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EccoS revista científica
Centro Universitario Nove de Julho
eccos@uninove.br
ISSN (Versión impresa): 1517-1949
BRASIL




                                                        2000
                                                  Eduardo Santos
                   RESEÑEA DE quot;O ÓCIO CRIATIVO (ENTREVISTA A MARIA SERENA PALIERI)quot; DE
                                              DOMENICO DE MASI
                            EccoS revista científica, dezembro, año/vol. 2, número 002
                                       Centro Universitario Nove de Julho
                                                  São Paulo, Brasil
                                                    pp. 129-134




            Red de Revistas Científicas de América Latina y el Caribe, España y Portugal

                           Universidad Autónoma del Estado de México

                                      http://redalyc.uaemex.mx
Resenhas
                                                                           EccoS Rev. Cient., UNINOVE, São Paulo: (v.2 n.2): 123-154




DE MASI, Domenico. O Ócio Criativo (entrevista a Maria Serena Pa-
lieri). Tradução Léa Manzi. Rio de Janeiro: Sextante, 2000.

             TRABALHO E PRAZER: ENFIM RECONCILIADOS?

                                                               Eduardo Santos*                *Sociólogo, Mestrando em Ge-
                                                                                              ografia Humana (USP). Coor-
                                                                                              denador de Política Editorial e
       Feita uma retrospectiva histórica   mais adequada entre as partes, abrindo             Editor de EccoS.
das relações entre trabalho e prazer ao    a todas as classes possibilidades inéditas
longo do périplo humano no planeta,        para uma convivência mais equilibrada,
dificilmente deixaremos de chegar à         materializada por um capitalismo em
conclusão de que, parafraseando os         que tecnologia e democracia política
compositores da música regional, es-       favoreceriam uma distribuição mais
tas duas dimensões tão fundamentais        igualitária dos frutos do trabalho.
quanto necessárias da vida humana                  Ledo engano! Hoje, no limiar de
sempre andaram “entre tapas e beijos”.     um novo século, o canto de sereia no-
A reconciliação, que na canção aconte-     vamente se faz ouvir, embalando-se na                                                  E
                                                                                                                                  C
ce à noite nos espaços da intimidade,      melodia de um avanço tecnológico sem                                                   C
é apenas aparente no primeiro caso:        precedentes, que permitiria ao trabalho                                                O
trabalho e prazer, no mais das vezes,      – e aos trabalhadores – livrarem-se das                                                S
reconciliam-se apenas em processos de      tarefas pesadas e brutalizantes que sus-                                               R
sublimação, com as decorrentes patolo-     tentam a produção de bens e de valor, e                                                E
gias que acometem os elos mais frágeis     romperem os grilhões que os acorrentam                                                 V.
da corrente – os trabalhadores.            aos desígnios do capital, para lembrar                                                 C
       O nascimento do pensamento          os termos do velho Marx. Há um novo                                                    I
filosófico no ocidente muito deve à rígi-    engano no ar, desta vez oferecido em es-                                               E
da separação operada pelos gregos entre                                                                                           N
                                           cala global aos mais incautos: se não for                                              T.
as dimensões do trabalho e do prazer:      rompido o contrato social que legaliza a
uma, para os escravos e não cidadãos;      propriedade privada e não for eliminada                                               n. 2
outra, para os bem nascidos e proprietá-   a legitimação cultural e ideológica que a                                             v. 2
rios. A dupla revolução do século XVIII    acompanha, aos trabalhadores só restará
– tecno-econômica e política ao mesmo      conviver com uma exploração ‘mais                                                    dez.
tempo – parecia prenunciar uma relação     humanizada’, em que prazer e trabalho                                                2000


                                                                                                                                 129
Resenhas
 EccoS Rev. Cient., UNINOVE, São Paulo: (v.2 n.2): 123-154




                                              permanecem inimigos.                        zação dos procedimentos, na execução
                                                      Esta digressão serve como um        de tarefas repetitivas e monótonas, nos
                                              alerta introdutório à leitura deste li-     valores da competição acirrada, entre
                                              vro-entrevista de Domenico de Masi.         outras características, tem seus dias
                                              O sociólogo italiano, que há mais de        contados, até porque se tornou con-
                                              quinze anos pesquisa as mudanças nas        traproducente;
                                              formas de trabalho e em suas organiza-
                                              ções gestoras, não deve ser visto como             3. o número médio de horas
                                              um Messias que veio anunciar a nova         trabalhadas durante a vida de uma pes-
                                              eclesia, mesmo porque não há ingenui-       soa vem diminuindo gradativamente
                                              dade nem vulgarização em suas teses,        e numa velocidade cada vez maior: o
                                              embora haja contribuições importantes       autor estima que em 2015 “cada tra-
                                              e sobrem polêmicas.                         balhador disporá, em média, de trinta
                                                      Dentre essas polêmicas, destaca-    mil horas de trabalho, contra as atuais
                                                                                          oitenta mil horas que ele atualmente
                                              se a que defende uma drástica redução
                                                                                          desempenha (sic) entre os vinte e os
                                              da jornada de trabalho, que beneficia-
                                                                                          sessenta anos.”(p. 267);
 E
                                              ria o prazer e, de quebra, aumentaria as
 C                                            vagas disponíveis. Toda a argumentação            4. a produtividade do trabalho
 C                                            do autor é construída a partir da cons-     tem crescido ininterrupta e vertiginosa-
 O
 S
                                              tatação de que:                             mente pelo menos nos últimos 20 anos
                                                                                          e o nível de emprego nem de longe a
 R                                                   1. vivemos um salto de época ba-     acompanha, ao contrário: “nos últimos
 E                                            seado numa mudança de paradigmas, em
 V.
                                                                                          dez anos (para se dar um exemplo), as
                                              que coincidem três inovações diferentes:    grandes empresas italianas produziram
 C                                            novas fontes energéticas, novas divisões    18% a mais com 22% a menos de tra-
 I                                            do trabalho e novas divisões do poder;      balho humano” (p. 266);
 E
 N
 T.
                                                     2. a sociedade industrial típica,           5. nas sociedades atuais, ditas
                                              que vigorou até o início da década de 80,   pós-industriais, as atividades físicas se
n. 2                                          baseada na produtividade do trabalho,       rendem às atividades intelectuais; as
v. 2                                          na produção em escala, num grande           atividades repetitivas, às criativas e o
                                              contingente proletário, nas hierarquias     diferencial produtivo é dado pela maior
dez.                                          rígidas e centralizadas, nos controles      aplicação de conhecimento às tarefas
2000                                          estritos sobre o trabalho, na burocrati-    profissionais, em função da redução


130
Resenhas
                                                                          EccoS Rev. Cient., UNINOVE, São Paulo: (v.2 n.2): 123-154




dos trabalhos braçais, que tendem a ser            Alguns analistas da sociologia do
desenvolvidos pelas máquinas;               trabalho, chatos de plantão, argumen-
                                            tam que não há propriamente perda
        6. o número de trabalhadores “co-   de centralidade do trabalho enquanto
larinho branco” – os que desenvolvem        categoria ontológica, mesmo que este
tarefas de natureza imaterial (planeja-     argumento recenda a um certo arqué-
mento, controle, decisão, pesquisa etc.)    tipo de ascendência judaico-cristã:
– atualmente suplantam aqueles que          a própria forma de organização e a
atuam na linha de produção, bastando        capacidade de criação de postos de
citar que na “IBM italiana, que é uma em-   trabalho, vale dizer, empregos nas
presa industrial, existem dez mil depen-    sociedades ditas modernas, é que
dentes (funcionários), dos quais somente    vêm sendo inapelavel-mente batidas
seiscentos são operários. Por ‘operários’   pelas inovações tecno-lógicas, pela
entendemos ‘empregados tecnológicos’,       reordenação espacial e operacional dos
que em nada se assemelham aos operários     mecanismos que geram mais-valia e
analfabetos de tempos atrás” (p. 62).       lucro. Trata-se, enfim, de um processo
                                            extensivo e intensivo de reorganização
       Como decorrência dessas evidên-      do capital em escala mundial, como o
                                                                                                                                 E
                                                                                                                                 C
cias empíricas, constata-se que:            é a própria globalização.                                                            C

      a) os trabalhadores típicos das              Nem por isso as teses de De Masi                                              O
                                                                                                                                 S
sociedades industriais não mais são o       devem ser desconsideradas, até porque
protótipo do trabalho no novo tipo de       a teoria nem sempre pode ser culpada                                                 R
sociedade nem representam uma classe        por não conduzir à boa prática, e a boa                                              E
                                            intenção não deixa de ser um indicativo                                              V.
revolucionária, o que equivale dizer
que eles não encarnam os problemas          do justo interesse. Vamos às duas que                                                C
e desafios centrais do mundo contem-         consideramos principais:                                                             I
                                                                                                                                 E
porâneo;                                                                                                                         N
                                                   1. organizações de todo tipo                                                  T.
       b) do mesmo modo, as empresas        conseguirão diferenciar-se no mercado
baseadas nos processos tayloristas/for-     altamente competitivo pela capacidade                                               n. 2
distas de produção, baseadas na estru-      de inovar e antecipar o futuro, seja                                                v. 2
tura piramidal de poder e no controle       nos processos de produção de bens ou
exacerbado do trabalhador e do tempo        serviços seja na tipologia de produtos e                                           dez.
de trabalho, não são mais as campeãs de     serviços que oferecem;                                                             2000
inovação e de produtividade.

                                                                                                                                131
Resenhas
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                                                     2. organizações e pessoas devem        pelo processo industrial, dependendo
                                              se preparar para ocupar criativamente o       de como se articulem as duas caracte-
                                              tempo livre que resultará das inovações       rísticas que definem este processo: as
                                              tecnológicas aplicadas à produção, o que      possibilidades materiais (econômicas) e
                                              significa aproveitar o ócio para dedicá-lo     imateriais (culturais). Fica claro que este
                                              ao cultivo das artes, do intelecto e do       salto dependerá do investimento maciço
                                              corpo, dos trabalhos domésticos, dos          e planejado em ciência, tecnologia e
                                              cuidados com os filhos, da educação            educação. Como exemplo, o autor cita
                                              profissional e civil permanentes.              o Silicon Valley , na Califórnia, que

                                                      Ampliando esquemas constru-                  era uma área deprimida econo-
                                              ídos por outros autores, Domenico                    micamente, mas próxima de grandes
                                              chega a uma divisão internacional do                 centros universitários como os de
                                              trabalho que contempla as seguintes                  San Diego ou Santa Barbara: seus
                                              etapas: Ideação – pesquisa as inovações              jovens eram pobres, mas diplo-
                                              e planeja o futuro; decisão / pesquisa e             mados em Informática ou Biologia.
                                              desenvolvimento – define os interesses                O Silicon Valley passou, em poucos
 E
 C
                                              comerciais e as condições necessárias                anos, do rural ao pós-industrial, sem
 C                                            para o desenvolvimento da idéia; produ-              jamais ter sido industrial e, portanto,
 O                                            ção – organiza todo o sistema produtivo              sem ter tido que enfrentar, vencer
 S
                                              do bem ou processo ideado; consumo                   e superar a cultura industrial e sua
                                              – distribuição e uso dos produtos resul-             resistência às mudanças. (p. 124)
 R
 E                                            tantes. Na visão do autor, o marketing
 V.                                           seria a inteligência que associa e organiza           O sociólogo ainda nos lembra
 C                                            estas etapas. Esta formulação reproduz,       da célebre frase cunhada pelo filósofo
 I                                            num plano mundial, a clássica divisão         russo Alexandre Koyré – “Não é do
 E                                            do trabalho que vigora nos espaços            trabalho que nasce a civilização, é do
 N
 T.
                                              microeconômicos, prendendo o autor            tempo livre e do jogo” – e busca sua
                                              a uma razão tributária do sistema capi-       validação nos fundamentos de nossa
n. 2                                          talista tal como a conhecemos.                civilização ocidental, a Grécia antiga,
v. 2                                                  Para dar um pouco de fôlego aos       quando o trabalho (aquilo que faz suar)
                                              subdesenvolvidos, Domenico avalia que         e também o comércio eram atividades
dez.                                          é possível um país chegar ao estágio pós-     delegadas aos escravos e aos não cida-
2000                                          industrial sem passar, necessariamente,       dãos, reservando-se às classes altas o livre


132
Resenhas
                                                                            EccoS Rev. Cient., UNINOVE, São Paulo: (v.2 n.2): 123-154




pensar, o deleite estético e intelectual,    educacionais, com a perda da autono-
o direito ao ócio, além do cultivo do        mia intelectual e criativa, outro.
corpo e as tarefas de guerra. O que se              O autor tem a sensibilidade de
privilegiava eram atividades em que          esclarecer sobre o perigo de o tempo
despontavam o caráter lúdico e estético,     livre estar a serviço do velho ditado ‘o
o jogo e o ‘treinamento’ do espírito e do    ócio é pai de todos os vícios’; para ele,
pensamento, sem estritas vinculações         ao contrário, o tempo livre deve servir
com a aplicação imediata, a necessidade      para promover o que ele chama de ócio
funcional ou a sobrevivência direta. Os      criativo, aquele que se dirige a melhorar
resultados alcançados por esse tipo de       a qualidade de nossas vidas e do meio
organização social, fundamentada no          ambiente; a produzir criativamente sem
ócio criativo, podem ser apreciados até      delimitações estritas de tempo e espaço,
hoje pelo desenvolvimento das artes, da      para além de comandos e hierarquias
filosofia, da astronomia, das ciências,        paralisantes; a conectar vida, traba-
da política... dos valores que erigiram a    lho e felicidade em um único tempo,
civilização ocidental, enfim.                 exercitado livremente pelo próprio
        Tudo isso é fato e já foi lembrado   indivíduo, em casa ou no escritório,
                                                                                                                                   E
nos primeiros parágrafos desta resenha,      principalmente por meio da modali-                                                    C
mas não se deve esquecer de que cada         dade do teletrabalho, que se associa ao                                               C
uma dessas conquistas só foi possível        uso das tecnologias de comunicação e                                                  O
                                                                                                                                   S
graças ao trabalho real e concreto de        informação. Não haverá lugar exclusivo
milhões de trabalhadores anônimos            para criar e produzir, trabalhar e ganhar                                             R
que, além de gerar valor econômico           o pão. Assim, exercitar o ócio criativo                                               E
                                             implicará descansar o corpo e manter                                                  V.
não compartilhado, foi o responsável,
literalmente, pelo sustento das cabeças      em atividade frenética o cérebro.                                                     C
pensantes que conferiam prazeres a suas             A sociedade pós-industrial,                                                    I
vidas na mesma medida em que coman-          para De Masi, pode superar estas dico-                                                E
                                                                                                                                   N
davam trabalho alheio. Cabe lembrar,         tomias entre trabalho como sacrifício                                                 T.
ainda, que os mecanismos tayloristas         e expiação e tempo livre como vício e
de exploração do trabalho vigoram            lassidão, conjugando, no ócio criativo,                                              n. 2
intensamente: o telemarketing , que          prazer, trabalho e lazer. E pode fazê-lo,                                            v. 2
exige um exagerado produtivismo ele-         agora, em bases mais igualitárias, por
trônico, é um exemplo característico; a      meio da difusão e uso dos extraordi-                                                dez.
subordinação proletarizante das funções      nários recursos propiciados pelas novas                                             2000
                                             tecnologias, que liberarão o homem

                                                                                                                                  133
Resenhas
 EccoS Rev. Cient., UNINOVE, São Paulo: (v.2 n.2): 123-154




                                              das tarefas monótonas, extenuantes e       de motivação e beleza e não estará
                                              pouco criativas. Nesse sentido, a refle-    mais restrito à idéia de um horário de
                                              xão do autor nos dá uma contribuição       trabalho (sacrifício) e outro de lazer
                                              extremamente importante, pelo reco-        (prazer). Em suma, o resultado do
                                              nhecimento da energia revolucionária,      trabalho não dependerá de sistemas de
                                              transformadora e criativa que o tempo      controle burocraticamente organizados
                                              livre poderá gerar, com impactos signifi-   e intensamente vigiados, mas da cria-
                                              cativos na mentalidade individual e co-    tividade que só se explicita à medida
                                              letiva e, quem sabe, no relacionamento     que o sujeito produz em liberdade, flui
                                              entre pessoas e povos.                     intensa e prazerosamente a vida junto
                                                      Para tanto, Domenico enfatiza a    à família e aos amigos, viaja e conhece
                                              necessidade de capacitar as pessoas para   outras culturas e diferentes formas de
                                              o exercício criativo de seu tempo livre.   fazer e pensar.
                                              Uma vez liberadas dos condiciona-                 A leitura de O Ócio Criativo é
                                              mentos que sustentavam a sociedade         importante para quem procura indícios
                                              industrial, deverão aprender a usar        de novas possibilidades para a felici-
 E
                                              esse tempo criativamente. Uma nova         dade no âmbito de uma globalização
 C                                            mentalidade acerca da organização          desenfreada. Quiçá as antevisões do au-
 C                                            do trabalho e da mensuração de seus        tor resultem numa aproximação efetiva
 O
 S
                                              resultados invadirá empresas e orga-       entre trabalho e prazer, reconciliando
                                              nizações de todo tipo. Isso significa       uma ontologia constitutiva que o capital
 R                                            que a medida do bom trabalho não           vem insistindo em contrariar.
 E                                            será mais dada exclusivamente pelo
 V.
                                              resultado material da produtividade;
 C                                            que o trabalho não será mais organizado
 I                                            no interior de escritórios desprovidos
 E
 N
 T.

n. 2
v. 2

dez.
2000


134

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  • 1. EccoS revista científica Centro Universitario Nove de Julho eccos@uninove.br ISSN (Versión impresa): 1517-1949 BRASIL 2000 Eduardo Santos RESEÑEA DE quot;O ÓCIO CRIATIVO (ENTREVISTA A MARIA SERENA PALIERI)quot; DE DOMENICO DE MASI EccoS revista científica, dezembro, año/vol. 2, número 002 Centro Universitario Nove de Julho São Paulo, Brasil pp. 129-134 Red de Revistas Científicas de América Latina y el Caribe, España y Portugal Universidad Autónoma del Estado de México http://redalyc.uaemex.mx
  • 2. Resenhas EccoS Rev. Cient., UNINOVE, São Paulo: (v.2 n.2): 123-154 DE MASI, Domenico. O Ócio Criativo (entrevista a Maria Serena Pa- lieri). Tradução Léa Manzi. Rio de Janeiro: Sextante, 2000. TRABALHO E PRAZER: ENFIM RECONCILIADOS? Eduardo Santos* *Sociólogo, Mestrando em Ge- ografia Humana (USP). Coor- denador de Política Editorial e Feita uma retrospectiva histórica mais adequada entre as partes, abrindo Editor de EccoS. das relações entre trabalho e prazer ao a todas as classes possibilidades inéditas longo do périplo humano no planeta, para uma convivência mais equilibrada, dificilmente deixaremos de chegar à materializada por um capitalismo em conclusão de que, parafraseando os que tecnologia e democracia política compositores da música regional, es- favoreceriam uma distribuição mais tas duas dimensões tão fundamentais igualitária dos frutos do trabalho. quanto necessárias da vida humana Ledo engano! Hoje, no limiar de sempre andaram “entre tapas e beijos”. um novo século, o canto de sereia no- A reconciliação, que na canção aconte- vamente se faz ouvir, embalando-se na E C ce à noite nos espaços da intimidade, melodia de um avanço tecnológico sem C é apenas aparente no primeiro caso: precedentes, que permitiria ao trabalho O trabalho e prazer, no mais das vezes, – e aos trabalhadores – livrarem-se das S reconciliam-se apenas em processos de tarefas pesadas e brutalizantes que sus- R sublimação, com as decorrentes patolo- tentam a produção de bens e de valor, e E gias que acometem os elos mais frágeis romperem os grilhões que os acorrentam V. da corrente – os trabalhadores. aos desígnios do capital, para lembrar C O nascimento do pensamento os termos do velho Marx. Há um novo I filosófico no ocidente muito deve à rígi- engano no ar, desta vez oferecido em es- E da separação operada pelos gregos entre N cala global aos mais incautos: se não for T. as dimensões do trabalho e do prazer: rompido o contrato social que legaliza a uma, para os escravos e não cidadãos; propriedade privada e não for eliminada n. 2 outra, para os bem nascidos e proprietá- a legitimação cultural e ideológica que a v. 2 rios. A dupla revolução do século XVIII acompanha, aos trabalhadores só restará – tecno-econômica e política ao mesmo conviver com uma exploração ‘mais dez. tempo – parecia prenunciar uma relação humanizada’, em que prazer e trabalho 2000 129
  • 3. Resenhas EccoS Rev. Cient., UNINOVE, São Paulo: (v.2 n.2): 123-154 permanecem inimigos. zação dos procedimentos, na execução Esta digressão serve como um de tarefas repetitivas e monótonas, nos alerta introdutório à leitura deste li- valores da competição acirrada, entre vro-entrevista de Domenico de Masi. outras características, tem seus dias O sociólogo italiano, que há mais de contados, até porque se tornou con- quinze anos pesquisa as mudanças nas traproducente; formas de trabalho e em suas organiza- ções gestoras, não deve ser visto como 3. o número médio de horas um Messias que veio anunciar a nova trabalhadas durante a vida de uma pes- eclesia, mesmo porque não há ingenui- soa vem diminuindo gradativamente dade nem vulgarização em suas teses, e numa velocidade cada vez maior: o embora haja contribuições importantes autor estima que em 2015 “cada tra- e sobrem polêmicas. balhador disporá, em média, de trinta Dentre essas polêmicas, destaca- mil horas de trabalho, contra as atuais oitenta mil horas que ele atualmente se a que defende uma drástica redução desempenha (sic) entre os vinte e os da jornada de trabalho, que beneficia- sessenta anos.”(p. 267); E ria o prazer e, de quebra, aumentaria as C vagas disponíveis. Toda a argumentação 4. a produtividade do trabalho C do autor é construída a partir da cons- tem crescido ininterrupta e vertiginosa- O S tatação de que: mente pelo menos nos últimos 20 anos e o nível de emprego nem de longe a R 1. vivemos um salto de época ba- acompanha, ao contrário: “nos últimos E seado numa mudança de paradigmas, em V. dez anos (para se dar um exemplo), as que coincidem três inovações diferentes: grandes empresas italianas produziram C novas fontes energéticas, novas divisões 18% a mais com 22% a menos de tra- I do trabalho e novas divisões do poder; balho humano” (p. 266); E N T. 2. a sociedade industrial típica, 5. nas sociedades atuais, ditas que vigorou até o início da década de 80, pós-industriais, as atividades físicas se n. 2 baseada na produtividade do trabalho, rendem às atividades intelectuais; as v. 2 na produção em escala, num grande atividades repetitivas, às criativas e o contingente proletário, nas hierarquias diferencial produtivo é dado pela maior dez. rígidas e centralizadas, nos controles aplicação de conhecimento às tarefas 2000 estritos sobre o trabalho, na burocrati- profissionais, em função da redução 130
  • 4. Resenhas EccoS Rev. Cient., UNINOVE, São Paulo: (v.2 n.2): 123-154 dos trabalhos braçais, que tendem a ser Alguns analistas da sociologia do desenvolvidos pelas máquinas; trabalho, chatos de plantão, argumen- tam que não há propriamente perda 6. o número de trabalhadores “co- de centralidade do trabalho enquanto larinho branco” – os que desenvolvem categoria ontológica, mesmo que este tarefas de natureza imaterial (planeja- argumento recenda a um certo arqué- mento, controle, decisão, pesquisa etc.) tipo de ascendência judaico-cristã: – atualmente suplantam aqueles que a própria forma de organização e a atuam na linha de produção, bastando capacidade de criação de postos de citar que na “IBM italiana, que é uma em- trabalho, vale dizer, empregos nas presa industrial, existem dez mil depen- sociedades ditas modernas, é que dentes (funcionários), dos quais somente vêm sendo inapelavel-mente batidas seiscentos são operários. Por ‘operários’ pelas inovações tecno-lógicas, pela entendemos ‘empregados tecnológicos’, reordenação espacial e operacional dos que em nada se assemelham aos operários mecanismos que geram mais-valia e analfabetos de tempos atrás” (p. 62). lucro. Trata-se, enfim, de um processo extensivo e intensivo de reorganização Como decorrência dessas evidên- do capital em escala mundial, como o E C cias empíricas, constata-se que: é a própria globalização. C a) os trabalhadores típicos das Nem por isso as teses de De Masi O S sociedades industriais não mais são o devem ser desconsideradas, até porque protótipo do trabalho no novo tipo de a teoria nem sempre pode ser culpada R sociedade nem representam uma classe por não conduzir à boa prática, e a boa E intenção não deixa de ser um indicativo V. revolucionária, o que equivale dizer que eles não encarnam os problemas do justo interesse. Vamos às duas que C e desafios centrais do mundo contem- consideramos principais: I E porâneo; N 1. organizações de todo tipo T. b) do mesmo modo, as empresas conseguirão diferenciar-se no mercado baseadas nos processos tayloristas/for- altamente competitivo pela capacidade n. 2 distas de produção, baseadas na estru- de inovar e antecipar o futuro, seja v. 2 tura piramidal de poder e no controle nos processos de produção de bens ou exacerbado do trabalhador e do tempo serviços seja na tipologia de produtos e dez. de trabalho, não são mais as campeãs de serviços que oferecem; 2000 inovação e de produtividade. 131
  • 5. Resenhas EccoS Rev. Cient., UNINOVE, São Paulo: (v.2 n.2): 123-154 2. organizações e pessoas devem pelo processo industrial, dependendo se preparar para ocupar criativamente o de como se articulem as duas caracte- tempo livre que resultará das inovações rísticas que definem este processo: as tecnológicas aplicadas à produção, o que possibilidades materiais (econômicas) e significa aproveitar o ócio para dedicá-lo imateriais (culturais). Fica claro que este ao cultivo das artes, do intelecto e do salto dependerá do investimento maciço corpo, dos trabalhos domésticos, dos e planejado em ciência, tecnologia e cuidados com os filhos, da educação educação. Como exemplo, o autor cita profissional e civil permanentes. o Silicon Valley , na Califórnia, que Ampliando esquemas constru- era uma área deprimida econo- ídos por outros autores, Domenico micamente, mas próxima de grandes chega a uma divisão internacional do centros universitários como os de trabalho que contempla as seguintes San Diego ou Santa Barbara: seus etapas: Ideação – pesquisa as inovações jovens eram pobres, mas diplo- e planeja o futuro; decisão / pesquisa e mados em Informática ou Biologia. desenvolvimento – define os interesses O Silicon Valley passou, em poucos E C comerciais e as condições necessárias anos, do rural ao pós-industrial, sem C para o desenvolvimento da idéia; produ- jamais ter sido industrial e, portanto, O ção – organiza todo o sistema produtivo sem ter tido que enfrentar, vencer S do bem ou processo ideado; consumo e superar a cultura industrial e sua – distribuição e uso dos produtos resul- resistência às mudanças. (p. 124) R E tantes. Na visão do autor, o marketing V. seria a inteligência que associa e organiza O sociólogo ainda nos lembra C estas etapas. Esta formulação reproduz, da célebre frase cunhada pelo filósofo I num plano mundial, a clássica divisão russo Alexandre Koyré – “Não é do E do trabalho que vigora nos espaços trabalho que nasce a civilização, é do N T. microeconômicos, prendendo o autor tempo livre e do jogo” – e busca sua a uma razão tributária do sistema capi- validação nos fundamentos de nossa n. 2 talista tal como a conhecemos. civilização ocidental, a Grécia antiga, v. 2 Para dar um pouco de fôlego aos quando o trabalho (aquilo que faz suar) subdesenvolvidos, Domenico avalia que e também o comércio eram atividades dez. é possível um país chegar ao estágio pós- delegadas aos escravos e aos não cida- 2000 industrial sem passar, necessariamente, dãos, reservando-se às classes altas o livre 132
  • 6. Resenhas EccoS Rev. Cient., UNINOVE, São Paulo: (v.2 n.2): 123-154 pensar, o deleite estético e intelectual, educacionais, com a perda da autono- o direito ao ócio, além do cultivo do mia intelectual e criativa, outro. corpo e as tarefas de guerra. O que se O autor tem a sensibilidade de privilegiava eram atividades em que esclarecer sobre o perigo de o tempo despontavam o caráter lúdico e estético, livre estar a serviço do velho ditado ‘o o jogo e o ‘treinamento’ do espírito e do ócio é pai de todos os vícios’; para ele, pensamento, sem estritas vinculações ao contrário, o tempo livre deve servir com a aplicação imediata, a necessidade para promover o que ele chama de ócio funcional ou a sobrevivência direta. Os criativo, aquele que se dirige a melhorar resultados alcançados por esse tipo de a qualidade de nossas vidas e do meio organização social, fundamentada no ambiente; a produzir criativamente sem ócio criativo, podem ser apreciados até delimitações estritas de tempo e espaço, hoje pelo desenvolvimento das artes, da para além de comandos e hierarquias filosofia, da astronomia, das ciências, paralisantes; a conectar vida, traba- da política... dos valores que erigiram a lho e felicidade em um único tempo, civilização ocidental, enfim. exercitado livremente pelo próprio Tudo isso é fato e já foi lembrado indivíduo, em casa ou no escritório, E nos primeiros parágrafos desta resenha, principalmente por meio da modali- C mas não se deve esquecer de que cada dade do teletrabalho, que se associa ao C uma dessas conquistas só foi possível uso das tecnologias de comunicação e O S graças ao trabalho real e concreto de informação. Não haverá lugar exclusivo milhões de trabalhadores anônimos para criar e produzir, trabalhar e ganhar R que, além de gerar valor econômico o pão. Assim, exercitar o ócio criativo E implicará descansar o corpo e manter V. não compartilhado, foi o responsável, literalmente, pelo sustento das cabeças em atividade frenética o cérebro. C pensantes que conferiam prazeres a suas A sociedade pós-industrial, I vidas na mesma medida em que coman- para De Masi, pode superar estas dico- E N davam trabalho alheio. Cabe lembrar, tomias entre trabalho como sacrifício T. ainda, que os mecanismos tayloristas e expiação e tempo livre como vício e de exploração do trabalho vigoram lassidão, conjugando, no ócio criativo, n. 2 intensamente: o telemarketing , que prazer, trabalho e lazer. E pode fazê-lo, v. 2 exige um exagerado produtivismo ele- agora, em bases mais igualitárias, por trônico, é um exemplo característico; a meio da difusão e uso dos extraordi- dez. subordinação proletarizante das funções nários recursos propiciados pelas novas 2000 tecnologias, que liberarão o homem 133
  • 7. Resenhas EccoS Rev. Cient., UNINOVE, São Paulo: (v.2 n.2): 123-154 das tarefas monótonas, extenuantes e de motivação e beleza e não estará pouco criativas. Nesse sentido, a refle- mais restrito à idéia de um horário de xão do autor nos dá uma contribuição trabalho (sacrifício) e outro de lazer extremamente importante, pelo reco- (prazer). Em suma, o resultado do nhecimento da energia revolucionária, trabalho não dependerá de sistemas de transformadora e criativa que o tempo controle burocraticamente organizados livre poderá gerar, com impactos signifi- e intensamente vigiados, mas da cria- cativos na mentalidade individual e co- tividade que só se explicita à medida letiva e, quem sabe, no relacionamento que o sujeito produz em liberdade, flui entre pessoas e povos. intensa e prazerosamente a vida junto Para tanto, Domenico enfatiza a à família e aos amigos, viaja e conhece necessidade de capacitar as pessoas para outras culturas e diferentes formas de o exercício criativo de seu tempo livre. fazer e pensar. Uma vez liberadas dos condiciona- A leitura de O Ócio Criativo é mentos que sustentavam a sociedade importante para quem procura indícios industrial, deverão aprender a usar de novas possibilidades para a felici- E esse tempo criativamente. Uma nova dade no âmbito de uma globalização C mentalidade acerca da organização desenfreada. Quiçá as antevisões do au- C do trabalho e da mensuração de seus tor resultem numa aproximação efetiva O S resultados invadirá empresas e orga- entre trabalho e prazer, reconciliando nizações de todo tipo. Isso significa uma ontologia constitutiva que o capital R que a medida do bom trabalho não vem insistindo em contrariar. E será mais dada exclusivamente pelo V. resultado material da produtividade; C que o trabalho não será mais organizado I no interior de escritórios desprovidos E N T. n. 2 v. 2 dez. 2000 134