O documento descreve a situação de crise energética no Brasil em 2001 devido à estiagem, as ações do governo FHC para lidar com o racionamento de energia através de uma campanha de comunicação e as lições aprendidas. A campanha usou porta-voz único, discurso positivo e engajamento da população para reduzir o consumo de energia em 20% e evitar um colapso no sistema elétrico.
Crise do apagão de energia elétrica no Brasil em 2001
1. Uma luz no apagão
ESPM | Pós-graduação em Comunicação Integrada
Gerenciamento de Crise | Prof. André Moragas
Bernardo Solon, Fabrício Machado,
Fernanda Castelo Branco, Patrícia Ribeiro,
Vanessa Medeiros
Dezembro 2011
2. Situação:
• Hidrelétricas responsáveis por 97% da energia gerada no país
• Menores índices pluviométricos dos últimos 70 anos –
reservatórios com níveis baixíssimos
• Consumo de energia cresceu 4,1% na década de 1990
• População tinha mentalidade de fartura
O Brasil tem encontro marcado com o caos. No dia 1º de junho
começa o plano de racionamento, expressão elegante que o
governo encontrou para referir-se a um blecaute que vai apagar as
cidades brasileiras por três, quatro, cinco horas – todos os dias.
(“Blecaute”, Revista Veja / Maio de 2001)
3. Em 10 de maio de 2001, FHC criava a
Câmara de Gestão da Crise de Energia,
que ficaria sob a liderança do chefe da Casa Civil,
Pedro Parente, o “ministro mais poderoso”
com poder de decisão “sem o embargo da burocracia”.
O alto comando do setor elétrico do país foi reunido,
incluindo o ministro de Minas e Energia e os
presidentes da Petrobras, da Eletrobrás e da ANP.
4. 11 de maio de 2001:
1ª entrevista coletiva, no Palácio do Planalto,
tendo o ministro Pedro Parente como porta-voz.
Press kit incluía release com dados técnicos,
blocos de notas e cartilhas
• Retrabalho: a primeira sugestão de marca da Comissão
tinha sido “Brasil Energia”, mesmo nome de uma importante
revista setorial. Tiveram que refazer pastas, adesivos e informativos.
• Dimensionamento: estavam preparados para receber
150 jornalistas, mas foram mais de 500.
• Falha na mensagem: as principais dúvidas quanto ao impacto
do racionamento na economia e na vida das pessoas persistiam.
5. 13 de maio de 2001:
O temor estampava a capa das principais revista semanais
6. “Prepare-se: o racionamento vai infernizar sua vida, desacelerar
a economia e pode devastar a imagem do governo”
(Revista Veja, maio de 2001)
“A economia crescerá menos, haverá
demissões, exportações serão
canceladas e a inflação aumentará”
(Revista Isto É, maio de 2001)
7. Objetivos do plano:
• Passar segurança e mostrar controle da gestão
• Explicar o plano de racionamento
- Convocar à racionalização do consumo (medida imediata)
- Criar novos hábitos de consumo (reeducação)
• Preservar a imagem do presidente FHC
- Mostrar que o governo não foi negligente
- Apresentar alternativas para a indústria
8. Pontos fortes:
• Imersão Agência responsável pela campanha já conhecia o setor
(atendia Eletrobras e Petrobras) e participou das reuniões da Câmara de
Gestão.
• Antecipação Planos pré-estabelecidos para situações extremas, com
antecipação de cenários com base em pesquisas qualitativas e auditorias.
• Marca positiva Criação da marca Energia Brasil, com tom mais positivo
que “Câmara de Gestão da Crise de Energia Elétrica”.
• Discurso positivo Em vez de abordar o racionamento compulsório,
buscou criar uma mania nacional
9. Princípios da comunicação:
• Centralização das decisões, liderança bem definida: Pedro Parente
• Porta-voz único para garantir coerência no discurso
(evitar controvérsia, polêmica, descontrole e pânico)
• Objetividade, sem discutir hipóteses para não desinformar
• “Era preciso aguentar as críticas, fazendo sempre o nosso
contraponto com vigor”
• Não permitir privilégios, para não ter busca por furos
• Exigir postura exemplar das autoridades envolvidas
• Preocupação com o discurso: racionalização e não
racionamento
10. Discurso:
• Discurso informativo Situação dos reservatórios, investimentos do
governo no setor elétrico (térmicas), andamento do trabalho da Comissão:
página na internet com dados, infomerciais, depoimentos exemplares
(empresários), palestras
• Discurso emotivo direto (consumidor final) Patriotismo, benefício
próprio (economia), sem tecnicismos, sem ameaça de corte de energia:
campanha com tomadinhas falantes, merchansiding (personalidades)
“Poupe energia. Bom para o Brasil. Melhor para você.”
“As pessoas não queriam saber se o setor estava privatizado,
se era culpa do governo ou não, mas se ia faltar luz em casa
e o que poderiam fazer para evitar o colapso”
11. Fases do plano:
• Conscientização – situações do dia-a-dia em que poderia
haver desperdícios.
• Institucional – com apresentação da situação os
reservatórios (reforçar a ideia de que a população
precisava continuar colaborando).
• Anúncios testemunhais – havia a preocupação de que as
pessoas começassem a baixar a guarda e diminuíssem o
esforço da economia.
12. Ações de comunicação:
• Convocação ao engajamento dos veículos: serviço, informação e
colaboração (criação do kit imprensa).
• Campanha de comunicação ativa muito rica, com ações gigantescas em
todas as mídias. O governo FHC dependia disso e não poupou recursos.
• Adaptação do tom de abordagem para cada segmento de público
(programas de auditório, jornais econômicos, revistas femininas etc.).
• Peças específicas para fase de manutenção da comunicação, para que o
sucesso dos primeiros resultados não fizessem diminuir o esforço de
economia de energia.
• Trabalho coordenado entre publicidade e assessoria de
imprensa
13. Resultados:
• Conseguiu-se falar ao coração do povo. Tamanho engajamento fez o
discurso de oposição perder força (quem criticasse seria “antipatriota”).
• Adesão de estados que não estavam no plano do racionamento.
• Meta de redução de 20% foi alcançada e mantida, às vezes superada.
• Cinco anos para voltar aos níveis iniciais de consumo, calcularam as
distribuidoras.
• A crise se tornou uma oportunidade para “demonstração cabal de
competência”.
14. Resultados:
• A comunicação ativa que criou fatos e alimentava a imprensa com
bastante informação o tempo todo não deixou que a privatização do
setor pudesse aflorar na imprensa.
• Evitou-se que a crise virasse um problema institucional
• Fechamento da conta: no dia 14 de dezembro de 2001, o ministro fez
um pronunciamento à Nação.
15. Sugestões e críticas:
• Tensão que gera erro: Tiveram que refazer pastas, adesivos e
informativos em função do primeiro nome escolhido para a Comissão. Isso
às vésperas do primeiro pronunciamento público sobre o assunto.
• Cálculo equivocado para os kits da coletiva de imprensa. Subestimaram
a repercussão do assunto, tendo em vista que o boato já estava espalhado
e um problema que afetava diretamente 100 milhões de brasileiros.
• A 1ª coletiva era o momento para dirimir todas as dúvidas. A atenção
dos 500 jornalistas foi desperdiçada e o caos negativo tomou conta da
imprensa nos primeiros dias que antecederam o
racionamento.
16. Sugestões e críticas:
• A definição de um discurso único foi um dos pontos positivos da gestão,
mas definir e preparar um segundo porta-voz, para conseguir
preencher e atender às solicitações de forma única e integrada, quando o
porta-voz oficial não pudesse ou conseguisse atender, poderia ter evitado
alguns ruídos.
• Ter uma excelente base de dados em um momento de crise é
fundamental, principalmente para nortear o trabalho da assessoria de
imprensa: pautas positivas, de utilidade pública, personagens, etc.
• Antever cenários e novas crises: todos os participantes
da campanha participaram de forma ativa do racionamento.
Já alguns senadores foram questionados sobre o uso
abusivo de energia.
17. Sugestões e críticas:
• Monitoramento da percepção: a crise não foi citada pelos opositores do
Governo FHC nas Eleições de 2002. Alguns meses depois a população não
lembrava mais da crise. Importância da realização de pesquisas
qualitativas e quantitativas após a crise.
• Novas campanhas pós-crise com o objetivo de fortalecer a imagem do
cliente em questão.
• O texto não cita quais as ações de comunicação interna foram
realizadas junto às companhias de energia elétrica e aos demais
stakeholders.
18. Sugestões e críticas:
• Palestras de economia doméstica, incluindo dicas de economia de
energia. Como as famílias podem controlar o orçamento e aproveitar a
queda dos gastos com a conta de luz, por exemplo.
• Criar um infográfico sobre a matriz energética e as principais fontes, outro
sobre os aparelhos que mais consomem e os pontos de maior desperdício
doméstico. Os infográficos têm linguagem de fácil entendimento e
poderiam ser publicados em revistas como a Superinteressante, além de
ilustrar material informativo.
• Cartelas de adesivos ("não esqueça de desligar“, etc.) encartadas em
revistas para as pessoas colarem em casa e no trabalho,
ilustradas com as mesmas "tomadinhas falantes"
dos anúncios de TV.
19. Sugestões e críticas:
• Oferecer workshop para professores, de forma que eles estimulassem
atividades de conscientização nas escolas e as crianças passassem a
participar da economia em casa. O engajamento das crianças é
muito importante e palestras lúdicas em escolas também seria um ponto a
favor.
• Ação a médio/longo prazo: criar programas de incentivo acadêmico,
como premiação de monografias sobre o sistema elétrico nacional ou
estímulo ao desenvolvimento de novas tecnologias de eficiência
energética. Esses assuntos poderiam ser trabalhados, inclusive, em
sugestões de pauta para a imprensa.