O documento descreve uma conversa durante um jantar onde as pessoas falam sobre séries de TV antigas. O narrador nota o sorriso e brilho nos olhos azuis de uma bela mulher ao lado dele quando mencionam o ator Richard Chamberlain. Ele pergunta se ela achava o ator bonito e ela assente com um sorriso discreto. O narrador reflete sobre a beleza e solidão das mulheres bonitas.
2. Ao fim do jantar, falava-se sobre
televisão, violência, filmes de terror
e crimes, besteirol dos auditórios, e
alguém lembrou a inocência das
séries antigas: “Os Intocáveis”,
“Bonanza”, “Perdidos no Espaço”,
“Caldeira do Diabo”, “Dr. Kildare”,
estrelada por Richard Chamberlain,
então jovem.
3. Ao mencionarem o nome
deste, notei leve sorriso e
brilho nos olhos de
tranqüilo azul da linda
mulher ao meu lado.
4. Bonitas buscam bonitos, sei,
porém não desisti e lhe
perguntei, de chofre:
“Você achava o Richard
Chamberlain bonito, não é?”
5. Ela assentiu em discreto sorriso,
ainda sem saber se era um modo
de eu puxar conversa, de
agradá-la, ou percepção
aguçada – de minha parte - do
que com ela se passava (o que a
tornaria vulnerável).
Sorriu, silenciosa, no eterno
enigma das mulheres.
6. Pousou seu azul olhar no
passado, e por certo lhe vieram
à memória emotiva os embates
amorosos que enfrentou por ser
linda, desejada e sedutora numa
sociedade que lhe ensinou
monogamia e (vá lá...), a
fidelidade.
7. Minha atenção ousou
interpretar o brilho
.
encabulado de seu olhar
azul.
Mulheres lindas são
princesas aprisionadas em
torres de castelos
inexpugnáveis.
8. Não será este cronista tão
desajeitado, o passo cambaio,
algo tronchudo, não será ele que
falará de beleza com
conhecimento de causa.
Posso, sim, avaliar e admirar
(na proporção inversa da
possibilidade de fruir).
9. Hoje sei apreciar a beleza e a
solidão da mulher linda, com a
desambição de quem já a sabe
impossível para si, sei admirar sua
resistência a olhares, a paixões
rimbombantes, a cortejadores sutis
ou rombudos, a homens que amaria
e não pode.
10. Ah, ser carente do amor de quem
ama, mesmo sabendo-o aquém.
Ah, ter que esconder, calar,
disfarçar, ver sem olhar, olhar sem
ver, sempre olhada e perseguida por
inveja ou paquera.
11. Comoveu-me aquela mulher
azul, serena e poderosa,
certamente perseguida por
quilômetros de olhares, atrações
e galanteios, a contentar-se
com guardar para si o enorme
poder de ser bela.
12. Olhei-a várias vezes, sempre
encantado, enquanto ela “azulzava”,
fingindo não perceber.
Mulher sempre sabe quando está a ser
olhada; encabulou e não demonstrou,
até que reduziu-me a pó com a
seguinte e humilhante frase: