1. ntrodução
O desenvolvimento de derrame pleural ocorre quando há um desequilíbrio entre a entrada e saída de líquido do espaço pleural. Alguns mecanismos podem estar envolvidos na patogênese dessa condição, a
saber:
- Aumento do líquido intersticial pulmonar por aumento de pressão capilar pulmonar (por exemplo, insuficiência cardíaca) ou da permeabilidade (por exemplo, pneumonia);
- Redução da pressão intrapleural, como na atelectasia;
- Diminuição da pressão oncótica plasmática, nos casos de hipoalbuminemia principalmente;
- Aumento da permeabilidade da membrane pleural e obstrução do fluxo linfático (por exemplo, nas doenças malignas e infecções pleurais);
- Defeitos diafragmáticos, como no hidrotórax hepático;
- Ruptura do ducto torácico, levando ao quilotórax.
Apesar da diversificada etiologia, as causas mais comuns de derrame pleural no adulto são a insuficiência cardíaca, doenças malignas, pneumonia, tuberculose e tromboembolismo pulmonar.
A definição da causa do derrame pleural é facilitada de maneira importante pela possibilidade de análise do líquido pleural. A toracocentese é um procedimento que pode ser realizado à beira do leito, permitindo a
coleta rápida de líquido para análise macroscópica, microscópica e bioquímica. Estima-se que uma análise clínica detalhada associada a uma avaliação adequada do líquido pleural permitam o diagnóstico em
cerca de 75% dos casos.
Mesmo nos casos em que a toracocentese não for diagnóstica, a análise do líquido é importante na exclusão de determinadas causas, como infecções e malignidade.
Indicações de Toracocentese
A toracocentese encontra-se indicada nos casos de derrame pleural recém-diagnosticado. No entanto, nos casos de insuficiência cardíaca congestiva não complicada ou pleurisia viral (pequena quantidade de
líguido), pode-se optar pela observação clínica. Nos casos em que a apresentação clínica é atípica ou não evolui conforme o previsto, a toracocentese deve ser realizada. Algumas causas de derrame pleural
podem ser estabelecidas de maneira definitiva à toracocentese, como doenças malignas, empiema, tuberculose, infecção fúngica, pleurite lúpica, quilotórax, urinotórax, ruptura esofágica, hemotórax e migração
extravascular de cateter venoso central.
Análise do Líquido Pleural
1. Aspecto Macroscópico
A primeira informação fornecida pelo líquido pleural consiste em sua inspeção macroscópica, à medida em que é aspirado. Um líquido que se apresenta amarelo citrino sugere um transudato, embora em alguns
casos o exsudato possa se apresentar com esse aspecto. Líquido avermelhado sugere doença maligna e infarto pulmonar atraumático; líquido brancacento revela quilotórax ou derrame de colesterol. Um líquido
francamente purulento é característico de empiema, o viscoso de mesotelioma; líquido turvo sugere derrame inflamatório ou por lipídeos.
2. Caracterização
A seguir, deve-se classificar o líquido pleural como transudato ou exsudato.
- Transudatos: geralmente causados por desequilíbrio das pressões hidrostática e oncótica, no interior da cavidade torácica. Porém, podem resultar também de deslocamento de líquido a partir da cavidade
abdominal, através do diafragma, ou por iatrogenia.
- Exsudatos: são de definição diagnóstica mais complexa, já que doenças em qualquer órgão pode causar derrame pleural exsudativo, por diversos mecanismos, como infecções, doenças malignas, resposta
imunológica, anormalidades linfáticas, processos inflamatórios não-infecciosos e causas iatrogênicas. Os exsudatos são resultado, principalmente, de inflamação pleural e pulmonar, com perda de proteína pelos
capilares, ou por comprometimento da drenagem linfática do espaço pleural. Além disso, fluido proveniente da cavidade peritoneal (como na pancreatite, ascite quilosa ou carcinomatose peritoneal) também pode
atingir o espaço pleural.
2. Na diferenciação desses dois tipos de derrame pleural, o método tradicionalmente empregado compreende os critérios de Light, que utiliza medidas de proteína e LDH no soro e no líquido pleural. Assim, se pelo
menos um dos critérios encontra-se presente, o fluido é definido como exsudato. São eles: (1) razão proteína líquido pleural/soro > 0,5; (2) relação LDH líquido pelural/soro > 0,6; e (3) LDH no líquido pleural
elevado mais que 2/3 acima do limite normal para o LDH sérico. Recentemente, os critérios foram revisados, sendo recomendado que o ponto de corte para o LDH no líquido pleural seja 45% do limite superior da
normalidade do LDH sérico, e não 2/3 como empregado previamente.
Quando se emprega os três critérios, a sensibilidade é maior, porém às custas de menor especificidade, em comparação aos critérios isoladamente.
3. Análise Bioquímica
Normalmente, quando se encaminha o líquido pleural para análise, solicita-se a dosagem de LDH, proteína, glicose, amilase e determinação do pH.
- Proteínas: na maioria dos casos de transudatos, a concentração de proteína encontra-se inferior a 3,0g/dL. Especificamente na tuberculose, a concentração costuma ser acima de 4,0g/dL. Quando se detecta
valores na faixa de 7,0-8,0g/dL, deve-se pensar em mieloma múltiplo e entidades correlatas.
- LDH: a determinação do LDH é essencial na diferenciação entre transudato e exsudato. No empiema, pleurisia reumatóide e, às vezes nas malignidades, os níveis encontram-se acima de 1.000UI/L. Na
pneumocistose, o achado característico é de uma relação LDH líquido pleural/soro > 1,0 e de proteína líquido pleural/soro < 0,5.
- Colesterol: acredita-se que se origina de degeneração celular e vazamento vascular. O objetivo desse teste é aumentar a acurácia na diferenciação entre transudato e exsudato, já que níveis acima de 45mg/dL
sugerem exsudato.
- Glicose: níveis reduzidos de glicose (<60mg/dL) ou relação líquido pleural/soro < 0,5 leva à suspeita de derrame parapneumônico complicado ou empiema, malignidade, tuberculose, pleurite lúpica ou reumatóide
e ruptura esofágica. Em todos os outros casos de exsudato e nos transudatos, a concentração de glicose é semelhante à do sangue. No caso de infecção e inflamação, a glicose reduzida se deve ao aumento do
consumo pelas bactérias/células presentes no espaço pleural. Nos outros casos, ocorre por redução do transporte de glicose para o espaço pleural.
- pH: um valor abaixo de 7,30, com pH arterial normal, é observado nos mesmos casos de glicose reduzida. No líquido pleural, o pH normal gira em torno de 7,60, devido ao gradiente de bicarbonato entre esse
líquido e o sangue. Nos transudatos, o pH costuma estar entre 7,40 e 7,55. Nos pacientes com derrame parapneumônico e derrame maligno, o baixo valor de pH denota pior prognóstico e pior resposta à
pleurodese química.
- Amilase: encontra-se elevada quando o valor no líquido pleural está acima do limite superior da normalidade para o soro ou uma relação líquido pleural/soro > 1,0. Os diagnósticos possíveis são pancreatite
aguda ou crônica, ruptura esofágica e doenças malignas.
- Adenosina Deaminase: é útil nos casos de derrame com predomínio de linfócitos e com esfregaço e cultura iniciais negativos para tuberculose. Normalmente, os níveis dessa enzima encontra-se acima de 50U/L
nos casos de tuberculose.
4. Citologia
A contagem total de células no líquido pleural não costuma ser diagnóstica, porém em algumas situações pode ser útil. Nas contagens acima de 50.000 células/microlitro, deve-se pensar em derrame
parapneumônico, incluindo o empiema. Na doença maligna e na tuberculose, as contagens costumam ser inferiores a 5.000 células/microlitro.
É importante lembrar que o tipo celular predominante é um parâmetro que depende do momento da toracocentese, em relação à lesão pleural inicial. Inicialmente, a resposta é predominantemente neutrofílica. À
medida que o processo se cronifica, a predominância é mononuclear, caso a lesão não seja contínua.
A presença de linfocitose sugere tuberculose, linfoma sarcoidose, pleurisia reumatóide crônica ou quilotórax, geralmente com porcentagem de linfócitos entre 85-95%. O derrame pleural carcinomatoso mostra
predominância de linfócitos em 50% dos casos, com porcentagem entre 50-70%.
3. Eosinofilia é definida como >10% de linfócitos na diferencial de células nucleadas. Sua presença sugere doença benigna e auto-limitada, estando normalmente associada à presença de ar ou sangue no espaço
pleural. No entanto, no diagnóstico diferencial devemos considerar o pneumotórax, hemotórax, infarto pulmonar, derrame pela presença de asbestos, doenças parasitárias e fúngicas, drogas e algumas doenças
malignas (por exemplo, linfoma).
Células mesoteliais são observadas em pequeno número no líquido pleural normal, estando em número aumentado dos transudatos. A maior importância de sua presença é que o diagnóstico de tuberculose é
pouco provável se há mais de 5% de células mesoteliais.
Biopsia Pleural
A biospia percutânea da pleura encontra-se indicada nos casos de derrame pleural sem etiologia definida e com suspeita de tuberculose ou doença maligna. A histologia associada à cultura do material obtido
estabelece o diagnóstico em 90% dos casos de tuberculose. Porém, como o diagnóstico pode ser fortemente sugerido pela concentração de adenosina deaminase, na maioria dos casos esse procedimento não é
necessário.
A citologia é superior à biopsia pleural às cegas, no diagnóstico de doença maligna pleural. O rendimento diagnóstico da biopsia é maior quando realizada guiada por algum método de imagem, que sugira áreas
suspeitas a serem biopsiadas.