O documento descreve a técnica de microgota para contagem de células bacterianas viáveis em suspensão. A técnica envolve a diluição serial da suspensão bacteriana, o depósito de microgotas das diluições em placas de Petri contendo meio de cultura, a incubação e contagem das colônias formadas para estimar o número de unidades formadoras de colônia (UFC) presentes originalmente na suspensão. A técnica possui vantagens como economia de material e minimização de riscos de contaminação em comparação a
1. UNIVERSIDADE FEDERAL DE VIÇOSA
DEPARTAMENTO DE FITOPATOLOGIA
LABORATÓRIO DE BACTERIOLOGIA DE PLANTAS
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TÉCNICA DE MICROGOTA PARA CONTAGEM DE CÉLULAS
BACTERIANAS VIÁVEIS EM UMA SUSPENSÃO
Reginaldo da Silva Romeiro, PhD
Professor Titular da UFV
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INFORMAÇÃO BÁSICA
Face às reduzidas dimensões da célula bacteriana e às peculiaridades com que ela se
divide, o crescimento de bactérias é estudado em termos de aumento da população em função
do tempo e não de aumento nas dimensões celulares de indivíduos (STANIER et alii, 1986;
SIGEE, 1993), mesmo porque poderia haver interpretações errôneas do que é crescimento e
do que é acúmulo.
Imaginando-se um frasco de Erlenmeyer, por exemplo, que contenha uma cultura
bacteriana em ativa fase de crescimento, cada mililitro deste caldo de cultura deve conter
milhões de células da bactéria. Nem todas, obviamente, estão viáveis, fazendo-se aqui
necessário diferenciar de modo muito claro o que é contagem de células totais e contagem de
células viáveis. O número de células viáveis presentes em um suspensão tem sido
genericamente denominado u.f.c. ("unidades formadoras de colônias"), sendo a sigla
equivalente em inglês c.f.u. ("colony forming units").
UFC (unidade formadora de colônia) é usado quase como sinônimo de célula viável.
Os métodos de contagem de colônias em placas ancoram-se no princípio que, sendo a diluição
e o semeio em placas bem feitos, cada colônia surgida é considerada originária de uma única
célula viável (viva e, se fitopatogênica, potencialmente capaz de infectar o hospedeiro e causar
infecção).
O número de células totais (somatório de viáveis mais não viáveis) pode ser estimado,
numa suspensão, por meio de diferentes métodos, todos eles envolvendo contagem e ele é, no
máximo igual, e quase sempre maior, que o de células viáveis (Fig. 1).
TEMPO
N
Ú
MERO D
E
CÉLULAS
TOTAIS
VIÁVEIS (u.f.c.)
Figura 1: Células viáveis (
______
) e totais (
..........
) numa cultura bacteriana, em função do tempo
A quantificação de UFC necessariamente envolve o preparo, com toda assepsia, de
uma suspensão de células bacterianas, que a seguir sofre diluições em série e uma alíquota de
cada diluição é semeada em placa. Após a incubação, conta-se o número de colônias, sempre
assumindo-se ser cada colônia originária de uma única célula.
Existem diferentes metodologias para a estimativa do número de UFC numa
suspensão de células bacterianas. Atualmente, a técnica genericamente denominada de
microgota tem sido extensivamente usada por permitir enorme economia de tempo, de
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material, assim como por tornar possível a realização concomitante de um grande número de
repetições.
A estimativa do número de células viáveis (UFC) em uma suspensão bacteriana é de
grande importância em bacteriologia, por exemplo, para se ajustar a concentração de inóculo
antes de inoculações, para quantificar patógenos bacterianos em lotes de sementes, em solo,
em rizoplano e em filoplano, para estudos de sobrevivência, epidemiologia, para investigar a
efetividade de produtos químicos em teste para controle, etc.
OBSERVAÇÃO IMPORTANTE
Bactérias multiplicam-se muito rapidamente e as fitopatogênicas, por exemplo, têm
um período de geração variando de 40 a 90 minutos. Isso significa que, havendo demora para
preparo das suspensões, leituras, etc., a população pode dobrar e ser cometido um erro de até
50% ou maior. Assim, para realizar esse tipo de trabalho, deve-se operar com todos os
recipientes, soluções, reagentes, culturas e suspensões de células resfriadas previamente, em
geladeira, a 4
o
C.
PREPARO DA SUSPENSÃO BACTERIANA
A bactéria em estudo deve ser cultivada em um meio que não favoreça a excessiva
formação de material capsular, pois os glumos resultantes da aglomeração de células podem
interferir na contagem.
Para minimizar esse tipo de problema, pode-se, por exemplo, substituir a fonte de
carbono do meio de cultura. No caso do meio 523 (KADO & HESKET, 1970) rotineiramente
utilizado no Laboratório de Bacteriologia de Plantas da UFV, a sacarose é substituída por
glicose uma vez que o primeiro açúcar estimula intensa formação de cápsula na célula
bacteriana (SILVA, 1996). Deve-se, ainda, suspender o crescimento bacteriano em solução
salina contendo 0,3-0,5% de Tween 80 para promover a dispersão das células, no momento de
se efetuarem as diluições.
DILUIÇÃO DA SUSPENSÃO BACTERIANA
A suspensão bacteriana deve sofrer uma diluição serial de 1:10 em solução salina
(0,85% NaCl) estéril. Para isso podem-se utilizar tubos de ensaio ou então tubos de
Eppendorf. Os tubos de ensaio devem conter 9,0 ml de solução salina contendo 0,3 a 0,5% de
Tween 80. À solução salina do tubo de ensaio adicionar-se-á 1,0 ml da suspensão bacteriana,
sucessivamente até a diluição 1,0 x 10
-10
. Quando se deseja maior precisão, as diluições
podem ser de 1:5 ou, até mesmo, de 1:2.
Os tubos de Eppendorf podem substituir os tubos de ensaio de vidro na diluição serial,
desde que previamente esterilizados (autoclavagem, calor seco ou microondas) e recebem 0,9
ml de solução salina estéril contendo 0,3 a 0,5% de Tween 80. A série de diluição é feita
adicionando-se ao primeiro tubo 0,1 ml da suspensão bacteriana, e procedendo-se á diluição
em série.
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PREPARO DA PLACA DE CONTAGEM
Verte-se em placas de Petri o meio na superfície do qual serão depositadas as
microgotas da suspensão bacteriana. A superfície do meio deve estar seca o suficiente para
que a microgota seja rapidamente absorvida mas que não impeça o crescimento das colônias.
Para isso, as placas devem ficar expostas, destampadas, a 37 °C , por 12 horas sob luz UV ou a
60 °C por 1 hora.
Após as placas atingirem a temperatura ambiente, as microgotas referentes a cada
diluição são depositadas sobre a superfície do meio. Devido ao formato convexo da gota,
ocorre uma maior concentração de células na periferia, o que poderia interferir na contagem
devido à coalescência de colônias. Para evitar que isso aconteça, após serem depositadas todas
as gotas em uma placa, fazem-se movimentos circulares suaves, com a placa tampada, sobre a
superfície na qual ela se encontra, de modo a espalhar a gota. Após incubação faz-se a
contagem propriamente dita.
CONTAGEM
Examinando-se a placa sob binocular estereoscópica, podem-se observar pequenas
colônias, que surgirão com maior ou menor tempo de incubação dependendo da bactéria em
estudo. Pode-se, com o auxílio de uma caneta de “retroprojetor” dividir a área da microgota,
sobre o vidro, em campos, de modo a facilitar a contagem das colônias. Deve-se acompanhar
o crescimento das colônias até a obtenção de número constante sem permitir a coalescência
entre elas. O número de colônias considerado ideal para a contagem situa-se entre 5 e 100
colônias por microgota, embora se possa fazer a contagem com relativa facilidade de até 300
colônias por microgota.
O número final de colônias é obtido pela média aritmética das repetições. No Quadro 1
há um exemplo hipotético de contagem realizada.
Considerando ambas diluições 10
-5
→ 103,75 + 11,25(10) = 216,25, em que 216,25/2
= 108,125. Corrigindo-se a diluição: 108,125 x 10
2
x 10
5
= 108,125 x 10
7
= =1,08 x 10
9
ufc/ml. Conclui-se pois que a suspensão original continha 1,08 x 10
9
ufc/ml.
Quadro 1: Exemplo hipotético de dados de contagem do número de colônias em placas onde
se realiza a técnica de microgota, em que o símbolo ( ∞) representa um número
grande demais de colônias para ser contado.
DILUIÇÃO REPETIÇÃO (R) MÉDIA
REALIZADA R
1
R
2
R
3
R
4
ESTIMADA
10
-0
∞ ∞ ∞ ∞ ∞
10
-1
∞ ∞ ∞ ∞ ∞
10
-2
∞ ∞ ∞ ∞ ∞
10
-3
∞ ∞ ∞ ∞ ∞
10
-4
∞ ∞ ∞ ∞ ∞
10
-5
112 104 99 100 103,75
10
-6
10 9 11 15 11,25
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VANTAGENS E DESVANTAGENS DA CONTAGEM EM MICROGOTA
1. A contagem em microgota otimiza a utilização de material, principalmente meio de
cultura e placas de Petri. Enquanto a contagem na superfície do meio requer 1 placa para
cada repetição de cada diluição, em microgota uma placa pode suportar até 12 microgotas,
sejam elas todas repetição de uma mesma diluição ou não (Figura 2). Caso fosse utilizado
um dos outros dois métodos de contagem, seriam necessárias 12 placas ao invés de 1.
Figura 2. Exemplo de como podem ser dispostas as microgotas em uma placa de Petri, para se
terem 4 repetições de cada diluição.
2. Os riscos de contaminação são minimizados pois o número de operações envolvidas é
menor. Não há necessidade, por exemplo, de se espalhar a gota na superfície do meio com
o auxílio de uma espátula de Drigalski, nem de placas serem abertas e fechadas muitas
vezes.
3. Há necessidade de apenas uma pipeta bem calibrada para a coleta das alíquotas de 10 µl
que formarão as microgotas.
4. Como se trabalham com volumes muitos pequenos, deve-se atentar para uma perfeita
homogeneização das suspensões bacterianas.
CORRELAÇÃO ENTRE CÉLULAS VIÁVEIS E CÉLULAS TOTAIS NUMA
SUSPENSÃO BACTERIANA
Geralmente é de interesse do pesquisador estabelecer algum tipo de correlação,
preferencialmente matemática, entre o número de células viáveis e o número de células totais
numa suspensão bacteriana. Isto porque é inviável realizar uma contagem em placas, seja
pelo método tradicional, seja pela técnica de microgotas, todas as vezes que se tenciona
ajustar a concentração de inóculo de uma suspensão bacteriana.
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S
U
SP
E
N
SÃ
O
DE
CÉLUL
A
S
DILUIÇÃO
1:2
DILUIÇÃO
1:10
. . .
. . .
.
.
.
DENSIDADE
ÓTICA
U.F.C.
Figura 3: Esquema explicativo do processamento das duas séries distintas de diluições
Há várias maneiras de se fazer isso, uma das mais simples aquela em que se prepara,
asseticamente, uma suspensão de células bacterianas a partir de cultura em fase logarítmica de
crescimento e se procedem a duas séries de diluições que são, respectivamente, semeadas em
placa e submetidas a estimativa de turbidez (Fig. 3). Os dados são então analisados
estatisticamente, por meio de regressão linear, quando se consegue estabelecer uma correlação
matemática entre turbidez (medida indireta do número de células totais) e u.f.c. (Fig. 4).
0 ,0 0
0 ,1 0
0 ,2 0
0 ,3 0
0 ,4 0
0 ,5 0
0 ,6 0
0 ,7 0
0 ,8 0
0 ,9 0
1 ,0 0
5 ,0 .1 0
8
1 ,0 .1 0
9
1 ,5 .1 0
9
2 ,0 .1 0
9
U .F .C . / m l
D
E
N
S
I
D
A
D
E
Ó
T
I
C
A(
540nm
)
U
.F
.C
/
m
l =
(O
D
5 4
0
- 0,
0 1
3)
/ 10
-1
0
R
=
0
,9
9 9
8
Figura 4: Correlação entre turbidez (OD 540 ) e número de células viáveis (U.F.C.) em uma
suspensão preparada em salina a partir de cultura de Agrobacterium tumefaciens, com
24 horas de idade. Adaptado de NAPOLEÃO (1996)
Contudo, algumas observações e condições se fazem necessárias para que estimativas de um
parâmetro em função do outro se revistam de validade científica.
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A correlação só é válida se se trabalha com culturas na fase exponencial de
crescimento, quando o número de células viáveis e de células totais é aproximadamente o
mesmo. A validade também só pode ser aceita e precisa se todas as condições são mantidas
inalteradas - temperatura e tempo de incubação, isolamento, meio de cultura, aeração,
comprimento de onda para leitura, etc.
Obtida a equação de regressão e todas as condições permanecendo constantes, basta ler
a densidade ótica da suspensão e calcular, usando a equação, o número de células viáveis e, a
partir daí, fazer as diluições necessárias para ajuste da concentração de inóculo, sempre que
necessário.
Como os espectrofotômetros comuns não detectam baixas intensidades de turbidez em
suspensões, a série de diluições para leitura de absorbância deve ser feita com fator 1:2 ao
passo que a série para semeio em placa pode ser 1:10 ou 1:5.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICA
GUIMARÃES, W.V. 1995. Curva de Crescimento de E. coli. Roteiro de aula prática do
Laboratório de Microbiologia do Departamento de Microbiologia - Universidade Federal
de Viçosa. 2p.
NAPOLEÃO, R. L. Avaliação de antagonistas a Agrobacterium tumefaciens isolados de
rizosfera, de rizoplano e de tumores de roseira. Imprensa Universitária-UFV. 1996. 61p
(Tese de MS)
SIGEE, D. C. Bacterial Plant pathology. Cambridge University Press. Cambridge. 1993.
325p.
SILVA, D. O. Universidade Federal de Viçosa. Departamento de Microbiologia. 36.571.000
Viçosa, Minas Gerais. Brasil. (Comunicação Pessoal). 1996
STANIER, R. Y., INGRAHAM, J. L., WHEELIS, M. L., PAINTER, P. R. 1986. The
Microbial World. Prentice-Hall, Englewood Cliffs, New Jersey. 689p.
WINKLER,U., RUGER, W., WACKERNAGEL, W. Bacterial, Phage and Molecular
Genetics. An Experimental Course. Spring-Verlay Berlin Heidelberg. New York. 1976.
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