corresponder melhor à necessidade cognitiva de
corresponder à maneira como os fatos acontecem na realidade,
8
9. constitui uma etapa superior de raciocinar para conhecer e pode
ser tido como um aperfeiçoamento metodológico.
Tanto os métodos não-dialéticos quanto o método dialético pode
ser identificados e reconhecidos por algumas características
essenciais que os tipificam e que são expostas logo a seguir.
O realism o ou mat erialism o é uma perpectiva do conhecimento
dirigido para as coisas da realidade, para o conhecimendo do
mundo material, da realidade objetiva. que existe fora do homem
que o observa e independente dele.
É possível considerar uma diferença sutil entre o realismo (menos
os realistas escolásticos medievais, que não o foram) e o
materialismo. Entretanto, isto será ignorado neste texto.
Os realistas e os materialistas valorizam mais a realidade, as coisas
do mundo objetivo que a produção mental (mitos, crenças, idéias.
palavras). Já os não realistas (idealistas, posivistas, neopositivistas,
fenomenologistas e outros) valorizam mais o produto da
subjetividade.
Características dos Métodos Não-Dialéticos)
Os métodos filosóficos (aqueles que detêm maior abrangência) que
podem ser genericamente denominados de m etafísicos (além da
física, além da matéria) podem ser caracterizados, grosso modo,
por algumas características essenciais que permitem seu
reconhecimento.
Aqui se emprega o termo metafísico com o sentido que foi
empregado por Aristóteles, o que está além da física, entendo
como reprsentação de uamtranscedência. Atualmente, o termo
teve seu significado bem muda e é emprgado com o sentido do que
aqui se denomina ontologia.
As características essenciais dos métodos filosóficos não dialéticos
são:
tendência à concepção estática de coisas imutáveis,
ordenação estática e uma classificação perene,
tendência a considerar as coisas e situações como imutáveis.
Os idealistas e a maior parte dos autores posivistas tendem a
empregar os recursos metodológicos aqui denominados não
dialéticos. E esta é uma das características mais importantes de
sua práxis cognitiva.
9
10. Abaixo se explica um pouco mais as características essenciais
inerentes aos métodos filosóficos aqui chamados não dialéticos
(que muitos autores preferem denominar metafísicos).
= 1. Considerar a natureza e todas as coisas que nela existem
como algo estático, imutável; tendendo a buscar uma substância
ess e n ci al nas coisas e nos fenômenos - “ a naturez a da coisa e m si ”
que seria permanente e incapaz de ser essencialmente
transformada; ou considerar as coisas como exteriorizações
aparentes de um espírito sobrenatural, de uma divindade, de uma
idéia que as representem ou das palavras que as simbolizam.
= 2. Procurar uma classificação estática e definitiva dos objetos e
fenômenos, visando a uma sistematização perpétua e estável da
natureza, e considerando cada objeto ou fenômeno como
diferenciado e isolado dos demais, ao invés de considerar o
significado de suas relações.
= 3. Atribuir uma natureza e um significado absolutamente singular
a cada objeto ou fenômeno e, por isto não valoriza as relações
entre eles. Considera- se os objetos, sejam fenômenos, conceitos ou
categorias e seus opostos como inconfundivelmente separados.
Pressupõe que os objetos e fenômenos estão divididos em grupos
diferentes, senão opostos e incomunicáveis. Um objeto é bom ou
mau, feio ou bonito; não sendo admitida a possibilidade de ser, ao
mesmo tempo, bom e mau, feio e bonito (maniqu eís m o ).
Há quem considere estes atributos do pensamento metafísico,
centrado nas coisas, como característico do pensamento conceitual
ou categorial. Isto não é verdade. Pensando-se dialeticamente ou
não, pode-se obter conceitos e categorias.
Nem se deve pensar dogmaticamente supondo que o raciocínio
dialético obrigue a pesar, sempre e unicamente, nas relações e
nunca nas coisas. Pensar dialeticamente reside extamente em
pensar nas coisas e em suas relações como um processo dinâmico
e permanente; em não separar as coisas de suas relações.
O modelo não dialético de raciocínio metodológico (chamado
m et afísico por muitos autores) se fixa nos conceitos
prioritariamente e, no máximo, só secundariamente considera as
relações reais entre as coisas representadas por aqueles conceitos.
Enquanto que o estudo dialético considera as relações os conceitos
como representações mentais de coisas reais (concretas ou
abstratas) e as relações conceituais como representações das
relações entre as coisas. O objetivo primário do pensamento
realista deve ser o conhecimento das coisas; por isto, encara o
conceito e as relações conceituais como reflexos mentais e
simbólicos da realidade.
10
11. Os conceitos enquanto sínteses e reflexos das coisas e seus
atributos conhecidos e as relações conceituais como sínteses das
relacões entre as coisas.
Também o método classificatório não é istrumento metafísico por
excelêncoa. Ao contrário, desde sua origem, é um procedimento
dialético, embora seja muito empregado pelos positivistas (mas,
estes, centram sua atenção nas coisas classificadas; enquanto os
dialéticos se preocupam com as relacões das coisas classificadas
entre si e com as demais coisas do mundo.
O pensamento dialético tem sido, necessariamente realista (ou
materialista). Pressupõe o predomínio das coisas no mundo, ignora
ou nega os espíritos e subordina as idéias e as palavras às coisas
(que as idéias representam e que as palavras simbolizam).
Enquanto que a metodologia não dialética (ou metafísica)
cosntuma ser dirigida pelo pensamento idealista tem as coisas
como sempre secundárias (aos espíritos, às idéias ous às palavras).
E esta diferença se revela essencial no se entedimento e no
entendimento dos seus resultados cognitivos (inclusive científicos).
Características do Método Dialético
O chamado método filosófico chamado dialético é um processo de
organização do pensamento filosófico destinado desde sua
elaboração para ser empregado como instrumento lógico do
conhecimento em sua maior escala de abrangência e generalização
(isto é, alcançando todas as manifestações do conhecimento sobre
as coisas).
O método filosófico dialético está dirigido para as coisas como
realidades (ou partes da realidade, coisas reais, portanto) e para as
relações das coisas, estando alicerçado na pressuposição de cinco
princípios que constituem suas características cardinais e tidas
como mais essenciais:
a concatenação universal,
a transformação de tudo o que existe,
a mudança de quantidade em qualidade,
a luta entre os contráriso e
a negação da negação.
A dialética se origina do processo grego (muito usado por Sócrates)
de conseguir a verdade através de perguntas e respostas. Depois,
incluiu a habilidade de classificar as coisas e dividí-las em classes
gêneros e espécies. No século passado Hegel retoma o estudo da
11
12. dialética, a partir de um ponto de vista metafísico, e lhe dá sua
conformação moderna. Mas, foi Marx que formulou sua estrutura
atual como método materialista para descobrir as leis gerais do
mundo (incluindo a natureza, a sociedade e o homem. Por isto
denominou sua doutrina de materialismo dialético.
= O raciocínio dialético pressupõe o interrelacionamento de todos
os fenômenos em permanente transformação, quantitativa ou
qualitativa; esta transformação resulta do conflito de forças opostas
na intimidade das coisas e que cada momento deste processo é a
negação do anterior. O que resulta em um processo de mudanças
que se dá como uma espiral .
As características essenciais presentes no método dialético e que
permitem seu reconhecimento são:
= 1. Tudo se relaciona .
= Ou princípio da interrelação e interdependência de tudo o que
existe na natureza; implica na noção de natureza como grande um
sistema, o macro- sistema natural. Supõe uma interação
permanente entre tudo que existe, que pode ser mais próxima ou
mais remota, mais ou menos evidente; porém existe sempre, em
tudo. Nada pode existir isoladamente. Os fenômenos ou objetos,
quaisquer que sejam, em qualquer condição, devem sempre ser
encarados como parte de uma totalidade. A lógica dialétrica
valoriza mais o estudo das relações que o conheciemnto da coisa.
= A inter- relação organizada entre todos os objetos e processos da
natureza é o primeiro elemento tido como essencial do raciocínio
dialético. A natureza inteira (incluindo seus elementos
componentes) é suposta como uma organização, um sistema
natural.
Daí, a importância que se atribui ao estudo da teoria geral dos
sistemas e sua aplicação em cada nível de organização do mundo.
= 2. Tudo se transforma.
Este conhecido postulado de LAVOISIER e um dos princípios
gnoseológicos de BUNGE (mencionados antes neste capítulo)
resume a segunda característica do raciocínio dialético em sua
maior abrangência possível. Tudo o que existe, é considerado em
permanente movimento, em constante transformação e perene
desenvolvimento. Esta transformação, que pode ser extremamente
lenta ou muito acelerada, está sempre presente em todos os
objetos e fenômenos da natureza. A lógica dialética se fundamenta
no princípio de que tudo o que existe está em transformação, em
movimento. Nada deve ser considerado como imutável; todas as
12
13. coisas devem ser estudadas como um processo ou um
desenvolvimento em transformação.
A imagem do movimento dialético como uma espiral (que gira
continuamente, mas não permanece no mesmo lugar) dá uma idéia
daqueilo que se denomina movimento dialético, dinâmica dialética.
Porque a dinamicidade é um atributo essencial do entendimento
dialético do mundo.
Do que se depreende que as coisas da natureza em constante
transformação não resultam em um amontoado caótico, mas que
exista uma certa ordem (ao menos nos estratos naturais que
estamos estudando); e o que chamamos caos deve ser a
organização sistêmica cuja estrutura e explicação se desconhece,
devendo existir uma ordenação lógica, necessária, ligando cada
etapa do processo de transformação, do desenvolvimento e do
movimento.
3. A transformação da quantidade em qualidade .
Princípio da transformação da quantidade em qualidade deriva do
anterior e é o terceiro postulado fundamental do método lógico
dialético. O movimento enunciado anteriormente pode ocorrer de
duas maneiras diferentes: a) transformações ou mudanças apenas
na forma, na aparência, sem atingir a essência do fenômeno ou
objeto - as mudanças quantitativas; ou b) alterações na própria
natureza essencial do objeto ou fenômenos, gerada, em
determinadas condições, inclusive pelo acúmulo de mudanças
quantitativas o que pode ser denominado salto ou transformação
qualitativa.
O pensamento dialético tende a não separar o quatitativo do
qualitativo (o que é característico do pensmaneto metafísico
clássico). Os que aplicam o método dialético não consideram haver
uma contradição antagônica (inconciliável, insintetizável) entre a
qualidade e a quantidade, ao contrário, supões estes dois conceitos
como categorias dialéticas mais típicas. Sabe-se que em
determinadas circunstâncias, é bastante comum que o acúmulo de
mudanças quantitativas em um processo provoque uma mudança
qualitativa (chamada salto qualitativo ou revolução).
O pensamento dialético trabalha com os conceitos de quantidade e
qualidade. Não se aprisiona em um único deles, nem considera
havar uma diferença estanque e insuperável que os separe. A
qualidade se diferencia pela presença ou ausência de um atributo.
Não significa valor. Por isto, nas elaborações psicopatológicas não
confere às alterações chamadas qualitativas significado maior ou
menor que às quantitativas.
13
14. Denominam- se cate g orias dialéticas justamente às unidades
totalizadoras resultantes de conceitos-chave, aparentemente
opostos mas que não podem existir, sequer como idéia, se um
estiver isolado do outro, como bem e mal, feio e bonito, falso e
verdadeiro, sadio e doente, doença e doente.
= 4. O princípio da unidade e luta entre os contrários .
Este é mais um princípio esencial que caracteriza a organização
lógica do pensamento dialético (que fundamente o chamado
método filosófico dialético), e pressupõe que a transformação, a
mudança, o movimento constante que ocorre em tudo na natureza,
resulta de uma tensão interna que é gerada pela oposição ou
contradição de forças opostas, existentes no interior do objeto,
fenômeno ou sistema considerado. Esta característica do método
dialético para conhecer afirma a unidade real existente entre todas
as coisas e tudo o que sucede a estas coisas em um mesmo
processo, apesar de sua aparente diversidade.
Para os dialéticos todas as funções das coisas, como as
contradições, por exemplo, seriam decorrentes de suas relações. Ao
contrário, os funcionalistas privilegiam as funções e subordinam
suas as relações a elas. O que é a essência do se denomina
funcionalism o .
O funcionalismo (organicismo e estruturalismo) é uma metodologia
filosófica de de origem positivista e, portanto, de natureza
materialista mecanista, muito empregada nas ciências sociais como
uma alternativa ao materialismo marxista, que encara os sistemas
sociais como organismos perfeitos cujos elementos estão
harmonicamernte vinculados entre si por suas funções. Considera
que os conflitos, as crises e as contradições sociais seriam
alterações mais ou menos patológicas que exigem solução, até que
se reestabeleça a harmonia, o equilíbrio. O funcionalismo é uma
manifestação do idealismo no qual a funçã o faz as vezes de
espírito, idéia ou palavra. A superestimação da função sobre a coisa
funcionante é sua característica principal.
O funcionalismo é um instrumento teórico do positivismo, do neo-
positivismo e de outrasescolas materialistas surgidas desde o
século passado. Sua inclusão, por autores marxóides e marxistas,
junto com tudo que não é dialético, como m et afísico , parece
inexplicável, a não ser como um ato hostil. Que, aliás, pode ser
explicado pela atitude religiosa que frequentemente assola a
ciência e transforma os divergentes em hereges.
= 5. A negação da negação .
14
15. É o quinto pressuposto fundamental da lógica dialética e uma
decorrência natural dos anteriores. Se tudo se transforma, se tudo
no universo está em perene movimento, em constante mudança
(seja quantitativa, seja qualitativa) cada um dos momentos deste
processo, cada uma das etapas desta cadeia de transformações é a
negação do momento ou etapa anterior. Este momento que foi a
negação do anterior, será negado pelo momento seguinte; a cada
momento, novas formas são criadas pela superação (negação) das
formas envelhecidas; o que hoje é novo, cedo ou tarde envelhece e
é substituído pelo mais novo. Sempre.
Cada etapa do processo, se origina da etapa anterior; cada
momento do processo de transformação é uma negação de si
mesmo, na medida em que traz dentro de si a premissa do
momento seguinte que há de superá-lo.
O paradigma científico-natural do mundo e da existência, em
princípio, concebe o mundo e a natureza submetidos a uma lógica
que pode ser desvendada, controlada pora leis (as leis naturais)
que regem sua ordenação sua descoberta permite explicar e prever
seu desenvolvimento. Tem como verdade que a atividade científica
deve ser o instrumento empregado para descobrir e reco-nhecer
estas leis e este ordenamento.
A tarefa fundamental da ciência é a descoberta dessas leis; e isto,
no campo específico de cada ciência, no estudo de seu objeto,
depende da utilização da metodologia mais eficaz. Por isto, a
aplicação dos princípios e leis da metodologia filosófica não podem
ser transpostos direta e imediatamente para as metodologias
específicas de cada atividade científica, da mesma maneira que não
se podem transpor conclusões acerca de uma certa ciência ou
aspecto do mundo para outra ciência ou outra dimensão da
realidade.
Os métodos científicos, grosso modo, se distribuem em três
grandes grupos de caminhos do pensamento para buscar o
conhecimento: os racionalistas (baseados na racionalidade, do
processamento lógico dos dados), os e m piristas (fundamentados na
capacidade dos homens perceberem o mundo através de seus
sentidos) e os dialéticos que empregam a síntese dos dois tipos
anteriores (porque os dialetas não reconhecem qualquer
antagonismo entre eles, ao contrário, pensam- nos como
intercomplementares e combinam a racionalidade com a
sensibilidade, enquanto recusam suimultaneamente o racionalismo
e o emprirsmo extremados).
É conveniente e importante destacar que estes procedimentos
metodológicos, aqui reconhecidos como métodos filosóficos, não
devem ser aplicados ou transpostos mais ou menos
mecanicamente para o conhecimento científico de algum aspecto
15
16. particular da pesquisa sobre o homem, a sociedade ou a natureza.
Os métodos filosóficos não devem ser entendidos senão como
diretriz metodológica para orientar a construção da metodologia e
da metódica da ciência. Uma diretriz metodológica que pode
permitir aferir sua confiabilidade e validade. Não pode ou deve
substituí-la.
O mesmo se pode afirmar para todas as diretrizes gerais, qualquer
que seja seu grau de abrangência, desde que formuladas como
teorias. A preocupação de ser ortodoxo em sua aplicação tem
produzido muita tolice e, até, servido para justificar muitas
condutas estúpidas e desumanas.
A experiência de tentar forçar a aplicação da metodologia filosófico-
religiosa à metodologia das ciências particulares e a procedimentos
científicos específicos resultou em situações extremamente
ridículas (se não fossem trágicas) e historicamente indefensáveis
como a Inquisição católica na Espanha, em Portugal e na Alemanha,
a Inquisição calvinista na Suissa e certos procedimentos estatais,
como o lisenkismo da União Soviética.
Metodologia, Ciência e Filosofia
Já se viu que a metodologia é o capítulo da Filosofia que estuda a
doutrina, a estrutura lógica e a qualidade prática dos processos e
procedimento de obtenção do conhecimento, especialmente do
conhecimento científico por meios racionais e pela verificação
controlada.
Um m ét o d o científico consiste em um sistema ordenado de
conhecimentos, técnicas, procedimentos e regras de investigação
que sejam previamente estabelecidas para obter conhecimento
através da descoberta das regularidades existentes no mundo.
Quando se estuda a metodologia científica a partir da contribuição
filosófica, verifica-se que os métodos da ciência dependem de três
princípios capazes de influir em seu desenvolvimento:
a) o princípio da subordinação do método ao seu objeto, às suas
motivações e à sua finalidade,
b) o princípio da dependência do método a um sistema teórico de
referência e
c) o princípio da dependência da metódica às possibilidades
metodológicas e técnicas do momento histórico.
Estes três princípios da metodologia devem presidir a elaboração
de quaisquer procedimentos científicos de investigação do mundo.
16
17. Por isto, podem, ser denominados como pressupostos filosóficos da
metodologia científica.
Em geral a consideração destes pressuposstos metodológicos
genéricos possibilitam a elaboração de metodologias científicas
mais eficazes e, sobretudo, menos tendenciosas dos que as que
não os levam em conta.
Pressupostos Filosóficos Básicos da Metodologia
Os princípios mencionados acima, induzem quatro pressupostos
filosóficos que norteiam a edificação e a execução de todas as
metodologias dirigidas para a obtenção de conhecimento.
Tais pressupostos são:
a<S>1, o primeiro pressuposto assinala que nenhum construto
(seja teoria, proposição ou conceito) pode ser considerado
científico, enquanto não gerar hipóteses testáveis empiricamnte
para verificação de seu conteúdo;
a<S>2) o9 segundo pressuposto da metodologia científica define a
subordinação do método de investigação ao objeto investigado;
a<S>3) o terceiro pressuposto filosófico da metodologioa científica
se refere à subordinação do método de investigação aos motivos
reais da pesquisa;
a<S>4) o quarto pressuposto da filosofia do conhecimento aplicado
á metodologia científica destaca a subordinação do método de
investigação aos seus propósitos reais;
a<S>5) o quinto pressuposto filosófico que preside a metodologia
científica assinala a existência necessária de uma referência teórica
em qualquer procedimento metodológico científico.
Estes pressupostos metodológicos extraídos da filosofia do
conhecimento científico encerram o que á de essencial naquela
área do conhecimento.
As teorias, proposições e conceitos científicos
geram hipóteses empricamente testáveis
Os construtos científicos, para serem considerados científicos,
forem quais forem sua complexidade e sua natureza, devem gerar
hipóteses que presumam sua falsidade.
17
18. Todo método de investigação (ou de intervenção)
está subordinado ao seu objeto
Inicialmente, destaque- se a interação existente entre os método e
o objeto que é mais ou menos óbvia em todas as modalidades do
conhecimento. Mesmo o senso comum a reconhece. Nenhum
mecânico buscaria realizar um trabalho com uma ferramenta
incompatível com o maquinismo que pretende consertar.
Este pressuposto traz a marca essencial do realismo científico (e
filosófico). O objeto real determina o método (dimensão ideal). O
pressuposto idealista consiste no oposto: o método determina o
objeto. Mas esta proposta idealista é muito mais difícil de sustentar
que outros pontos de vista análogos.
Neste ponto do conhecimento metodológico e epistemológico
coloca iniciaalmente a interação existente entre a metodologia e a
ontologia, que não podem nem devem ser considerados como
conhecimentos estanques, incomunicáveis ou independentes.
A ontologia e a metodologia são ramos da filosofia completamente
interdependentes. Aqui também se põe a relação da objetividade e
da comprobabilidade como requisitos essenciais de cientificidade. O
estudo da metodologia (científica o qualquer outra) obriga à
delimitação de seu objeto, sem o que, ficará necessariamente
incompleto e tendencioso.
O pressuposto filosófico da subordinação do método ao objeto
também pões em evidência a integração da epistemologia com a
metodologia, enquanto põe em relevo as dificuldades para
construir uma metodologia da investigação médica sem um
entendimento ontológico do homem, do homem enfermo e da
enfermidade. a não ser que se pretenda reduzir o ser humano a
suas variáveis biológicas, o que não faz sentido dentro de ume
perspectiva humanista e dialética.
A natureza extremanente complexa do ser humano, sobretudo de
seu psiquismo, implica necessariamente em ocasionar uma
dificuldade particular para seu estudo científico. Principalmente por
causa de sua característica de pertencer, ao mesmo tempo, a dois
mundos: o mundo da natureza e o mundo da cultura.
Os métodos sofrem influência dos motivos que os
originaram
Em segundo lugar, deve-se destacar que qualquer procedimento
científico sofre a influência, mais ou menos evidente, dos motivos
que determinam sua realização. Entretanto, quando se tratar de
18
19. ponderar a influência da estrutura de motivação no
desenvolvimento de qualquer atividade (individual, interpessoal ou
social), deve-se buscar diferenciar os motivos reais dos motivos
anunciados.
É bastante diferente quanso se investiga uma substância para
descobrir seu possivel valor terapêutico em uma certa condição
pataológica ou investigar uma substância para reforçar sua
publicidade como produto farmacêutico no mercado. Esta
diferenciação é importante porque é muito comum que os motivos
anunciados existam unicamente para encobrir os motivos reais
ocultados ou que lhes sejam completamente secundários.
Este pressuposto põe em cheque a crença na neutralidade da
ciência e reforça a necessidade de existirem mecanismos e
procedimentos para evitar esta tendenciosidade e para promover a
avaliação permanente da fidedignidade e da validade do
conhecimento científico.
A estrutura de motivação real de uma atividade qualquer pode
coexistir e se confundir com seus falsos propósitos e isto acontece
na ciência. Deve-se evitar a tendência reducionista de
supersimplificar processos complexos como são as estruturas de
motivação dos seres humanos.
Os métodos sofrem influência dos propósitos para os quais foram
construídos
Este pressuposto filosófico sobre os métodos para conhecer
ressalta a impossibilidade de haver método cognitivo,
principalmente um método de investigação científica, sem
consciência de finalidade ou dos propósitos daquela atividade. Todo
procedimento científico configura um ato ou um sistema de atos
voluntários e conscientes. A consciência dos propósitos e a
intencionalidade da atividade assinalam todas as ações voluntárias
(inclusive, ou principalmente, a investigação científica).
Aqui, deve-se repetir o aviso mencionado no estudo do pressuposto
anterior. Nem sempre os propósitos reais são os objetivos
publicados.
Este princípio metodológico geral, o pressuposto filosófico da
voluntariedade consciente da atividade humana (inclusive da
metodologia), se choca com os inconscientistas que nega ou
subestima a consciência e com o preconceito condutista que nega a
voluntariedade da conduta humana.
19
20. Existe uma referência necessária em cada recursos metodológico
que deva ser tido como científico
Todo recurso metodológico (método, metódica, técnica ou
procedimento técnico), para ser considerado como científico deve
estar apoiado em conhecimento científico estabelecido como uma
teoria aceitável legitimamente. Isto significa que toda metodologia
científica deve estar subordinada a um enunciado teórico de
referência, ainda que isto não seja imediatamente aparente.
Este princípio fundamental da metodologia científica se
substancializa na necessidade do método científico (qualquer
método de investigação científica ou, mesmo, qualquer
procedimento decorrente deste método) estar apoiado em uma
teoria cientificamente reconhecida que lhe garanta estatuto de
cientificidade. Nenhuma metodologia científica pode existir sem
apoio em certos marcos teóricos que permitiram sua construção e
possibilitam seu emprego.
Considera- se a existência de uma teoria de referência como
fundamental para toda elaboração metodológica científica. Por isto,
quando uma teoria não está explicitada em uma formulação
metodológica, nem estiver claramente implícita em sua aplicação
ou quando sua existência é negada, (deve- se desonfiar de que há
um transtorno da comunicação, que se está lidando com um tolo ou
um esperto).
E, quando se der este caso, deve-se tratar de buscá-la. Porque,
quando ela for encontrada, provavelmente, há de explicar a razão
da negação (sendo muito provável que esteja relacionada com a
estrutura de motivação ou com os objetivos da atividade..
Todos os sistemas de procedimentos suficientemente dotados de
cientificidade que, por isto, podem ser denominados m ét o d o s
científicos ou aplicaç õ e s científicas , estão sempre baseados em
uma teoria científica (seu sistema teórico de referência ou suporte)
que podem estar expostas ou ocultas. As teorias científicas
constam de um conjunto sistêmico de conceitos, categorias,
definições, juízos, hipóteses, constantes, variáveis e indicadores
que são empregados para construir conhecimentos científicos.
Deve-se desconfiar de um método (recurso metódico, procedimento
metodológico ou técnico) que pretenda ser ateórico. Isto não
existe. Só pode ser uma proposição errada, fruto de
desconhecimento ou tentativa de encobrir um engodo. É bastante
provável que a declaração de ateoricidade, substitua a recusa do
emprego de uma metodologia axiomática na investigação científica
factual. Este procedimento de investigação factual vai definido logo
adiante.
20
21. Não existe proposição ou procedimento científico de investigação
que não esteja fundamentado em uma estrutura téorica que lhe
sirva de referência denominada sistema teórico de referência
daquele procedimento ou enunciado. Toda metodologia científica
presume uma referência teórica. Por isto, quando esta regra é
violada, deve-se recusar a esta atividade ou formulação
metodológica qualquer status de cientificidade. Ainda que seja
muito comum que tal sistema teórico de referência seja ignorado
pelo aplicador cego de uma técnica ou seja escamoteado
intencionalmente por esperteza.
Princípios da Metodologia Científica
Além dos grandes pressupostos filosóficos gerais que influem na
metodologia de investigação da ciência e que foram expostos
acima, a metodologia e a metódica de qualquer ciência ou
atividade científica devem estar subordinados a alguns outros
mandamentos tão importantes quanto os primeiros que também
devem ser considerados como norteadores da atividade científica
ou princípios metodológicos das ciências factuais.
A qualidade da escolha e da aplicação da metodologia na atividade
cognitiva científica pode ser determinada pelos seguintes princípios
metodológicos
Os princípios fundamentais da metodologia de investigação
científica são os seguintes:
a) princípio da necessidade do método para caracterizar qualquer
atividade científica;
b) princípio da subordinação do métodos e da metódica aos co-
nhecimentos existentes e aos recursos técnicos disponíveis (ou
princípio da possibilidade);
c) princípio da consciência social de sua necessidade e do
investimento social (ou princípio da necessidade);
d) princípio da eticidade;
e) o princípio da prédefinição do método;
f) o princípio da objetividade metodológica e
g) o princípio da reprodutibilidade dos procedimentos científicos.
21
22. a) princípio da necessidade do método para caracterizar qualquer
atividade científica
O primeiro princípio diretor da metodologia científica, bastante
óbvio e evidente por si mesmo, resume- se no seguinte: quando se
considera a questão da metodologia e a metódica da ciência,
verifica-se que toda atividade cognitiva científica deve dispor de
um conjunto de instrumentos teóricos e práticos específicos para a
investigação de seu objeto; além de meios de conhecimento que
lhe sejam peculiares e que possibilitem comprovar suas hipóteses
tanto no plano da teoria, quanto da prática.
Tais instrumentos de investigação constituem o arsenal
metodológico específico de uma ciência.
Este princípio que fundamenta a metodologia científica se refere à
sua essencialidade e à tendência de se considerar o método como
mera formalidade, exterior ao conhecimento, o que é uma falácia,
dá margem a muito equívoco e a muitas infrações éticas e técnicas:
a metodologia é elemento crucial da busca do conhecimento
científico e deve ser adequado ao objeto e aos objetivos da
investigação.
A metodologia de uma ciência ou de um procedimento científico
não pode ser considerada uma mera formalidade, um elemento
accesório na busca do conhecimento ou um recurso legitimador de
uma atividade social.
Não se pode reduzir uma ciência à sua metodologia; mas os
métodos e as técnicas não devem ser subestimados ou entendidos
como mera formalidade e simples exterioridade em relaçäo à
investigação científica. A seriedade na escolha e no manejo dos
métodos de investigação reflete a confiabilidade que podem
merecer os achados decorrentes de seu uso e denota a correção
ética do pesquisador.
Este princípio fundamental da metodologia científica se opõe à
tendência de se considerar o método como mera formalidade,
exterior ao conhecimento, uma falácia que dá margem a muito
equívoco e a muitas infrações éticas e técnicas. A metodologia deve
ser considerada como elemento crucial da busca do co-nhecimento
científico e deve ser adequada ao objeto e aos objetivos da
investigação.
A metodologia de uma ciência ou de um procedimento científico
não pode ser considerada uma mera formalidade, um elemento
accesório na busca do conhecimento ou um recurso legitimador de
uma atividade social.
22
23. Não se pode reduzir uma ciência à sua metodologia; mas os
métodos e as técnicas não devem ser subestimados ou entendidos
como mera formalidade e simples exterioridade em relaçäo à
investigação científica. A seriedade na escolha e no manejo dos
métodos de investigação reflete a confiabilidade que podem
merecer os achados decorrentes de seu uso e denota a correção
ética do pesquisador.
b) princípio da possibilidade
O terceiro princípio metodológico que norteia a investigação
científica ressalta sua historicidade, na medida em que implica na
subordinação do métodos e da metódica de uma atividade
científica aos conhecimentos existentes e aos recursos técnicos
disponíveis Isto que dizer que os instrumentos práticos de
investigação (a metódica e outros recursos técnicos) dependem da
disponibilidade material (disponibilidade financeira, viabilidade
técnica) e cultural (grau de desenvolvimento e atitude da cultura).
Cada momento da evolução do conhe-cimento fornece condições
objetivas diferentes para explorar as possibilidades metodológicas.
c) princípio da necessidade
O princípio da necessidade (da consciência social da necessidade)
motiva a atribuição dos recursos que a sociedade destina a um tipo
de investigaçào; ressalta a dependência da metodologia científica à
consciência social de sua necessidade, o que é essencial para a
definição dos recursos que necessita.
d) princípio da eticidade
O princípio da eticidade assinala a obrigatoriedade da metodologia
científica estar permanente subordinada a normas ética da
conduta. ãs normas, prescrições e proscrições éticas gerais da
humanidade, aos valores vigentes em cada cultura, especialmente
da cultura científica e das normas instituídas em cada atividade
científica particular (como a medicina, por exemplo).
e) o princípio da prédefinição do método científico
Quando se tratar da avaliação de um procedimento de
investigação, a questão metodológica, em princípio, se inicia na
avaliação do conjunto de métodos e procedimentos específicos
empregados, destacando- se que estes devem ser sempre pré-
definidos em cada pesquisa. Pois, sabe-se que basta que se defina
ou se reestruture a metodologia, após terem sido obtidos os dados
a analisar, para que se comprometa a confiabilidade do achado.Por
exemplo, é possível chegar a resultados diametralmente opostos
23
24. na avaliação dos efeitos terapêuticos de uma substância com
possível ação farmacológica, apenas mudando a metodologia de
análise estatística de um mesmo conjunto de dados.
Os métodos científicos devem ser definidos antes da coleta dos
dados ou das informações que vão ser utilizadas. Romildo BUENO,
em aula de psicofarmacologia, comprova como é possível mudar
radicalmente os resultados de uma investigação em farmacologia
clínica, apenas mudando a maneira de processar os dados
existentes.
f) princípio da objetividade metodológica
Toda metodologia científica factual deve ser objetiva, isto é, não
pode se reduzir unicamente à razão e à introspecção ou depender
de características especialíssimas do investigador. Embora, os
procedimentos racionais (inclusive a imaginação) possam e devam
compor a atividade cognitiva científica.
Todo método científico deve ter objetividade. A metodologia de
uma ciência factual deve ser objetiva. Isto é, os meios de que se
vale a atividade científica, em seus procedimentos para a busca de
conhecimento, devem ser objetivos em relação a quem, os utiliza. É
claro que o sistema lógico que preside a observação, a
experimentação, a medição e outros procedimentos de avaliar,
aferir e pesquisar, além das elaborações teóricas dedutivas,
indutivas ou analógicas, são processos subjetivos que envolvem
variados graus de abstração e generalização, mas os conceitos que
elaborarem e as conclusões que permitirem devem se referir,
sempre, a fatos objetivos ou objetiváveis, vez que a ciência é,
funda m e n t al m e n t e , factual .
Nenhum achado teórico-dedutivo deve ser considerado como fato
comprovado científicamente, sem que tenha sido confirmado pela
prática concreta e objetiva, pois comprovar é submeter à prova, re-
experimentar.
O princípio da objetividade impõe que qualquer tipo de
conhecimento ou prática de investigação da realidade, na qual o
resultado dependa de interpretação subjetiva do investigador, ou
de algum outro atributo peculiar seu, ou algum tipo de iniciação ou
revelação mágicas, viola esta exigência de cientificidade e
descaracteriza aquela prática como atividade científica. Não produz
conhecimento científico. Pode até permitir achados verdadeiros
mais ou menos casulamente, mas não, fatos científicos com o
sentido que esta expressão requer e como é utilizada em filosofia
da ciência.
Iniciação é o ato ritual pelo qual alguém é incluido em uma
religião, crença ou sociedade; revelação é o conhecimento
24
25. sobrenatural de uma verdade oculta para os demais. Parece óbvio
que este tipo de dado não possa ser cientoficamente utilisado.
h) princípio da reprodutibilidade dos procedimentos científicos
Todo método científico deve ser reprodutível. Quaisquer
procedimentos de investigação científica devem poder ser
reproduzidos por quem quer que disponha dos mesmos recursos
técnico-metodológicos.
Uma decorrência necessária deste princípio, enquanto traço
necessário característico e essencial das ciências e de toda
atividade científica, é que qualquer investigador, trabalhando o
mesmo objeto e utilizando os mesmos procedimentos, nas mesmas
condições, deve chegar ao mesmo resultado que os outros que
fizeram a mesma coisa em idênticas condições. O que se denomina
princípio da reprodutibilidade e tem sido um dos mais reputados
instrumentos de determinação de cientificidade.
Em resumo, a comprobabilidade da ciência e dos conhecimentos
que podem ser tidos como científicos deve se manifestar na
objetividade de seus métodos, meios e procedimentos de
investigar, além da adequação de tais meios e métodos ao seu
objeto específico.
O rigor metodológico e a confiabilidade e a validade dos
instrumentos estabelecem o grau de comprobabilidade de uma
investigação científica o que se aplica também às conclusões que
ocasiona.
A especificidade, a confiabilidade, a validade, a sensibilidade e
outros atributos dos conhecimento científicos capazes de influir
resultados obtidos pelos instrumentos de investigação são
determinadas pela exigência de comprobabilidade, enquanto
característica essencial da atividade científica.
Os positivistas do século passado e seus seguidores atuais tendem
a supervalorizar o método para caracterizar o que é científico da
pseudociência. Para eles, a ciência teria que dispor de um conjunto
metodológico universal, atéorico e ahistórico que a definisse acima
de qualquer dúvida. Este dogmatismo suscitou a parecimento de
uma atitude cepticista, vontada contra todos os métodos, no outro
extremo improvável do espectro lógico.
Etapas do Método Científico
Existem muitas variantes daquilo que seria uma estrutura mais ou
menos padronizada da Metodologia Científica. Cada autor mostra a
sua e cada uma delas pode ser perfeitamente aceitável.
25
26. Mario BUNGE aponta as seguintes etapas da metodologia científica:
1. descobrimento do problema novo, de um velho problema para o
qual existem novas soluções possíveis, ou de uma lacuna em uma
teoria ou qualquer outro corpo de conhecimentos;
2. exposição precisa do problema (se possível em termos
quantitativos e, de preferência, que sejam termos matemáticos);
3. procura de procedimentos, informações ou instrumentos
importantes para resolver o problema posto (tais como aparelhos,
instrumentos, técnicas, modalidades de cálculo ou recursos
descritivos de medição);
4. tentativa de resolver o problema com o auxílio dos recursos
levantados na etapa anterior,
5. invenção de novas idéias (hipóteses, teorias ou técnicas que
sejam promissores de ajudar na solução do problema);
6. obtenção de uma solução exata ou aproximada (com auxílio do
instrumental ou técnicas escolhidos);
7. investigação das conseqüências causadas pela solução obtida
(previsões ou aplicações práticas do resultado obtido);
8. comprovação da solução (confrontação da solução obtida com o
restante doas dados disponíveis, comprovação do resultado
obtido);
9. correção das hipóteses, teorias, procedimentos ou dados
(quando se reinicia o processo.
Hipótese e Comprobabilidade Empírica
Em uma ciência factual, a verificabilidade ou comprobabilidade
empírica, que é uma de suas características fundamentais e um de
seus elementos mais importantes, se materializa nos
procedimentos de verificação que consistem em operações lógicas
ou metodológicas que se concretizam em procedimentos técnicos
programados para examinar algum juizo sobre alguma coisa,
objetivando saber se o enunciado daquele juízo se trata de uma
verdade ou de um erro.
Já foi visto que cada ciência deverá dispor de um conjunto de
instrumentos e procedimentos teóricos e práticos para aferição das
hipóteses acerca de seu objeto e que tais instrumentos e
procedimentos constituem seu arsenal metodológico para
investigar a fração do mundo que lhe compete estudar.
26
27. Adiante, quando se tratar das diferenças entre as ciências formais e
factuais, há de se saber a característica da verificação, como
procedimento heurístico da comprobabilidade ou verificabilidade
empírica, que se deva chegar à conclusão que o juizo testado se
trata de um erro através da prova de sua falsidade ou da falsidade
de algum de seus postulados básicos; porque a premissa errada
induz a erro de conclusão. E, exatamente por isto, a
comprobabilidade empírica também pode ser chamada de
falsicabilidad e .
Distingue- se a co m pr o b a bilida d e teórica ou comprobabilidade
lógica, praticada na de m o n s tra ç ã o (que é procedimento
característico das ciências formais), consubstanciada na
demonstração da coerência interna dos termos, da
co m pr o b a bilidad e e m pírica (prática ou experimental, típica das
ciências factuais) representada pela co m pr o v a ç ã o ou verificaçã o .
Verificação: Observação e Experimentação
A observação e a experimentação são os dois métodos
tradicionalmente empregados para promover a comprovação da
hipóteses na atividade científica, mas cuja validade persiste até
hoje. A observação e a experimentação são os métodos científicos
por excelência.
Os procedimentos de comprovação podem ser produzidos pela
obs erv a ç ã o (processo lógico indutivo) ou pela ex p eri m e n t a ç ã o
(processo hipotético- dedutivo), os dois métodos tradicionais da
investigação científica. Em geral e na prática, a observação e a
experimentação se sucedem no desenvolvimentos dos
procedimentos de verificação científica.
Em última análise a experimentação consiste na verificação
experimental de um juízo. Este juízo a ser verificado em sua
possível veracidade ou falsidade, já se viu acima, deve ser
denominado hipót e s e . Por isto, tem que ser viável e verificável. A
viabilidade e a verificabililidade são as características mais
importantes da hipóteses. As hipóteses são juízos prováveis que,
embora ainda não comprovadas, devem ser comprováveis com o
emprego dos recursos metodológicos e metódicos disponíveis.
A veracida d e (grau de verdade contida em uma assertiva), a
verossi militud e (probabilidade de ser igual ao verdadeiro) e as
possibilidad e s heurísticas e preditivas da observação são
reconhecidamente inferiores ao da experimentação. Provavelmente
por causa disto, a observação seja considerada como aplicação
metodológica secundária e desimportante na ciência por quem
emprega a experimentação.
27
28. Analogamente, por sua maior probabilidade de veracidade
demonstrada com seu emprego nas ciências naturais, a
experimentação vem sendo considerada por muitos como o
instrumento natural da verificação, mas alguns radicalizaram
demais esta tendência, e para estes, o método experimental é tido
como o único instrumento da verificação, portanto, desqualificando-
se e excluindo- se a observação do arsenal da metodologia científica
destinada à comprobabilidade.
Pela influência desta realidade, da ideologia naturalista e por causa
de interesses materiais concretos de muitos investigadores (como,
por exemplo, o acesso às verbas de pesquisa de organismos oficiais
ou privados), a experimentação foi promovida por muitos a
metodologia exclusiva das ciências factuais, restando à observação,
no máximo, o papel secundário de possibilitar o levantamento das
hipóteses a serem verificadas experimentalmente. Pretender que
aomente a experimentação deva ser considerada como
metodologia resp eitá v el , financiáv el ou aceitáv el é uma tendência
ideológica que deve ser combatida por sua parcialidade.
Esta tendência, que integra a chamada ide olo gi a neo- naturalista ,
pretende fazer crer que as ciências naturais são o modelo
obrigatório para as demais e que a metodologia das ciências sociais
seria insuficiente para produzir verdades científicas. Na Medicina
esta ideologia se revela muito claramente no esforço, muitas vezes
quase comovente de seus autores, de apresentar a epidemiologia,
uma típica interciência de fronteira entre as ciências sociais e as
biológicas, como se fora uma ciência natural. O mesmo acontece
com o assim chamado m ét o d o clínico .
A observação é a essência metodológica dos procedimentos clínicos
de investigação clínica, impropriamente denominado m ét o d o
clínico, porque não é um método, mas uma técnica, uma aplicação
prática do método de observar.
O que se denomina m ét o d o clínico é um procedimento de
observação sistemática de um ou mais casos clínicos e que
caracteriza a investigação médica desde tempos imemoriais e que
foi fixado em sua essência desde o século dezoito. Os
procedimentos experimentais podem lhe ser agregados (e é
necessário reconhecer sua vantagem como instrumento científico
por sua maior capacidade preditiva e heurística) sempre que isto
for possível e não sacrifique os objetivos, a confiabilidade e a
validade do estudo. Os processos experimentais não substituem o
método clínico, completam- no.
A obs erv a ç ã o é o método científico no qual o investigador não
interfere nos fenômenos estudados; divide- se em: observação
subjetiva e observação objetiva.
28
29. A obs erv a ç ã o subjetiva , auto- obs erv a ç ã o ou introsp e c ç ã o , é a
observação de si mesmo; o investigador é sujeito e objeto da
investigação.
A obs erv a ç ã o objetiva se subdivide em direta e indireta , quando o
observador utiliza recursos auxiliares e não apenas seus sentidos
(gravação sonora, filmagem).
Experiência é a confirmação ou tentativa de confirmação,
possibilidade de verificação empírica das hipóteses. De certa
maneira, a experimentação é uma observação reprodutível em que
se pode fazer variar as condições nas quais ela se verifica.
Todo procedimento experimental em ciência deve se subordinar a
alguns princípios que servem como exigências de cientificidade em
metodologia experimental.
CARACTERÍSTICAS ESSENCIAIS
DA EXPERIMENTAÇÃO CIENTÍFICA:
a) O experimentador provoca intencional e sistematicamente o
fenômeno estudado.
b) Deve fazer variar, da maneira a mais controlada possível, as
condições experimentais nas quais faz surgir o fenômeno estudado.
c) De modo que possa isolar uma das condições, mantendo
constantes as demais, para determinar, com a precisão possível,
sua influência real.
d) Ao estabelecer as conexões entre o fenômeno e as condições
nas quais ele ocorre, as condições experimentais devem poder ser
adicionadas, suprimidas ou variar de intensidade de modo
controlado.
Procedimentos para Investigar o Psiquismo
Existem muitos procedimentos que podem ser empregados para
investigar o psiquismo. Genericamente, eles costumas ser ser
agrupados nas seguintes classes:
a) introspecção (auto- inspecção, visão de si mesmo, procedimento
pelo qual o indivíduo examina o que se passa em sua própria
consciência);
b) estudo das manifestações externas do sistema nervoso central
(motricidade, linguagem, conduta);
29
30. c) estudo da atividade nervosa autonômica (sudorese, palidez,
pressão arterial, temperatura corporal, atividade visceral);
d) estudo direto da atividade neural (eletrodos implantados,
consumo de oxigênio pelo cérebro);
e) estudo dos produtos da atividade cultural (produção artística,
resultado do trabalho).
Cada um destas modalidade de procedimentos se materializa em
técnicas que permitem estudar a atividade nervosa e o psiquismo.
Objeções aos Procedimentos Experimentais
em Psicologia e Psiquiatria
O emprego do método experimental, a par de possibilitar grandes
avanços no conhecimento psicológico e psiquiátrico, também tem
provocado algumas objeções bastante pertinentes, não apenas nas
investigações no campo da psicologia e da psiquiatria, mas em
todas as áreas que e em todas as pesquisas que envolvam
investigaçòes experimentais em seres vivos, seja animais ou
humanos
1) seu caráter artificial, distante da realidade natural (os seres
humanos não se submetem ao controle necessário ‘a
experimentação), objeção que aumenta bastante quando se
transpõe para seres humanos os resultados da experimentação em
animais;
2) sua natureza analítica e abstrata, pois estuda como se fossem
isolados, fenômenos que ocorrem sempre integrados a outros na
realidade e a influência de fatores ideológicos, psicológicose
interesses materiais concretos do investigador e do investigado;
3) influência do experimentador (não só na escolha do objeto e dos
recursos metodológicos), mas na conduta do investigado e,
principalmente, em sua interpretação.
Além disto, a investigação em seres humanos coloca problemas
éticos muioto sérios para quem a realiza e que devem ser
consideradas. O Conselho Federal de Medicina e o Conselho
Nacional de Saúde tem normas específicas para esta matéria que
devem ser obedecidas por todos os pesquisadores nesta área.
A estas objeções muito conhecidas e às ponderações éticas, deve-
se acrescentar ainda a tendência a se forçar o caráter experimental
a certos procedimentos de investigação clínica nos quais é mais
adequado empregar a observação, principalmente em
psicofarmacologia, porque aí, o retorno financeiro do crédito obtido
30
31. pela experiência é sempre muito maior. Principalmente quando se
sabe que grande parte significativa das pesquisas
psicofamacológicas que se publica em nosso meio são financiadas
direta ou indiretamente, clara ou ocultamente, pelas empresas que
produzem os medicamentos estudados.
Coisa semelhante acontece no âmbito da indústria fabricante ou
que comercializa equipamento médico de diagnóstico e
terapêutica e agentes farmacológicos.
Esta situação parece muito mais grave quando se dá na
universidade, fornecendo péssimo exemplo de amoralidade para os
alunos. Todos sabem que certos professores são conhecido como:
Fulano do Lab tal Roche, Sicrano da qual, Beltrano de outro e assim
por diante. Cada empresa tem seu plantel que se dedica à pesquisa
ou a publicidade ética ! Seja lá o que se queira dizer com isto, mas
pode-se imaginar a que não é.
Não se sabe até quando esta situação vai poder contaminar o
crédito de professores e serviços universitários sem provocar
alguma reação moralizadora que ninguém pode negar, está ficando
cada vez mais urgente. Urge elaborar um código de conduta para
os professores e investigadores científicos, ao menos na área
médica.
Diferenças Práticas e Metodológicas entre
o Conhecimento Formal e o Factual
Uma das coisas que torna impossível, ao menos no momento
presente, uma metodologia universal para todas as ciências é a
diferença existente entre o conhecimento científico formal e o
factual. E, no interior de cada uma destas grandes áreas as
características específicas de cada modalidade de ciência.
Na intimidade das ciências factuais, as diferenças essenciais que
podem ser identificadas entre aos objetos e fenômenos da natureza
e os processos da cultura, se refletem nas possibilidades e
limitações das ciências que se dão a seu estudo, como se há de
considerar adiante.
Além do que se deve distinguir as dife-renças entre o raciocínio
comum e o raciocínio (indutivo, dedutivo ou analógico) implícito na
atividade cognitiva que pretende ser reconhecida como científica.
O conhecimento formal, procedente das ciências formais,
tem caráter abstrato e seu objeto é composto unicamente
31
32. por idéias com significado precisamente convencionado.
Por isto, pode se utilizar exclusivamente da lógica para
construir rigorosamente suas conclusões e demonstrar
seus teoremas, avaliando seu grau de veracidade em
função da coerência interna de suas proposições que se
manifesta na concordância lógica que existe entre elas.
Já, quando se trata dos conhecimentos produzidos pelas
ciências factuais, porque lidam com conceitos e juízos que
refletem os fatos da natureza ou da sociedade, necessitam
de outros recursos além da lógica formal, para construir
suas conclusões; precisam empregar símbolos
interpretados que representem os objetos e os fenômenos,
não lhes basta a racionalidade interna mas precisam
comprovar a compatibilidade de suas hipóteses com a
realidade.
Nestes dois tipos de conhecimento científicos, aqueles chamados
formais e os factuais, a natureza de seus objetos (idéias na ciências
formais e fatos, nas factuais), lhes impõe necessidades e
possibilidades metodológicas características. de duas maneiras
diversas, como se viu. Nesta área do conhecimento se critério de
verdade se resume à verificação da consistência ou compatibilidade
de seus elementos lógicos entre si.
Mesmo no interior das ciências factuais, existem impecilhos a uma
única estrutura metodológica reunindo todas elas. Na intimidade
das ciências factuais, em obediência ao princípio epistemológico de
que o método deve estar absolutamente subordinado ao objeto,
acontece um fenômeno análogo.
As ciências naturais (porque seus objetos são mais adequados à
experimentação e à quantificação) permitem organização
metodológica e estruturação teórica relativamente mais exigente,
sobretudo pelo emprego da metodologia experimental e do raciocío
dedutivo, como já se mencionou.
Diferentemente do que acontece nas ciências da natureza, na
busca do conhecimento cietífico nas ciências da sociedade, em
função da peculiaridade de seu objeto, encontram- se em um
patamar menos desenvolvido de possibilidades metodológicas e
técnicas porque não desfrutam da possibilidade de empregar o
32
33. método experimental, devendo- se contentar com a observação
como método de investigação, inclusive para comprovar suas
hipóteses, e a raciocinar indutivamente.
Características Essenciais dos Fenômenos e
Processos Sociais
Os fenômenos sociais são extremamente complexos e os conjuntos
sociais estruturados, em geral, apresentam as seguintes
características:
são compostos por outros subconjuntos (famílias, grupos,
associações, corporações, classes e muitos outras entidades
coletivas sistêmicas, além dos constituintes individuais);
cada um destes subconjuntos está integrado por indíviduos que se
mostram sempre bastante singulares em função de suas
peculiaridades e que apresentam grande polimorfismo em suas
relações;
as diferenças que marcam os indivíduos humanos, enquanto
componentes singulares dos sistemas sociais, são muito numerosas
e mostram grande amplitude de variação de indivíduo a indivíduo;
neles, nem sempre as diferenças que apresentam entre si
dependem de alguma característica essencial de seu conteúdo,
sendo, muitas vezes, variações de características acessórias suas
ou de seus agregados coletivos;
é sempre muito mais difícil reconhecer o que seria a essência e o
conteúdo dos fenômenos sociais que nos acontecimentos naturais.
É possível que a limitação metodológica para pesquisar
experimentando seja um estágio metodológica ou tecnicamente
“ imaturo ” das ciências sociais. Porque seu objeto, os fenômenos
sociais, é menos susceptível ou insusceptível de estudo
experimental.
Deve-se reconhecer que nelas, nas ciências sociais e humanas, a
observação deve ser considerada como o método natural de
estudo, por causa da natureza de seu objeto e, nunca é demais
insistir na repetição, a metodologia deve estar sempre subordinada
à natureza do objeto ao qual é aplicada.
Daí porque, pode-se afirmar que é bem mais que possível, é
bastante provável, que a extrema complexidade dos sistemas
sociais e a grande diversidade e singularidade de seus subsistemas
e dos seus elementos individuais, ocasionem seus principais
obstáculos metodológicos; pois, sabe-se que a metodologia de
33
34. qualquer ciência deve ser absolutamente subordinada ao seu
objeto e, por isto, de certa maneira, deve refletir suas
características e peculiaridades.
A complexidade relativa dos fenômenos sociais (em relação aos
naturais) impõem- lhes a necessidade de construir uma metodologia
adequada a esta complexidade e contendo grande capacidade
explicativa e preditiva, para que possam ser estudados
adequadamente. E tal metodologia não existe ainda ao alcance dos
investigadores. Possivelmente por esta razão, existe um grande
esforço para adotar ou imitar a metodologia das ciências naturais
(sobretudo as ciências biológicas).
Mas, muito mais que esta diferença de complexidade, sabe-se que
a natureza qualitativa de muitos dos fenômenos que são estudados
nas ciências da sociedade (da mesma maneira que acontece na
psicologia e na Psicopatologia) dificulta ou, mesmo, impossibilita a
sua quantificação e a programação de procedimentos
experimentais de investigação; por isto, limita sua pesquisa aos
procedimentos descritivos da observação.
A Medicina se situa em curiosa situação no meio destas
contradições por causa de sua natureza de ciência de dois
mundos: o mundo da natureza e o mundo psicossocial.
Enquanto que suas atividades científicas relacionadas com
a patologia e a fisiologia pertencem ao mundo das ciências
naturais e empregam o método experimental hipotético-
dedutivo; as atividades voltadas para a clínica devem se
servir da observação e dos raciocínios analítico-indutivos.
Contradição que oferece oportunidade para muitas
aventuras naturalistas onde só deve caber o método
clínico (não importa se causadas por ingenuidade ou por
esperteza).
As ciências físicas e biológicas, pela própria natureza de seus
objetos, estudam fenômenos quantificáveis e que, por isto,
favorecem as técnicas experimentais de investigação (na
dependência quase exclusiva das possibilidades da tecnologia,
ainda que empregando definições operacionais em sua
dimensionalização); isto, naturalmente, porque tais técnicas
experimentais exigentes de quantificação foram construídas
exatamente para elas; e, por isto, enquanto nas ciências naturais
fica favorecido o emprego do método hipotético- dedutivo como
instrumento teórico, nas ciências da sociedade, pela natureza de
seu objeto, pode-se afirmar que estão como que condenadas a
investigar pela observação e a raciocinar indutivamente. Os
34
35. diferentes procedimentos provenientes da observação são os
recursos naturais das ciências sociais, ao menos no momento atual
de seu desenvolvimento.
Entre as implicações resultantes desta diversidade objetal e
metodológica que se dá entre as ciências naturais e as ciências da
sociedade, que são conseqüentes às peculiaridades de seus
objetos, às diferenças de maturidade metodológica e das
possibilidades técnicas de cada uma delas, destaca-se a
diversidade de suas possibilidades preditivas e de estabelecimento
da verossimilhança de seus achados. Tudo isto explica o motivo
pelo qual as ciências naturais têm maior poder de prever e de
explicar que as ciências humanas.
No entanto, de modo algum estas diferenças devem ser postas em
termos de uma hierarquia de valor entre estes dois tipos de
ciências (e muito mais ainda em termos de “ legitimida d e ” ou de
“ resp eitabilidad e ”), como se faz muito comumente. Porque as
ciências são processos cognitivos que se situam em diferentes
graus de desenvolvimento (ou maturidade metodológica) e isto é o
que determina seu potencial preditivo e explicativo.
Encontram- se diferenças de possibilidades metodológicas e
conseqüentes diferenças heurísticas e prognósticas quando se
comparam as ciências formais com as factuais e as ciências
naturais e as sociais; mas, igualmente, cada ramo de cada ciência
em particular e, até, cada tipo de pesquisa ou projeto específico de
investigação com os demais em uma mesma atividade científica.
Pode-se afirmar que a discussão sobre a hierarquia de valor das
ciências (sobretudo supervalorização das ciências naturais sobre as
ciências sociais, o ne o n aturalism o ), não é apenas uma polêmica
científica, mas essencialmente ideológica, porque em sua raiz e ao
longo de toda sua trajetória histórica, situam- se numerosas
divergências filosóficas e doutrinárias; mas também se encontram
muitas contradições de interesses econômicos, sociais e políticos,
entre outros motivos de discórdia. A todos estes motivos, soma-se
a diversidade essencial dos objetos das ciências naturais (os seres
vivos) e sociais (os entes sociais, estas últimas muito mais
complexas que as primeiras) e se considere a imaturidade
metodológica e técnica (expressa pela limitação teórica da
metodologia analítico-descritiva e da falta de tecnologia de
experimentação) e pode-se explicar estas diferenças de níveis de
cientificidade.
35
36. Procedimentos Metodológicos Indutivos e
Dedutivos
Os dois tipos mais importantes de raciocinar em ciência são a
indução e a dedução. Na elaboração do conhecimento comum,
utiliza-se muito o procedimento analógico, quando a explicação já
comprovada de um caso particular é aplicada a outro caso
particular parecido ou idêntico.
Os procedimentos metodológicos mais genéricos mais comumente
empregados na investigação das ciências são: os proc e di m e n t o s
lógicos indutivos e os proc e di m e n t o s lógicos dedutiv o s .
INDUÇÃO.
Os métodos genericamente chamados indutivos empregam, como
parece óbvio, o raciocínio indutivo como base de sua elaboração
lógica que lhe possibilita chegar a conclusões e elaborar
generalizações.
A induçã o é um tipo de raciocínio e instrumento lógico de
investigação científica que possibilita passar do conhecimento que
se tem sobre os fatos singulares às proposições gerais sobre aquela
categoria de objetos ou fenômenos. Na indução científica, a
conclusão é resulta da atribuição a toda uma classe de objetos ou
fenômenos atributos identificados em alguns elementos desta
classe. Concluem- se sobre o geral a partir do que se conhece dos
casos particulares.
DEDUÇÃO.
A dedução é um tipo de procedimento racional e um processoo
lógico deformular conclusões na investigação científica que consiste
em concluir a respeito de casos particulares a partir de informações
sobre a totalidade que os contenha. As conclusões dedutivas
dependem das chamadas regras de inferência que permitem
derivar uma conclusão dedutiva.
Regras de inferência são regras semelhantes aos axiomas e às
definições operacionais que permitem tirar conclusões a partir de
certas premissas tidas como aceitáveis.
Metodologia e Psicologia
Como a maioria das aplicações científicas que oferecem a
possibilidade de emprego tecnológico imediato de seus
conhecimentos, a psicologia resulta em duas entidades sociais
distintas:
36
37. a psicologia- profissão e
a psicologia- ciência.
Cada uma delas bem distinta da outra, embora, muitas vezes se
superponham na prática, não devem ser confundidas. Aqui, se trata
da psicologia enquanto ramo da ciência, com todas as
características e responsabilidades de qualquer atividade científica.
Como elemento integrante da ciência, a psicologia
científica deve ser, antes de tudo, investigação. E a
investigação científica é, essencialmente, método e
metódica, isto é, exige que lhe sejam disponíveis meios e
procedimentos que se constituam em instrumentos para o
conhecimento cada vez mais amplo e mais profundo
acerca do seu objeto.
A metodologia de uma ciência deve ser um sistema coerente e
harmônico de métodos de investigação vinculados ao seu objeto de
estudo e dependentes das motivações e finalidades que motivaram
sua escolha. Tais métodos de investigação devem se materializar
em uma metódica (repertório de técnicas, processos e
procedimentos) que se harmonizam com esta exigência.
A metodologia da Psicologia, como a de qualquer ciência, não pode
ser reduzida a um conjunto de procedimentos casuais e formais,
independentes de seu objeto e desvinculados de seus objetivos,
resumindo- se a instrumentos facilitadores da investigação. A
metodologia psicológica se destina a estruturar os meios
destinados a descobrir as leis que regem os fenômenos psíquicos, a
conduta e o desenvolvimento do psiquismo. E como o objeto da
psicologia é um ente de dois mundos (o mundo da natureza e o
mundo da cultura), sua metodologia deve estar sintonizada com
esta característica ontológica que é sua. É impertinente tentar
identificar a metodologia da psicologia com uma única destas
dimensões.
A metodologia da investigação medica, por sua vez, destina- se a
fundamentar a investigação das leis dos fenômenos patológicos
que acometem os seres humanos para auxiliá-los.
Princípios Metodológicos da Psicologia Científica
Como todo processo cognitivo sistematizado, a metodologia da
psicologia também deve estabelecer uma interação entre o método
e o seu objeto. Isto significa obedecer a uma série de princípios
metodológicos que norteiem sua aplicação.
37
38. RUBINSTEIN (em trabalho um tanto antigo, mas ainda
perfeitamente válido no que respeita a esta matéria) propõe os
seguintes princípios metodológicos que deveriam ser empregados
para fundamentar e orientar a estruturação dos meios para a
investigação psicológica com pretensão de cientificidade e que, por
isto, devem ser repetidos, ainda que não sejam uma novidade,
porque respondem ainda hoje às necessidades dos investigadores
desta área. Tais princípios são:
1. O psiquismo deve ser estudado como manifestação da unidade
dos fenômenos internos e externos, subjetivos e objetivos. A
primeira tarefa de qualquer método objetivo de investigação,
consiste na compreensão do funcionamento global e na
identificação das contradições principais envolvidas no processo,
tanto no plano objetivo, quanto no da subjetividade. Mas a
atividade global do indivíduo investigado deve ser mais valorizada
do que seus atos isolados. Daí porque, deva-se atentar para a
extrema relatividade dos resultados de testes, questionários,
observação da conduta em situação controlada e outros meios
limitados de investigação. No entanto, por mais objetiva que seja a
metodologia psicológica, ela não pode ignorar a subjetividade, sob
pena de se igualar à fisiologia e à metodologia fisiológica.
2. Embora a metodologia fisiológica tenha dado importante
contribuição à psicologia, a investigação psicológica não deve
ignorá- la, nem pode se resumir a ela, porque seu objeto não é um
ente exclusivamente biológico, tem um componente social e detém
uma identidade ontológica própria. Da mesma maneira, a
investigação psicológica não pode ser resumida à descrição dos
fenômenos, fatos e processos psíquico, como se o funcionamento
orgânico nada tivesse a ver com as manifestações psicológicas; a
observação fenomenológica é importante, mas não exclusiva. A
metodologia fisiológica é indispensável à Psicologia, mas dever ser
considerada secundária em relação aos seus meios peculiares de
investigação.
3. O mesmo raciocínio aplica-se ao enfoque sociológico na
psicologia. A metodologia das ciências sociais tem sido importante
para a psicologia, sobretudo a psicossociologia, mas deve ser
considerada secundária em relação à metodologia psicológica,
devendo- se evitar as conclusões psicológicas derivadas
exclusivamente de premissas sociológicas, por mais assentadas
que pareçam.
4. A finalidade da psicologia- ciência, como acontece a toda as
atividade científica, é a descoberta das leis psicológicas específicas
e de explicaçöes confiáveis de seu objeto que permitam predizer
coisas acerca dele; o comportamento é o objeto e o limite das
possibilidades de generalizar das ciências psicológicas. O processo
38
39. cognitivo de investigação psicológica deve considerar o indivíduo
concreto, dinamicamente integrado na realidade; sem perder de
vista o social, a investigação da psicologia deverá valorizar o
princípio da individualização.
5. Considerando que qualquer processo é melhor conhecido e
estudado no curso de seu desenvolvimento, nos procedimento de
investigação psicológica há que se obedecer ao princípio do
desenvolvimento. A psicologia e a psicopatologia do
desenvolvimento são importantes campos de investigação do
comportamento e são muito úteis para permitir explicá-los.
Contudo, quando se trata de estudar o desenvolvimento
psicológico, não basta estabelecer os graus de transição em cada
etapa do desenvolvimento individual. Além disto, é importante
estabelecer as condições em que ocorre cada uma destas etapas e
quais suas relações com o restante do processo.
6. O conhecimento mais profundo acerca dos seres humanos é
obtido no curso de sua transformação que excede aos limites de
seu desenvolvimento. Todo conhecimento sobre qualquer sistema
operativo será mais eficaz se realizado durante sua operação. O
princípio metodológico piagetiano de que a criança deve ser
estudada enquanto se lhe ensina, deve ser aplicado sem
pedagogizar a psicologia.
7. A metodologia psicológica se fundamenta também no fato de
que é possível conhecer o psiquismo da pessoa através do estudo
dos produtos de sua atividade. Mas a investigação psicológica não
pode ser reduzida ao mero registro mecânico desta atividade, bem
como deve ter presente que é impossível generalizar, de modo
absoluto, padrões standard para o estado psicológico. Deve-se
levar em conta que um mesmo resultado, na dependência de uma
situação concreta, pode significar diferentes conteúdos
psicológicos. Fatores individuais e situacionais podem influir
decisivamente sobre a conduta e não devem ser subestimados.
Estratégias da Ciência
As questões metodológicas em ciência têm um caráter
essencialmente tático ao longo do desenvolvimento científico. Por
isto, BERNAL 2
propõe que se lhe acrescente o aspecto estratégico
(decorrente de seus objetivos mais gerais e de suas metas mais
abrangentes). Como não se pode ignorar os interesses materiais,
políticos e ideológicos envolvidos na investigação ou decorrentes
de seus achados.
Tática , palavra de origem grega que significa dispor as tropas em
uma certa posição para a batalha de forma a tirar a maior
2
Bernal, J.D., Historia Social de la Ciencia, E. Peninsula, Barcelona, 1973
39
40. vantagem possível de suas possibilidades, do terreno e das
possibilidades do adversário. Em sentido figurado, inclusive político
e científico, emprega- se para significar a organização dos meios
para consecução dos objetivos desejados. Os procedimentos táticos
devem ser entendidos como elementos componentes de um
processo estratégico. Não existe tática sem estratégia definida.
Estratégia , o termo provém do grego e significa a condução do
exército; se refere a arte de comandar um exército em função de
objetivos a serem atingidos a prazo mais ou menos longo; objetivos
importantes de uma campanha militar, política ou outra. Em
sentido figurado, a estratégia significa a identificação dos objetivos
decisivos e dos caminhos para alcançá-los; a organização geral das
operações militares, políticas ou outras.
A característica mais importante do que pode ser chamada
estraté gi a da ciência reside na determinação da seqüência dos
problemas a serem resolvidos e dos objetivos maiores a serem
alcançados. Segue-se consciência da necessidade, daquilo que é
necessário para atingir cada objetivo definido. Após, vem a
organização dos meios disponíveis em função das necessidades e
das possibilidades.
Convém que, em cada procedimento científico, seja qual for seu
alcance, sejam pré-definidos os objetivos estratégicos e táticos
daquela atividade, ao menos do ponto de vista de seu executor.
Sem isto, será impossível avaliar sua eficiência ou eficácia.
A metodologia de uma atividade científica é definida por seu objeto
e pelas possibilidades técnicas, mas sofre influência decisiva de
seus objetivos.
Comprobabilidade em Medicina e Psiquiatria
Em geral, as questões metodológicas da psiquiatria decorrem mais
dos problemas ontológicos e gnosiológicos que lhes são anteriores,
no entanto, na maioria das vezes em que se discute o tema, elas
são apresentadas como questões primárias. não sendo raro que se
tente limitar a avaliação epistemológica às questões
metodológicas.
As dificuldades relacionadas com a mencionada indefinição do
objeto se refletem muito imperiosamente na metodologia da
Medicina e, muito mais, na da psiquiatria. O procedimento
metodológico tradicional da Medicina é o método clínico, uma
variante específica do método de observação.
Muitas das ciências médicas, entre as quais a bioquímica, a
farmacologia, a parasitologia, a imunologia, tanto a microbiologia
40
41. quanto a não microbiana têm seus alicerces solidamente
assentados nas ciências naturais e empregam procedimentos
experimentais consagrados na comunidade científica e, nesta área,
quase não ocorrem disputas metodológicas (até porque, quase
todas são ramos da biologia que se tornaram independentes por
causa de seu crescimento ou de seu significado social). Tais
disputas, no entanto, parecem muito comuns no que respeita às
ciências do comportamento e as ciências da sociedade, exatamente
pelas características de seus objetos.
Com relação às disputas metodológicas no âmbito das ciências
médicas, nota-se a tendência a aparecer alguns ramos das ciências
naturais, sobretudo no campo das ciências biomédicas, que
combinam a metodologia hipotético- experimental- dedutiva com o
método clínico, cuja essência é a observação analítico-indutiva
(como a bioquímica clínica, a farmacologia clínica, a imunologia
clínica, a microbiologia clínica, entre outras). Esta composição
metodológica combinada ou mista, responde às necessidades
próprias impostas pela natureza dos objetos destas atividades
científicas e, noutro plano, por aquilo que a sociedade espera delas.
Noutro plano, há um problema metodológico muito presente nas
investigações médicas atuais e, especialmente influente nas
pesquisas psiquiátricas.
Neste último caso específicamente, verifica-se a já citada tendência
a biologizar a metodologia social (como conseqüência da
biologização do seu objeto e do desprestígio de sua metodologia),
provavelmente, como resultado de deformações ideológicas como o
positivismo e do desnível metodológico que existe entre as ciências
naturais e as sociais, inclusive (ou, quem sabe, sobretudo) pelas
diferenças de financiamento dos programas de investigação e dos
interesses políticos e econômicos das agências financiadoras.
O desnível metodológico e teórico (inclusive os defeitos de
sistematicidade) constatáveis quando se comparam as
possibilidades de comprobabilidade das ciências naturais
(conhecidas em inglês como hard scienc e , por causa deste processo
ideológicos de supervalorização) com as ciências chamadas
psicossociais (tidas como soft scienc e , conseqüência da ideologia
de desqualificação), designações que põem a nu o desnível de
prestígio social que desfavorece as ciências da sociedade (inclusive
as ciências psicológicas, por sua natureza de transição) deve ser
reconhecida para que possa ser identificada e ponderada no estudo
da metodologia da Medicina e da Psiquiatria, de modo a minimizar
os efeitos danosos dessa ideologia.
O naturalismo (como sinnimo de funcionalismo) reside exatamente
nesta tendência positivista a empregar as ciências naturais e seus
métodos como instrumentos das ciências que não são naturais.
41
42. Para os positivistas, o único modelo sistema é o natural e animal,
porque se prendem às características objetiváveis.
Não há qualquer razão para se retroagir ao objetivismo positivista
nas investigações da psiquiátricas, nem ter que optar pela mente
ou pela conduta, quando se pretender fazer boa ciência. A
subjetividade pode contribuir para o conhecimento científico, desde
que não se configure como condição única ou principal da
investigação.
Esta situação, da mesma maneira, deve motivar algum esforço
deliberado e construtivo de aperfeiçoamento dos procedimentos de
observação, como o chamado método clínico (na verdade, uma
técnica derivada diretamente do método de observação), ao invés
de se construir simulacros de experimentação ou desperdiçar
esforços para quantificar o inquantificável, numa tentativa vã de
usar a metodologia das ciências naturais como modelo
paradigmático para as ciências da sociedade.
Muitas investigações em psicopatologia e, sobretudo, aquela
pesquisas clínicas de aplicação mais ou menos imediata, tais como
as que se realizam para avaliar a possível a ação de farmacológica
de medicamentos como os psicofármacos, padecem deste defeito
essencial. E, como tantos outros simulacros, mal conseguem ser
uma caricatura da coisa imitada, por mais que levem a sério a
imitação.
Talvez aí, no maior crédito de verossimilhança que merecem os
achados dos métodos experimentais, característicos das ciências da
natureza, se origine a crença ideologizada da superioridade ou
maior legitimidade científica das ciências naturais sobre as ciências
humanas.
Tais qualificativos valorativos não fazem sentido numa análise
epistemológica e devem ser evitados a todo o custo, em nome da
seriedade científica, ainda que não se tratasse de um julgamento
fortemente ideológico e condicionado por vaidade pessoal e disputa
de financiamento de projetos, entre outros fatores.
Acrescente- se a diversidade essencial entre os objetos das ciências
naturais (os seres vivos) e os das ciências sociais (os entes sociais),
muito mais complexos que os objetos e fenômenos das ciências
naturais; e quando se considera aquilo que antes foi denominado
neste trabalho como imaturidade metodológica e técnica (expressa
pela limitação teórica da metodologia analítico-descritiva e a falta
de tecnologia de experimentação), pode-se explicar as diferenças
de cientificidade e, portanto, de previsibilidade e explicabilidade
entre os dois grupos de ciências.
42