Este documento analisa criticamente o Modelo de Auto-Avaliação das Bibliotecas Escolares português. Discutem-se a pertinência do modelo, os conceitos subjacentes como valor, interação e aprendizagem, e os desafios de implementação devido à complexidade do modelo e estrutura das escolas. O modelo pode contribuir para mudanças nas escolas, mas requer adaptações à realidade portuguesa.
Análise crítica do Modelo de Auto-Avaliação das Bibliotecas Escolares
1. Formanda: Ana Maria Gomes Salgueiro
Tarefa 2
Faça uma análise crítica ao Modelo de Auto-Avaliação das Bibliotecas Escolares,
tendo em conta os seguintes aspectos:
- Pertinência da existência de um Modelo de Avaliação para as bibliotecas escolares.
- O Modelo enquanto instrumento pedagógico e de melhoria de melhoria. Conceitos
implicados.
- Organização estrutural e funcional.
- Integração/ Aplicação à realidade da escola/ biblioteca escolar. Oportunidades e
constrangimentos.
- Gestão das mudanças que a sua aplicação impõe. Níveis de participação da e na
escola.
Recorra, quando julgar oportuno, à informação disponibilizada, citando-a.
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A avaliação de qualquer actividade é sempre pertinente, já que é condição
essencial para a deteção de problemas e dificuldades, no sentido do seu
aperfeiçoamento posterior. A existência de um modelo uniformizado para uma
avaliação das BE será com certeza ainda mais pertinente, tendo em conta os
objectivos concretos que persegue e a possibilidade de adaptação às várias
realidades e contextos de escolas do país. Ao mesmo tempo, uma avaliação realizada
de uma forma uniformizada, garante igualmente o traçar de um caminho uniforme a
nível nacional, a formação dos intervenientes para alcançar os mesmos objectivos e a
possibilidade da comparação dos resultados entre as várias experiências com todos
os ganhos inerentes. Há ainda que ter em conta os investimentos que têm vindo a ser
feitos aos níveis central e local, os quais, para além de terem de ser justificados,
deverão no futuro ser sempre optimizados, tal como é referido na própria introdução
do documento: O Programa Rede de Bibliotecas Escolares (RBE), iniciado em 1996
com a publicação do relatório Lançar a rede de bibliotecas escolares, conta no
momento presente com cerca de 2200 escolas integradas. É reconhecido o
investimento que tem suportado o crescimento desta rede – investimento a nível
central, das autarquias e das próprias escolas – e é necessário assegurar que esse
investimento continuará a ser feito (...)( Mabe, RBE, p.4)
A sua pertinência em relação aos objectivos que pretende alcançar é ainda
maior, já que se trata de um modelo que se pretende formativo, com o principal
2. objectivo de melhorar o funcionamento da BE e da escola ao nível pedagógico,
garantindo um maior sucesso e autonomia nas aprendizagens: (...) o objectivo de
facultar um instrumento pedagógico e de melhoria contínua que permita aos órgãos
directivos e aos professores bibliotecários avaliar o trabalho da biblioteca escolar e o
impacto desse trabalho no funcionamento global da escola e nas aprendizagens dos
alunos e identificar as áreas de sucesso e aquelas que, por apresentarem resultados
menores, requerem maior investimento, determinando, nalguns casos, uma inflexão
das práticas. (...)A criação de um Modelo para avaliação das bibliotecas escolares
permite dotar as escolas/ bibliotecas de um quadro de referência e de um instrumento
que lhes permite a melhoria contínua da qualidade, a busca de uma perspectiva de
inovação. (Texto da Sessão, p.1e p.6).
Este modelo tem como pressupostos alguns conceitos que será fundamental
clarificar:
- O conceito de valor como o que tem a ver com a experiência e benefícios que se
retiram das coisas: (...)se é importante a existência de uma BE agradável e bem
apetrechada, a esse facto deve estar associada uma utilização consequente nos
vários domínios que caracterizam a missão da BE, capaz de produzir resultados que
contribuam de forma efectiva para os objectivos da escola em que se insere. (Mabe,
RBE, p.5). Assim, o valor da BE e o papel do bibliotecário, devem deslocar-se cada
vez mais do âmbito do fazer para o ser, no sentido em que, mais do que desenvolver
competências de manipulação da informação (fazer), será contribuir para o
desenvolvimento de um aluno letrado em informação, o que é essencial para se tornar
e ser. (...) o desenvolvimento de uma pessoa com conhecimento e saber, que é capaz
de interagir efectivamente com um mundo de informação rico e complexo e que é
capaz de desenvolver novas compreensões, percepções e ideias. Isto é o que os
professores deveriam esperar. O desenvolvimento e a utilização do saber humano, a
construção do entendimento e significado são o cerne da aprendizagem, e que define
o papel fundamental do bibliotecário escolar. (...)Isto sugere uma pedagogia que tem a
construção do conhecimento e a aprendizagem da investigação no seu centro, onde
através do acesso a múltiplas fontes e formatos de informação e tecnologia da
informação, os alunos adquirem as matrizes intelectuais para se envolverem com
múltiplas perspectivas, fontes e formatos de informação para serem capazes de
construir o seu próprio entendimento. Neste contexto, o papel do bibliotecário escolar
vai além do desenvolvimento de um conjunto de competências de literacia da
informação, ao contrário, é a grande responsabilidade de tornar todas as informações
e conhecimentos que a escola possui ou pode aceder accionáveis, para que os alunos
3. possam construir sua própria compreensão e desenvolver as suas ideias de forma
significativa. Este SER e TORNAR-SE são o ponto fulcral da investigação de
Kuhlthau e é a razão da existência das bibliotecas escolares. (Professores
Bibliotecários Escolares: resultados da aprendizagem e prática baseada em
evidências, p.1, 2) Esta perspectiva constitui o valor que a BE e o bibliotecário escolar
poderão ganhar na escola, contribuindo para as mudanças globais necessárias na
escola do mundo actual, caminhando no sentido de uma melhor formação para a
cidadania e de uma maior democratização do ensino.
- Relacionado com a perspectiva anterior, podemos considerar o conceito de
interacção, no sentido em que a biblioteca escolar deixa de ser um espaço que
disponibiliza e organiza recursos para passar a ser um espaço que interage com a
escola através da participação em projectos e actividades em desenvolvimento na
escola, e do trabalho articulado com os docentes (Texto da Sessão, p.2).
- O aluno, sujeito de aprendizagem, apresenta-se como actor activo, construtor do seu
próprio conhecimento – construtivismo – usando cada vez mais, novas estratégias
de conhecimento baseadas no questionamento contínuo e no trabalho baseado na
pesquisa e no uso de fontes de informação, desenvolvendo novas literacias.
- A BE, passa a ser um espaço de acesso permanente com acesso online 24 horas
através do seu sítio.
- A considerar também o conceito de auto-avaliação como um processo de carácter
essencialmente formativo: (...)a auto-avaliação deve ser encarada como um processo
pedagógico e regulador, inerente à gestão e procura de uma melhoria contínua
da BE. (...)a avaliação não constitui um fim, devendo ser entendida
como um processo que, idealmente, conduzirá à reflexão e originará mudanças
concretas na prática. (Texto da Sessão, p.1).
- O Modelo de auto-avaliação tem na sua estrutura e concepção o conceito de
avaliação no contexto das organizações, com um processo de recolha de
evidências e de inquirição sistemáticos, associados ao trabalho do dia-a-dia – conceito
de Evidence-Based practice. Ross Todd associa o conceito às práticas das
bibliotecas escolares e à necessidade que estas têm de fazer diferença na escola que
servem e de provar o impacto que têm nas aprendizagens. (...) A prática baseada em
evidências combina o saber profissional, a prática reflexiva e o conhecimento das
4. necessidades dos estudantes(...)Uma abordagem holística à prática baseada em
evidências envolve três dimensões: evidências para a prática; evidências na prática e
evidências da prática.(...) A diferença ou impacto residem não nos inputs (recursos) ou
processos mas na maisvalia que estes trazem à escola e à aprendizagem. (Texto da
Sessão, p.4). Esta prática baseia-se na premissa de que todos os alunos podem ser
alunos de sucesso, maximizando as suas experiências de aprendizagem.
Em relação à organização do Modelo, parece-me que em termos teóricos será
adequada, mas, apesar de nunca o ter posto em prática, a recolha de evidêcias
apresenta-se demasiado exaustiva e a operacionalização do modelo, parece estar
longe de cumprir o objectivo de início enunciado de que a aplicação do modelo de
auto-avaliação seja exequível e facilmente integrável nas práticas de gestão da equipa
da biblioteca. (MABE, p.5). Parece-me que para ser posto em prática, se torna
demasiado complexo e talvez até, inutilmente complexo, para os 4 níveis de perfis de
desempenho definidos. Ou seja, parece-me que não seria necessária uma tão
exaustiva recolha e tratamento de dados, para se chegarem às conclusões para as
quais remetem os 4 perfis de desempenho. No entanto, o processo de
operacionalização do Modelo, tem o grande mérito de conduzir a toda uma
mobilização da escola para uma reflexão mais profunda sobre as suas práticas,
reflexão essa, fundamental, para uma maior consciencialização dos resultados do
trabalho que é desenvolvido e para se operarem as mudanças fundamentais. Na
verdade, o modelo de escola actual, está completamente desadequado da realidade
do nosso mundo global e das modernas TIC. (A estrutura da escola actual mantém
raízes do sec XIX e o professor desse tempo, seria, com certeza, o único profissional,
que se pudesse viajar do seu tempo para o nosso, conseguiria desempenhar a sua
função com algum sucesso: daria uma aula da mesma forma como muitos dos
professores ainda o fazem...e não estranharia sequer a distribuição das mesas e o
local da sua secretária...) O projecto das Bibliotecas Escolares com um Modelo de
Auto-Avaliação associado ao trabalho diário, poderá contribuir para se começarem a
operar as transformações necessárias no funcionamento da escola, à medida que a
mesma vá adequando as suas práticas à aplicabilidade do Modelo em causa,
proporcionando maior motivação, maior sucesso educativo e melhor formação dos
alunos. Estas são as maiores oportunidades que são assim levadas à escola.
A sua exequibilidade poderá ser posta em causa não só pela complexidade do
modelo, como já foi referido antes. O modelo de funcionamento da escola actual muito
burocratizado, com excesso de reuniões geralmente pouco produtivas, com dificuldade
5. de tempos comuns de trabalho entre os professores, dificultam e podem comprometer
muitas das iniciativas do professor bibliotecário e dos professores mais mobilizados.
Mesmo assim, é possível iniciar todo um trabalho inovador com os Departamentos das
escolas, dependendo do Projecto Educativo das mesmas, de uma forma faseada,
onde só alguns se irão envolver de início, mas onde uma perspectiva de acção a 4
anos poderá proporcionar um caminho mais consistente a percorrer. A possibilidade
de articular trabalho ao longo dos ciclos de escolaridade ao nível de Agrupamento de
Escolas, poderá também dar os seus frutos.
Acrecentaria ainda que, há um excesso de tarefas/competências atribuídas ao
professor bibliotecário, para o qual parece remeter actualmente a responsabilidade de
fazer a revolução na escola, nas quais não se pode perder de vista a mudança mais
profunda e estrutural que está por fazer e da qual a BE e o professor bibliotecário
poderão ser só dois agentes privilegiados para ajudar a operar. Apesar desta análise
não se aplicar só às escolas portuguesas, para concretizar alguns dos seus objectivos,
o projecto das BE teria de estar ancorado numa proposta mais global e profunda de
alteração de organização e funcionamento da Escola como instituição, o que passaria
pela reformulação da sua orgânica, pelos modelos de formação inicial dos
professores e por muito maiores investimentos em recursos. Na maioria das nossas
BE, estamos longe dos 10 livros por aluno recomendados pela UNESCO e ao nível
das modernas TIC o panorama é ainda muito mais confrangedor. Avalia-se as BE a
partir de um ideal que está muito longe da nossa realidade. Apesar de todo o esforço
recente, não podemos ultrapassar em poucos anos, aquilo que o nosso país deixou de
fazer no passado e que outros há muito mais tempo começaram a concretizar. Por
isso também poderá perguntar-se se será adequado importar-se um Modelo de
Avaliação construído a partir de outra realidade das BE, apesar da sua pertinência e
apesar das adaptações que foram feitas.