A privatização dos serviços aeroportuários tem sido testemunhada em todo o mundo, principalmente devido a razões financeiras. A gestão e financiamento de aeroportos por Estados tem se tornado difícil, enquanto o investimento privado é visto como uma oportunidade. Embora a privatização dos serviços de navegação aérea ainda não tenha sido amplamente adotada, a tendência é a privatização de aeroportos de grande porte através de venda ou arrendamento de longo prazo.
1. A PRIVATIZAÇÃO DOS
SERVIÇOS
AEROPORTUÁRIOS
O processo e as opções
Trabalho elaborado no âmbito da cadeira de
Seminários de Aeronáutica da Licenciatura em
Gestão Aeronáutica – 2º ano/1º Semestre – 2011/2012
Docente: Miguel Moreira
Trabalho elaborado por: Luís Miguel Cruz
2. A PRIVATIZAÇÃO DOS
SERVIÇOS
AEROPORTUÁRIOS
O processo e as opções
LUÍS MIGUEL CRUZ
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3. Índice
1. Introdução ........................................................................................................... 4
2. A ICAO e a sua política de estrutura organizacional ...................................... 6
3. Resumo e tendências nas privatizações .......................................................... 8
4. As forças condutoras atrás da privatização .................................................... 9
5. Principais modelos de privatização ................................................................ 12
6. As opções dos Estados ..................................................................................... 13
7. Prós e Contras das opções .............................................................................. 15
8. Aplicabilidade das opções.............................................................................. 17
9. Algumas particularidades das infra-estruturas aeroportuárias ..................... 18
10. Principais aspectos a considerar nas opções .............................................. 20
11. Privatização dos serviços de navegação aérea ......................................... 21
12. Aspectos Legais e Reguladores..................................................................... 22
13. O processo de privatização .......................................................................... 24
14. Riscos da privatização para os Estados ........................................................ 25
15. Reorganização da estrutura da aviação civil ............................................. 26
16. A importância da consultoria ........................................................................ 27
17. Conclusão ....................................................................................................... 28
Índice de Ilustrações............................................................................................. 29
Índice de Tabelas ................................................................................................. 29
Bibliografia / Webgrafia ........................................................................................... 29
Página 3
4. A Privatização dos Serviços Aeroportuários – Sim ou Não?
Luís Miguel Cruz
1. Introdução
As privatizações no sector aeroportuário e de navegação aérea,
principalmente no primeiro, tiveram o seu início, em parte devido à
globalização e liberalização das economias mundiais e a um
movimento generalizado na privatização das Industrias e serviços
comercialmente orientados, tradicionalmente geridas pelos Estados.
A privatização dos serviços de navegação aérea está a seguir os passos
da privatização aeroportuária mas num ainda limitado numero de
Países, pelo que podemos afirmar que se encontra ainda num estado
embrional e em modo experimental de modelos aplicáveis. (Um
exemplo de sucesso é a NAV CANADA uma entidade privada não
lucrativa que detêm e gere o sistema de navegação aérea (SNA) civil
do Canadá com mais de 2000 controladores aéreos, 800 especialistas e
700 técnicos diversos, a operar desde Novembro de 1996).
(http://www.navcanada.ca)
Em Portugal, seguindo aliás a tendência instalada,
a pressão para a privatização tem vindo
invariavelmente não do gestor de serviços
aeroportuários, mas sim do accionista, ou seja, o
Governo.
Numa altura em que ainda uma larga maioria de aeroportos na UE está
sob controlo público (78%), observando a questão pelo ponto de vista
do número de passageiros, o cenário é bastante mais revelador de uma
certa tendência já que os 78% de aeroportos públicos apenas
receberam 52% do total de tráfego europeu de passageiros, ou seja
22% de aeroportos europeus assistiram 48% do total de tráfego de
passageiros, o que mostra que as privatizações estão a ocorrer
preferencialmente em aeroportos de grande dimensão (número em
crescendo segundo um estudo da ACI1). (ACI, 2010)
Este trabalho visa a temática da privatização dos serviços
aeroportuários, tema em cima da mesa em Portugal, e sempre que
achado necessário abordará também a área dos serviços de
navegação aérea.
1
ACI – Airports International Council – A ACI EUROPE representa mais de 400 aeroportos em 46 países
Europeus. Os seus membros são responsáveis por 90% do tráfego aéreo na Europa.
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5. A Privatização dos Serviços Aeroportuários – Sim ou Não?
Luís Miguel Cruz
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6. A Privatização dos Serviços Aeroportuários – Sim ou Não?
Luís Miguel Cruz
2. A ICAO e a sua política de estrutura organizacional
Hoje em dia, os aeroportos e serviços de
navegação nos diversos Países são
operados sob diversos modelos
organizacionais (Em Portugal temos a ANA2
como gestora dos aeroportos nacionais com a
subsidiária ANAM3 na Madeira e mais recentemente a NAER 4 como
base de lançamento do futuro novo aeroporto nacional).
Considerando as diversas circunstâncias envolvidas, a ICAO não
recomenda nenhum modelo organizacional específico, limitando-se a
definir linhas-mestras descrevendo os aspectos relevantes de cada um
deles. No entanto, considerando a vasta experiencia internacional da
ICAO, a recomendação actual vai no sentido de sugerir aos governos a
possibilidade de estudarem o estabelecimento de autoridades
autónomas que possam operar os serviços aeroportuários e de
navegação onde esta acção vá de encontro ao interesse geral tanto
dos prestadores como utilizadores dos respectivos serviços.
(Statements by the Council to Contracting States on Charges for Airports and Air
Navigation Services (Doc 9082/5) paragraphs 6 and 27). (ICAO, Statements by the
Council to Contracting States on Charges for Airports and Air Navigation Services (Doc
9082/5) paragraphs 6 and 27)
2A ANA - Aeroportos de Portugal, SA tem como missão gerir de forma eficiente as infra-estruturas
aeroportuárias a seu cargo, ligando Portugal ao mundo, e contribuir para o desenvolvimento
económico, social e cultural das regiões em que se insere. É ainda objecto da sua missão,
oferecer aos seus clientes um serviço de elevada qualidade, criando valor para os accionistas e
assegurando elevados níveis de qualificação profissional e motivação dos seus colaboradores.
3 Criada pelo Decreto-Lei n.º 453/91 de 11 de Dezembro, é uma sociedade de capitais
exclusivamente públicos, cujo objecto social consiste no estudo, planeamento, construção e
exploração dos Aeroportos da Região Autónoma da Madeira.
4 Criada pelo Decreto-Lei n.º 109/98 de 24 de Abril, é uma sociedade de capitais exclusivamente
públicos e tem por objecto social o desenvolvimento dos trabalhos necessários à preparação e
execução das decisões referentes aos processos de planeamento e lançamento da construção
de um novo aeroporto no território de Portugal Continental.
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7. A Privatização dos Serviços Aeroportuários – Sim ou Não?
Luís Miguel Cruz
Relativamente ao envolvimento privado na gestão parcial ou total dos
aeroportos, a ICAO alerta, por exemplo, que a privatização poderá, em
certos casos, oferecer benefícios significativos. No entanto o processo
de privatização deverá considerar a atenta revisão de um determinado
número de factores. O ponto fulcral é que um aeroporto é na sua
essência um monopólio em que os utilizadores - operadores, passageiros
e despachantes são altamente dependentes. Consequentemente, um
considerável número de balizas de segurança deverá ser considerado
antes de se avançar para a privatização (ICAO, Airport Economics
Manual Doc 9562 paragraph 2.28).
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8. A Privatização dos Serviços Aeroportuários – Sim ou Não?
Luís Miguel Cruz
3. Resumo e tendências nas privatizações
A privatização dos serviços
aeroportuários tem sido
testemunhada em todos os
Continentes.
Teve um rápido progresso na Europa
e na América Latina, com um
avanço mais lento na América do
Norte, Ásia (nomeadamente no
Sudoeste Asiático), Médio Oriente e
África.
Enquanto na Europa o processo de
privatização tem evoluído no sentido
da venda, na América Latina,
Austrália e alguns outros Países o
processo escolhido tem sido o do
leasing por múltiplos períodos.
A privatização dos serviços de
navegação aérea ainda não foi
seriamente considerada na grande
maioria dos Estados.
Este serviço é considerado como
mais ligado à segurança aérea, ter
implicações a nível de defesa
nacional e relações externas e
consequentemente menos propenso
à privatização.
Os serviços de navegação aérea
são também percebidos como
intimamente ligados à soberania dos
Estados uma vez que permitem a
entrada no espaço aéreo de cada
Nação.
(http://www.asianairlines-airports.com/)
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9. A Privatização dos Serviços Aeroportuários – Sim ou Não?
Luís Miguel Cruz
4. As forças condutoras atrás da privatização
Considerações financeiras
O financiamento das infra-estruturas aeroportuárias
por parte dos Estados tem-se tornado
progressivamente mais difícil devido à pressão para
desviar esse financiamento para outras prioridades
como sejam os serviços sociais. Em alguns Estados o
passado negligente derivado das dificuldades
financeiras levou à deterioração das infra-estruturas
aeroportuárias e os Estados têm-se revelado
impotentes para alterar esta situação.
Dado o constante aumento de tráfego aéreo, tornam-se necessários
grandes investimentos que os Estados não conseguem suportar de
forma a garantir o aumento recorrente de capacidade adicional. Para
além disso é esperado um aumento no custo operacional dos
aeroportos, nomeadamente no custo de compra ou arrendamento de
terrenos. As expectativas das companhias aéreas e restantes utilizadores
no que diz respeito à qualidade de serviço estão em crescendo. Os
novos aeroportos poderão tornar-se bastante onerosos não só a
desenvolver como também a operar. É agora tempo de repensar os
modelos existentes.
Ilustração 1 - Estado geral da Industria Aeronáutica, fonte: (Bentley, 2008)
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10. A Privatização dos Serviços Aeroportuários – Sim ou Não?
Luís Miguel Cruz
Os Governos começam a perceber que poderão rapidamente livrar-se
desse fardo de financiamento dos aeroportos para o sector privado,
nomeadamente aqueles com volume de tráfego relativamente grande.
A privatização dos aeroportos tem sido vista por alguns Governos como
uma potencial fonte de receita para cobrir ou reduzir o défice
orçamental. Por outro lado, aeroportos lucrativos são uma fonte regular
de impostos. A título de exemplo, podemos citar os aeroportos de Los
Angeles, concedidos à COMARCO 5 (sob a designação de Los Angeles
world Airports – LAWA), que nos primeiros 2 anos de actividade como
gestora dos mesmos subiu para $2,7M os $2,2M que o Estado garantia
com a sua gestão anterior, e esse valor tem crescido com decorrer dos
anos chegando aos $6,2M no último relatório de contas de 2010. (LAWA,
2010)
Recentes boas ofertas para a privatização de alguns aeroportos têm
encorajado os Estados a decidir-se por esse caminho.
No presente, a visão generalizada dos Governos é que deverão afastar-
se dos serviços que não façam parte do seu “core” enquanto
actividade pública e os aeroportos enquadram-se nesta moldura. Os
aeroportos, pelo menos os de maior dimensão, são hoje considerados
mais como entidades comerciais e não tanto como factor de utilidade
pública. Os maiores aeroportos estão a transformar-se em cidades no
seu interior com os seus pontos de venda e de encontro para pessoas e
negócios.
“O Governo deverá avançar com a privatização da maioria do capital da ANA -
Aeroportos de Portugal, no quadro do modelo de negócios do novo aeroporto
internacional de Lisboa.
O modelo final, que prevê a venda da maioria da capital da gestora de aeroportos
aos privados, foi aprovado ontem em Conselho de Ministros (CM). A decisão política
foi tomada ao mais alto nível, já que vai contra a intenção anunciada há cerca de
um ano pelo ministro das Finanças, Teixeira dos Santos, de o Executivo manter a
maioria do capital da ANA (…). O comunicado do CM refere apenas que o modelo
de transacção se baseará, em simultâneo, na privatização da ANA e na contratação
da concepção, construção, financiamento e exploração do novo aeroporto de
Lisboa, ambos a realizar através de uma única operação".” (DN, 2011)
5
COMARCO – A Comarco é uma empresa Californiana com escritórios em Anaheim, California. A divisão de
serviços aeroportuários com sede em Arlington, Virginia contratualizou a gestão dos aeroportos de Los
Angeles,onde se incluem o de Brackett em La Verne, Compton em Compton, El Monte em El Monte, Fox
Field em Lancaster, e Whiteman em Pacoima
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11. A Privatização dos Serviços Aeroportuários – Sim ou Não?
Luís Miguel Cruz
Existe um sentimento geral de que a privatização poderá levar a
melhorias na Gestão dos aeroportos, embora nem sempre seja este o
caso, especialmente porque os aeroportos são essencialmente
monopólios.
A emergente indústria global de gestão aeroportuária
A percepção global da comunidade de investidores e financeiros em
geral, é de que com uma situação de monopólio, crescimento contínuo
de tráfego e fortes cash-flows, um aeroporto poderá ser um bom
investimento e consequentemente emerge uma indústria global de
gestão aeroportuária.
“A Brisa considera que a privatização da ANA, operação que o Governo quer lançar
no próximo ano, é a sua “grande oportunidade de crescimento”.
No Dia do Investidor da empresa, o administrador Daniel Amaral reafirmou o interesse
do grupo em concorrer à privatização da gestora dos aeroportos nacionais.” (Babo,
2011)
Os investidores sabem que estarão sujeitos a forte regulação
governamental, mas as actividades comerciais no interior dos
aeroportos, com enormes receitas, não são reguladas.
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12. A Privatização dos Serviços Aeroportuários – Sim ou Não?
Luís Miguel Cruz
5. Principais modelos de privatização
Empresas detidas pelo Estado
(a) uma corporação autónoma;
(b) uma companhia com 100% do capital detido pelo Estado, e
(c) uma empresa responsável pela Gestão Aeroportuária e/ou serviços
de navegação aérea. (O presente conceito de privatização, mais
avançado do que no passado, não inclui estes sistemas de detenção
de capital e de gestão. Deveremos notar no entanto que sob estes
sistemas a aproximação ao sistema privado é evidente).
Participação/envolvimento do sector privado
(a) Parcerias publico-privadas com divisão do capital com
percentagem de até 49% para o sector privado;
(b) Leasing a curto-médio prazo a menos de 20 anos; e
(c) Contratos de gestão.
(Similarmente, esta categoria de aeroportos não se poderão considerar
privatizados, uma vez que o sector privado apenas detém uma
participação limitada).
Aeroportos privatizados
(a) Aeroportos com mais de 51% do capital pertencente ao sector
privado
(b) Venda directa /venda de acções em bolsa; e
(c) Leasing de longo-prazo a mais de 20 anos.
(Em rigor, os aeroportos em regime de leasing, seja em que modalidade
for, não deveriam ser considerados como privatizados, uma vez que a
sua posse não foi transferida.)
Detidos pelo
Nº de Detidos pelo Parcerias
Números totais Aeroportos Estado Público/Privadas
sector
Privado
Todos os Aeroportos 404 317 52 35
UE – 27 Países 306 237 43 26
Não UE – 18 Países 98 80 9 9
Tabela 1 – Total de aeroportos por modelo de gestão na Europa (UE e não UE) - (Council, 2010)
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13. A Privatização dos Serviços Aeroportuários – Sim ou Não?
Luís Miguel Cruz
6. As opções dos Estados
(a) Gestão do Estado
(1) Uma corporação autónoma
estabelecida debaixo de
regulamentação e estatutos especiais
(2) Uma s.a. com todas as acções
detidas pelo Estado
(3) Uma empresa estabelecida por
Decreto Administrativo
(b) Contractos de Gestão
Poderão ser de variadas durações
(c) Leasings
(1) Contractos de curto ou médio prazo
(menos de 20 anos)
(2) Contractos de longo prazo (acima de 20
anos)
(o BOT6 e as suas variantes são também
considerados contractos de leasing)
(d) Participação minoritária do sector privado
Limitada a 50% ou menos das acções
(e) “ownership and control” do sector privado
(1) Sector privado detém mais que 50% das acções
(2) Venda total do aeroporto
6
BOT – Build-Operate-Transfer - é uma forma de financiamento de projectos onde a iniciativa privada recebe a
licença do sector para financiar, projectar, construir e operar uma instalação por um período determinado, após o qual o
controlo é transferido de volta para a administração pública. Antes da transferência, a instituição privada possui
permissão para estabelecer tarifas de uso e arrendar os estabelecimentos de forma a recuperar os investimentos
iniciais, além de compensar os custos operacionais e de manutenção do projecto.
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14. A Privatização dos Serviços Aeroportuários – Sim ou Não?
Luís Miguel Cruz
Modelos de Gestão na UE
100
75
50
25
0
PÚBLICO PPP PRIVADO
Ilustração 2 - Modelos de Gestão aplicados nos Aeroportos da UE por País - fonte: (Council, 2010)
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15. A Privatização dos Serviços Aeroportuários – Sim ou Não?
Luís Miguel Cruz
7. Prós e Contras das opções
Na opção (a) do capítulo anterior, os
serviços aeroportuários e de navegação
aérea permanecem basicamente sob o
controlo do governo sendo apenas a sua
gestão transferida para uma outra
organização, que é normalmente
autónoma quer operacional quer
financeiramente. No entanto, a
autonomia poderá ser restrita.
O que se espera de uma organização
governamental é que sirva o interesse publico sendo o lucro um factor
secundário como motivo de existência. Esta opção poderá garantir aos
Estados a possibilidade de adequar o desenvolvimento dos aeroportos
de acordo com a sua politica social e económica.
Na opção (b) a gestão dos aeroportos é transferida para uma entidade
profissional privada durante um período limitado de tempo. A posse do
aeroporto permanece no Estado. O aeroporto em questão irá
beneficiar da gestão profissional mas com esta opção o gestor
profissional não irá efectuar quaisquer desenvolvimentos da estrutura
com fundos próprios. Esta opção poderá ser vantajosa para aeroportos
com fraco potencial de desenvolvimento mas que desejem melhorar a
sua gestão.
Na opção (c) o aeroporto permanece propriedade do governo mas a
gestão e desenvolvimento são transferidos para a entidade privada por
um determinado período fixo de tempo. No final desse período o
aeroporto é devolvido ao locador. Durante o período de duração do
leasing a entidade privada irá ficar com todos os eventuais lucros. A
entidade pagará ao Estado uma determinada quantia a título de
aluguer ou um royalty. Os trabalhos de desenvolvimento dos aeroportos
nesta opção ficam normalmente a cargo da entidade privada.
No sistema de leasing o Estado mantém a posse das instalações
aeroportuárias, pelo menos psicologicamente. No entanto sob estes
termos o valor a receber pelos estados é predeterminado e fixo durante
a duração do contracto. Para períodos mais extensos o montante é
necessariamente superior.
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16. A Privatização dos Serviços Aeroportuários – Sim ou Não?
Luís Miguel Cruz
Na opção (d) a posse do aeroporto é parcialmente transferida para o
sector privado. Com este sistema o governo terá a opção de decidir, de
tempos a tempos, a proporção da participação de cada parte. A
vantagem está na possibilidade de poder transferir a posse por fases.
Em Países como Portugal, no entanto, a menos que a gestão seja
também transferida para o sector privado, (havendo um investidor
estrangeiro com uma larga fatia do capital), a transferência parcial de
posse poderá não atrair o investimento estrangeiro.
Na opção (e) a maioria da posse do aeroporto é transferida para uma
entidade privada ou efectivamente vendida como qualquer outro
bem. No entanto, uma vez vendidas as acções, poderá não ser possível
reaver o aeroporto a menos que o governo decida comprar de volta as
acções e os privados estejam dispostos a vender. Neste cenário é
provável que o governo tenha que pagar um preço mais elevado.
Contratualizar uma opção de compra poderá ser uma opção para
aeroportos mais pequenos sem relevância económica de maior.
Esta não costuma ser uma opção e, a efectivar-se, obrigaria à
existência de um corpo regulador que assegure os interesses das
operadoras, passageiros e dos Estados em última análise.
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16
17. A Privatização dos Serviços Aeroportuários – Sim ou Não?
Luís Miguel Cruz
8. Aplicabilidade das opções
Todas as opções apresentadas estão a ser
actualmente aplicadas em diferentes
partes do globo em maior ou menor
escala.
Isto deve-se aos diferentes ambientes
económicos, políticos e sociais de cada
País.
O volume de tráfego desempenha também um papel fundamental na
viabilidade económica de um aeroporto e subsequentemente na
escolha do modelo de gestão a adoptar.
Os dados disponíveis não permitem concluir se uma opção é de facto
melhor do que outra. O que será melhor para Portugal, depende de
bastantes factores externos, da análise do volume de tráfego e
potencial de crescimento, condições das infra-estruturas existentes,
requisitos de melhoria e expansão, acesso ao mercado de capital,
mão-de-obra especializada de gestão disponível e a política de
transportes global do próprio governo quanto à posse e gestão das
infra-estruturas do estado.
Uma opção em particular poderá servir para um determinado
aeroporto mas não para outro. Num mesmo Estado é possível a
aplicação de mais do que um modelo. Debaixo de cada opção são
admitidas ainda variações.
De notar que os aeroportos são uma indústria de serviços, cujo objectivo
primário é garantir um serviço seguro, eficiente e económico às
companhias aéreas, passageiros e restantes utilizadores. A posse e
gestão do aeroporto deverá ser entendida como um meio para atingir
este fim. No entanto a autonomia financeira e operacional é a chave
para o sucesso da estrutura organizacional.
Num regime privatizado, a regulação económica e de segurança é de
vital importância. Parece ser também claro que no futuro a
dependência dos estados para com o sector privado no financiamento
dos serviços aeroportuários será crescente, independentemente dos
modelos de posse e Gestão adoptados. (Bentley, 2008)
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18. A Privatização dos Serviços Aeroportuários – Sim ou Não?
Luís Miguel Cruz
9. Algumas particularidades das infra-estruturas
aeroportuárias
As estruturas aeroportuárias têm determinadas características próprias
que diferem das restantes industrias e mesmo de outras infra-estruturas
do sector dos transportes. Desde que geridas ou controladas pelos
Estados, a boa gestão destas particularidades pode ser garantida. No
entanto, se o aeroporto estiver em mãos privadas, onde o principal
objective é a maximização do retorno do investimento, algumas
precauções são necessárias e a indústria deverá estar suficientemente
regulada para garantia dos direitos dos diversos stakeholders.
Uma vez que os maiores aeroportos, que são afinal os que são
considerados para privatização, são na sua maioria Internacionais,
(servem portanto tráfego internacional entre dois ou mais Estados),
estão envolvidos no âmbito de acordos bilaterais ou multilaterais entre
os Estados. Estes acordos estão regulados por orientações da ICAO
quanto a custos envolvidos (Artigo15 da Convenção da Aviação Cívil,
“Statements by the Council to Contracting States on Charges for Airports
and Air Navigation Services”, Doc 9082/5).
Article 15
Airport and similar charges
Every airport in a contracting State which is open to public use by its national aircraft shall
likewise, subject to the provisions of Article 68, be open under uniform conditions to the aircraft of
all the other contracting States. The like uniform conditions shall apply to the use, by aircraft of
every contracting State, of all air navigation facilities, including radio and meteorological
services, which may be provided for public use for the safety and expedition of air navigation.
Any charges that may be imposed or permitted to be imposed by a contracting State for the
use of such airports and air navigation facilities by the aircraft of any other contracting State shall
not be higher, (a) as to aircraft not engaged in scheduled international air services, than those
that would be paid by its national aircraft of the same class engaged in similar operations, and
(b) as to aircraft engaged in scheduled international air services, than those that would be paid
by its national aircraft engaged in similar international air services.
All such charges shall be published and communicated to the International Civil Aviation
Organisation: provided that, upon representation by an interested contracting State, the charges
imposed for the use of airports and other facilities shall be subject to review by the Council, which
shall report and make recommendations thereon for the consideration of the State or States
concerned. No fees, dues or other charges shall be imposed by any contracting State in respect
solely of the right of transit over or entry into or exit from its territory of any aircraft of a contracting
State or persons or property thereon.
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19. A Privatização dos Serviços Aeroportuários – Sim ou Não?
Luís Miguel Cruz
As companhias aéreas operam no ar mas utilizam aeroportos para
aterrar e descolar, que são consideradas fases críticas de voo. Assim
sendo, os aeroportos desempenham um papel fulcral na segurança das
operações das companhias aéreas. Pela sua natureza a segurança das
Operações de voo é uma prioridade máxima, e uma parte considerável
das despesas de um aeroporto está co-relacionada.
Os aeroportos têm um carácter monopolístico. Em certos Estados, com
um território pouco vasto, com apenas um aeroporto internacional, ou
Estados separados de outros por barreiras aquáticas ou físicas, os
aeroportos desempenham um papel fulcral na economia.
Foto – Aeroporto Internacional de Male - Maldivas
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20. A Privatização dos Serviços Aeroportuários – Sim ou Não?
Luís Miguel Cruz
10. Principais aspectos a considerar nas opções
Se um Estado quiser considerar uma alteração
da posse ou estrutura de gestão dos seus
aeroportos, deverá ter em consideração alguns
pontos.
Ao considerá-los a gestão aeroportuária deverá
estar permanentemente envolvida em todas as
fases do processo.
É também necessário definir os objectivos a curto, médio e longo prazo
da mudança. Alguns dos pontos iniciais, que requerem consideração,
são:
Examinar em profundidade o estado actual das infra-estruturas no
País e os problemas que enfrentam tanto a nível financeiro como
de gestão.
Preparar um relatório detalhado de proveitos e custos dos
aeroportos e fazer previsões para o futuro, (se possível para os
próximos 20 anos).
Também, fazer uma previsão das necessidades de
desenvolvimento prementes e as possíveis opções para garantir a
resolução das necessidades financeiras e de gestão.
Se a privatização for considerada como uma opção, decidir que
serviços e instalações deverão ser privatizados e qual o método a
utilizar.
Também considerar o que fazer com os serviços restantes.
É de notar que o sector privado só estará essencialmente interessado
em instalações que sejam ou que tenham potencial para vir a ser
lucrativas.
Página
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21. A Privatização dos Serviços Aeroportuários – Sim ou Não?
Luís Miguel Cruz
11. Privatização dos serviços de navegação aérea
Para o sucesso da gestão e operação dos serviços de navegação
aérea, a autonomia financeira e de gestão é tão importante como
para os aeroportos. No entanto, é necessária uma abordagem bem
mais cautelosa uma vez que em termos de segurança e outros
importantes aspectos envolvidos estaremos a considerar uma escala
bem superior.
Ilustração 3 - Eurocontrol Centre - Maastricht
Página
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22. A Privatização dos Serviços Aeroportuários – Sim ou Não?
Luís Miguel Cruz
12. Aspectos Legais e Reguladores
Para uma mudança na posse e gestão
das infra-estruturas aeroportuárias ou
serviços de navegação aérea, poderão
ser necessárias alterações nas Leis
Nacionais. Poderão ter de existir emendas
em Leis já existentes ou aprovação de
nova Legislação. A abrangência da
Legislação irá depender do que já esteja
em vigor e da opção escolhida. As novas
Leis para além de permitir aos Governos
alterações à posse e gestão, deverão permitir a reestruturação da
restante organização da aviação civil.
A ICAO, como corpo regulador para a aviação civil, desenvolveu
algumas regras de procedimentos standards para ajudar os Estados na
prossecução da segurança das operações. São necessárias inspecções
e auditorias periódicas das instalações aeroportuárias tanto pelo
operador como pelo regulador. Salvaguardas em relação ao ambiente,
que incluem, emissão de ruído, CO2, água, esgotos, armazenamento
de combustível e tratamento de lixos deverão também ser
consideradas.
É sobretudo necessário assegurar que o poder monopolístico que um
aeroporto garante não é mal utilizado. Um monopólio não regulado é
mais prejudicial que um serviço publico ineficiente. (Bentley, 2008)
As obrigações internacionais tais como, o livre acesso, a não
discriminação de utilizadores, e as políticas e procedimentos financeiros
da ICAO, etc., especialmente no que diz respeito às taxas a cobrar
deverão ser respeitadas. Poderá ter de existir algum tipo de controlo
sobre outras eventuais taxas cobradas e a qualidade do serviço
oferecido pelo operador privado.
A regulação tem assim um preço, uma vez que coloca alguns
constrangimentos na flexibilidade do operador privado.
A falta de controlo efectivo dos Estados, com a aplicação avulsa de
regras não precisas, aumenta o risco do operador privado e este
poderá levar a maiores expectativas na prossecução do lucro e assim
também menor valor para o Estado.
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23. A Privatização dos Serviços Aeroportuários – Sim ou Não?
Luís Miguel Cruz
É importante que as regras possam ser precisas e as mínimas
indispensáveis.
Idealmente, a autoridade reguladora deverá ser independente.
O objectivo final dos Estados deverá ser o balanceamento de interesses
dos variados stakeholders, incluindo investidores privados, passageiros,
companhias aéreas, interesses comerciais, comunidade local e o
público em geral.
Outros
Passageiros
Companhias Aéreas
Investidores Privados
Página
23
24. A Privatização dos Serviços Aeroportuários – Sim ou Não?
Luís Miguel Cruz
13. O processo de privatização
Dado pretender-se fazer a melhor
escolha, a privatização de aeroportos
poderá ser um processo
relativamente detalhado e
complicado para um Estado. O
processo deverá ser tratado de forma
cuidada e não ser implementado de
forma apressada. O Governo deverá
garantir todo o tipo de informação
aos potenciais licitadores para que
estes possam avaliar todo o cenário e fazer ofertas realísticas. O
operador seleccionado deverá estar bem reputado, ser
financeiramente estável e experiente. Uma eventual oferta
extraordinariamente alta deverá ser encarada com cautela e deverão
ser exigidas explicações detalhadas ao proponente antes de tal oferta
ser aceite. Preferencialmente, o processo de ofertas deverá ser dividido
em duas fases, uma para avaliar os proponentes e uma segunda
especificamente para as ofertas financeiras. No fundo será convidar
determinados proponentes pré-avaliados/seleccionados a fazer a sua
oferta.
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25. A Privatização dos Serviços Aeroportuários – Sim ou Não?
Luís Miguel Cruz
14. Riscos da privatização para os Estados
Todas as actividades comerciais têm um factor de risco associado, e os
aeroportos não são naturalmente excepção. Os principais riscos são:
A entidade privada poderá ir à falência.
A entidade privada poderá ignorar requisitos de segurança.
Se um grupo de aeroportos for gerido por uma mesma entidade,
a mesma poderá ignorar o desenvolvimento de alguns deles em
detrimento dos mais rentáveis.
A entidade privada poderá aumentar as taxas de utilização, o
que poderá não ser atractivo tanto para o estado ou para a
região de inserção do aeroporto.
A entidade privada poderá não honrar os pagamentos previstos.
A entidade privada poderá pressionar o estado a renegociar os
termos do contracto de leasing, após ter acordado termos de
pagamento pouco realísticos, ou as expectativas de tráfego não
terem sido alcançadas.
Se os contractos forem bem preparados, os riscos poderão ser
minimizados.
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26. A Privatização dos Serviços Aeroportuários – Sim ou Não?
Luís Miguel Cruz
15. Reorganização da estrutura da aviação civil
A actual estrutura da aviação civil necessitará de ser reorganizada em
consequência das mudanças na estrutura de posse e gestão de certas
infra-estruturas e serviços. A natureza e extensão dessa reorganização
irá depender primariamente do que permanecerá sob controlo do
governo após a mudança.
Regra geral apenas alguns aeroportos irão ser privatizados, os restantes
tal como os serviços de navegação aérea permanecerão sob o
controlo do governo. As opções poderão ser:
1 - Manter os restantes aeroportos e serviços de navegação aérea sob
controlo do Estado. Esta opção será a ideal para Estados com tráfego
Limitado.
2 - Criar uma entidade autónoma para o fornecimento de serviços
aeroportuários e de navegação aérea com o comprometimento do
Governo em suprir as necessidades financeiras de cobertura de
eventuais défices e/ou capitalização de investimentos.
3 - Uma entidade autónoma que possa gerir os serviços de navegação
aérea, e os restantes aeroportos a ficarem sob controlo do governo
4 - Também é possível privatizar os restantes aeroportos e escolher a
entidade que requerer menos subsídios.
Qualquer que seja a opção, o poder regulador necessita ficar sob a
tutela do governo ou de uma entidade independente. Em Países de
grande dimensão, a segunda hipótese parece ser a mais viável. No
entanto, uma vez que a necessidade de regulação à partida
aumentará com a introdução de regimes privados de gestão, a
unidade do ministério competente encarregada do problema da
regulação deverá ser reforçada.
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27. A Privatização dos Serviços Aeroportuários – Sim ou Não?
Luís Miguel Cruz
16. A importância da consultoria
É comummente aceite que o processo de
selecção de um investidor privado seja feito
através de um processo claro de licitação
aberta e publica da forma mais transparente
possível.
Uma vez que a privatização da prestação de
serviços aeroportuários é um processo
complexo no qual os governos poderão não
ter especialistas na área em número
suficiente, seria vantajoso e desejável que possam obter
aconselhamento de uma ou mais entidades de consultoria externa. Ao
fazerem isso, no entanto, é importante que todos os esforços sejam no
sentido de avaliar a real mais-valia da consultoria escolhida
nomeadamente nos conhecimentos da área de especialização.
É necessário também assegurar que o consultor não tem qualquer
afiliação com os licitadores. A Gestão aeroportuária deverá trabalhar
em forte cooperação com os consultores, monitorizar regularmente o
seu trabalho e avaliar cuidadosamente os relatórios produzidos. Não
deverá ser esquecido que um consultor é apenas um conselheiro e que
todas as decisões finais deverão ser feitas pelos governos.
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28. A Privatização dos Serviços Aeroportuários – Sim ou Não?
Luís Miguel Cruz
17. Conclusão
Os Aeroportos são uma Industria de SERVIÇOS, o principal objectivo
passa pela prestação de serviços seguros, eficientes e económicos às
companhias aéreas, passageiros, despachantes, etc. Existem diversas
alternativas de posse e gestão para a prestação desses serviços, e essas
opções deverão ser consideradas como um meio para atingir uma
decisão final rumo ao desejado resultado. A informação disponível e
pesquisada neste trabalho não permite concluir com clareza qual a
melhor opção. Assim sendo os Estados deverão escolher aquela opção,
que lhes permita alcançar os seus objectivos, conforme descrito acima.
Deverá ser no entanto notado o seguinte;
(a) A opção escolhida deverá garantir uma relativa autonomia
operacional e financeira;
(b) A industria deverá estar devidamente regulada, e;
(c) no futuro, a indústria deverá tendencial e exponencialmente
depender de financiamentos do sector privado para suporte dos seus
programas de desenvolvimento.
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29. A Privatização dos Serviços Aeroportuários – Sim ou Não?
Luís Miguel Cruz
Índice de Ilustrações
Ilustração 1 - Estado geral da Industria Aeronáutica, fonte: (Bentley, 2008) ........ 9
Ilustração 2 - Modelos de Gestão aplicados nos Aeroportos da UE por País -
fonte: (Council, 2010) ............................................................................................... 14
Ilustração 3 - Eurocontrol Centre - Maastricht ....................................................... 21
Índice de Tabelas
Tabela 1 – Total de aeroportos por modelo de gestão na Europa (UE e não UE)
- (Council, 2010)........................................................................................................ 12
Bibliografia / Webgrafia
(s.d.). Obtido de http://www.asianairlines-airports.com/.
ACI, E. (2010). The ownership of europe`s airports. Obtido em 04 de Novembro
de 2011, de Web site da ACI - Airports Council International: http://www.aci-
europe.org/
Babo, M. J. (2011). Privatização da ANA é a grande oportunidade de
crescimento da Brisa. Jornal de Negócios Online .
Bentley, D. (2008). World Airport Privatization 2008 and Beyond . Manchester:
DJB Associates.
Council, A. E.-A. (2010). The ownership of Europe`s Airports.
DN. (2011). Governo vai vender maioria do capital da ANA. Diário de Noticias .
http://www.navcanada.ca. (s.d.). Obtido em 04 de Novembro de 2011
ICAO. Airport Economics Manual Doc 9562 paragraph 2.28.
ICAO. Statements by the Council to Contracting States on Charges for Airports
and Air Navigation Services (Doc 9082/5) paragraphs 6 and 27.
LAWA. (2010). LAWA_Annual_Financial_Report_2010.pdf.
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